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human decency”
Quando morre um polícia, é automaticamente topo dos jornais de notícias, até
primeira página. Só que não foi um homicídio, e cobrir a verdadeira história
significa que pessoas inocentes irão pagar as consequências.
Eu tinha fontes em Norwood. Houve tempo para fazer algumas chamadas e eu fi-las.
Um jovem detetive que me conhecia hesitou por um segundo, e depois contou-me tudo.
Dois tiros foram disparados, a primeira ferida foi superficial – um tiro no abdómen. O
segundo foi o fatal, direto ao coração. A arma, a própria do polícia, estava no chão do
carro. Tinha queimaduras de pó nas suas mãos, as janelas todas fechadas e as portas
trancadas. Sem bilhete não é homicídio, mas sim suicídio. Liga-me de volta quando
chegares à cidade, disse o detetive.
Não me ocorreu na viagem de carro que nas próximas horas, e de novo dois meses
depois, eu fosse estar perante várias decisões difíceis de tomar.
A primeira, de chamar ao suicídio “suicídio”, não era difícil. O morto era um polícia,
não um anónimo, cidadão privado cuja morte, de modo algum, não teria consequências
para ninguém. Além disso, a história errada – que o polícia havia sido assassinado – já
estava a tomar grandes proporções nas estações de rádio em Boston. Uma fonte do
escritório do exame médico confirmou-me os detalhes do suicídio, e depois ao meu
local de trabalho da altura, WCVB-TV, que certamente iria noticiar a verdade às 18h.
Outra chamada ao meu amigo detetive, levou-me a outra fonte e à próxima fase da
história. O falecido polícia era também membro da autoridade habitacional da cidade e
tinha acabado de descobrir que estava sob investigação por, alegadamente, ter desviado
fundos. De facto, a fonte disse, os auditores do escritório do procurador-geral vinham à
cidade esse mesmo dia para rever livros no escritório do conselho.
Eu não andava a usar o pager nesses dias (abril 1977), mas quando cheguei ao carro do
Len, a mesa de atribuição estava a ligar-me freneticamente pelo rádio. O detetive, a
minha fonte inicial, precisava de falar comigo antes que eu reportasse alguma coisa. O
que ele tinha para me dizer congelou-me de imediato.
Frank Walsh não tinha nenhum registo criminal. Folha limpa, registo departamental
incrível por 30 anos. O que ele era, era um pai de 4 filhos cuja família havia sido
devastada pela morte, doença e montanhosos problemas financeiros, nos meses
anteriores ao seu suicídio.
O Len e eu ficamos sentados no carro por uma hora, a tentar escolher entre meia dúzia
de versões de um guião, aquele que parecesse adequadamente sensível. O Len era o
operador de câmara certo para estar a trabalhar com naquele dia: ele odiava as
trompetes, a simplificação excessiva e a, por vezes, invasão brutal das notícias
televisivas.
Eu liguei à produtora, contei-lhe a história toda, e disse-lhe que era sólida. Ela disse que
ia ser a notícia líder e concordou connosco na forma como a história deveria ser tratada.
Nenhum de nós previu a resposta violenta que a história teve. Apesar de a Boston
Phoenix e, mais tarde, a imprensa tradicional ter divulgado a história correta, nós fomos
os primeiros e nós somos da TV, e a TV é onde a ação acontece – e também a reação.
Quando os carros da nossa equipa passaram pela cidade, foram vandalizados. Um
colega que estava a cobrir o funeral foi agredido. Eu recebi ameaças de morte bem
credíveis.
E as cartas. Havia pontuação das mesmas, das quais maior parte transbordava com
raiva, mas muitas reconheciam que enquanto eu tinha um trabalho a fazer, também
acrescentei dor e sofrimento a uma família já desolada. Algumas incluíam fotografias de
jornal dos filhos de Walsh. Se a campanha foi organizada ou espontânea, a verdade é
que foi implacável.
E dois meses depois chegou a terceira decisão. Uma fonte no governo do estado disse-
me que o conselho de previdência do estado, discretamente, concedeu o benefício de
morte apesar da descoberta oficial de que o policial morreu pelas suas próprias mãos.
Eu não reportei isso, ou sequer contei aos meus superiores que havia algo para reportar.
Eu não estava certo do que a administração iria dizer, mas eu sabia como me sentia.
Fazer está história apenas ia magoar pessoas inocentes, a família de Walsh, pessoas que
já tinham sido afetadas pela morte e o seu rescaldo. Um jornalista enfrenta
constantemente decisões de como usar a informação que recebe. Às vezes a decisão, a
decisão justa, é não usar a informação de todo.
Talvez outra agência de notícias fosse pegar na notícia, pensei. E talvez, naquele
momento, eu tenha escolhido não me comportar como jornalista, mas como ser humano.
Enfim, foi isso que eu disse a mim mesmo, e como eu escolhi lembrar a história.
Ninguém, aparentemente, informou que o benefício da morte tinha sido pago.
Apresentação
Um policial é dado como assassinado, para mais tarde se vir a descobrir que este
se tinha suicidado.
Contar a verdade sobre o suicídio, impediria uma família de receber o benefício
de morte dado quando um polícia morre na linha de serviço. A família do polícia
era carenciada.
Apesar de a notícia do suicídio ter sido divulgada na mesma, a família recebeu
na mesma “às escondidas da população”, o benefício de morte.
Um jornalista descobre a verdade e tem a decisão de contar ao seu canal
televisivo ou de ficar calado e deixar a família beneficiar por algo que não
deviam estar a ser beneficiados.
- Devia o jornalista ter posto o facto de ser um ser humano, à frente do seu dever de
jornalista?