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Introdução

Vários estudiosos vêm se dedicando a pesquisar e a se aprofundar em uma concepção do


desenvolvimento intelectual humano que para muitos não é, em sentido estrito, uma teoria,
mas integra diversas contribuições teóricas baseadas em princípios construtivistas. As Teorias
Interacionistas do desenvolvimento apoiam-se na ideia de interacção entre o organismo e o
meio. A aquisição do conhecimento é entendida como um processo de construção contínua
do ser humano em sua relação com o meio. “Organismo e meio exercem acção recíproca.”
(FOSNOT, 1998).

O ser humano, na teoria interacionista, interage com o meio ambiente respondendo aos
estímulos externos, analisando, organizando e construindo seu conhecimento a partir do
“erro”, através de um processo contínuo de fazer e refazer (COLL, 1992, p. 164). Essas
construções dependem das relações que estabelecem com o ambiente numa dada situação.
Pode-se empregar o termo construtivismo como sinónimo de interacionismo, uma vez que
existe a “construção” do conhecimento basicamente considerada a verdadeira aprendizagem.

Em suma, classificada como interacionista, a teoria construtivista é em sentido geral, o


processo pelo qual um indivíduo desenvolve sua própria inteligência adaptativa e seu próprio
conhecimento, interagindo com o meio em que esta inserido.

Dentre as teorias interacionistas destacam-se: a Teoria Interacionista Piagetiana e a Teoria


Sócio interacionista Vygotskiana.

O objectivo desse trabalho é apresentar, através de uma pequena síntese, os principais


enfoques das teorias dos mais importantes representantes do Interacionismo: Piaget e
Vygotsky.

A construção deste trabalho está fundamentada em pesquisa bibliográfica das obras de Fosnot
(1998), Ferrari (2010a), Ferrari (2010b) e Coll (1992).
1. Teoria Interacionista de Jean Piaget

Exporemos aqui as principais contribuições sobre a teoria de Jean Piaget segundo as obras
pesquisadas para tecer o trabalho atual.

Os estudos sobre a Teoria Construtivista começaram com Piaget, que foi um biólogo com
preocupações eminentemente epistemológicas (Teoria do Conhecimento), numa perspectiva
interdisciplinar (FERRARI, 2010).

Nascido na Suíça, doutorou-se em ciências naturais com uma dissertação sobre moluscos,
porém, não eram apenas esses temas biológicos que chamavam a atenção de Piaget, a
principal questão que a biologia poderia ajudar a resolver seria a epistemológica, isto é, o
problema do conhecimento (COLL, 1992, p. 165).

Este foi o ponto bastante crucial das preocupações piagetianas. Explicar a forma pela qual o
homem atinge o conhecimento, o que o distingue fundamentalmente das outras espécies
vivas. Esta, no entanto, é uma questão tipicamente filosófica. Entre a energia, o rigor dos
métodos biológicos e a filosofia, Piaget foca uma lacuna que precisa ser preenchida. Com
isso a psicologia do desenvolvimento viria no futuro fazer este papel, como mediadora entre
os dois campos de estudo (FERRARI, 2010a; SANTOS, 2002).

Coll (1992) já vem frisando que: “Depois de seu doutorado em 1918, Piaget iniciou a busca
de um laboratório de psicologia que pudesse servir de campo para as investigações empíricas
que dessem suporte ao seu empreendimento”. (P. 168).

Piaget era fascinado pela compreensão da lógica subjacente ao erro e a interpretação do


percurso intelectual da criança em relação ao seu desenvolvimento cognitivo global.
“Consequentemente, a análise realizada por ele, desloca-se dos produtos dos testes para os
processos que as causaram, melhor dizendo, ele foca o percurso que uma criança percorre na
resolução de um problema e não no seu resultado final” (SANTOS, 2005).

Ao focar o percurso da criança na resolução de um problema, Coll (1992) afirma que:

Piaget utilizou-se do método clínico, para suas observações, por ter semelhança com
os procedimentos usados em Psiquiatria e Psicoterapia: entrevistas, aplicações de
testes, e observação. Utilizando este método, ele chegou a formulações de uma teoria
de como se processa o desenvolvimento cognitivo – a Psicologia Genética (P. 168-
169).
A psicologia genética propiciou um aprofundamento sobre a compreensão do processo de
desenvolvimento humano na construção do conhecimento.

Piaget buscou compreender os mecanismos pelos quais as crianças constroem representações


internas de conhecimentos construídos socialmente, em uma perspectiva psicogenética,
trazendo uma contribuição para além das descrições dos grandes estágios de desenvolvimento
(FERRARI, 2010).

Segundo Bock, Furtado e Teixeira (2002). “A psicogênese era objecto de estudo do


construtivismo como ciência e, agora, como psicogênese das diversas ciências ou
conhecimentos, é conteúdo do construtivismo aplicado ao ensino”. (P. 103)

Nesta teoria, todas as crianças se desenvolvem intelectualmente passando por estágios. Os


diferentes estágios por que passam os indivíduos, são descritos no processo de aquisição dos
conhecimentos, de como se desenvolve a inteligência humana e de como o indivíduo se torna
autónomo (SANTOS, 2005; COLL, 1992, p. 169).

Segundo Piaget (apud COLL, 1992, p. 170), “o conhecimento não pode ser concebido como
algo predeterminado desde o nascimento (inatismo), nem como resultado do simples registo
de percepções e informações (empirismo) ”. Resulta das acções e interacções do sujeito com
o ambiente onde vive. “Todo o conhecimento é uma construção que vai sendo elaborada
desde a infância, através de interacções do sujeito com os objectos que procura conhecer,
sejam eles do mundo físico ou cultural”. (SANTOS; BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 2002,
p. 104).

O construtivismo é mudança de visão, pois ele não considera o conhecimento só pelo prisma
do sujeito nem só pelo prisma do objecto, mas pela óptica da interacção sujeito-objecto
(COLL, 1992, p. 169-170). Assim, ensaia-se definir o construtivismo como uma teoria do
conhecimento que engloba numa só estrutura dois pólos, o sujeito histórico e o objecto
cultural, com interacção recíproca, ultrapassando dialeticamente e sem cessar as construções
já acabadas para satisfazer as lacunas ou carências (necessidades).

2. Teoria Sócio Interacionista de Lev Vygotsky

 
Vygotsky é um famoso psicólogo russo que, apesar de sua formação em Direito, pela
Universidade de Moscovo em 1918, destacou-se mais no campo da arte e da psicologia, cuja
tese de doutorado defendida em 1925 versava sobre Psicologia da Arte. O seu interesse pela
Psicologia levou-o a uma leitura crítica das teorias em voga como o Behaviorismo, a Gestalt,
a Psicanálise, além das ideias de Jean Piaget. As obras desses autores e escolas são citadas e
comentadas em seus diversos trabalhos.

Foi graças a uma conferência proferida no “II Congresso de Psicologia” em Leningrado que
Vygotsky foi convidado a trabalhar no Instituto de Psicologia de Moscovo, revelando
interesses pelo estudo das funções mentais superiores, da cultura, da linguagem e dos
processos orgânicos cerebrais pesquisados por neurofisiologistas russos com quem conviveu,
especialmente Alexander Luria e Alexei Leontiev, sendo considerado hoje em dia como o
grande fundador da escola soviética de psicologia histórico-cultural (CABRERA.
VILLALOBOS, 2007; OLIVEIRA, 2012).

O contexto em que viveu Vygotsky ajuda a explicar o rumo que seu trabalho iria tomar. As
suas ideias foram desenvolvidas na União Soviética saída da Revolução Russa de 1917 e
reflectem o desejo de reescrever a psicologia, com base no materialismo marxista, e construir
uma teoria da educação adequada à nova realidade social emergida da revolução. “Su genio
estribó en sentar las bases de un nuevo sistema psicológico a partir de materiales tomados de
la filosofía y de las ciencias sociales de su época” (BEATRIZ; MAZZARELLA, 2001, p. 41).

Lucci (2006) vem frisando que:

Vygotsky, ao lado de seus colaboradores diretos, Luria e Leontiev, propõe um estudo


sócio-genético do ser humano, assim como estabelece relações com as condições
biológicas, principalmente nos aspectos neurológicos, na tentativa de evitar
reducionismos e simplificações de qualquer espécie. (p. 2).

Molon (1995 e 2003) e Bonin (1996) destacam como os interesses de Vygotsky pela
psicologia estão relacionados com aspectos culturais: “génese e desenvolvimento cultural do
ser humano, com ênfase nos estudos sobre a linguagem, considerada como instrumento do
pensamento humano”. A ênfase no estudo da linguagem também é dada por Marta Kohl
Oliveira (2006), considerada uma autoridade em estudos vygotskianos: “a linguagem é
instrumento do pensamento”. Shuare (1990) ressalta que o historicismo é a chave para
entender a teoria de Vygotsky. Souza e Andrada (2013) destacam que, embora a teoria de
Vygotsky esteja comumente associada aos temas da educação, os fundamentos da Psicologia
Histórico-Cultural ou da Teoria Sócio-Interacionista possibilitariam compreender o ser
humano de modo sistémico, articulando as dimensões psíquicas e sócio culturais.

Diferente das escolas de psicologia existentes até o momento, de orientação


comportamentalista ou mentalista, Vygostky acentua a relação dialética existente entre
sujeito e cultura, sujeito e história, sujeito e meio social, como uma forma de explicitar a
génese das funções psicológicas dos seres humanos. Entende o homem como um ser
histórico-social, ou ainda histórico-cultural, moldado pela própria cultura que ele cria,
determinado pelas interacções sociais cuja actividade mental se torna resultante da
aprendizagem social, da interiorização da cultura e das relações sociais, mas não de forma
passiva e sim, activa. Em outras palavras, o desenvolvimento mental para Vygotsky, além de
um processo filogenético e ontogenético (ligado à génese da espécie e do indivíduo) é
também um processo sociogenético, em que tanto o organismo quanto o psiquismo são
activos e estabelecem uma contínua interacção com as condições do meio em que vive.

Sua doutrina, também conhecida como Sócio-Interacionismo, ou mais precisamente, Teoria


Sócio-Histórica, postula uma dialética das interacções com o outro e com o meio, como
desencadeador do desenvolvimento.

LUCCI (2006) frisa que:

Diante de tal quadro, ele propôs, então, uma nova psicologia que, baseada no método
e nos princípios do materialismo dialéctico, compreendesse o aspecto cognitivo a
partir da descrição e explicação das funções psicológicas superiores, as quais, na sua
visão, eram determinadas histórica e culturalmente. Ou seja, propõe uma teoria
marxista do funcionamento intelectual humano que inclui tanto a identificação dos
mecanismos cerebrais subjacentes à formação e desenvolvimento das funções
psicológicas, como a especificação do contexto social em que ocorreu tal
desenvolvimento. (p. 4).

O método dialéctico materialista desenvolvido pelo filósofo alemão Karl Marx analisa o
movimento dos contrários em que o resultado final, a síntese, se dá a partir de uma dinâmica
entre uma tese e uma antítese, aqui neste caso, o outro e o meio. Desta forma, na teoria de
Vygotsky, o homem é visto como alguém que transforma e é transformado pelas relações
sociais. O que ocorre é uma interacção (dialéctica) entre o ser humano e o meio social e
cultural onde está inserido, ou seja, o desenvolvimento humano é compreendido como o
produto de factores biológicos, e factores ambientais que agem sobre o organismo,
determinando seu comportamento.
Nesta óptica, Damiani e Neves (2006) frisa que:

Vygotsky rejeita os modelos baseados em pressupostos inatistas que determinam


características comportamentais universais do ser humano [...] Discorda também da
visão ambientalista, pois, para ele, o indivíduo não é resultado de um determinismo
cultural, ou seja, não é um receptáculo vazio, um ser passivo, que só reage frente às
pressões do meio, e sim um sujeito que realiza uma actividade organizadora na sua
interacção com o mundo. (p. 07-08).

O conceito de síntese pode ser encontrado largamente na sua obra. O autor define a síntese
não apenas como a soma ou a justaposição de dois ou mais elementos, e sim como a
emergência de um produto totalmente novo gerado a partir da interacção entre elementos
anteriores. Em certo sentido, Vygotsky está mais próximo do empirismo do que do inatismo.
Para o psicólogo, primeiro somos seres sociais e depois nos individualizamos. Mas o sujeito
não é um mero receptáculo passivo que absorve e contempla o real, mas um sujeito activo
que em sua relação com o mundo se reconstrói neste mundo.

Vygotsky e seus colaboradores acreditam que a estrutura dos estádios descrita por Piaget seja
correcta, porém diferem na concepção de sua dinâmica evolutiva. Enquanto Piaget defende
que a estruturação do organismo precede o desenvolvimento, para Vygotsky é o próprio
processo de aprender que gera e promove o desenvolvimento das estruturas mentais
superiores. Assim, podemos ver como a visão de Vygotsky dá importância à dimensão social,
interpessoal, na construção do sujeito psicológico.

Se por um lado o conceito de subjectividade é tratado muitas vezes em Psicologia como algo
interno ao sujeito, o sócio interacionismo de Vygotsky destaca a dialéctica entre o sujeito e o
meio como o principal responsável pela sua formação. Este debate, em torno dos aspectos
sociais inerentes ao desenvolvimento da subjectividade, recebeu diferentes aportes teóricos
nos debates soviéticos Luria e Leontiev (1991), Leontiev (2004), e também fora da união
soviética, com o psicólogo marxista francês Wallon (1975) e outros teóricos como Zinhenko
(1998).

Além disso, Vygotsky toma como ponto de partida as funções psicológicas dos indivíduos, as
quais classificou em elementares e superiores. A partir das estruturas orgânicas elementares
do processo de maturação é que se formam novas e complexas funções mentais que inclui
também o elemento sociocultural. As funções psicológicas superiores são de origem social,
mas só são possíveis porque existe uma base biológica, cerebral, que permite tais actividades.
Dito de outro modo, as funções psicológicas superiores não tem origem no cérebro, mas não
existem sem ele. “Vygotsky considera que o modo de funcionamento do cérebro é moldado
ao longo da história da espécie (base filogenética) e do desenvolvimento individual (base
ontogénica), como produto da interacção com o meio físico e social (base sociogénica)”
(LUCCI, 2006, p. 8).

As funções psicológicas superiores que estão na base do desenvolvimento ontogénico não


ocorrem de forma linear e rectilínea, mas a partir de uma série de transformações qualitativas
e dialécticas, no qual a linguagem (primeiro a linguagem oral e depois a escrita) constitui o
elemento mais significativo do desenvolvimento cognitivo, representando um salto de
qualidade nas funções psicológicas superiores.

Onde segundo Souza e Andrade (2013) enfatizam que:

O processo evolutivo do elementar ao superior não é paralelo ou sobreposto, mas


resultado de combinações e nexos entre as funções, formando uma imbricada rede de
sínteses entre elas [...] As Funções Psicológicas Superiores (FPS), como memória,
consciência, percepção, atenção, fala, pensamento, vontade, formação de conceitos e
emoção, se intercambiam nesta rede de nexos ou relações e formam, assim, um
sistema psicológico, em que as funções se relacionam entre si. (p. 357).

Linguagem e Aprendizagem

Para Vygotsky e seus colaboradores, o desenvolvimento é impulsionado pela linguagem. A


linguagem é fundamental e capaz de transformar decisivamente os rumos de nossa
actividade. Por entender que a linguagem representa um elo de ligação muito importante
entre o mundo sócio cultural e os processos mentais dos indivíduos, Vygotsky qualifico a
linguagem como a pedra angular do desenvolvimento cognitivo do ser humano. Quando
aprendemos a linguagem específica do nosso meio sociocultural, transformamos radicalmente
os rumos de nosso próprio desenvolvimento.

Segundo Leont’ev (1959) e Vygotsky (1987) apud Villalobos (2007)

De acordo com a teoria sociocultural de Vygotsky (1978), o conhecimento é u m


fenómeno profundamente social. A experiencia social molda as formas que o
individuo tem disponível para pensar e interpretar o mundo, e nesta experiencia, a
linguagem tem papel fundamental em uma mente formada socialmente porque é esta
primeira via de contacto mental e de comunicação com outros, serve como o
instrumento más importante por meio do qual a experiencia social é representada de
maneira psicológica e, noutra vez, representa uma ferramenta indispensável para o
pensamento. (p. 412)
Vygotsky defende que o meio social é determinante do desenvolvimento humano e que isso
acontece fundamentalmente pela aprendizagem da linguagem, que ocorre por imitação e
mediado através da interacção com o outros (BRUNER, 1987): “a linguagem é uma
actividade social e é aprendido através da interacção com os outros” (WELLS, 1986 apud
CABRERA. VILLALOBOS, 2007, p. 413). A premissa básica da teoria de Vygotsky é a de
que toda forma de actividade mental humana de ordem superior é derivada de contextos
sociais e culturais. Todas as actividades mentais de ordem superior são inicialmente criadas
através da interacção social e só posteriormente se convertem em processos mentais internos.
Como o afirma Vygotsky (1979), “a dimensão social da consciência é o primeiro en tiempo y
en hecho. A dimensão individual é derivativa e secundaria’” (apud CABRERA.
VILLALOBOS, 2007, p. 413). Toda função mental superior necessariamente atravessa uma
etapa externa de seu desenvolvimento que corresponde ao aspecto social, ou seja, toda função
mental superior foi externa porque foi social em algum momento antes de converter-se em
uma função interna (VYGOTSKY, 1981). Para compreender o desenvolvimento dos
indivíduos, é necessário compreender as relações sociais das quais o indivíduo faz parte.

Neves (2006) acentua que o psicólogo russo:

Concebe o homem como um ser histórico e produto de um conjunto de relações


sociais. Ele se pergunta como os factores sociais podem modelar a mente e construir o
psiquismo e a resposta que apresenta nasce de uma perspectiva semiológica, na qual o
signo, como um produto social, tem uma função geradora e organizadora dos
processos psicológicos. O autor considera que a consciência é engendrada no social, a
partir das relações que os homens estabelecem entre si, por meio de uma actividade
sígnica, portanto, pela mediação da linguagem. Os signos são os instrumentos que,
agindo internamente no homem, provocam-lhe transformações internas, que o fazem
passar de ser biológico a ser sócio-histórico. Não existem signos internos, na
consciência, que não tenham sido engendrados na trama ideológica semiótica da
sociedade. (p. 06).

Para Vygotsky, o mundo da aprendizagem infantil é assistida ou mediada pelos professores e


pelo seu ambiente, e a maior parte desta comunicação é orientada pela linguagem, em outras
palavras, o psicólogo acreditava que o desenvolvimento cognitivo ocorre por meio da
linguagem, das conversas e interacções das crianças com os adultos (família, professores,
amigos, colegas, e.t.c.)

González (2010) ressalta que outra contribuição vygotskiana de relevo foi a relação que
estabelece entre Pensamento e Linguagem, desenvolvida no seu livro de mesmo título, ao
frisar que:
Em Pensamento e Linguagem, Vygotsky expõe com profundidade sua visão sobre a
relação entre cognição e linguagem e a importância do seu pensamento se revela do
fato de que em praticamente todos os manuais de história da Psicologia a figura de
Vygotsky ocupa um papel de destaque. (p.12).

A relação entre cognição e linguagem tem sido estudada por vários autores, como Souza e
Andrade (2013) que procuram abordar esta relação a partir da ideia de que a fala é expressão
do psiquismo e contribui para o seu desenvolvimento. Quando uma criança se comunica com
o meio vai construindo as condições para que a fala organize a função do pensamento e é por
volta dos dois anos que há um grande salto no desenvolvimento do sujeito quando, a partir do
desenvolvimento da fala, a criança pode explorar a relação entre signo e significado.

A palavra é o signo que conceitua e, ao mesmo tempo, representa o objecto, dando-


lhe sentido como um predicado do pensamento. À medida que a fala fica mais
complexa, o pensamento também se torna mais desenvolvido. Cada estágio do
desenvolvimento do significado das palavras representa também um novo estágio de
desenvolvimento na relação entre pensamento e fala. (p. 358).

O signo é aquilo que permite a transferência de conhecimento do plano social para o plano
individual. Antes da escrita, a mediação das relações entre as pessoas ocorre através do signo
que são internalizados ajudando no desenvolvimento de processos mentais.

Vygotsky enfatizou que os signos constituem o nexo entre o plano social e o plano psíquico e
os seres humanos geram uma ampla variedade de instrumentos simbólicos como a obra de
arte, sistemas simbólicos algébricos, compreensão e produção de textos, diagramas e mapas,
entre outros. Utilizando uma analogia com um instrumento ou ferramenta como o martelo
poderíamos dizer que, da mesma que o martelo é um meio para obter controlo sobre objectos
físicos e transformá-los, assim funciona a linguagem por meio dos signos.

Aprendizagem Assistida e Zona de desenvolvimento proximal

As obras de Vygotsky incluem alguns conceitos que se tornaram incontornáveis na área do


desenvolvimento da aprendizagem. Dois destes conceitos mais importantes são o de
Aprendizagem Assistida e o de Zona de Desenvolvimento Proximal, que se relaciona com a
diferença entre o que a criança consegue aprender sozinha e aquilo que consegue aprender
com a ajuda de um adulto. A Zona de Desenvolvimento Proximal é, portanto, tudo o que a
criança pode adquirir em termos intelectuais quando lhe é dado o suporte educacional devido.
Este conceito será, posteriormente desenvolvido por Jerome Bruner, sendo hoje vulgarmente
designado por etapa de desenvolvimento.
A aprendizagem assistida visa, em última análise, fazer com que os alunos trabalhem cada
vez mais sozinhos, mas que requer uma orientação (assistência) prévia, no sentido de
fornecer informações, pistas, lembretes, incentivos no momento certo etc. Desta forma, o
professor assiste a aprendizagem conduzindo os alunos pelos passos de um problema
complicado, permitindo que o aluno gradualmente alcance a aprendizagem. Como saber que
tipo de ajuda oferecer e quando oferecê-la é algo que está directamente relacionado com o
conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal.

A Zona de Desenvolvimento Proximal define a distância entre o nível de desenvolvimento


real, determinado pela capacidade de resolver um problema sem ajuda, e o nível de
desenvolvimento potencial, determinado através de resolução de um problema sob a
orientação de um adulto ou em colaboração com outro companheiro (a aprendizagem
acontece no intervalo entre o conhecimento real e o conhecimento potencial.). Quer dizer, é a
série de informações que a pessoa tem a potencialidade de aprender mas ainda não completou
o processo, conhecimentos fora de seu alcance actual, mas potencialmente atingíveis.

Em outras palavras, a Zona de Desenvolvimento Proximal é a distância existente entre o que


o sujeito já sabe e aquilo que ele tem potencialidade de aprender. Seria neste campo que a
educação actuaria, que se daria a aprendizagem assistida, estimulando a aquisição do
potencial, partindo do conhecimento da Zona de Desenvolvimento Proximal do aprendiz,
para assim intervir. O conhecimento potencial, ao ser alcançado, passa a ser o conhecimento
real e a Zona de Desenvolvimento Proximal redefine-se a partir do que seria o novo
potencial.

O nível de desenvolvimento real é dinâmico, aumenta dialecticamente com os movimentos


do processo de aprendizagem. O desenvolvimento potencial é determinado pelas habilidades
que o indivíduo já construiu, porém encontram-se em processo. Isto significa que a dialéctica
da aprendizagem que gerou o desenvolvimento real, gerou também habilidades que se
encontram em um nível menos elaborado que o já consolidado. Desta forma, o
desenvolvimento potencial é aquele que o sujeito poderá construir. Nessa concepção, as
interacções têm um papel crucial e determinante.

Para definir o conhecimento real, Vygotsky sugere que se avalie o que o sujeito é capaz de
fazer sozinho, e potencial aquilo que ele consegue fazer com ajuda de outro sujeito. Segundo
Vygotsky, em qualquer ponto do desenvolvimento existem certos problemas que uma criança
está prestes a ser capaz de resolver. Ela precisa apenas de alguma estrutura como pistas e
lembretes, ajuda para recordar detalhes ou passos, incentivo para continuar tentando etc. Por
outro lado, alguns problemas estão além da capacidade da criança mesmo que cada passo seja
explicado claramente. Pode acontecer inclusive, de que os melhores “professores” sejam os
outros alunos que acabaram de compreender um determinado problema, no sentido de que
estes “professores” podem estar operando na Zona de Desenvolvimento Proximal do aprendiz
Assim determina-se a Zona de Desenvolvimento Proximal e o nível de riqueza e diversidade
das interacções determinará o potencial atingido. Quanto mais ricas as interacções, maior e
mais sofisticado será o desenvolvimento.

A Zona de Desenvolvimento Proximal muitas vezes é tomada como um dos níveis de


desenvolvimento, porém, trata-se precisamente do campo intermediário do processo. Sendo o
desenvolvimento potencial uma incógnita, já que não foi ainda atingido, Vygotsky postula
sua identificação através do entendimento da Zona de Desenvolvimento Proximal. Tomando-
se como premissa o desenvolvimento real como aquilo que o sujeito consolidou de forma
autónoma, o potencial pode ser inferido com base no que o indivíduo consegue resolver com
ajuda. Assim, a zona proximal fornece os indícios do potencial, permitindo que os processos
educativos actuem de forma sistemática e individualizada. O esforço pedagógico deve se
situar no sentido de, segundo Neves (2006):

Criar Zonas de Desenvolvimento Proximal, isto é, actuando como elemento de


intervenção, de ajuda. Na Zona de Desenvolvimento Proximal, o professor actua de
forma explícita, interferindo no desenvolvimento dos alunos, provocando avanços que
não ocorreriam espontaneamente. Vygotsky, dessa forma, resgata a importância da
escola e do papel do professor como agentes indispensáveis do processo de ensino
aprendizagem. O professor pode interferir no processo de aprendizagem do aluno e
contribuir para a transmissão do conhecimento acumulado historicamente pela
Humanidade. É nesse sentido que as ideias de Vygotsky sobre a Educação
constituem-se em uma abordagem da transmissão cultural, tanto quanto do
desenvolvimento. (p. 09).

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