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DE 9 A 12 DE OUTUBRO
Resumo: Discutimos neste texto a relação entre imigração estrangeira e a questão regional no início
da República em Minas Gerais. Nossa preocupação é demonstrar as estratégias discursivas e o
emolduramento de regiões a partir do uso político da mão-de-obra estrangeira como um elemento
estruturador de novos territórios. Além disso, queremos indagar como determinadas cidades vão se
destacar no nascimento das “regiões do mandar” em Minas Gerais.
Resumen: En este trabajo se discute la relación entre la inmigración extranjera y la cuestión regional
en el inicio de la República, en Minas Gerais. Nuestra preocupación es demostrar las estrategias
discursivas y o “encuadre de las regiones” mediante la utilización política de la mano de obra, los
trabajadores extranjeros como un elemento estructural de nuevos territorios. Además, queremos
preguntar cómo ciertas ciudades se destacan en el nacimiento de las “regiões do mandar” en Minas
Gerais.
1 – Introdução
Designando parcela de território resultante de uma divisão política,
administrativa ou paisagística, a ideia de região foi manejada de forma recorrente no
contexto brasileiro, no findar do século XIX, em virtude da expressiva migração de
estrangeiros para o país. Nesse contexto, a apreensão de Minas Gerais como um
“mosaico de regiões” foi potencializada nos discursos que tanto valorizavam a
diversidade e riqueza ambiental das diferentes áreas quanto atribuíam valores
negativos a algumas delas.
A despeito da palavra “região” ter sido assumida como sinônimo daquilo que
apresenta uma unidade paisagística de uma determinada área, após o surgimento
das Assembleias provinciais (1835) este termo foi alvo de novas semantizações,
sobretudo a partir dos anos 1870. Embalados pelos “ventos republicanos”, alguns
fatores contribuíram para deslocar o significado desse vocábulo, que passou a servir
muito mais para ilustrar as potencialidades sociais e econômicas de determinadas
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- Geógrafa, Mestre e Doutora em Planejamento Urbano e Regional. Professora Associada do Departamento de Geografia da
Universidade Federal de Viçosa – Minas Gerais. E-mail de contato: isachrysostomo@ufv.br
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- Acadêmico do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Juiz de Fora. Bolsista CAPES. E-mail de
contato: hmozart@gmail.com
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A escolha deste corte temporal teve como critério de escolha os maiores investimentos destinados à política de
imigração e colonização em Minas Gerais.
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Historicamente o autor demonstra que essa diversidade foi forjada desde o período colonial em virtude das medidas
restritivas à construção de estradas.
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Tudo isso sem falar dos interesses daqueles que desejavam a permanência da capital em Ouro
Preto.
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Ver: AGUIAR, Tito Flávio Rodrigues de. Vastos subúrbios da nova capital: formação do espaço
urbano na primeira periferia de Belo Horizonte. 2006. 443f. Tese de Doutorado em História –
Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte,
2006.
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visibilidade aos conflitos regionais, colocando em cena a figura dos imigrantes como
atores capazes de salvaguardar o progresso no campo e na cidade. Por isso, não
deixa de ser significativo o papel exercido pela colônia de Barreiros, a primeira a ser
instalada em Belo Horizonte. Esta, além de abrigar levas de imigrantes estrangeiros,
tinha como proposta impulsionar o ensino técnico-agrícola.
A disputa por ferrovias é um outro aspecto relevante a ser considerado
quando se discute a moldura das novas regiões em Minas Gerais. Primeiramente,
pelo fato das mesmas produzirem novos espaços e territórios, exercendo forte poder
de transformação nos “fluxos e fixos”. Já tratado por vasta bibliografia, evidenciamos
este aspecto para demonstrar o poder do Sul da Zona da Mata – região que desde
meados do século XIX se notabilizava em virtude do representativo plantel de café e
da mão-de-obra escravizada.
Como indica Blasenheim (1996), os políticos e fazendeiros mineiros
concordavam que seria necessário estimular a exportação da rubiácea matense,
pois além de fortalecer a economia do estado, possibilitaria investimento em novas
vias férreas. Nessa medida, mesmo sofrendo oposição da região central, a Zona da
Mata, que representava apenas 5% da superfície do total do estado, irá abrigar, em
1884, quase 60% da rede ferroviária existente.
Analisando esse mesmo contexto, Soares (2009) dedica-se a compreender o
papel polarizador exercido pela cidade de Juiz de Fora na construção da região
propiciada pela densificação da rede urbana. A autora revela que em função da
economia do café ocorre uma mudança no padrão de urbanização influenciado pelo
forte poder concentrador dessa cidade – a mais destacada em termos econômicos e
populacionais. No entanto, a despeito da dependência dos vários pequenos núcleos
a Juiz Fora, ela assinala que os centros de tamanho intermediário também exerciam
importante papel. Isso contribuiu não apenas para amenizar o comando ultra
concentrador da cidade na região da Mata, como para colocar em destaque outros
centros como o de Leopoldina, Ubá e Ponte Nova.
Nessa perspectiva, um dos aspectos que ficou demarcado nesse jogo de
poder no interior da Zona da Mata foi o permanente reajustamento espacial em
decorrência da economia do café, da cana-de-açúcar e demais atividades. Ressalta-
se que a região da Mata foi a que mais implantou núcleos de colonização,
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Válido lembrar que entre 1889 a 1930 foram instalados vinte nove núcleos, sendo a maioria situados na Zona da Mata
e Sul de Minas (MONTEIRO, 1973).
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O que vemos escrito no jornal “A Verdade Política” ilustra a maneira pela qual
os imigrantes passaram a ser concorridos pelas lideranças locais da própria Zona da
Mata e, também, por outras regiões. A matéria, como outras, exemplifica a
insatisfação pela concentração desse serviço em Juiz de Fora. Não por acaso, a
existência de apenas uma hospedaria situada na cidade em questão foi um dos
principais motivos de queixas das outras localidades e alvo de intensos conflitos no
parlamento mineiro. Exemplo disso pode ser visualizado no relato abaixo:
A pratica vae demonstrando que a derrama de imigrantes pela
provincia, unicamente pela hospedaria de Juiz de Fora, traz difficuldades e
despezas ao fazendeiro, de modo a entibiar-lhe o animo, na acquisição
desses auxiliares.
Aquella hospedaria, que póde bem servir á zona da Matta, não está
collocada nas mesmas condições favoraveis em relação à zona do campo e
ás regiões do sul, norte e oeste de Minas (ARAUTO DE MINAS, S. João Del
Rey, 17.nov. 1888, p.1).
Por isso, como nos lembra Monteiro (1973), a municipalização desse serviço
criando outros centros de atração imigratória, constituiu-se em uma nova estratégia
do governo para compatibilizar os diferentes interesses locais. A proposta seria tanto
distribuir os imigrantes de forma mais igualitária por todas as zonas produtivas do
território como possibilitar a diversificação da economia. A fração abaixo, retirada
ainda no Jornal “A verdade Política” de São João del Rey expressa essa questão:
(...) Somos, portanto, a favor dos agentes, da publicidade, mas
sobretudo das agencias n’esta cidade como em todas as outras do centro.
[…]
Sobre isso há a considerarem-se as conveniências do próprio
colono, que quando mais afastado da matta menos rigor encontra no clima
e mais similitude com o de sua pátria.
A nossa cidade, por exemplo, se não entra em paralelo com as da
matta quanto a lavoura sobrepuja-se na amenidade do clima e os terrenos
de seu município adaptando-se a qualquer agricultura proprorcionam ao
colono facilidade de subsitencia e meios de continuar aquellas a que já está
habituado
A vinha, o trigo e quasi todos os produtos agrícolas dão nas zonas
do campo com admirável desenvolvimento, o que não sucede na matta,
onde o café é quasi a lavora exclusiva” (A VERDADE POLÍTICA, S. João
o
d’El-Rey, 1 . nov. 1888, p.1).
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4 – Considerações Finais
As propostas de imigração estrangeira, no período analisado, abriram-nos
possibilidades para desvendar as singularidades do conflituoso processo de
organização do território e de criação de uma região – entendida aqui como um
recorte forjado e moldado pelos homens de poder, a partir das relações de
dependência ambiental, comercial, jurídica e política de uma dada cidade.
Como pressuposto assumimos que as políticas imigratórias implicaram em
um amplo debate sobre as formas de constituição de um poder gerador, por
excelência, de contra-poderes. Consideramos ainda que a iniciativa de identificar
uma cidade como “cidade de imigrantes”, é fruto da manipulação discursiva dos
chamados recursos naturais e da construção da ideia de vocação regional.
Nessa medida, o uso da palavra região e suas apropriações, contemplava,
sobretudo, os elementos de uma área que eram passíveis de serem utilizados para
a produção da riqueza. Exemplo disso pode ser visualizado através da associação
da Zona da Mata, via de regra, às lavouras cafeeiras e das demais regiões à
diversificação agrícola. Ou seja, as regiões que em termos econômicos possuíam
um papel marginal, eram representadas especialmente como áreas que
apresentariam um enorme potencial para contribuir com a soma geral da riqueza do
estado. Tratar-se-ia de regiões do devir, acalantadas por uma natureza ainda não
aproveitada. Em ambos os casos, o regionalismo, enquanto discurso apoiado na
natureza, foi sobremaneira acionado pelos líderes políticos para a realização de
seus interesses.
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5- Fontes Primárias
ARAUTO DE MINAS (1888).
A VERDADE POLÍTICA. São João Del-Rei (1888).
CAPRI, Roberto. Minas e seus municípios. Bello Horizonte, Zona da Matta, 1916.
MINAS GERAES. Ouro Preto, Minas Gerais (1890-1899).
Mensagens dos Presidentes do Estado de Minas Geraes (1890-1899).
O ESTADO DE MINAS GERAES. Ouro Preto, Minas Gerais (1890-1899).
6 – Referências
BLASENHEIM, Peter L. As ferrovias de Minas Gerais no século
dezenove. Locus: Revista de História. Juiz de Fora, v.2, n.2, 1916. S. Paulo: Pochi
Weiss & Comp.
CASTRO, Iná Elias de. Do imaginário tropical à política: a resposta da geografia
brasileira à história da maldição. Scripta Nova, Barcelona, v.X, N. 218 (11), 2006.
Disponível em: <http://www.ub.edu/geocrit/sn/sn-218-11.htm>. Acesso em: 26. fev.
2014.
FOUCAULT, Michel. Segurança, Território, População. Curso no Collège de
France (1977-1978). São Paulo: Martins Fontes, 2008.
JULIÃO, Letícia. Sensibilidades e representações urbanas na transferência da
Capital de Minas Gerais. In: Dossiê: Capitais sonhadas, capitais abandonadas,
História (São Paulo) v.30, n.1, p.114-147, jan/jun 2011
MONTEIRO, Norma Góes. Imigração e Colonização em Minas: 1889-1930. Belo
Horizonte: Imprensa Oficial, 1973.
SOARES, Josarlete Magalhães. Das Minas às Gerais: um estudo sobre as origens
do processo de formação da rede urbana da Zona da Mata mineira. Dissertação de
Mestrado defendida no Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da
UFMG, 2009.
WIRTH, John. O fiel da balança: Minas Gerais na federação brasileira, 1889-1930.
Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982.
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