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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ

DANIEL FABRICIO DA VEIGA

PROPOSTA CENOGRÁFICA PARA ADAPTAÇÃO TEATRAL DO LIVRO


“DOM CASMURRO” DE MACHADO DE ASSIS

CURITIBA
2022
DANIEL FABRICIO DA VEIGA

PROPOSTA CENOGRÁFICA PARA ADAPTAÇÃO TEATRAL DO LIVRO


“DOM CASMURRO” DE MACHADO DE ASSIS

Monografia apresentada à disciplina Orientação de


Pesquisa (TA 204) como requisito parcial para a
conclusão do curso de Arquitetura e Urbanismo,
Setor de Ciência e Tecnologia, da Universidade
Federal do Paraná.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Andréa Berriel

CURITIBA
2022
TERMO DE APROVAÇÃO

DANIEL FABRICIO DA VEIGA

PROPOSTA CENOGRÁFICA PARA ADAPTAÇÃO TEATRAL DO LIVRO


“DOM CASMURRO” DE MACHADO DE ASSIS

Monografia apresentada ao curso de Graduação em Arquitetura e


Urbanismo, Setor de Tecnologia, Universidade Federal do Paraná, como requisito
parcial à obtenção do título de Bacharel em Arquitetura e Urbanismo.

______________________________________
Profª. Drªa. Andréa Berriel
Orientadora – Departamento de Arquitetura e Urbanismo,
Universidade Federal do Paraná

______________________________________
Profª. Drªa. Juliana Harumi Suzuki
Departamento de Arquitetura e Urbanismo,
Universidade Federal do Paraná

______________________________________
Prof. Dr. Marcelo Caetano Andreoli
Departamento de Arquitetura e Urbanismo,
Universidade Federal do Paraná

Cidade, 26 de Abril de 2022.


À minha mãe e minha família
por me permitirem sonhar
quando nem mesmo eu
sabia aonde iria chegar
AGRADECIMENTOS

À minha professora e orientadora Andréa Berriel por aceitar embarcar neste


projeto, pelo incentivo e pelas palavras dos livros e das artes. A todos os
professores de minha graduação por ampliarem meus horizontes me despertando
para esta ciência do espaço que é a arquitetura. E estendo minha gratidão a colegas
e amigos, que ainda alunos me foram professores em dados momentos.
Tudo me era estranho e adverso.
Deixei que demolissem a casa, e, mais tarde,
quando vim para o Engenho Novo, lembrou-me fazer esta reprodução
por explicações que dei ao arquiteto, segundo contei em tempo.
MACHADO DE ASSIS
RESUMO

A cenografia é um tema estreitamente ligado à arquitetura e seus modos de


pensar e de fazer, mas o que se observa na maioria dos cursos de arquitetura e
urbanismo é que, embora o conhecimento arquitetônico traga substancial
contribuição técnica e simbólica ao projeto do espaço cênico, os estudantes têm
pouco contato com o assunto durante a graduação. Este trabalho de pesquisa tem o
objetivo de reunir material que dê suporte ao projeto de um cenário para a
apresentação da peça Dom Casmurro, de Machado de Assis, a ser encenada no
Teatro Guaíra em Curitiba. Foram exploradas fontes bibliográficas e webgráficas de
autores de diferentes especializações que se aproximam por buscarem o
entendimento do espaço do espetáculo. Através de pesquisa histórica daqueles que
foram grandes mestres da cenografia, analisando seus trabalhos e ideias,
acrescenta-se aos conhecimentos do projetar e idealizar, próprios da arquitetura, um
pouco mais de liberdade para se criar o espaço de sonho ainda baseado na prática
do construir com a matéria. Trata-se do ponto de partida e fundação do outro
trabalho que virá. Através do trabalho foi possível analisar correlatos e estabelecer
diretrizes para o projeto de arquitetura que será desenvolvido na próxima etapa do
trabalho final de graduação.

Palavras-chave: Cenografia. Cenário. Projeto cenográfico. Teatro. Iluminação


cênica. Dom Casmurro
ABSTRACT

Scenography is a topic closely linked to architecture and its ways of thinking


and doing it, but what is observed in most architecture and urbanism courses is that,
although architectural knowledge brings a substantial technical and symbolic
contribution to the design of the scenic space, students have little contact with the
subject during graduation. This research work aims to gather material that supports
the design of a scenario for the presentation of the play Dom Casmurro, by Machado
de Assis, to be staged at the Guaíra Theater in Curitiba. Bibliographic and
webgraphic sources of authors from different specializations were explored, which
are close by seeking to understand the space of the show. Through historical
research of those who were great masters of scenography, analyzing their work and
ideas, it adds to the knowledge of designing and idealizing, typical of architecture, a
little more freedom to create the dream space still based on the practice of building
with matter. It is the starting point and foundation of the other work to come. Through
the work, it was possible to analyze correlates and establish guidelines for the
architectural project that will be developed in the next stage of the final graduation
work.

Keywords: Scenography. Scenery. Scenic light. Theater. Scenic lightning. Dom


Casmurro.
LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1 – INDIOS NAVAJO COMO DEUSES LIGADOS AOS ELEMENTOS .... 20


FIGURA 2 – EIRA MOVIDA POR TRAÇÃO ANIMAL .............................................. 21
FIGURA 3 – PERSPECTIVA DA SKENE E ORQUESTRA ...................................... 22
FIGURA 4 – KATABLEMATA .................................................................................. 23
FIGURA 5 – PERIACTOS ....................................................................................... 24
FIGURA 6 – EKICLEMA .......................................................................................... 25
FIGURA 7 – MECANISMO MODERNO SEMELHANTE A ANAPIESMA ................ 26
FIGURA 8 – DEUS EX MACHINA ............................................................................ 27
FIGURA 9 – COLISEU E SEUS SISTEMA DE COBERTURA ................................. 28
FIGURA 10 – EVOLUÇÃO DO ESPAÇO TEATRAL ............................................... 28
FIGURA 11 – PLANTA DO TEATRO GREGO (ESQ.) E ROMANO (DIR.) ............ 29
FIGURA 12 – REPRESENTAÇÃO TEATRAL EM TEMPLO RELIGIOSO .............. 30
FIGURA 13 – HIPÓDROMO DE CONSTANTINOPLA ............................................ 31
FIGURA 14 – MÁQUINAS PARA EFEITOS DO TEATRO ....................................... 32
FIGURA 15 – CAPA DO LIVRO DE SABBATTINI ................................................... 33
FIGURA 16 – CAIXA CÊNICA ITALIANA ................................................................ 33
FIGURA 17 – TEATRO OLÍMPICO DE VICENZA .................................................. 34
FIGURA 18 – TEATRO ELISABETANO ................................................................. 35
FIGURA 19 – ESTRUTURA PANTOGRÁFICA DAS GLÓRIAS .............................. 36
FIGURA 20 – CENOGRAFIA DE APPIA PARA “AS VALQUÍRIAS” ........................ 37
FIGURA 21 – DESENHO DE APPIA PARA A ÓPERA “TRISTÃO E ISOLDA” ........ 38
FIGURA 22 – DESENHO DE APPIA PARA “OURO DO RENO” ............................. 39
FIGURA 23 – IDEIA DE CRAIG PARA “PAIXÃO SEGUNDO SÃO MATEUS” ........ 40
FIGURA 24 – CENÁRIO PROJETADO POR NORMAN BEL GEDDES .................. 41
FIGURA 25 – CENÁRIO DE SVOBODA PARA A ÓPERA “TOSCA” ....................... 41
FIGURA 26 – CENÁRIOS DE SVOBODA PARA ROMEU E JULIETA ................... 42
FIGURA 27 – CANDELABRO ROMANO ................................................................ 45
FIGURA 28 – EVOLUÇÃO DE FONTES LUMINOSAS .......................................... 46
FIGURA 29 – MECANISMO DE SABBATINI .......................................................... 47
FIGURA 30 – OS DISCÍPULOS DE EMAÚS POR REMBRANDT ........................... 48
FIGURA 31 – VOCAÇÃO DE SÃO MATEUS POR REMBRANDT .......................... 49
FIGURA 32 – A ALCOVITEIRA POR GERARD VAN HONTHORST ...................... 50
FIGURA 33 – MONTAGEM DE ZIEMBINSKI DA MORTE DE MÉLISANDE ........... 53
FIGURA 34 – CONTRALUZ ..................................................................................... 54
FIGURA 35 – CONTRALUZ COM USO DE GOBOS ............................................... 54
FIGURA 36 – LUZ CHAPADA .................................................................................. 55
FIGURA 37 – LUZ DE CHÃO ................................................................................... 56
FIGURA 38 – LUZ DE CHÃO .................................................................................. 56
FIGURA 39 – LUZ DIAGONAL ................................................................................ 57
FIGURA 40 – LUZ CRUZADA ................................................................................. 57
FIGURA 41 – LUZ FRONTAL .................................................................................. 57
FIGURA 42 – LUZ LATERAL ................................................................................... 58
FIGURA 43 – LUZ CRUZADA LATERAL NA ALTURA DO CORPO ....................... 58
FIGURA 44 – LUZ À PINO ....................................................................................... 59
FIGURA 45 – LUZ À PINO EM ESPETÁCULO DE DANÇA .................................... 59
FIGURA 46 – LUZ REBATIDA QUENTE ................................................................. 60
FIGURA 47 – LUZ REBATIDA FRIA ........................................................................ 60
FIGURA 48 – SALOMÉ COM A CABEÇA DE JOÃO BATISTA ............................... 61
FIGURA 49 – AUTORRETRATO POR REMBRANDT 1658 ................................... 62
FIGURA 50 – SISTEMA PARA LUZ DE REMBRANDT .......................................... 63
FIGURA 51 – CENA DO FILME BLADE RUNNER ................................................. 63
FIGURA 52 – CROQUIS DE ESTUDO DA PEÇA BABEL ....................................... 64
FIGURA 53 – PLANTA BAIXA DO CENÁRIO “PALÁCIO DO DUQUE” ................... 65
FIGURA 54 – CORTE DO CENÁRIO “RUA ESCURA” ............................................ 66
FIGURA 55 – ESQUEMA DE ESTRUTURA ............................................................ 66
FIGURA 56 – RESULTADO FINAL .......................................................................... 66
FIGURA 57 – TEATRO MUNICIPAL CHACAO ....................................................... 67
FIGURA 58 – CENÁRIO DE "A EMPAREDADA DA RUA NOVA" ........................... 68
FIGURA 59 – CENÁRIO COM USO DE FUMAÇA .................................................. 69
FIGURA 60 – CENÁRIO DE “SENHOR COUVE FLORIDA” .................................. 70
FIGURA 61 – CENÁRIO DE “AS YOU LIKE IT” ...................................................... 71
FIGURA 62 – CENÁRIO DA ÁREA EXTERNA “PRAIA” ......................................... 73
FIGURA 63 – PALCO GIRATÓRIO COM CENÁRIO “PRAIA” À FRENTE .............. 74
FIGURA 64 – CENÁRIO “SALA” E SUA CONEXÃO DIRETA COM A “PRAIA” ....... 75
FIGURA 65 – CENÁRIO “PRAIA” NO FORMATO DIGITAL .................................... 75
FIGURA 66 – CENÁRIO “SALA” E TOCHAS COMO FONTE DE LUZ ................... 76
FIGURA 67 – PALCO GIRATÓRIO COM CENÁRIO “SALA” À FRENTE ............... 77
FIGURA 68 – PALCO GIRATÓRIO COM CENÁRIO “QUARTO” À FRENTE ......... 78
FIGURA 69 – REFERÊNCIA DO DIRETOR PARA LUZ DA LUA NO “QUARTO” ... 78
FIGURA 70 – TRAUGOTT MULLER ........................................................................ 79
FIGURA 71 – PERFIL DE PISCATOR SOBRE A ESTRUTURA ............................ 80
FIGURA 72 – CENA COM APENAS 3 ESPAÇOS ILUMINADOS .......................... 82
FIGURA 73 – ESTRUTURA E SISTEMA DE PROJEÇÃO ..................................... 82
FIGURA 74 – CENA COM ATORES E PROJEÇÕES SIMULTÂNEAS ................... 83
FIGURA 75 – DESENHO ESQUEMÁTICO COM PROJEÇÕES E CENÁRIOS ...... 84
FIGURA 76 – CENA COM PROJEÇÕES EM TODA A ESTRUTURA ..................... 85
FIGURA 77 – MAQUETE DA ESTRUTURA ............................................................ 86
FIGURA 78 – RESIDENCIAS NAS OBRAS DE MACHADO DE ASSIS .................. 87
FIGURA 79 – POSTER DO FILME DOM ................................................................. 89
FIGURA 80 – TRECHO DA PEÇA “DOM CASMURRO” 2019 ................................. 90
FIGURA 81 – CAPA DO DVD DE “CAPITU” ............................................................ 91
FIGURA 82 – CENÁRIO “QUINTAL” DA CASA DE MATA-CAVALOS ................... 93
FIGURA 83 – CENÁRIO “CASA DE MATA-CAVALOS” ......................................... 94
FIGURA 84 – CAPITOLINA E SUA TATUAGEM .................................................... 95
FIGURA 85 – CENÁRIO “QUINTAL” DESENHADO NO CHÃO EM GIZ ................. 96
FIGURA 86 – SEDE DO AUTOMÓVEL CLUB DO BRASIL ..................................... 97
FIGURA 87 – OBRA DE MATTA CLARK “SPLITTING” ............................................ 99
FIGURA 88 – OBRA DE MATTA CLARK “SPLITTING” ......................................... 100
FIGURA 89 – PROPOSTA CENÁRIO 1 ................................................................. 101
FIGURA 90 – “RECHEIO” DE MATERIAL SINTÉTICO ......................................... 101
FIGURA 91 – PROPOSTA CENÁRIO 2 ................................................................. 103
FIGURA 92 – OBRA DE ADRIANA VAREJÃO ...................................................... 104
FIGURA 93 – OBRA DE ADRIANA VAREJÃO ..................................................... 105
FIGURA 94 – PLANO INCLINADO DE PISCATOR .............................................. 107
FIGURA 95 – PLANO INCLINADO DE DEBORA COLKER ................................. 107
FIGURA 96 – PROPOSTA CENÁRIO 3 ................................................................. 106
FIGURA 97 – OBRA DE ADRIANA VAREJÃO ...................................................... 107
FIGURA 98 – PRÉDIO ANTIGO DO TEATRO GUAÍRA ........................................ 109
FIGURA 99 – CONSTRUÇÃO DO NOVO TEATRO .............................................. 110
FIGURA 100 – RUBENS MEISTER NAS OBRAS DO GUAÍRA ............................ 111
FIGURA 101 – FOTOMONTAGEM A PARTIR DA MAQUETE ............................. 111
FIGURA 102 – PLANTA BAIXA DO PALCO .......................................................... 113
FIGURA 103 – CORTE LONGITUDINAL ............................................................... 114
FIGURA 104 – CORTE TRANSVERSAL .............................................................. 114
FIGURA 105 – PLANTAS DE VARAS DE ILUMINAÇÃO ...................................... 115
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 15
2 CONCEITUAÇÃO E HISTÓRICO .......................................................................... 17
2.1 CONCEITOS DE CENOGRAFIA ........................................................................ 17
2.2 HISTÓRICO DA CENOGRAFIA .......................................................................... 19
2.3 CENOGRAFIA CONTEMPORÂNEA ................................................................... 36
3 ILUMINAÇÃO CÊNICA .......................................................................................... 43
3.1 BREVE HISTÓRICO DA ILUMINAÇÃO CÊNICA .............................................. 43
3.2 OBJETIVOS E PRINCÍPIOS .............................................................................. 50
3.3 ANGULAÇÃO E MODELAGEM ATRAVÉS DA LUZ .......................................... 52
3.3.1 Contraluz ......................................................................................................... 54
3.3.2 Luz chapada .................................................................................................... 55
3.3.3 Luz de chão ..................................................................................................... 55
3.3.4 Luz diagonal .................................................................................................... 56
3.3.5 Luz frontal ........................................................................................................ 57
3.3.6 Luz lateral ........................................................................................................ 58
3.3.7 Luz à pino ........................................................................................................ 59
3.3.8 Luz rebatida ..................................................................................................... 59
3.4 CHIAROSCURO ................................................................................................. 60
3.5 DESENHO DE ILUMINAÇÃO – APRESENTAÇÃO DE PROJETO ................... 63
4 ANÁLISE DE CORRELATOS................................................................................ 73
4.1 OTELO ................................................................................................................ 73
4.2 HOPPLA, WIR LEBEN! ....................................................................................... 79
5 DOM CASMURRO ................................................................................................ 87
5.1 RESUMO DA OBRA E ADAPTAÇÕES .............................................................. 87
5.2 RESUMO E APONTAMENTOS DA ADAPTAÇÃO PARA A TV “CAPITU” ........ 91
6 ELEMENTOS E DIRETRIZES EXTRAÍDOS DA PEÇA E DA MINISSERIE ........ 98
7 ANÁLISE DA REALIDADE – TEATRO GUAÍRA ............................................... 109
7.1 HISTÓRIA DO TEATRO ................................................................................... 109
7.2 ESPECIFICAÇÕES TÉCNICAS – GUAIRÃO .................................................. 112
8 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................ 116
REFERÊNCIAS....................................................................................................... 117
FONTES DE FIGURAS .......................................................................................... 119
15

1 INTRODUÇÃO

Como arquitetura e cenografia tratam do uso do espaço, as atividades


acabam tendo muitas similaridades. Seja no processo criativo ou na construção em
si neste trabalho foram encontrados diversos pontos em que as duas formas de
pensar o espaço sem somam e se complementam.
Através da pesquisa e estudo foi possível constatar que são poucos os
profissionais de arquitetura que se dedicam a esta área infelizmente. Desta forma
abre-se um campo promissor a ser explorado, pois o domínio do desenho técnico e
a familiaridade com técnicas construtivas diversas seriam uma grande adição ao
espaço teatral e à cenografia.
Com base nesta oportunidade de contribuir na área este trabalho que
compõe parcialmente o Trabalho Final de graduação em Arquitetura e Urbanismo
pela Universidade Federal do Paraná busca criar uma ponte entre cenografia e
arquitetura, utilizando a obra de Machado de Assis, Dom Casmurro, como veículo.
O objetivo geral foi criar um estudo fundamentado em pesquisas históricas e
de processos de criação no espaço teatral sempre buscando as similaridades no
ramo da arquitetura. O local escolhido para ambientar o resultado final deste
trabalho foi o auditório Bento Munhoz da Rocha Netto, conhecido como Guairão.
Fornecendo uma base teórica inicial, o capítulo 2 trata inicialmente da
conceituação do que é cenografia e avança para um breve resumo da história desta
atividade. Inicia seus estudos na antiguidade da Grécia e percorre sua evolução até
o período contemporâneo.
O capítulo 3 tem como foco a iluminação cênica demonstrando como ao
longo do tempo a luz foi tratada e aperfeiçoada não só para mostrar o que acontece
no palco mas também para transformar atribuindo novas características ao que é
visto. Trata da pintura e como os estudos de luz e sombra chegaram aos palcos e
também de técnicas modernas no uso da luz, exemplificando como ângulos e
intensidades modificam atores e cenários.
O quarto capítulo analisa duas obras que possuem correlação com o tema
escolhido. “Otelo”, em formato de ópera, pela temática do ciúme e pelo dinamismo
nas trocas de cena que a ópera pede, aparece inclusive na obra de Machado, sendo
citada diretamente. A outra é “Hoppla, wir Leben!” que conta com uso de projeções
16

simultâneas a ação dos atores e recursos simbólicos que são explorados na


proposta de adaptação.
O capítulo 5 trata da obra de Machado diretamente. Conta com um breve
resumo de “Dom Casmurro” e analisa adaptações feitas para teatro, tv e cinema. A
adaptação em formato de minissérie “Capitu” é também explorada analisando suas
metáforas e figuras de linguagem.
O sexto capítulo faz uma coleta dos principais pontos a serem explorados
nas obras correlatas apresentadas e descreve como podem ser empregadas em
uma nova roupagem para o teatro, atribuindo a elementos arquitetônicos do cenário
uma carga emocional que contribui com a narrativa emprestando símbolos das
obras de artistas plásticos como Adriana Varejão e Gordon Matta Clark.
O capítulo 7 traz um breve resumo das origens do Teatro Guaíra, palco
escolhido para a adaptação teatral, e conta também com desenhos técnicos que
auxiliam na percepção do espaço.
17

2 CONCEITUAÇÃO E HISTÓRICO

2.1 CONCEITOS DE CENOGRAFIA

A cenografia é um elemento presente em diversas formas de peças


audiovisuais. Cinema, peças publicitárias, videoclipes, shows, teatro, novelas,
animações e videogames todas possuem um ambiente predefinido onde a ação
acontece e que é parte integrante desta obra. Especificamente no âmbito do teatro,
este é um trabalho coletivo que envolve a participação de diversos profissionais
especializados em diferentes áreas.
São eles diretores, que idealizam o espetáculo de uma forma geral, dirigindo
os atores e coordenando os diversos grupos profissionais envolvidos. O cenógrafo
cria a cenografia e identidade visual da peça, realiza os desenhos técnicos,
acompanha a criação e montagem das estruturas, atuando junto aos demais
profissionais envolvidos no processo, como carpinteiros, marceneiros e pintores. O
cenógrafo também atua muito junto aos iluminadores, técnicos ligados aos efeitos
especiais e em alguns casos projecionistas. Outros profissionais envolvidos na
criação de uma peça teatral são os figurinistas, criando todo tipo de vestimentas e
adereços. Coreógrafos, ou especialistas em expressão corporal, também atuam no
que diz respeito a orientar os atores a como se movimentarem em cena. Existem
ainda outros profissionais envolvidos nesta indústria, mas sem relação direta com o
material artístico.
Mantovani (1989) faz uma distinção importante sobre a nomenclatura
empregada. A autora utiliza o termo lugar teatral para o espaço onde ocorre a
apresentação teatral e onde é estabelecida a relação entre cena e público ao invés
de teatro, pois este termo designa apenas o edifício teatral. Este termo liberta a
prática do espaço tradicional e permite que o termo valha para demais localidades.
Este lugar teatral compõe-se do local do espectador, seja na plateia, camarote ou
outro espaço onde fique evidente seu distanciamento da peça em si, e do lugar
cênico, onde de fato o ator realiza seu ofício e a cena acontece. Em um teatro o
lugar cênico é o palco, mas o conceito é flexível e caso a peça fosse apresentada
em outro lugar, como uma praça ou ginásio, seria onde os atores atuam e a obra
ocorre de fato.
18

Descrevendo a cenografia Soares a resume como:

A cenografia é uma arte que lida com a manipulação de um espaço


específico, onde terá lugar um determinado evento performativo. É pensada
para ser habitada por indivíduos durante um período de tempo definido e,
durante esse período de tempo, irá ser apreendida por um outro conjunto de
indivíduos. Esta interação torna-a num veículo particularmente eficaz na
transmissão de ideias. (SOARES; 2010, p. 11).

A cenografia, durante sua gênese na Grécia antiga, assumia um caráter


muito básico representando apenas locações e situando as ações no tempo e no
espaço através de uma tenda com suporte pictórico “As unidades de ação, lugar e
tempo da tragédia grega, (...), simplificaram muito o problema da cenografia, que se
bastava com fachadas de palácios, templos e tendas de campanha” (MAGALDI,
1986; p. 37). Por muito tempo ela manteve essa característica secundária, como
literalmente apenas um pano de fundo do espetáculo em si, atravessando os
períodos romanos, medieval até a era contemporânea. Mas a leitura que se faz hoje
atribui a ela uma importância e simbologia muito mais forte, fundindo-se a obra e se
tornando parte importante da construção da cena e realizando a ponte entre o real e
a fantasia.
As habilidades para que este profissional da cenografia possa criar este
cenário são muitas e plurais. Como já dito anteriormente ele deve interagir, e mais
que isso, entender o suficiente para conseguir trocar ideias e entender as
capacidades e limitações dos outros técnicos envolvidos. Quando nos aprofundamos
sobre quais aptidões o cenógrafo deve ter, como desenhar e interpretar projetos de
carpintaria e marcenaria, compreender como a luz incide sobre os objetos e os
efeitos gerados por ela, a importância no uso das cores e seus efeitos sobre a
percepção humana fica evidente que este deveria ser um profissional de arquitetura.
Tomando como exemplo os projetos de edificação em madeira, realizados
em algumas obras teatrais, estes demandam um rígido controle no uso da madeira
principalmente na sua função estrutural, pois embora representem uma alusão a
realidade estes serão submetidos a esforços físicos reais. Embora não precise
necessariamente ser capaz de realizá-los como um operário deve saber como este
trabalho será feito, prevendo problemas, desafios e tempo de execução.
19

A habilidade em esboçar ideias através do desenho técnico e evoluí-las para


um projeto arquitetônico nas suas formas usuais como plantas, cortes e perspectivas
são atribuições típicas de arquitetos e urbanistas e, mesmo quando tais empreitadas
são realizadas por profissionais sem esta formação específica eles acabam se
valendo destas habilidades, ou as adquirem no processo, pois são necessárias para
se levar a cabo projetos desta natureza.
De acordo com Pavis (2008, p. 45), em seu livro Dicionário do Teatro,
“cenografar” é, “estabelecer um jogo de correspondências e proporções entre o
espaço do texto e aquele do palco, é estruturar cada sistema ‘em si’ mas também
considerando o outro numa série de harmonizações e defasagens.” Sobre esta
transição do que o texto relativo à peça trata e como representar isto no espaço
teatral, não apenas como lugar ou tempo, Pavis diz ainda:

Hoje, ao contrário, a cenografia concebe sua tarefa não mais como


ilustração ideal e unívoca do texto dramático, mas como dispositivo* próprio
para esclarecer (e não mais ilustrar) o texto e a ação humana, para figurar
uma situação de emancipação* (e não um lugar fixo), e para situar o sentido
da encenação no intercâmbio entre um espaço e um texto. (PAVIS; 2008,
p.45)

Sabendo da conceituação, por diferentes autores, acerca da cenografia,


passaremos agora a um breve histórico sobre as transformações incorporadas por
ela ao longo do tempo, desde seu início até a atualidade.

2.2 HISTÓRICO DA CENOGRAFIA

Urssi (2006) argumenta que o teatro possui uma origem anterior aos gregos.
“A origem do teatro é pré-histórica, ele nasceu da forma circular definida pelo público
que se posicionava em torno do espetáculo primitivo. O xamã, instrumento de
ligação entre a natureza mística e o ser humano, era o proto-personagem.” O autor
vai além e continua a descrever as características dessa expressão cultural que,
embora possua teatralidade, ainda não se define como teatro. Ao descrever o uso
do fogo e da fumaça pelo xamã, bem como os ornamentos de penas, peles de
animais e instrumentos musicais rudimentares, tenta nos mostrar como essas
ferramentas eram utilizadas para, segundo o autor, suspender a incredulidade dos
20

seus espectadores os conduzindo a um outro tipo de atmosfera, delimitando o


espaço de atuação.
Outra ferramenta utilizada no mesmo período seriam as máscaras. Ainda
sobre a experiência xamânica, este utilizava o rosto pintado visando gerar uma nova
realidade e tomar “a palavra” sendo este o ponto de convergência para o surgimento
do Drama como é conhecido. Pavis (2008) descreve bem o alcance desse recurso
quando atribuía às máscaras valores além das motivações antropológicas, quando
procuram imitar os elementos ou reforçam a crença em uma transubstanciação,
surgindo como objeto de poder e instrumento de religação espiritual.
Berthold (2001, p. 3) diz, “O teatro primitivo utiliza acessórios exteriores, [sic]
como seu sucessor [sic]. Máscaras e figurinos, acessórios de contra-regragem,
cenários e orquestras (sic!) eram comuns, embora na [sic] forma concebível”. Ainda
sobre o mesmo tema exemplifica, estabelecendo a diferença entre os dois formatos
devido ao número de atores em cena e os acessórios utilizados em cena:

O palco do teatro primitivo é uma área aberta de terra batida. Seus


equipamentos de palco podem incluir um tótem fixo no centro, um feixe de
lanças espetadas no chão, um animal abatido, um monte de trigo, milho,
arroz ou cana-de-açúcar.” (BERTHOLD; 2001, p. 4)

FIGURA 1 – ÍNDIOS NAVAJO COMO DEUSES LIGADOS AOS ELEMENTOS

FONTE: CURTIS, EDWARD S. (1904)


21

Em seu livro “Cenografia, uma breve visita” Cyro Del Nero argumenta que
embora o surgimento do teatro grego possa ser datado historicamente, através de
fontes e registros, a cenografia de certa forma o precede pois já era utilizada nos
rituais ligados a religiões e crenças espirituais:

“Cenografia” é palavra que escapa da sua maior vinculação, o teatro.


Porquê? Porque é anterior ao teatro. (sic) Muito antes, os xamãs já haviam
criado os adereços de cena; a luz para fazer efeito no fumo da queima de
ervas intoxicantes ou na fumaça de charutos; edifícios teatrais como
cabanas pouco iluminadas ou barracos com um buraco no teto através
do qual o sol fazia o papel dos atuais refletores; roupas especiais
decoradas de maneira a atrair a atenção ou para atemorizar os
espectadores durante os serviços de curandeira dos xamãs; e a cenografia
que era o composto dos efeitos e a decoração dos tetos e paredes. (DEL
NERO; 2008, p. 11, grifo nosso).

Ainda sobre as origens da cenografia Del Nero (2008, p. 11), “A cenografia


grega nasce [sic] no século V a.C. E quem a solicita é Sófocles. A cenografia nasceu
como um desenho (graphein) na tenda (skene) onde os atores trocavam de roupa.”
Tendo início na Grécia, entre os séculos VII e VI a.C. o teatro, já mais
próximo da forma como o reconhecemos na atualidade, surgiu como uma
homenagem aos deuses quando se dançava na eira, espécie de piso circular onde
os grãos eram moídos por uma mó que era rotacionada por tração animal. Essa
configuração em círculo das apresentações foi o que deu origem ao formato das
encenações em ambientes abertos e também nos primeiros teatros que seriam
edificados mais tarde. (DEL NERO, 2008).

FIGURA 2 – EIRA MOVIDA POR TRAÇÃO ANIMAL

FONTE: DEL NERO (2008)


22

A transição deste mesmo piso circular para um edifício propriamente dito se


deu na construção do teatro de Dionísio em Atenas. Projetado por Pisístrato em 600-
528 a.C. Nele havia, segundo Del Nero (2008, p. 13), “[...] um santuário de Dionisos,
um altar, uma gruta e uma “orquestra” (do verbo dançar) circular de terra batida ou
areia (arena), onde se realizavam cantos e danças coletivas.” Esse edifício teatral
era democrático no que diz respeito à visão do espetáculo, os gregos queriam ver
bem e sentados de forma igual sem espaços privilegiados. O público ficava sentado
no espaço chamado theatron (local onde se vê).

FIGURA 3 – PERSPECTIVA DA SKENE E ORQUESTRA

FONTE: URSSI (2006)

Até o princípio do século V a.C. os atores faziam a troca de suas vestes em


uma tenda, chamada skene, atrás da orquestra. À medida que esta skene passou a
ser construída e deixou de ser feita de tecidos, se aproximou da orquestra,
permitindo acesso mais rápido por parte dos atores. Este espaço evoluiu ao longo
do tempo até abrigar uma série de roupas, adereços e peças de cenografia. Mais
tarde a skene se tornaria em stoa, com acessos para os atores e ornamentada com
fachadas de templos, altares e escadas. A skene evolui com novos usos até o
momento em que se une a pintura, nascendo assim a skenographein — pintura na
tenda. (DEL NERO, 2008).
Segundo Del Nero (2008, p. 15) “A pintura de cenários, pinakes, e a troca de
cenários, katablemata, foram sugeridas por Sófocles, que viveu noventa anos do
século V a.C., o século de Péricles.” Estas pinturas estariam no mesmo nível das
23

melhores obras da época, a qual junto às outras artes, como escultura e arquitetura,
haviam alcançado um alto nível.

FIGURA 4 – KATABLEMATA

FONTE: DEL NERO (2008)

O uso de painéis era feito de maneira simples, com as estruturas apoiadas


na skene. Este mecanismo foi relatado por Ésquilo. Porém no século V a.C. Phormis
de Siracusa começou a utilizar painéis móveis que seriam trocados entre as cenas.
Por estarem enfileirados quando os da frente eram removidos revelavam os que
estavam atrás, criando uma nova paisagem cenográfica. Estes cenários, pinakes,
serviram de inspiração para os estudos de Demócrito e Anaxágoras sobre a
perspectiva. Estes possuíam diferentes tipos de representações cênicas, como
trágica, cômica e satírica. Vitrúvio as chamava de scaena ductilis, ou seja, cena
móvel. (DEL NERO, 2008).
Outro dispositivo que merece ser citado por sua engenhosidade e efeito
cênico é o periactos. Para Del Nero consiste em um dispositivo de três lados, onde
cada uma dessas faces possui uma representação cenográfica e ao serem
rotacionados geravam diferentes ambientes e atmosferas. Poderiam ainda ter as
faces trocadas durante o espetáculo permitindo uma variedade ainda maior de
cenários. Compostos de madeira e tela eram fixados ao chão por blocos de pedra
que os sustentavam. Eram dotados de um eixo vertical e operados por maquinistas
segundo se pode verificar através dos resquícios arqueológicos encontrados destes
mecanismos, os blocos em pedra que os ancoravam, em teatros da antiguidade. O
periactos poderia ainda ser disposto ao fundo do cenário, junto a skene,
24

caracterizando um pano de fundo a ação teatral, ou nas laterais do palco criando um


outro tipo de ambientação aos olhos dos espectadores que acompanhavam o
espetáculo teatral. Segundo Del Nero a forma de utilização era sofisticada:

Eles estavam separados em dois grupos laterais – girar os que ficavam do


lado direito era mudar de localidade, de cidade; os da esquerda mudavam
de interior para exterior; e para trocar a cena inteira seria necessário girar
todos os periactos. (DEL NERO; 2009, p. 135)

FIGURA 5 – PERIACTOS

FONTE: DEL NERO (2009)

Um mecanismo usado na Grécia antiga, já com um efeito plástico para uso


mais específico foi o ekiclema. Foi utilizado pelas primeiras vezes no século V a.C. e
consistia em carros sobre plataformas rolantes por um tipo de portal. Este
mecanismo era utilizado principalmente em cenas de assassinato onde o ato em si
não podia ser representado. A cena era congelada no momento clímax do ato de
violência e os atores eram removidos do palco, para depois serem reintroduzidos em
cena já com o crime cometido e a vítima aos pés do perpetrador. Cabe destacar que
o uso de ekiclemas podia ser utilizado ainda para simplesmente introduzir
personagens em cena atraindo os olhares do público e gerando efeito semelhante
ao zoom do cinema tornando o personagem que se aproximava da plateia o ponto
focal do espetáculo. A plataforma poderia adotar diferentes formas e quando sendo
circular o efeito seria de aparição, ou mutação, revelando o personagem ao ser
25

rotacionada, sem que o ator precisasse entrar em cena pelas laterais ou fundo do
palco. (DEL NERO, 2009).

FIGURA 6 – EKICLEMA

FONTE: DEL NERO (2009)

Dois dispositivos usados ainda neste período, apesar de possuírem efeitos


semelhantes, têm distinção devido ao método empregado. A escada de Caronte e o
anapiesma serviam aos atores para lhes conferir um efeito como se surgissem das
profundezas e abismos subterrâneos. A escada de Caronte consistia em um simples
lance de degraus que vinha do subsolo ou plano inferior, através de um túnel, ao
palco até a superfície por onde o ator deveria subir passo a passo. Existe um destes
túneis no teatro em Erétria, do final do século IV a.C. e dois no teatro de Corinto.
Foram usados para revelar o fantasma de Dario em Os Persas e de Clitemnestra em
Eumênides, as duas de Ésquilo. (DEL NERO, 2009).
Já a anapiesma era dotada de um mecanismo mais sofisticado. Era um
alçapão que se erguia mecanicamente elevando a plataforma até revelar os atores,
também buscando revelar figuras e deuses oriundos do plano subterrâneo.
(HELINIKA, 2021). Este mecanismo é utilizado até hoje e tem grande uso em
exibições musicais criando uma atmosfera espetacular para os artistas e intérpretes.
Os gregos dividiam o teatro em fatias horizontais para representar: O mundo
superior e divino, o território humano e o submundo (Tártaro e o Hades). Um céu,
uma terra e um submundo. No caso das representações ligadas ao céu, e esse
mundo dos deuses do Olimpo, um recurso simples utilizando plataformas elevadas
era o um theologuêion, mas um dispositivo em específico seria o que talvez traria
maior efeito dramático se valendo de uma tecnologia que seria explorada nos
períodos subsequentes, a deus ex machina. (DEL NERO, 2009).
26

FIGURA 7 – MECANISMO MODERNO SEMELHANTE A ANAPIESMA

FONTE: ACIR (1997)

O theologuêion (lugar onde os deuses falam) que era uma tribuna armada
na parte superior do cenário, representando a morada dos deuses. O aparecimento
de divindades em cena se fazia acompanhar de relâmpagos e trovões. O relâmpago
se produzia por meio de archotes que se agitavam e o barulho do trovão era
conseguido com uma bacia de bronze colocada atrás da cena, na qual se lançavam
pedaços de ferro. (BRANDÃO, 1992)
A deus ex machina talvez seja a máquina de efeito visual mais expressivo do
período. Segundo Del Nero (2009), são as máquinas cuja finalidade é representar a
chegada dos deuses vindo do Olimpo ou Parnaso. Consistia em uma grua que fazia
os deuses aparecer em meios aos céus e os transportava pelo ar até o
theologuêion. A sofisticação deste mecanismo, e sua íntima relação com o uso de
cabos e mastros, cria a possibilidade de uma ligação com a origem deste
mecanismo no meio naval, pois o uso de dispositivo semelhante era feito para
transporte de cargas em embarcações.
27

FIGURA 8 – DEUS EX MACHINA

FONTE: DEL NERO (2009)

De acordo com Del Nero:

Quando os romanos chegaram à Grécia, encontraram um brinquedo político


extraordinário, chamado teatro. Mediante as adaptações que executaram no
edifício teatral e a promoção do esvaziamento de ideias em favor do
espetáculo, ele viria a servir como o melhor instrumento de distração nas
regiões onde a pax romana era imposta. Pão e circo: um programa de
dominação. (DEL NERO; 2009, p. 153)

Ainda de acordo com Del Nero (2009, p. 154), “Esse foi o primeiro grande
boom da história do espetáculo, quando a excelente engenharia romana podia
erguer teatros independentemente da forma dos terrenos, construindo alguns no
deserto, onde não havia nenhuma colina para se apoiar o theatron.” O segundo seria
com a ópera de Monteverdi e a abertura de vários teatros líricos pela Europa. O
terceiro foi o cinematográfico, no século XX. (DEL NERO, 2009).
28

FIGURA 9 – COLISEU E SEUS SISTEMA DE COBERTURA

FONTE: DEL NERO (2009)

O início do teatro romano se deu através de traduções do teatro grego.


Segundo Del Nero (2009; p. 163, grifo nosso), “Os gregos tinham o arquiteto e o
filósofo. Os romanos contribuíram com o engenheiro e o jurisconsulto.” Vestindo
trajes e máscaras gregos os atores romanos atuavam como se estivessem em
Atenas. Del Nero (2009, p.164) “A arte não imitava mais a realidade, [sic]. A arte
agora imitava a Grécia”. O palco agora era uma espécie de utopia, ora
representando Atenas, ora Roma.

FIGURA 10 – EVOLUÇÃO DO ESPAÇO TEATRAL

FONTE: DEL NERO (2009)


29

O teatro romano acabaria por influenciar fortemente o teatro ocidental, até o


século XIX, quando ocorre um resgate da tradição grega. A farsa e o melodrama são
criações romanas. Os romanos, grandes engenheiros, deixam com legado de suas
obras de edifícios teatrais grandes obras em pedra, sendo o mais notável o Coliseu
de Roma. No início os teatros romanos eram construídos em madeira e tinham
caráter provisório servindo a festivais, mas foi modernizado com o passar do tempo.
Também apresentaram algumas mudanças tanto na configuração do edifício
teatral quanto do espaço teatral em si, como a consolidação da diferenciação de
lugares baseados em classes sociais e posições hierárquicas dentro da sociedade
romana, e também na utilização de cortinas em frente ao palco, que ao invés de
abrir lateralmente como é na atualidade se abriam verticalmente, descendo até o
chão. Com o esvaziamento de ideias do espetáculo e a necessidade de um
entretenimento incessante acabaram por criar diferentes formatos de espetáculos.
Com isso surgiu a necessidade de novas estruturas e equipamentos, tornando seus
edifícios ainda mais complexos. (DEL NERO. 2009).

FIGURA 11 – PLANTA DO TEATRO GREGO (ESQ.) E ROMANO (DIR.)

FONTE: DEL NERO (2009)


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Bizâncio, ou Império Bizantino, também deixou sua contribuição no que se


refere ao teatro. Sendo uma continuação do Império Romano trouxe consigo alguns
traços deste período mas a influência da religião gerou alterações profundas na
maneira como a obra teatral era vista e interpretada, e em como os próprios edifícios
teatrais eram utilizados.
Segundo Del Nero (2009), havia três tipos de atividades teatrais: a popular, a
religiosa e a erudita, sendo que esta última preservava os textos clássicos.
Importante ressaltar que a prática teatral era proibida neste período, mas se
especula que tenha sobrevivido sendo realizada discretamente nos poucos edifícios
sobreviventes no extenso território do império ao longo do mediterrâneo. Porém as
informações apontam para um formato de espetáculo mais diversificado, como a
mima, pantomima, recitações e danças, mas sem a confirmação se eram realizados
em anfiteatro, circos ou espaços alternativos ou clandestinos.
As representações teatrais passaram a ser realizadas também dentro dos
templos e tinham um caráter didático, para que juntamente com as referências
religiosas em murais, pudessem transpor a barreira do analfabetismo da população
levando a ela o conteúdo dos textos bíblicos.

FIGURA 12 – REPRESENTAÇÃO TEATRAL EM TEMPLO RELIGIOSO

FONTE: DEL NERO (2009)

Edifícios como o hipódromo de Constantinopla foram construídos


principalmente para a realização de corridas de carros e tornaram-se o local mais
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importante de reunião de cidadãos da cidade. Del Nero (2009, p.175), “O próprio


imperador dirigia-se ao povo de sua tribuna no hipódromo, transformando-o em
fórum ocupado por 40 mil a 80 mil espectadores.” Fica ainda mais evidente este
sequestro do espetáculo por parte do governante para influenciar desta forma as
decisões políticas quando o autor descreve a maneira como os partidos políticos
eram formados ao redor destes eventos. Diz Del Nero:

“O público se dividia em dois partidos que eram a princípio apenas torcidas


esportivas no hipódromo, onde havia espetáculos de todo tipo. Um dos dois
partidos ganhou benesses dos imperadores de Bizâncio e se tornou partido
pró-governo. Eles se formaram ao redor dessas corridas do hipódromo em
que homens podiam entrar sem pagar, mas deveriam apresentar uma ficha
previamente distribuída.” (DEL NERO; 2009, p. 175).

FIGURA 13 – HIPÓDROMO DE CONSTANTINOPLA

FONTE: WIKIPEDIA (2022)

Durante o Renascimento as mesmas máquinas utilizadas desde a Grécia


antiga são aprimoradas e levadas a um outro patamar de eficiência e sofisticação. É
possível fazer aqui um paralelo entre o avanço das técnicas ligadas à navegação,
como a utilização de cabos e gruas para transporte de cargas, com avanço destes
mesmos recursos no teatro. Segundo Del Nero (2009, p. 193), “Essa tradição de
cordas, velames, varandas aéreas, contrapesos e outros elementos nos foi descrita
e algumas vezes desenhadas por Nicola Sabbatini, quando os cenários teatrais
estavam dominados pela troca de cenários, levando a cenografia aos limites de sua
eficiência.”
32

Sabbatini, em seu livro Pratica di fabricar scene e macchine ne’ teatri, de


1637, aparece com questões interessantes sobre a cenografia na forma de
representação de algumas cenas padrão. São elas, segundo Del Nero:

• Como fazer aparecer um inferno


• Primeira maneira de fazer aparecer o mar
• Como fazer que uma nuvem desça diretamente do céu sobre a cena,
com pessoas dentro
• Como representar um paraíso (DEL NERO; 2009, p. 194-195)

FIGURA 14 – MÁQUINAS PARA EFEITOS DO TEATRO

FONTE: DEL NERO (2009)

Tendo trabalhado para figuras importantes do período, como duques,


cardeais e arcebispos, além de cenotécnico, foi também matemático e engenheiro,
mas a obra de maior contribuição à prática cenográfica será ter refeito o Teatro del
Sole, adicionando a ele diversas máquinas teatrais descritas em seu livro Tratado.
(DEL NERO, 2009)
33

FIGURA 15 – CAPA DO LIVRO DE SABBATTINI

FONTE: WIKIPEDIA (2022)

Neste período também surgiu outra figura importante que viria a mudar a
formatação do edifício teatral. Andrea Palladio criou o Teatro Olímpico de Vicenza,
reduzindo suas medidas e adicionando um teto ao teatro romano. No mesmo
período, em Londres, Shakespeare utilizava o Teatro Globo, um tipo de circo
adaptado para espetáculos com diversas cenas em um mesmo palco. (DEL NERO,
2009).

FIGURA 16 – CAIXA CÊNICA ITALIANA

FONTE: DEL NERO (2009)


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No renascimento o teatro perde seu caráter religioso. O teatro profano


aparece mais uma vez só que de forma elitizada. As peças agora são realizadas em
salões nobres de palácios e o público fica restrito à corte. Mais tarde neste período
será reconhecido como arte erudita e o edifício do teatro volta a ser imaginado como
na Grécia e Roma. As salas começam a ser projetadas com base em novas ideias
mas ainda com as mesmas restrições ao público. (PEREIRA, 2017).
No que diz respeito à cenografia, a perspectiva marca este momento sendo
novamente objeto de estudo e aprimoramento nas produções cênicas, visando
representar as três dimensões no plano bidimensional. Segundo Pereira (2017, p.
21), “Uma forte marca dos desenhos de cenário nesse período era o uso de um
único ponto de fuga, a chamada perspectiva central era a principal técnica adotada.”
Para Del Nero:

Mesmo essa ferradura octogonal projetada para abrigar o público


elizabetano num novo theatron, com um palco, um porão, três portas no
fundo, mais um balcão alto, é ainda o palco italiano (de Sabbatinni) visto no
continente e refeito, em Londres, por um genial carpinteiro inglês, Cuthbert
Burbage [sic]. (DEL NERO; 2009, p. 195).

FIGURA 17 – TEATRO OLÍMPICO DE VICENZA

FONTE: DEL NERO (2009)

Um dos marcos do renascimento na Inglaterra foi a construção do teatro


elisabetano em 1576. O primeiro foi o The Theatre, construído em Londres, com
projeto de James Burbage. Este modelo de teatro contava com pátios abertos e um
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dos mais famosos foi o Globe Theatre, com formato circular, galerias e camarotes.
(PEREIRA, 2017).

FIGURA 18 – TEATRO ELISABETANO

FONTE: MANTOVANI (1989)

No teatro barroco “glórias”, visão dos céus, última cena, apoteose, na qual
todos os conceitos e efeitos se reuniam era o ponto alto do espetáculo. Segundo Del
Nero (2009, p. 201), “Cantores subiam do limbo posterior do palco sentados em
nuvens, como nas imagens sagradas, tomando o lugar de Cristo, com seus santos e
apóstolos.” Estas nuvens consistiam em painéis com assentos ocultos atrás deles.
Eles subiam juntos e eram interligados mas contavam com movimentação
independente. Del Nero (2009, p. 201), “Um leque de madeira, pantográfico,
sustentava-os e abria-se, expandindo as nuvens.” O efeito era grandioso e
reservado para o clímax da peça.
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FIGURA 19 – ESTRUTURA PANTOGRÁFICA DAS GLÓRIAS

FONTE: DEL NERO (2009)

Esta técnica acabou com o tempo sendo utilizada em festas pagãs,


emprestando a grandiosidade dos símbolos católicos a outros personagens. Todo
este aparato necessitava de vários maquinistas com diferentes especializações,
maquinistas volantes, das varandas, dos contrapesos e dos carros. Todos ocultos e
guardadores dos segredos e mistérios do teatro. As técnicas de controle de cabos e
gruas, oriundas das práticas dos navios, era muito empregada aqui. Del Nero diz:

“As cordas herdadas dos navios, dos oceanos e dos séculos, e que no
teatro são chamadas de manobras, corriam para cima e para baixo,
contrapesadas – umas curtas, outras longas – passando nos eixos dos
gornes e das roldanas mestras, levando carga artística que cantava a glória
de deuses, reis e potestades. (DEL NERO; 2009, p. 201).

2.3 CENOGRAFIA CONTEMPORÂNEA

Com a obra de Richard Wagner ocorrem grandes mudanças na cenografia.


Para ele, a ópera é a obra de arte total – gesamtkunstwerk – que deve reunir em
uma só unidade poesia, dança e música. Acreditava na valorização do texto, unido à
música. Devendo abandonar a história e buscar o mito, pois só este era capaz de
realizar a transposição da ideia para a emoção. Somente o mito pode ser popular,
nacional e universal simultaneamente. Decorre desta visão o uso da mitologia
germânica, resgata do romantismo. Para Del Nero:
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“Foi por meio de sua música e do edifício teatral que mandou construir para
ele que Wagner realizou suas ideais. Nesse edifício, a encenação que fez
visando ao futuro da obra de arte tinha a cenografia de suas obras ainda de
costas, ainda como se olhasse por um retrovisor histórico para o passado,
recorrendo também à arqueologia. Sua música era revolucionária e
profética, mas sua cenografia era antiga e referia-se a encenações de
cunho antigo.” (DEL NERO; 2009, p. 217-218).

FIGURA 20 – CENOGRAFIA DE APPIA PARA “AS VALQUÍRIAS”

FONTE: DEL NERO (2009)

Será Adolphe Appia que dará a obra de Wagner a grandiosidade estética


que sua obra necessitava. Sobre Appia diz Del Nero (2009, p. 218), “[sic] ele chegou
a uma posição de reformador radical da arte da cena, dando importância primeiro ao
texto dramático musical e ao ator e, depois à arquitetura do palco e luz.”
Appia começou sua trajetória reformista ao recusar os painéis pintados
realistas em uso em Bayreuth, cidade alemã. Como a luz elétrica neste período, o
ator lhe parecia deslocado em cena junto a cenografia bidimensional representada
nos painéis. Para ele, o ator deve habitar e interagir em um cenário tridimensional,
tal qual seu próprio corpo. (DEL NERO, 2009). “[sic] é da música e do drama que se
engendra a encenação. A duração, o tempo musical, [sic] deve ser projetado no
espaço”. (DEL NERO; 2009, p. 218, grifo nosso). Realinhando as ideias de Wagner,
Appia acreditava que a encenação não deve ser a unificação de todas as artes, mas
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sim uma apropriada ligação derivada da hierarquia entre estas diferentes formas de
expressão.
Adotando o ator como elemento primário e fundamental, pois o drama não
acontece sem sua figura, será sua ação que irá definir o espaço teatral. Desta forma
o espaço tridimensional se verá livre das tradições da caixa italiana e substituirá a
representação de cenários em duas dimensões. Os volumes substituem as
superfícies planas. (DEL NERO, 2009). A iluminação deve ser tida como uma
ferramenta de representação do meio dramático, de maneira ágil, dinâmica e que dê
vida ao espaço. “Música do espaço, a luz, entre outras funções, tem o poder da
sugestão e o de fazer ver ao espectador não a realidade, mas como o sentimento da
realidade envolve os personagens.” (DEL NERO; 2009, p. 220).

FIGURA 21 – DESENHO DE APPIA PARA A ÓPERA “TRISTÃO E ISOLDA”

FONTE: DEL NERO (2009)

Analisando a obra de Appia cronologicamente fica evidente uma evolução no


sentido da purificação, renunciando a qualquer representação descritiva buscando
sempre a pureza da plasticidade e um espaço abstrato com o rigor da geometria.
Para ele, corpo e espaço necessitam de uma união orgânica através do ritmo da
música. (DEL NERO, 2009). Para valorizar a plasticidade da figura humana Appia,
na visão de Del Nero (2009, p. 221), “[sic] concebe os espaços rítmicos compostos
de volumes horizontais e verticais, de degraus que chegam a planos elevados e
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inclinados, os quais ilumina com parcimônia.” Appia desenvolveu sua arte em busca
de uma utopia na arte viva aberta para todos, abolindo até mesmo a noção de
representação.

FIGURA 22 – DESENHO DE APPIA PARA “OURO DO RENO”

FONTE: DEL NERO (2009)

Este novo conceito de arte social proposto por Appia carregava consigo a
ideia de um novo lugar teatral, “a sala, a catedral do futuro, espaço livre, vasto e
transformável, capaz de acolher as manifestações das mais diversas de nossa vida
social e artística.” O que ele busca é um edifício teatral e uma cenografia cujo
mundo todo seja o palco, servindo a qualquer espetáculo.

Sobre as contribuições de Appia no período Del Nero relata:

“O ano de 1892 foi rico para o teatro moderno: Appia faz desenhos para
Ouro do Reno e Valquírias, além de desenhar a mise-en-scène de Mestres
Cantores de Nuremberg e de Tristão e Isolda. No fim desse ano termina a
Mise-en-scène do drama wagneriano, o primeiro dos três livros que
publicou.” (DEL NERO; 2009, p.228).

Edward Gordon Craig foi revolucionário na prática teatral fazendo oposição


ao uso dos grandes painéis em duas dimensões vigentes na época. Certa vez
tocado pela música de Bach, mais precisamente “Paixão segundo São Mateus”, foi
inspirado pela geometria e matemática presente nesta obra germinando assim seu
40

desejo de inovar na cenografia. Percebeu como Bach criava climas e tensões


musicais relativos aos sentimentos humanos e os traduziu para a linguagem física
do cenário no espaço teatral. Segundo Del Nero (2009, p. 250), “[sic] desenha um
gigantesco cenário de degraus que sobem para o infinito. É seu projeto para a
Paixão segundo São Mateus.” Esta influenciará Geddes para a “Divina Comédia” e
posteriormente Svoboda em “Édipo Rei”. Um de seus trabalhos mais importantes foi
para “Hamlet” embora a tecnologia da época não permitisse sua correta execução.
Era composta por painéis móveis que se moveriam tanto na vertical quanto na
horizontal, mas devido às limitações do período não funcionaram como pretendido.

FIGURA 23 – IDEIA DE CRAIG PARA “PAIXÃO SEGUNDO SÃO MATEUS”

FONTE: EDWARD GORDON CRAIG (2022)

Appia também deixaria discípulos sendo um deles Norman Bel Geddes.


Sendo também influenciado por Gordon Craig, Geddes se tornou famoso devido ao
seu trabalho na cenografia para a Divina Comédia de Dante Alighieri. “[sic] era um
construtor de escadas monumentais com formas geométricas irregulares para o uso
da iluminação. Seus efeitos transcendiam as alturas de uma caixa italiana e
tornavam-se estratosféricos.” (DEL NERO; 2009, p. 267).
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FIGURA 24 – CENÁRIO PROJETADO POR NORMAN BEL GEDDES

FONTE: DEL NERO (2009)

Joseph Svoboda acumulou diversas funções ao longo de sua vida e deixaria


para sempre grande influência nos trabalhos que o sucederiam. Foi diretor do Teatro
de Praga, transformando a cidade, junto a outras importantes figuras do período, em
um centro universal para a arte cênica. Recebia diversas pessoas dispostas a
aprender, na teoria e na prática sobre o teatro. (DEL NERO, 2009).

FIGURA 25 – CENÁRIO DE SVOBODA PARA A ÓPERA “TOSCA”

FONTE: DEL NERO (2009)


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Tinha uma maneira única de cenografar suas peças, detentor de, segundo
Del Nero (2009, p. 269), “[sic] maneiras grandiloquentes de encenar os clássicos e a
nova dramaturgia.” Teve trabalhos realizados nos maiores teatros do mundo e
contribui em diversos setores ligados a cenografia, Del Nero (2009, p. 269), diz “[sic]
nos campos da óptica, da iluminação, da cinética cenográfica e dos novos meios
para fazê-lo. Foi quem mais realizou os sonhos de Appia e Craig. Uniu ilusão e
expressão, técnica e arte.” A obra de Wagner pode ser considerada uma ponte entre
os trabalhos de Appia e Svoboda. (DEL NERO, 2009).

FIGURA 26 – CENÁRIOS DE SVOBODA PARA ROMEU E JULIETA

FONTE: DEL NERO (2009)


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3 ILUMINAÇÃO CÊNICA

3.1 BREVE HISTÓRICO DA ILUMINAÇÃO CÊNICA

A cena é aqui compreendida como um acontecimento no qual o artista


opera conceitos e ações estético-poéticas para a criação de uma obra cuja
ocorrência se dá em lugares escolhidos para abrigar seu encontro-confronto
com o público, sem o qual ela não se efetiva. (TUDELLA; 2017, p. 21-22).

Como o trecho acima diz, a obra teatral só existe quando executada para um
público, mas tal ponto levanta a questão sobre quando a luz deve ser introduzida no
desenvolvimento da peça para que seja considerada manifestação artística. Para
Tudella o trabalho do iluminador, a dita “montagem da luz”, começa, ou deveria
começar, logo nos primeiros ensaios, quando atores interagem com o texto, entre si
e não poucos dias antes da estreia, problema que aponta em sua dissertação.
Mesmo que não exista ainda um cenário, e até mesmo na ausência de palco, os
atores acabam por criar de forma virtual o lugar artificial da cena quando se
deslocam na sala de ensaio. Embora o autor se mostre preocupado com essa
participação do profissional da luz em etapas anteriores na criação de obras teatrais
Tudella enfatiza que as ideais e visões do iluminador ocorrem mesmo antes dos
ensaios em um estado que ele chama de “pré-cênico”, de acordo com Tudella (2017,
p. 20), “[sic] um processo vivo, constituído por todas as atividades que ocorrem
desde as primeiras ideias que levam à realização espetacular.”
Esta interação com a luz, mesmo nos ensaios, se faz necessária pois
diversas obras possuem a intenção de, através das falas, segundo Tudella (2017, p.
19), “compartilhar com o fruidor, não somente o lugar e o tempo da ação, mas
também a atmosfera de cada espetáculo, ou cena.” Neste momento de estudo
também podem ser sugeridas e testadas formas de uso da luz que evoquem
simbolismos que complementem a noção de cada ação, lugar, tempo ou atmosfera.
A influência da luz vai além, até mesmo se relacionando com os motivos e
desdobramentos do movimento dos personagens, tendo forte relação com a
argumentação da ação dramática. De acordo com Tudella (2017, p. 20), “Há algo
que provoca o movimento da personagem, levando-a a interagir com o mundo.” O
autor do texto dramático revela sua visão sobre este processo na maneira como a
44

desenvolve, o iluminador por sua vez observa estas relações e elabora sua própria
interpretação sobre como a peça será vista.
Ainda sobre a importância da luz na obra teatral cabe ressaltar que a criação
de um espetáculo é uma obra plural e que as disciplinas empregadas não são
estabelecidas de maneira hierárquica e nem mesmo de forma sequencial. O uso da
luz, no seu conceito máximo de algo que mostra o físico existente e o imaterial
subjetivo, permeia o processo em todas as suas etapas , não se submetendo a
ordens pré-estabelecidas e outros rigores impositivos. (TUDELLA, 2017).

“Quando me refiro à luz, é evidente, quero dizer, a atividade luminosa, e não


usá-la apenas para enxergar. (APPIA; 1986, p. 77, tradução nossa).

Sobre o trecho de Appia é importante destacar o significado de dois termos


são eles, visibilidade e visualidade. Hall Foster, crítico de arte e historiador, membro
da Academia Norte-Americana de Artes e Ciências, procura os definir no trecho a
seguir:

Embora o termo visão sugira o ato de ver como uma operação física, e
visualidade como um fato social, os dois não se opõem, como aspectos da
natureza, à cultura: a visão é social e também histórica, e a visualidade
envolve o corpo e a mente. (FOSTER; 1988, p. 9, tradução nossa)

Ele procura mostrar que, além de haver diferenças entre si, esses conceitos
demonstram uma tensão positiva no próprio processo visual, uma tensão que gera
interação entre o mecanismo da visão, suas técnicas históricas, os dados da visão e
suas determinações discursivas, com diversas diferenças entre a forma que vemos,
a forma como somos capazes, permitidos, ou induzidos a ver e a maneira como
compreendemos essa forma de enxergar. (TUDELLA, 2017).
A visualidade se relaciona à atitude crítica que orienta o iluminador e confere
postura estético-poética à sua contribuição para a práxis cênica. Enquanto jogar luz
sobre a cena gera apenas visibilidade. O estudo de aspectos técnicos, estéticos e
poéticos de tal atividade, caracteriza a visualidade de um espetáculo. A visualidade
não está presente apenas no que é considerado um espetáculo de sucesso, naquele
que é aclamado pela crítica ou pelo público, mas em toda e qualquer manifestação
artística. A forma como o iluminador define o que será visto, como irá construir sua
45

narrativa visual é o que determina a identidade artística de sua proposta. Ao assumir


a tarefa de criar e planejar a luz para um espetáculo, o artista assume também a
obrigação de conceber uma proposta estético-poética e não somente a tarefa de
operar máquinas e instrumentos. Além disso, quanto mais o iluminador se dedicar a
visualidade seus símbolos e mensagens, mais ele se apropria de seu próprio
discurso estético-visual, o tornando cada vez mais capaz de mover e comover seu
público. (TUDELLA, 2017).

‘’Quando, por fim, um arquiteto descobre que a luz é o tema central da


Arquitetura, então, começa a entender algo, começa a ser um verdadeiro
arquiteto’’ (BAEZA; 1996, p. 53, tradução nossa).

Em toda a história dos espetáculos a preocupação com a luz sempre se fez


presente. Inicialmente apenas pela necessidade básica de se enxergar o que era
representado, mas é possível deduzir que os efeitos além desta simples função
vieram logo em seguida. Os gregos utilizavam a luz do sol e sincronizavam suas
peças para que terminassem junto com o pôr do sol dando ao fim do espetáculo um
desfecho dramático pelo apagar das luzes encerrando a possibilidade de se ver o
que era apresentado. Em Roma algumas opções são trazidas ao palco com o uso
de tochas, lamparinas a óleo e velas que devido a própria natureza da fonte
luminosa, que gerava pouca iluminação, acabaram por incorporar ao espetáculo
intrincado jogo de sombras. Até o domínio da iluminação utilizando gás a maior
preocupação na iluminação era a visibilidade. (RATTO, 2001).

FIGURA 27 – CANDELABRO ROMANO

FONTE: BIDDR (2022)


46

Os dramas litúrgicos aconteciam nas igrejas e a iluminação de tais peças era


filtrada pelos seus vitrais enquanto, as peças de comédias satíricas e apresentações
de circo, eram feitas em tavernas ou castelos onde archotes e tochas eram
empregadas. Na renascença os teatros possuíam grandes janelas já projetadas com
essa finalidade de iluminar, as quais eram abertas em peças durante o dia, enquanto
a noite as velas iluminavam, mesmo que precariamente, o espaço teatral. Diversos
candelabros foram utilizados durante os séculos XVII e XVIII, sendo de grandes
proporções, iluminando tanto palco como plateia. No teatro elisabetano a luz solar
ainda era muito explorada através de grandes aberturas na cobertura e durante
exibições à noite era comum que os atores entrassem em cena munidos de tochas e
velas. A vela foi ainda muito utilizada e tentou-se variar o material de que eram feitas
mas sem maiores sucessos. Lampiões também foram explorados mas seus
inconvenientes combustíveis geravam mais problemas que soluções, com
vazamentos e riscos de incêndios. (PEREZ, 2002).

FIGURA 28 – EVOLUÇÃO DE FONTES LUMINOSAS

FONTE: DEL NERO (2009)

Somente com a tecnologia luminosa do gás foi possível ter controle sobre as
gradações da intensidade luminosa, embora limitado pelo odor exalado,
principalmente em ambientes fechados, e pelo altíssimo risco de incêndio. Esta
técnica tornou mais fácil a transição da representação do dia e da noite, livrando o
espaço teatral das manchas e da fumaça do uso do óleo. A inventividade dos
47

cenógrafos e iluminadores deste período merece atenção pois apesar das severas
limitações no uso da luz no palco, conseguiam através de engenhosas e, ao mesmo
tempo, simples invenções criar efeitos surpreendentes. Um deles era a necessidade
de escurecer o palco subitamente sem apagar a fonte luminosa que consistia em
algum tipo de chama acesa.
No livro de Sabbatini, Prática para fabricar cenários e máquinas de teatro ele
descreve uma prática solução para este problema. Consistia em cilindros de ferro
com uma cobertura na parte superior fosco que posicionados sobre as fontes
luminosas desceriam ao movimento de uma alavanca envolvendo a origem da luz e
desta forma gerando a escuridão necessária. Da mesma forma, ao operar a mesma
alavanca estes cilindros se elevariam trazendo novamente a luz ao palco. (RATTO,
2001).

FIGURA 29 – MECANISMO DE SABBATINI

FONTE: RATTO (2001)

“Nada mais emocionante, no silêncio de uma sala vazia, na obscuridade na


qual mergulha o cenário, do que fazer surgir do nada algo que está presente
esperando para ser revelado.” (RATTO; 2001, p. 93).

A exploração dos efeitos da luz teve papel fundamental no desenvolvimento


da pintura e muito dos efeitos de luz apresentados nas telas serviu de inspiração
48

para os efeitos reproduzidos nos palcos. Em alguns exemplos a luz se faz presente
mesmo sem a indicação de uma fonte luminosa real e factível. Na obra Os
discípulos de Emaús de Rembrandt a luz que irradia em torno da cabeça de Cristo
só pode ser creditada ao seu caráter divino, não correspondendo a uma fonte
luminosa física. Caso a intenção seja recriar este feito em uma peça, a luz deveria
partir da parte de trás do ator que representa Jesus e deve permanecer oculta para
que a magia da cena não se perca. O mesmo recurso é também empregado na obra
Tintoretto do mesmo pintor, mas dessa vez compete com uma luminária em outro
ponto da cena retratada. (RATTO, 2001).

FIGURA 30 – OS DISCÍPULOS DE EMAÚS POR REMBRANDT

FONTE: RATTO (2001)

Nos trabalhos de Caravaggio a luz também merece destaque pela maestria


com que é empregada. Em sua obra Vocação de São Mateus a luz parte de uma
janela, que não aparece na composição, e atinge primeiramente a figura de Cristo,
pelas costas, quando aponta para Mateus e o chama para o apostolado. A mesma
luz recai sobre a figura de Mateus que é o ponto focal da obra. (RATTO, 2001). A luz
neste caso provém de uma fonte real, e por possuir este componente de realidade,
ganha contornos simbólicos indicando que não é apenas luz mas sim o próprio
chamado para a vida sacra.
49

FIGURA 31 – VOCAÇÃO DE SÃO MATEUS POR REMBRANDT

FONTE: RATTO (2001)

Em “A alcoviteira”, de Gerard van Honthorst, a fonte luminosa tem ainda


mais força na composição. O pintor holandês posiciona velas em uma mesa que
iluminam com maior intensidade a jovem, que é o ponto focal da obra e centro das
atenções dos outros dois personagens, e além de acentuar a silhueta do rapaz que
está de costas para quem observa a tela, ainda ilumina de maneira mais fraca uma
senhora a esquerda da mesa. Aqui o efeito chiaroscuro é muito acentuado e as
figuras representadas estão imersas nas sombras evidenciando ainda mais a força
da vela em iluminar a cena. Caso se tentasse recriar a mesma cena no palco
apenas uma vela seria insuficiente. Seriam necessárias outras fontes de luz em
diversos ângulos que reforçassem a ideia de que apenas a vela ilumina a cena para
obter o mesmo efeito.
50

FIGURA 32 – A ALCOVITEIRA POR GERARD VAN HONTHORST

FONTE: RATTO (2001)

Com esta análise dos usos simbólicos e recheados de mensagens que a luz
assume na pintura, além de sua função meramente prática de tornar visível aos
olhos, é possível perceber que ela já era usada como veículo para transmitir ideias,
sentimentos e criar atmosferas capazes de transportar quem as observa para um
lugar de fantasia e com maior número de possibilidades de interpretação.
Resgatando um termo já explicado neste trabalho, alguns pintores já se
preocupavam com a visualidade presente em suas obras e não somente a
visibilidade pura e simples.

3.2 OBJETIVOS E PRINCÍPIOS

Valmir Perez enumera uma série de características que a luz deve assumir
no espaço teatral com um enfoque mais técnico e direto de seus usos. A luz deve
permitir a percepção (visibilidade) do espectador do palco de forma geral, mas
também ter a possibilidade de iluminar apenas partes do cenário quando necessário.
Deve manter a atenção do público concentrada nos atores porém também ser capaz
de explorar a tridimensionalidade do cenário, destacando suas formas, contornos e
demais elementos. Ser capaz de criar diferentes atmosferas e respostas emocionais
(visualidade) utilizando cores e intensidades diversas. Permitir a sensação de
diferentes horas do dia e da noite e também suas transições como amanhecer e
51

anoitecer. Produzir sombras e controlar suas formas e intensidades dando a elas


força e significado dentro da composição. (PEREZ 2002).
As propriedades mais importantes que a luz precisa possuir para ser
devidamente explorada são intensidade, cor, padrão e foco. A intensidade costuma
ser medida em lux, lúmens ou velas. Para todo instrumento voltado a iluminação a
intensidade esta diretamente ligada a potência de cada lâmpada, da forma e
característica desse instrumento, da utilização ou não de filtros, distância que se
encontra entre a fonte luminosa e o objeto ou ator a ser iluminado, o ângulo criado
pela posição do equipamento e sua relação com demais componentes da cena,
levando ainda em conta a reflexão, material e cor dos materiais e superfícies em
cena. A cor que a luz projeta é em grande parte resultado do gel colorido que é nela
utilizado, porém o poder de luminosidade da fonte também pode interferir nessa
percepção. A cor das superfícies e objetos iluminados também pode reagir com as
cores da luz gerando outras cores e variações de tonalidade. (PEREIRA, 2017).
Perez (2002), trata ainda do projeto de iluminação cênica destacando
alguns pontos importantes. Primeiro ele cita a importância de esboços e desenhos
que são refinados no decorrer do processo. O autor elenca uma série de pontos que
devem ser levados em consideração para a elaboração destes desenhos. São eles
as movimentações dos atores e o tempo que permanecem em cena, as áreas em
que irão atuar em cada cena, também as cores e formas presentes no cenário da
peça. Também cita as ideias abstratas ligadas a criação de atmosferas ligadas a
ideias e conceitos mais subjetivos. Ele ainda divide estas ideias em dois grupos,
desenhos e ideias, que em muito se assemelham a distinção que arquitetos fazem
entre conceito, ligado à ideia abstrata que motiva o projeto, e partido, sendo este
uma representação visual, seja ela gráfica ou na forma de maquetes de estudo.
Os desenhos buscam representar o palco, a posição das varas e torres de
iluminação, as quantidades e tipos de equipamentos que serão usados, as cores e
suas características como intensidade e tonalidades, demais ferramentas e
máquinas de apoio e outros componentes que carregam cor no cenário como os
figurinos e peças de cenografia.
As ideias tentam descrever pontos subjetivos da cena. O clima emocional da
cena, tipo de ambiente, o clima físico ligado às condições meteorológicas, a hora do
dia buscando demonstrar a trajetória do sol ao longo do tempo e a transição entre
dia e noite, o uso de palavras-chave que enquanto símbolos carregam uma ideia
52

abstrata, metáforas estas sendo muito usadas em todas as artes e detentoras de


grande capacidade dramática e por fim orientações do próprio diretor visando ajudar
na compreensão do espetáculo de forma geral.

3.3 ANGULAÇÃO E MODELAGEM ATRAVÉS DA LUZ

Com o advento da luz elétrica o seu controle e uso se tornou muito maior
quando comparado com as tecnologias anteriores, proporcionando uma nova forma
de linguagem através dela. Retomando ainda o emprego da luz na obra de
renomados pintores, estes não possuíam luz elétrica em seu tempo, mas mesmo ao
utilizarem as fontes de luz disponíveis quando criaram suas obras conseguiram
efeitos dramáticos impressionantes replicados até hoje no cinema e teatro. Esta
nova linguagem através da luz se dá pela variação dos ângulos com que ilumina
atores e cenário, como também pela variação de intensidade e cores. Quando estas
mesmas variações acontecem com mais de uma fonte luminosa as possibilidades
são incontáveis.
Graças a esta nova forma de iluminação novos movimentos teatrais surgem,
como o Naturalismo e o Simbolismo. O Simbolismo possuía propostas inovadoras,
sendo uma delas a iluminação na qual a . Para Roubine a luz elétrica traz outras
percepções da cena proporcionando uma transformação estética do espetáculo.
Vicenzia sobre o Simbolismo, de acordo com Vicenzia, (2006, p. 42), “[sic] a magia
da luz difusa – irreal – domina o espetáculo”. Já sobre o Naturalismo ela aponta:

A linguagem crua, direta, do naturalismo, inaugura outro tipo de iluminação,


sem os ‘claro-escuros’ misteriosos, do simbolismo. Parte-se do teatro ‘sem
mistério’ para uma linguagem sutil, onde a atmosfera é criada pelas
imagens poéticas, fluídas, por vezes encantatórias.” (VICENZIA; 2006, p.
42)

Um importante artista que reconhecia a importância do jogo entre luz e


sombra em suas obras foi Louis Jouvet, que teve passagem pelo Brasil na primeira
metade do século XX iluminado cenários simbolistas em Ondine, obra de Jean
Giraudoux, direção e iluminação de Ziembinski, cenografia por Santa Rosa.
(VICENZIA, 2006). Segundo Vicenzia (2006, p. 46), “O marco do simbolismo no
53

Brasil é [sic] a montagem de Pelléas et Mélisande, em 1943, pelo grupo Os


Comediantes.” Luiza Barreto Leite, atriz que interpretou a Rainha Geneviève nesta
mesma peça relata suas impressões sobre a iluminação no palco:

[sic] o cenário era todo em carrinhos, e Ziembinski jogou a luz em cima


daqueles carrinhos, de maneira que eles andavam, e parecia que Pelléas e
Mélisande andavam sobre a água. As cenas subiam e desciam com todo o
delírio, e havia aqueles elevadores que iam para baixo e de repente se tinha
a impressão que a pessoa tinha desaparecido na gruta, e as luzes caíam
em profundidade, e depois iluminavam, e depois ficava tudo escuro.
(VICENZIA; 2006, p. 46).

FIGURA 33 – MONTAGEM DE ZIEMBINSKI DA MORTE DE MÉLISANDE

FONTE: VICENZIA (2006)

Todo este jogo de luz e sombra descrito pela atriz em seu relato só é
possível pela variedade de ângulos e intensidades que a luz assume quando
trabalhada com uma sólida proposta estética. Segundo Perez (2002), para obter
estes e toda a gama de efeitos possíveis as luzes são posicionadas em varas de
iluminação na parte superior do palco ou estruturas posicionadas de maneira
semelhante. Os efeitos podem tanto reforçar a visualização do que é mostrado,
destacando os detalhes, como também pode ter a função de ocultar, jogando mais
sombras sobre a cena. Pereira cita:
54

Na linguagem técnica dos profissionais de iluminação cênica, quando não


há a necessidade de especificar um ângulo exato para a emissão da luz, os
efeitos produzidos são nomeados com alguns termos mais gerais como:
contraluz, luz a pino, luz lateral, luz frontal, etc. Estes termos deixam claro o
posicionamento da fonte luminosa em relação ao objeto ou indivíduo a ser
iluminado e ao solo.” (PEREIRA; 2017, p. 30).

Já quando o efeito requer maior precisão na descrição dos ângulos


utilizados a linguagem matemática e geométrica é necessária, podendo também ser
representada em desenhos técnicos que irão auxiliar no caso de variações do efeito
ou mesmo nas improvisações. (PEREZ, 2002).

3.3.1 Contraluz

Segundo Carvalho (2004, pg. 70), “Iluminação sempre posicionada por


detrás do objeto a ser iluminado; pode ser de 0 a 80 graus.” Segundo Figueiredo
(2022, não paginado), “Essa luz cria profundidade no espaço. Descola os elementos
do fundo que a luz frontal projeta para trás. Possui um grande apelo dramático e é
infalível no quesito criar belas atmosferas luminosas.” Na figura apresentada a
direita são utilizados gobos, que podem ser feitos de metal ou de vidro refratário
para resistirem às altas temperaturas provocadas pelo aquecimento destes materiais
em contato com os raios de luz. Os de metal possuem as imagens recortadas em
determinadas áreas e os de vidro possuem imagens estampadas no material. Esses
últimos propiciam projeções mais realistas.

FIGURA 34 – CONTRALUZ FIGURA 35 – CONTRALUZ COM USO DE GOBOS

FONTE: CARVALHO (2004) FONTE: FIGUEIREDO (2022)


55

3.3.2 Luz chapada

Segundo Pereira:

Luz posicionada na mesma linha do objeto a ser iluminado. Dá grande


destaque ao objeto ou ator iluminado, projeta a sua sombra dividida entre
chão e fundo de palco dependendo da distância entre a fonte, o objeto e o
plano de fundo. (PEREIRA; 2017, p. 31).

FIGURA 36 – LUZ CHAPADA

FONTE: CARVALHO (2004)

3.3.3 Luz de Chão

Sobre este assunto pesquisadores afirmam que:

Refletor posicionado no piso do palco. Muito utilizado para efeitos especiais.


Produz sombras aumentadas em relação ao tamanho real dos atores, bem
como dos objetos. Produz sensação de verticalidade quando lançada há
elementos do cenário. (PEREIRA; 2017, p. 32).

Geram grandes sombras bem definidas ao fundo quando feitas com spots
de lentes. Cria um efeito teatral de fantasia, devido à sua própria condição
anti-natural. Gera impressões fantásticas, assombrosas e irrealistas. [sic]
Remete ao aconchego de uma fogueira ou lareira. (FIGUEIREDO; 2022,
não paginado).
56

Na foto apresentada abaixo é possível ver na cena que para se obter o


destaque nítido de 3 atores através de refletores do piso, os refletores foram
colocados em ângulos cruzados e um centralizado, todos focados no rosto de cada
um dos atores.

FIGURA 37 – LUZ DE CHÃO FIGURA 38 – LUZ DE CHÃO

FONTE: CARVALHO (2004) FONTE: FIGUEIREDO (2022)

3.3.4 Luz Diagonal

Segundo Pereira:

Normalmente posicionada entre iluminação lateral e frontal. Por nesse caso


a fonte luminosa estar posicionada com uma angulação menor em relação
ao objeto, as sombras produzidas existem, mas são menores e geralmente
projetadas no chão. Pode-se usar mais de uma fonte luminosa, para que
sejam produzidas mais sombras a partir do mesmo objeto. (PEREIRA; 2017,
p. 32):

Figueiredo (2022, não paginado), se refere a este tipo de luz como luz
cruzada e sobre ela diz, “Observar que desta forma o corpo ganha grande destaque,
bem como aumenta a revelação tridimensional. Uma forma bem comum para
iluminar um/uma solista de um show musical [sic]”.
57

FIGURA 39 – LUZ DIAGONAL FIGURA 40 – LUZ CRUZADA

FONTE: CARVALHO (2004) FONTE: FIGUEIREDO (2022)

3.3.5 Luz frontal

Segundo Pereira:

Normalmente utilizada entre 30º e 60º. Semelhante à luz diagonal, porém a


fonte de luz é posicionada exatamente a frente do objeto a ser iluminado,
dando grande destaque à sua figura e fazendo com que a sombra seja
projetada para trás do mesmo. (PEREIRA; 2017, p. 33).

FIGURA 41 – LUZ FRONTAL

FONTE: CARVALHO (2004)


58

3.3.6 Luz lateral

Segundo Pereira (2017, p. 34), “Pode ser em diversas angulações desde 0º


a 80º normalmente colocada nas coxias laterais entre os bastidores. Produz
sombras laterais, deformadas ou não, dependendo da angulação no
posicionamento.” Figueiredo (2017, não paginado) a trata como “Cruzado Lateral na
Altura do Corpo” e sobre ela diz, “Essa afinação é fundamental para os espetáculos
de dança, pois favorecem o desenho tridimensional do corpo, e aumentam a nitidez
da revelação dos desenhos coreográficos executados pelo bailarino/bailarina.”

FIGURA 42 – LUZ LATERAL

Fonte: CARVALHO (2004)

FIGURA 43 – LUZ CRUZADA LATERAL NA ALTURA DO CORPO

Fonte: FIGUEIREDO (2022)


59

3.3.7 Luz à pino (Zenital)

Segundo Pereira (2017, p. 34), “Refletor disposto a 90º do objeto a ser


iluminado. Dá grande destaque ao personagem, porém causando alguns efeitos
sombreados na feição.” Para Figueiredo (2022, não paginado), “A luz à pino cria
atmosfera de mistério e contornos contrastantes para o jogo luz sombra nos
corpos. Cria efeito de grande dramaticidade e plasticidade.” Muito utilizada em
espetáculos de dança, porém requer certos cuidados em peças de teatro que sejam
muito dependentes da expressividade do ator em cena pois ocultam suas feições
dificultando a interpretação de suas falas e atitudes.

FIGURA 44 – LUZ À PINO FIGURA 45 – LUZ À PINO EM ESPETÁCULO DE DANÇA

FONTE: CARVALHO (2004) FONTE: FIGUEIREDO (2022)

3.3.8 Luz rebatida

Segundo Figueiredo (2022, não paginado), “Projetada sobre um ciclorama


ou parede de cenário a luz rebatida opera pelos efeitos residuais que ela gera no
espaço, além das áreas de incidência direta.” Este formato de iluminação altera a
figura dos atores e os transforma em forte silhuetas no palco. De acordo com
Figueiredo (2022, não paginado), “A cor quente ‘aproxima’ a figura para a plateia e a
cor fria ‘distancia’ a figura colocada na mesma posição.”
60

FIGURA 46 – LUZ REBATIDA QUENTE

FONTE: FIGUEIREDO (2022)

FIGURA 47 – LUZ REBATIDA FRIA

FONTE: FIGUEIREDO (2022)

3.4 CHIAROSCURO

O chiaroscuro, termo italiano para “claro-escuro” é uma das técnicas


revolucionárias da pintura renascentista do século XV. É definido pelo contraste
entre luz e sombra ao representar um objeto. Esta estratégia exige noções de
perspectiva, das características físicas que a luz cria nas superfícies, nos seus
brilhos, das tintas utilizadas e de suas variações tonais. O chiaroscuro não utiliza
linhas de contorno em todo o perímetro, mas destaca os objetos principalmente pelo
contraste entre as tonalidades do fundo. (LANDAU; PARSHALL, 1996).
61

O chiaroscuro busca representar, tanto no desenho como na pintura,


sombras com maior definição, imitando o volume. Essa técnica em grande parte não
dá muita importância a luz refletida, que é possível de ser visualizada na área de
penumbra, dessa forma grande parte das formas são definidas pelo fenômeno de
fechamento descrito pela gestault. (SCOTT, 1970; VIDAL, 2014).

FIGURA 48 – SALOMÉ COM A CABEÇA DE JOÃO BATISTA

FONTE: WIKIPEDIA (2022)

Buscar a origem precisa do surgimento desta técnica requer grande


aprofundamento histórico, o que não cabe neste trabalho, dessa forma este fica
restrito a expoentes da técnica como, em ordem cronológica: Caravaggio (1571–
1610) e Rembrandt van Rijn's (1606–1669).
Caravaggio foi peça fundamental no desenvolvimento do Tenebrismo,
movimento onde o chiaroscuro se tornou ferramenta central de composição. Nascida
no Barroco, se perpetuou de maneira irregular até o Romantismo. O nome é
derivado de tenebra (treva, em latim). Na obra acima é possível ver como a figura de
Salomé é banhada pela luz que vem da esquerda e a sombra de sua cabeça logo é
seguida pela figura de uma idosa com profundas marcas em seu rosto envelhecido.
A figura de um jovem, este de costas para quem observa a tela, é também iluminada
pela mesma fonte evidenciando a presença de uma única fonte luminosa. A cabeça
de João Batista, devido a posição na bandeja, acaba por ser iluminada apenas na
62

sua porção superior. Todas as figuras representadas estão mergulhadas em uma


profunda escuridão fazendo com que as porções mais escuras se dissolvam nas
trevas.

FIGURA 49 – AUTORRETRATO POR REMBRANDT 1658

FONTE: WIKIPEDIA (2022)

Rembrandt explorou muito uma temática que ganhou maior força após o
tenebrismo ao representar cenas noturnas iluminadas por velas, muito popular nas
primeiras décadas do século XVII. Em toda a sua carreira oscilou entre diversos
estilos mas para o foco deste trabalho sua maior contribuição foi a do seu último
estilo adotado. O uso que fez da luz neste período seria mais tarde no cinema e é
até hoje muito utilizado no cinema. Ao iluminar o objeto por um lado e utilizar um
anteparo do outro, consegue uma variação da intensidade da luz que destaca a
figura ao mesmo tempo que a mantém imersa em uma sombra controlada. O traço
mais aparente da técnica talvez seja o aparecimento de um triângulo apontando
para baixo abaixo do olho que esta ao lado com menor iluminação. Este efeito é hoje
chamado de “luz de Rembrandt”.
63

FIGURA 50 – SISTEMA PARA LUZ DE REMBRANDT

FONTE: Wikipedia (2022)

FIGURA 51 – CENA DO FILME BLADE RUNNER

FONTE: BLADE RUNNER (1982)

3.5 DESENHO DE ILUMINAÇÃO – APRESENTAÇÃO DE PROJETO

Para ser qualificado como um projeto que trata a luz para a cena, dentro do
modelo mencionado, ele precisa apresentar um determinado conjunto de
documentos que registrem (grafem ou gravem), precisamente, todos os
procedimentos referentes à contribuição da luz para o espetáculo.
(TUDELLA; 2017, p. 31).

Ainda segundo Tudella (2017), devem conter também uma apresentação


resumida da concepção estético-poética do profissional de iluminação, um texto
curto com cerca de uma página, a disposição gráfica dos equipamentos e utensílios,
64

um plano de uso destes, incluindo croquis, roteiro de operação, planilhas e


desenhos técnicos, em escala apropriada.

FIGURA 52 – CROQUIS DE ESTUDO DA PEÇA BABEL

FONTE: BABEL (2013)

Segundo Perez (2002), existem componentes de vital importância para que


a representação gráfica da iluminação em cena seja bem compreendida, tanto na
etapa de projeto quanto na conclusão. São eles os elementos principais do desenho
de iluminação: espaciais, estruturais, dimensionais, cenográficos, mecânico-
dinâmicos, elétricos e energéticos, ferramentais, formais, espectrais e também
psicológicos e climatológicos,
Os elementos espaciais proporcionam uma visão ampla e ao mesmo tempo
detalhada do formato dos espaços aplicados em uma cenografia sendo de forma
geral representados em planta baixa. Este formato torna mais fácil o entendimento
do espaço como um todo. Caso haja a necessidade também podem ser
representados por vistas frontais, laterais e até mesmo em perspectiva variando em
função do tipo de espaço representado e nível de detalhes. Nestes desenhos
usualmente são inseridos palco e plateia, contudo isto depende das necessidades
de cada espetáculo. Algumas performances modernas podem utilizar diversos
espaços não ortodoxos disponíveis no edifício utilizado e todos devem ser incluídos
nos desenhos de representação evitando desenhos que não tenham influência no
desenvolvimento da peça evitando assim confusão de informações.
65

FIGURA 53 – PLANTA BAIXA DO CENÁRIO “PALÁCIO DO DUQUE”

FONTE: RIBEIRO (2003)

Os elementos estruturais descrevem as estruturas de suporte técnico


disponíveis no edifício como:

Varas de iluminação, varas de cenografia, palcos móveis, urdimento,


pernas, coxias, bambolinas, cicloramas, arandelas, torres, mezaninos,
escadas, proscênio, cortinas, elevadores, macacos hidráulicos, malaguetas,
quarteladas móveis e fixas, manobras, sistemas de hidráulica (efeitos com
água), espelhos, etc. (PEREZ; 2002, p. 40).

Estes possuem importância especial pois têm grande impacto na disposição


dos equipamentos de luz nas estruturas do espaço. Um exemplo prático seria a
disposição das varas de iluminação no edifício teatral e a maneira como são
distribuídas no espaço, pois estas definem como serão fixadas as luzes no
espetáculo e também ajustes como ângulos de campo e foco das lentes. Desta
forma as peças de cenário devem se adequar ao padrão ditado pelos equipamentos
de iluminação pois é mais conveniente mover o cenário que as varas de iluminação
o mesmo ocorrendo com as marcações dos atores e elementos cênicos.
66

FIGURA 54 – CORTE DO CENÁRIO “RUA ESCURA”

FONTE: RIBEIRO (2003)

Os elementos dimensionais dizem respeito aos mapas de iluminação, os


quais devem seguir rigorosamente a escala e as dimensões métricas do espaço em
questão. A importância destas medições e distâncias impacta também na abertura
focal dos equipamentos de iluminação que iriam definir a forma e intensidade no seu
uso. Se os desenhos técnicos e as marcações em cena respeitarem a escala e
padrões definidos o resultado final será facilmente ajustado permitindo adequações
e ajustes sem comprometer a qualidade da iluminação.

FIGURA 55 – ESQUEMA DE ESTRUTURA FIGURA 56 – RESULTADO FINAL

FONTE: BABEL (2013) FONTE: BABEL (2013)


67

Os elementos cenográficos são os responsáveis pela percepção da estrutura


funcional da luz, tendo papel importante nos mapas de iluminação e também no
próprio espetáculo. A harmonia entre desenho cenográfico e de iluminação gera
uma compreensão do espaço como um todo.

Camas, mesas, cadeiras, paredes, janelas, jardins, balcões, etc, formam a


base real das dimensões do espaço. São componentes imprescindíveis na
composição do desenho de iluminação. Até porque, a iluminação encontra
no espaço físico seu objeto final de construção. (PEREZ; 2002, p. 50).

A iluminação tem papel importante ainda que o cenário seja constituído por
apenas planos de fundo bidimensionais pois deve iluminá-los de maneira apropriada
os revelando da melhor forma possível.
Os elementos mecânico-dinâmicos estão relacionados com as novas
tecnologias de representação gráfica. Com a evolução de softwares de
representação da luz esta nova forma de produzir e comunicar acaba por
complementar, sem nunca substituir, o desenho técnico. Por possuírem grande
complexidade os desenhos de movimentação cenográfica sempre requerem novas
formas complementares de representação e com a popularização de arquivos no
formato digital estes estão agora ainda mais perto do público em geral.

FIGURA 57 – TEATRO MUNICIPAL CHACAO

FONTE: ARCHDAILY (2022)


68

Os elementos elétricos e energéticos dizem respeito aos sistemas elétricos e


toda forma de energia que atua nas fontes luminosas. Aqui é também utilizado o
termo energético pois nem todo espetáculo se vale apenas da luz elétrica, podendo
citar como exemplo peças que são iluminadas por velas, lampiões ou outras fontes
além da energia elétrica.

Dos elementos básicos elétricos do desenho, pode-se citar os seguintes: os


pontos de ligação (tomadas) das varas de iluminação, arandelas,
mesaninos, tomadas de chão, tomadas de escada, fiações principais, multi-
cabos de troca de informação, quadros de tensão, sistemas de distribuição
via cabos, interruptores de serviços, interruptores de maquinaria, sistemas
de luzes de emergência, controles de sistemas de ar-condicionado,
sistemas de controle de combate ao fogo, sistemas de controle de
ventilação, etc. (PEREZ; 2002, p. 52).

Todas estas informações constam nos mapas de sistemas energéticos e só


devem aparecer nos mapas de iluminação quando necessárias e onde tenham
contribuição estética. O foco deste tipo de senho é na informação técnica facilitando
a comunicação das informações para a montagem e sempre levando em conta a
segurança das instalações. Cabe destacar que informações ligadas à segurança
ganham maior relevância em determinados projetos. Um exemplo seria uma peça
que utiliza tochas, ou outro material relativo ao fogo, no cenário fazendo com que os
desenhos destacassem com rigor as distâncias de afastamento de materiais
inflamáveis das fontes luminosas.

FIGURA 58 – CENÁRIO DE "A EMPAREDADA DA RUA NOVA"

FONTE: PORTALMUD (2020)


69

Elementos ferramentais do desenho indicam os aparatos que o criador utiliza


para solucionar responder questões estéticas. Segundo Perez (2002, p. 52),
“Refletores, equipamentos de efeitos, periféricos, mesas de controle, maquinarias,
etc. São [sic] os elementos principais do desenho. Inclui-se [sic] no caso de
refletores: tipo, potência, fabricante, modelo, acessórios, etc.” Os refletores utilizados
devem ser todos representados e numerados para que possam ser identificados em
planilhas de controle. Uma medida que pode facilitar o entendimento do desenho é a
representação destes refletores indicando sua direção focal.
De acordo com Perez (2002, p. 52), “Máquinas e equipamentos de efeitos
especiais também devem ser adicionados ao desenho e suas devidas explicações
de funcionamento, manutenção e operação devem seguir em anexo à parte.” A
indicação das mesas de controle geralmente ocorre quando os espetáculos são
realizados em espaços alternativos devido a posição que esta ocupa em meio ao
público e o posicionamento de cabos elétricos ou de comunicação. Outro ponto
importante sobre a mesa é a necessidade que o operador tem de visualizar o palco
enquanto opera todos os mecanismos. Demais máquinas utilizadas, como máquinas
de fumaça, ventiladores e outros equipamentos de efeitos também devem ser
representadas de modo a favorecer o entendimento de seu uso utilizando além da
planta baixa também desenhos laterais, frontais e perspectiva.

FIGURA 59 – CENÁRIO COM USO DE FUMAÇA

FONTE: HALPIN (2008)


70

Os elementos formais do desenho envolvem a criação de um mapa de


ambientes. Esse mapeamento é muito importante pois facilita o entendimento sobre
quais áreas receberão iluminação e de que forma. Podem ser utilizados diversos
formatos de representação como plantas baixas, vistas frontais, laterais e
perspectivas com o objetivo de representar da melhor forma possível e com riqueza
de detalhes quais áreas serão iluminadas, e por conseguinte, quais permanecerão
nas sombras. Há de se levar em conta que isto não depende apenas da
representação gráfica mas também da qualidade da montagem deste cenário, das
escolhas e ajustes adequados dos equipamentos. De maneira geral as áreas
definidas por esses elementos são, de acordo com Perez (2002, p. 53), “gerais,
focos, banhos, laterais, efeitos de solo, efeitos provenientes das quarteladas, efeitos
de interiores e exteriores de cenários e objetos, efeitos de iluminação focal em
atores, atrizes, adereços, etc.” Usualmente os elementos formais são nomeados
enquanto os ferramentais são numerados. Isto ocorre para que não haja confusão
em relação aos nomes e seu entendimento junto aos mapas.

FIGURA 60 – CENÁRIO DE “SENHOR COUVE FLORIDA”

FONTE: MASSETANI (2016)

Os elementos espectrais do desenho buscam representar as cores aplicadas


às fontes luminosas nos diversos formatos de filtros utilizados. Estes devem ser
indicados nas diversas plantas e mapas e são de suma importância para obtenção
71

do efeito desejado em cena. Caso estas indicações estejam apenas nas planilhas de
refletores os técnicos teriam problemas em identificá-las, o que dificultaria a
montagem. Para facilitar este processo por parte dos técnicos, os filtros, acessórios
e gobos, modelo ou dispositivo que cria padrões usando luz, devem estar indicados
nos mapas.
Os filtros e gobos possuem nomes padronizados e números indicados em
catálogos, devendo ser indicados junto aos desenhos dos equipamentos. Caso
sejam utilizados softwares para representá-los estes possuem bibliotecas que
seguem os padrões dos manuais. “No caso de utilização de gobos, torna-se
necessário às vezes a inclusão do ângulo de inclinação do desenho de projeção.
Isso é importante na medida em que as possibilidades de desenho projetado em
cenários, atores, adereços, elementos de cena e fundos, influenciam sobremaneira o
sentido exato da projeção na psicologia da cena.” (PEREZ; 2002, p. 54).

FIGURA 61 – CENÁRIO DE “AS YOU LIKE IT”

FONTE: FINKELSTEIN (2022)

Elementos psicológicos e climatológicos estão relacionados com as


idealizações poéticas da cena e seu caráter psicológico. Para que haja um melhor
entendimento ao transmitir um conteúdo tão subjetivo como a ideia de “clima” da
cena é comum a utilização de comentários junto aos desenhos indicando qual o
caráter de cada cena e sua atmosfera correlata. Estes elementos podem ser
divididos em categorias. Climatologia ambiental seria relativa às condições
72

climáticas como frio e calor. Emocional, ligadas a sentimentos e condições


espirituais como ódio, amor, felicidade ou glória. Estímulo visual, que busca criar
efeitos na retina do espectador. Construção física que tem como objetivo criar uma
cenografia luminosa gerando superfícies ou volumes. Sensibilidade orgânica busca
recriar ou indicar sensações como sabor, tato e odor. Tensão tenta recriar
momentos de apreensão ou deleite. E por fim a dimensão espacial que busca gerar
a sensação de expansão ou confinamento. (PEREZ, 2002).
73

4 ANÁLISE DE CORRELATOS

4.1 OTELO

Nome do espetáculo: Otello


Autor: William Shakespeare
Produção: José Cura
Projeto de cenografia: José Cura
Ano: 2013

FIGURA 62 – CENÁRIO DA ÁREA EXTERNA “PRAIA”

FONTE: CURA (2020)

Otello, espanhol para simplesmente Otelo em português, foi uma ópera


produzida em 2013 e apresentada no Teatro Cólon em Buenos Aires, Argentina.
Para a finalidade deste trabalho será aqui analisado o processo de criação da
cenografia para o espetáculo. O projeto cenográfico foi desenvolvido por José Cura
com o apoio de Silvia Collazuol e figurinos de Fernando Ruiz.
Esta produção se diferencia das demais por possuir um palco giratório
dividido em 3 partes que ao ser rotacionado revela as 3 opções cênicas. É
constituído por uma área externa de grandes proporções, representando uma praia,
e duas internas, sendo uma sala e um quarto. (CURA, 2020).
74

FIGURA 63 – PALCO GIRATÓRIO COM CENÁRIO “PRAIA” À FRENTE

FONTE: CURA (2020)

O estilo de encenação no qual a peça se insere é o do “Teatro Épico


Brechtiano” sendo composto por uma cortina preta que envolve todo o palco. As
paredes do castelo são cortadas e ficam contidas no disco giratório do palco dando
a sensação de que o observador espiasse o mundo claustrofóbico de Otelo. Os três
cenários, Praia, Sala e Quarto, buscam uma representação realista de seus
espaços, mas não respeitam limites arquitetônicos como pode ser evidenciado em
cenas em que a janela se mostra no mesmo nível da praia, o que seria improvável
para uma fortificação como um castelo. Outro ponto semelhante seria a abertura da
porta da frente do castelo que se conecta diretamente a Praia. De acordo com Cura
(2020, p. 3, tradução nossa), “Isso foi feito para manter a continuidade da ação,
guiando o espectador de um ambiente para outro, de acordo com as necessidades
do roteiro, mesmo dentro do mesmo ato: o proscênio é o quadro de uma câmera que
acompanha o trabalho em torno da ‘zona de ação’, restrita ao palco rotativo”.
Somente o manipulador Iago e seu comparsa Rodrigo, podem ir além deste mundo
e dirigirem-se ao público diretamente. (CURA, 2020).
75

FIGURA 64 – CENÁRIO “SALA” E CONEXÃO COM A “PRAIA”

FONTE: CURA (2020)

O cenário foi projetado utilizando softwares de modelagem computacional,


como pode ser visto no acervo de imagens disponíveis do espetáculo, e é possível
deduzir que as plantas e demais desenhos foram derivados deste recurso. A
montagem e alterações neste formato digital na fase inicial da criação são muito
atrativas e possibilitam mudanças rápidas, além de facilitar o entendimento e
comunicação em um palco com a complexidade de ser ao mesmo tempo três em
apenas um.

FIGURA 65 – CENÁRIO “PRAIA” NO FORMATO DIGITAL

FONTE: CURA (2020)


76

O espetáculo é dividido em 4 atos, ao contrário dos 5 atos em que a obra


original se divide. Ao acompanhar o texto com as orientações do diretor é possível
compreender melhor como os três cenários se relacionam e como se dá o fluxo de
ação dos personagens.
O primeiro ato acontece na “Praia” com muitas referências ao mar e às
disputas navais. Notas do diretor indicam raios e relâmpagos e também o barulho de
um mar bravio ao abrir deste ato. Otelo é celebrado por sua ação nas batalhas
marítimas enquanto Iago, junto a Rodrigo, simula uma falsa admiração por Cássio.
O palco gira acompanhando Iago à “Sala” que pelas notas do diretor devem ser
iluminadas apenas por tochas e pela lareira em certos momentos. Em outro ponto da
ópera o cenário gira acompanhando Otelo e seu primeiro encontro no espetáculo
com Desdêmona na “Sala” e esta parte do cenário se volta para o público utilizando
toda a boca do teatro substituindo o cenário “Praia”.

FIGURA 66 – CENÁRIO “SALA” E TOCHAS COMO FONTE DE LUZ

FONTE: CURA (2020)

O segundo ato inicia seguindo Iago, fazendo a transição entre “Sala” e


“Praia”. Mesmo com pouco avanço da peça aqui já é possível perceber como a
transição entre estes dois cenários “Praia” e “Sala” é frequente e como é acertada a
escolha do cenógrafo em não ser rigoroso quanto a arquitetura real em favor de um
maior dinamismo entre as cenas e ações dos personagens. Ainda nesta primeira
cena deste ato através das notas do diretor é possível identificar seu desejo de
indicar a passagem do tempo através da luz que incide sobre Iago buscando
representar o amanhecer. O cenário “Praia” torna a ocupar todo o palco.
77

FIGURA 67 – PALCO GIRATÓRIO COM CENÁRIO “SALA” À FRENTE

FONTE: CURA (2020)

Iago faz alguns monólogos descrevendo suas origens e começa a despertar


os ciúmes de Otelo sobre Cássio. O cenário oscila entre “Sala” e “Praia”. Iago fala a
Emília, sua esposa, sobre seu plano envolvendo o lenço. Ao final deste ato Otelo já
está muito perturbado e o diretor indica em suas notas que ao acorde final as luzes
se apaguem fazendo referência ao personagem sendo tomado pelas sombras.
O terceiro ato se inicia com as luzes, seguindo as notas do diretor, buscando
representar as últimas horas do dia. Otelo questiona Desdêmona sobre o lenço que
a deu de presente iniciando a armadilha de Iago. Desdêmona diz não saber onde
está o lenço aumentando a desconfiança do mouro que a pergunta sobre Cássio.
Iago incita Cássio a falar de Bianca para que Otelo a tome por Desdêmona
aumentando sua desconfiança sobre uma possível traição de sua amada. A noite
chega e para representá-la notas do diretor indicam que as tochas da “Sala” devem
ser acesas.
78

FIGURA 68 – PALCO GIRATÓRIO COM CENÁRIO “QUARTO” À FRENTE

FONTE: CURA (2020)

No quarto ato as tochas e lareira estão acesas para indicar a noite e pela
primeira vez o palco gira revelando o “Quarto”. A luz incide pela janela indicando os
raios da luz da lua. Otelo procura por Desdêmona no “Quarto” que se defende das
acusações mas Otelo não se convence e acaba por assassiná-la. Emília revela a
trama de Iago a Otelo e este se suicida sobre o corpo de sua amada.

FIGURA 69 – REFERÊNCIA DO DIRETOR PARA LUZ DA LUA NO “QUARTO”

FONTE: CURA (2020)


79

4.2 HOPPLA, WIR LEBEN!

Nome do espetáculo: Hoppla, wir leben!


Autor: Ernst Toller
Produção: Erwin Piscator
Projeto de cenografia: Traugott Müller
Ano: 1927

FIGURA 70 – TRAUGOTT MULLER

FONTE: GETTY IMAGES (2022)

Todas as artes reflectem, de uma ou outra forma, a sociedade do tempo a


que pertencem. [sic] A arte tem sido também um veículo de contestação
dos valores vigentes, manifestando-se através de um conjunto de signos
que procuram provocar reacções na sociedade. O teatro está, como toda a
arte, intimamente relacionado com o meio social onde surge e vai
reflectindo ao longo dos tempos os contextos e constrangimentos culturais,
sociais e políticos de cada período. (SOARES; 2010, p. 11).

A cenografia tem potencial para ser parte importante de um espetáculo


teatral que almeja expor o espectador com a realidade de modo a gerar uma reação
aos acontecimentos. Esta era a intenção de Piscator com suas obras sendo um
precursor deste teatro épico. As transformações sociais, técnicas e artísticas que
ocorreram ao longo do século XX, despertaram em alguns artistas uma poderosa
necessidade de instigar o senso crítico do espectador. Este novo formato de
80

espetáculo busca gerar em quem assiste uma postura ativa, enxergando o teatro
como uma crítica, de uma forma didática e mais realista. (SOARES, 2010).
Na obra de Ana Soares a leitura de uma das peças de Piscator foi dividida
em três itens. O dispositivo cênico, onde são analisados os elementos utilizados em
cena como grandes estruturas do cenário, volumes e mobiliário geral, bem como o
ângulo de enquadramento e abordagem visual da cena. O simbolismo apresentado
na cenografia como a interpretação dos elementos físicos e volumétricos utilizados
na cena e seu alcance subjetivo dentro da construção da imagem e narrativa do
espetáculo. E os agentes e processos que tratam da metodologia de construção e
montagem do espetáculo, dos profissionais envolvidos e meios de produção
aplicados. (SOARES, 2010).
Sobre o autor cabe destacar que Erwin Piscator (1893-1966) foi um diretor
alemão que vivenciou as duas guerras mundiais. Foi através do seu trabalho que se
começou a desenvolver o conceito de um teatro didático. Segundo Soares (2010, p.
13), “Um teatro que fosse capaz de provocar o público e de o ‘ensinar’, mostrando-
lhe como o sistema económico e político exercia repressão sobre o indivíduo.” Suas
obras eram sempre retiradas da história atual. Para Soares (2010, p. 23), “O seu
teatro ficou por isso conhecido como ‘Zeittheater’ (teatro contemporâneo).”

FIGURA 71 – PERFIL DE PISCATOR SOBRE A ESTRUTURA

FONTE: GETTY IMAGES (2022)


81

Seus espetáculos exigiam grande rigor técnico. Ele buscou facilitar as


mudanças e dinamizá-las utilizando aparatos já utilizados em óperas. Mas para
Piscator o cenário e suas máquinas não tinham a função de criar ilusões e sim de
auxiliarem a narrativa da mesma forma que o texto ou a música o fazem, e não
estão ocultos no palco, estando ali de forma real que integra todo o projeto.
(SOARES, 2010).
A Piscatorbühne, sua companhia de teatro, apresentou-se pela primeira vez
em 3 de Setembro de 1927, com a estreia do espetáculo “Hoppla, Estamos vivos!”.
Fez muito o uso de filmes e documentários sendo esta uma característica de todas
as suas peças neste período, assim como o uso de projeções com texto que pauta a
ação. Segundo Soares (2010, p. 26), “A intenção era fazer o espectador observar e
compreender a realidade e perceber que os valores que regem o mundo podem e
devem ser modificados. Partindo deste objectivo, Piscator escolhe temas da história
recente para poder confrontar o público com a totalidade dos eventos mundiais.”
Hoppla, Estamos vivos!, do alemão Hoppla, wir leben!, é uma obra do
escritor Alemão Ernst Toller publicada no mesmo ano da estreia no teatro, em 1927.
Ela contém prólogo e cinco atos. Ocorre no pós guerra da Alemanha, durante a
revolução de 1919. Soares descreve uma breve sinopse como:

Um grupo de revolucionários foi preso e condenado à morte e espera a sua


execução. Inesperadamente, são perdoados. Mas Karl Thomas, um dos
líderes, cede sob a pressão dos acontecimentos e é mandado para um
asilo. Aquando da sua libertação, oito anos mais tarde, este idealista
descobre que todos os antigos membros do grupo original tinham, de uma
ou outra forma, traído os seus ideais. Kilman, um deles, [sic] tornou-se
Ministro do Interior e insiste com Thomas para abandonar o seu idealismo.
Mas Thomas vê-o como um adversário e decide matá-lo. [sic] Thomas é
preso para interrogatório e acaba por se enforcar na sua cela, desesperado
com a humanidade. (SOARES; 2010, p. 29).

“A peça Hoppla, Estamos Vivos! foi a primeira produção da Piscatorbühne


no Teatro Nollendorfplatz. Trata-se de um teatro com palco à italiana (onde os
espectadores ficam apenas de frente, situa-se mais distante da plateia) e palco
rotativo.” (SOARES; 2010, p. 31).
82

FIGURA 72 – CENA COM APENAS 3 ESPAÇOS ILUMINADOS

FONTE: WIKIS (2022)

O espectáculo conta com 39 personagens. O cenário é projeto de Traugott


Müller e é composto de um andaime com três andares que definem três diferentes
espaços. Se apresenta em três seções verticais e a porção central ao meio fica livre
em toda sua área vertical, as laterais são divididas em três andares. Trechos da
peça que são mais emblemáticos são encenados nos espaços delimitados por estes
andares já as cenas que contam com um grande número de atores e necessitam de
maior espaço são realizadas a frente do cenário, enquanto na própria estrutura são
projetados vários filmes, ilustrações ou documentários ao mesmo tempo nas
diferentes porções dos andaimes. (SOARES, 2010).

FIGURA 73 – ESTRUTURA E SISTEMA DE PROJEÇÃO

FONTE: SOARES (2010)


83

As cenas acontecem saltando de um espaço para outro e em alguns


momentos ao mesmo tempo em dois espaços diferentes que se destacam pela
iluminação. Em outras cenas o espaço iluminado onde ficam os atores ganham
destaque enquanto em outro, igualmente iluminado, são projetadas imagens ou
textos relativos à ação. Todo o restante do espaço cênico fica oculto na escuridão.
(SOARES, 2010).

FIGURA 74 – CENA COM ATORES E PROJEÇÕES SIMULTÂNEAS

FONTE: SOARES (2010)

Uma prisão é representada na última cena em que o herói se encontra preso


e se comunica com os seus companheiros através de batidas nas paredes das
celas. O conteúdo destas mensagens é projetado no grande vão vertical ao centro
na área entre as celas. O cenário, desenvolvido por Traugott Müller, consegue de
forma muito clara realizar a transmissão da mensagem pretendida, mas demanda
um rigor técnico muito grande. A organização da estrutura por andares consegue
alterar diferentes espaços, como um hotel e uma prisão e da mesma forma as
divisões da sociedade e seus rigores sociais. (SOARES, 2010).
84

FIGURA 75 – DESENHO ESQUEMÁTICO COM PROJEÇÕES E CENÁRIOS

FONTE: WIKIS (2022)

As projecções exibidas na peça se dividem em três temáticas. Documentário


de caráter histórico, que busca situar o observador sobre o período e o local da
ação. O dramático, que potencializa a história e reduz os diálogos, como pode ser
percebido nas mensagens trocadas pelos prisioneiros em suas celas. O terceiro são
os próprios comentários que instigam os olhos do público para algum detalhe e
focam no aspecto moral da história. Como boa parte destas projeções são exibidas
simultaneamente, demonstra que o desejo de Piscator é transmitir um grande
volume de informação. Parte delas, como citações ou estatísticas, procuram
representar uma fonte de provas ou relatos de apoio às teorias sociológicas do
autor. Estas informações procuram dar ao espetáculo um tom de autenticidade e
fundamentação real de seus argumentos porém com um formato artístico e sensível
em consonância com a obra. Cabe destacar que este tipo de projeção era uma
inovação técnica dada a época em que foi empregada. (SOARES, 2010).
85

FIGURA 76 – CENA COM PROJEÇÕES EM TODA A ESTRUTURA

FONTE: SOARES (2010)

Por envolver um grande número de profissionais esta é uma produção cara


e complexa. Envolve o cenógrafo e vários técnicos de diferentes habilidades
relativas à montagem, iluminação e mesmo profissionais para produzirem e editarem
os filmes e projetá-los. Toda a estrutura do cenário pesa cerca de quatro toneladas e
tem oito metros de altura. Exigia um trabalho muito grande por parte dos técnicos
pois precisava ser desmontada para que os ensaios de outras peças ocorressem.

Tudo é desenhado e executado especificamente para esta peça. O cenário


é desenhado com detalhe (incluindo plantas, cortes e alçados) por Traugott
Müller, para depois ser executado e montado por técnicos. Originalmente,
os andaimes projectados por Müller estavam cobertos com telas brancas
que corriam em guias para mostrar a área de acção relevante. Mas ao longo
do processo de trabalho percebeu-se que as telas emperravam e decidiu-se
então deixar o esqueleto dos andaimes à vista. (SOARES; 2010, p. 33).

Apesar de toda esta riqueza de detalhes em seu projeto, sua operação e


montagem era complexa por incorporar além da atuação dos atores, filmes e
projeções em seu interior em partes específicas da estrutura, utilizando um elevado
número de profissionais. (SOARES, 2010).
86

FIGURA 77 – MAQUETE DA ESTRUTURA

FONTE: WIKIS (2022)


87

5 DOM CASMURRO

5.1 RESUMO DA OBRA E ADAPTAÇÕES

Dom Casmurro é um romance escrito por Machado de Assis e publicado em


1899. Seu protagonista é Bento Santiago, que narra a história em primeira pessoa.
Bento faz uma série de relatos de sua vida passando pela infância, vida adulta e
velhice tendo como foco sua vida junto a Capitu. Machado de Assis o escreveu
fazendo uso de recursos literários como a ironia e a intertextualidade, fazendo
referências, à peça Otelo, o Mouro de Veneza de Shakespeare, ambas envoltas em
ciúmes e ideias de traições.
Sua infância se passa com familiares próximos, na emblemática casa da rua
de Mata-cavalos, e com a própria família de Capitolina, que mora na casa ao lado. A
fase adulta, em que está casado com Capitu, se passa em uma casa próxima a
praia, mas esta conta com poucas descrições. Suas relações com Escobar e sua
esposa Sancha se estreitam neste período. Na velhice, já separado de Capitu e do
filho Ezequiel, ele faz construir uma casa igual à da infância no Engenho Novo,
tentando unir as duas pontas da vida, como ele mesmo diz no livro.

FIGURA 78 –RESIDENCIAS NAS OBRAS DE MACHADO DE ASSIS

FONTE: TRAGANTE (2014)


88

A história é ambientada no Rio de Janeiro do Segundo Império e logo no


terceiro capítulo ele especifica o ano de 1857 como o ano em que se passa a ação,
Bento está com 15 anos de idade enquanto Capitu 14. Reforço as datas e idades
para que se possa fazer a exata localização temporal dos tipos arquitetônicos. Ao
descrever a casa do Engenho Novo é possível reconhecermos as características
das duas, a de sua infância e a da velhice, pois ele fez esta construir da maneira
mais semelhante possível à primeira. Bento a descreve no segundo capítulo:

é o mesmo prédio assobradado, três janelas de frente, varanda ao fundo, as


mesmas alcovas e salas. Na principal destas, a pintura do teto e das
paredes é mais ou menos igual, umas grinaldas de flores miúdas e grandes
pássaros que as tomam nos bicos, de espaço a espaço. Nos quatro cantos
do teto as figuras das estações, e ao centro das paredes os medalhões de
César, Augusto, Nero e Massinissa, com os nomes por baixo... Não alcanço
a razão de tais personagens. Quando fomos para a casa de Mata-cavalos,
já ela estava assim decorada; vinha do decênio anterior. Naturalmente era
gosto do tempo meter sabor clássico e figuras antigas em pinturas
americanas. (ASSIS; 1994, p. 2).

O livro recebeu várias adaptações para teatro, sendo comum em grupo


amadores, onde se segue um rigor cronológico baseado na peça subtraindo grande
parte dos acontecimentos mantendo apenas as passagens mais emblemáticas para
que a peça fique dentro de um limite de exibição de uma hora e meia até duas
horas. A obra também recebeu adaptações em formato de filme. Uma delas “Dom
Casmurro” em 1968, mas foram alterados diversos elementos o que acabaram por
descaracterizar a obra em demasia. A adaptação mais moderna chamada “Dom”
lançada em 2013, se vale da metalinguagem e seus personagens são influenciados
diretamente pela obra, existente na trama, de Machado de Assis. O protagonista é
batizado de Bento pelos pais e apelidado de Dom pelos amigos. O próprio
protagonista se refere a sua esposa Ana como Capitu, e destaca suas
características semelhantes a personagem do livro de Machado durante o filme.
89

FIGURA 79 – POSTER DO FILME DOM

FONTE: WIKIPEDIA (2020)

Para a finalidade deste trabalho foi escolhida uma peça teatral adaptada do
livro com certo rigor cronológico e que preserva os acontecimentos mais marcantes
servindo ao propósito de ser uma marcação dos principais pontos a serem exibidos.
A peça intitulada “Dom Casmurro” foi exibida no teatro Coronel Raimundo em 2019.
Conta com direção de Rick Von Dentz e produção da Cia Realce, composta por Iraci
Batista e Marco Bueno.
Com cerca de uma hora e quinze minutos de duração, a peça narra a
trajetória de Bento iniciando nas disputas iniciais sobre sua ida ao seminário e seus
primeiros envolvimentos amorosos com Capitu. Narra também sua passagem pelo
seminário em que conhece Escobar e iniciam sua amizade. Bento abandona a vida
religiosa e se dedica ao direito e se casa com Capitu em 1865 enquanto Escobar se
casa com Sancha, amiga de Capitolina. Os ciúmes de Bento começam a se
manifestar em pequenos detalhes da vida cotidiana enquanto lamenta o fato de
ainda não ter tido um filho. Seu filho nasce e o batiza como Ezequiel em
homenagem a seu amigo Escobar. Suas desconfianças sobre a paternidade de seu
filho começam a surgir e são relacionadas às semelhanças com Escobar. A
proximidade de Escobar e Capitu acaba por aumentar os ciúmes de Bento. A morte
90

de Escobar no mar é representada de maneira simbólica com a figura de um homem


nadando em direção a uma mulher, ambos em meio a tecidos iluminados com luz
vermelha sendo um dos poucos pontos da peça com figuras de linguagem mais
pronunciadas. Os ciúmes de Bento se tornam tão intensos que intenções homicidas
começam a se manifestar e o personagem tem impulsos assassinos para com seu
filho e sua. Eles se separam e Capitu vai morar na Europa com seu filho. Após a
morte de Capitu, a morte de Ezequiel também se dá por um recurso visual, a figura
de seu filho aparece no palco em frente a Bento e após um abraço o ator narra os
acontecimentos que levaram a sua morte. A peça se encerra com Bento sozinho no
palco enquanto o barulho de um trem se aproximando busca unir o final do
espetáculo com o início da peça quando na estação de trem um poeta frustrado
chama o protagonista de Dom Casmurro.

FIGURA 80 – TRECHO DA PEÇA “DOM CASMURRO” 2019

FONTE: YOUTUBE (2020)

Embora com pouca exploração do cenário e apenas algumas cenas com


recursos visuais e simbólicos mais ousados, a peça serve como um referencial sobre
como seria uma adaptação teatral da obra de Machado de Assis. Focando na sua
relação com Capitu, seus dramas e pensamentos, a trama se desenvolve em seu
pequeno núcleo familiar. O tempo de exibição é curto e poderia ser estendido para
duas horas ou até mesmo três se fossem incluídos intervalos para o público. Peças
com duração ainda maior já foram produzidas mas fogem ao usual e demandam um
91

público diferenciado disposto a permanecer longas horas no teatro, o que não é o


foco deste trabalho.

5.2 RESUMO E APONTAMENTOS DA ADAPTAÇÃO PARA A TV “CAPITU”

A adaptação para a televisão no formato de minissérie foi objeto de diversos


estudos. Com forte uso de recursos visuais, metáforas e símbolos forneceu
elementos para pesquisas no campo da filosofia e psicologia buscando descrever os
traços psicológicos tanto de Bento como de Capitu. Contando com cinco episódios,
variando entre cerca de quarenta minutos até uma hora do episódio final, a obra
toda soma quase 4 horas de duração. Baseada no romance “Dom Casmurro” de
Machado de Assis, foi escrita por Euclydes Marinho com a colaboração de Daniel
Piza, Luis Alberto de Abreu e Edna Palatnik, tendo roteiro final e direção geral de
Luiz Fernando Carvalho.

FIGURA 81 – CAPA DO DVD DE “CAPITU”

FONTE: WIKIPEDIA (2022)


92

Seguindo a ordem dos capítulos do livro, e até mesmo citando seus títulos
quando a ação é representada, esta adaptação segue de forma cronológica os
acontecimentos, mantendo também trechos sem alterações da escrita. A obra conta
com dois atores no papel de Bento. Nas passagens referentes a sua infância Bento
é representado por César Cardadeiro, já na fase adulta e velhice Michel Melamed dá
vida ao personagem, sendo Michel também narrador está presente em quase todo o
espetáculo. Capitolina é representada por Letícia Persiles na infância e por maria
Fernanda Cândido nas fases posteriores. A obra conta ainda com Pierre Baitelli no
papel de Escobar e grandes nomes da teledramaturgia brasileira no elenco de apoio,
como Eliane Giardini no papel da mãe de Bento, Dona Glória.

Elenco:

Alan Scarpari – Ezequiel Santiago


Alby Ramos – Pai do Manduca
Antônio Karnewale – José Dias
Beatriz Souza – Capituzinha, filha de Sancha e Escobar
Bellatrix – Sancha
César Cardadeiro – Bento Santiago jovem
Charles Fricks – Pádua
Eduardo Pires – Jovem poeta
Eliane Giardini – Dona Glória
Emílio Pitta – Padre Cabral
Fabrício Reis – Ezequiel Santiago
Izabela Bicalho – Fortunata
Juliana Nasciutti, Kallanda Caetana, Leo Villas Boas, Letícia Persiles – Capitu jovem
Maria Fernanda Cândido – Capitu adulta
Michel Melamed – Bento Santiago adulto, Dom Casmurro
Paula Sofia | Paulo José – Vigário da paróquia
Pierre Baitelli – Escobar
Renata Nascimento | Rita Elmôr – Prima Justina
Sandro Christopher – Tio Cosme
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Cenografia e produção de arte: Raimundo Rodriguez


Figurino: Beth Filipecki
Direção de fotografia: Adrian Teijido
Música original: Tim Rescala e Chico Neves
Produção de arte: Isabela Sá
Coreografia: Denise Stutz
Produção de elenco: Nelson Fonseca
Caracterização: Marlene Moura, Rubens Libório, Deborah Levis
Sonoplastia: Aroldo Barros, Samy Lima
Produção musical: Tim Rescala
Efeitos especiais: Marcos Soares
Efeitos visuais: Eduardo Halfen, Rafael Ambrosio

A minissérie mescla ópera, teatro, cinema mudo e elementos da cultura pop.


Na recriação do diretor, Dom Casmurro contracenava com os acontecimentos de
sua memória como se entrasse no cenário de seu passado. Seu relato procurava
lidar com as fantasmagóricas memórias, emoções e dúvidas que carregava. Dom
Casmurro era o narrador não totalmente confiável definido por Machado de Assis,
que tem o olhar enviesado devido a suas fortes emoções. (MEMORIA GLOBO,
2022).

FIGURA 82 – CENÁRIO “QUINTAL” DA CASA DE MATA-CAVALOS

FONTE: MEMORIA GLOBO (2022)


94

Todos os personagens são representados sob a ótica da memória do


narrador, Bento. Seus familiares aparecem como caricaturas exageradas. Os
figurinos remetem ao século XIX, período do livro em questão. A ação em alguns
momentos tem como cenário o Rio de Janeiro moderno, mas mantém a narrativa
sob o enfoque da época do livro. Fazendo uso também de outros meios modernos,
como tatuagem em Capitu e trilha sonora moderna com rock de bandas nacionais e
internacionais, a obra faz referência a atemporalidade e universalidade da obra,
enquanto mantém os figurinos de época. (MEMORIA GLOBO, 2022).

FIGURA 83 – CENÁRIO “CASA DE MATA-CAVALOS”

FONTE: MEMORIA GLOBO (2022)

Capitu e suas tatuagens, um pássaro e uma bromélia, foram incorporados à


personagem. A planta foi reproduzida em Maria Fernanda Cândido com uma pintura
especial. Antes da minissérie, Maria Fernanda Cândido já havia interpretado Capitu
no filme Dom (2003), de Moacyr Góes, uma versão contemporânea da obra de
Machado de Assis. (MEMORIA GLOBO, 2022).
95

FIGURA 84 – CAPITOLINA E SUA TATUAGEM

FONTE: MEMORIA GLOBO (2022)

“Elementos como projeções, sombras, texturas e gelatinas ajudaram a


contar a história, que é constituída de lembranças. Como a arte e o figurino, a luz
também acompanhou o tom operístico da série.” (MEMORIA GLOBO, 2022, não p.).
As duas etapas da história de Bento e Capitu estão bem delimitadas pela
iluminação.

A infância é mais luminosa, de cor branca, sem muita interferência de


gelatinas artificiais; a maturidade ganha cores mais intensas, como o
vermelho, e as imagens são mais densas e contrastadas, com áreas claras
e escuras compondo o quadro. As projeções de sombras também
ganharam relevância na história. Quando Dom Casmurro está em sua casa,
uma reprodução da antiga casa da rua Matacavalos de sua infância, sua
família, Capitu e todos os personagens que povoam sua memória aparecem
como sombras projetadas em seu refúgio. (MEMORIA GLOBO, 2022, não
paginado)

Para dar forma a visão enviesada de Bento Santiago “Capitu” recebeu um


efeito especial exclusivo, “[sic] uma retina de cerca de 30 cm de diâmetro, cheia de
água, para criar dimensão ótica a partir da refração da água.” (MEMORIA GLOBO;
2022, não p.). Chamada de “lente-Dom Casmurro” por seu inventor, o diretor Luiz
Fernando Carvalho, foi utilizada nas cenas de Dom Casmurro em que são
96

representadas suas memórias e fantasias. A lente foi acoplada à frente da câmera


para “[sic] dar à imagem uma textura aquosa, como o mar de ressaca dos olhos de
Capitu, e também simbolizar o estado psicológico de Dom Casmurro, personagem
que flutua ou é arrastado pelas águas do tempo.” (MEMORIA GLOBO; 2022, não
p.).
“Capitu” foi toda filmada no grande salão na sede do Automóvel Club do
Brasil, no centro do Rio de Janeiro, alterado para representar os diferentes espaços
da memória de Dom Casmurro. Os ambientes se proliferaram através da cenografia,
da iluminação utilizada e do ângulo da câmera.

[sic] sua equipe revestiu as paredes e colunas [sic] com camadas de papel
para dar a aparência de ruínas [sic]. Os tetos de cores neutras e
descascadas e os antigos espelhos manchados pelo tempo foram mantidos.
O chão do salão foi pintado de preto, como uma lousa das salas de aula das
escolas. O quintal e o muro que separa as casas dos dois vizinhos foram
desenhados no chão, em giz. Um recurso metafórico para mostrar que
Capitu é capaz de imaginar e sonhar seu próprio mundo. (MEMORIA
GLOBO; 2022, não p.).

FIGURA 85 – CENÁRIO “QUINTAL” DESENHADO NO CHÃO EM GIZ

FONTE: MEMORIA GLOBO (2022)

Dado a proposta minimalista do cenário não existiam paredes. Portas, de


vários tamanhos em função da posição social do personagem eram móveis e
97

transportadas pelos próprios atores. A obra também contava com reduzido número
de objetos de cena, sendo estes obtidos de antiquários ou mesmo produzidos pela
equipe de direção de arte. “As camas de Dona Glória e Bentinho, assim como várias
cortinas e o trem que leva Bentinho ao seminário foram feitos de jornal, uma forma
de homenagear o romancista Machado de Assis e o próprio ato de escrever.”
(MEMORIA GLOBO; 2022, não p.). O mar bravio representado na cena em que
Escobar acaba afogado foi realizado pelos atores que agitavam um enorme plástico
azul. A rua era mostrada na obra coberta por uma sobreposição de cartazes com
rasgos e colagens criando um painel com várias faces.

O prédio em ruínas foi apontado pelo diretor como o lugar perfeito para
contar a história de um homem em ruínas, que não consegue resgatar o
que perdeu. Bentinho se transforma em um prisioneiro patológico de sua
própria imaginação e memória, um “doente imaginário”, como frisou Luiz
Fernando Carvalho, parafraseando Molière. (MEMORIA GLOBO; 2022, não
paginado).

FIGURA 86 – SEDE DO AUTOMÓVEL CLUB DO BRASIL

FONTE: MEMORIA GLOBO (2022)


98

6 ELEMENTOS E DIRETRIZES EXTRAÍDOS DA PEÇA E DA MINISSÉRIE

Dividindo a peça em 3 atos, infância, vida adulta e velhice, é possível


escolher uma cena emblemática de cada uma destas etapas que servirá como
amostra da proposta cenográfica apresentada neste trabalho. O cenário da primeira
cena será a “Casa da Rua de Mata-cavalos” e a ação correrá principalmente na sala,
com um grande número de atores em cena, mas também irá utilizar a varanda desta
mesma casa. A segunda cena apresentada será na casa do bairro da Tijuca e será
encenada na varanda voltada para o mar. Já a terceira cena ocorrerá na “Casa do
Engenho Novo” e será em um espaço muito semelhante ao da primeira cena, por
serem tecnicamente a mesma casa, mas o espaço utilizado será o porão de onde o
protagonista já idoso recitará seus monólogos para a plateia.

CENA 1
Dia. Casa da rua de Mata-cavalos. Interna (sala principal) passando para externa
(varanda e quintal)

PERSONAGENS
Dona Glória, José Dias, Tio Cosme, Prima Justina, Bentinho e Capitu

AÇÃO
Dona Glória, José Dias, Tio Cosme e Prima Justina estão na sala enquanto Bentinho
espia toda a conversa. É a cena que apresenta todos estes personagens do núcleo
familiar de Bento

José Dias lembra D. Glória de sua promessa de mandar Bentinho para o seminário e
insinua que o envolvimento de Bento com Capitu pode vir a ser um empecilho para
que a promessa se concretize. Ao comunicar esta ideia dispara uma resposta em
todos os personagens presentes. Dona Glória reage dizendo não ver mal algum, Tio
Cosme tenta se esquivar mas demonstra concordar que isto pode vir a ser um
problema. Prima Justina quando questionada evita emitir qualquer julgamento. Dona
Glória enfim rompe em lágrimas e é amparada pelos demais personagens enquanto
Bento movido pela revelação escapa para a varanda junto ao quintal onde encontra
Capitu.
99

PROPOSTA

Tomando a casa da rua de Mata-cavalos como ponto de partida da


adaptação proposta por este trabalho a ideia é recriar uma casa burguesa
tipicamente carioca, nos moldes da própria descrição do protagonista Bento
Santiago. Na impossibilidade do espectador acompanhar o que se passa no interior
de uma casa montada integralmente no palco, devido às vedações de suas paredes,
esta seria seccionada permitindo que se acompanhasse o que ocorre em seu
interior. Este corte poderia ocorrer no sentido longitudinal ou até mesmo em um
plano de corte livre que percorresse diversos cômodos. Este corte seria semelhante
a algumas obras de Matta Clark e também fazendo referência ao formato de palco
utilizado por Piscator em “Hoppla, wir leben!”. Este corte tem o valor simbólico de
abrir a vida cotidiana de uma típica família carioca, e aparentemente comum, e se
debruçar sobre seus problemas e problemáticas internas. Esta ideia do “corte
revelador” estará presente na proposta dos três cenários.

FIGURA 87 – OBRA DE MATTA CLARK “SPLITTING”

FONTE: ARCHDAILY (2022)


100

FIGURA 88 – OBRA DE MATTA CLARK “SPLITTING”

FONTE: ARCHDAILY (2020)

A cena acontece no grande espaço da sala principal que mostra uma


residência cortada ao meio, como se o plano de corte da arquitetura realmente
tivesse seccionado a casa revelando seu interior. Desta forma se expõe as
entranhas da casa e como metáfora também o interior do protagonista. Por ser a
infância a fase mais feliz da vida de Bento este corte deve ser preciso e bem
delineado indicando uma visão ainda correta e alinhada com a verdade dos fatos.
101

FIGURA 89 – PROPOSTA CENÁRIO 1

FONTE: DESENHO DO AUTOR (2022)

O “recheio” destas paredes pode ser preenchido com flocos de algodão para
representarem a doçura desta fase do personagem fazendo uma referência ao
algodão doce. Caso se use o algodão branco este reagirá diretamente a luz usada,
mas caso se opte pela cor tons leves e pastéis devem ser empregados, como o rosa
e amarelo. Nesta etapa da vida de Bentinho as cores que iluminam os atores e
cenários devem ser claras e leves representando a infância e sua candura.

FIGURA 90 – “RECHEIO” DE MATERIAL SINTÉTICO

FONTE – TWITTER (2018)


102

É importante também destacar a fluidez de movimento que ocorre nas


diversas vezes em que Bentinho interage com sua família dentro da casa e corre
para fora buscando se encontrar com Capitu. Caso a ação na varanda e quintal se
estenda é possível ainda arrastar a casa para o lado direito do palco oferecendo
maior área para a varanda e quintal pois estas são o pequeno grande palco das
fantasias dos jovens enamorados.
Para dar maior dinamismo na troca de cenários, tanto nas áreas internas da
casa como na parte externa com sua varanda e quintal, o uso de projeções seria
uma ferramenta muito útil. Em um momento é possível projetar todo o interior da
casa de Mata-cavalos, com seus medalhões e grinaldas, e em outro criar um
ambiente de fantasia e projetando salões imaginários, como os do seminário ou das
igrejas que permeiam as ideias de Bentinho no começo do romance.
O uso de azulejos portugueses nas suas tradicionais cores azul e branco
podem ser o prenúncio do caos que será introduzido fazendo referência a obra de
Adriana Varejão. Nesta etapa como as coisas “ainda estão em seus devidos lugares”
os azulejos podem estar assentados corretamente, sendo eles projetados nas
paredes ou mesmo instalados. Mais tarde na peça estes azulejos irão aparecer
desordenados indicando o princípio da dúvida e confusão mental de Bento.

CENA 2
Noite. Casa da época de casados na Praia da Glória. Externa (sala com janela e
varanda voltada para a praia)

PERSONAGENS
Bento e Capitu

AÇÃO
Bento fala a Capitu sobre as estrelas e planetas mas ela esta distraída em seus
pensamentos não dando muita atenção às lições de seu marido. O protagonista já
começa a dar sinais de desequilíbrio tendo um certo ciúme do mar que distrai
Capitu. Esta acaba revelando que sua distração se deve a cálculos ligados a somas
de dinheiro e entrega a Bento dez libras esterlinas. Revela também que Escobar foi
seu fiador e esteve com ela na casa momentos antes sem o conhecimento de seu
103

marido. Bento não se fica enciumado com a visita inesperada de Escobar e pede
que Capitu guarde o dinheiro.

PROPOSTA

A ideia central nesta etapa da narrativa é começar a transmitir ao espectador


os primeiros sinais do comportamento possessivo e ciumento de Bento enquanto se
demonstra a crescente proximidade entre Escobar e Capitu. A casa é a mesma
estrutura utilizada para representar a de Mata-cavalos. O truque consiste em
rotacionar toda a estrutura revelando o plano de corte e suas entranhas do outro
lado. Desta forma os técnicos podem trabalhar no “recheio” das paredes na parte de
trás do cenário enquanto a ação acontece na frente.

FIGURA 91 – PROPOSTA CENÁRIO 2

FONTE: DESENHO DO AUTOR (2022)

O “recheio” das paredes nesta etapa são inspirados nos trabalhos da artista
plástica Adriana Varejão. Seus trabalhos fazem uso de preenchimentos viscerais
realistas em paredes e estruturas. Estes indicariam o estado mental do protagonista
que “pensa com o fígado” e tem reações agressivas e dramáticas nesta fase do
romance. Os azulejos portugueses citados anteriormente começam a se desordenar,
podendo até mesmo se mover durante as cenas no caso do uso de projeções sendo
disparados por diálogos ou palavras-chave.
104

FIGURA 92 – OBRA DE ADRIANA VAREJÃO

FONTE: EBIOGRAFIA (2022)

FIGURA 93 – OBRA DE ADRIANA VAREJÃO

FONTE: PINTEREST (2022)

Outro elemento que pode ser introduzido aqui é a inclinação das superfícies.
Mesmo que de forma sutil ao inclinarmos o piso ou uma das paredes o observador
mais atento percebe que algo não está correto nas memórias de Bento
105

representadas no palco. Inclinação é antes de tudo geradora de movimento e


simboliza aqui as forças de ciúme e obsessão que movem o protagonista. Também
demonstram instabilidade sendo uma referência a sua instabilidade emocional
oscilando entre a adoração de Capitu e rompantes de raiva e ódio. Recurso
semelhante foi utilizado por Piscator e nos espetáculos de dança moderna de
Deborah Colker.

FIGURA 94 – PLANO INCLINADO DE PISCATOR

FONTE: DEUTSCHE DIGITALE BIBLIOTHEK (2022)

FIGURA 95 – PLANO INCLINADO DE DEBORA COLKER

FONTE: YOUTUBE (2022)


106

CENA 3
Escuro/Sombras. Casa do Engenho Novo. Interna (Porão)

PERSONAGENS
Bento

AÇÃO
Na porção final do livro o protagonista profere alguns monólogos e este cenário final
pode servir a vários deles. Pegando em especial o capítulo 144 “Uma Pergunta
Tardia”, no qual Bento explica os motivos pelos quais ao invés de preservar a casa
antiga decidiu construir uma nova é possível explicar seus símbolos e mensagens.
Nesta passagem ele afirma ter feito uma visita a casa de Mata-cavalos mas relata
que não conseguia se identificar com a casa por mais que a inspecionasse. Acabou
optando por tentar reconstruir na ânsia de criar laços com o passado.

PROPOSTA

A intenção por colocar a figura do protagonista no porão da própria casa é


torná-lo “um fantasma dentro da própria casa”. Ele não conseguiu se conectar às
memórias através da casa original e também não as alcança na casa construída o
que o torna um inquilino de memórias falhas, não permitindo que se conecte nem
com o passado nem com o presente. Utilizando a área abaixo do palco e removendo
parte do tablado é possível criar este porão que apresenta Bento apenas da cintura
para cima.

FIGURA 96 – PROPOSTA CENÁRIO 3

FONTE: DESENHO DO AUTOR (2022)


107

A estrutura ainda é a mesma das outras cenas sendo apenas subtraída a


varanda e quintal insinuando que não há mais conexão com Capitu nem a antiga
casa dos Pádua. É uma casa sem zonas de escape. Não se escapa para a infância
pelo quintal e nem se escapa para o bom período que vivera com Capitu na Praia da
Glória. Ao isolar a casa no lote, Bento também acaba isolado do mundo.
Como todos os personagens de suas memórias já faleceram, o diretor fica
livre para invocar suas memórias na casa, estes sim fantasmas de verdade,
enquanto Bento no porão acompanha seus passos no tablado e suas vozes por
entre as ripas do assoalho.
Cabem aqui os mesmos recursos já empregados na cena anterior. O recheio
visceral das paredes e tetos pode assumir uma cor mais escura, seja pela natureza
do próprio material empregado ou pela luz. Estas vísceras podem até mesmo verter
das paredes e se acumularem no chão ou porão, simbolizando toda a amargura que
Dom Casmurro carrega consigo. Usando ainda da obra de Adriana Varejão é
possível empregar obras com ainda maior vigor e exagero com vísceras estourando
as paredes e tetos.

FIGURA 97 – OBRA DE ADRIANA VAREJÃO

FONTE: THE FAKE ECONOMIST (2012)

A inclinação de pisos, paredes e móveis podem ser ainda mais pronunciadas


indicando um rompimento com a realidade e a impossibilidade de se conectar com a
108

casa e a utilizá-la apropriadamente. As pernas de mesa e cadeiras podem se abrir.


A cama já está com uma das pontas apoiadas no chão e janelas e portas
desencaixadas das esquadrias. Os azulejos portugueses, apresentados nas outras
cenas, podem se soltar da parede e se quebrarem ao chão, ou no caso de projeções
o sonoplasta se encarrega do ruído da cerâmica se partindo. Dom Casmurro é um
homem que definha junto com a casa.
109

7 ANÁLISE DA REALIDADE – TEATRO GUAÍRA

7.1 HISTÓRIA DO TEATRO

A origem do Teatro Guaíra começa com a doação de um terreno por parte


da Assembleia Provincial à Sociedade Teatral Beneficente União Curitibana para a
construção do Theatro São Teodoro, uma homenagem ao então fundador da cidade
de Curitiba Theodoro Ébano Pereira. O terreno hoje abriga a Biblioteca Pública do
Paraná na rua Dr. Muricy. O Theatro São Theodoro tem sua inauguração em 1884 e
por dez anos se mantém como referência da cultura curitibana. Após cerca de 6
anos de intervalo devido a Revolução Federalista, quando se torna uma prisão, o
teatro é reinaugurado como Theatro Guayrá. (TEATRO GUAÍRA, 2022).

FIGURA 98 – PRÉDIO ANTIGO DO TEATRO GUAÍRA

FONTE: TEATRO GUAÍRA (2022)

O Theatro Guayrá entra em processo de demolição em 1939 e planos para


um novo teatro são iniciados no ano seguinte. O projeto foi escolhido ainda nos anos
40 mas sua construção só teve início em 1952. A década de 50 é repleta de grandes
avanços culturais devido a franca expansão da economia nesta época. (TEATRO
GUAÍRA, 2022).
110

FIGURA 99 – CONSTRUÇÃO DO NOVO TEATRO

FONTE: TEATRO GUAÍRA (2022)

Com projeto de Rubens Meister a arquitetura moderna toma forma no novo


teatro. Seu trabalho foi ainda marcado pela construção de outros marcos
importantes da arquitetura pela cidade, como o Auditório da Reitoria UFPR (1956),
o Centro Politécnico (1956), o Edifício Barão do Rio Branco (1958), a Prefeitura
Municipal de Curitiba (1969), a Estação Rodoferroviária de Curitiba (1976), o Centro
de Atividades do SESC da Esquina (1985) e a restauração do Palácio Avenida
(1990). (TEATRO GUAÍRA, 2022).
As obras são concluídas em 2 anos e logo o primeiro dos três auditórios é
inaugurado, o Auditório Salvador de Ferrante, conhecido como Guairinha. Contando
com apresentações já em 55. O auditório maior, Guairão, é inaugurado em 74 após
ser reconstruído devido a um incêndio. (TEATRO GUAÍRA, 2022).
111

FIGURA 100 – RUBENS MEISTER NAS OBRAS DO GUAÍRA

FONTE: TEATRO GUAÍRA (2022)

O último auditório, Glauco Flores de Sá de Brito, um Miniauditório, é


inaugurado em 1975 e completa o grande complexo cultural que então passa a se
chamar Fundação Teatro Guaíra. São 16.900 metros quadrados com capacidade
para 2.757 lugares no espaço total. TEATRO GUAÍRA (2022).

FIGURA 101 – FOTOMONTAGEM A PARTIR DA MAQUETE

FONTE: TEATRO GUAÍRA (2022)


112

7.2 ESPECIFICAÇÕES TÉCNICAS – GUAIRÃO

Lotação
Plateia: 1.135
Cadeirantes: 15
Primeiro Balcão: 539
Segundo Balcão: 478
Total: 2.167 lugares

Dimensões da área cênica


Boca de Cena: 16,00 x 7,50 altura (usual)

Palco
Profundidade: 19,00m (da cortina de boca até o ciclorama)
Largura: 54,00m (de parede a parede)
Urdimento: 23,50m de altura
Proscênio: 20,00m x 6,30 x 11,00m de altura no ponto médio

Acesso ao Palco
Acesso por rampa, com porta nas dimensões de 4,00m x 3,20m

Sistema de varas
40 varas contrapesadas manuais, sendo:
33 varas de cenário, 8 varas de luz, 3 varas mecanizadas (guincho), 1 passarela de
luz sobre o proscênio e 1 sacada de iluminação sobre a plateia.

Camarins
6 camarins, com capacidade aproximada de 40 pessoas.
113

FIGURA 102 – PLANTA BAIXA DO PALCO

FONTE: PEREIRA (2017)


114

FIGURA 103 – CORTE LONGITUDINAL

FONTE: PEREIRA (2017)

FIGURA 104 – CORTE TRANSVERSAL

FONTE: PEREIRA (2017)


115

FIGURA 105 – PLANTAS DE VARAS DE ILUMINAÇÃO

FONTE: PEREIRA (2017)


116

8 CONSIDERAÇÕES FINAIS

São inúmeras as similaridades entre a forma de pensar o espaço cênico e


arquitetônico indicando uma proximidade muito grande entre as duas ciências do
espaço. Isto posto o trabalho de ambos os profissionais, cenógrafo e arquiteto, se
complementa e ganha muito em repertório e técnicas.
Um dos desafios encontrados durante o trabalho foi encontrar o registro em
desenhos, sejam eles técnicos ou croquis, pois sendo a prática teatral feita de
estruturas efêmeras seus registros se vão junto com suas obras. Talvez por isso seja
tão importante a ajuda que o profissional de arquitetura pode trazer à área,
emprestando ao teatro o rigor dos desenhos técnicos e a exploração de alternativas
digitais tridimensionais tão comuns nas obras arquitetônicas mas que parece não ter
avançado tanto na prática teatral.
117

REFERÊNCIAS

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Alegre: Ed. Movimento, 1997.

APPIA, Adolphe. Oeuvres completes: tome II. Paris: L’Age d’Homme, 1986.

ASSIS, Machado de. Dom Casmurro. Rio de Janeiro: Ed. Garnier, 1899.

BAEZA, Alberto Campo. La idea construida. Madri, Espanha: Ed. COAM, 1996.

BRANDÃO, Juanito. Teatro grego origem e evolução. Rio de Janeiro: Ed. Ars
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PEREIRA, Luisa Silva. Proposta cênica para “Orfeu da Conceição”. 2017.


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Paraná, Curitiba, 2017.

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