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INSTITUTO DO EMPREGO E FORMAÇÃO PROFISSIONAL, I. P.

CENTRO DE EMPREGO E FORMAÇÃO PROFISSIONAL DO PORTO


Os contos populares.

A comadre Morte

Um pobre trabalhador, carregado de filhos, já tinha vergonha de convidar para padrinhos as


pessoas suas conhecidas e de importância. Nasceu-lhe mais um filho, e lançou-se à aventura para
convidar para compadre a primeira pessoa que encontrasse. Encontrou uma criatura magra, pálida,
amargurada; o pobre homem para em frente do desconhecido:

- Muito desejava tê-lo por compadre, para poder batizar o mais depressa uma criança.
- Não me custa a aceitar o convite; ora você não sabe quem eu sou.
- Não sei, mas por isso mesmo.
- Eu sou a Morte.
- Tanto melhor.
E caminharam juntos, e nesse mesmo dia se fez o batizado. A comadre Morte, depois da cerimónia,
disse para o homem pobre:

- Já que vives tão apoquentado por falta de recursos vou-te ofertar um dom que te aproveitará
muito e até poderás viver com fartura.
- Ó minha querida comadre!
- É o que te digo. Faz-te cirurgião, e quando visitares os doentes e me vires à cabeceira da
cama é sinal de que não escapam; nem Deus nem os santos os salvam. Se me vires aos pés
do leito, receita o que quiseres, e parecerá a muitos que são curas milagrosas.
Assim foi correndo a vida, que o homem como cirurgião acreditado ganhava muito dinheiro.

Uma vez é chamado para um doente que era riquíssimo, mas, por infelicidade, ao visitá-lo,
encontrou a comadre Morte à cabeceira. Disse que nada podia fazer e quis ir-se embora. Agarraram-
no, ofereceram-lhe peças de ouro, uma boa saca. O cirurgião teve então uma ideia, para não perder
aquele dinheiro. Mandou virar a cabeceira do doente para os pés. Salvou-o, mas a comadre Morte
foi-se embora e jurou vingar-se daquela deslealdade.

No dia seguinte, a Morte foi esperar o compadre à saída de casa:

- É agora a tua vez.

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- Ó comadre Morte, não me mates antes de eu acabar um padre-nosso.


- Pois sim, concedo-te isso.
O compadre nunca acabava de rezar o padre-nosso; a Morte foi-se embora, cansada de esperar.
Daí a dias, quando ia ao chamado de um doente, encontrou a comadre Morte caída e estatelada na
estrada, imóvel, insensível.

- Olha a minha comadre, como ela já está pronta! Sempre lhe quero pagar o bem que me fez.
Vou-lhe rezar um padre-nosso pela sua alma.
Rezou sinceramente e, logo que acabou, a Morte ergueu-se:

- Sempre acabaste o padre-nosso que te concedi. Anda daí comigo.


E assim acabaram todas as espertezas.

Teófilo Braga, Contos Tradicionais do Povo Português.

Responda às perguntas sobre o texto.

1. Diga se as afirmações seguintes são verdadeiras ou falsas. Corrija as falsas.

2. Justifique a grafia do nome “Morte” com letra maiúscula.

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3. Comprove a inexistência de referências claras à localização no espaço e no tempo em que


decorre a ação.
4. Transcreva, da última fala do homem, uma expressão popular e explique o seu sentido.

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O CONDE SOLDADINHO

Junto do palácio do rei morava um pobre soldado; no dia e hora em que nasceu um filho ao rei,
também a mulher do soldado teve um filho. Aconteceu serem muito amigos um do outro, e o rei
como era justiceiro e de bom coração deixou que o soldado e a mulher viessem viver para o palácio,
para as duas crianças brincarem juntas. Chamavam todos no palácio ao rapaz o Conde Soldadinho;
ele acompanhava o príncipe a todas as festas e caçadas.

Uma vez andava o príncipe à caça, e achou-se ardendo em sede. O Conde Soldadinho foi-lhe arranjar
água; daí a pedaço veio com um lindo jarro cheio de água fresca.

— Quem te deu um jarro tão bonito?

— Foi numa pobre cabana; que faria se o príncipe visse a mãozinha que mo deu!

Foram ambos levar o jarro à cabana, e o príncipe ficou logo apaixonado por uma rapariga muito
linda que ali morava. Tomou amores com ela, ia vê-la em segredo, até que prometeu casamento para
obter tudo o que queria. Temendo que o rei soubesse daqueles amores, nunca mais voltou à
cabaninha, mas andava muito triste com saudades. A rapariga, que não sabia que o namorado era o
príncipe, veio à corte deitar-se aos pés do rei para lhe valer:

Supondo, serva de Deus,

Na terra fazeis de rei

E que sempre sem suspeita

Fazeis justiça direita;

Pois mui alto rei, sabei

Que a mim um cavaleiro

Com um amor verdadeiro

Protestou ser meu marido,

E entrou no meu aposento,

Conseguiu o seu intento;

E eu como humilde criada

Abatida e infamada

Neste campo de mudança

Peço aos vossos pés vingança.

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O rei disse:

Levantai-vos nobre dama,

Cobrarás crédito e fama,

Que será bem castigado

O que vos tem desonrado.

E mandou chamar o príncipe, que estava passeando no jardim, para vir à sua presença; o príncipe
veio suspirando:

A ela trago no pensamento,

Por ela estou num tormento.

O Conde Soldadinho, que o acompanhava disse:

— Pois por uma pobre pastora suspirais!

— Calai-vos, meu amigo; que também eras soldado, e meu pai vos fez conde sem o teres merecido.

Quando chegou à presença do rei contou-lhe tudo, e o rei deu-lhe ordem para casar com a pastora.

Teófilo Braga, Contos Tradicionais do Povo Português, Vol II, Dom Quixote

Após a leitura do conto, responda às seguintes questões.

1. Exponha as ideias principais do texto completando as frases.

a) Um rei e um pobre soldado...

b) Como as crianças eram muito amigas...

c) Quando o príncipe, numa caçada, sentiu sede...

d) Apaixonado pela rapariga, o príncipe...

e) A rapariga foi ter com o rei para...

f) O rei...

g) O príncipe foi criticado pelo Conde Soldadinho por...

h) ...

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2. Retire do texto as palavras ou expressões que dão indicações temporais.

3. Atente na expressão “Uma vez andava o príncipe...”

3.1. Indique a subclasse do determinante sublinhado.

3.2. Retire uma conclusão sobre a localização temporal desta narrativa.

4. Caracterize, em traços gerais, as personagens Príncipe e Conde Soldadinho.

5. Indique a razão pela qual o filho do soldado pobre se chamava Conde Soldadinho.

6. Observe a palavra “Soldadinho”

6.1. Identifique a sua classe, subclasse e grau.

7. Explicite o assunto do conto.

As lendas

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A lenda do paraíso.

Responda às perguntas.

1. Conta esta lenda que, quando Deus criou o homem, este lhe fez algumas queixas. Enumere-
as.
2. A quem recorreu Deus para atender ao último pedido do homem?
2.1. Explique a condição que a terra impôs para dar de comer ao homem.
3. Explique o sentido do último parágrafo do texto.
4. Assinale a opção que melhor sintetiza o assunto desta lenda. Esta lenda “explica” por que
razão...
Deus criou o Paraíso.
A terra produz alimentos.
Os homens são enterrados quando morrem.

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5. Relacione a “Lenda do Paraíso” com esta quadra do Cancioneiro Popular:


Oh! terra, que tudo crias,
Oh! terra, que tudo comes,
Oh! terra que hás de dar conta
Das mulheres mais dos homens.
Jaime Cortesão, Cancioneiro Popular,
Antologia Precedida dum Estudo Crítico,
Porto, Edição da Renascença Portuguesa.

6. No último parágrafo, o verbo “tornar” significa devolver. Comprove que esta palavra possui
mais do que um significado, retirando um exemplo do texto.

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