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Resumo
O presente artigo busca analisar a discussão acerca das três mais significantes teorias referentes
a situação jurídica do nascituro, desde a concepção intrauterina até o nascimento. Trazer ao
leitor um breve relato acerca de algumas concepções do conceito de pessoa humana, bem como
a respeito do início da personalidade jurídica civil a partir do nascimento com vida. A ideia
deste artigo é divulgar os debates recentes e atuais relacionados ao tema, analisando-os à luz
doutrinária e de nosso ordenamento jurídico pátrio.
Abstract
This article seeks to analyze the discussion about the three most significant theories regarding
the legal status of the unborn child, from intrauterine conception to birth. Bring the reader a
brief report about some conceptions of the concept of human person, as well as about the
beginning of the civil legal personality from birth alive. The idea of this article is to disseminate
recent and current debates related to the topic, analyzing them in the light of doctrine and our
national legal system.
1
Acadêmico de Direito na Faculdade Dom Bosco de Porto Alegre. E-mail: Eduardorosa89229583@gmail.com
1. Considerações iniciais
A evolução científica ao longo dos tempos trouxe diversos novos debates à sociedade
contemporânea, inclusive acerca do momento que se dá origem a vida humana e as
consequências jurídicas advindas deste fato, fazendo surgir novas questões a serem resolvidas
pelo Direito.
Desse modo, no presente trabalho, serão analisados os desafios jurídicos em relação a
perspectiva forense quanto às expectativas legais geradas pela existência de uma nova pessoa.
Isso, porque a legislação vigente deixa o tema em aberto, disponível ao debate, seja acadêmico,
seja doutrinário.
O método utilizado será o dedutivo. A técnica de pesquisa será a bibliográfica, pois serão
utilizadas, leis, doutrinas, jurisprudência, artigos científicos e notícias, visando o estudo acerca
do aludido tema proposto.
2. A Pessoa Humana
Grande parte dos estudiosos parece considerar a noção como sendo inata, assim o
conceito de pessoa seria um dado, que tem sempre existido. Mas, é indispensável para a
resolução de dilemas no campo do direito contemporâneo e para efetiva proteção jurídica do
indivíduo que se possa investigar adequadamente o conceito de pessoa.2
Os gregos utilizavam dois termos para se referirem à vida: um termo que expressava a
simples vida natural, uma simples forma de viver – zoé – e outro termo, bios, cuja significação
se refere à vida qualificada, a um modo de vida particular, à vida própria do indivíduo do grupo.
Aristóteles distingue entre vida contemplativa (bios theoretikos), vida do prazer (bios poietikós)
e vida política (bios politikós).3
Segundo Sgreccia4 “a pessoa humana é uma unitotalidade, ou seja, unidade de corpo e
espírito; e uma totalidade porque deve ser considerada em todas as suas dimensões (física,
psíquica, espiritual, social e moral). Assim, antes de serem considerados princípios ou normas
de ação, é preciso que olhemos para um fundamento, para o lugar de onde deve surgir a solução
de um dilema bioético – a pessoa humana”.5
2
https://jus.com.br/artigos/47003/conceito-de-pessoa-na-trajetoria-filosofia-e-juridica.
3
ARISTÓTELES, VI, 2; 1139 – 20.
4
Elio Sgreccia (Arcevia, 6 de junho de 1928 - Roma, 5 de junho de 2019) foi um cardeal italiano e Presidente
Emérito da Pontifícia Academia para a Vida.
5
REVISTA PISTIS PRAXIS, V. 2, N. 1, 2010.
Uma das principais perguntas existentes no debate bioético é a de quando se inicia a
vida humana. Trata-se de uma questão cuja reposta poderia ser, à primeira vista, facilmente
respondida: a vida do ser humano tem início, biogeneticamente, no momento da fecundação.
Este é um dado científico que deveria ser considerado indiscutível. Se existem
discussões sobre a definição filosófica de pessoa e também sobre a identificação do início da
vida pessoal, parece impossível que haja qualquer dúvida a respeito do início da vida
biogenética do ser humano, já que, sendo o ser humano espécie vivente do Homo sapiens, o
início de sua vida deveria coincidir com a união dos gametas humanos – masculino e feminino.
Juridicamente é o sujeito de direitos e deveres, ou seja, capaz de adquirir direitos e
contrair obrigações, podendo ser física ou jurídica. Lembra Paulo Nader “Pessoa física ou
natural é o ser dotado de razão e portador de sociabilidade, condição que o leva a convivência.
Por sua constituição corpórea integra o reino da natureza e se sujeita às leis da física em geral.
O que o distingue, todavia, é espiritualidade, dom divino que o singulariza na escala animal”.6
6
NADER, Paulo. Curso de Direito Civil – Parte Geral. Vo. I 1. 2 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p.144.
7
Nunes, R. (2000). A natureza do embrião humano. Humanística E Teologia, 21(1), 47-65.
https://doi.org/10.34632/humanisticaeteologia.2000.6773
8
Human embriology, citado por Ruy Nunes, in "O Estado de São Paulo", 25-1-87. (“Roberto Vidal da Silva
Martin., Aborto no direito comparado, Folheto,” 1991).
tendo em vista as possibilidades de reprodução assistida e assim, não receberá proteção do
direito como se fosse um nascituro, posto que não o é.9
3.1 Conceito
O significado etimológico da palavra nascituro é “o que está por nascer”. Portanto, ente
já concebido (onde já ocorre fusão dos gametas, a junção do ovulo ao espermatozoide formando
o zigoto ou embrião), nidado (implementado nas paredes do útero materno), porém não nascido.
Majoritariamente, o que se tem verificado é que o nascituro surge com o fenômeno da nidação,
que é a fixação ou implantação (para o caso de concepções artificiais o in vitro) do zigoto nas
paredes do útero10
9
https://jus.com.br/artigos/48678/direito-do-nascituro
10
PAMPLONA FILHO, Rodolfo; ARAÚJO, Ana Thereza Meirelles. Tutela jurídica do nascituro à luz da
Constituição Federal. Revista Magister de direito civil e processual civil. Porto Alegre, n. 18, p. 33-48, 2007.
com vida, utiliza-se da docimasia respiratória, que é quando se colocam os pulmões do recém-
nascido em água em uma certa temperatura e através disto verificando que os pulmões
flutuaram o diagnóstico é de que houve vida, mesmo que por alguns segundos apenas, ou seja,
o recém-nascido chegou a respirar, viveu.11
Não sem razão, o art. 2º do Código Civil declara que todos os direitos do nascituro estão
assegurados desde a concepção. “Art. 2º A personalidade civil da pessoa começa do nascimento
com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro”.
É assegurado ao nascituro o direito de filiação, ao qual há a possibilidade do
reconhecimento pelos pais anterior ao nascimento do filho. Razão pela qual, qualquer um dos
pais poderá pleitear os direitos inerentes ao reconhecimento da paternidade ou maternidade.
Deste mesmo modo, fixando que o nascituro desde a sua concepção é considerado pessoa, não
há no ordenamento jurídico empecilho algum a mãe ajuizar representando seu filho nascituro
em uma ação de reconhecimento.
Conforme interpretação do artigo 1.609, parágrafo único do Código Civil por
Maria Helena Diniz, sobre o reconhecimento de filho antes de seu nascimento ou após
seu óbito, reflete: “Será possível a declaração de estado civil de filiação mediante
reconhecimento que preceda ao nascimento do filho para atender a certas razões de
ordem pessoal ou que suceda ao seu falecimento, desde que este tenha deixado
descendente que possa tirar proveito desse reconhecimento póstumo, hipótese em que a
esse descendente caberá consentir o reconhecimento.”12
O direito à sucessão também foi reconhecido ao nascituro. Mediante os ensinamentos
de Maria H. Diniz, no que tange a explicação do artigo 1.798 caput do Código Civil, que diz
respeito a capacidade sucessória do nascituro: “A capacidade sucessória do nascituro é
excepcional, já que só sucederá se nascer com vida, havendo um estado de pendência de
transmissão hereditária, recolhendo seu representante legal a herança sob condição resolutiva.
O já concebido no momento da abertura da sucessão e chamado a suceder, adquire desde logo
o domínio e a posse da herança como se já fosse nascido, porém em estado potencial, como lhe
falta personalidade jurídica material, nomeia-se um curador ao ventre”13.
11
ALMEIDA, Silmara J. A. Chinelato e. Op. Cit. 2000. p. 196
12
DINIZ, Maria Helena. Idem. Código Civil Anotado. 2005. p. 1.314.
13
DINIZ, Maria Helena. Idem. Código Civil Anotado. 2005.p. 1.471.
Caso nascer morto a sucessão será ineficaz, pois o feto será dado como se nunca tivesse
existido. Mas, nascendo com vida, ou seja, respirando, terá este a plena capacidade para
suceder.14
Bem como o direito de receber doações conforme o art. 542 do Código Civil de 2002 “A
doação feita ao nascituro valerá, sendo aceita pelo seu representante legal.” Entre outros
consagrados em nosso Ordenamento Jurídico Pátrio.
Portanto, podemos constatar, por meio de alguns exemplos, que o Código Civil
Brasileiro dispendeu alguns direitos ao nascituro.
14
RIBEIRO, Tiago. INÍCIO DA PERSONALIDADE E A SITUAÇÃO JURÍDICA DO NASCITURO.
15
SEMIÃO, Sergio Abdalla. Os Direitos do nascituro: aspectos cíveis, criminais e do biodireito. 2 ed. Belo
Horizonte: Del Rey, 2000, p. 89.
16
TARTUCE, Flavio. Manual do direito civil. 10º ed. Vol. Único. Rio de Janeiro: Método, 2020. p.64.
4.2 Teoria condicional
A teoria concepcionista é aquela que sustenta que o nascituro é pessoa humana, tendo
direitos resguardados por lei. Esse é entendimento defendido por Silmara Juny Chinellato,
Pontes de Miranda, Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, José Fernando Simão,
Maria Helena Diniz entre outros respeitáveis juristas.
Registre-se que a conclusão pela corrente concepcionista consta no Enunciado n. 1, do
Conselho de Justiça Federal (CJF), aprovado na I Jornada de Direito Civil, e que também
enuncia direitos ao natimorto. Cujo teor segue: “Art. 2.º A proteção que o Código defere ao
nascituro alcança ao natimorto no que concerne aos direitos de personalidade, tais como nome,
imagem e sepultura”.19
Tal teoria é a que prevalece entre os doutrinadores contemporâneos do Direito Civil
Brasileiro. Com tal raciocínio se explica o fato de os nascituros poderem receber alimentos,
herdar, ser parte em ações judiciais, entre outros e possam ter seus direitos resguardados,
mesmo antes de nascerem.
17
https://jus.com.br/artigos/48678/direito-do-nascituro.
18
TARTUCE, Flavio. Manual do direito civil. 10º ed. Vol. Único. Rio de Janeiro: Método, 2020. p.64.
19
https://www.cjf.jus.br/enunciados/enunciado/647 Acessado: 2021-11-28.
A corrente concepcionista tem também prevalecido na jurisprudência do Superior
Tribunal de Justiça. Em notório julgado foi reconhecido dano moral ao nascituro, pela morte de
seu pai ocorrida antes de seu nascimento:
Anote-se que tal entendimento é reconhecido por outros acórdãos de datas mais
próximas da mesma Corte Superior, que confirmam a teoria concepcionista (STJ, AgRg no
AgRg no AREsp 150.297/DF, 3.ª Turma, Rel. Min. Sidnei Beneti, j. 19.02.2013, DJe
07.05.2013).
Recentemente (informativo 547/2014) o STJ adotou essa teoria em um julgamento que
dizia respeito ao direito, ou não, de uma mãe receber o seguro DPVAT (pago, entre outras
hipóteses, aos herdeiros do falecido em caso de morte em acidente de trânsito), tendo em vista
aborto sofrido por ela, em razão de acidente de trânsito.
O benefício foi deferido a ela, sendo que o Ministro Relator afirmou o seguinte: “o
ordenamento jurídico como um todo – e não apenas o Código Civil de 2002 – alinhou-se mais
à teoria concepcionista para a construção da situação jurídica do nascituro, conclusão
enfaticamente sufragada pela majoritária doutrina contemporânea”21
Esclarecida e consolidada a prevalência da teoria concepcionista no Direito Civil
contemporâneo, cumpre trazer algumas palavras sobre a situação jurídica do embrião.
A Lei 11.105/2005, conhecida como Lei de Biossegurança, tutela e integridade física
do embrião, reforçando a teoria concepcionista. Isso, diante da proibição da engenharia genética
em embrião humano, como regra. O art. 5.º da referida lei autoriza a utilização de células-tronco
embrionárias para fins científicos e terapêuticos, desde que os embriões sejam considerados
20
STJ, REsp 399.028/SP, 4.ª Turma, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, j. 26.02.2002. DJ 15.04.2002,
p.232.
21
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 1.415.727-SC. Relator: Ministro Luis Felipe
Salomão, julgado em 4/9/2014. Disponível em https://processo.stj.jus.br/jurisprudencia/externo/informativo/
Acessado: 2021-11-28.
como inviáveis. A lei exige autorização dos genitores do embrião, para que sejam utilizados
para tais fins. A utilização de células-tronco embrionárias é exceção e não regra.
Em maio de 2008, O Supremo Tribunal Federal discutiu a constitucionalidade do
dispositivo, em ação declaratória de inconstitucionalidade proposta pela Procuradoria-Geral da
República, por maioria prevaleceu o entendimento de sua constitucionalidade, autorizando a
pesquisa com células-tronco em nosso país (ADIn 3.510).
5. Considerações finais
Restou evidente, após breve verificação do tema, de que o direito brasileiro tutela, de
fato, os direitos do nascituro e do embrião, ainda que de forma reduzida. Por obvio, os direitos
garantidos não são exatamente àqueles dados à pessoa nascida com vida, malgrado, ainda lhe
são garantidos certos direitos que estão previstos pelo nosso ordenamento, e inclusive,
reconhecidos na prática, no cotidiano, nos diversos âmbitos do direito.
Pois bem, vale destacar as palavras de José Sebastião de Queiroz Oliveira:
“Independentemente da teoria adotada, é consenso entre os doutrinadores de que o nascituro
é um ser vivo e que tem direitos desde a sua concepção, seja na forma de expectativa tutelável,
pela teoria natalista, seja na forma suspensiva, pela teoria da personalidade condicionada, ou
seja, na forma plena, pela teoria verdadeiramente concepcionista.”
No caso de um tema tão relevante e discutido atualmente, o nascituro se destaca no
ordenamento jurídico brasileiro pela “atenção” adquirida, apesar do fato de sequer ter nascido.
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
https://jus.com.br/artigos/47003/conceito-de-pessoa-na-trajetoria-filosofia-e-juridica
Elio Sgreccia (Arcevia, 6 de junho de 1928 - Roma, 5 de junho de 2019) foi um cardeal italiano
e Presidente Emérito da Pontifícia Academia para a Vida.
Human embriology, citado por Ruy Nunes, in "O Estado de São Paulo", 25-1-87. (“Roberto
Vidal da Silva Martin., Aborto no direito comparado, Folheto,” 1991).
https://jus.com.br/artigos/48678/direito-do-nascituro
TARTUCE, Flavio. Manual do direito civil. 10º ed. Vol. Único. Rio de Janeiro: Método, 2020.
p.64.
PAMPLONA FILHO, Rodolfo; ARAÚJO, Ana Thereza Meirelles. Tutela jurídica do nascituro
à luz da Constituição Federal. Revista Magister de direito civil e processual civil. Porto
Alegre, n. 18, p. 33-48, 2007.
https://jus.com.br/artigos/48678/direito-do-nascituro
TARTUCE, Flavio. Manual do direito civil. 10º ed. Vol. Único. Rio de Janeiro: Método, 2020.
p.64.
https://www.cjf.jus.br/enunciados/enunciado/647 Acessado: 2021-11-28.
STJ, REsp 399.028/SP, 4.ª Turma, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, j. 26.02.2002. DJ
15.04.2002, p.232.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 1.415.727-SC. Relator: Ministro
Luis Felipe Salomão, julgado em 4/9/2014. Disponível em
https://processo.stj.jus.br/jurisprudencia/externo/informativo/
Acessado: 2021-11-28.