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PRÁTICAS PEDAGÓGICAS DOS PROFESSORES DA SALA DE APOIO

PEDAGÓGICO

SCHEUNEMANN, Rafael1 - UNIVILLE

CORDEIRO, Aliciene Fusca Machado2 - UNIVILLE

Grupo de Trabalho – Didática: Teorias, Metodologias e Práticas


Agência Financiadora: FUMDES/FAP-UNIVILLE

Resumo

O presente trabalho é um recorte da pesquisa da dissertação de mestrado intitulada “Práticas


Pedagógicas dos Professores da Sala de Apoio Pedagógico, realizado no município de
Joinville. Fundamentado na concepção materialista histórico-dialética, tem por objetivo geral
investigar as práticas pedagógicas dos professores da sala de apoio pedagógico, e por
objetivos específicos buscou-se identificar os recursos constituintes das práticas pedagógicas
dos professores das salas de apoio pedagógico e compreender as intervenções realizadas pelos
professores das salas de apoio pedagógico. Para a realização da pesquisa, optou-se pela
etnografia, por meio de observação participante, entendendo-se este método como forma mais
apropriada para compreender a situação em questão, por um período de 3 meses em cada sala
de apoio pedagógico. Foram observadas duas salas de aula, uma vez por semana, em cada
escola. A análise dos dados foi realizada pelo método de análise de conteúdo (FRANCO,
2010), sendo utilizado para a mesma Libâneo (2012), Vygotsky (2007) e Rego (2009), com
percepções relativas ao ambiente utilizado pelas professoras, a tensão (não) existente referente
a conteúdos curriculares e a atenção dada erro. Os resultados indicam práticas pedagógicas
diversificadas e distintas das utilizadas no modelo tradicional de escola, nas salas regulares,
quando colocados em confronto com este modelo. Apresentam-se, assim, práticas
pedagógicas que demonstra estar (in) diretamente de acordo com o documento “Linhas
Programáticas para o Atendimento Especializado na Sala de Apoio Pedagógico”, documento
este que normatiza as salas de apoio pedagógico, bem como aproximam-se dos documentos
reguladores da sala de apoio pedagógico também no município de Joinville.

Palavras-chave: Práticas pedagógicas. Processo de escolarização. Trabalho docente.

Introdução

1
Licenciado em Educação Física pela Instituto Educacional Luterano Bom Jesus/IELUSC. Mestrando em
Educação.E-mail:rsch13@pop.com.br
2
Doutora em Educação: Psicologia da Educação pela PUCSP. Professora da Universidade da Região de
Joinville. E-mail: aliciene_cordeiro@hotmail.com
17050

Não é de hoje que a escola discute a inclusão e a diversidade dentro de seu ambiente.
As mudanças e transformações advindas de conferências e declarações, como a Declaração
dos Direitos Humanos (1948), a Declaração de Jontien (1990) e a Declaração de Salamanca
(1994), expuseram as escolas à novas trajetórias, que suscitaram a necessidade de rever
práticas e modelos até então indiscutíveis.O espaço escolar, antes composto por grupos
semelhantes, cujas práticas pedagógicas direcionavam-se para um público alvo homogêneo,
recebe desde então, obrigatoriamente, grupos heterogêneos, representando a diversidade
presente na sociedade. O ingresso deste novo grupo amplia a discussão sobre as diferenças
individuais, os processos de escolarização e seu papel na aprendizagem e desenvolvimento do
estudante.
Diante disso, à escola, afeita ao modelo tradicional, repetitivo e segregador, marcado
pela dialética inclusão/exclusão, com alunos adaptados ao processo de escolarização e outros
abortados do mesmo, coube criar mecanismos para ensinar aqueles que somente figuravam
entre os estudantes. Um destes mecanismos são as salas de apoio pedagógico – SAP, que tem
como objetivo “oferecer atendimento especializado aos alunos que apresentam dificuldades
de aprendizagem” (MEC, 1994, p.5).
Considerando que a aprendizagem “trata-se essencialmente de um processo de
mudança, de reorganização e enriquecimento do próprio aluno, implicando sua participação
ativa e, ao mesmo tempo, a intencionalidade educativa daquele que ensina”. (LIBÂNEO,
2012, p.42). Cria-se em cada escola uma expectativa em relação ao trabalho pedagógico do
professor da sala de apoio, pois cabe a ele proporcionar a relação entre o estudante e o objeto
de conhecimento, salientando que tal relação foi frustrada na sala de aula comum.
Tal como destaca Libâneo (2012) ao educar pessoas, cabe ao professor efetivar
práticas pedagógicas que favoreçam a apropriação de conteúdos e formas de lidar com o
mundo social e dos objetos, sem desconsiderar contudo que nesta prática irão se constituir
sujeitos e identidades. Assim, cabe questionar em que se constituem as práticas pedagógicas
dos professores da sala de apoio pedagógico. Não só enfocando o “como se faz”, mas também
e principalmente o “porque se faz”, pois é compreendendo a intencionalidade das ações
docentes que será possível discutir as finalidades políticas e sociais subjacentes ao ato de
ensinar.
Este trabalho é um recorte da pesquisa de mestrado, em andamento, intitulada
“Práticas Pedagógicas dos Professores da Sala de Apoio Pedagógico” e tem por objetivo geral
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investigar as práticas pedagógicas dos professores da sala de apoio pedagógico. Derivado


deste objetivo central, encontram-se os objetivos específicos: identificar os recursos
constituintes das práticas pedagógicas dos professores das Salas de Apoio Pedagógico e
compreender as intervenções realizadas pelos professores das Salas de Apoio Pedagógico.
Um balanço de produção realizado pra esta pesquisa apontou: 5221 dissertações
encontradas no banco de teses e dissertações da Capes utilizando a expressão exata “práticas
pedagógicas” e 17 dissertações com a expressão exata “sala de apoio pedagógico”, sendo que
destas destacam-se, para este estudo, a pesquisa de Ropelato (2003) e de Escabora (2006).
Com relação as teses, foram encontradas 907 com a expressão exata “práticas pedagógicas”,
destacando-se Moraes (2010); Stefane (2003) e Silva (2007), devido a aproximação destas
com a temática desta pesquisa. O balanço de produção no Scielo apontou 247 artigos
referenciados com a expressão “práticas pedagógicas” e 4 para a expressão “sala de apoio
pedagógico”. Destes, 5 foram selecionados pela compatibilidade com o tema: Albuquerque e
Morais (2008); Giusta (1985); Marcon, Graça e Nascimento (2011); Ferreira (2007);
Sanchotene e Neto (2010). No site da Anped, a partir do ano de 2004 (27ª edição), foram
pesquisados os GTs 4, 8, 10, 13 e 15, nos quais apresentaram-se 15 trabalhos sobre práticas
pedagógicas, 4 sobre práticas docentes, 2 sobre didática (direcionada à prática pedagógico) e
2 sobre fracasso escolar. Esta busca mostra o quanto ainda é pouco pesquisado as práticas
pedagógicas nas salas de apoio pedagógico. Por ser considerada uma estratégia importante,
para o efetivo aprendizado do estudante por parte do professor das salas regulares
(SCHULZE, 2012), entende-se como fundamental investigar quais ações docentes são
efetivadas neste espaço.

Referencial Teórico

A escola é a instituição oficial destinada a transmissão do conhecimento adquirido


historicamente pelo Homem, para as novas gerações, como afirma Bernardes (2012, p.18) ao
visualizar

a escola como um lugar instituído historicamente, que tem a função social de criar
condições, por meio da educação, para que as crianças se humanizem, apropriando-
se do que o homem produziu historicamente no campo do conhecimento e se
desenvolvam em seus múltiplos aspectos.
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Além desta função, outra prática conhecida, porém não oficialmente destacada, é a de
doutrinar os corpos, discipliná-los e preparar para a vida de trabalho. Destacam Rockwell e
Mercado (1999, p.22) “la escuela también es el contexto natural del proceso de toma de
consciencia laboral y social por parte de los alumnos3” e prosseguem

Por eso, algunos aspectos de la formación implícita em la escuela son análogos a


características del trabajo industrial; la formalización, la importancia de cumprir
com las tareas, la desarticulación entre uma e outra tarea y la necesidad de trabajar
sin tratar de compreender el sentido global del conocimiento transmitido se asemejar
a aspectos del proceso de trabajo em la producción capitalista del país
(ROCKWELL; MERCADO, 1999, p.45).4

Entender o espaço escolar sob esta visão é entender porque o contexto da


escola não se aproxima do contexto do aluno, isolando o mundo externo e as experiências que
o sujeito carrega consigo, os sentidos que coloca nos conteúdos trabalhados. Parece que o
aluno deve ignorar “seu mundo” e inserir-se em outro, como coloca Franco (2010, p.24) “é
sabido que a criança, ao entrar na escola, é muitas vezes levada a silenciar-se para atender ao
controle do que pode ou não ser dito no espaço escolar”.
Neste silenciamento, vemos colocadas práticas repetitivas e excludentes,
características de uma escola dita tradicional; um modelo de escola que perdura há muito
tempo, cujas marcas podem ser vistas nas carteiras umas atrás das outras, na transmissão de
práticas esvaziadas do contexto do aluno, de provas e avaliações que levam em conta o agora,
não o processual, nem a zona de desenvolvimento proximal (VYGOTSKY, 2007).
Esta escola tradicional é, para Behrens (2011, p.41)

[...] o lugar por excelência em que se realiza a educação. Apresenta-se como um


ambiente físico austero, conservador e cerimonioso. Tem como função preparar
intelectual e moralmente os alunos. O compromisso social da escola é a reprodução
da cultura. Caracterizada pela disciplina rígida tem como finalidade ser agência
sistematizadora de uma cultura complexa e funciona como local de apropriação do
conhecimento, por meio da transmissão de conteúdos e confrontação com modelos e
demonstrações.

O professor, responsável direto pela transmissão do conhecimento, nesta visão da


escola, parece haver incorporado o modelo tradicional, segundo Mota (2011, p.76),

3
A escola também é o contexto natural do processo de tomada de consciência social e de trabalho por parte dos
alunos. Tradução livre.
4
Por isso, alguns aspectos da formação implícita na escola são análogos as características do trabalho industrial;
a formalização, a importância de cumprir as tarefas, a desarticulação entre uma e outra tarefa e a necessidade de
trabalhar sem compreender o sentido global do conhecimento transmitido se assemelhar a aspectos do processo
de trabalho da produção capitalista do país. Tradução livre.
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[...] na prática tradicional, o professor, por haver construído conhecimentos sobre


ela, sente uma segurança no direcionamento do trabalho, organizado dentro da
lógica do controle de aprendizagem dos alunos. Talvez essa resistência se dê,
também, como resultado de uma formação inadequada ou como decorrência da falta
de espaço, dentro da escola, para discussão, estudo e reflexão sobre a prática
alfabetizadora.

Ao buscar entender as práticas pedagógicas, chegamos a Franco (2012, p. 173) para


quem “são práticas as que se organizam intencionalmente para atender as determinadas
expectativas educacionais solicitadas/requeridas por uma dada comunidade social” e ainda
“estamos nos referindo a práticas sociais que se exercem com a finalidade de concretizar
processos pedagógicos” (op. cit, p.172).
Baseando-nos nesta afirmação, entendemos que as práticas pedagógicas são processos
desencadeados pelos professores, realizados intencionalmente, que tem por objetivo mediar o
“encontro formativo” (LIBÂNEO, 2012) entre o estudante e o conhecimento, sem
desconsiderar, contudo, o papel das condições concretas para a realização desta atividade.
Quando falamos em práticas intencionais, temos o entendimento de que as condições
concretas nas quais estas se dão, faz com que recai sobre o professor uma sobrecarga de
funções, demandas oriundas da necessidade de retransmitir conteúdos, atender critérios
estabelecidos por instâncias superiores, atingir metas estabelecidas pela direção e conseguir
que seus alunos aprendam e se desenvolvam. Neste amalgamado de funções, o professor,
infelizmente, dispõe de pouco tempo para refletir sobre sua prática, fato impeditivo da
constituição de uma práxis (VÁSQUEZ, 2011), e o leve a submeter-se ao modelo tradicional
de escola e ensino.
Apesar dos diversos estudos e críticas ao modelo tradicional, é ainda perceptível sua
presença nas escolas, segundo Behrens (2011) e Zabala (1998). As crianças que não
conseguem se adequar ao processo de escolarização e/ou apresentam dificuldades diante deste
processo, devem ser atendidas por outros mecanismos, criados para “normalizar” o ambiente
escolar e atender as diferenças. Conforme Escabora (2006, p.13) “vemos, por exemplo, as
escolas e classes especiais, os projetos de reforço, programas de recuperação paralela,
serviços de apoio pedagógico e programas de aceleração”. Ropelato (2003, p.12) entende que
estes programas são para
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alunos que encontram desafios em aprender os conhecimentos que são organizados,


selecionados e ensinados pelas escolas, alunos que não apresentam o desempenho
considerado adequado para sua idade, ou que não desenvolveram as competências
exigidas pelo sistema escolar.

As salas de apoio pedagógico foram criadas em 1993 pelas diretrizes estabelecidas


pela Secretaria de Educação Especial (SEESP), na publicação 01/93, cujo título é
“Encaminhamento de Alunos do Ensino Regular para Atendimento Especializado”. Como
complemento destas diretrizes, foi criado o documento denominado “Linhas Programáticas
para o Atendimento Especializado na Sala de Apoio Pedagógico”, pelo Ministério da
Educação, emitido em 1994 (MEC, 1994). Segundo este documento, a SAP foi implantada no
ensino regular com “o objetivo de oferecer atendimento especializado aos alunos que
apresentam dificuldades de aprendizagem” (MEC, 1994, p.5).
O público alvo das salas de apoio pedagógico são alunos das primeiras séries do 1°
grau no Ensino Fundamental com “multirrepetência, dificuldades em alfabetizar-se e
hiperatividade” (MEC, 1994, p.7), devendo ser atendidos seu contra turno escolar.

Percurso Metodológico

Esta é uma pesquisa etnográfica, e acreditamos, como Gatti e André (2010, p.32), que
“os acontecimentos de sala de aula só podem ser entendidos no contexto em que ocorrem e
são permeados por uma multiplicidade de significados”. Realizada por meio de observação
participante, que conforme descreve André (1995, p.28) “a observação é chamada de
participante porque parte do princípio de que o pesquisador tem sempre um grau de interação
com a situação estudada, afetando-a e sendo por ela afetado”, e acreditando, conforme
Riemann (2010, p.17) que “o trabalho etnográfico pode promover uma reflexão sobre a
própria prática pedagógica”.
A observação participante foi realizada em 2 escolas da Rede Municipal de Ensino de
Joinville, em um período de 3 meses em cada uma delas, com acompanhamento de uma turma
de alfabetização das duas escolas. As escolas foram selecionadas a partir do trabalho sobre as
salas de apoio pedagógico da mestre em educação Solange Rosskamp, intitulado “Sala de
Apoio Pedagógico: o coração da escola”. Algumas das professoras entrevistadas para este
trabalho colocaram-se a disposição para continuar os estudos, e por esta razão foram
selecionadas.
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As Salas de Apoio Pedagógico do município de Joinville são referenciadas pelo


Regimento Único da Secretaria de Educação de Joinville e pela Portaria Municipal n° 111-
GAB-2009, que declaram a SAP “[...] destinada aos alunos de 2º ao 5º ano que apresentam
dificuldades acentuadas de aprendizagem” (SECRETARIA DE EDUCAÇÃO, 2009, p. 1).
Ao longo do período de observação, foram realizadas entrevistas com as professoras
da SAP, entendendo que a entrevista pode esclarecer pontos que ficaram em aberto durante a
observação.
Os dados analisados por meio de análise de conteúdos, proposta por Bardin (1977,
p.42), para quem o procedimento é “um conjunto de técnicas de análise das comunicações
visando obter, por procedimentos sistemáticos e objetivos, de descrição do conteúdo das
mensagens, indicadores”.

Análise dos Dados

Conhecer o ambiente de uma sala de apoio pedagógico nos leva a uma primeira
surpresa: neste espaço, não há a tradicional disposição das carteiras. Na escola A, existem
duas fileiras com cinco cadeiras, de frente uma para a outra. Na escola B, são duas mesas
redondas, com cinco lugares em cada uma delas. Nesta disposição de carteiras, os alunos
estão sempre próximos, acompanhando o que seu colega do lado e da frente está fazendo.
Notou-se em algumas situações, propostas pelas professoras, que os alunos utilizam desta
formação para em conjunto com seu colega, aprenderem. Com esta prática pedagógica, o
professor beneficia-se da mediação entre as crianças para a aprendizagem, pois conforme
Rego (2009, p.42) baseada em Vygotsky, a “mediação são os instrumentos técnicos e os
sistemas de signos, construídos historicamente, que fazem a mediação dos seres humanos
entre si e deles com o mundo”.
Esse trabalho, neste espaço, é possível de ser desenvolvido, pois de alguma forma ali
se rompe com os padrões do chamado ensino tradicional. Conforme citam Behrens (2011),
Zabala (1998) e Rockwell e Mercado (1999), o modelo tradicional de escola está assentado
numa transmissão de conteúdos que necessita ser ministrada aos alunos, uma espécie de
“carga” que leva os professores das salas regulares a concentrar-se no conteúdo, e não na
aprendizagem individual de seus alunos. Este fato leva o professor a criar um “padrão” de
aluno, um aluno “médio”, que possa ser atendido por sua demanda de conteúdos. Com isto, os
alunos que estão abaixo deste “médio” não são inseridos no processo de escolarização.
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Na sala de apoio pedagógico, entretanto, nota-se que não há esta demanda por
conteúdos curriculares, de forma que as professoras podem concentrar-se nos desafios
apresentados por cada aluno. Percebemos este elemento em várias situações, em especial nas
falas da professora da escola A: “- Calma, tô chegando. Calma, calma, calma. Lembra que
aqui é tudo bem devagar, bemmmm devagar” (ênfase no bem). Em outra situação: “- Agora,
no caderno, vamos escrever Joinville. Vamos fazer bem devagar. JO-IN-VI- LLE. Não tenho
pressa”. Com este processo, podemos perceber a ênfase no tempo, mas um tempo que mostra
ser diferenciado, que respeita o processo individual que cada aluno apresenta, sem que seja
necessário, para isso, uma prática formatada para cada aluno. Como afirma André (1999,
p.12) “procura-se substituir o ensino individualizado, em que cada aluno desenvolve
isoladamente suas tarefas, por uma diferenciação no interior de situações didáticas abertas e
variadas, confrontando cada aluno com aquilo que é obstáculo para ele na construção de
saberes”.
Uma das funções da escola hoje é trabalhar com o sujeito de forma integral,
contemplando fatores cognitivos, afetivos, emocionais e motores. Libâneo (2012, p.43) cita o
desenvolvimento cognitivo, afetivo e moral dos indivíduos e afirma que “uma atividade
pedagógica somente é pedagógica se ela mobiliza as ações mentais dos sujeitos, visando a
ampliação de suas capacidades cognitivas e à formação de sua personalidade global”. O
modelo tradicional de escola tem favorecido, todavia, que o sujeito seja visto somente pelo
seu aspecto cognitivo, ignorando sua totalidade, enquanto ser complexo e multideterminado.
O trabalho docente, na sala regular, geralmente é marcado pela tensão da necessidade
que do aprendizado do aluno. Cabe ao professor verificar o “nível” em que o sujeito se
encontra, o estágio por ele alcançado, de forma a afirmar se o sujeito está ou não apto a
avançar no conteúdo ou, nos casos extremos, de série/ano. Este motivo tem levado o docente
a focar sua atenção no erro, porém de uma forma negativa. O erro não é visto como parte do
processo de aprender, condição na qual o sujeito se encontra e a partir da qual pode se
transformar.
No caso da sala de apoio pedagógico da escola A, notou-se uma prática pedagógica
inversa a esta lógica da sala regular. Nela, a professora utiliza o erro como estímulo ao aluno,
fazendo-o perceber onde errou para posteriormente alcançar o aprendizado e desenvolvimento
neste quesito. Esta forma de ver o erro permite trabalhar com o conceito de Zona de
Desenvolvimento Proximal, que como explica Vygotsky (2007, p.97) “é a distancia entre o
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nível de desenvolvimento real, que se costuma determinar através da solução independente de


problemas, e o nível de desenvolvimento potencial, determinado através da solução de
problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais
capazes.”
Podemos ilustrar esta prática por exemplo na forma como a professora lida com o uso
da borracha durante a aula. Segundo a própria professora fala aos alunos: “ - Não vamos
apagar. Assim, você sabem onde erraram, vocês estão vendo, vão lembrar e não vão mais
errar”; ou ainda: “ - Pro (fessora), tem borracha?” pergunta um aluno. E a professora
responde: “ - Não, não temos borracha aqui! Faz um risquinho na palavra e escreve do lado
para ver o que está errado”. Lidar desta forma com o erro permite a professora e aos próprios
alunos utilizarem o erro como condição para aprendizagem, também aproximando do que os
alunos já conhecem e já conseguem fazer com ou sem auxílio.

Considerações Finais

Adentrar na sala de apoio pedagógico é conhecer um lado que a Escola procura


esconder. É conhecer o lado marginal (MARTINS, 2003) do sistema escolar, aquele que
inclui após excluir, após culpabilizar o aluno por não se adequar ao processo de escolarização.
Contudo, ao investigar as práticas pedagógicas dos professores das salas de apoio pedagógico,
percebe-se uma contradição: é neste local marginal que as ações pedagógicas favorecem que o
estudante se percebe e seja percebido em sua totalidade.
Com a inversão das práticas “tradicionais” realizadas e conhecidas na sala regular, na
sala de apoio pedagógico, os pequenos acertos são acompanhados de palavras de incentivo,
como “muito bom”, e o erro é visto como alicerce para o aprendizado.
Ambas professoras pesquisadas utilizam materiais diversificados em aula, como massa
de modelar, jogos de ligue os pontos, revistas para recortes, vídeos, computadores. Esta
diversidade de recursos amplia possibilidades de aprendizado dos alunos, e muitas vezes o
aproxima do contexto que estes vivenciam fora do ambiente escolar. Suas intervenções são
marcadas pela busca do desenvolvimento total do aluno, priorizando um sujeito cognitivo,
afetivo, emocional e motor.
Realizar pesquisa etnográfica favoreceu melhor compreensão das atividades que são
realizadas no contexto escolar. Também é necessário levar em conta os locais e períodos da
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observação, de fato que pesquisas realizadas em outros tempo e espaço podem apresentar
resultados diferentes dos apresentados nesta pesquisa.

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