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BANCO DE QUESTÕES – PORTUGUÊS12.

O ANO
Domínio: Educação Literária
Conteúdo: Obras de leitura obrigatória – questionários

Fernando Pessoa
● Ortónimo e heterónimos

A.Lê, atentamente, o texto seguinte.

Nã o sei porque é que sou assim.


Também, saber é nã o andar.
Sentir foi sempre para mim
Uma maneira de pensar.
Por isso agora essa cantiga,
Que me lembrou, me entristeceu.
Nã o sei se foi por ser antiga,
Se por ser ela, ou eu ser eu.
À s vezes há um rodopio
Das folhas secas num lugar.
Nã o consigo ser eu a fio,
Mas continuo sempre a olhar.
Fernando Pessoa, Poesia 1931-1935 e não datada, Assírio &Alvim,2006

Apresenta, de forma bem estruturada, as respostas aos itens que se seguem.

1.Identificatrês traços de autocaracterizaçã o do sujeito poético, revelados na primeira e


na terceira estrofes, fundamentando a sua resposta com elementos do texto.

2.Considerando a segunda estrofe, caracterizae justificao efeito que a memó ria exerce
sobre o estado de espírito do sujeito.

3.Apontaas duas linhas temá ticas da poesia de Fernando Pessoa ortó nimo presentes
neste poema.



B.Lê,atentamente,o texto apresentado a seguir.

Poema IX

Sou um guardador de rebanhos.


O rebanho é os meus pensamentos
E os meus pensamentos sã o todos sensaçõ es.

Português 12.º ano | Banco de questõ es | © Raiz Editora 1


Penso com os olhos e com os ouvidos
E com as mã os e os pés
E com o nariz e a boca.
Pensar uma flor é vê-la e cheirá -la
E comer um fruto é saber-lhe o sentido.
Por isso quando num dia de calor
Me sinto triste de gozá -lo tanto,
E me deito ao comprido na erva,
E fecho os olhos quentes,
Sinto todo o meu corpo deitado na realidade,
Sei a verdade e sou feliz.
Alberto Caeiro,Poesia, Assírio & Alvim, 2001

Apresenta, de forma bem estruturada, as respostas aos itens que se seguem.

1.Mostrao tipo de relaçã o que sujeito poético estabelece com a realidade, esclarecendo
o papel das sensaçõ es e do pensamento no estabelecimento dessa relaçã o.

2.Registae comentatrês dos recursos expressivosutilizados pelo poeta, que mais


contribuem para a apresentaçã o da sua relaçã o com a realidade.



C.Lêo texto a seguir transcrito, com atenção.

Acordo de noite, muito de noite, no silêncio todo.


Sã o – tictac visível – quatro horas de tardar o dia.
Abro a janela diretamente, no desespero da insó nia.
E, de repente, humano,
O quadrado com cruz de uma janela iluminada!
Fraternidade na noite!
Fraternidade involuntá ria, incó gnita, na noite!
Estamos ambos despertos e a humanidade é alheia.
Dorme. Nó s temos luz.
Quem será s? Doente, moedeiro falso, insone simples como eu?
Nã o importa. A noite eterna, informe, infinita,
Só tem, neste lugar, a humanidade das nossas duas janelas,
O coraçã o latente das nossas duas luzes,
Neste momento e lugar, ignorando-nos, somos toda a vida.
Sobre o parapeito da janela da traseira da casa,
Sentindo hú mida da noite a madeira onde agarro,
Debruço-me para o infinito e, um pouco, para mim.
Nem galos gritando ainda no silêncio definitivo!
Que fazes, camarada, da janela com luz?
Sonho, falta de sono, vida?

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Tom amarelo cheio da tua janela incó gnita...
Tem graça: nã o tens luz elétrica.
Ó candeeiros de petró leo da minha infâ ncia perdida!
Á lvaro de Campos,Poesia, Assírio & Alvim, 2002

Apresenta, de forma bem estruturada, as respostas aos itens que se seguem.

1.Indicatrês sentimentos desencadeados no sujeito poético pelas diversas sensaçõ es


experimentadas ao acordar, sozinho, na noite e revelados nas estrofes um a quatro.

2.Interpretaa apó strofe final do poema, integrando-a na poética de Á lvaro de Campos.



D.Lê, atentamente, o texto seguinte.

Uns, com os olhos postos no passado,


Veem o que nã o veem; outros, fitos
Os mesmos olhos no futuro, veem
O que nã o pode ver-se.

Porque tã o longe ir pô r o que está perto –


O dia real que vemos no mesmo hausto
Em que vivermos, morreremos. Colhe
O dia, porque és ele.
Poesia de Ricardo Reis, Lisboa, Assírio & Alvim, 2000

Apresenta, de forma bem estruturada, as respostas aos itens que se seguem.

1. Na primeira estrofe, o sujeito poético aponta «uns» e «outros» dos quais se distancia.
1.1Explica como «uns» e «outros» vivenciam o tempo.
1.2Identifica as aná strofes usadas nesta estrofe.

2. Na segunda estrofe, o sujeito poético apresenta o seu ponto de vista sobre a vivência
do tempo.
2.1Explicita-o atendendo ao quadro temá tico da consciência da mortalidade.

3. «Colhe / O dia, porque és ele.»


Interpreta o sentido deste conselho.

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●A Mensagem

A.Lê, atentamente, o texto seguinte.

A Última Nau

Levando a bordo El-Rei Dom Sebastiã o,


E erguendo, como um nome, alto, o pendã o1
Do Império,
Foi-se a ú ltima nau, ao sol aziago2
Erma, e entre choros de â nsia e de pressago3
Mistério.
Nã o voltou mais. A que ilha indescoberta
Aportou? Volverá da sorte incerta
Que teve?
Deus guarda o corpo e a forma do futuro,
Mas Sua luz projeta-o, sonho escuro
E breve.
Ah, quanto mais ao povo a alma falta,
Mais a minh’ alma atlâ ntica se exalta
E entorna,
E em mim, num mar que nã o tem tempo ou espaço,
Vejo entre a cerraçã o4teu vulto baço
Que torna5.
Nã o sei a hora, mas sei que há a hora,
Demore-a Deus, chame-lhe a alma embora
Mistério.
Surges ao sol em mim, e a névoa finda:
A mesma, e trazes o pendã o ainda
Do Império.
Fernando Pessoa, Mensagem, Assírio & Alvim, Lisboa, 1997

1. bandeira, estandarte; 2. funesto, que traz desgraça; 3. que pressagia; 4. nevoeiro; 5. volta.

Apresenta, de forma bem estruturada, as respostas aos itens que se seguem.

1.Explicitao sentido histó rico e o significado simbó lico de «a ú ltima nau», baseando-te
em elementos das duas primeiras estrofes do poema.

2.«Ah, quanto mais ao povo a alma falta, / Mais a minh’alma atlâ ntica se exalta».
Considerando o estudo de Mensagem, e recordando o seu cará ter épico-lírico,
interpretaestes versos, relacionando-os com o conteú do das estrofes anteriores.

3.Interpretaa ú ltima estrofe do poema, integrando-a na temá tica do Sebastianismo


presente na obra.

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B.Lê, atentamente, o texto a seguir apresentado.

Prece

Senhor, a noite veio e a alma é vil.


Tanta foi a tormenta e a vontade!
Restam-nos hoje, no silêncio hostil,
O mar universal e a saudade.

Mas a chama, que a vida em nó s criou,


Se ainda há vida ainda nã o é finda.
O frio morto em cinzas a ocultou:
A mã o do vento pode erguê-la ainda.

Dá o sopro, a aragem – ou desgraça ou â nsia –,


Com que a chama do esforço se remoça,
E outra vez conquistaremos a Distâ ncia –
Do mar ou outra, mas que seja nossa!
Fernando Pessoa,Mensagem, Porto Editora, 2017

Apresenta, de forma bem estruturada, as respostas aos itens que se seguem.

1.Explicita a caracterizaçã o do presente que, na primeira estrofe, o sujeito poético faz,


num tom de prece angustiada. Apoia a tua resposta em elementos textuais.

2.Explicade que modo, na segunda estrofe, surge a ideia de esperança, contrá ria ao
pessimismo da estrofe anterior.

3.Interpretao desejo, de sentido coletivo, patrió tico e simbó lico, expresso na ú ltima
estrofe, relacionando-o com o conteú do da primeira estrofe.

4.Analisaa estrutura formal do poema.

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Conto
●Mário de Carvalho

Lêo texto a seguir apresentado, com atenção.

Acontece que, mesmo à esquina, um primeiro andar vem sendo habitado por uma
família de médicos que dali faz consultó rio. Pouco antes da instalaçã o dos semá foros a
pedal, veio morar o Doutor Joã o Pedro Bekett, pai de filhos e médico singular. Chegou de
Coimbra com boa fama mas transbordava de espírito de missã o. Andava pelas ruas a
interpelar os transeuntes: «Está doente? Nã o? Tem a certeza? E essas olheiras, hã ?
Venha daí que eu trato-o.» E nesta â nsia de convencer atravessava muitas vezes a rua. O
semá foro complicava. Aproximou-se do Ramon e bradou, severo: «A mim, ninguém me
diz quando devo atravessar uma rua. Sou um cidadã o livre e desimpedido.» Ramon
entristeceu. Nã o gostava que interferissem com o seu trabalho e, daí por diante, passou
a dificultar a passagem ao doutor. Era caso para inimizade. E eis duas famílias
desavindas. Felizmente, nunca coincidiram descendentes casadoiros. Piora sempre os
resultados.
Má rio de Carvalho, «Famílias desavindas», Contos Vagabundos, Porto Editora, 2018

Apresenta, de forma bem estruturada, as respostas aos itens que se seguem.

1.Explicita o que há de «singular»:


 no semá foro referido no texto;
 no doutor Beckett.

2.Expõ e o que deu origem à inimizade entre o médico e o semaforeiro.

3.Comenta a ironia das duas ú ltimas frase do texto.



●Maria Judite de Carvalho

Lê,atentamente, o excerto que se segue.

– Tu?
– Tu, Gi?
Tã o jovem, Gi. A rapariguinha frá gil, um vime, que ela tem levado a vida inteira a
pintar, primeiro à maneira de Modigliani, depois à sua pró pria maneira, à de George,
pintora já com nome nos marchands das grandes cidades da Europa. Gi com um
pregador de oiro que um dia ficou, por tuta e meia, num penhorista qualquer de Lisboa.
Em tempos tã o difíceis.
– Vim vender a casa.
– Ah, a casa.

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É esquisito nã o lhe causar estranheza que Gi continue tã o jovem que podia ser sua
filha. Quieta, de olhar esquecido, vazio, e que nã o se espante com a venda assim
anunciada, tã o subitamente, sem preparaçã o, da casa onde talvez ainda more.
– Que pensas fazer, Gi?
– Partir, nã o é? Em que se pode pensar aqui, neste cu de Judas, senã o em partir?
Ainda nã o me fui embora por causa do Carlos, mas… O Carlos pertence a isto, nunca se
irá embora. Só a ideia o apavora, nã o é?
– Sim. Só a ideia.
– Ri-se de partir, como nó s nos rimos de uma coisa impossível, de uma ideia louca.
Quer comprar uma terra, construir uma casa a seu modo. Recebeu uma herança e só
sonha com isso. Creio que é a altura de eu…
– Creio que sim.
– Pois nã o é verdade?
– Ainda desenhas?
– Se nã o desenhasse dava em maluca. E eles acham que eu tenho muito jeitinho,
que hei de um dia ser uma boa senhora da vila, uma esposa exemplar, uma mã e perfeita,
tudo isso com muito jeito para o desenho. Até posso fazer retratos das crianças quando
tiver tempo, nã o é verdade?
– É o que eles acham, nã o é?
– A mã e está a acabar o meu enxoval. […]
Agora está à janela a ver o comboio fugir de dantes, perder para todo o sempre
á rvores e casas da sua juventude, perder mesmo a mulher gorda, da passagem de nível,
será a mesma ou uma filha ou uma neta igual a ela? Á rvores, casas e mulher acabam
agora mesmo de morrer, deram o ú ltimo suspiro, adeus. Uma lá grima que nã o tem nada
a ver com isto mas com o que se passou antes – que terá sido que já nã o se lembra? –,
uma simples lá grima no olho direito, o outro, que esquisito, sempre se recusa a chorar. É
como se se negasse a compartilhar os seus problemas, nã o e nã o.
Maria Judite de Carvalho, «George», George e Seta Despedida, Porto Editora, 2015

Apresenta, de forma bem estruturada, as respostas aos itens que se seguem.

1.Gi, jovem de 18 anos, decide que está na altura de partir. Nã o sabemos para onde,
sabemos porquê.
Especificade que «foge» Gi.

2.«Agora está à janela a ver o comboio fugir de dantes…»


Nesta nova situaçã o, explica quem foge e de quê.

3.«uma simples lá grima no olho direito, o outro, que esquisito, sempre se recusa a
chorar. É como se se negasse a compartilhar os seus problemas, nã o e nã o.»
Interpretaesta estranha forma de manifestar emoçõ es.

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Poetas portugueses contemporâneos
A.Miguel Torga

Lê, atentamente, o poema seguinte.

Aos Poetas

Somos nó s Por isso a vó s, Poetas, eu levanto


As humanas cigarras. A taça fraternal deste meu canto,
Nó s, E bebo em vossa honra o doce vinho
Desde o tempo de Esopo conhecidos... Da amizade e da paz.
Nó s, Vinho que nã o é meu,
Preguiçosos insetos perseguidos. Mas sim do mosto que a beleza traz.
Somos nó s os ridículos comparsas E vos digo e conjuro que canteis.
Da fá bula burguesa da formiga. Que sejais menestréis
Nó s, a tribo faminta de ciganos Duma gesta de amor universal.
Que se abriga Duma epopeia que nã o tenha reis,
Ao luar. Mas homens de tamanho natural.
Nó s, que nunca passamos, Homens de toda a terra sem fronteiras.
A passar... De todos os feitios e maneiras,
Somos nó s, e só nó s podemos ter Da cor que o sol lhes deu à flor da pele.
Asas sonoras. Crias de Adã o e Eva verdadeiras.
Asas que em certas horas Homens da torre de Babel.
Palpitam. Homens do dia a dia
Asas que morrem, mas que ressuscitam Que levantem paredes de ilusã o.
Da sepultura. Homens de pés no chã o,
E que da planura Que se calcem de sonho e de poesia
Da seara Pela graça infantil da vossa mã o.
Erguem a um campo de maior altura
A mã o que só altura semeara.
Miguel Torga, in Odes, Coimbra Editora, 1946

Apresenta, de forma bem estruturada, as respostas aos itens que se seguem.

1.«Somos nó s / As humanas cigarras.» (vv. 1-2)Na primeira parte do poema, o sujeito


poético caracteriza o ofício de poeta, aludindo à fá bula da «cigarra e da formiga».
Explicae justificaessa alusã o nas duas primeiras estrofes.

2.Explicitaa exortaçã o feita nas três ú ltimas estrofes, apontando três valores universais
da poesia para os quais apela o sujeito poético.

3.Interpretao valor da metá fora «asas» usada na terceira estrofe, relacionando-a com o
conteú do geral do poema.

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B.Eugénio de Andrade

Lê, atentamente, o seguinte poema.

Urgentemente

É urgente o amor.
É urgente um barco no mar.

É urgente destruir certas palavras,


ó dio, solidã o e crueldade,
alguns lamentos,
muitas espadas.

É urgente inventar alegria,


multiplicar os beijos, as searas,
é urgente descobrir rosas e rios
e manhã s claras.

Cai o silêncio nos ombros e a luz


impura, até doer.
É urgente o amor, é urgente
permanecer.
Eugénio de Andrade, Até Amanhã, Guimarã es Editores, 1956

Apresenta, de forma bem estruturada, as respostas aos itens que se seguem.

1.Propõ e uma interpretaçã o simbó lica para o elemento «barco no mar».

2.«É urgente destruir certas palavras». Explica o sentido deste verso, explicitando o que
«é urgente destruir».

3.Interpreta a terceira estrofe,prestando atençã o ao valor metafó rico e simbó lico das
palavras.

4.«Cai o silêncio nos ombros e a luz / impura, até doer.» Interpreta estes dois versos:
 relacionando-os com o conteú do das estrofes anteriores;
 como representaçã o do contemporâ neo.

5.Mostra o valor expressivo da aná fora usada ao longo do poema.

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C.Ana Luísa Amaral

Lê, atentamente, o poema seguinte.

As pequenas gavetas do amor

Se for preciso, irei buscar um sol


para falar de nó s:
ao ponto mais longínquo
do verso mais remoto que te fiz

Devagar, meu amor, se for preciso,


cobrirei este chã o
de estrelas mais brilhantes
que a mais constelaçã o
para que as mã os
depois sejam tã o brandas
como as desta tarde

Na memó ria mais funda guardarei


em pequenas gavetas
palavras e olhares, se for preciso:
tã o minú sculos centros
de cheiros e sabores

Só nã o trarei o resto
da ternura em resto esta tarde,
que nem nos foi preciso:
no fundo do amor, tenho-a comigo
quando a quiseres –
Ana Luísa Amaral, Imagias, Gó tica, 2002

Apresenta, de forma bem estruturada, as respostas aos itens que se seguem.

1.Mostra de que forma, na primeira e na segunda estrofes, o sujeito poético afirma a


total entrega ao amor.

2.«este chã o», «desta tarde»/«esta tarde». Determina a importâ ncia das referências
deíticas.

3.Considerando toda a terceira estrofe, bem como o título do poema, aponta o valor
simbó lico das «gavetas», associadas à memó ria do amor.

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4.Interpreta a quarta e a quinta estrofes.
5.A condiçã o que inicia o poema e se repete duas vezes – «Se for preciso» – parece ser
anulada no final. Explica porquê.

6.Propõ e uma explicaçã o para o travessã o final.

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D. Jorge de Sena
Lê, atentamente, o poema seguinte.

Camões dirige-se aos seus contemporâneos

Podereis roubar-me tudo:


as ideias, as palavras, as imagens,
e também as metá foras, os temas, os motivos,
os símbolos, e a primazia
nas dores sofridas de uma língua nova,
no entendimento de outros, na coragem
de combater, julgar, de penetrar
em recessos de amor para que sois castrados.
E podereis depois nã o me citar,
suprimir-me, ignorar-me, aclamar até
outros ladrõ es mais felizes.
Nã o importa nada: que o castigo
será terrível. Nã o só quando
vossos netos nã o souberem já quem sois
terã o de me saber melhor ainda
do que fingis que nã o sabeis,
como tudo, tudo o que laboriosamente pilhais,
reverterá para o meu nome. E mesmo será meu,
tido por meu, contado como meu,
até mesmo aquele pouco e miserá vel
que, só por vó s, sem roubo, haveríeis feito.
Nada tereis, mas nada: nem os ossos,
Que um vosso esqueleto há de ser buscado,
Para passar por meu. E para os outros ladrõ es,
Iguais a vó s, de joelhos, porem flores no tú mulo.
Jorge de Sena, »Metamorfoses»,Poesia II,Guimarã es Editores, 2015

Apresenta, de forma bem estruturada, as respostas aos itens que se seguem.

1.O poema é uma pesada acusaçã o de Camõ es aos seus contemporâ neos.«Podereis
roubar-me tudo». Explicitao conteú do geral dos oito primeiros versos, mostrando

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as três dimensõ es da existência referidas pelo poeta.
2.Apontaa acusaçã o, implicitamente feita, nos três versos seguintes.

3.«Nã o importa nada: que o castigo/será terrível.»Explicitao sentido davingança


que o poeta reserva para os seus contemporâ neos, relacionando-a com as críticas
feitas no final do canto VII de Os Lusíadas.



E. Alexandre O’Neill
Lê, atentamente, o poema seguinte.

O beijo

Congresso de gaivotas neste céu


Como uma tampa azul cobrindo o Tejo.
Querela de aves, pios, escarcéu.
Ainda palpitante voa um beijo.
Donde teria vindo! (Nã o é meu...)
De algum quarto perdido no desejo?
De algum jovem amor que recebeu
Mandado de captura ou de despejo?
É uma ave estranha: colorida,
Vai batendo como a pró pria vida,
Um coraçã o vermelho pelo ar.
E é a força sem fim de duas bocas,
De duas bocas que se juntam, loucas!
De inveja as gaivotas a gritar...
Alexandre O’Neill,No Reino da Dinamarca (1958),
Poesias Completas, INCM, 1990

Apresenta, de forma bem estruturada, as respostas aos itens que se seguem.

1.No poema cruzam-se duas realidades completamente diferentes, mas nã o


dissonantes.Identifica-as e mostra a razã o da ausência de dissonâ ncia.

2.Caracterizao beijo referido no poema, mostrando a natureza surrealista da sua


descriçã o.
2.1Selecionaoutras expressõ es em que a ironia surrealistaesteja presente.

3.Analisaa estrutura formal do poema.

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F. António Ramos Rosa
Lê, atentamente, o poema seguinte.

O funcionário cansado

A noite trocou-me os sonhos e as mã os


dispersou-me os amigos
tenho o coraçã o confundido e a rua é estreita
estreita em cada passo
as casas engolem-nos
sumimo-nos
estou num quarto só num quarto só
com os sonhos trocados
com toda a vida à s avessas a arder num quarto só
Sou um funcioná rio apagado
um funcioná rio triste
a minha alma nã o acompanha a minha mã o
Débito e Crédito Débito e Crédito
a minha alma nã o dança com os nú meros
tento escondê-la envergonhado
o chefe apanhou-me com o olho lírico na gaiola do quintal em frente
e debitou-me na minha conta de empregado
Sou um funcioná rio cansado de um dia exemplar
Porque nã o me sinto orgulhoso de ter cumprido o meu dever?
Porque me sinto irremediavelmente perdido no meu cansaço?
Soletro velhas palavras generosas
Flor rapariga amigo menino
irmã o beijo namorada
mã e estrela mú sica.
Sã o as palavras cruzadas do meu sonho
palavras soterradas na prisã o da minha vida
isso todas as noites do mundo uma noite só comprida
num quarto só
Antó nio Ramos Rosa,Viagem Através de Uma Nebulosa, Á tica, 1968

Apresenta, de forma bem estruturada, as respostas aos itens que se seguem.

1.Mostraa autocaracterizaçã o que o sujeito poético faz, referindo a auto-ironia que


utiliza no retrato que traça de si mesmo.

2.Explicitao desajuste existente entre a sensibilidade de poeta e a condiçã o de


funcioná rio, bem como o papel que o espaço físico e social asfixiante tem nesse

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desajuste.

3.Explicao papel libertador da palavra poética.

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G. Herberto Helder
Lê, atentamente, o poema seguinte.

O poema

Um poema cresce inseguramente


na confusã o da carne.
Sobe ainda sem palavras, só ferocidade e gosto,
talvez como sangue
ou sombra de sangue pelos canais do ser.
Fora existe o mundo. Fora, a esplêndida violência
ou os bagos de uva de onde nascem
as raízes minú sculas do sol.
Fora, os corpos genuínos e inalterá veis
do nosso amor,
os rios, a grande paz exterior das coisas,
as folhas dormindo o silêncio,
as sementes à beira do vento,
– a hora teatral da posse.
E o poema cresce tomando tudo em seu regaço.
E já nenhum poder destró i o poema.
Insustentá vel, ú nico,
invade as casas deitadas nas noites
E as luzes e as trevas em volta da mesa
e a força sustida das coisas
e a redonda e livre harmonia do mundo.
– Em baixo o instrumento perplexo ignora
a espinha do mistério.
– E o poema faz-se contra a carne e o tempo.
Herberto Helder A Colher na Boca,in Poemas Completos, Porto Editora, 2014

Apresenta, de forma bem estruturada, as respostas aos itens que se seguem.

1.Assinalaas expressõ es que revelam a origem íntima do poema, que nasce do


interior do poeta.

2.Exterior ao poema existe a realidade.Apontaa parte do poema que corresponde à

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enunciaçã o dessa realidade.

3.Indicao momento a partir do qual o poema alastra e integra a realidade.

4.Procuraexplicar a arte poéticaexposta através deste poema.

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H. Ruy Belo
Lê, atentamente, o poema seguinte.

O portugal futuro

O portugal futuro é um país


aonde o puro pá ssaro é possível
e sobre o leito negro do asfalto da estrada
as profundas crianças desenharã o a giz
esse peixe da infâ ncia que vem na enxurrada
e me parece que se chama sá vel
Mas desenhem elas o que desenharem
é essa a forma do meu país
e chamem elas o que lhe chamarem
portugal será e lá serei feliz
Poderá ser pequeno como este
ter a oeste o mar e a espanha a leste
tudo nele será novo desde os ramos à raiz
À sombra dos plá tanos as crianças dançarã o
e na avenida que houver à beira-mar
pode o tempo mudar será verã o
Gostaria de ouvir as horas do reló gio da matriz
mas isso era o passado e podia ser duro
edificar sobre ele o portugal futuro
Ruy Belo, Homem de Palavra(s),Assírio & Alvim, 2016

Apresenta, de forma bem estruturada, as respostas aos itens que se seguem.

1.Atendendo ao valor simbó lico dos elementos «pá ssaro» e «criança», explicitao
que, segundo o sujeito poético, é possível no «portugal futuro».
1.1Propõ euma interpretaçã o para o desenho das crianças e para o asfalto negro
que serve de suporte ao desenho.

2.O «portugal futuro» terá a mesma dimensã o e as mesmas fronteiras que «este».
Mostrao que será diferente.

3.Nesse país futuro, o sujeito poético gostaria de ouvir as badaladas do reló gio da

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igreja, mas um receio assalta-o. Explicaesse receio.

4.Esclarececomo se constró i a musicalidade deste poema, tendo em conta a rima, a


aliteraçã o e outrasrepetiçõ es.



I. Luiza Neto Jorge


Lê, atentamente, o poema seguinte.

Acordar na rua do mundo

madrugada, passos soltos de gente que saiu


com destino certo e sem destino aos tombos
no meu quarto cai o som depois
a luz. ninguém sabe o que vai
por esse mundo. que dia é hoje?
soa o sino só lido as horas. os pombos
alisam as penas, no meu quarto cai o pó .
um cano rebentou junto ao passeio.
um pombo morto foi na enxurrada
junto com as folhas dum jornal já lido.
impera o declive
um carro foi-se abaixo
portas duplas fecham
no ovo do sono a nossa gema.
sirenes e buzinas, ainda ninguém via satélite
sabe ao certo o que aconteceu, estragou-se o alarme
da joalharia, os lençó is na corda
abanam os prédios, pombos debicam
o azul dos azulejos, assoma à janela
quem acordou. o alarme nã o pá ra o sangue
desavém-se. nã o veio via satélite a querida imagem o vídeo
nã o gravou
e duma varanda um pingo cai
de um vaso salpicando o fato do bancá rio
Luiza Neto Jorge, A Lume,Assírio & Alvim, 1989

Apresenta, de forma bem estruturada, as respostas aos itens que se seguem.

1.Neste poema, o sujeito poético é observador do movimento do mundo que lhe chega
atravésde sons e imagens.Destacaas expressõ es que transmitem sensaçõ es auditivas,
banda sonora do rumor matinal.

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2.«os lençó is na corda/abanam os prédios», «pombos debicam/o azul dos
azulejos».Comentaas expressõ es transcritas, referindo a expressividade dos recursos
nelas usados.

3.Indicae interpretaduas passagens de olhar iró nico sobre a cidade.



J. Nuno Júdice
Lê, atentamente, o poema seguinte.

Pedro, lembrando Inês

Em que pensar, agora, senã o em ti? Tu, que


me esvaziaste de coisas incertas, e trouxeste a
manhã da minha noite. É verdade que te podia
dizer: «Como é mais fá cil deixar que as coisas
nã o mudem, sermos o que sempre fomos, mudarmos
apenas dentro de nó s pró prios?» Mas ensinaste-me
a sermos dois; e a ser contigo aquilo que sou,
até sermos um apenas no amor que nos une,
contra a solidã o que nos divide. Mas é isto o amor:
ver-te mesmo quando te nã o vejo, ouvir a tua
voz que abre as fontes de todos os rios, mesmo
esse que mal corria quando por ele passá mos,
subindo a margem em que descobri o sentido
de irmos contra o tempo, para ganhar o tempo
que o tempo nos rouba. Como gosto, meu amor,
de chegar antes de ti para te ver chegar: com
a surpresa dos teus cabelos, e o teu rosto de á gua
fresca que eu bebo, com esta sede que nã o passa. Tu:
a primavera luminosa da minha expectativa,
a mais certa certeza de que gosto de ti, como
gostas de mim, até ao fim do mundo que me deste.
Nuno Jú dice, Pedro, Lembrando Inês,Publicaçõ es Dom Quixote, 2001

Apresenta, de forma bem estruturada, as respostas aos itens que se seguem.

1.«Em que pensar, agora, senã o em ti?»


Esta questã o que inicia o poema serve de pretexto para o sujeito poético enunciar,
metaforicamente, o muito que o destinatá rio lhe trouxe.

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Explicao sentido das duas metá foras iniciais:
a.«me esvaziaste de coisas incertas»
b.«trouxeste a manhã da minha noite.»

2.Explicitao conceito de amor que preside à relaçã o eu-tu e que está expresso nos
vv. 6-15.

3.Justificao título do poema, referindo a tradiçã o literá riaem que se inscreve.



K. Manuel Alegre
Lê, atentamente, o poema seguinte.

Portugal em Paris

Solitá rio
por entre a gente eu vi o meu país.
Era um perfil
de sal
e abril.
Era um puro país azul e proletá rio.
Anó nimo passava. E era Portugal
que passava por entre a gente e solitá rio
nas ruas de Paris.
Vi minha pá tria derramada
na Gare de Austerlitz. Eram cestos
e cestos pelo chã o. Pedaços
do meu país.
Restos.
Braços.
Minha pá tria sem nada
sem nada
despejada nas ruas de Paris.
E o trigo?
E o mar?
Foi a terra que nã o te quis
ou alguém que roubou as flores de abril?
Solitá rio por entre a gente caminhei contigo
os olhos longe como o trigo e o mar.
É ramos cem duzentos mil?
E caminhá vamos. Braços e mã os para alugar
meu Portugal nas ruas de Paris.

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Manuel Alegre, O Canto e as Armas,Publicaçõ es Dom Quixote, 2017

Apresenta, de forma bem estruturada, as respostas aos itens que se seguem.

1.Apontaa realidade observada pelo sujeito poético, que serve de motivo e tema para o
poema.

2.«eu vi o meu país»/«Vi minha pá tria derramada» (vv. 2, 10)


Caracterizaa imagem que o sujeito poético percecionou do seu país, tendo em conta as
metá foras e a enumeraçã o utilizadas na 1.ª e na 2.ª estrofe, respetivamente.

3.Mostraos sentimentos que o sujeito poético exprime através do uso das interrogaçõ es
da 3.ª estrofe.



L. Vasco Graça Moura


Lê, atentamente, o poema seguinte.

Elegia breve à poesia

fugitivo passar pela retina,


no virar de uma esquina ou de um silêncio,
a tua ausência é este ensombramento,
porém que a despedida seja breve
e que voltes com um relâ mpago, um
desvendar-se do mundo entrecortando
dobras desamparadas do real.
e eu pergunto: que vozes do crepú sculo
se apagavam entã o? talvez o vento
agitasse tristezas na folhagem,
e esse fosse o frémito dos seus
melancó licos sinais rumorejando,
ou talvez fosse a cama de um hospital
e o branco desolado das paredes
e a mudez de estranhos aparelhos,
ou talvez fosse o pró prio esquecimento
de que irias voltar, ou resvalar
numa lenta passagem de tercetos.
In Revista Relâmpago n.º 27, outubro de 2010

Nota:Alusã o ao poema de Camilo Pessanha começado pelos versos «Imagens que passais pelaretina / Dos meus olhos, porque nã o
vos fixais?»

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Apresenta, de forma bem estruturada, as respostas aos itens que se seguem.

1.«fugitivo passar pela retina»


1.1Dos primeiros sete versos, transcreveas palavras do campo lexical de visã o.
1.2Expõ eo que distingue as situaçõ es marcadas pela ausência do destinatá rio daquelas
em que este está presente.

2.«e eu pergunto:…» (v. 8)


2.1Interpretaa pergunta colocada pelo sujeito poético.
2.2Interpreta, também, as três hipó teses de resposta subsequentes.

3.Explicitaa conceçã o de poesia que o poema pressupõ e.

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José Saramago
O Ano da Morte de Ricardo Reis

A.Lê, com atenção, o texto que se segue.

Nã o voltou a ter notícias de Marcenda, Nem uma palavra, eu é que escrevi, há dias,
uns versos sobre ela, Duvido, Tem razã o, sã o apenas uns versos em que o nome dela
está , quer que lhos leia, Nã o, Porquê, Conheço os seus versos de cor e salteado, os feitos
e os por fazer, novidade seria só o nome de Marcenda, e deixou de o ser, Agora é você
que nã o está a ser amá vel, E nem sequer posso desculpar-me com o estado dos meus
nervos, diga lá o primeiro verso, Saudoso já deste verã o que vejo, Lá grimas para as
flores dele emprego, pode ser o segundo, Acertou, Como vê sabemos tudo um do outro,
ou eu de si, Haverá alguma coisa que só a mim pertença, Provavelmente, nada. Depois
de Fernando Pessoa sair, Ricardo Reis bebeu o café que lhe deitara na chá vena. Estava
frio, mas soube-lhe bem.
Alguns dias depois, os jornais contaram que vinte e cinco estudantes das
Juventudes Hitlerianas de Hamburgo, de visita ao nosso país em viagem de estudo e
propaganda dos ideais nacional-socialistas, foram homenageados no Liceu Normal, e
que, tendo visitado demoradamente a Exposiçã o do Ano X da Revoluçã o Nacional,
escreveram no Livro de Honra esta frase, Nó s nã o somos nada, querendo significar, com
declaraçã o tã o perentó ria, segundo explicava pressuroso o plumitivo1de serviço, que o
povo nada vale se nã o for orientado por uma elite, ou nata, ou flor, ou escol. Ainda
assim, nã o rejeitaríamos esta ú ltima palavra, escol, que vem de escolha, posto o que o
teríamos, ao povo, dirigido por escolhidos, se os escolhesse. Mas por uma flor ou nata,
credo, afinal de contas a língua portuguesa é de um ridículo perfeito, viva pois a elite
francesa, enquanto nã o aprendermos a dizer melhor em alemã o. Porventura com vistas
a essa aprendizagem se decretou a criaçã o da Mocidade Portuguesa, que, lá para
outubro, quando iniciar a sério os seus trabalhos, abrangerá , logo de entrada, cerca de
duzentos mil rapazes, flor ou nata da nossa juventude, da qual, por decantaçõ es
sucessivas, por adequadas enxertias, há de sair a elite que nos governará depois, quando
a de agora se acabar. Se o filho de Lídia vier a nascer, se, tendo nascido, vingar, daqui
por uns anos já poderá ir aos desfiles, ser lusito, fardar-se de verde e caqui, usar no
cinto um S de servir e de Salazar, ou servir Salazar, portanto duplo S, SS, estender o
braço direito à romana, em saudaçã o […]. Como amostra do que virá a ser a nossa
juventude patrió tica, irã o a Berlim, já fardados, os representantes da MP, esperemos
que tenham oportunidade de repetir a frase célebre, Nó s nã o somos nada, e assistirã o
aos Jogos Olímpicos, onde, escusado seria dizê-lo, causarã o impressã o magnífica, estes
belos e aprumados moços, orgulho da lusitana raça, espelho do nosso porvir, tronco em
flor estende os ramos à mocidade que passa2, Filho meu, diz Lídia a Ricardo Reis, nã o
entra em semelhantes comédias, e com estas palavras teríamos principiada uma
discussã o daqui a dez anos, se lá chegá ssemos.
José Saramago, O Ano da Morte de Ricardo Reis, Porto Editora, 2016

1. sinó nimo iró nico de jornalista; 2. ú ltimos versos do hino da Mocidade Portuguesa.

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Apresenta, de forma bem estruturada, as respostas aos itens que se seguem.

1.Como é sabido, o romance de José Saramago estabelece um permanente diá logo


intertextual com a obra pessoana.
Do primeiro pará grafo do excerto transcrito (iniciado por uma pergunta de Fernando
Pessoa),relevaos elementos caracterizadores da relaçã o heteronímica entre Pessoa e
Ricardo Reis.

2.Destacaas informaçõ es transmitidas pelo excerto, no que se refere à representaçã o do


tempo histó rico da obra.

3.«Ainda assim, nã o rejeitaríamos esta ú ltima palavra, escol […], enquanto nã o


aprendermos a dizer melhor em alemã o.»
Explicitao sentido crítico da intervençã o do narrador.



B.Lê, atentamente o excerto que se segue.

Nã o volto aqui, dissera Lídia, e é ela quem neste momento bate à porta […].
É por causa do meu irmã o. Ricardo reis lembra-se de qu o Afonso de Albuquerque
regressou de Alicante, porto que ainda está em poder do governo espanhol, soma dois e
dois acha que sã o quatro, O teu irmã o desertou, ficou em Espanha, O meu irmã o veio
com o barco, Entã o, Vai ser uma desgraça, uma desgraça, Ó criatura, nã o sei de que está s
a falar, explica-te por claro, É que, interrompeu-se para enxugar os olhos e assoar-se, é
que os barcos vã o revoltar-se, sair para o mar, Quem to disse, Foi o Daniel em grande
segredo, mas eu nã o consigo guardar este peso para mim, tinha de desabafar com uma
pessoa de confiança, pensei no senhor doutor, em quem mais havia de pensar, nã o
tenho ninguém, a minha mã e nã o pode nem sonhar. Ricardo Reis espanta-se por nã o
reconhecer em si nenhum sentimento, talvez isto é que seja o destino, sabermos o que
vai acontecer, sabermos que nã o há nada que o possa evitar, e ficarmos quietos,
olhando, como puros observadores do espetá culo do mundo, ao tempo que imaginamos
que este será também o nosso ú ltimo olhar, porque com o mesmo mundo acabaremos,
Tens a certeza, perguntou, mas disse-o somente porque é costume dar a nossa cobardia
ao destino essa ú ltima oportunidade de voltar atrá s, de arrepender-se. […] A ideia é
irem para Angra do Heroísmo, libertar os presos políticos, tomar posse da ilha, e
esperar que haja levantamento aqui. E se nã o os houver, Se nã o houver, seguem para
Espanha, vã o juntar-se ao governo de lá . É uma rematada loucura, nem conseguirã o sair
a barra, Foi o que eu disse ao meu irmã o, mas eles nã o dã o ouvidos a ninguém, Para
quando será isso, Nã o sei, ele nã o modisse, é um destes dias, E os barcos, quais sã o os
barcos, É o Afonso de Albuquerque, mais o Dã o e o Bartolomeu Dias, É uma loucura,
repete Ricardo Reis, mas já nã o pensa na conspiraçã o que com tanta simplicidade lhe foi
descoberta. Recorda-se, sim, do dia da sua chegada a Lisboa, os contratorpedeiros na
doca, as bandeiras molhadas como trapos pingõ es, as obras mortas pintadas de morte-
cinza, O Dã o é aquele mais perto, dissera o babageiro, e agora o Dã o vai sair para o mar,

Português 12.º ano | Banco de questõ es | © Raiz Editora 22


em rebeldia, deu por si Ricardo Reis a respirar fundo, como se ele pró prio fosse na proa
do barco, recebendo em cheio na cara o vento salgado, a amarga espuma. […] nã o chores
mais, lá grimas nã o adiantam, porventura mudarã o de ideias, Nã o mudam, nã o, o senhor
doutor nã o os conhece, tã o certo como chamar-me eu Lídia. Ter dito o seu pró prio nome
chamou-a ao cumprimento dos deveres, Hoje nã o lhe posso arrumar a casa, tenho de ir
a correr para o hotel, foi só o tempo de desabafar, talvez nem tenham dado pela minha
falta, Nã o te posso ajudar em nada, Eles é que vã o precisar de ajuda, com tanto rio para
navegar antes de passarem a barra, o que mais lhe peço, por alma de todos os seus, é
que nã o conte nada a ninguém, guarde-me este segredo que eu nã o fui capaz de calar só
para mim, Fica descansada, que a minha boca nã o se abrirá . Nã o se abriu a boca mas
descerraram-se os lá bios, o suficiente para um beijo de consolaçã o, e Lídia gemeu,
porém da má goa que tem, embora nã o fosse impossível encontrar nesse gemido um
outro som profundo, nó s, humanos, é assim que somos, sentimos tudo ao mesmo tempo.
Lídia desceu a escada, contra o costume foi Ricardo Reis ao patamar, ela olhou para
cima, ele fez-lhe um gesto de aceno, ambos sorriram, há momentos perfeitos na vida, foi
este um deles, como uma pá gina que estava escrita e aparece branca outra vez.
José Saramago, O Ano da Morte de Ricardo Reis, Porto Editora, 2016

Apresenta, de forma bem estruturada, as respostas aos itens que se seguem.

1. Explicitaos elementos de caracterizaçã o da relaçã o entre Ricardo Reis e Lídia


fornecidos pelo texto.

2. Explica, com palavras tuas, a hipó tese de definiçã o de destino, colocada pela
protagonista.

3. As confidências de Lídia remetem para um contexto histó rico determinado. Indicaos


dados presentes no excerto que permitem contextualizar a açã o.

4. «É o Afonso de Albuquerque, mais o Dã o e o Bartolomeu Dias.» Os nomes dos barcos


trazem memó rias e provocam reaçõ es em Ricardo Reis. Transcrevee interpretaa
comparaçã o usada para descrever a primeira destas reaçõ es.

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SOLUÇÕES
Fernando Pessoa
● Ortónimo e heterónimos
A.
1.Os mais nítidos traços de autocaracterizaçã o do sujeito poético sã o os seguintes: a incompreensã o de
simesmo («Nã o sei porque é que sou assim.»); a incapacidade de sentir sem pensar («Sentir foi sempre
para mim / Uma maneira de pensar.»); a inquietaçã o interior, representada pelo «rodopio / Das folhas
secas», que impedem o encontro consigo mesmo («Nã o consigo ser eu a fio»).
2. A recordaçã o de uma velha cançã o entristece o sujeito poético, no entanto, ele nã o sabe determinar,
com exactidã o, o motivo da tristeza. Essa tristeza advém do facto de a cantiga ser antiga e, por isso,
remeter para um passado distante, que já nã o existe? Ou é o sujeito poético que é antigo, condiçã o de que
a cantiga o faz tomar consciência e, logo, tem o efeito de o deixar triste? Seja como for, na base da tristeza
do sujeito poético está a memó ria nostá lgica de um passado distante e irrecuperá vel, desencadeadapela
lembrança de uma cantiga que pertence a esse passado.
3.As duas linhas temá ticas pessoanas que melhor se evidenciam no poema sã o: a dor de pensar,
provocada pela incapacidade de sentir sem a interferência do pensamento («Sentir foi sempre para mim /
Uma maneira de pensar.»), e a nostalgia da infâ ncia, patente na segunda estrofe.

B.
1.É através das sensaçõ escaptadas pelos cinco sentidos(visã o, ouvido, tato, olfato, gosto – vv. 4-6), que o
poeta estabelece a relaçã o com a realidade, seja ela flor, fruto ou dia de calor. Essa forma de
relaçã osensacionistacom o real basta-lhe, pois é a que lhe traz a verdade desse real. Ao afirmar a sensaçã o
como fonte ú nica do conhecimento do real, o poeta nega o pensamento, submetendo-o à sensaçã o. Caeiro
consegue, assim, unir o pensar ao sentir, afirmando, por exemplo, «Pensar uma flor é vê-la e cheirá -la / E
comer um fruto é saber-lhe o sentido».
2.Metá fora: «Sou um guardador de rebanhos»; «O rebanho é os meus pensamentos». Estas metá foras sã o
essenciais para a compreensã o de toda a poética de Caeiro, cujo livro se chama, precisamente, «O
Guardador de Rebanhos». Através destas metá foras, Caeiro assume a sua dimensã o de poeta bucó lico,
intimamente ligado à Natureza, ao mesmo tempo que nos fornece a interpretaçã o desse bucolismo: ele é
pastor de um rebanho que sã o os seus pensamentos, guardando-os, nã o deixando que eles se libertem,
mas que se diluam e convertam em sensaçõ es.
Aná fora:Este recurso está ligado ao tipo de articulaçã o do discurso: muito simples, com predomínio da
coordenaçã o, neste caso aditiva (conjunçã o coordenativa copulativa – e)
Enumeraçã o:A enumeraçã o dos ó rgã os dos sentidos, nos versos 4 a 6, contribui decisivamente para a
afirmaçã o da relaçã o sensacionista com o real.
Antítese: Na ú ltima estrofe poderemos considerar a antítese «triste» / «feliz», dois estados contrastivos
que o sujeito poético experimenta na sua relaçã o sensacionista com a Natureza.

C.
1.Ao acordar, sozinho, na noite, o sujeito poético experimenta diversas sensaçõ es (auditivas: o silêncio, o
tictac; visuais: a janela iluminada do vizinho e a luz da sua pró pria janela; e táteis: a humidade da noite),
que desencadeiam os seguintes sentimentos:
– «desespero» pela «insó nia» que o despertou;
– surpresa, jú bilo e depois curiosidade, face à luz de uma janela, que assinala a presença de outro ser
humano em vigília como ele;
– «fraternidade» e comunhã o com esse outro ser, acordado como ele, naquela hora de solidã o noturna.
2.O poema termina com a apó strofe«Ó candeeiros de petró leo da minha infâ ncia perdida!», que remete,
de imediato, para um sentimento de nostalgia da infâ ncia irremediavelmente perdida pelo sujeito poético.
Esta nostalgia, desencadeada pela visã o da luz de um candeeiro de petró leo como os da sua infâ ncia, é um
tema que Á lvaro de Campos partilha com Fernando Pessoa ortó nimo.

D.
1.1 Diferentemente do sujeito poético, «uns» e «outros» sã o os que nã o sã o capazes de viver o presente.
Assim, «uns» vivenciam o tempo olhando para o passado, o que significa nã o ver a realidade, pois sendo

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passado, já nã o existe. «Outros» olham para o futuro e, por isso, também nã o veem a realidade, uma vez
que o futuro apenas pode existir na imaginaçã o.
1.2 Aná strofes: Ao sujeito «Uns» deveria seguir-se o grupo verbal do predicado «Veem o que nã o veem»,
que integra uma oraçã o a funcionar como complemento direto, e só depois o modificador do grupo verbal
«com os olhos postos no passado».
2.1 Consciente da mortalidade, o sujeito defende uma filosofia de vida assente na vivência do presente
sem fuga para o passado ou para o futuro. É preciso viver o presente, pois o tempo passa inexoravelmente
e nó s passamos com ele, nã o podemos fugir à morte.
3. «Colhe / O dia, porque és ele» é o conselho que o sujeito poético dá , no qual está contida a ideia de que
é preciso aproveitar o momento presente (o «dia») na sua brevidade, porque nó s somos momento, apenas
no presente existimos, e é o presente que devemos fruir. É a filosofia clá ssica epicurista do carpe diem que
está subjacente a este poema.

●A Mensagem
A.
1.Do ponto de vista histó rico, a «ú ltima nau» é aquela que levou D. Sebastiã o e o seu exército para o Norte
de Á frica onde seriam derrotados, na batalha de Alcá cer Quibir.
A nau partiu numa atmosfera de otimismo e orgulho imperialista, «Levando a bordo El-Rei Dom
Sebastiã o, / E erguendo, como um nome, alto, o pendã o / Do Império». Mas a partida foi também marcada
pelo sentimento de desolaçã o, tristeza, â nsia e pressá gios de desgraça. Repare-se na expressã o «sol
aziago» e considere-se que o sol remete para energia, força, açã o, ideias contrariadas pelo adjetivo
«aziago», anunciador de morte, de «pressago mistério». Os adjetivos usados na primeira estrofe – última,
aziago, erma, pressago – sã o determinantes na criaçã o dessa atmosfera de desgraça pressentida e
confirmada na expressã o «Nã o voltou mais», que inicia a 2.ª estrofe.
Ao nível simbó lico, «a ú ltima nau» representa o fim do Império. No entanto, as interrogaçõ es colocadas na
2.ª estrofe abrem um rasgo de esperança, conferindo a Deus o papel de guardiã o e inspiraçã o do sonho
restaurador do futuro («Deus guarda o corpo e a forma do futuro, / Sua luz projeta-o, sonho escuro / E
breve»).
2.A «ú ltima nau» partiu e nã o voltou ainda. Entã o, o sujeito poético, consciente da hora apagada que a
pá tria vive no presente, deseja ser o impulsionador de uma nova energia que a faça renascer das cinzas.
Por isso, «quanto mais ao povo a alma falta», quanto menos energia a pátria tem, mais o sujeito poético
sente a exaltaçã o da sua missã o inspiradora do sonho que quer transmitir à pátria: o sonho utó pico de
uma nova era.
É assim que o sujeito poético conjuga a epopeia da memó ria dos heró is e dos mitos com o lirismo da sua
pró pria ânsia e do seu pró prio sonho inspirador, de onde decorre o cará ter épico-lírico da obra.
3.Imbuído, como anteriormente se afirmou, do desígnio de construçã o de uma nova era, o sujeito poético
afirma nã o saber o momento, mas ter a certeza da chegada do momento misterioso e desejado.
Configurado como a chegada do sol (a luz) que afasta o nevoeiro, é a era do renascimento do império,
agora espiritual, logo, mais duradouro do que o império terreno que acabou. É a desejada luz – D.
Sebastiã o – que regressa do nevoeiro, afastando as sombras e fazendo reerguer o pendã o – o símbolo – o
sonho do Quinto Império. Assim se expressa, neste poema e, particularmente, nesta estrofe, a temática do
Sebastianismo presente na Mensagem.

B.
1. O sujeito poético caracteriza o presente como um tempo adormecido e moribundo, através das
expressõ es «noite», tempo da «alma vil», «silêncio hostil», «saudade» e «frio morto em cinzas».
2. Começando com a adversativa «Mas», a 2.ª estrofe abre uma janela de esperança no presente
moribundo, apontando «a chama», nã o totalmente extinta por trá s das cinzas, que pode erguer-se com o
vento, o sopro vital da vontade.
3. A ú ltima estrofe exprime um apelo/desejo, de sentido coletivo, patrió tico e simbó lico, de ressurgimento
e rejuvenescimento do «sopro» vital, da «â nsia» de conquista do desconhecido, ainda que seja «desgraça»,
mas que é também vida, esforço, conquista. Deseja-se que Portugal renasça das cinzas, para conquistar «a
Distâ ncia / do mar ou outra», mas que seja a sua identidade, o seu rosto.
Assim, o sujeito lírico, depois de lamentar o presente de cinzas em que a pá tria está mergulhada (depois
de ter vencido tanta «tormenta» e ter tido tanta «vontade»), exprime o desejo de um ressurgimento,

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impulsionado pela vontade de novos embates com o desconhecido, na perseguiçã o da verdade, que só
pode ser alcançada seguindo a chama vital do sonho.
4. O poema é constituído por três quadras de versos decassilá bicos, apresentando o esquema rimá tico
abab, ou seja, rima cruzada.

Conto
● Mário de Carvalho
1. É movido pelo pedalar de um semaforeiro. O doutor Beckett é um médico singular porque anda nas
ruas a captar doentes. Diz à s pessoas que nã o estã o com bom aspeto e procura convencê-las a utilizar os
seus serviços.
2. O médico, nesta sua tarefa de arranjar doentes, precisa de circular livremente e o semá foro nã o o
permite. Desta implicâ ncia nasceu uma inimizade que passou de geraçã o em geraçã o.
3. A desavença teria sido mais grave ou mais dolorosa se em alguma das famílias houvesse alguém
apaixonado por um elemento da outra família (a lembrar Romeu e Julieta ou tantas novelas de Camilo
Castelo Branco).

● Maria Judite de Carvalho


1.Gi foge de um projeto de vida que a família lhe destinou e que nã o está de acordo com os seus sonhos,
com as suas perspetivas futuras. A família espera que ela case, seja uma boa esposa, uma boa mã e e tenha
uma situaçã o econó mica está vel. Quanto à sua paixã o pelo desenho poderá sempre satisfazê-la, nas horas
vagas, com uns desenhos, uns retratos dos filhos, por exemplo. Carlos, o namorado, está ansioso por
começar esta nova etapa das suas vidas e Gi sente que é a altura de partir.
Gi foge da pressã o familiar, de um envolvimento que a aprisiona e de que só conseguirá libertar-se
partindo, deixando tudo para trá s – família, namorado, amigos, estabilidade. Foge à procura da realizaçã o
do seu sonho.
2.Nesta situaçã o é George quem «foge». Ou seja, é a mesma personagem, agora bem mais velha. Foge do
passado ou, mais precisamente, das lembranças do passado. Lembranças da família que deixou na vila,
quando partiu há muitos anos, lembranças do mundo em que viveu até à sua adolescência, lembranças de
si pró pria, muito jovem, cheia de sonhos e ansiosa por concretizá -los. Foge do «dantes» a que já só estava
presa pela «casa» de família que viera vender.
3.As emoçõ es de George sã o contraditó rias. Se, por um lado, sente a nostalgia de um tempo que passou e
em que parece ter sido amada e feliz, por outro, sabe que só conseguira construir o que agora tem por ter
tido a coragem de partir. Hoje é uma pintora consagrada. Uma parte de si congratula-se com a realizaçã o
presente e sabe que valeu a pena a opçã o que tomou, apesar das dificuldades que teve de enfrentar. Outra
parte de si relembra com nostalgia um passado que vai ficando, definitivamente e cada vez mais para trá s
à medida que o comboio avança.

Poetas portugueses contemporâneos


A.Miguel Torga
1.A partir dos versos iniciais, o sujeito poético estabelece uma identificaçã o dos poetas com a cigarra da
fá bula de Esopo. Como a cigarra, os poetas sã o considerados preguiçosos, uma espécie de saltimbancos
cujo trabalho nã o é levado a sério e que pagam com a miséria a vida levada a cantar, ou seja, a vida
dedicada à poesia.
2.Na segunda parte do poema, o sujeito faz uma saudaçã o fraternal e uma exortaçã o aos Poetas, no
sentido de cantarem, de exercerem o seu ofício. Mas a poesia a escrever deverá ser um hino de
humanidade, orientada por valores universais: «amor universal», igualdade entre os homens, canto do
homem comum.
3.Sã o as «asas»da cigarra que produzem o seu canto e que, neste contexto de associaçã o entre a cigarra e
o poeta, sã o a metá fora da voz do poeta, o seu canto. Como as asas / canto da cigarra, a voz do poeta ora
triste, ora pujante de energia, ergue-se acima da contingência, elevando a condiçã o humana.

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B.Eugénio de Andrade
1. O elemento «barco no mar» remete para as seguintes ideias: esperança; viagem física e/ou interior;
traço de beleza e de vida no horizonte.
2. É urgente destruir as palavras que nomeiam o ó dio, a solidã o, a crueldade, a tristeza («lamentos»), a
violência («espada»). Destruir as palavras significa destruir as realidades que elas nomeiam, ou seja, à
palavra corresponde uma realidade, nã o existindo uma sem a outra. (Veremos que é esta a base da Arte
Poética de Eugénio de Andrade.)
3. De acordo com o sujeito poético, é urgente construir a alegria, a esperança («barco no mar»), o amor
(«multiplicar os beijos»), a vida («as searas»). Enfim, é urgente a beleza das coisas da Natureza
(«descobrir rosas e rios / e manhã s claras»).
4. Estes versos caracterizam, metaforicamente, a realidade contemporâ nea: um tempo de incomunicaçã o
ou de medo de falar («Cai o silêncio nos ombros»); um tempo sujo, negativo, doloroso («a luz / impura até
doer»). Este presente negativo justifica a urgência de destruiçã o da negatividade e de construçã o de um
tempo novo expressas nas estrofes anteriores.
5. A aná fora «É urgente» sublinha a sensaçã o de premência, de urgência.

C. Ana Luísa Amaral


1. O sujeito poético afirma que, «se for preciso», fará o impossível. Esta afirmaçã o é feita através das
metá foras «irei buscar um sol» e «cobrirei este chã o / de estrelas mais brilhantes / que a mais
constelaçã o», reveladoras de uma entrega total ao amor, que tudo torna possível.
2. Os deíticos espaciais e temporais situam o sujeito e a pessoa amada em presença e num presente de
plenitude amorosa.
3. As gavetas sã o, simbolicamente, as guardadoras de memó rias (do amor), o lugar onde serã o guardadas,
se necessá rio, a memó ria das palavras e dos olhares trocados, bem como a dos sentidos («cheiros e
sabores»).
4. O sujeito poético afirma que guardará na gaveta a ternura que sobrou daquela tarde (porque era tanta),
já que ela está dentro de si, pronta a dar-se, quando o ser amado o quiser.
5. Porque a ternura permanece, nã o está gasta, logo, nã o precisa de provas impossíveis nem de memó ria.
6. O travessã o final, em vez do ponto final, deixa o futuro em aberto e talvez procure dar voz ao
destinatá rio.

D. Jorge de Sena
1.Dirigindo-se aos seus contemporâ neos, o poeta acusa-os de lhe roubarem a obra, a vida de combate e o
amor. Essa acusaçã o é carregada de ironia amarga contida na expressã o «Podereis roubar-me», que
indicia o roubo de que, de facto, é vítima, por parte dos seus contemporâ neos.
2.O poeta acusa os seus contemporâ neos de ignorarem a sua obra, enquanto proclamam outros poetas
sem valor, mas igualmente ladrõ es como eles.
3.O castigo dos contemporâ neos será o seu pró prio esquecimento, enquanto a memó ria do poeta
perdurará para sempre. Daquele tempo em que vivem (o poeta e os seus vis contemporâ neos) apenas o
nome de Camõ es perdurará , num futuro que será caracterizado como a época de Camõ es. No final do
poema, mais uma vez com ironia, referirá o facto de um qualquer esqueleto (de um dos seus
contemporâ neos) ser usado como se fosse o de Camõ es, resgatado da vala comum para colocar no tú mulo
solene dos Jeró nimos.

E.Alexandre O’Neill
1.As duas realidades que se cruzam no poema sã o um bando de gaivotas e um beijo. Sendo
completamente diferentes – as gaivotas sã o aves reais, concretas, o beijo é um gesto / ato de amor, nã o
tem existência material –, nã o sã o dissonantes no texto, porque o beijo, poeticamente, voa como as
gaivotas, junta-se a elas.
2.O beijo chegou a voar, «ainda palpitante», de origem desconhecida. A sua imagem é perfeitamente
surrealista: «É uma ave estranha: colorida», um coraçã o vermelho a pulsar no ar, com a força apaixonada
de duas bocas.
2.1As expressõ es «Congresso de gaivotas» e «De inveja as gaivotas a gritar» contêm uma muito
expressiva ironia surrealista.
3.O poema é um soneto (constituído por catorze versos, organizados em duas quadras e dois tercetos); os
versos sã o decassilábicos e apresentam rima cruzada nas quadras e emparelhada e interpolada nos
tercetos, segundo o esquema rimá tico abab / abab / ccd / eed.

Português 12.º ano | Banco de questõ es | © Raiz Editora 27


F.António Ramos Rosa
1.O sujeito poético autocaracteriza-se como um funcioná rio apagado, triste, solitá rio, confuso, com uma
frustrada alma de poeta e os sonhos aprisionados numa vida sem sabor. Ao traçar o seu retrato e o da sua
vida, ele utiliza, em algumas passagens, uma ironia triste, patente sobretudo na 2.ª estrofe («A minha
alma nã o dança com os nú meros», «o chefe apanhou-me com o olho lírico», «debitou-me na minha conta
de empregado»).
2.Há um claro desajuste entre a sensibilidade de poeta e a condiçã o de funcioná rio. Ser funcioná rio
obriga-o a uma vida compassada pelo ritmo dos nú meros e dos documentos com que trabalha, o «Débito e
Crédito» referenciado no poema. No entanto, em oposiçã o a esta condiçã o, a sua alma insatisfeita «nã o
dança com os nú meros» e arrasta o seu «olho lírico» de poeta para lá da realidade, para a beleza de um
pá ssaro, para as «velhas palavras generosas» do seu sonho aprisionado. Contribui para este desajuste o
espaço físico e social asfixiante e devorador que o sujeito habita, numa «rua estreita», de casas que o
engolem, num aprisionamento dos sonhos mais simples, num universo de funcioná rios que só podem ter
olhos para os papéis. Por isso, nesse aprisionamento, perde tudo o que possa ter de mais íntimo, pessoal e
criativo, e fica um «funcioná rio cansado», «irremediavelmente perdido no (seu) cansaço».
3.Apesar da sua existência de funcioná rio apagado, ele soletra «velhas palavras», que povoam o seu sonho
abafado – flor, rapariga, amigo, menino, irmão, beijo, namorada, mãe, estrela, música. Sã o palavras de
libertaçã o, que podem encher de calor a alma mais fria, de cor o lugar mais cinzento, palavras carregadas
da poesia, que o funcioná rio nã o ousa, apenas timidamente soletra e deixa escapar do «olho lírico». Sã o
palavras instauradoras de amor, afeto, beleza, vida, inocência, alegria, luz, tudo o que a vida tem de bom
se soubermos vivê-la.

G.Herberto Helder
1.Os cinco primeiros versos revelam a origem interior do poema. Como exemplo, atentemos nas
expressõ es que evidenciam a origem íntima, física e humana do poema: «Um poema cresce […] na
confusã o da carne. Sobe […] só ferocidade e gosto, talvez como sangue ou sombra de sangue pelos canais
do ser.»
2.«Fora existe o mundo» (v. 6) é a expressã o que inicia a enunciaçã o da realidade exterior que se estende
até ao final do v.14 («a hora teatral da posse»).
3.«E o poema cresce tomando tudo em seu regaço.» (v. 15). É a partir deste verso que o poema se
apropria da realidade, invadindo tudo com o seu poder.
4.Este poema é uma verdadeira «Arte poética», pois nele está exposto um conceito de criaçã o poética.
Assim, o poema começa por gerar-se dentro do poeta, confuso, sensual, íntimo, para depois abarcar a
realidade do mundo, sugá -la para o seu interior de palavras que se erguem poderosas e acima da
realidade, acima do tempo – «E o poema faz-se contra a carne e o tempo».

H.Ruy Belo
1.No «portugal futuro», é possível o voo do pá ssaro, ou seja, a liberdade; é possível o desenho das crianças
sobre o asfalto, ou seja, a criatividade; é possível a dança das crianças, ou seja, a alegria; é possível a
felicidade.
1.1O desenho tem a forma de um peixe e representa a infâ ncia. Ao desenharem esse peixe sobre o asfalto
negro, como quem desenha numa lousa, as crianças estã o a transformar a estrada em rio, caminho vivo e
natural.
2.O que mudará no «portugal futuro» nã o serã o as dimensõ es nem as fronteiras, nem o nome, mas sim o
seu interior, a sua alma («tudo nele será novo desde os ramos à raiz»), ou seja, o país é á rvore que tem de
renovar-se para dar frutos novos.
3.O sujeito poético identifica as badaladas do reló gio da matriz com o passado, por isso receia que ouvi- -
las, no «portugal futuro», seja ficar preso a esse passado e que, assim, a renovaçã o necessá ria nã o
aconteça.
4.Rima:A rima, muito livre, musical e flexível, apresenta-se com o esquema: abcacbdada|eeafgfahh ou
seja, há uma rima que predomina ao longo de todo o poema – país, giz, país, feliz, raiz, matriz ; verifica-se a
existência de conjuntos que se apresentam de forma variada (emparelhada: este / leste, duro / futuro;
cruzada: desenharem /país / chamarem / feliz; interpolada: feliz / este / leste / raiz); o ú nico verso solto, o
15.º, nã o o é completamente, pois rima com o interior do verso seguinte – beira-mar / mudar.
Aliteraçã o: «o puro pá ssaro é possível»; «desde os ramos à raiz»; «na avenida que houver»; «o passado e
podia». Outras repetiçõ es– desenhem / desenharem; chamem / chamarem; será / serei; este / oeste / este.

Português 12.º ano | Banco de questõ es | © Raiz Editora 28


I.Luiza Neto Jorge
1. Sã o vá rias as expressõ es correspondentes a sensaçõ es auditivas que chegam ao quarto do sujeito
poético:
– «passos soltos de gente»;
– «cai o som»;
– «soa o sino só lido as horas»;
– «um cano rebentou»;
– «um carro foi-se abaixo»;
– «portas duplas fecham»;
– «sirenes e buzinas»;
– «estragou-se o alarme»;
– «o alarme nã o para».
2.Ambas as transcriçõ es sã o muito intensas do ponto de vista poético.
«os lençó is na corda / abanam os prédios»: além da forte impressã o visual e cinética dos lençó is, é muito
interessante a deslocaçã o do movimento dos lençó is pendurados para o prédio.
«pombos debicam / o azul dos azulejos»: nesta expressã o, a sinestesia, provocada pela sugestã o do som
do bico dos pombos e pela indicaçã o da cor azul é intensificada pelas aliteraçõ es – «pombos debicam / o
azul dos azulejos».
3.«sirenes e buzinas, ainda ninguém via satélite / sabe ao certo o que aconteceu»:esta passagem ironiza
com o alarme contemporâ neo dos acontecimentos que tenham algum sabor a tragédia e que sã o
imediatamente amplificados, através dos mais diversos meios de difusã o.
«duma varanda um pingo cai de um vaso salpicando o fato do bancá rio»:nesta passagem a ironia reside
na pró pria situaçã o que encerra o texto, com um acontecimento tã o pequenino, tã o banal e que, no
entanto, encerra um certo grau de desajuste có mico.

J.Nuno Júdice
1.O poema apresenta um conjunto de metá foras caracterizadoras daquilo que o sujeito poético sente
como uma dá diva transformadora do ser amado. Estas sã o as primeiras.
a.Trouxeste a segurança, que anula a incerteza; trouxeste a felicidade, que afasta os medos.
b.Trouxeste a luz da felicidade a uma vida de tristeza e solidã o.
2.Segundo o sujeito poético, o amor é cada um encontrar a sua pró pria identidade, construir-se por
dentro, para poder entrar na equaçã o de ser dois, e sem deixar de o ser, poder também fundir- se num só ,
liberto da solidã o. O amor é ainda nã o precisar da presença física do ser amado para o ter junto de si,
dentro de si. Finalmente, o amor é a luta contra o tempo.
3.O tema do amor de Pedro e Inês está presente na tradiçã o literá ria portuguesa desde o Cancioneiro
Geral de Garcia de Resende, no início do século XVI, passando por Camõ es e inú meros autores ao longo
dos séculos.
Neste poema de Nuno Jú dice, o título remete para esse tó pico, mas ultrapassa-o. Na verdade, podemos
entender o poema como um discurso de Pedro dirigindo-se à amada morta, mas o texto é sobretudo um
poema sobre o amor vivido plenamente, numa dimensã o que lhe confere universalidade, nã o o
restringindo a uma histó ria de amor concreta. «Pedro e Inês» serã o a metonímia dos amantes mais felizes
que infelizes.

K.Manuel Alegre
1.A realidade é a da emigraçã o portuguesa em França, observada através da visã o dos emigrantes na gare
parisiense de Austerlitz.
2.O sujeito poético percepciona um país marítimo, proletá rio e muito pobre. Duas metá foras muito
expressivas o caracterizam: «um perfil / de sal / e abril» e «um puro país azul e proletá rio». A 1.ª remete
para a condiçã o marítima de Portugal; a 2.ª remete para o mar e para a condiçã o simples e proletá ria dos
emigrantes. Já a enumeraçã o de cestos, pedaços, restos, braços remete para a descriçã o da pá tria exilada,
transmitindo uma ideia de pá tria rural, partida em pedaços, caída, perdida em terra alheia.
3.As interrogaçõ es, nos vv. 19 e 20, referenciam a situaçã o de abandono dos campos e do mar, provocada
pela saída dos homens que emigravam. A dos vv. 21-22 contém implícita a situaçã o política das
perseguiçõ es do tempo do fascismo. A do v. 25sugere o nú mero incontá vel de emigrantes. Através destas
interrogaçõ es, o sujeito poético exprime perplexidade, revolta, solidã o e saudade. Por outro lado, ao
utilizar a 1.ª pessoa do plural («É ramos», «caminhá vamos»), exprime a solidariedade e a comunhã o com a
condiçã o dos emigrantes que, alugam a sua força de trabalho em França.

Português 12.º ano | Banco de questõ es | © Raiz Editora 29


L.Vasco Graça Moura
1.1Ao campo lexical de visã o pertencem as palavras «retina», «ensombramento», «relâ mpago»,
«desvendar-se».
1.2A ausência é a sombra, o silêncio, o desligar da realidade, enquanto a presença traz a luz, o
desvendamento das imagens do mundo.
2.1O sujeito poético interroga-se sobre os motivos da ausência, o que afasta de si a poesia.
2.2A tristeza é uma das razõ es possíveis; outra, mais concreta e com a qual as duas outras se prendem, a
doença e a «cama de um hospital», «o branco desolado das paredes», a «mudez de estranhos aparelhos»; a
ú ltima, a desesperança.
3.A poesia surge no poema como a forma privilegiada de ligaçã o à vida. Sem ela, o que fica é um
«ensombramento», um desamparo do real.

José Saramago
O Ano da Morte de Ricardo Reis
A.
1.No primeiro pará grafo do excerto, diversos elementos sã o reveladores da relaçã o heteronímica, mais
exatamente, do facto de Ricardo Reis ser uma criaçã o de Fernando Pessoa: as referências ao poema, que
este sabe nã o ser verdadeiramente sobre Marcenda, e do qual diz o segundo verso, acrescentando
«Conheço os seus versos de cor e salteado, os feitos e os por fazer»; o criador dos heteró nimos, expondo
ainda mais flagrantemente o seu estatuto, corrige a afirmaçã o de que sabem tudo um do outro para «…ou
eu de si», o que conduz à ú ltima pergunta de Reis, «Haverá alguma coisa que só a mim pertença», dando
lugar à ú ltima confirmaçã o de que a sua identidade é dependente de uma outra, é o desdobramento de
uma outra, «Provavelmente, nada».
2.O excerto mostra a influência crescente em Portugal do nacional-socialismo alemã o, referindo a visita
da delegaçã o das Juventudes Hitlerianas de Hamburgo e um dos pilares da ideologia que vinham defender
– a necessidade de um poder autoritá rio. A criaçã o da Mocidade Portuguesa é assim enquadrada no
regime político que deve servir e perpetuar, preparando a elite futura, «que nos governará depois,
quando a de agora se acabar». A fidelidade ao modelo alemã o é visível na descriçã o do uniforme, da
saudaçã o nazi executada nos desfiles, na referência à exaltaçã o da «raça». O excerto informa finalmente
sobre a presença de representantes da organizaçã o portuguesa nos Jogos Olímpicos de 1936.
3.O narrador usa a palavra «escol» como pretexto para criticar uma das estratégias do nacional- -
socialismo, seguida de perto em Portugal: a anulaçã o da vontade coletiva, a submissã o generalizada e
voluntá ria, face ao autoritarismo. Em oposiçã o, o narrador afirma uma clara preferência pelo regime em
que os dirigentes sã o escolhidos pelo povo.

B.
1. Os elementos presentes no texto retratam uma relaçã o de grande proximidade, quer da parte de Lídia,
pela confiança revelada, quer da parte de Ricardo Reis, que a ouve, se interessa, pergunta se a pode
ajudar. O beijo e o «momento perfeito» final sã o ilustrativos dessa intimidade.
2. O protagonista admite que o destino seja o reconhecimento da nossa impotência perante os
acontecimentos da vida e perante a morte.
3. O texto refere a guerra civil de Espanha, quando Reis lembra que Alicante nã o foi ainda tomada pelos
golpistas e quando é revelada por Lídia a alternativa dos revoltosos, caso a sua revolta falhasse. O assunto
principal é, porém, o da revolta dos marinheiros, que pretendiam iniciar um levantamento nacional, indo
para Angra do Heroísmo e libertando os presos políticos.
4. «deu por si Ricardo Reis a inspirar fundo, como se ele pró prio fosse na proa do barco, recebendo em
cheio na cara o vento salgado, a amarga espuma.» A comparaçã o mostra a identificaçã o de Reis com os
conspiradores, a emoçã o provocada pela revelaçã o de Lídia.

Português 12.º ano | Banco de questõ es | © Raiz Editora 30

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