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São Paulo
2015
Copyright © 2015 por Marcos Granconato
Publicado pela Hermeneia Editora
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Granconato, Marcos
A prática da igreja de Deus / Marcos Granconato – São Paulo:
Hermeneia, 2015.
3ª Edição Revista e Ampliada
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Pureza: A igreja que não zela pelo pilar da pureza muito cedo se verá
invadida pelos costumes e práticas do mundo que, aos poucos, tomarão
conta dela (1Co 5.6). Então, nenhuma diferença haverá entre a igreja e
qualquer associação de incrédulos. Na verdade, uma igreja assim será
ainda pior do que uma sociedade de pagãos, pois, por causa dela, o
evangelho será desacreditado e o nome de Cristo será blasfemado entre
os perdidos (1Tm 6.1; 2Pe 2.1-2). Se não primar pela pureza em seu
meio, a igreja logo se tornará um covil de hipócritas, perderá sua força
espiritual, desencorajará a vida de temor, afastará do seu convívio os
que buscam a Deus com sinceridade e atrairá sobre si a ira do Senhor
(1Co 10.21-22; Ap 2.12-25). A pureza da igreja, portanto, é questão de
sobrevivência! Se essa coluna for derrubada, toda igreja cairá,
tornando-se apenas um aglomerado de pessoas que nutrem os padrões
do mundo, às vezes de maneira até mais escandalosa (1Co 5.1). A
ferramenta mais importante para a manutenção da pureza da igreja é a
disciplina eclesiástica prevista em Mateus 18.15-17 e 1Coríntios 5.1-5.
Esses cinco pilares não devem ser usados somente como fundamentos da
igreja como organização, mas também como alicerces sobre os quais a vida de
cada crente é construída. De fato, cada irmão, no seu dia a dia, tem de adorar o
Deus trino, aprender a verdade e ensiná-la aos que estão à sua volta, manter
acesa a chama da santa comunhão com outros crentes, proclamar o evangelho
aos perdidos e buscar pureza no seu proceder.
Sob o ponto de vista teológico, a igreja local não é uma espécie de célula
visível ou a expressão concreta do que tem sido chamado de “novo Israel de
Deus”.
A teologia cristã antiga, já a partir do século 2, israelizou a igreja e, nesse
particular, tem sido hoje seguida pela teologia aliancista (ou teologia do pacto),
dominante no meio evangélico (tradicional ou não). Ora, as implicações práticas
disso podem ser vistas ao longo dos séculos e na atualidade em diversos
equívocos.
Entre esses equívocos podem-se destacar os seguintes:
fazendo com que essas pessoas sejam vistas como uma espécie de elite
dentro da igreja.
e terreno (At 1.6) como uma esperança judaica grosseira[13] que deve dar
lugar a uma concepção absolutamente espiritual do reino messiânico.
4. A falta de interesse pelo entendimento judaico acerca do cânon do AT, o
que levou alguns pais da igreja antiga a fazer uso de livros apócrifos na
construção de sua teologia.[14]
5. A aceitação do uso de imagens no culto cristão tendo como um dos
fundamentos para essa prática a ideia de que sua reprovação refletia uma
perniciosa forma judaica de pensar.
6. A degradação dos israelitas pela lei canônica[15] e pela tradição
parcela de culpa pelo Holocausto, o que foi admitido por vários círculos
protestantes, especialmente na Europa, a partir de 1950.
O fato, porém, é que na Bíblia existe clara distinção entre Israel e igreja,
ambos ocupando espaços distintos no plano de Deus. De fato, nada na Escritura
corrobora a ideia de que o advento da igreja a posicionou como substituta de
Israel, de maneira que essa nação deixasse de ocupar espaço de alta importância
no projeto de Deus para a história (Rm 1.16).
Textos como Jeremias 31.35-37 envolvem a promessa de Deus de
preservar Israel para sempre como nação, sem jamais rejeitar sua descendência.
O fato de isso ter sido dito ao povo rebelde dos dias de Jeremias mostra que se
trata de uma promessa incondicional.
Ademais, o Israel étnico é visto também no Novo Testamento como o
povo eleito que Deus não rejeitou (Rm 3.1-2; 9.1-5; 11.1-2). Isso, é claro, não
significa que cada judeu é eleito para a salvação. Na verdade, Paulo diz que
apenas um número limitado de israelitas foi escolhido no sentido salvífico (Rm
11.5-6). Mesmo assim, permanece intocável a verdade de que a nação judaica
inteira foi eleita por Deus num sentido instrumental, isto é, como veículo por
meio do qual ele realiza seus planos de abençoar e salvar (Gn 12.3; 28.14; Jo
4.22; Rm 11.11-12,15).
Romanos 11.28 alude claramente à eleição não salvífica de Israel. Isso
mostra que nem mesmo a rejeição do evangelho fez com que essa nação
perdesse seu status como povo especial de Deus. Aliás, esse status também é um
dos motivos pelos quais todo o Israel será salvo na inauguração da futura era
messiânica (Rm 11.25-27).
Assim, não é correto definir a igreja como um novo Israel de Deus. A
verdade é que a igreja se constitui num povo diferente, composto sim por judeus
e gentios, mas de maneira que perfazem juntos uma terceira classe de homens –
os homens novos – livre de distinções raciais (Ef 2.11-18), trazida à luz pela obra
de Cristo ao tempo dos apóstolos (Ef 3.1-9) e com um espaço específico dentro
dos propósitos de Deus para o presente (Ef 3.10-11; 1Tm 3.15) e do seu plano
para o futuro (1Co 6.2-3; 15.22-23; 1Ts 4.14-18).
Duas questões
1) Conforme o ensino deste capítulo, fundar uma igreja sem a tutela de outra não
é prática recomendável. Não foi, porém, exatamente isso o que fizeram os
reformadores quando se desligaram da Igreja Católica?
Não. Os reformadores do século 16 não fundaram igrejas novas. Eles apenas
reformaram as antigas, purgando-as dos erros e das superstições papistas. Além
disso, é bom lembrar que os reformadores não se desligaram da Igreja Católica.
Na verdade, foi essa igreja que os expulsou.
A pregação
A oração
Outro componente do culto cristão é a oração (At 2.42). Esta, para ser
aceitável, deve ser feita em nome do Filho (Jo 14.13-14), com a assistência do
Espírito Santo (Rm 8.26) e na expectativa de que somente a vontade do Pai seja
feita (Mt 6.10; 1Jo 5.14). A oração pode ser dirigida a qualquer uma das três
pessoas da Santíssima Trindade,[24] mas nunca a santos ou anjos (Fp 4.6-7). Além
disso, o crente deve rogar por coisas lícitas (1Tm 2.1-2) e por pessoas vivas ou
que ainda hão de nascer, jamais orando pelos mortos (2Sm 12.16,21-23).
Observe-se ainda que, durante o culto público, a oração deve ser proferida numa
língua conhecida pela congregação (1Co 14.16-19).
Na Bíblia, pode-se encontrar pelo menos seis orientações básicas acerca
da oração que devem ser observadas pelos cristãos na prática de seus atos
cultuais.
Primeiro, as Escrituras ensinam que o crente deve orar com reverência.
Os cristãos têm uma percepção clara da majestade de Deus e da grandeza da sua
santidade. Conhecendo a Santa Palavra, eles sabem que o Senhor está envolto
em sublime esplendor, que ele habita na luz inacessível, que sua glória é
indizível e que sua soberania se estende sobre todo o universo e além (1Tm 6.15-
16; Jd 25). Por isso, jamais se referem ao Senhor como “o cara lá de cima”.
Tampouco falam com ele como quem fala com qualquer um. Ainda que tenham
em Deus um pai e amigo (Rm 8.15), sua intimidade com ele não lhes dá licença
para serem irreverentes (1Tm 2.8). Assim, ao orar, os crentes têm de usar uma
linguagem respeitosa e decente (Hb 12.28). Devem fazer da sua oração uma
oferta verbal pura e bonita ao Deus glorioso (Ap 5.8). Os piedosos personagens
bíblicos oravam assim e os cristãos devem imitá-los.
Em segundo lugar, o crente deve orar com humildade. A noção de se
aproximar de Deus com palavras de reivindicação, exigindo supostos direitos,
está bem longe do ensino cristão sobre a oração. Trata-se de uma noção nova,
inventada por homens de mente corrompida, que acham que podem se dirigir a
Deus como se fossem senhores dele. A verdade, porém, é que o homem é sempre
pequeno, pobre e incapaz diante daquele que é grande, rico e poderoso. Por isso,
quando oram, os crentes devem reconhecer sua miséria e necessidade e, numa
atitude súplice, implorar a ajuda imerecida de Deus (Sl 123.1-2), crendo que essa
ajuda virá somente se ele quiser e sabendo que sua vontade é soberana, não
tendo o Senhor obrigação nenhuma de fazer o que lhe é pedido (Mt 6.10; 2Co
12.7-9).
Em terceiro lugar, o crente tem de orar com contrição. O tempo de
oração, mesmo pública, deve ser como um vestíbulo dentro do qual o homem se
despe de qualquer noção de dignidade e glória pessoal. Toda confiança em si
mesmo, toda autoindulgência devem ser lançadas fora quando o cristão está
orando (Lc 18.10-14). No lugar dessas coisas, ele deve olhar para os trapos da
sua indignidade, da sua desídia, do seu pecado e da sua ingratidão (Ed 9.5-15; Is
64.6; Lm 3.40-42). Então, com o coração arrependido, deve pedir perdão e
restauração, sabendo que, como Juiz, Deus absolverá seus eleitos pelos méritos
de Cristo (1Jo 1.9) e, como Médico, ele os curará pelo poder da sua Palavra,
divino remédio (Lm 3.22-33).
Em quarto lugar, o crente deve orar com gratidão. É na oração que o
homem salvo expressa verbalmente seu louvor a Deus por tudo que ele é e por
tudo que ele tem feito. O crente reconhece em suas súplicas que nada do que o
Senhor lhe confere é devido ao seu merecimento. Ele se lembra que o ar que
respira, o alimento que come e as roupas que o cobrem são dádivas sublimes de
Deus que as derrama sobre as pessoas, apesar da sua pecaminosidade e vileza (Sl
147.7-19; At 17.25). Isso sem falar das coisas que ele concede sem que o homem
necessite delas, com o propósito doce e paterno de alegrá-lo e consolá-lo neste
mundo mau. É em face disso que o cristão remove de sua boca as reclamações e
o murmurar sombrio, dirigindo ao Senhor palavras de sincera gratidão e louvor
(Fp 4.6-7; Cl 3.15).
Em quinto lugar, o crente tem de orar com fé. Ninguém deve ser tolo ao
ponto de acreditar que pode “fazer a cabeça” de Deus, induzindo-o a realizar
alguma coisa (Is 46.10). Assim, em vez de orar crendo ingenuamente em sua
suposta capacidade de persuasão, o cristão deve fazer suas petições crendo no
amor e no poder de Deus, confiando que ele o ama como seu herdeiro especial e
que lhe fará sempre o melhor, mesmo quando seus olhos não forem capazes de
enxergar isso (Lc 11.11-13; Hb 4.16). O servo do Senhor deve crer que ele tem
poder para fazer muito mais do que lhe é pedido (Ef 3.20) e que efetivamente o
fará, caso isso se encaixe nos propósitos do seu amor infinito (1Jo 5.14-15).
Em sexto lugar, o crente deve orar com brevidade. A mente humana,
marcada pelo pecado, com muita facilidade se deixa levar durante as orações
pelo vento de pensamentos desconexos ou de preocupações terrenas. Por isso,
quando o cristão ora longamente, gera grande dificuldade de concentração tanto
para si mesmo (quando ora sozinho) como para seus irmãos (quando ora em
público). A forma de evitar isso é imitar o exemplo do Senhor (Mt 6.9-13) e
fazer uso da objetividade, abandonando jargões, frases prontas, grandes
formulações doutrinárias e exposições históricas, lembrando, inclusive, que
orações longas não são necessariamente sinais de espiritualidade (Lc 20.46-47).
O crente que ora deve, portanto, apresentar brevemente seus motivos, seus
louvores e sua confissão. Isso ajudará a evitar que longos rios de preces
terminem num oceano de confusões mentais.
Eis aí seis pequenas “dicas” de como orar de modo bíblico e proveitoso.
Que o crente se afaste, pois, das rezas supersticiosas, das orações de quebra de
maldição ensinadas por pastores feiticeiros e das palavras de ordem e de
reivindicação que os falsos mestres estimulam os incautos a dirigir ao Senhor.
Em vez disso, que ore como os santos de Deus mencionados na Bíblia. É o
exemplo deles e o ensino do Senhor que se devem seguir. O resto é invenção
danosa.
O louvor cantado
Como será visto adiante (Capítulo 6), os crentes têm o dever de oferecer
os recursos que a igreja usará para funcionar bem e realizar suas metas. Ora, o
culto cristão fornece o contexto em que esse ato de entrega deve ocorrer. Por
isso, existe espaço na liturgia cristã para o ofertório, devendo esse aspecto da
adoração ser regido também por princípios que emanam da Palavra de Deus.
O primeiro princípio a ser observado no momento do ofertório é o
princípio da exclusividade. Com base nesse princípio afirma-se que as ofertas
dedicadas ao serviço de Deus devem vir somente das mãos do seu povo
redimido. Um exemplo claro disso se encontra em 3João 7. Esse versículo
afirma que os evangelistas itinerantes que haviam sido enviados pela igreja em
que João estava (provavelmente em Éfeso) realizaram sua jornada missionária
“nada recebendo dos gentios”, ou seja, dos pagãos incrédulos. Eles agiram assim
porque, em seus dias, os falsos mestres obtinham dinheiro fácil com a venda de
um evangelho distorcido (2Co 2.17; 4.2; 1Tm 6.5) e aqueles mensageiros de
Deus não queriam ser confundidos com os tais obreiros fraudulentos (2Co
11.13).
Hoje, o mesmo problema permanece, havendo pregadores da mentira que
tiram dinheiro dos incrédulos com mensagens vazias. Assim, para evitar que a
igreja de Deus seja confundida com um covil onde esses ladrões se reúnem,
deve-se acolher a mesma prática sensata dos antigos evangelistas de Éfeso,
recusando qualquer recurso que não venha das mãos de pessoas convertidas.
As ofertas de incrédulos também devem ser recusadas porque, tomados
muitas vezes por uma visão comercial das bênçãos de Deus, os homens perdidos
acreditam que podem comprar o favor do Senhor oferecendo-lhe alguns
trocados, como se o Dono do universo precisasse de dinheiro. Essa atitude é tão
blasfema e tão contrária à natureza santa, autossuficiente e graciosa de Deus que
é imperativo que seja desencorajada durante o momento de ofertório, a fim de
que o culto não seja maculado por impulsos tão perversos.
O segundo princípio a ser observado no momento do ofertório é o
princípio da obediência, pelo qual se estabelece que as ofertas aceitáveis a Deus
são aquelas que vêm de vidas santas, marcadas por arrependimento, retidão e
busca sincera da vontade do Senhor. A base bíblica desse princípio pode ser
encontrada já no Livro de Gênesis, onde a oferta de Caim é rejeitada porque seu
procedimento não era reto diante de Deus (Gn 4.3-7).
Outros textos fortalecem a importância do princípio da obediência,
mostrando que as dádivas que vêm de pessoas perversas, hipócritas, apóstatas e
mundanas são vistas por Deus como verdadeira abominação (1Sm 15.22; Pv
15.8; 21.27). Aliás, deve-se destacar que não são somente as ofertas de pessoas
assim que Deus rejeita, mas sim cada gesto cultual que elas realizam (Is 1.11-
15). Assim, quando for iniciar o momento de ofertório, o dirigente deve alertar
os adoradores acerca dessas coisas, a fim de que haja arrependimento no coração
de todos e as dádivas oferecidas agradem realmente a Deus (Sl 51.17).
Finalmente, durante o momento de ofertório, os cristãos devem observar
o princípio da responsabilidade pelo qual cada crente deve contribuir não com
qualquer igreja, mas com aquela de que participa, seja como membro, seja como
assíduo frequentador, sendo essa a prática reinante em todo o Novo Testamento.
É claro que o membro de uma determinada igreja é livre para,
eventualmente, dar ofertas em outra, caso queira. Isso, porém não pode ser feito
em prejuízo da igreja de que faz parte, igreja essa pela qual é responsável e que
conta com sua cooperação. Cada ovelha de Cristo deve, pois, saber que seu
compromisso maior é com o aprisco de fé e adoração em que o Supremo Pastor
a colocou, sendo livre para dar ofertas para qualquer agência do Reino, mas sem
deixar de lado a contribuição de que sua própria igreja necessita.
A bênção apostólica
Demônios no culto?
Uma das obras de Satanás e seus anjos que mais escravizam e destroem
vidas é o fenômeno da possessão demoníaca. Em face dessa aflição, duas
correntes de opinião se formam, ambas marcadas por extremismo injustificado.
Na primeira corrente, encontram-se os que em tudo veem os “chifres do diabo”.
Basta alguém ficar irado, ter um mal-estar físico, discordar do que disse o pastor,
ou simplesmente tossir, e logo dizem que a pessoa está endemoninhada.
No outro extremo encontram-se os que, mesmo diante das mais claras
evidências de possessão demoníaca, se mantêm céticos, afirmando que o que
estão testemunhando é mero resultado da bebida ou de algum problema mental.
O cristão que pretende pensar e agir de conformidade com a Palavra de
Deus deve se situar de modo equilibrado entre esses dois extremos. Deve aceitar
que a possessão demoníaca é um fenômeno que realmente existe, pois são
inúmeros os textos bíblicos que o atestam (Mt 8.28; 9.32; 12.22; 15.22; Mc 1.23;
5.2; Lc 8.2; At 5.16). Contudo, deve também ter bom senso para discernir se está
diante de alguém realmente endemoninhado ou de uma vítima de outro problema
qualquer.
Nem sempre é fácil fazer distinção. Tanto mais quando se sabe que é
possível diferentes problemas serem patentes, ao mesmo tempo, numa pessoa só.
De fato, é comum a mesma pessoa estar endemoninhada e embriagada, ou
endemoninhada e com problemas mentais, ou até endemoninhada, embriagada e
com problemas mentais, o que torna difícil, se não impossível, saber onde
terminam as evidências de um problema e começam as do outro.
De qualquer modo, parece ser ponto pacífico que a mudança de voz, a
força física descomunal (Mc 5.2-4), a alteração notável do semblante, a imitação
de movimentos e sons de animais, o olhar carregado de ódio assassino e
selvagem (Mt 8.28), a fúria incontrolável diante das verdades da Bíblia e o dizer
ou fazer coisas que o indivíduo em seu estado normal não saberia dizer ou fazer
(Mc 1.23,24) são evidências claras de possessão demoníaca. Diante de fatores
desse tipo, portanto, o crente deve considerar seriamente a hipótese de estar
lidando com um endemoninhado.
O modo de agir do cristão em face de um problema de tão elevado grau
de gravidade deve levar em conta alguns critérios, especialmente se a
manifestação demoníaca ocorrer durante um culto. Aqui também é a Palavra do
Senhor que fornecerá orientação para o povo de Deus não ser enganado nem cair
nos mesmos erros de certas seitas modernas que fazem do endemoninhado o
centro de um espetáculo, agradando com isso somente aos próprios demônios.
Estes se deleitam em ser o alvo das atenções e zombam de todos quando fingem
obedecer aos ministros que, com seus shows de exorcismo, só lhes satisfazem as
vontades e propósitos.
Para evitar tudo isso, deve o cristão e, principalmente o pastor, ter os
seguintes cuidados:
1) Quantas horas deve durar um culto e o que deve ocupar maior parcela de
tempo ao longo dessa reunião?
No passado, especialmente entre os puritanos, os cultos podiam chegar a seis ou
nove horas! Hoje, por causa das mudanças nos costumes e no estilo de vida, as
pessoas têm dificuldade para permanecer tanto tempo numa reunião. Por isso, o
melhor é que o culto dure, no máximo, duas horas. Desse período, a maior
parcela de tempo (quarenta minutos a uma hora) deve ser reservada para a
pregação que é o veículo mais eficaz para a edificação dos santos e a
proclamação da fé.
O batismo infantil
A prática do batismo infantil foi adotada muito cedo pela igreja cristã. De
fato, já no século 2 há evidências de que os cristãos batizavam seus bebês, uma
vez que criam no batismo como uma forma de remissão de pecados, capaz de
garantir a salvação das vítimas de morte prematura.
Esse chocante desvio do ensino apostólico é encontrado poucas décadas
depois de concluído o Novo Testamento. Alguns documentos do século 2 que o
atestam são a Epistola de Barnabé (11:1,11) e O pastor de Hermas (11:5; 93:2-
4). Justino de Roma (Primeira apologia 66:1) e Teófilo de Antioquia (A Autólico
2:16) também estão entre os escritores do século 2 que defendem o batismo
como forma de remissão de pecados.
É verdade que Tertuliano de Cartago († c. 220) se insurgiu contra essa
prática. Porém, ele o fez porque entendia que o arrependimento para perdão de
pecados mortais só poderia ocorrer uma vez depois do batismo.[31] Segundo
Tertuliano, esse fato deixava os que eram batizados muito cedo em situação
perigosa, sujeitos a perder irremediavelmente e para sempre o favor de Deus na
fase adulta. Para ele, esse era o motivo pelo qual o batismo devia ser protelado
até que a pessoa se sentisse mais distante do perigo de cometer pecados mortais
como o adultério, o assassinato ou a apostasia.[32]
Os reformadores do século 16 também foram favoráveis ao batismo
infantil, sendo o pastor anabatista Menno Simons uma exceção. Timothy George
explica por quê:
Regeneração batismal
A afirmação “isto é o meu corpo”, feita por Jesus pouco antes da sua
paixão (Mt 26.26), é uma das frases que mais têm originado debates ao longo da
história da igreja. Conforme dito anteriormente, na época da Reforma
Protestante a falta de acordo acerca do seu real significado foi a causa do
rompimento das relações entre Lutero e Zuínglio, após o malfadado Colóquio de
Marburgo (1529)[37] e ainda hoje o meio cristão permanece dividido acerca do
modo como a ceia do Senhor deve ser entendida, tanto no tocante à sua natureza
como no que diz respeito aos efeitos que produz sobre os que participam dela.
Num dos extremos da discussão estão os que entendem a frase de Jesus
de modo figurado, dizendo que se trata apenas de uma metáfora, como se o
Mestre tivesse dito simplesmente “isto representa o meu corpo”. No outro
extremo do debate, há intérpretes que propõem uma visão absolutamente literal,
ensinando que os elementos da ceia são, de fato, o corpo e o sangue reais de
Cristo, num sentido que encerra a sua mais completa essência. Entre esses dois
polos há interpretações intermediárias, propostas por teólogos que tentam
compor uma opinião mais equilibrada, fazendo uso, inclusive, de argumentos
usados pelos dois extremos.
Basicamente, quatro são as concepções acerca da ceia do Senhor
dominantes do meio cristão: transubstanciação, consubstanciação, presença
espiritual e memorial.
A doutrina da transubstanciação é esposada pela Igreja Católica
Apostólica Romana[38], sendo um dos temas centrais de sua teologia e prática
litúrgica.[39] De acordo com essa visão, a ceia deve ser ministrada ao povo num
só elemento, a hóstia, nome dado a um pequeno pão sem fermento, de formato
arredondado.[40] Esse elemento, dizem, após ser consagrado pelo sacerdote
ministrante, passa por uma transformação em sua substância (daí o termo
transubstanciação), tornando-se literalmente carne, sangue, ossos, unhas e
cabelos de Cristo.
Os católicos entendem que essa transformação não é visível porque
ocorre apenas na substância do pão e não nos seus acidentes. Assim, conforme
alegam, o elemento eucarístico, ainda que apresente em sua forma e aparência os
atributos do pão, é, na verdade, em sua essência, carne humana!
Uma das implicações da doutrina da transubstanciação é que sempre que
a eucaristia é celebrada no culto católico (e isso acontece em todas as missas), o
sacrifício de Cristo se repete.[41] Portanto, se três missas forem realizadas num só
domingo numa mesma catedral, naquele dia o sacrifício de Cristo se repetirá ali
três vezes, o mesmo ocorrendo em outras igrejas romanistas ao redor do mundo.
É essa suposta repetição contínua do sacrifício do Senhor que dá o motivo pelo
qual as igrejas católicas celebram sua ceia num altar e não numa mesa como
fazem as igrejas evangélicas.
A doutrina da transubstanciação também explica porque os padres, pelo
menos há alguns anos, orientavam os fiéis a não morder a hóstia, mas sim deixá-
la dissolver-se na boca. Essa era uma forma de tentar infundir nas pessoas um
entendimento maior acerca do suposto mistério presente no “corpo eucarístico de
Cristo”.
Essa doutrina é ainda o fundamento pelo qual os sacerdotes católicos
tendem a fazer o “sepultamento” de hóstias consagradas que sobram após
encerrada a missa. No seu entender, jogá-las fora seria sacrilégio cometido
contra o próprio corpo de Cristo e armazená-las não seria o modo digno de lidar
com um cadáver tão santo.
Os católicos acreditam que é somente graças ao milagre da
transubstanciação que o homem pode efetivamente conhecer Cristo como o pão
da vida e se alimentar dele para viver eternamente (Jo 6.48-58). Segundo eles,
comer a hóstia consagrada ajudará o fiel a conquistar a salvação, sendo, pois,
imensos os benefícios espirituais que emanam da eucaristia.[42]
Evidentemente, não há como sustentar essa concepção da ceia, nem
racional nem tampouco biblicamente. Primeiro porque não faz sentido propor a
hipótese de uma mudança de substância sem uma consequente alteração nos
acidentes, pois os acidentes de determinada substância pertencem
necessariamente a ela. Assim, não há como um pedaço de pão deixar de ser pão
e continuar com as células do pão. Negar isso seria contrariar as mais
elementares noções de lógica.
O absurdo dessa concepção também é percebido quando se leva em conta
a própria história da instituição da ceia. Ora, é óbvio que, quando o Senhor disse
“isto é o meu corpo”, não estava segurando um pedaço dele próprio. Com efeito,
naquele momento o pão estava nas mãos de Jesus, não era uma extensão de seus
dedos.
A doutrina da transubstanciação, com todos os seus desdobramentos,
também não leva em conta ensinos fundamentais da Palavra de Deus. As
Escrituras ensinam que o sacrifício de Cristo ocorreu uma vez por todas, não
havendo necessidade de que se repita (Rm 6.9-10; Hb 7.27; 9.12, 26, 28; 10.10;
1Pe 3.18).
Ademais, quando o Senhor afirmou ser o pão da vida, sendo necessário
comer o seu corpo e beber o seu sangue para ser salvo (Jo 6.48-58), não
pretendia com isso ensinar algum tipo de antropofagia, como entenderam seus
ouvintes naquela ocasião (Jo 6.52).
O que Jesus quis ensinar no discurso registrado em João 6 deve ser
entendido à luz do versículo 35. Esse versículo revela a que Jesus se referiu
quando fez alusão aos atos de comer sua carne e beber seu sangue. De fato, João
6.35 apresenta Jesus como o Pão da Vida, destacando que quem vai a ele se
alimenta, e quem crê nele mata a sede. Logo, comer a carne de Cristo é buscá-lo;
enquanto beber seu sangue é crer nele. Alimenta-se, pois, do Senhor, o indivíduo
que o busca e deposita nele sua confiança para ser salvo. Este faz de Cristo sua
comida e sua bebida, jamais tendo fome ou sede outra vez.
Deve-se destacar, finalmente, que a doutrina da transubstanciação é
antibíblica porque conduz sutilmente a uma forma grosseira de idolatria. De fato,
crendo que a hóstia é o próprio Cristo, o católico a cultua como Deus e deposita
nela sua esperança de salvação. Esse erro chocante foi denunciado vividamente
pelo já citado pastor anabatista Menno Simons (1496-1561), ex-sacerdote
católico que se converteu a Cristo e se tornou um dos grandes pregadores do
século 16, tendo também fundado a Igreja Menonita:
Provas históricas
Calvino, contudo, não somente ensinou essas coisas. Ele também as pôs
em prática. Uma prova disso está no fato de que, em Genebra, cidade em que
atuou como pastor e estadista, foi criado, após 1545, o Fundo Francês, uma
instituição que tinha como propósito central dar apoio material aos franceses
pobres ali refugiados por causa da perseguição em sua terra natal. Calvino
contribuía prodigamente para esse fundo e é provável que tenha sido um dos
seus criadores. Ainda que os objetivos principais da instituição fossem no campo
humanitário, é sabido que o Fundo Francês era também usado para fins
missionários, sustentando pastores em Genebra que deveriam ser enviados à
França.
É também preciso destacar que, em meados do século 16, havia em
Genebra 38 tipografias, com cerca de dois mil empregados, cujo trabalho
dominante era imprimir literatura evangélica destinada aos países vizinhos,
especialmente a França. Por conta disso, na década de 1540, Paris foi inundada
pela literatura produzida em Genebra e as conversões começaram a ocorrer.
Isso despertou a atenção e o desagrado do parlamento parisiense, o qual
emitiu sucessivas listas de livros proibidos, nas quais eram incluídas quaisquer
obras que expusessem ideias calvinistas. As gráficas de Genebra, porém, não
paravam de lançar novos títulos, numa velocidade que o Parlamento não podia
acompanhar. Assim, as listas de livros censurados estavam sempre
desatualizadas e as obras de Calvino continuavam a ser vendidas e lidas pelo
povo francês.
Além disso, sendo impossível um controle absoluto sobre o comércio de
literatura por parte das autoridades de Paris, os livros proibidos procedentes de
Genebra eram vendidos no mercado negro. O resultado era que as conversões à
fé evangélica não paravam de ocorrer na França. Os registros históricos apontam
que, em 1562, dois anos antes de Calvino morrer, existiam pelo menos 1.250
congregações calvinistas naquele país, abrangendo mais de dois milhões de
membros! Foi certamente por causa desses extraordinários avanços, que a
Venerável Companhia de Pastores, outra instituição da Genebra de Calvino,
enviou 151 missionários à França só no ano de 1561![53] Essa mesma instituição,
entre 1555 e 1562, também enviou 88 ministros para quase todos os países da
Europa.[54]
A obra missionária de Calvino também abrangeu a fundação da
Academia de Genebra (1559), criada para treinar pastores e suprir a demanda
que o crescimento do número de igrejas impunha aos reformadores. Muitos
alunos da academia eram estrangeiros refugiados (franceses, ingleses,
holandeses, italianos e alemães) que, depois de formados, voltavam para seus
países de origem ensinando o que ali haviam aprendido. Entre esses alunos
esteve John Knox, o grande reformador escocês. Foi assim que a escola fundada
por Calvino tornou-se um grande centro missionário, irradiando a fé evangélica
para o mundo inteiro.
É preciso ainda lembrar que os primeiros missionários protestantes que
chegaram ao Brasil foram enviados precisamente por João Calvino. Eles vieram
a pedido de Nicolas Durand de Villegaignon (1510-1571), com o objetivo de
ensinar a fé reformada aos colonizadores franceses do Rio de Janeiro e
evangelizar os indígenas.
O grupo chegou em março de 1557, mas, menos de um ano depois, foi
expulso por causa de conflitos doutrinários com Villegaignon. Esses conflitos
resultaram na produção da Confissão de Fé da Guanabara (1558), um
documento de orientação reformada escrito por cinco calvinistas leigos
aprisionados por Villegaignon. Desses cinco, quatro foram estrangulados, pondo
fim ao trabalho missionário de Calvino no Brasil.[55]
No século 17, o Brasil mais uma vez foi cenário da atividade missionária
calvinista. Isso aconteceu como resultado indireto dos conflitos políticos entre
Espanha e Holanda. Movido por esses conflitos, Filipe II, da Espanha, proibiu as
relações comerciais entre os holandeses e todas as áreas de dominação
espanhola, o que abrangia a América do Sul. Nessa época, a Holanda dominava
a distribuição de açúcar na Europa e não podia abrir mão do comércio com a
empresa açucareira nordestina. Por isso, em 1621, foi criada a Companhia das
Índias Ocidentais, com sede em Amsterdã, cujo objetivo era a exploração
mercantil na América.
A companhia das Índias Ocidentais promoveu duas invasões holandesas
ao Brasil: uma na Bahia (1624-1625) e outra em Pernambuco (1630-1654). Esta
última foi melhor sucedida e, para garantir a paz e os seus interesses no Brasil, a
companhia enviou um representante, o conde João Maurício de Nassau, que
governou o Brasil Holandês de 1637 a 1644.
Maurício de Nassau era crente, membro zeloso e assíduo frequentador da
Igreja Cristã Reformada. Seu governo foi brilhante, cobrindo uma área que ia do
Sergipe até o Maranhão.
Ocorreu, porém, que a companhia passou a adotar políticas que
desagradavam os senhores de engenho, exigindo o pagamento imediato de
empréstimos e impondo certos limites à liberdade religiosa. Quando, então,
Maurício de Nassau pediu demissão de seu cargo, iniciou-se a luta contra os
holandeses. A chamada Insurreição Pernambucana (1645-1654) resultou na
expulsão dos invasores, os quais passaram a produzir açúcar nas Antilhas.
Foram os holandeses desse período que trouxeram para o Brasil a igreja
calvinista. Seu nome oficial era Igreja Cristã Reformada e contava com 22
congregações locais espalhadas pelo Brasil Holandês. Ela adotava confissões de
fé calvinistas, além de outros credos ortodoxos antigos, e realizou intensa obra
missionária, especialmente entre os índios.
O primeiro pastor dessa igreja a se envolver com a evangelização dos
nativos foi Vincentius Joaquimus Soler. A princípio, ele pregou na aldeia
Nassau, no Recife (atual Bairro das Graças), e somente mais tarde, a pedido dos
nativos da capitania da Paraíba, dedicou-se à evangelização dos índios. Cabe,
porém, a David Doreslaer, cujo trabalho iniciou-se em 1638, o título de primeiro
pastor missionário de tempo integral entre os nativos do Brasil.
O trabalho missionário dos calvinistas holandeses cresceu muito, a ponto
de, em 1641, ser celebrada a primeira ceia do Senhor na aldeia do cacique Pedro
Poti. Várias tribos pediam que a Igreja Cristã Reformada lhes enviasse
pregadores e congregações indígenas foram abertas. Até os antropófagos tapuias
pediram o envio de missionários. Infelizmente, nem sempre essas solicitações
podiam ser atendidas, até mesmo em virtude da instabilidade decorrente dos
conflitos entre Holanda, Espanha e Portugal. Apesar disso, 17% do trabalho
pastoral era dedicado aos índios, graças, inclusive, à iniciativa pessoal de vários
ministros que viam a pregação aos nativos como parte obrigatória do seu
ministério.
Em seu trabalho, os pastores calvinistas ganhavam a confiança dos
nativos dando-lhes assistência social (remédios, alimentos, proteção, etc.). Além
disso, traduziam partes das Escrituras para o tupi, produziam literatura
reformada em português e em tupi, primavam pela educação e formação de
professores índios (alguns se tornaram “consoladores” ou evangelistas) e
zelavam não somente pelo ensino doutrinário, mas também pelo ideal de
santidade que deve acompanhar a fé. De fato, o puritanismo holandês via a
Bíblia como norma de fé e prática (norma credendi et agendi) e isso foi
transmitido aos índios.
Infelizmente, com a expulsão dos holandeses do Brasil, em 1654, a Igreja
Cristã Reformada também partiu. Os índios convertidos foram incluídos no
“Perdão Geral” promulgado pelos portugueses. Contudo, sem acreditar nesse
perdão, os índios membros da primeira igreja evangélica verdadeiramente
brasileira fugiram para a Serra de Ibiapaba, no Ceará, a 750 km do Recife. O
local tornou-se, então, o que o padre jesuíta Antônio Vieira chamou de “Genebra
de todos os sertões do Brasil”, repleta de índios calvinistas que consideravam o
catolicismo uma fé falsa.
No mesmo ano da expulsão dos holandeses, os índios da Serra de
Ibiapaba enviaram uma pequena delegação a Holanda, suplicando socorro em
prol do povo que havia abraçado a fé calvinista. Porém, a Igreja Cristã
Reformada viu-se atada pelas negociações de paz entre Portugal e Holanda e não
enviou auxílio. Por isso, a igreja indígena morreu. Aos poucos seus membros
foram novamente submetidos a Roma ou massacrados como hereges. Foi assim
que terminou um dos capítulos mais belos da história da igreja reformada no
Brasil; e esse capítulo prova quão falaciosa é a acusação de que os calvinistas
não se importam com a evangelização dos povos sem Deus.[56]
As provas históricas do empenho evangelístico dos calvinistas são
inumeráveis. Porém, para concluir esse assunto, é suficiente apontar somente
mais dois personagens: George Whitefield[57] e Charles Haddon Spurgeon, sem
dúvida os maiores pregadores de todos os tempos, ambos fervorosos expoentes
da fé reformada, com sua ênfase na doutrina da predestinação dos santos.
George Whitefield nasceu em Gloucester, na Inglaterra, em 1714, e
morreu em Newbury Port, nos Estados Unidos, em 1770. Ele viveu menos de
sessenta anos, mas dificilmente a história poderá mostrar um homem mais zeloso
no trabalho de proclamação das boas-novas aos perdidos. De fato, Whitefield foi
o maior pregador da Inglaterra no século 18 e, certamente, um dos mais notáveis
evangelistas de todos os tempos. Com certeza, ele foi o principal líder do Grande
Avivamento evangélico que varreu a Inglaterra há mais de duzentos anos.
Whitefield começou a pregar em 1736 e, já no ano seguinte, era capaz de
reunir grandes multidões em Londres dispostas a ouvi-lo. A ele cabe a honra de
ter sido o primeiro evangelista da igreja moderna a pregar ao ar livre, rompendo
antigas tradições eclesiásticas em prol da expansão da fé.
A estratégia de pregar a céu aberto foi usada pela primeira vez por
Whitefield em 1739. Ele foi motivado pelas terríveis informações que lhe
chegaram acerca da vida depravada dos trabalhadores das minas de carvão que
moravam numa vila perto de Bristol. A princípio, Whitefield pregou ao ar livre
para um grupo de cem homens daquela vila, mas seu impacto foi tão grande que
logo o número passou para cinco mil, superando mais tarde os vinte mil
ouvintes. Aquelas pessoas nunca tinham entrado numa igreja e, mesmo cansadas
e sujas em virtude do trabalho nas minas de carvão, não iam para casa,
preferindo ficar de pé ouvindo a pregação de Whitefield.
Desde esse tempo até o fim da vida, Whitefield se dedicou à pregação em
lugares abertos, alcançando dezenas de milhares de pessoas tanto na sua terra
natal como na Escócia, onde esteve 14 vezes.
A partir de 1738, Whitefield fez também diversas viagens aos Estados
Unidos a fim de pregar o evangelho ali. Sua coragem em atravessar o oceano
treze vezes em suas idas e vindas à América, enfrentando todos os perigos que
essa viagem representava no século 18, mostra o zelo missionário desse pastor
calvinista que, em 34 anos de ministério, pregou cerca de 18 mil sermões!
Proclamando suas mensagens ao ar livre ao longo de toda a vida,
Whitefield enfrentava qualquer situação, mesmo as mais difíceis. Frio, calor,
chuva e neve, nada disso o impedia de anunciar a Palavra às multidões que,
também sob essas condições se ajuntavam para ouvi-lo. Ele pregava cerca de
seis vezes por dia e fez isso por mais de três décadas! Não tinha descanso no
trabalho, submetendo seu corpo a severas tensões. Foi por isso que, durante sua
sétima visita aos Estados Unidos, estando extremamente exausto e doente,
faleceu em Newbury Port, Massachusetts, com apenas 56 anos de idade, após
árduos esforços para pregar uma última vez.
Ninguém mais do que George Whitefield provou como a fé calvinista
move o crente ao evangelismo. Sendo árduo defensor da doutrina da eleição
soberana de Deus, ele foi um evangelista incomparável, superando todos do seu
tempo no nobre trabalho de alcançar os escolhidos do Senhor.
Whitefield pregou para a aristocracia inglesa, para os homens humildes
do campo e das minas e para as crianças dos orfanatos, tanto em sua terra natal
como em regiões distantes dali. A fé reformada não o desencorajava. Muito pelo
contrário. Foi essa fé que se constituiu na base de todo o seu empenho, por
décadas a fio, até a morte. Hoje, os que dizem que calvinistas não evangelizam
devem estudar a vida de George Whitefield. Isso, certamente, os fará mudar de
opinião!
Uma dramática mudança de opinião acerca do zelo evangelístico
calvinista também ocorrerá no crítico da fé reformada que estudar a vida de
Charles Haddon Spurgeon (1834-1892), notável pastor batista inglês, conhecido
como o “Príncipe dos Pregadores”.[58]
Mesmo pertencendo a uma família de tradição protestante e sendo criado
sob a forte influência de seu avô, um pastor congregacional, Charles Spurgeon
só se converteu realmente aos 16 anos de idade. Logo no início de sua vida
cristã, ele mostrou grande preocupação pelas almas, dedicando-se à distribuição
de folhetos, ao ensino na escola dominical e, eventualmente, à pregação. Aos
poucos, porém, suas habilidades como comunicador da Palavra de Deus
começaram a aflorar e Spurgeon viu sua fama de pregador crescer quando ainda
era bem jovem.
Em 1852, ele se tornou pastor e, dois anos depois, assumiu o ministério
na Capela Batista de New Park Street, em Londres. Seu desempenho ali como
pregador e evangelista atraiu tantas pessoas que as ruas ao redor da igreja logo se
tornaram intransitáveis por conta da multidão que afluía para ouvir o jovem
pastor. Em pouco tempo, a igreja teve de se mudar para Newington, onde, em
1861, foi construído o Tabernáculo Metropolitano, que abrigava cerca de 12 mil
pessoas. O local ficava repleto de homens e mulheres desejosos de ouvir os
sermões ardentes de Spurgeon que anunciava o Evangelho com uma paixão e
clareza nunca vistas em nenhum outro pregador daqueles dias.
Charles Spurgeon era calvinista convicto e seus sermões são prova cabal
desse fato.[59] Defendendo vigorosamente a doutrina da predestinação dos santos
e a eleição incondicional, ele foi, ao mesmo tempo, um zeloso evangelista de
renome mundial, pregando em diversos países da Europa, tanto em igrejas ou em
amplos salões como ao ar livre. Ele pregava de oito a doze vezes por semana e
chegou a falar para um público de mais de 23 mil pessoas, no Crystal Palace, em
Londres.
Tantas foram as pregações de Spurgeon que, quando seus sermões
passaram a ser publicados, a partir de 1855, a obra abrangeu 63 volumes, com
mais de 3.500 homilias. Desejoso de que a mensagem de Cristo alcançasse o
maior número possível de pessoas, Spurgeon se esforçava para que as
publicações dos sermões fossem semanais, revisando ele próprio os textos antes
que chegassem ao público. Como resultado dessa imensa obra evangelizadora,
Spurgeon batizou cerca de 15 mil pessoas ao longo de quarenta anos de
ministério pastoral. Mais tarde, seus sermões foram traduzidos para diversos
idiomas, transformando vidas em todo o mundo.
Sempre preocupado com a divulgação da mensagem cristã, Spurgeon
também começou um trabalho de treinamento de evangelistas e pastores, o que
deu origem ao posteriormente chamado Spurgeon’s College. Essa instituição
existe até hoje, adotando a mesma visão do seu fundador e formando
evangelistas, missionários e pastores.
Charles Spurgeon adotava uma concepção ortodoxa das Sagradas
Escrituras e, por isso, passou a ser fortemente criticado pelos membros liberais
da União das Igrejas Batistas da Inglaterra da qual sua igreja fazia parte. Por
causa disso, em 1887, ele se desligou da união e, sob severa oposição, viu sua
saúde minguar. Spurgeon tinha gota, reumatismo e uma enfermidade crônica
degenerativa incurável chamada Doença de Bright. Ele morreu aos 57 anos.
Grandes cortejos foram realizados em Londres por ocasião de seu sepultamento
no cemitério de Norwood. Naquele dia, 31 de janeiro de 1892, o Senhor tomou
para si um dos maiores evangelistas de todos os tempos.
Quem conhece a vida e os sermões de Spurgeon vê quão grande é o
impulso que a doutrina da eleição incondicional dá ao evangelismo. Aquele
grande pregador provou que, encorajados pelo precioso ensino acerca da
predestinação dos santos, os homens de Deus se lançam com maior empenho na
busca daqueles que o Senhor escolheu e trazem para o seio da igreja os
convertidos verdadeiros em quem a graça do Senhor realmente atuou.
Divulgando a fé
mundo, a fim de sofrer o castigo pelo pecado em seu lugar (Rm 5.6-8);
4. Por isso, Cristo foi crucificado, morto e sepultado, mas ao terceiro dia
3) Com que intensidade o pregador deve insistir para que alguém se converta?
Essas insistências, muitas vezes, partem da ideia (ou dão a entender) que a
pessoa tem de ir à frente para ser salva. Por isso, “martelar” o convite por
longos períodos pode ser mais prejudicial do que se imagina.
Também na esfera do evangelismo individual, a prática de insistir
ininterruptamente para que alguém creia em Cristo é estranha ao modelo
bíblico. O livro de Atos mostra que os evangelistas apresentavam o evangelho
com clareza e até se envolviam em longos debates visando a convencer as
pessoas acerca da salvação em Cristo (At 6.9-10; 28.23). Porém, quando afinal
os incrédulos diziam “não” à mensagem, eles se dirigiam a outros ouvintes (At
13.46; 28.24-29). Na verdade, os pregadores do NT apresentam o evangelho a
um mesmo grupo no máximo duas vezes! Isso mostra que, quando há rejeição,
ataque ou zombaria, o evangelista deve interromper seu trabalho e buscar
outras pessoas (Mt 7.6).
Capítulo 5 – OS MEMBROS QUE VÊM E VÃO
O meio evangélico de hoje revela uma ampla ausência de qualquer noção
de congregacionalidade. Isso acontece porque muitos líderes eclesiásticos atuais
de destaque desprezam o congregacionalismo bíblico – um modelo que realça a
importância da participação do povo santo nos rumos e decisões da igreja. O
modelo congregacional é claramente visto em textos como Mateus 18.17, Atos
6.2-3, 15.2 e 2Coríntios 2.6. Porém, não levando em conta esse aspecto da
eclesiologia apostólica, vários movimentos (pseudo?) evangélicos evitam formar
uma comunidade eclesiástica local definida, fixa, bem identificada e
comprometida. Tudo que importa é apenas atrair multidões variáveis, formadas
por milhares de anônimos sem nenhum vínculo oficial com a igreja.
Muito diferente disso, o que se vê na Bíblia é que as igrejas locais são
formadas por grupos certos e determinados em que cada componente da
comunidade cristã está conectado a ela de forma intensa e responsável,
participando ativamente da vida, dos problemas, das escolhas, dos planos e dos
destinos da igreja a que pertence.
Por isso, dada a importância da congregação na eclesiologia bíblica, e
considerando que a congregação é, obviamente, formada por indivíduos, toda
igreja precisa de um rol de membros definido. Isso deixará claro quem de fato
compõe a congregação local e desfruta, assim, do precioso direito de participar
das decisões e direções eclesiásticas.
Neste capítulo serão brevemente expostas as formas mais comuns pelas
quais um crente pode se tornar parte do rol de membros de uma igreja local e
também as maneiras como pode ser desligado.
Dá-se aqui especial realce à conversão como requisito essencial para sua
admissão e também se destaca a vida de santidade como fator determinante da
participação permanente de um membro da igreja na comunhão dos santos.
Contudo, antes de tratar desses assuntos, é bom apontar quando um
crente pode solicitar desligamento da igreja a que pertence e o que deve procurar
na nova comunidade eclesiástica de que pretende ser membro.
Seja qual for o método mediante o qual alguém se torne membro de uma
igreja verdadeira, deve-se exigir de todos os candidatos um requisito essencial
sem o qual ninguém poderá sequer sonhar em fazer parte da igreja de Deus: ser
realmente crente em Jesus Cristo.
Por isso, quando uma pessoa diz que quer ser incluída no rol de membros
de determinada igreja local, a primeira pergunta a ser feita é: “Como foi a sua
conversão?”. Com essa pergunta, espera-se que o candidato conte como e
quando se rendeu aos pés de Cristo, crendo nele a ponto de recebê-lo como
único e suficiente Salvador (Jo 1.12).
Se o indivíduo que quer ser membro da igreja nunca reconheceu que é
pecador (Rm 3.23), nunca aprendeu que Cristo morreu pelos pecados e
ressuscitou ao terceiro dia a fim de justificar os pecadores diante de Deus (Rm
4.25; 5.1,8), nunca se curvou aos pés de Cristo, crendo nele como Salvador (Mt
11.28-30; Jo 6.37), enfim, nunca “nasceu de novo” (Jo 3.3 cf. 2Co 5.17), esse
indivíduo não deve ser recebido de modo nenhum como membro até que, pela fé
em Jesus (Jo 3.16, 36), seja feito nova criatura.
Ser portador de cartas de transferência ou de referência emitidas por
outras igrejas, pertencer a famílias tradicionalmente evangélicas, frequentar
assiduamente os cultos, nutrir amizade com os líderes eclesiásticos... nada disso
substituirá o requisito essencial para se tornar membro da igreja, isto é, a
conversão.
Por isso, em conversa particular com o interessado a ingressar na igreja,
o pastor deve sempre perguntar acerca de sua conversão e, verificando pelo
testemunho dado os sinais do novo nascimento, deve aconselhar o candidato a
frequentar os cultos, a participar da classe de novos membros (especialmente se
será recebido por meio do batismo) e a cultivar amizades durante alguns meses,
ao cabo dos quais será conhecido por quase todos e também conhecerá melhor a
igreja à qual deseja pertencer.
Somente depois disso, as medidas práticas para o efetivo arrolamento do
candidato, tais como cartas, entrevistas e profissões de fé, poderão ser tomadas.
A disciplina eclesiástica
A comunhão
A cooperação
A contribuição
Nas seções anteriores deste capítulo, foram feitas alusões ao fato de que
o homem que ocupa o cargo pastoral na igreja de Deus é designado no Novo
Testamento por três termos distintos: pastor, presbítero e bispo (At 20.17,28; Ef
4.11; Tt 1.5,7). Cada um desses termos destaca diferentes aspectos das funções
que o ministro cristão deve exercer junto ao povo que Deus lhe confiou.
O termo “pastor” (poimén) é o mais abrangente entre os três
supracitados, pois realça as tarefas de proteger e apascentar (o que inclui
conduzir) um rebanho.
A figura do pastor da igreja como protetor do rebanho de Deus aparece
em Atos 20.28-31. Nessa passagem, Paulo, despedindo-se dos pastores da igreja
de Éfeso, diz que lobos vorazes atacariam as ovelhas do Senhor que estavam sob
seus cuidados e não as poupariam, arrastando-as à destruição por meio de
ensinos perversos. Segundo Paulo, diante dessa ameaça, os pastores deveriam
vigiar, mantendo-se sempre atentos e prontos, a fim de afugentar aquelas feras
malignas e manter o rebanho de Deus ileso.
Obviamente, esse aspecto da função pastoral é imperativo aos ministros
de Cristo de todas as épocas e de todos os lugares, enquanto dirigem as igrejas
em que foram postos. Aliás, o Apocalipse revela que os pastores de Pérgamo e
de Tiatira foram negligentes precisamente na realização dessa tarefa, sendo esse
o motivo pelo qual o Senhor os censurou tão severamente (Ap 2.14-16, 20-23).
Conforme já referido, o vocábulo grego poimén (e o verbo poimaino,
associado a essa palavra) também aponta para a tarefa de apascentar, ou seja,
prover as necessidades das ovelhas, conduzindo-as na direção de bons pastos e
de água fresca. Com base na figura que esses termos evocam, conclui-se que o
pastor, como oficial eclesiástico, também deve apascentar o povo de Deus,
garantindo-lhe o suprimento de alimento e de refrigério espirituais.
Não resta dúvidas de que o crente precisa de alimento para a alma (Mt
4.4; 1Pe 2.2). Ora, o ofício de pastor está entre aqueles que Deus instituiu
exatamente para fornecer esse alimento aos crentes (2Tm 4.1-2), a fim de que
eles sejam equipados para o serviço dos santos, cresçam na unidade da fé,
amadureçam nas virtudes de Cristo e deixem de ser como meninos facilmente
levados por qualquer vento de doutrina (Ef 4.11-14).
Apascentar o rebanho de Cristo, porém, não abrange somente oferecer-
lhe o alimento da Palavra com o fim de transmitir conhecimento e gerar
maturidade. O pastor zeloso tem de ir além disso e, sempre com a Palavra do
Senhor em punho, deve trabalhar para satisfazer também as necessidades de
consolo e descanso das ovelhas de Jesus. Nesse aspecto, é notório que, nas
Escrituras Sagradas, a condução ao alívio e ao refrigério é uma prática
distintamente pastoral (Sl 23.1-3; Ap 7.17), sendo certo que a falta desse
trabalho é um dos motivos pelos quais as pessoas passam a viver cansadas e
aflitas (Mt 9.36).
Ora, há diversas situações em que o pastor poderá atuar como alguém
que conduz a ovelha cansada ao repouso, mas um exemplo prático dessa forma
de agir é mencionado em Tiago 5.14-15. Nesse texto, o escritor bíblico (ele
mesmo um pastor) ensina que quando alguém estiver doente, deve chamar os
presbíteros da igreja. Estes, então, orarão pelo enfermo e tentarão trazer-lhe
algum alívio tanto físico como espiritual.[63] Esse tipo de visita, marcada por
afeição, cuidado e até serena admoestação, é uma das mais tocantes expressões
do trabalho do homem de Deus ocupado em apascentar o rebanho de Cristo,
levando-lhe refrigério.
O Novo Testamento ensina ainda que o pastoreio cuidadoso das ovelhas
de Cristo é uma das provas principais do amor do ministro por seu Senhor (Jo
21.16). Conforme o ensino de Pedro, esse nobre trabalho deve ser realizado de
boa vontade, nunca por mera obrigação e em hipótese alguma movido pelo
anseio de receber alguma vantagem financeira desonesta (1Pe 5.2). Pedro diz
ainda que o homem de Deus, no exercício do pastorado, não pode agir como um
déspota dominador que subjuga e oprime as pessoas. Antes, tem de exercer sua
autoridade apresentando-se como modelo para os irmãos (1Pe 5.3).
O segundo termo designativo da atividade pastoral é “presbítero”
(presbyteros). Essa palavra também está ligada à tarefa de ensinar (1Tm 5.17),
pastorear (1Pe 5.1-2) e cuidar (Tg 5.14). Porém, o termo evoca ainda outros
deveres, os quais apontam para uma posição de destaque e de liderança (At
21.17-19).
Em seu significado básico, o presbítero é um ancião. Assim, num sentido
não técnico, o termo se refere a um homem idoso (At 2.17). Já num sentido
técnico, como nos casos em que é usado para designar os oficiais da igreja, a
palavra sugere a ideia de honorabilidade e sabedoria. Vista ainda a partir da
realidade cultural dos tempos bíblicos, o vocábulo “presbítero” evoca a figura do
homem revestido de autoridade que realizava a tarefa de julgar demandas e
dirimir conflitos entre indivíduos em litígio.
Ora, tanto a experiência como a própria Escritura mostram que essa
função é necessária na igreja, sendo uma forma de evitar que as disputas entre
crentes sejam levadas ao magistrado civil, contrariando o ensino apostólico (1Co
6.1-6). Sendo, pois, esse trabalho tão importante e delicado, é o pastor que,
atuando como presbítero, deverá realizá-lo ou, no mínimo, presidi-lo, aplicando
a cada caso concreto os princípios e preceitos específicos da Palavra de Deus
que sejam então cabíveis.
Realizando a importante função de julgador dentro da comunidade da fé,
o presbítero será, obviamente, alvo especial de pessoas que se sentirem
contrariadas por suas decisões. Por isso, a Escritura proíbe que acusações contra
ele sejam aceitas, exceto sob o depoimento de duas ou três testemunhas (1Tm
5.19).
No Novo Testamento, o termo “presbítero” também aparece ligado à
tarefa de receber recursos destinados ao auxílio dos carentes, indicando que os
pastores são os responsáveis por avaliar a real necessidade de cada um no
momento da distribuição da ajuda material ofertada aos pobres da igreja (At
11.29-30). Como juízes, eles também aparecem deliberando acerca de disputas
ético-doutrinárias, examinando as razões expostas pelas partes em conflito e,
finalmente, emitindo seu parecer que, estando em harmonia com a revelação de
Deus em sua Palavra, é acolhido por toda a igreja (At 15.2,4,6,22).
O terceiro vocábulo usado na Bíblia para designar o ofício pastoral é
“bispo”. O substantivo grego (epískopos) aparece somente cinco vezes no Novo
Testamento, sendo que em uma dessas vezes refere-se a Cristo (1Pe 2.25). As
outras quatro ocorrências (At 20.28; Fp 1.1; 1Tm 3.2; Tt 1.7) dizem respeito a
líderes da comunidade cristã.
Epískopos é um termo relacionado à atividade de supervisionar ou
administrar. Esse sentido se encaixa perfeitamente em um dos deveres pastorais,
ou seja, o trabalho de inspecionar a igreja de Deus, primando pela sua pureza
vivencial e doutrinária, a fim de que em tudo ela reflita o caráter do Senhor e seu
reto ensino.
Evidentemente, para realizar as funções implícitas nos termos “pastor”,
“presbítero” e “bispo”, o ministro eclesiástico precisará ter um amplo
conhecimento bíblico e teológico (2Tm 2.15). Sem isso, seu trabalho destruirá a
igreja, arruinará vidas e, do ponto de vista bíblico e espiritual, será um fracasso
completo.
O diaconato
O mesmo autor, na obra citada, oferece ainda uma visão clara do enorme
espaço que a mulher passou a ocupar no processo de produção naqueles dias.
Diz ele:
3) O pastor não tem também a obrigação de fazer visitas regulares nas casas?
O texto de Mateus 25.34-36 fala sobre visitar doentes e presos, dizendo que essa
é uma prática que distingue os justos dos injustos. No entanto, a passagem não
se refere a uma atividade pastoral, mas sim a algo que se espera de todos os
discípulos de Cristo. Note-se ainda que as visitas mencionadas têm como alvos
específicos os doentes e presos e não os crentes que estão vivendo vidas
normais.
Ademais, é preciso notar que o contexto indica que as pessoas visitadas
mencionadas na passagem não são doentes e presos comuns, mas sim discípulos
de Jesus que adoeceram, foram encarcerados, fugiram para outras terras e
passaram privações por causa das tragédias que marcarão o tempo da Grande
Tribulação e por causa da perseguição contra os justos que haverá naqueles
dias (Mt 24.7-10). Nada se diz, portanto, no texto, sobre qualquer suposto dever
pastoral de ir regularmente às casas dos membros da sua igreja.
Na Bíblia, só existe a menção de um tipo de visita especificamente pastoral. É a
hipótese prevista em Tiago 5.14. Ainda assim, a iniciativa para a realização
dessa visita parte do enfermo que chama os presbíteros para orar por ele. Tiago
também fala de visitar órfãos e viúvas nas suas necessidades (Tg 1.27), mas o
significado desse texto não aponta para a mera prática de ir à casa de alguém,
mas sim para gestos que aliviem os fardos dos menos favorecidos. Ademais,
Tiago 1.27 não é um texto dirigido exclusivamente a pastores. Seu alvo são os
crentes em geral.
Não há, portanto, nenhuma exigência bíblica que obrigue o pastor a fazer
visitas sociais, didáticas, admoestatórias ou de aconselhamento. Todos esses
aspectos do envolvimento do pastor com os membros da igreja podem ser feitos
em diferentes contextos, sendo a visita no lar somente mais uma opção.
Assim, não é correto impor ao pastor o dever de ir à casa dos irmãos com
regularidade. Essa prática é boa, conforme a experiência mostra, e em alguns
casos pode ser a única alternativa que o ministro do evangelho tem para
alcançar certos objetivos. Contudo, a prática da visita regular não pode ser
elevada à categoria de obrigação pastoral.
Quanto aos perigos ligados ao costume de fazer visitas constantes aos lares,
vejam-se Provérbios 25.17, Mateus 23.14, 1Timóteo 5.13 e 2Timóteo 3.6.
4) Como o pastor deve lidar com membros ranzinzas, que vivem reclamando e
criticando tudo?
A princípio, ele deve admoestá-los brandamente, usando as Escrituras para
mostrar que essa atitude é pecaminosa (Ef 4.29-32; Fl 2.1-2,14; Cl 3.12-17). A
permanência no erro dará ensejo a processos disciplinares (veja-se cap. 5 ).
Casos mais sutis e que inviabilizam a aplicação da disciplina bíblica, podem ser
resolvidos se o pastor orientar a ovelha insatisfeita a procurar outra igreja. Ao
fazer isso, porém, o líder não deve transmitir a ideia de raiva ou desprezo.
Nessa hipótese, o pastor pode dizer ao membro descontente algo mais ou menos
assim: "Irmão, nossa igreja, assim como qualquer outra, tem suas virtudes e
seus defeitos. As virtudes tentamos preservar; os defeitos tentamos superar, mas
nem sempre temos sucesso. Também temos nossas características próprias,
nossos estilos e costumes. Ocorre que, pelo que vejo, esse nosso perfil não o
agrada, fazendo com que o irmão se sinta sempre descontente e insatisfeito. Não
é bom que alguém venha à igreja e se sinta assim. Por isso, creio que o irmão
deveria buscar outro lugar para se congregar. Há muitas igrejas boas por aí
afora e, certamente, Deus tem preparado uma que se ajuste melhor aos anseios
e expectativas do irmão".
Seja qual for o caso, o que não pode ocorrer em hipótese alguma é o pastor se
retrair e, intimidado, tentar agradar os que vivem descontentes. Se agir assim,
seu ministério girará sempre em torno dessas pessoas e ele será, praticamente,
submisso a elas, agindo com medo e fazendo de tudo para conquistar sua
aprovação. Então, a igreja inteira perceberá essa fraqueza e o líder perderá o
respeito de todos.
5) Existem crentes que, pelo seu modo de ser, assim que chegam na igreja vão
logo ganhando espaço, assumindo tarefas e tomando iniciativas. Como lidar com
esses casos?
Muito simples. Corte as "asinhas" depressa. Pessoas assim geralmente agem em
igrejas que têm liderança fraca, mas pastores de pulso firme também têm que
lidar eventualmente com elas, pois muitas vezes essas pessoas querem testar a
liderança pra ver até onde podem ir. Na verdade, há casos de excessos absurdos
em que o indivíduo mal chega na igreja e já assume a postura de líder,
convocando reuniões, manifestando suas opiniões e questionando o modo de
funcionamento das coisas. Diante de pessoas com esse perfil, o pastor e os
demais líderes da igreja devem de pronto obstruir a busca de espaço do crente
recém-chegado, chamando-o ao lado e dizendo que ele não tem autorização
nenhuma para tomar aquelas iniciativas, devendo permanecer no seu lugar de
novato. Infelizmente, muitos pastores que passam por essa situação acreditam,
por ingenuidade, que estão sendo abençoados com a chegada de um irmão (ou
um casal, ou ainda uma família) dinâmico e cheio de entusiasmo. Mais tarde,
porém, descobrem que não deviam ter dado espaço tão depressa a um
desconhecido e que a presença daquele novo irmão na igreja é fonte mais de
problemas do que de soluções.
6) Como deve agir a mulher que acredita ter dons ligados à atividade pastoral ou
diaconal?
Ela deve realizar o pastoreio dos irmãos (cuidado, conselho, consolo, etc.), sem
exercer o pastorado (o cargo de líder oficial da igreja). Também poderá exercer
a diaconia entre os santos (serviço, ajuda, socorro, etc.), sem assumir o
diaconato (a posição de líder dentro da comunidade). Muitas senhoras fazem
isso, sendo extremamente úteis à igreja de Deus (Rm 16.1).
7) Foi dito neste capítulo que a mulher não pode ser líder na igreja. É possível,
porém, que ela, sem ser líder, pregue ocasionalmente nos cultos?
Muitos entendem que sim, afirmando que, nesses casos, a mulher pregaria
debaixo de uma autoridade que lhe fosse emprestada pelo pastor. Contudo, não
existe base nenhuma para se aceitar a noção de “autoridade emprestada”.
Aliás, se isso pudesse ser feito, então, qualquer pessoa poderia assumir o
púlpito da igreja, desde que o pastor lhe “emprestasse” sua autoridade.
Assim, em vez de buscar refúgio em conceitos ilusórios de autoridade, o que se
deve fazer é respeitar a autoridade real da Bíblia. Nela é clara a proibição de a
mulher ensinar na igreja, ficando óbvio que se ela o fizer, exercerá autoridade
cabível somente aos homens e inverterá o modelo proposto na doutrina da
criação, desconsiderando também um dos efeitos da Queda (1Tm 2.11-14).
pelo que está em seu poder (Gn 2.15; Pv 24.30-31), usando tudo para a
honra e glória do dono supremo de tudo que há (Pv 3.9; Mt 25.14-30; At
4.36-37; 2Co 9.7-15).
4. Os bens materiais colocados por Deus sob a administração do seu povo e
A teologia do espaço
Toda doutrina bíblica corre o risco de ser mal entendida e mal aplicada. Quais os
perigos da má compreensão da mordomia cristã e da teologia do espaço?
Se a doutrina da mordomia cristã não for bem compreendida, poderá
desembocar numa proteção tão intensa do patrimônio da igreja que as pessoas
mal poderão usá-lo, sentindo-se sufocadas sob inúmeras restrições. Por isso, a
concepção correta da mordomia cristã deve levar em conta que o Senhor coloca
bens nas mãos dos crentes não somente para que eles cuidem deles, mas também
deles desfrutem. Do contrário, a igreja se tornará serva e não beneficiária do
seu patrimônio.
Quanto à teologia do espaço, o perigo de sua má compreensão é tentar tornar o
espaço tão belo ao ponto de se gastar dinheiro com luxos desnecessários.
Quando isso acontece, o desejo de resgatar o espaço atingido pela Queda acaba
levando à má mordomia dos recursos, pois estes passam a ser empregados em
futilidades.
Assim, no afã de cuidar do seu espaço, resgatando a beleza e a ordem que Deus
tanto preza, a igreja deve primar especialmente pela limpeza, pela boa
arrumação e por uma estética moderada e equilibrada, livre de luxos inúteis.
Capítulo 9 – DESVIOS EVANGÉLICOS
Os tempos atuais têm se revelado imensamente férteis na produção de
desvios e heresias dentro do contexto dito evangélico. Na verdade, é difícil
imaginar um ambiente em que a prática de distorção das Escrituras seja maior do
que a percebida hoje dentro das igrejas de origem protestante.
Na verdade, ao que parece, muitas igrejas que se denominam evangélicas
concedem a si mesmas certas liberdades no campo da hermenêutica, da ética, da
liturgia e da eclesiologia aplicada que nem mesmo as seitas mais danosas jamais
ousaram arrogar para si. Essas liberdades, obviamente, têm produzido desvios
horríveis que maculam o nome do cristão diante da sociedade, exibindo a todos
um cristianismo caricaturizado, bem diferente daquele ensinado pelo Senhor e
pelos seus santos apóstolos.
Em face dos prejuízos que esses modelos têm gerado para a verdadeira
igreja do Senhor, o crente de hoje deve evitá-los a todo custo, retomando à
mesma postura do pastor anabatista Menno Simons (1496-1561), líder da
reforma radical que floresceu no século 16 e fundador da Igreja Menonita:
O pentecostalismo [71]
Muitas pessoas vão dizer que este capítulo faz confusão entre
pentecostalismo e neopentecostalismo. Dirão que, na verdade, é somente o
neopentecostalismo que realiza os abusos aqui mencionados, estando o
pentecostalismo “clássico” livre disso tudo.
Esse parecer resulta de certas distinções que foram feitas no passado
entre o chamado pentecostalismo de “primeira onda” (com ênfase no batismo do
Espírito acompanhado de línguas estranhas), o pentecostalismo de “segunda
onda”, também chamado de “movimento carismático” (com ênfase em curas e
milagres) e o da “terceira onda” (que, além das doutrinas tipicamente
pentecostais e carismáticas, adota ainda a teologia da prosperidade).[74] Sem
dúvida, essa distinção tem certo valor como forma de classificação que auxilia a
análise histórica do movimento. Contudo, a observação do cenário atual mostra
que, na prática, a referida diferenciação tornou-se obsoleta, não fazendo mais
qualquer sentido.
Com efeito, como acontece em qualquer praia em que uma “onda” logo
se mistura com outra, o mesmo ocorreu com o pentecostalismo. Por isso, hoje é
possível perceber que a “primeira”, a “segunda” e a “terceira onda” se
mesclaram, viraram uma vaga só, espumando juntas os mesmos erros e perigos.
Isso faz com que igrejas ligadas ao pentecostalismo clássico exponham doutrinas
e práticas tipicamente atribuídas ao neopentecostalismo (e vice-versa), tornando
difícil separar as duas vertentes.
Ao que parece, a diferença entre pentecostalismo e neopentecostalismo,
se houver, poderá talvez ser encontrada na eventual ênfase que cada igreja em
particular dá a um erro específico. No alicerce, porém, e em muitos
desdobramentos práticos, todo o movimento se iguala, pois as comunidades que
o compõem adotam os mesmos pressupostos, praticam e pregam basicamente as
mesmas coisas, afirmando a crença na “segunda bênção”, abraçando doutrinas e
ensinos estranhos e buscando as revelações e os portentos que acreditam ser
concedidos por Deus aos seus supostos apóstolos e profetas.
Feita essa ressalva, importa agora voltar a atenção para os crentes em
Cristo que se encontram nas igrejas pentecostais. Há muitos cristãos de verdade
nessas comunidades. São irmãos em Cristo que percebem que algo está errado,
que sentem a falta de alimento sólido, que observam inconformados aquelas
manifestações forçadas de arrebatamento espiritual, que sofrem percebendo a
ação de falsos líderes e a santidade hipócrita de pessoas que louvam a Deus com
gritos, mas tem a vida cheia de impurezas (Is 29.13).
São também irmãos que, à vezes, se sentem culpados, pensando: “Será
que o errado sou eu? Será que não tenho fervor? Será que Deus está realmente
agindo aqui e só eu não estou vibrando? Por que não sinto vontade de gritar e
pular? Por que não consigo falar em línguas? E quanto a essas profecias, curas e
orações barulhentas? Será que só eu percebo que são forçadas?”.
Há muitos irmãos amados que enfrentaram esses dilemas no meio
pentecostal e que hoje estão num aprisco bíblico. Outros, porém, geralmente por
causa de vínculos sociais e afetivos, ainda vivem nesse meio, mesmo se sentindo
incomodados e pouco à vontade. Para esses crentes de verdade, há quatro
opções:
Seja qual for a opção adotada pelo crente que pertence a uma
comunidade pentecostal, o fato é que ele não deve, de modo algum, perpetuar
sua participação ali de maneira que comprometa seu crescimento espiritual e o
de sua família. A santificação é valor inegociável e nenhum tipo de paz pode ser
nutrido à parte dela (Hb 12.14).
Estratégias perigosas
1. O fato de esse dom não existir mais não significa que Deus não
pode realizar milagres na área da comunicação. Deus tem poder para
fazer com que, em alguma situação especial, duas pessoas de idiomas
diferentes se comuniquem de forma surpreendente. Se isso, porém,
acontecer, não será correto dizer que houve uma manifestação do dom
de línguas, pois, conforme visto, não era assim o funcionamento desse
dom (quem o tinha o usava com frequência na igreja), nem era seu
objetivo quebrar as barreiras linguísticas entre as pessoas (tanto que
exigia a atuação de intérpretes). Por isso, diante da hipótese levantada,
o certo será dizer que ocorreu um milagre no campo da conversação.
O dom de profecia
Curas e milagres
Quebra de maldições
11.13; Ap 2.2).
4. Eles realizavam prodígios milagrosos (2Co 12.12).
mas somente por ordem direta de Cristo (Gl 1.1, 11-12). A única
exceção que ocorreu no caso de Matias (At 1.21-26) foi provavelmente
por causa do caráter provisório de seu papel como décimo-segundo
apóstolo.
6. Eles eram canais de revelação doutrinária inédita (1Co 15.3; Ef 3.4-
6).
7. Eles eram colocados por Deus numa posição de desprezo, miséria e
Avivamentos estranhos
O princípio do santuário
Marcas gerais
Igrejas emergentes
De que maneira a igreja atual pode se tornar relevante para o homem do século
21?
A igreja sempre será relevante seja em que século for, desde que preserve a
tarefa dada exclusivamente ela de anunciar com fidelidade o único caminho
para a salvação do homem perdido. Se, porém, querendo atrair e agradar os
descrentes do seu tempo, a igreja mudar sua postura, seus valores, seu discurso
e sua conduta, amoldando-se à cultura depravada que a cerca, sua relevância
desaparecerá e ela se tornará apenas uma opção secundária de lazer ou uma
alternativa passageira de congraçamento social.
Capítulo 11 – O AUXÍLIO MATERIAL NA IGREJA
A maioria dos membros da igreja de Deus é composta por pessoas de
poucas posses. De fato, não há entre os crentes muitos de nobre nascimento, nem
um grande número de homens poderosos e influentes.
A leitura dos antigos registros históricos mostra que sempre foi assim. Na
verdade, os pagãos viam na condição social dos cristãos em geral mais uma
causa para zombar do evangelho e dizer que a fé pregada pela igreja era a fé dos
ignorantes, dos iletrados, da gente de baixo nível social — uma doutrina indigna
de ser seguida por pessoas nobres e de boa formação.
O que os inimigos de Cristo não sabiam é que a condição social dos
crentes já tinha sido percebida e comentada pelo apóstolo Paulo, o qual
apresentou uma explicação teológica para essa realidade.
De fato, Paulo disse que Deus chamou poucas pessoas grandes segundo
os padrões do mundo para que a verdadeira sabedoria fosse predominantemente
propriedade dos fracos e dos que nada são. Dessa forma — ensinou ele — a
sabedoria dos nobres e dos poderosos seria confundida e humilhada e ninguém
poderia se vangloriar na presença de Deus (1Co 1.26-29).
Sendo, então, a igreja marcada pela presença de pessoas pobres,
constantemente ela tem de lidar com a questão da ajuda aos carentes. Nessa
matéria, porém, ao contrário do que muitos pensam, as Escrituras não deixam o
povo de Deus à mercê de suas próprias percepções e julgamentos. Antes,
estabelecem diretrizes claras, as quais devem ser observadas pela igreja caso esta
queira obedecer em tudo à palavra do seu Senhor.
Note-se nessa lista que os crentes carentes devem ter prioridade sobre os
incrédulos. Isso deve ser assim porque o auxílio material deve fazer com que os
necessitados deem muitas graças a Deus, glorifiquem o nome dele por causa da
liberalidade do seu povo e orem em prol dos seus irmãos que os ajudam,
nutrindo grande afeto por eles (2Co 9.11-15). Ora, esses efeitos só podem ser
obtidos quando a assistência material é dirigida a crentes.
A ordem de prioridade apresentada aqui é útil principalmente para o
crente como indivíduo, o qual, com frequência, se vê diante de pessoas que
olham para ele esperando alguma ajuda material. Se o cristão não tiver critérios
embasados na Palavra de Deus, cometerá erros e injustiças nesse campo,
desconsiderando o que tem primazia e aplicando mal os recursos que Deus lhe
dá.
Os princípios de ajuda a pessoas carentes aplicáveis à vida do crente
individual devem, entretanto, ser aproveitados, o máximo possível, na formação
de uma filosofia de ajuda material a ser adotada pela igreja como instituição.
Porém, há também normas específicas dirigidas à igreja como um todo, as quais
versam sobre o modo que ela deve atuar no sustento dos menos favorecidos.
É dito, por exemplo, com meridiana clareza, que a igreja jamais deve
ajudar pessoas que enfrentam dificuldades porque não trabalham. O apóstolo
Paulo chega a afirmar que quem não trabalha deve passar fome (2Ts 3.10). De
fato, a igreja que auxilia pessoas acomodadas incentiva a ociosidade, o mau
testemunho, a maledicência e as intrigas (2Ts 3.11; 1Tm 5.13).
É verdade que, muitas vezes, ocorre de o indivíduo não estar trabalhando
por não conseguir emprego. Nesse caso, a liderança terá de avaliar as
particularidades da questão: o irmão desempregado tem por hábito ser
inconstante em todos os seus empregos? É mau funcionário e, por isso, sempre é
demitido? O crente desempregado está procurando emprego com real dedicação?
Os empregos que lhe são arranjados têm sido rejeitados por ele sob pretextos
injustificáveis? Tudo isso deve ser avaliado com bastante seriedade pelos líderes
antes que a ajuda financeira seja dada.
Ainda no nível de igreja como instituição, a prática da ajuda financeira
aos membros deve seguir dois princípios básicos: a necessidade real e a
temporalidade.
Por necessidade real entende-se a situação caracterizada por inevitável
penúria, em que a pessoa, por motivo legítimo, não tem de onde tirar recursos
para sua alimentação, moradia, saúde e vestuário.
Esse princípio é absoluto, ou seja, não tem exceções. Desse modo, a
igreja nunca se verá obrigada a ajudar financeiramente quem não esteja
enfrentando essa circunstância (como, por exemplo, quem contraiu dívidas e
pede ajuda financeira para não ser protestado ou executado).
O princípio da necessidade real está previsto em 1Timóteo 5.3-6,16, em
que Paulo fala das mulheres que são verdadeiramente viúvas, ou seja, mulheres
idosas da igreja (com sessenta anos ou mais) que não apenas tinham perdido o
marido, mas também não contavam com filho ou neto algum que as pudesse
ajudar. Senhoras naquela situação deviam ter seus nomes inscritos numa lista
especial para receber auxílio da igreja, desde que tivessem também um histórico
de bom testemunho e serviço (1Tm 5.9-10). Membros que não estivessem nessas
circunstâncias não podiam se inscrever (1Tm 5.11-13).
O segundo princípio (o da temporalidade), intimamente relacionado ao
primeiro e dele decorrente, aponta para o fato de que a ajuda financeira a
membros carentes não é necessariamente permanente. A ajuda deverá cessar
assim que a situação de necessidade real chegar ao fim. Ora, é evidente que
cessando a necessidade, o auxílio não será mais justo. É bom ressaltar que a
ajuda também poderá cessar quando os líderes perceberem que a necessidade
perdura em razão de negligência ou comodismo do auxiliado.
O princípio da temporalidade é relativo, pois haverá casos excepcionais
em que a ajuda se perpetuará. Isso ocorre, por exemplo, no caso de pessoas
inválidas ou de bastante idade que vivem sozinhas, sem nenhum parente, e
recebem apenas uma pequena pensão mensal. Casos como esses trazem em seu
bojo situações que dificilmente se alterarão — e a igreja terá de ajudar o
indivíduo nessas condições talvez até o fim de sua vida.
No tocante à ajuda material da igreja dirigida a pessoas incrédulas, é bom
dizer que essa conduta não é regulada pelo Novo Testamento. Em toda a
literatura neotestamentária, a preocupação da igreja com os carentes tem sempre
como objeto os irmãos na fé. Se não houver pessoas carentes numa determinada
igreja local (o que dificilmente ocorre), então essa igreja direcionará sua ajuda a
pessoas carentes de outras igrejas (At 11.27-30; Rm 15.25,26; 1Co 16.1-4; 2Co
9.1,2, 12-14).
Concluindo, deve ficar bem claro que a administração e o uso do
dinheiro da igreja são assuntos muito sérios. Todo centavo que entra para o
caixa, proveniente dos dízimos e ofertas, deve ser usado com responsabilidade e
critérios que se harmonizem com a Palavra do Senhor, o qual, em última análise,
é o dono de todos esses recursos, sendo os crentes apenas administradores.
Por isso, os líderes cristãos, ao deliberar acerca da ajuda material a
alguém, não devem se deixar levar por apelos emocionais ou por temores de
desagradar a uns e outros, ou ainda por situações que gerem constrangimento.
Acima das circunstâncias, do agrado aos homens e das fortes emoções está a
Palavra de Deus, que deve ser sempre aplicada, seja em que caso for.
Em regra, é bom que os pastores detenham a palavra final acerca de
quem deve receber recursos destinados ao suprimento de necessidades materiais,
julgando eles conforme a necessidade de cada um e a partir do conhecimento
especial que têm do seu rebanho. Ao que tudo indica, essa foi a prática adotada
em Atos 11.29-30.
Com efeito, a experiência pastoral ensina que, se o crente em particular
assumir essa tarefa, será facilmente movido pelas aparências e pela manipulação
de quem se mostra excessivamente carente e acabará suprindo necessidades
ilusórias, deixando os realmente necessitados vivendo em desamparo. Por isso, o
crente que quer ajudar os irmãos carentes de sua igreja deve pedir orientação ao
pastor que, quase sempre, saberá distinguir quem realmente precisa de quem
apenas parece precisar.
A proposta liberal
1) Qual deve ser a resposta do crente às pessoas em geral que lhe pedem
socorro?
Este capítulo desaprova os projetos sociais eclesiásticos que reduzem a igreja a
uma entidade assistencialista e fazem com que ela se desvie de seus alvos
principais, os quais envolvem a pregação, o ensino, a santidade e a disciplina.
Quanto ao cristão individual, é seu dever ajudar qualquer pessoa que lhe pedir
socorro (Mt 5.42; Rm 12.20), tendo apenas cuidado para não ser enganado por
pessoas de má-fé e por aproveitadores (Pv 3.27; 2Ts 3.10). O crente também
deve evitar se comprometer em ajudar alguém deixando seus familiares e seus
irmãos na fé sem amparo (Gl 6.10; 1Tm 5.8; 1Jo 3.17).
Ainda no tocante ao âmbito individual, há cristãos que criam entidades
humanitárias ou associações filantrópicas. Essas iniciativas são bastante
louváveis e não há nada de condenável nelas, desde que esses grupos não
deixem de pregar o evangelho puro, não tentem desviar a igreja de sua tarefa
principal de proclamação e pratiquem o ensino bíblico de socorrer primeiro os
da família da fé.
2) Não há nada que a igreja, como instituição, possa fazer para aliviar o
sofrimento deste mundo e reduzir as injustiças sociais?
É claro que há. Uma boa sugestão é a igreja cooperar como entidade
mantenedora de instituições beneficentes cristãs que tenham zelo evangelístico.
Se a igreja tiver condições financeiras, poderá destinar verbas para essas
instituições, ajudando no sustento do seu trabalho. Isso a envolverá na obra
central de evangelismo e a tornará presente numa esfera mais ampla da vida
social, sem comprometer a verdadeira razão da sua existência e sem perder o
foco do seu trabalho. A ajuda da igreja a essas instituições, porém, deve ser
dada sem prejuízo do amparo aos membros necessitados da própria comunidade
ou de irmãos de outros lugares que enfrentam miséria e calamidade (veja-se a
lista de prioridades acima).
Capítulo 12 – O CASAMENTO
A banalização do matrimônio é uma das marcas da sociedade
contemporânea — uma marca presente tanto no contexto secular como cristão.
Com efeito, não é somente a mídia, os governos e as instituições
antiDeus que apregoam o afrouxamento dos laços matrimoniais. Também
pastores, escritores cristãos, igrejas, seminários e denominações inteiras
propagam discursos que são verdadeiras apologias à fragilidade do vínculo
conjugal, dando ensejo e estímulo a separações e fazendo com que seus índices
de incidência atinjam níveis surpreendentes.
Raras são as comunidades e solitários são os líderes evangélicos que se
opõem ao divórcio. Mais raros ainda são os crentes que se insurgem contra o
recasamento. E toda essa “tolerância”, na maior parte das vezes, não repousa
sobre a análise bíblica séria ou sobre a reflexão madura acerca de um tema tão
crucial para a felicidade das pessoas e para o bem da igreja.
Em vez disso, a defesa do casamento solúvel é construída sobre jargões
pobres (“você tem o direito de ser feliz com outra pessoa”), sobre bases
teológicas fracas expostas em retórica barata (“nosso Deus é o Deus da segunda
chance” ou “Deus não quer que fiquemos com alguém por mera obrigação”) e
sobre uma hermenêutica que faz malabarismos com passagens da Bíblia (um dos
exemplos mais chocantes é a defesa do recasamento com base em Ageu 2.9: “A
glória desta última casa será maior do que a da primeira...”).
Isso tudo produz práticas erradas das quais a igreja de Deus deve fugir.
Para tanto, é preciso que os crentes corrijam suas ideias sobre o santo
matrimônio e construam uma estrutura conceitual bíblica e sólida acerca do
tema. Essa construção deve partir da análise do que, de fato, produz o vínculo
matrimonial.
A cláusula de exceção
2) Uma pessoa que convive há décadas com outra, tendo filhos e bens em
comum, sem, no entanto, casar-se, tem vínculo conjugal com seu consorte?
Não, não tem. O vínculo conjugal não se perfaz com a passagem do tempo, nem
com o nascimento de filhos, nem com a aquisição conjunta de bens. Tudo que a
passagem do tempo faz numa relação de convivência entre um homem e uma
mulher não casados é tornar seu pecado mais velho, pois qualquer conúbio
carnal fora do matrimônio é pecado.
Como dito acima, para que o vínculo conjugal se perfaça, é preciso que haja
vontade livre, ato solene e intercurso sexual. No caso em pauta, falta o ato
solene. Portanto, não há vínculo conjugal unindo o casal hipotético mencionado
na pergunta.
3) É possível que alguém estabeleça vínculo conjugal com mais de uma pessoa?
Sim, é errado, mas é possível. A Bíblia vislumbra essa possibilidade, fazendo
alusão a homens com mais de uma esposa (recorde-se os vários personagens do
AT e também 1Tm 3.2,12).
O fato é que sempre que se realizarem os três fatores que perfazem o casamento
(vontade livre, ato solene e intercurso sexual), o vínculo surgirá, mesmo que o
outro cônjuge ainda esteja em vida. Isso, no entanto, gerará uma condição de
bigamia (ou até poligamia), reprovada na Bíblia.
5) Como tratar os casais que chegam à igreja e não são casados, vivendo uma
relação de concubinato?
O pastor deve orientá-los a suprir o elemento que falta para o surgimento do
vínculo conjugal — no caso, o ato solene. Isso poderá ser feito por meio do
casamento civil.
decepcionado comigo?
1) Os pais crentes podem deixar seus filhos participar de festas juninas e das
comemorações de Halloween?
Se o propósito das festas juninas é manter acesa a tradição cultural e religiosa
do povo brasileiro em seu aspecto de veneração a Santo Antônio, São João e
São Pedro (e esse parece ser o caso), então nenhum crente deve participar
delas.
Ainda que certo tom de inocência e ausência de malícia permeie essas
comemorações, é inegável que as escolas, na busca de seus objetivos sociais,
que incluem situar os pequeninos no ambiente cultural em que nasceram, e no
dever de ensinar aos alunos de modo ilustrativo as tradições do seu povo, nunca
poderão deixar de dar às festas juninas cunho fundamentalmente católico-
romano. Tanto isso é verdade que as imagens dos “santos” celebrados estão
sempre presentes nessas festividades.
Sendo, portanto, esses os objetivos dessas festas, os pais cristãos não devem
permitir que seus filhos participem delas e devem aproveitar a oportunidade
para ensinar aos pequeninos que os crentes em Cristo têm um só Deus e é
somente a fogueira de adoração a ele que deve ser mantida sempre acesa no
coração (Dt 6.4-7).
Quanto às comemorações de Halloween, é possível que um de seus objetivos,
além da diversão, seja a banalização do mal sobrenatural, criando e nutrindo a
mentalidade de que os poderes de trevas são apenas temas de brincadeiras.
Mais uma vez, se for esse o caso, os crentes não devem de forma alguma
cooperar com o sucesso desse tipo de evento.
2) Se não é errado fazer imagens para fins decorativos ou didáticos, por que os
crentes não usam figuras e estátuas somente com esses objetivos?
Na verdade, os crentes usam imagens religiosas com esses objetivos. Os livros
infantis adotados nas classes de crianças das igrejas evangélicas são repletos de
figuras de Maria, de José, de Jesus, dos profetas e dos apóstolos. Em muitas
igrejas evangélicas também existem quadros com temas bíblicos e até cruzes
ornamentando as paredes. Nenhum crente se opõe a isso porque sabe que o
objetivo dessas figuras é o ensino e a decoração, nunca a veneração.
Já no tocante à questão das imagens esculpidas, a história eclesiástica alerta
para o fato de que seu uso, mesmo para fins de decoração, não é recomendável.
Os vários séculos de história do cristianismo revelam que, por alguma razão,
diante de estátuas de natureza religiosa, o vulgo, movido pela ignorância e pela
superstição, logo passa a venerá-las, desvirtuando o propósito original para o
qual foram feitas (Veja-se o já citado texto de 2Rs 18.1-4).
Por isso, a igreja cuidadosa não tem nenhuma imagem de escultura, nem mesmo
para fins de estética. Essa foi uma lição aprendida a partir da longa
observância de fatos passados.
Capítulo 14 – A PRÁTICA DE ENFRENTAR A MORTE
A igreja de Deus, representada na pessoa de cada um dos seus membros,
deve aprender a se comportar adequadamente diante da morte. O estilo de vida
do crente verdadeiro não é mera representação teatral que, em face dos mais
profundos sofrimentos da vida, permite tirar a máscara de santidade e revelar
desespero e ódio contra Deus. Ao contrário, a verdade é que no enfrentar das
situações realmente difíceis, nas quais é impossível manter qualquer grau de
hipocrisia ou falsa piedade, a magnitude do caráter cristão maduro desponta com
brilho ainda maior.
Que situação mais difícil o homem pode enfrentar do que a morte? É ela
o terrível legado que a humanidade herdou dos seus primeiros pais, que
desobedeceram ao Criador no Éden (Gn 2.15-17; 3.19; Rm 5.12). É o pagamento
indesejado que o ser humano recebe por ter pecado (Rm 6.23). É o fim para o
qual cada um caminha a passos largos (Ec 12.1-7). Mais do que isso, é o inimigo
inexorável que vem no encalço de todos para, no inevitável dia do encontro,
deixá-los prostrados, sem exceção (Lc 12.20).
Que é ensinado na igreja de Deus sobre o modo como o cristão deve se
comportar diante da morte? Conforme o entender dos mestres dessa igreja, qual
deve ser a postura do crente quando um ente querido seu parte desta vida? Como
ele pode ajudar de modo real e significativo os enlutados? E quando a morte,
enfim, o vier chamar, como deverá proceder?
As respostas dadas a todas essas perguntas devem ter como fundamento
as Sagradas Escrituras. É na Bíblia que se obtêm respostas claras e precisas para
todas as questões relacionadas à morte, o cruel e último inimigo.
Convém agora falar acerca de como o crente deve agir diante de pessoas
que sofrem a dor da separação ocasionada pela morte de um parente ou amigo. É
comum nessas ocasiões que vários indivíduos tentem desempenhar o papel de
consolador, dizendo palavras com as quais pretendem suscitar certo conforto nos
que pranteiam.
Infelizmente, porém, esses consoladores (alguns deles se apresentam até
como pastores!), muitas vezes, dizem as mais grosseiras tolices e devaneios,
acreditando que seus ares artificiais de sabedoria podem emprestar autoridade às
palavras absurdas que proferem. Um diz que o incrédulo morto descansou (!);
outro, que, de algum lugar, a alma do defunto estará cuidando agora daqueles
que aqui permanecem; e outro, ainda, fica enaltecendo virtudes imaginárias do
falecido, suscitando dúvidas nos presentes sobre se vieram ao velório da pessoa
certa.
Todas essas demonstrações de ignorância são absolutamente infrutíferas.
É na Bíblia que se aprende como ajudar os enlutados. Paulo ensina em
1Tessalonicenses 4 com que palavras se devem consolá-los. Ele diz nos
versículos 13-17 que, assim como Jesus morreu e ressuscitou, Deus, mediante
Jesus, um dia trará juntamente em sua companhia os crentes que morreram. Diz
ainda que o Senhor, depois de dar sua palavra de ordem, uma vez ouvida a voz
do arcanjo e ressoada a trombeta de Deus, descerá dos céus, e os crentes mortos
ressuscitarão. Diz também que os cristãos que estiverem vivos nesse dia serão
arrebatados junto com os que hão de ser ressuscitados e, entre nuvens, todos
subirão ao encontro do Senhor nos ares e, então, estarão para sempre com ele.
Depois de expor tudo isso, Paulo diz: “Consolai-vos, pois, uns aos outros
com estas palavras” (v. 18). Por isso, todos os cristãos devem conhecer a fundo
“estas palavras”. Isso os tornará mais úteis no auxílio dos que sofrem em razão
da separação, evitará que emudeçam diante dos que, inconsoláveis, pranteiam a
morte de alguém e colocará freio nos desvios que os indoutos proclamam em
momentos tão propícios à reflexão da verdade.
Evidentemente, as palavras que Paulo escreveu servem apenas para o
consolo dos que choram a morte de crentes. No texto analisado, o apóstolo
ensina sobre a tranquilidade que se pode ter quando se pensa nos mortos em
Cristo (1Ts 4.16).
Em se tratando da morte de incrédulos, nenhuma palavra agradável pode
ser dita a respeito do estado ou do lugar em que a alma deles se encontra. Isso
porque a Palavra de Deus é extremamente amarga quando fala sobre o destino
eterno dos que não receberam Jesus Cristo, crendo nele como Salvador de sua
vida. Tais pessoas, segundo as Escrituras, estão condenadas ao tormento eterno
no inferno, preparado para o diabo e seus anjos, onde o verme não morre e o
fogo nunca se apaga! (Mt 25.41,46; Mc 9.43-48; Lc 16.19-31; Jo 3.36; 2Ts 1.7-
9; Jd 13; Ap 20.11-15).
É claro, porém, que o cristão deve ter tato. Há maneiras sábias e ocasiões
mais propícias para dizer essa verdade aos queridos de um incrédulo que morreu.
Por isso, na hora mais pesada do luto pela morte de um perdido, é recomendável
que o crente concentre suas conversas e discursos não na condição espiritual do
defunto (que já não importa mais), mas na condição espiritual dos ouvintes. Esse
proceder preservará o que realmente é importante e livrará o crente de situações
embaraçosas.
É evidente, entretanto, que se alguém perguntar sobre o destino da alma
do falecido incrédulo, o cristão terá de, cuidadosamente, dizer a verdade. O
consolo enganador é obra do mundo e do diabo, não dos ministros de Cristo. E é
melhor os ouvidos dos enlutados serem alertados por verdades dolorosas que o
coração deles ser iludido com uma falsa paz.
Uma forma sábia de agir diante de perguntas embaraçosas formuladas
nesses momentos é fazer o interlocutor chegar a suas próprias conclusões. Basta
lhe responder brandamente com perguntas do tipo: “A Bíblia diz que só os
crentes em Cristo são salvos. Ele era crente em Cristo?”. Respondendo a essa
questão, o interlocutor chegará às suas próprias conclusões, sejam elas tristes ou
não. Caso responda que não sabe, então o servo do Senhor deverá dizer: “Se não
sabemos se ele morreu tendo fé em Cristo ou não, também não podemos saber
onde a alma dele está”.
Princípio da alteridade
Ao dirimir conflitos interpessoais, o líder não deve tomar qualquer medida ou
decisão sem antes ouvir ambas as partes.
Princípio do equilíbrio
O rigor da exigência deve ser temperado com bom senso e a dureza do castigo
deve ser mesclada de misericórdia.
Princípio da congregacionalidade
Em matérias que não envolvem a preservação da sã doutrina, a vontade expressa
da assembleia de crentes formalmente reunida se situa acima da vontade da
liderança formalmente constituída.
Princípio da obediência
As ofertas aceitáveis a Deus são aquelas que procedem de vidas santas,
marcadas por arrependimento, retidão e busca sincera da vontade do Senhor.
Princípio da responsabilidade
O crente que quer contribuir financeiramente para a causa do Mestre deve fazer
isso na igreja de que participa, seja como membro, seja como assíduo
frequentador, ainda que a ajuda dirigida a outras comunidades de linha ortodoxa
seja aceitável, desde que eventual.
Princípio da temporalidade
A ajuda material a irmãos carentes deverá cessar tão logo termine a condição de
necessidade real.
REFERÊNCIAS
Livros
BILLHEIMER, Paul E. Seu destino é o trono. São José dos Campos: CLC, 1984.
DANIEL-ROPS, Henri. A vida diária nos tempos de Jesus. São Paulo: Vida
Nova, 1988.
DIPROSE. Ronald E. Israel and the church: The origin and effects of
replacement theology. Waynesboro, GA: Authentic Media, 2004.
GEORGE, Timothy. Teologia dos reformadores. São Paulo: Vida Nova, 1993.
GOMES, Cirilo Folch (Edit.). Antologia dos Santos Padres: Páginas Seletas dos
Antigos Escritores Eclesiásticos. São Paulo: Paulinas, 1985.
_____________. O que estão fazendo com a igreja. São Paulo: Mundo Cristão,
2008.
MacARTHUR. John. O caos carismático. São José dos Campos: Fiel, 1992.
McGRATH, Alister. A vida de João Calvino. São Paulo: Cultura Cristã, 2004.
SHELDON, Charles M. Em seus passos que faria Jesus? São Paulo: Mundo
Cristão, 2011.
VAN BAALEN, J. K. O caos das seitas. São Paulo: Imprensa Batista Regular,
1982.
WARREN, Rick. Uma igreja com propósitos. São Paulo: Vida, 2008.
Artigos
COOK, Randall K. O templo — sua história e seu futuro. Vox Scripturae, São
Paulo, v. 2, n. 1, mar. 1992.
HOUSE, H. Wayne. Distinctive roles for women in the second and third
centuries. Bibliotheca Sacra, Dallas, v. 146, n. 581, jan./mar. 1989.
Notas do prólogo
[1]
Nos tempos da Inquisição, “cristão velho” referia-se ao católico da Península
Ibérica que estava acima de qualquer suspeita de heresia. Já “cristão novo”
denominava o judeu convertido que passara a ser perseguido com severidade,
acusado de praticar o judaísmo secretamente em casa. Veja-se K , M.
AYSERLING
Notas do capítulo 1
[4]
Nesse sentido, veja-se especialmente S , Francis A. A verdadeira
CHAEFFER
Notas do capítulo 2
[16]
C , João. As institutas ou tratado da religião cristã. Vol. III. São Paulo:
ALVINO
Notas do capítulo 3
[29]
S , José Gonçalves (Edit.). O Didaquê ou O ensino do Senhor através dos
ALVADOR
Notas do capítulo 4
[52]
A
H . De correptione et gratia, XIV-XVI. In C
GOSTINHO DE IPONA , Op. Cit.,
ALVINO
III:XXIII:14, p. 426.
Notas do capítulo 5
[60]
G , Edward. Declínio e Queda do Império Romano. São Paulo: Companhia
IBBON
Notas do capítulo 6
[62]
Note-se que nesse texto a palavra traduzida em várias versões como “mais
velhos” é presbyteroi, termo que designa pastores. Aliás, o contexto da
passagem (v. 1-4) favorece esse entendimento.
Notas do capítulo 7
[63]
O emprego do óleo mencionado nesse texto tinha objetivos simbólicos (a
representação do favor de Deus vindo sobre o enfermo) e humanitários (o óleo
era usado para dar refrigério). Em nada essa prática se assemelhava ao
curandeirismo evangélico que se vê hoje em dia.
Notas do capítulo 9
[70]
W , John C. (org.). The complete works of Menno Simons. Scottdate:
ENGER
[110]
A associação da igreja com o romanismo é proposta pelo ecumenismo. Já a
associação com o hinduísmo é mais sutil e surge quando os crentes passam a
crer, por exemplo, que “há poder em suas palavras”. Essa crença é não só o
corolário da doutrina hinduísta acerca da divindade do homem, mas também o
principal fundamento das práticas tanto antigas como modernas de feitiçaria.
Para mais detalhes sobre o assunto, veja H , David; M M , T. A. La
UNT C AHON
Notas do capítulo 10
[113]
No Brasil, um dos livros que melhor refletem essa disposição teológica
conciliadora é M L , Brian. Uma ortodoxia generosa. Brasília: Editora
C AREN
Palavra, 2007. O prefácio à edição americana desse livro, escrito por John R.
Franke, proclama que uma de suas marcas positivas é a aceitação da
possibilidade de salvação para os que estão fora da fé cristã, recusando que a
graça salvadora de Deus esteja limitada aos crentes (p. 19). De fato, McLaren,
no capítulo 4 da sua obra, se insurge abertamente contra a pregação de Jesus
como salvador pessoal, insistindo que ele é o salvador do mundo. O propósito
do evangelismo, segundo essa concepção, seria convidar as pessoas a terem
uma vida diferente, enquanto participam da fascinante obra de Cristo de salvar
o mundo inteiro.
[114]
Essa é a proposta de Dan Kimball no livro A igreja emergente: cristianismo
clássico para as novas gerações. São Paulo: Vida, 2008.
[115]
Essa é, pelo menos em parte, a proposta de Rick Warren, em seu livro Uma
igreja com propósitos. São Paulo: Vida, 2008.
[116]
Para mais detalhes sobre o Princípio Regulador do Culto veja-se o Capítulo
2.
[117]
O NT também mostra que em meados do século 1 surgiram credos
cristãos e declarações hínicas que eram adotados pelas igrejas e que
serviam como fator de distinção entre elas e os diversos grupos heréticos
que as rodeavam (Gl 1.9; Fl 2.5-9 [talvez um hino cristão primitivo]; 2Ts
3.6; 1Tm 3.16 [também um hino cristão antigo]; 6.20; 2Tm 1.14; 2.2). A
adoção desses credos e hinos também sinaliza para as igrejas locais como
instituições bem organizadas, com identidade teológica formalmente
definida, todas comprometidas com uma tradição doutrinária específica,
cujos contornos eram claros e inegociáveis.
Notas do capítulo 11
[118]
Até onde a avaliação é possível, não se pode dizer que esse livro seja
proponente da teologia liberal. Sua menção aqui serve apenas para destacar a
contribuição que fez para a visão da igreja como agente mais presente no
campo social – uma visão que coincidiu com as propostas liberais.
[119]
O texto integral do Pacto de Lausanne em português pode ser acessado no
site www.lausanne.org ou em www.monergismo.com.
[120]
Nesse sentido, veja-se O , Op. Cit., p. 335.
SBORNE
Notas do capítulo 12
[121]
Veja-se Tobias 7.14. O livro apócrifo de Tobias foi escrito em cerca de 200
a.C. e é reconhecido como canônico pela Igreja Católica. O judaísmo e as
igrejas protestantes, porém, não o aceitam em seu rol de livros inspirados.
[122]
Nos tempos do AT, o ritual central de matrimônio era a condução simbólica
da noiva à casa do noivo, o que era seguido de festejos (Jr 16.9). No dia do
casamento, os noivos usavam trajes especiais (Ct 3.11; Is 61.10) e
participavam de um banquete com os convidados (Gn 29.21-23). Esses
costumes sofreram modificações ao longo do tempo, mas o rito cerimonial que
perfaz o casamento nunca deixou de existir (Veja-se o verbete Marriage in
A , Paul (Org.). Harper’s Bible Dictionary. New York: Harpercollins,
CHTEMEIER
1985.).
[123]
Citado por J , Op. Cit., p. 484.
EREMIAS
[124]
Há no meio cristão uma posição ainda mais restritiva que admite o divórcio
somente no caso em que o incrédulo quer se apartar. Segundo os proponentes
dessa visão, o divórcio admitido na hipótese mencionada em Mateus 5.32 e
19.9 era o rompimento das relações de noivado. Para uma discussão sobre esse
tema, veja-se K , Andreas J.; J , David W. Deus, casamento e família:
ÖRSTENBERGER ONES
também H William A e W
ETH, Gordon J. Jesus and divorce. London, The
. ENHAM,
Notas do capítulo 13
[130]
Para análise mais detalhada do assunto, veja-se C , Fustel de. A cidade
OULANGES
Notas do capítulo 14
[132]
A orientação dada no leito de morte por Jacó (Gn 49.29-33) e José (Gn
50.24-26) quanto a serem sepultados na terra de Canaã não foi expressão de
capricho tolo. Antes, constituiu ato de fé (Hb 11.22), uma vez que esses
homens criam que um dia ressuscitariam dentre os mortos e possuiriam para
sempre a terra prometida por Deus a Abraão e seus descendentes (Gn 12.7;
13.14-17; 15.7-21).
Notas da conclusão
[133]
Veja o Capítulo 9 (subtítulo “Avivamentos estranhos”) para o ensino bíblico
acerca do impacto da verdade sobre as multidões.