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PESQUISA EM EDUCAÇÃO

CAPÍTULO 2 – COMO COLETAR E


ANALISAR OS DADOS DE UMA
PESQUISA EM EDUCAÇÃO?
Ana Claudia de Oliveira G. Merli

INICIAR

Introdução
A realização de uma pesquisa é um trabalho árduo que requer do pesquisador
organização e algum conhecimento do objeto a ser pesquisado. Nesse sentido, é
muito importante separar um tempo para se planejar a pesquisa, ou seja, dedicar-
se na elaboração de um projeto de pesquisa. Depois dessa etapa, ocorre a revisão
do projeto e a fundamentação teórica. Então, o pesquisador parte para a coleta de
dados, que pode ser em campo ou biográfica.
Sendo assim, neste capítulo, iremos estudar quanto a coleta e análise de dados
reunidos a partir de procedimentos metodológicos específicos, como o
questionário e a entrevista. Também serão considerados pontos importantes a
respeito de questões éticas e do papel do pesquisador, que tem contato direto
com os sujeitos da pesquisa. Dessa forma, procuraremos responder aos seguintes
questionamentos: quais são as principais pesquisas utilizadas para investigar o
cotidiano escolar? Em que consistem os procedimentos metodológicos dessas
pesquisas? Como organizar a coleta de dados que envolvem os sujeitos que
participam do cotidiano escolar? Qual é o papel do pesquisador no que se refere
aos sujeitos da pesquisa? Como organizar a pesquisa em educação documental?
O cotidiano escolar é um ambiente rico que requer pesquisas atentas e rigorosas
para o levantamento de problemas, discussão e apontamento de possíveis
soluções que envolvem o processo de ensino e aprendizagem, docentes,
estudantes e equipe pedagógica. Isto é, toda a comunidade escolar está envolvida
nesse cenário. Além disso, o Brasil é um país de grandes diversidades regionais,
portanto, são necessários os contextos cultural, histórico e social ao apontar
questões educacionais e refletir sobre elas.
Vamos aos estudos!

1.1 Aprofundando os conhecimentos


nas pesquisas em educação
Grande parte das pesquisas desenvolvidas em educação têm caráter qualitativo,
ou seja, envolvem dados não necessariamente expressos de forma numérica, que
buscam compreender o processo a que se referem e considerar o entorno da
problemática. Nesse sentido, muitas questões relacionadas ao cotidiano escolar
são pesquisadas, considerando-se técnicas e métodos que possibilitam uma
análise qualitativa.
A partir de agora, iremos conhecer alguns tipos de pesquisas educacionais,
procedimentos metodológicos e questões éticas.  

1.1.1 As principais pesquisas


Ao tratar de pesquisa, pode-se ter a imagem de experimentos sofisticados que
requerem equipamentos modernos e procedimentos complexos. De fato, esse tipo
de pesquisa existe, e, em geral, é realizada em institutos e universidades; contudo,
também são consideradas pesquisas de caráter científico, como artigos, trabalhos
de conclusão de curso, relatórios e relatos de experiências, desenvolvidos em nível
acadêmico por estudantes de graduação, acompanhados por professores que os
orientam na pesquisa. Muitos desses trabalhos são elaborados em disciplinas de
cursos de graduação, projetos de iniciação científica, pesquisa, ensino e extensão.
Nesse contexto, as ciências humanas, em especial a educação, desenvolvem
pesquisas sob diversas abordagens metodológicas. Muitas pesquisas em
educação buscam uma abordagem qualitativa pela possibilidade de observação,
participação e intervenção do pesquisador para discutir questões próximas da
prática docente cotidiana, envolvendo seres humanos, uma vez que se trata da
natureza e da especificidade do campo educacional. Segundo Saviani (2013, p.
11), “Sabe-se que a educação é um fenômeno próprio dos seres humanos. Assim
sendo, a compreensão da natureza da educação passa pela compreensão da
natureza humana”.
Considerar o cotidiano escolar permite pesquisarmos problemáticas específicas
das disciplinas escolares, como metodologias de ensino, avaliação e processo de
ensino e aprendizagem. Entretanto, ressalta-se que a educação vai muito além do
ensino. A compreensão do processo escolar envolve questões contextuais na
delimitação dos objetos de pesquisa, como aspectos sociais, políticos e culturais.
Além disso, envolve reflexões sobre gestão, políticas públicas, formação de
professores, tecnologias, constituição da educação básica e superior, bem como
metodologias de pesquisa que permitam analisar as especificidades desse campo
de pesquisa.
Sendo assim, os tipos de pesquisas são aquelas em que o pesquisador pode estar
presente no ambiente e em contato com sujeitos; ter contato com documentos e
imagens; ter registros reais que podem estar ou não sob seu controle; propor
intervenção e interação com os sujeitos; levantar dados de bancos virtuais ou
físicos; entre outras possibilidades. Dessa forma, pesquisas do tipo participante,
etnográfica, estudo de caso, documental e bibliográfica são bastante recorrentes.
Elas empregam como técnicas a entrevista, os questionários, a observação e,
principalmente, a participação. A seguir, serão discutidos alguns métodos e
técnicas empregados nesses tipos de pesquisa. 

1.1.2 Os principais procedimentos metodológicos


Primeiramente, é necessário sabermos diferenciar alguns termos empregados no
decorrer das pesquisas científicas, a exemplo de “método” e “procedimentos
metodológicos”.
O método se relaciona a maneira com que certo tipo de conhecimento — nesse
caso, o científico — é construído. De acordo com Lakatos e Marconi (2003, p. 83),
“[...] o método é o conjunto das atividades sistemáticas e racionais que, com maior
segurança e economia, permite alcançar o objetivo — conhecimentos válidos e
verdadeiros, traçando o caminho a ser seguido, detectando erros e auxiliando as
decisões do cientista”. Portanto, o método é o caminho, ou seja, o planejamento
traçado para alcançar determinado fim. Gatti (1999) ressalta que o método é algo
vivo, concreto e necessário para a construção do conhecimento.
Os procedimentos metodológicos ou procedimentos de pesquisas, por sua vez,
relacionam-se aos passos dados durante o caminho. As técnicas utilizadas para
coleta, organização, classificação e análise de dados devem estar em concordância
com a teoria, com o caminho e com o encaminhamento selecionados para
direcionar a pesquisa. Nesse contexto, Gatti (1999, p. 72) nos explica que “O
método nasce do embate de ideias, perspectivas e teorias com a prática. Ele não é
somente um conjunto de regras que ditam um caminho. É também um conjunto
de crenças, valores e atitudes”.

VOCÊ O CONHECE?
Bernadete Gatti é uma pesquisadora, reconhecida por seus trabalhos em metodologia da pesquisa em
educação, como o livro “A Construção da Pesquisa em Educação”. Ela publicou e participou de livros e
artigos que esclarecem quanto a especificidade do campo educacional, retomando a história da
pesquisa em educação no Brasil. A autora apresenta contrapontos a respeito das metodologias e
técnicas empregadas nas pesquisas educacionais brasileiras.

Para selecionar o melhor procedimento, é preciso relacionar os objetivos e o


embasamento teórico. A classificação de uma pesquisa não é apenas a
organização didática da disciplina de metodologia da pesquisa, uma vez que serve
para auxiliar nos procedimentos, segundo a abordagem da análise, as fontes de
pesquisa, os procedimentos e as técnicas.
Quanto a abordagem, as pesquisas podem ser quantitativas ou qualitativas, o que
designa um conjunto de metodologias e referências epistemológicas.
Já no que diz respeito aos objetivos, de acordo com Severino (2016), as pesquisas
podem ser: 
Etnográficas: buscam compreender os processos cotidianos;
Participante: o pesquisador participa da vivência dos sujeitos e de suas
atividades;
Pesquisa-ação: propõe uma intervenção em dada situação;
Estudo de caso: um caso particular que é representativo de certo
fenômeno ou situação; 
Análise de conteúdo: analisa informações em forma de discurso a partir
da linguagem empregada.

VOCÊ QUER LER?


Para compreender mais profundamente a respeito dos métodos e procedimentos metodológicos nas
pesquisas em educação, vale a pena tirar um tempo para ler o artigo “Algumas considerações sobre
procedimentos metodológicos nas pesquisas educacionais”, de Bernadete Gatti. O documento está
disponível em: <http://www.redalyc.org/pdf/715/71511277007.pdf
(http://www.redalyc.org/pdf/715/71511277007.pdf)>.

Para ilustrar os procedimentos metodológicos, vamos imaginar uma pesquisa que


tem como objetivo investigar os procedimentos de formação de leitores. O
pesquisador, com esse objetivo, busca no cotidiano escolar as práticas de
professores do sexto ano do Ensino Fundamental que podem ser estimuladores ou
desestimuladores na formação de leitores. Como embasamento teórico-
metodológico, tem-se a fenomenologia, que permite a apreensão da essência das
coisas e de como elas são percebidas pelos sujeitos, a partir da consciência do
pesquisador. Em consonância, escolhe-se a abordagem qualitativa, pois a ideia é
descrever o processo, e não apenas focar no resultado. Assim, o pesquisador
recorre à pesquisa etnográfica, a fim de mergulhar efetivamente no cotidiano das
práticas de formação de leitores e registrar as ações e significados dados pelos
sujeitos que vivenciam essas práticas, o que caracteriza uma pesquisa de campo,
que adotará as entrevistas semiestruturadas e a observação para coleta de dados.
No exemplo dado, é possível compreendermos a proximidade entre os objetivos
da pesquisa, sua fundamentação teórico-metodológica e os procedimentos. É
válido ressaltar, no entanto, que as pesquisas em educação requerem cuidado na
adoção dos procedimentos e clareza na hora de descrevê-los, pois se tratam, em
grande parte, de pesquisas que envolvem seres humanos. A seguir, iremos analisar
alguns aspectos significativos sobre a ética nas pesquisas educacionais.

1.1.3 Principais considerações éticas


Desde os anos de 1960, o campo das pesquisas em educação no Brasil vem
sofrendo modificações. Além do aumento quantitativo e das temáticas, a
perspectiva metodológica também está mudando. Inicialmente, as pesquisas se
espelhavam nas metodologias adotadas pelas ciências biológicas, mas, com o
passar do tempo e o crescimento dos estudos a respeito da especificidade e da
interdisciplinaridade do campo educacional, novas perspectivas foram sendo
desenvolvidas (ANDRÉ, 2001). 

Figura 1 - A ética, quando relacionada à pesquisa científica, trata-se da postura do pesquisador em


relação aos participantes. Fonte: garagestock, Shutterstock, 2018.
Os novos rumos da pesquisa em educação discutidos por André (2001) nos
mostram que houveram modificações na forma de ver a educação, ou seja,
aspectos contextuais, sociais, políticos e culturais necessitam ser considerados
para a compreensão desse campo de pesquisa. Outro fator de impacto se refere
aos sujeitos, isto é, todos que estão envolvidos no processo educacional:
estudantes e suas famílias, professores, funcionários e gestores. Ao considerarmos
esses atores, outras questões são postas, como a postura do pesquisador e os
aspectos éticos quanto a identidade dos participantes da pesquisa. A seleção dos
sujeitos, o tipo de pesquisa a ser desenvolvida e a técnica mais adequada para a
coleta de dados requerem do pesquisador habilidades complexas. Questões como
preservar a identidade dos sujeitos e da instituição escolar, o grau de influência do
pesquisador no meio, como relatar e selecionar os dados e como organizar as
anotações e observações devem ser analisadas com parcimônia.
Toda vez que há o envolvimento de seres humanos, é necessária a submissão do
projeto à comitês de ética em pesquisa com seres humanos. Esses comitês são
formados por profissionais de diversas áreas e se concentram em instituições de
Ensino Superior, espalhadas pelo país — o que não significa que são analisados
apenas trabalhos dos alunos da própria instituição. Os projetos e seus
proponentes devem ser cadastrados na Plataforma Brasil para apreciação da
comissão.
Um dos documentos utilizados em pesquisas que envolvem seres humanos é o
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Nele, é apresentado brevemente ao
participante do que se trata a pesquisa e que se ele concorda em participar, sendo
necessário assinar o documento que indica o consentimento. Além disso, toda vez
que envolver coleta de imagem ou som, é necessário informar ao participante e
pedir sua autorização para divulgação de imagem. Contudo, é válido ressaltar que
o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990),
protege toda criança e adolescente de exposição de imagem.

VOCÊ SABIA?
O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido é um documento formulado pelo pesquisador, em
que ele esclarece para quem vai participar da pesquisa, do que se trata e qual é o papel do sujeito
na pesquisa. Ter esse documento anexado no relatório de pesquisa não garante que o
pesquisador está agindo com ética, por isso, é imprescindível submeter o projeto ao Comitê de
Ética em Pesquisa.

Dessa forma, é necessário que o pesquisador planeje com antecedência suas


ações ao envolver os sujeitos do processo educacional em suas pesquisas, haja
vista os aspectos éticos e técnicos.
Agora que já entendemos o que são métodos e técnicas de pesquisa, no tópico a
seguir iremos explorar alguns tipos de pesquisas muito utilizados no campo
educacional. 

1.2 Métodos e técnicas de pesquisa


O cotidiano escolar traz diversas possibilidades de investigação de temáticas que
envolvem os sujeitos do processo educativo, como estudantes e professores.
Nesse caso, cabe ressaltar que, independentemente dos procedimentos
metodológicos selecionados pelo pesquisador, é muito importante a comunicação
com os responsáveis por estudantes menores, bem como a assinatura do Termo
de Consentimento Livre e Esclarecido para a realização de coleta de dados com
esses sujeitos.
Na sequência, serão apresentados características e procedimentos a respeito do
método etnográfico e da técnica de observação, bem como o papel do
pesquisador. 

1.2.1 Método etnográfico


A pesquisa do tipo etnográfica tem origem na Antropologia e foi utilizada para
estudar a cultura e a sociedade. Bogdan e Bicklen (1982) caracterizam a pesquisa
etnográfica como aquela que se preocupa com a descrição do processo, tendo
foco no significado atribuído pelos sujeitos da pesquisa ao fenômeno investigado.
Os autores ainda ressaltam que é muito importante o contado direto do
pesquisador com os sujeitos e o ambiente pesquisado, não havendo hipóteses
anteriores.
André (1995), por sua vez, elenca algumas caraterísticas principais da pesquisa
etnográfica em educação:

preocupa-se com o processo educativo, enquanto que a Antropologia


fica com a cultura;
observação participante, entrevista intensiva e análise de documentos;
o pesquisador tem papel de destaque, sendo instrumento de coleta e
análise de dados, uma vez que está em contato direto e prolongado com
os sujeitos e com o ambiente, sem interferir nestes;
ênfase no processo, buscando descrevê-lo, bem como tudo que foi
vivenciado e observado pelo pesquisador;
preocupa-se com o significado atribuído aos sujeitos pesquisados;
visa à formulação de novos conceitos, relações e formas de
entendimento da realidade, por isso é flexível quanto a hipóteses e
instrumentos. 

Figura 2 - Uma das técnicas utilizadas na pesquisa etnográfica é a observação dos sujeitos em seu
ambiente natural. Fonte: Monkey Business Images, Shutterstock, 2018.
Na pesquisa etnográfica, parte-se do pressuposto de que o comportamento
humano é influenciado pelo contexto, e que o pesquisador deve estar próximo
para compreender os significados e interpretar o que é possível de ser observado
nos sujeitos envolvidos.
Outra técnica utilizada em ambientes educacionais para coleta de dados é a
observação, sobre a qual veremos com mais detalhes a seguir.

1.2.2 Técnica de observação


Para que o pesquisador tenha conhecimento do seu objeto de pesquisa, é
necessário que o conheça exaustivamente, em suas particularidades. No passado,
para que a pesquisa fosse científica, a relação entre pesquisador e objeto
necessitava de distanciamento, pois se imaginava que o distanciamento e a
neutralidade do pesquisador em relação ao objeto traziam fidedignidade ao
conhecimento científico (ANDRÉ, 2006). Com o passar do tempo e a ampliação de
entendimento sobre os campos de pesquisa, principalmente os das ciências
sociais, entendeu-se que toda realidade é vista a partir dos olhos de alguém,
portanto, ainda que o pesquisador esteja distante de seu objeto, isso não garante
que ele não tenha suas próprias leituras a respeito do fenômeno. A partir dessa
mudança paradigmática, as técnicas que permitem contato do pesquisador com o
objeto, o fenômeno ou os sujeitos pesquisados ganharam maior visibilidade. A
partir desse contexto, a observação ganhou espaço enquanto técnica de pesquisa
e investigação de metodologia científica.
A observação consiste no contato do pesquisador com o objeto, de forma a
registrar as reações dos sujeitos tanto em ambiente natural ou controlado:

Para que se torne um instrumento válido e fidedigno de investigação científica, a


observação precisa ser, antes de tudo, controlada e sistemática. Isto implica a
existência de um planejamento cuidadoso do trabalho e uma preparação rigorosa
do trabalho do observador. Planejar a observação significa determinar com
antecedência “o quê” e “como” observar. (LUDKE; ANDRÉ, 2012, p. 25).

Podemos dizer que observar é natural do ser humano, mas, quando se trata de
uma pesquisa, são necessários alguns cuidados prévios, como a escolha dos
sujeitos, quais situações serão observadas, como observar, como organizar os
dados observados, como classificá-los e analisá-los. A presença do pesquisador
pode ter a intensão de interferir ou não no ambiente, entretanto, cabe ressaltar
que a presença de um sujeito estranho ao ambiente, por si só, já altera os
comportamentos alheios.
Um cuidado necessário também é como serão registradas as observações. Elas
podem ser feitas através de anotações do pesquisador e registros de áudio ou
vídeo. A partir desses registros, é preciso, ainda, saber como será feita a análise,
quais parâmetros adotar, como demonstrar as observações no relatório de
pesquisa e como proteger a identidade dos sujeitos envolvidos, quando for o caso.
Todos esses aspectos precisam ser previamente planejados para que o
pesquisador possa utilizar da forma mais proveitosa possível a técnica e realizar
suas análises com rigor metodológico. 

Figura 3 - Observar é uma técnica que exige clareza de objetivos e atenção para apreender a realidade e os
significados produzidos pelos participantes. Fonte: ImageFlow, Shutterstock, 2018.
No caso da observação empregada em pesquisas educacionais, é possível coletar
informações quanto ao comportamento, conhecimento e experiência dos sujeitos
que integram o ambiente escolar, e como estes reagiriam a determinadas
situações propostas pelo pesquisador. Ludke e André (2012), nesse contexto,
indicam algumas vantagens do uso da observação:

permite apreender a perspectiva dos sujeitos, suas visões de mundo,


significados atribuídos e acompanhar experiências in loco;
possibilita descobrir novos aspectos do problema investigado;
propicia a coleta de informações em que a comunicação direta é
impossível.

Pesquisas envolvendo crianças, pessoas com deficiências múltiplas ou


intelectuais e sujeitos em ambientes controlados são algumas opções em que a
observação é uma das poucas possibilidades de contato.
Os registros das observações também requerem atenção, visto que são descrições
detalhadas, coletadas pelo pesquisador a partir do contato com os sujeitos em
ambiente natural. Dessa maneira, Ludke e André (2012) indicam a descrição dos
sujeitos, a reconstrução dos diálogos, a descrição dos locais, a descrição dos
eventos ocorridos, a descrição das atividades desenvolvidas e a descrição dos
comportamentos do pesquisador.
Assim, podemos perceber que não há uma receita pronta de como devem ser
organizadas as reflexões, uma vez que isso depende do tipo e dos objetivos da
pesquisa. Ludke e André (2012) sugerem alguns tipos, como analíticas,
metodológicas, dilemas éticos e conflitos, mudanças na perspectiva do
observador, esclarecimentos, entre outras. Contudo, os autores também apontam
alguns problemas dessa técnica, como o fato de que a presença do pesquisador
pode alterar comportamentos ou ambientes e a margem para a interpretação
pessoal do pesquisador, que pode ser distorcida em relação à realidade. Dessa
maneira, para garantir a parcialidade ou uma visão mais próxima da realidade, o
pesquisador pode confrontar os fatos com as suas expectativas ou suas primeiras
ideias a respeito do fenômeno. O grau de envolvimento do participante vai
depender dos objetivos da pesquisa.
Ainda de acordo com Ludke e André (2012), o pesquisador pode ser um
observador total, um observador como participante, um participante como
observador ou um participante total. Vamos entender melhor quanto ao papel do
pesquisador com o item a seguir.

1.2.3 Papel do pesquisador


O pesquisador exerce um papel muito importante na pesquisa. Antigamente, ele
era visto como um elemento “fora” da pesquisa, mas, hoje, é um elemento que
integra a pesquisa e, no caso de pesquisas qualitativas, exerce papel de
instrumento de coleta e análise de dados não-neutro, ou seja, a visão do
pesquisador acerca do fenômeno é essencial para a composição da pesquisa.
Há tempos é bastante discutido o papel do pesquisador frente a relação do rigor
metodológico e da pertinência das análises frente a realidade educacional
brasileira (GATTI, 1999). Nesse aspecto, e, principalmente, quanto a abordagem
qualitativa da pesquisa educacional, é necessário considerar que o caráter
científico implica na busca profunda da solução de um problema de pesquisa.
Dessa forma, é necessário mergulhar no universo do objeto pesquisado para se
sair da superficialidade e buscar compreender a radicalidade.
Outra questão é quanto à metodologia, visto que alguns adotam uma postura que
remete com rigidez a aspectos da neutralidade científica, enquanto outros
buscam no ecletismo formas alternativas para a construção do conhecimento
científico. Segundo Noronha (2010, p. 156),

[...] ao combater o cientificismo também combate a própria deia de pesquisa


científica. Deve-se então, evitar o regresso, as posturas anticientíficas,
“espontaneístas” ou populistas. Uma adequada compressão do saber popular não
deve alimentar as posições antiteóricas e anti-intelectuais.

Ressalta-se, ainda, que é essencial não perder o caráter científico e, ao mesmo


tempo, não exagerar neste a ponto de se perder a análise educacional do
fenômeno. Diante das desigualdades nacionais e das dificuldades enfrentadas,
tanto pela pesquisa quanto pela educação brasileira nos últimos anos, é mais
premente que as pesquisas indiquem com seriedade os problemas, reflitam sobre
as soluções e indiquem caminhos possíveis.
O papel do pesquisador é, portanto, o de planejar, fundamentar, conhecer
profundamente o objeto pesquisado e os objetivos da pesquisa, manter o rigor
metodológico na coleta, na organização, na classificação e na análise de dados,
escrever o relatório de pesquisa de maneira clara e consistente, bem como
divulgar os resultados e reflexões.
No que diz respeito a entrevista e observação, cabe ao pesquisador planejar a
coleta de informações e o contato com os sujeitos da pesquisa, buscar uma
posição que seja favorável com os objetivos e com o rigor do conhecimento
científico, submeter o projeto ao Comitê de Ética de Pesquisa e preservar as
identidades dos locais e sujeitos envolvidos. 

VOCÊ QUER VER?


O filme O Óleo de Lorenzo, de George Miller, é um drama a respeito da deficiência, que se entrelaça com
questões relacionadas à ética na ciência e postura do pesquisador diante dos desafios da busca pelo
conhecimento e pela cura de um filho. Vale a pena assistir ao longa e analisar o caso apresentado!

O posicionamento ético implica, também, na escolha dos sujeitos e do local da


pesquisa, assim como na ponderação quanto ao contato do pesquisador com
esses sujeitos. Além disso, as pesquisas, para que sejam científicas, necessitam de
detalhamento quanto aos procedimentos adotados, seguindo procedimentos
metodológicos consistentes.

1.3 Técnicas de pesquisa


A pesquisa em educação conta com diversos tipos de procedimentos
metodológicos. Ao realizar uma pesquisa, é importante saber como serão
coletados os dados que irão compor a análise da pesquisa. Contudo, ressalta-se
que nem todas as pesquisas científicas necessitam ter contato direto com os
sujeitos pesquisados, afinal, muitas têm o objetivo de analisar documentos;
outras contam com instrumentos tecnológicos, como formulários on-line para
coletar informações; e há, ainda, as que contam com imagens, filmografia e
músicas. Diante desse leque de opções, veremos algumas técnicas para coleta de
dados e informações a partir de agora.

1.3.1 Questionário
O questionário é bastante utilizado nas pesquisas, pois permite abordar os
sujeitos de forma direta e indireta, dimensionando a organização dos dados e
como será feita a análise. Por exemplo, caso a abordagem seja quantitativa, as
perguntas podem ser feitas de modo que o resultado seja dimensionado
quantitativamente. Dependendo do tamanho da amostra a ser pesquisada, é
possível, também, fazer questões objetivas e dissertativas ou apenas
dissertativas. 

Figura 4 - O questionário deve conter perguntas concomitantes ao tipo de análise que será adotado na
pesquisa. Fonte: JNT Visual, Shutterstock, 2018.
O questionário se caracteriza por ser um conjunto de perguntas direcionadas aos
sujeitos da pesquisa, as quais devem ser coerentes com os objetivos delimitados
pelo pesquisador. É importante, após a elaboração das questões, submetê-las a
um pré-teste, isto é, aplicar o questionário a um pequeno grupo para avaliar se
elas são inteligíveis, atendem as intenções do pesquisador e se não induzem os
sujeitos a respostas pré-estabelecidas (SEVERINO, 2016).
Nas pesquisas sobre cotidiano escolar, por exemplo, podem ser aplicados
questionários de acordo com os objetivos pretendidos. Caso a pesquisa tenha
caráter qualitativo, é possível avaliar o processo de ensino de determinada
disciplina por meio de pesquisas em que os sujeitos atribuam notas ou conceitos
aos aspectos pesquisados. É possível, também, questionar os professores a
respeito da escolha do material didático em escolas públicas por meio de
questionários com perguntas abertas, que requerem respostas dissertativas; com
perguntas fechadas, com respostas objetivas; ou ambas. Dessa forma, é
importante que, ao elaborar o questionário, o pesquisador pense na forma de
organizar e classificar os dados e informações.
Os questionários podem ser aplicados pelo próprio pesquisador, por outro
colaborador da pesquisa ou ser enviado por meios eletrônicos, como e-mail.
Outra técnica que permite a abordagem direta com os participantes é a entrevista.
Nela, é possível fazer perguntas diretamente e ter contato próximo com o
entrevistado. O questionário e a entrevista guardam algumas semelhanças, mas a
grande diferença é que, na entrevista, o participante tem a oportunidade de se
expressar e esclarecer suas respostas, pois o contato é direto. A seguir,
conheceremos melhor quanto aos procedimentos envolvidos na técnica de
entrevista. 

1.3.2 Entrevistas
Entrevistas são práticas comuns na sociedade atual. Muitos espectadores ficam
ansiosos para verem seus ídolos sendo entrevistados, revelando como vivem, o
que pensam e do que gostam. Isso porque essa técnica de pesquisa científica é
utilizada para coleta de dados, que serão analisados para refletir um determinado
problema de pesquisa, confirmar ou refutar hipóteses, relatar práticas,
acontecimentos, eventos ou significados quanto a um determinado fenômeno. Em
educação, essa técnica é bastante empregada sozinha ou combinada a outras, a
fim de coletar dados que serão escritos, organizados e analisados por um
pesquisador.
A entrevista permite ao pesquisador contato direto com um sujeito ou um grupo,
de forma que as informações possam ser esclarecidas no momento da coleta.
Além disso, outras questões sobre o tema pesquisado podem ser apresentadas
pelos entrevistados, ou seja, “[...] correções, esclarecimentos e adaptações que a
tornam sobremaneira eficaz na obtenção das informações desejadas” (LUDKE;
ANDRÉ, 2012, p. 34).
No entanto, como qualquer outra técnica, são necessários alguns cuidados éticos
para a realização de entrevista, sendo eles:

respeito a cultura e aos valores do entrevistado; 


marcar horário e locais próprios para a realização da entrevista, de modo
que o entrevistado se sinta confortável e a vontade; 
respeito aos horários marcados; 
cuidado com o vocabulário empregado para que o entrevistado não se
sinta constrangido e que seja compreensível; 
não induzir respostas ou distorcê-las posteriormente; 
estimular um clima de confiança e cumplicidade; 
estar sempre atento ao que é dito pelo entrevistado. 

É válido dizer que podem ser usadas formas diferentes de registro de uma
entrevista, como filmagem, áudio ou anotações; contudo, seja qual for a forma, é
essencial que sejam tomadas todas as providências éticas, como submissão ao
comitê, pedidos de permissão — principalmente em se tratando de sujeitos
menores — e esclarecimentos aos entrevistados quanto aos objetivos da
pesquisa. 
Figura 5 - As perguntas de uma entrevista podem estar prontas antecipadamente, sendo o único fio
condutor da conversa. Fonte: Iakov Filimonov, Shutterstock, 2018.

Duarte (2004) nos esclarece que, ao adotarmos a técnica de entrevista, é


necessário que todo o trabalho esteja integrado teórica e metodologicamente.
Essa técnica é bastante empregada em pesquisas qualitativas e, em especial, nas
pesquisas educacionais, possibilitando o contato direto do pesquisador com os
significados produzidos pelos sujeitos que participam do processo educativo.
Também é possível integrar pesquisas quantitativas, combinadas a outras técnicas
ou tipos de pesquisas, como a bibliográfica, a documental e o questionário. 

VOCÊ SABIA?
Uma forma de combinar técnicas é associar dados quantitativos e qualitativos. Contudo, o
pesquisador não precisa produzir os dados quantitativos necessariamente, podendo recorrer a
banco de dados disponíveis, como o Censo Escolar, disponível no site do Inep. O Censo faz um
levantamento estatístico dos dados da educação básica, como número de matrículas. Para
conhecer mais sobre isso, acesse o link: <http://portal.inep.gov.br/web/guest/censo-escolar
(http://portal.inep.gov.br/web/guest/censo-escolar)>.  

Mesmo com as mudanças nos paradigmas das pesquisas em ciências humanas,


há, ainda, alguns pontos a serem considerados quanto ao emprego da entrevista,
devido as críticas que essa técnica tem sofrido ao longo do tempo. Duarte (2004, p.
214) explica que “[...] é um procedimento de coleta de informações pouco
confiável e excessivamente subjetivo, pelo qual optam pesquisadores com
pequena bagagem teórica, que dele fazem uso de forma bem menos rigorosa do
que seria desejável”.
Reconhecendo a relevância das entrevistas para as pesquisas educacionais, a
autora indica que, para combater as críticas, é necessário um rigoroso tratamento
metodológico, um planejamento adequado e a escolha certa dos sujeitos e do
procedimento. Além disso, ainda de acordo com Duarte (2004), alguns pontos
devem ser considerados para a realização de uma boa entrevista:

definição clara dos objetivos da pesquisa; 


conhecimento profundo quanto ao contexto da investigação;
domínio do roteiro da entrevista;
segurança e autoconfiança do pesquisador;
ambiente de confiança e informalidade. 

Quanto à organização da entrevista, pode-se elaborar um roteiro ou perguntas


específicas. Nesse sentido, as entrevistas podem ser estruturadas,
semiestruturadas ou livres, também chamadas de não diretivas. A escolha, então,
vai depender do universo dos sujeitos que serão selecionados, assim como dos
objetivos da pesquisa.
Para além das técnicas de contato direto, há aquelas em que o pesquisador não
entra em contato com os participantes, pois não são uma fonte de dados. É o caso
da análise documental, por exemplo, que conheceremos na sequência.

1.3.3 Análise documental


A análise documental busca por informações em determinado tempo e espaço,
que evidenciem fatos, comportamentos, significados, pensamentos e registros,
com a finalidade de descrever ou analisar. Por exemplo, uma pesquisa que tem
como objeto os processos de alfabetização da década de 1980, pode buscar por
materiais didáticos ainda não analisados por nenhuma outra pesquisa.
É importante entendermos, então, que “A característica da pesquisa documental é
que a fonte de coleta de dados está restrita a documentos, escritos ou não,
constituindo o que se denomina de fontes primárias” (LAKATOS; MARCONI, 2003,
p. 173). Documentos, nesse caso, são entendidos como jornais, comunicados,
revistas, legislação, cartas ou qualquer registro escrito, além de registros de
imagens, como fotografias, cartazes e figuras, desde que ainda não tenham sido
analisadas, ou seja, devem ser fontes primárias. Ludke e André (2012) indicam que
documentos podem ser fontes de informações estáveis, ricas e naturais, bem
como expressam um contexto. Além disso, documentos são fontes de baixo custo
e permitem coletar informações quando os sujeitos relacionados ao objeto de
pesquisa são inacessíveis.
Para efetuar a análise, os autores ainda elencam alguns aspectos referentes aos
procedimentos metodológicos, como considerar o tipo de documento, que pode
ser técnico, como leis e comunicados; pessoais, como cartas e fotografias;
instrucionais, como livros e roteiros; ou trabalhos escolares. Deve-se, também,
considerar que a escolha do documento não é isenta de intencionalidade, por isso,
o pesquisador deve deixar claro os critérios que o levaram a selecionar
determinado documento.
As metodologias utilizadas para a análise documental, em geral, levam em conta
os discursos verbais e não verbais presentes nos documentos. A partir daí, são
eleitas categorias de análise, de modo que o pesquisador possa relacionar os
dados coletados com o referencial teórico que embasa sua pesquisa. A pesquisa
documental, assim como a entrevista, pode ser associada a outras técnicas e
integrar o corpus de análise de pesquisas qualitativas.
Tanto análises documentais quanto bibliográficas contam com dados e
informações extraídos de documentos, a diferença, portanto, está em que a
pesquisa bibliográfica busca documentos que não são fontes primárias, ou seja,
que já passaram por um processo de análise, a exemplo de artigos, relatórios,
livros, periódicos e teses. A análise ou pesquisa documental, por outro lado, se
preocupa com documentos ainda não analisados, ou seja, fontes primárias.
A pesquisa bibliográfica pode ser um tipo de pesquisa própria ou integrar a revisão
de literatura de outro tipo de pesquisa. Para exemplificar, imagine que está sendo
desenvolvida uma pesquisa etnográfica a respeito da educação ambiental. Para
isso, o autor precisa fundamentar a pesquisa apresentando os principais conceitos
que a embasam, mostrar o que já foi pesquisado sobre o tema e quais são os
autores principais ou os mais utilizados para discutir a temática. Assim, ele deverá
recorrer a banco de dados, como periódicos qualisados, dissertações, teses e
livros. Essa coleta de informações, então, configura-se uma parte da pesquisa que
será realizada, entretanto, ela pode ser a pesquisa em si, desde que haja
aprofundamento e delimitação tempo-espacial no objeto. 

VOCÊ QUER LER?


As revistas qualisadas são periódicos analisados pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de
Nível Superior (CAPES), que recebem um qualis, ou seja, uma classificação quanto a relevância das
pesquisas publicadas. No site da CAPES, há a plataforma “Sucupira”, que apresenta os periódicos e suas
classificações. Para conhecer e se inteirar do assunto, acesse o link: <https://sucupira.capes.gov.br
(https://sucupira.capes.gov.br)>.

O planejamento da análise documental e da pesquisa bibliográfica devem incluir a


delimitação do tema e as fontes que serão consultadas. Por exemplo, a consulta
de recortes de jornais de 1984 a 1985, os quais noticiaram as medidas tomadas
pela Secretaria de Educação de dada cidade referente a abertura política
brasileira, pode ser a fonte de uma análise documental. Já as dissertações do
programa de pesquisa e pós-graduação em educação produzidas em dada
universidade, nos anos de 1985 a 1990, pode ser fonte para uma pesquisa
bibliográfica. 
Figura 6 - Documentos são todos os tipos de registros que podem ser objeto de pesquisa científica, como
cartas, livros, imagens, jornais e revistas. Fonte: Nomad_Soul, Shutterstock, 2018.

O recorte e a delimitação de tempo e espaço precisam ser justificados, ou seja, o


pesquisador precisa explicar porque vai pesquisar determinado intervalo de
tempo e quais são os motivos que o levaram ao bando de dados escolhido.
Vimos até aqui técnicas bastante usadas em pesquisas educacionais, mas elas não
são as únicas, sendo que há outras menos aplicadas, mas que atendem a objetivos
específicos, como é o caso da história de vida e a narrativa oral. Vamos conhecer
melhor essas técnicas na sequência. 
1.4 Outras técnicas de pesquisa 
Como vimos, algumas técnicas de pesquisa — questionário, entrevista e análise
documental — são bastante utilizadas em pesquisas educacionais de abordagem
qualitativa que pretendem conhecer aspectos do cotidiano, da história e das
práticas escolares. Entretanto, há outras técnicas que podem investigar essas
temáticas.
Não é exaustivo repetir que o campo de pesquisa educacional é vasto, complexo e
interdisciplinar, por isso, é importante termos o conhecimento de diversas
técnicas que possibilitem pesquisar os mais distintos recortes. Portanto, a partir
de agora, veremos outros tipos de pesquisa: a história de vida, a narrativa oral, o
estado da arte e do conhecimento, bem como a documentação. 

1.4.1 História de vida e história oral


Há personalidades dentro do campo educacional que trouxeram avanços e
mudanças significativas, como Paulo Freire, Anísio Teixeira e Maria Montessori.
Esses autores possuem suas teorias e pressupostos publicados, discutidos e
integrados nas práticas escolares no Brasil e em diversos países. Contudo, há
outros personagens menos conhecidos que trazem consigo importantes
contribuições para a educação, como memórias, narrativas e experiências que
merecem ser pesquisadas e registradas.
Para abarcar as narrativas como fontes de pesquisa, pode-se contar com a história
de vida e a oral. De acordo com Chizzotti (2011, p. 95), “A história de vida é um
instrumento de pesquisa que privilegia a coleta de informações contidas na vida
pessoal de um ou vários informantes. [...]. As formas novas valorizam a oralidade,
as vidas ocultas, o testemunho vivo de épocas ou períodos históricos”.
As histórias orais, ou narrativas orais, fazem parte da história da humanidade, que,
por muito tempo, teve seus registros históricos marcados por narrativas, passando
de geração em geração. Desse modo, como metodologia de pesquisa, a história de
vida tem origem nas pesquisas históricas. Então, outros campos do conhecimento
se apropriam de algumas técnicas e estratégias das pesquisas em história para
desenvolver estratégias para suas próprias áreas de estudo. É o caso da educação,
que emprega técnicas, fontes e metodologias nascidas originalmente na História,
a fim de utilizar a história de vida e a narrativa oral em seu campo investigativo. 
VOCÊ QUER VER?
O filme A Teoria de Tudo, de James Marsh, conta aspectos da vida pessoal de um dos mais brilhantes
cientistas, Stephen Hawking. O longa tem caráter biográfico e mostra a vida familiar e os dramas
vividos pelo cientista em vista de sua doença degenerativa, que, no entanto, não apagou o brilho de
suas ideias. O filme, então, traz a biografia de uma pessoa que tem sua vida, suas atitudes e sua história
dedicadas a ações que marcaram o campo de investigação.

Um ponto importante, tanto de crítica quanto de apoio, nesse tipo de pesquisa


são a memória e as lembranças dos sujeitos envolvidos. As críticas indicam que é
pouco confiável contar com a memória de um sujeito para se realizar uma
pesquisa científica, por outro lado, é justamente nas memórias que o pesquisador
se apega.
Para adotar essa metodologia de pesquisa, é necessário que os objetivos estejam
muito bem delineados, que os sujeitos participantes sejam confiáveis e que o
pesquisador seja capaz de trabalhar com uma grande quantidade de informações.
De modo geral, são realizadas entrevistas, as quais são gravadas ou filmadas, e,
depois, precisam ser organizadas, descritas e analisadas. O pesquisador pode
contar com outras fontes além das narrativas orais, como documentos e imagens,
que poderão auxiliá-lo na comprovação dos fatos.
Esse tipo de pesquisa ou técnica auxilia na compreensão de fatos ocorridos em um
determinado tempo ou evento, visto que o pesquisador seleciona alguém que
vivenciou e tem credibilidade para narrar fatos importantes. Outro objetivo é
relatar ações pioneiras ou de renomada importância que podem ser narradas
pelos próprios sujeitos ou por pessoas que vivenciaram a situação.
Outros estilos de pesquisas são de estado da arte e estado do conhecimento, as
quais conheceremos melhor a seguir.

1.4.2 Estado da arte e estado do conhecimento


Estado da arte e do conhecimento são tipos de pesquisas bibliográficas que têm
como fonte o que já foi produzido sobre determinado assunto. Quando a pesquisa
aborda um setor de publicações, por exemplo, é chamada de estado do
conhecimento. Já quando consegue organizar tudo o que foi produzido sobre
determinado assunto, chamamos de estado da arte, que “[...] tem o objetivo de
realizar levantamentos do que se conhece sobre um determinado assunto a partir
de pesquisas realizadas em determinada área” (ROMANOWSKI; ENS, 2006, p. 40).
A pesquisa bibliográfica, então, é aquela em que “[...] o pesquisador trabalha a
partir das contribuições dos autores dos estudos analíticos constantes dos textos”
(SEVERINO, 2016, p. 131). A pesquisa bibliográfica pode ter o objetivo de
apresentar o que já foi produzido a respeito de determinado tema. Para isso, é
imprescindível que o objeto e a fonte de pesquisa estejam bem delimitados e
justificados. Essa metodologia possibilita descrição e análise das produções
científicas. Pode-se acessar o banco de dissertações e teses de uma universidade
de reconhecida tradição em estudos de um dado campo do conhecimento, por
exemplo, a fim de delimitar um intervalo de tempo, que deve ter justificada
significância para se analisar os dados.

VOCÊ QUER LER?


A Revista Brasileira de Educação (RBE) é uma importante referência de publicação de artigos científicos
sobre educação e pode servir de fonte tanto para o estado do conhecimento quanto para o estado da
arte, em vista de sua importância para a área e por longa data publicando assuntos específicos da
educação. Acesse a edição atual em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_issuetoc&pid=1413-
247820180001&lng=pt&nrm=iso (http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_issuetoc&pid=1413-
247820180001&lng=pt&nrm=iso)>.

Atualmente, é muito difícil realizar uma pesquisa sobre um assunto que ainda não
foi abordado, por isso, em geral, tem-se publicado apenas estados do
conhecimento.
Outra forma de pesquisar a partir de registros é utilizando a documentação. Aliás,
a técnica em si pode auxiliar pesquisadores a organizarem o material que leem,
independentemente do tipo de pesquisa, pois documentar tem a ver com a
organização de registros. O tópico a seguir traz mais detalhes sobre o assunto.  

1.4.3 Documentação
Documentar tem um sentido comum e facilmente compreensível. Quando é
aplicada à pesquisa científica, refere-se a “[...] técnica de coleta, de organização e
conservação de documentos” (SEVERINO, 2016, p. 133). Vale lembrar, contudo,
que o documento, nesse contexto, é todo suporte que abriga informações, sejam
elas verbais ou não verbais. Trata-se, portanto, de livros, registros históricos,
revistas, fotografias, pinturas, projetos arquitetônicos etc.
Essa técnica pode ser utilizada para a organização de dados coletados em
pesquisas tanto quantitativas quanto qualitativas, ou combinada a outras
técnicas, como entrevistas, questionários, história de vida, entre outras. 

Figura 7 - A documentação é uma técnica para a organização das fontes e dos dados da pesquisa. Fonte:
ESB Professional, Shutterstock, 2018.

Há documentos e registros muito raros e antigos guardados em bibliotecas ou


institutos de pesquisa específicos que requerem autorização especial para serem
consultados. Nesse caso, o pesquisador precisa estar a par do trâmite dessas
autorizações, pois podem ser demoradas devido ao processo burocrático.
Portanto, quando o objetivo estiver relacionado a registros de acesso restrito, é
necessário planejamento antecipado por parte do pesquisador para que a etapa
de coleta de dados não atrase ou dificulte a finalização da análise. 

SO
squisa que se pretende investigar as normas relativas à educação publicadas no Brasil durante a Ditadura
64 a 1985), por exemplo, adota-se a pesquisa qualitativa, e para coleta de dados a entrevista e a
ção. Na análise, o pesquisador poderá organizar as normativas localizadas na Biblioteca Pública e
com as narrativas dos sujeitos entrevistados. A escolha desses sujeitos, por sua vez, pode considerar
que trabalhavam no período delimitado com educação básica na cidade do Rio de Janeiro.

dor, então, pode utilizar técnicas de documentação, combinadas com entrevista, possibilitando um
ento da coleta dos dados da pesquisa. Apesar de o montante de dados ser extenso e requerer organização
ador, há elementos que permitem rigor metodológico e informações que podem ser confrontadas, a fim
car que as memórias dos entrevistados possam ser coerentes com a realidade.

A documentação pode auxiliar na organização dos dados pesquisados, ainda que


a natureza da pesquisa não seja documental, visto que as técnicas de
documentação, herdadas da História e da Biblioteconomia, colaboram com a
organização de materiais coletados durante uma pesquisa científica.
Sendo assim, podemos afirmar que existem diferentes técnicas para coleta de
dados e que o pesquisador em educação pode se beneficiar de cada uma delas,
conforme o recorte que escolher. A educação possibilita uma grande diversidade
de temas que carecem de pesquisas. Assim, com organização e conhecimentos de
metodologia da pesquisa, podemos nos aventurar nessa empreitada e colaborar
para pensar, solucionar e especificar os desafios vivenciados por esse campo. 

Síntese
Neste segundo capítulo foram aprofundados estudos a respeito de metodologia
da pesquisa em educação, bem como considerações a respeito de ética e técnicas
utilizadas para coleta, organização, classificação e análise de dados. 

Neste capítulo, você teve a oportunidade de:


conhecer metodologias e técnicas utilizadas na pesquisa em educação; 
compreender diferentes técnicas de coleta de dados, como o
questionário, a entrevista, a observação e a documentação;
verificar diferentes exemplos de aplicação de pesquisas em educação,
com diferentes técnicas e métodos;
perceber a importância do planejamento da pesquisa; 
entender o papel do pesquisador na interação com os sujeitos da
pesquisa. 

Bibliografia
A TEORIA de Tudo. Direção: James Marsh. Reino Unido: Universal Pictures, 2015.
123 min. Color.
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O ÓLEO de Lorenzo. Direção de: George Miller. Estados Unidos: Universal Pictures,
1993. 129 min. Color.
REVISTA Brasileira de Educação. Rio de Janeiro: Associação Nacional de Pós-
Graduação e Pesquisa em Educação, v. 23, 2018. Disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_issuetoc&pid=1413-
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SAVIANI, D. Pedagogia histórico-crítica: primeiras aproximações São Paulo:
Autores Associados, 2013. 

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