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Um líder de aço

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Colaborou nesta edição: Lucas Pires (textos) e Felipe Ajzemberg (ilustrações) ríodo na história de seu país e do mundo que muitos desejam esquecer. As
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do de família pobre, ele mesmo confessou que se tornara marxista por causa
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pôs a dar palestras, tornando-se um “doutrinador de operários”. Aos poucos,
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aliado. Já Trotski, outro ilustre membro do partido, transformou-se em seu rival,
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passaria para a posteridade como um ponto extremamente polêmico da his-
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tatianelopez@editoraonline.com.br tória russa, que terminaria com o assassinato de Trótski a mando de Stálin.
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Primeiros passos
Infância e juventude

Nascido Iossef Vissarionovitch Djugachvili, só se tornou Stálin na década


de 1910. Antes disso, viveu a infância na pequena Gori e estudou num
seminário em Tbilissi. Ali amadureceriam o nacionalismo georgiano e o
ideário socialista
Por Lucas Pires

S
tálin era descendente de uma família de servos A FAMÍLIA
e viveu uma infância pobre, entre surras do pai, Os mistérios em torno de Stálin já começam pela defi-
que gostava muito de beber, e o carinho da mãe, nição de sua data de nascimento. A maioria afirma que
que teve de trabalhar para suprir a ausência do ele nasceu em 21 de dezembro de 1879. Mas pesquisas
sustento que deveria ser provido pelo pai. mais recentes, descobertas em 1990 em documentos de
A história de Josef Stálin confunde-se rapidamen- arquivos paroquiais, apontam para 6 de dezembro do
te com a dos movimentos socialistas revolucionários na ano anterior. Dúvidas à parte, é certo que o líder rus-
Rússia imperial. Isso porque, na juventude, ele entraria so era filho de um casal de ascendência serva da Geór-
para os devotos da revolução contra o czar e a favor do gia, região independente que fora conquistada em 1801
socialismo, e só deixaria o movimento com sua morte,
pelos czares russos. O pai, sapateiro, deixou sua vila
em 1953, como chefe da União Soviética.
próxima a Tbilissi, capital do Cáucaso, conhecida por
Enquanto viveu, Stálin vivenciou dois momen-
Didi-Lilo, e mudou-se para Gori, cidadezinha de cin-
tos antagônicos. Primeiro, foi o império russo atrasa-
co mil habitantes.
do que tentava sobreviver com um sistema alternativo
ao capitalismo e ao socialismo, sistema este que deixa- Vissarion Ivanovitch Djugachvili, quando ain-
ria 80% da população na miséria. Num segundo mo- da era jovem, por volta de 1875, conheceu a mulher
mento, pós-revolução de 1917, ele se deparou com um que viria a ser sua esposa e a mãe de seus filhos. Ca-
país socialista que expandiu sua economia via uma in- sou-se com Ekaterina Ghelazde, de apenas 15 anos, com
dustrialização acelerada, levando-o a vencer a 2a Guerra quem teve três filhos até 1879, sendo que nenhum
Mundial e a construir uma bomba atômica. deles “vingou” – morreram logo depois do nascimen-
Em pouco mais de 30 anos, um abismo separa- to. Apenas a quarta criança sobreviveria – Iossef Vis-
va essas duas Rússias. E Stálin esteve em ambas – na sarionovitch Djugachvili, mais tarde conhecido como
primeira, como opositor e revolucionário; na segunda, Josef Stálin.
como seu maior protagonista depois da morte de Lê- Como a maioria do povo russo ou dos povos domi-
nin. São estes dois mundos, o tempo de Stálin e sua nados pelo império, que era o caso da Geórgia natal de
participação neles que iremos abordar nestas páginas Stálin, a família do futuro revolucionário bolchevique
de Grandes Líderes da História. era muito pobre. O que o pai ganhava como sapateiro

Apesar de forte, Stálin passou por problemas quando criança


que o afetariam para o resto da vida. Um deles foi a varíola,
que teve aos 7 anos e que lhe deixou marcas no rosto;
outro foi uma infecção no braço esquerdo, que, mesmo
após a recuperação, deixou o movimento prejudicado
e o membro mais curto que o direito
4 | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | STÁLIN
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Selo postal chinês com a imagem de Stálin, de 1954

STÁLIN | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | 5


não dava para pagar o aluguel e alimentar os três. Daí a ria, segundo alguns, numa briga de rua, quando o menino
mãe ter começado a lavar roupas pra fora, “para equilibrar tinha 11 anos. Em termos financeiros, não surtiu muita
o orçamento”. Alguns biógrafos colocam que a frustração diferença no orçamento familiar, pois, de fato, o susten-
de Vissarion em não ter ascendido socialmente com sua to era provido pela mãe. O pai, mesmo levando a famí-
mudança o fez gastar o pouco que ganhava com vodca, lia a Tbilissi para tentar a vida numa fábrica de sapatos,
obrigando a esposa a trabalhar mais ainda. Há referências não conseguiu nada além de trocar, como escreveu Isaac
de colegas de Stálin que lembram de seu pai bêbado sur- Deutscher em Stálin: Uma Biografia Política (Civilização
rando o filho e até a mulher. Um deles disse: “Aquelas sur- Brasileira, 2006), “a escravidão à terra pela escravidão as-
ras terríveis e sem propósito fizeram do filho um homem salariada”. Sua morte, em 1890, colocou apenas fim a uma
duro, acostumado a enfrentar situações violentas”. relação conturbada e, muitas vezes, violenta entre pai, mãe
Apesar de forte em saúde, Stálin passou por proble- e filho. Em toda sua vida, pouco Stálin falaria a respei-
mas quando criança que o afetariam para o resto da vida. to do pai, e quase nada se sabe sobre ele. Em relação à
Um deles foi a varíola, que teve aos 7 anos e que lhe dei- mãe, Deutscher também teceu considerações: “Ekaterina
xou marcas no rosto; outro foi uma infecção no braço es- possuía a paciência e o espírito de submissão infinitos da
querdo, que, mesmo após a recuperação, deixou o movi- camponesa oriental. Suportava sua sorte com tenacidade,
mento prejudicado e o membro mais curto que o direito. sem guardar ressentimento do marido. Dedicava toda a
Sobre este episódio, Stálin declarou à sua cunhada poste- ternura ao único filho vivo. Era profundamente religiosa;
riormente: “Não sei o que me salvou, se minha constitui- só encontrava consolo para as aflições na igreja. Era tam-
ção robusta ou o unguento de um charlatão de aldeia”. A bém analfabeta. Só na velhice iria aprender a ler, mostran-
figura paterna viveria pouco ao lado do filho, pois morre- do-se, assim, digna do filho famoso”.

A mãe do camarada Stálin


Da família de Stálin, praticamente ninguém foi capaz de ter Junto com as cartas, Ekaterina enviava doces e geleias ao filho,
influência sobre ele. De temperamento forte, seria conhecido mais que retribuía com algum dinheiro e bilhetes curtos como o
por sua dedicação à política e ao Partido do que por suas relações citado anteriormente. Apesar de ausente, Stálin rodeava a mãe
pessoais – pais, esposas e filhos. Mesmo assim, convém dissertar dos melhores cuidados. Tinha moradia, era atendida pelos mais
a respeito da relação que o todo-poderoso da União Soviética, competentes médicos e, de vez em quando, recebia a visita dos
depois da morte de Lênin, estabeleceu desde jovem com sua mãe. netos. Em compensação, numa dessas visitas, Svetlana Alliluyena,
A filha de Stálin disse, certa vez, a respeito do pai e da avó o filha de Stálin, questionou-se do porquê da pobreza e da pequenez
seguinte: “Ele era um mau filho, negligente, exatamente como do quarto em que a avó morava.
era como pai e marido. Todo seu ser estava voltado para outra Na década de 1930, a saúde da mãe do camarada Stálin começou
coisa, a política e a luta, de modo que as pessoas que não estavam a definhar. Em outubro de 1935, ele, enfim, quebrou um hiato de
próximas em caráter pessoal sempre foram consideradas mais muitos anos e visitou a mãe. Passou o dia com ela e voltou para
importantes para ele do que as que eram de seu convívio pessoal”. Moscou na mesma noite. Nesse encontro, que seria o último entre
De fato, Stálin era mais voltado ao Partido do que à família. eles, Ekaterina teria perguntado ao filho o que ele era realmente
Reclamações quanto à sua ausência em casa seriam corriqueiras no país. Ela tinha noção de que era importante, mas não do
entre suas duas esposas. A mãe não reclamava, pois cedo grau de hierarquia a que chegara. Stálin teria respondido a ela o
aprendera a ficar longe do filho. Primeiramente, quando foi seguinte: “Mamãe, lembra-se de nosso czar? Pois
estudar no seminário, em seguida com o envolvimento na política bem, sou mais ou menos como ele”. Quando se despediram,
e, depois, nos dez anos entre as revoluções de 1905-07 e 1917, Ekaterina teria dito: “Ainda assim, é uma pena que não
quando Stálin viveu intercalando a clandestinidade e as prisões. tenha se tornado padre”.
Nesse período, Ekaterina Georgievna Djugashvili ficou até No final de maio de 1937, ela contraiu pneumonia. Poucos dias
mesmo sem ter notícias do filho. depois, em 4 de junho, acabou morrendo. Stálin não foi a Tbilissi
Pouco se encontraram depois da primavera de 1904, quando e não esteve presente no enterro da mãe. Alguns diziam que fez
passaram juntos algumas semanas em Gori. A partir de 1922, já com isso por receio da reação popular contra o período de terror que a
grande destaque no Partido e no governo, Stálin mudou sua mãe de União Soviética vivia, de perseguições e fuzilamentos sumários a
Gori para Tbilissi, a capital do Cáucaso. Ela foi instalada num antigo “traidores” e espiões. Outros apontam justamente esse cenário de
palacete da cidade, onde ocupou um pequeno compartimento. Daí preocupação com as perseguições para sua ausência. O trabalho,
em diante, passou a se comunicar com o filho mais por cartas, ditadas como ele sempre demonstrou, viria em primeiro lugar, acima
para pessoas do Partido que iam da cidade para Moscou. Nos mesmo da mãe e de sua família.
arquivos soviéticos divulgados em 1990, foram encontradas cartas Deu ordens para que a morte de Ekaterina não fosse noticiada
recebidas do filho que ela guardava com todo cuidado. De 1922 até pela imprensa central, mas no Cáucaso saíram fotos dela nos
sua morte, em 1937, foram 18 cartas. Algumas delas não passavam jornais, e as autoridades georgianas reservaram três dias para as
de duas linhas, como a de 1o de janeiro de 1923, que dizia assim: despedidas. Entre as milhares de coroas de flores, um grande
“Querida mamãe! Saudações! Que você possa viver dez mil anos. arranjo com um bilhete se destacava. Os dizeres eram: “Para
Mando-te um beijo. O seu Soso”. minha querida e amada mãe, de seu filho Josef Djugashvili”.

6 | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | STÁLIN


A IDA PARA O SEMINÁRIO O cotidiano no seminário, onde permaneceu até
O caráter religioso da mãe ajudou na decisão de enviar ser expulso em 1899, era monástico. Viviam trancados,
o pequeno Soso – apelido pelo qual era chamado Stálin muitos empilhados em um único quarto, tendo aulas
pelos mais próximos, que era um diminutivo georgiano de teologia e escolástica e fazendo orações, além de só
de Iossef (algo como nosso Zezinho) – para a escola ecle- poder ler a literatura autorizada pela instituição. Um
siástica de Gori. Desejava intimamente a mãe que seu ex-estudante afirmou que se sentiam como “prisio-
filho fosse um homem neiros que ali devem passar
dedicado à religião, um anos, mesmo sem ter culpa
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sacerdote. Desde muito de nada. Todos nós éramos
criança, Soso frequen- sombrios e taciturnos. (...) a
tava a igreja e cantava alegria juvenil quase nunca
no coro. Daí a alegria da se afirmava”. Mesmo assim, a
mãe quando, em 1894, oposição política era cultiva-
ele ingressou no Semi- da pelos alunos no seminá-
nário Teológico de Ti- rio. Dali saíram muitos dos
flis, com a indicação de homens que iriam lutar con-
“melhor aluno”. Graças tra o regime czarista nos pró-
ao diretor da escola e a ximos anos.
um padre, Stálin recebeu Stálin passou a ter maior
uma bolsa de estudos e contato com a literatura, ten-
pôde continuar sua for- do publicado em 1895 um
mação no seminário. poema num periódico cha-
Ainda na escola em mado Iberia. Pegava livros
Gori, algumas caracte- de uma biblioteca da cida-
rísticas foram destaca- de, que eram proibidos pelo
das na personalidade de seminário e, muitas vezes,
Stálin, entre elas a exce- acabavam confiscados pelos
lente memória e a faci- monges, como certa vez foi
lidade para aprender. No Os Trabalhadores do Mar, de
campo físico, era ágil e Victor Hugo. Stálin lia Hugo
forte e dominava os co- Selo postal húngaro de cerca de e, principalmente, os russos
1950 com a imagem de Stálin Tchekhov, Gogol e Saltikov-
legas nas brincadeiras.
Em compensação, já te- Chtchedrin. Além destes, de
ria demonstrado sua agressi- fundamental importância fo-
ram as leituras sobre biologia darwi-
vidade e desenvolveria ali um
pensamento de questionamen- Em 1894 , Stálin niana, economia e sociologia.
to quanto às diferenças sociais
– já que era o único filho de
ingressou no Seminário Ao que parece, quando Stálin in-
gressou no seminário, aos 15 anos,
camponeses na escola. Foi em Teológico de Tiflis, em outubro de 1894, havia no futu-
Gori também que aprendeu o
idioma russo, ensinado na es-
com a indicação ro ditador russo nada além de uma
semente rebelde, brotada das injus-
cola quase que exclusivamente, de aluno
“melhor ”. tiças sociais vividas por ele e obser-
apesar de em casa Stálin falar
o georgiano. Essa “russificação”
Graças ao diretor da vadas na escola, e um sentimento
patriótico georgiano. Sua discrição
imposta pelo governo causaria escola e a um padre , o em relação a tais ideias quando ain-
diversas confusões na Geórgia,
e mesmo Stálin iria se espe-
rapaz recebeu bolsa da em Gori possibilitaria a ida ao
seminário, e seria ali que entraria
cializar na questão quando no deestudos e em contato com marxistas e com a
partido bolchevique. A ques-
tão das minorias nacionais se-
pôde continuar
doutrina socialista. Contraditoria-
mente, foi num ambiente de for-
ria o tema pelo qual ficaria co- sua formação mação religiosa que Stálin forjaria
nhecido no círculo comunista
no início do século 20. de seminarista sua personalidade política de revo-
lucionário.

STÁLIN | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | 7


Encontro com o
Começo do engajamento político

socialismo
Em 1900, Stálin já fazia parte de grupos marxistas que pregavam contra o
regime do czar. Quatro anos depois, conheceu Lênin, o grande inspirador
revolucionário, e participou da Revolução de 1905, agindo na organização de
populares e em ações de boicote ao governo. Começava a surgir uma figura
de importância para o nascente bolchevismo. A partir dali, Stálin viveria para o
Partido e para a Revolução
Por Lucas Pires

A
estada no seminário, ao contrário do que
desejava a mãe – torná-lo um religio-
so – fez que Stálin conhecesse a doutri-
na marxista. Em 1898, ingressou numa
sociedade clandestina secreta de nome Messame
Dassi, em que seus membros discutiam o socialis-
mo. Os amigos do grupo eram quase todos do pró-
prio seminário, que era um centro de oposição ao
governo czarista.
Por que Stálin acabou aderindo ao socialismo
nessa época? Ele mesmo dá a resposta: “Tornei-me
marxista por causa de minha posição social (meu
pai era operário numa fábrica de sapatos e minha
mãe era uma trabalhadora), mas também (...) por
causa da cruel intolerância e da disciplina jesuítica
que me esmagaram tão impiedosamente no semi-
nário (...). A atmosfera na qual vivia estava satura-
da de ódio contra a opressão czarista”.
Assim, o clima da época, como ele mesmo dis-
se, ajudou-o a entrar para o movimento socialista e
a se dedicar a dar palestras a operários das nascen-
tes indústrias de Tbilissi. Sua atividade socialista
não fora descoberta no seminário, mas o choque
com as autoridades se tornou rotina. Um dos rela-
tórios dos monges afirmava que “Djugachvili é ge-
ralmente grosseiro e desrespeitoso com as pessoas
investidas de autoridade”. Certo é que, em maio
de 1899, sob a alegação de “razões desconhecidas”
que não o deixaram prestar os exames finais, Stá-
lin foi expulso do seminário. O próprio envolvido
mais tarde teria afirmado que o motivo da expul-
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são fora propaganda marxista, mas, na época, os


monges não ousaram relatar tal razão. Karl Marx

8 | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | STÁLIN


SOCIALISMO CLANDESTINO “Se havia um Estado onde se
A oposição ao regime não era novidade em fins do sé-
culo 19, quando Stálin surgiu no cenário político russo. acreditava que a revolução
O regime do czar fazia por merecer o ódio engendra-
do pela população e pelos que acreditavam na revolução
fosse não só desejável como
para derrubá-lo. Um desses grupos, os narodniks, pre- inevitável, era o império dos
gava a rebeldia em forma de atos terroristas contra au-
toridades, como foi o caso do assassinato do czar Ale-
czares. Gigantesco, pesado
xandre II, em 1881. Não enfraqueceu o czarismo, mas e ineficiente, econômica e
deu destaque internacional ao movimento.
Eric Hobsbawm, falando sobre o império russo em
tecnologicamente atrasado,
fins do século 19, em seu A Era dos Impérios (Paz e Ter- com 126 milhões de habitantes
(1897), 80% de camponeses e
ra, 1988) afirmou: “Se havia um Estado onde se acredi-
tava que a revolução fosse não só desejável, como ine-
vitável, era o império dos czares. Gigantesco, pesado 1% de nobreza hereditária,
ele era organizado de uma forma
e ineficiente, econômica e tecnologicamente atrasado,
com 126 milhões de habitantes (1897), 80% de cam-
poneses e 1% de nobreza hereditária, ele era organi- que todos os europeus
zado de uma forma que todos os europeus instruídos
consideravam francamente pré-histórica no fim do sé- instruídos consideravam
culo 19: a autocracia burocrática. (...) Como havia a
consciência quase universal da necessidade de um tipo
francamente
ou outro de mudança, praticamente todos eram obri- pré-histórica no
gados a ser revolucionários. A única indagação era de
que tipo”. No alvorecer do século 20, eram os marxis-
fim do século 19: a
tas que tinham maior número de adeptos e que pare- autocracia burocrática”,
ciam mais próximos de uma vitória contra a autocracia
czarista. Sua base de pensamento estava montada so-
Eric Hobsbawm
bre o proletariado urbano industrial, o verdadeiro pro- no Iskra (Faísca), que se tornou o centro dos revolu-
tagonista da derrubada do sistema capitalista e da im- cionários com a consolidação do Partido no início do
plantação do socialismo. Para tanto, seguiam o ideário novo século, apontara em edição seguinte o fato de que
marxista – era preciso florescer o capitalismo na Rússia “aquele dia marcou o início de um movimento aberta-
para, só assim, vir o socialismo. mente revolucionário no Cáucaso”.
O movimento marxista acabou se unindo em tor- Stálin preparava as manifestações do 1o de Maio
no de um partido, o Partido Operário Social-Demo- daquele ano quando chegou a Tbilissi um enviado de
crata, fundado em 1898. Após ser expulso do seminá- Lênin que muito o impressionou – Victor Kurnato-
rio, Stálin passou a dar aulas particulares e arrumou um vski. Ele seria um dos motivadores de Stálin para in-
emprego no Observatório de Tbilissi, o que o ajudou a gressar no partido em novembro de 1901. Kurnatovski
mascarar suas atividades clandestinas de doutrinador de e outros cabeças do movimento foram presos antes das
operários. Foi trabalhando no observatório que organi- manifestações, e, na ocasião, a polícia descobriu o “dis-
zou seu primeiro grande levante: as comemorações na farce” do observatório. Desmascarado, Stálin fugiu e se
cidade do 1o de Maio de 1900. Conseguiu unir algu- entregou inteiramente para o movimento ilegal e clan-
mas centenas de manifestantes com bandeiras verme- destino. Sua vida a partir dali seria totalmente dedicada
lhas e retratos de Karl Marx fora da cidade, onde fez ao movimento e ao Partido. Seu nome real seria dei-
seu primeiro discurso público. De fato era uma vitória xado de lado, e ele passaria a usar codinomes e passa-
num tempo em que qualquer forma de desobediência portes falsos. Trabalho? Apenas o ligado à Revolução,
era punida severamente. Mais importante ainda, e de- à causa socialista. Como escreveu Deutscher, “a decisão
cisivo para sua vida, foi o ano de 1901. Em março, ele e de tomar esse caminho era um voto de pobreza infor-
alguns “camaradas” organizaram uma greve de ferroviá- mal, que, num certo sentido, concluía o noviciado no
rios com manifestação no centro da cidade, numa pro- socialismo. O ex-seminarista tornava-se membro da-
vocação direta à Okhrana, a polícia política do czar, quela ordem ateísta de cavaleiros andantes e peregrinos
que respondeu com violência, deixando como saldo da revolução para quem a vida, fora da sua missão, ofe-
do evento 14 feridos e 15 presos. O jornal clandesti- recia pouco ou nenhum interesse ou atrativo”.

STÁLIN | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | 9


Uma das conclusões de Stálin
marxismo na Rússia. A rigor, estava exilado desde sua
prisão, em 1898, numa das reuniões prévias da funda-
no artigo e em seus métodos era ção do Partido. Lênin seria o grande herói e inspirador
de que o regime czarista, com
de Stálin.
Os dois tiveram papéis díspares nos anos que an-
a política de sempre levantar tecederam à Revolução de 1905. Stálin passou um
o chicote indistintamente
ano e meio preso no Cáucaso até ser deportado para
uma prisão na Sibéria. Isaac Deutscher lembra que a
para manifestantes e prisão do regime czarista era uma “mistura de bru-

curiosos nas ruas, estaria apenas


talidade e ineficiência liberal”: brutalidade suficien-
te para confirmar o ódio dos prisioneiros ao regime e
aumentando a fileira de ineficiência para não evitar a continuidade dos estu-
dos e dos trabalhos revolucionários de dentro da pri-
revolucionários e que não são. Ou seja, a prisão servia quase como uma univer-
seriam necessários mais que sidade, onde os presos obtinham uma melhor forma-
ção revolucionária e mantinham contato com grandes
três anos para o “espectro” nomes do movimento.
surgir. Foi uma profecia Enquanto isso, Lênin participava do Congresso dos
Sociais-democratas Russos em julho de 1903. Previs-
certeira, pois em 1905 explodia to para acontecer em Bruxelas, acabou transferido para
a Revolução na Rússia Londres porque a polícia descobrira o evento. A reu-
nião do congresso marcaria a divisão do partido russo
Uma das primeiras ações de Stálin após o 1o de em duas facções – a dos bolcheviques e a dos menche-
Maio de 1901 foi montar uma gráfica clandestina e viques. O desacordo começou quando Lênin propôs o
editar o jornal Brdzola (A Luta), que saiu em setem- parágrafo primeiro do estatuto partidário para a de-
bro. No segundo número, lançado em dezembro, um finição de quem poderia ser considerado membro do
ensaio não-assinado de Stálin trazia considerações so- Partido. A exigência dele era de que só seria do partido
bre a Rússia e o cenário de descontentamento, propício quem atuasse pessoalmente ou fosse de alguma or-
à Revolução. Uma das conclusões no artigo e em seus ganização ligada ao Partido. A outra proposta, feita
métodos era de que o regime czarista, com a política de por Martov, abria espaço para simpatizantes e colabo-
sempre levantar o chicote indistintamente para mani- radores fortuitos. Segundo Daniel Aarão Reis Filho,
festantes e curiosos nas ruas, estaria apenas aumentan- em As Revoluções Russas e o Socialismo Soviético (Edito-
do a fileira de revolucionários e que não seriam neces- ra Unesp, 2003), para Lênin “só poderia ser considera-
sários mais que três anos para o “espectro” surgir. Foi do filiado, com direito de voto, os militantes que par-
uma profecia certeira, pois em 1905 explodia a Revo- ticipassem regularmente de organizações do Partido.
lução na Rússia. Lênin propunha uma organização de profissionais, to-
talmente devotada à ação política, capaz de resistir ao
PRIMEIRA PRISÃO E O NASCIMENTO rigor repressivo da polícia política czarista, disponível,
DOS BOLCHEVIQUES sem restrições, para as tarefas revolucionárias”.
O trabalho de Stálin e o perigo que corria em Tbilis- A proposta de Martov venceu por 28 votos a 23,
si fizeram que ele fosse enviado a Batum, região de in- mas, ao fim do congresso, quando da votação para a
dústria petrolífera, para organizar o movimento grevis- eleição dos dirigentes do partido do jornal Iskra, oito
ta. Foi em Batum que passou a usar o codinome Koba, votantes de Martov haviam abandonado o plenário, e
que significava “o indomável”, no lugar de Djugachvili. o placar da votação foi favorável aos partidários de Lê-
Elegeu o comitê social-democrata da cidade, montou nin. Este apelou para o caráter legal da votação, exigin-
uma gráfica clandestina e escreveu panfletos destina- do sua vitória, mesmo sendo questionado pela minoria
dos aos trabalhadores das indústrias do petróleo, até ser derrotada. Daí nasceu a origem dos nomes – bolchevi-
preso em abril de 1902. que vem de “maioria” (bol’chinstvo), e menchevique é
Ao mesmo tempo em que Stálin entrava de cabeça oriundo de “minoria” (men’chinstvo). Ao final, a fac-
no movimento, crescia na Rússia a fama de um orador e ção de Lênin saiu de fato vitoriosa e com o comando,
teórico marxista que viria a ser o grande herói da revolu- não sem sofrer boicotes da minoria, o que fazia nascer
ção – Wladimir Lênin. Seu nome já era conhecido pela o movimento com uma cisão que se mostraria irredu-
Europa Ocidental, de onde escrevia artigos a respeito do tível.

10 | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | STÁLIN


Enquanto isso, na Sibéria desde novembro de 1903, Pelo calendário russo, era 9 de janeiro quando uma
Stálin-Koba programava sua fuga, que foi concretizada manifestação de populares – cerca de 200 mil pessoas –
em janeiro de 1904, com a desordem causada pela guer- rumou para o Palácio de Inverno a fim de fazer um pe-
ra russo-japonesa. Um mês depois, viajando em carroças dido ao czar. Não havia armas nem queixas verbais ao
e passando muito frio, Stálin chegou a Tbilissi, onde to- governante ou ao regime. Pelo contrário, carregavam
mou conhecimento da cisão do Partido, e logo se afinou cartazes com ícones religiosos e retratos do czar, e can-
com o ideário bolchevique. Trótski afirma em sua bio- tavam hinos de louvor ao chefe da nação. Apesar disso,
grafia da Revolução que Stálin foi menchevique antes de Nicolau II saiu de São Petersburgo na véspera da pas-
ser bolchevique, mas nada na postura dele, e mesmo em seata, deixando para a ocasião a polícia cossaca. Aquele
sua devoção a Lênin, indica isso. As duas facções digla- seria chamado de “Domingo Sangrento”, pois a polícia,
diavam-se entre si quando, em janeiro de 1905, explodiu não obtendo sucesso na dispersão da massa, passou a
a revolução popular que inflaria todo o país. Nos dize- atirar sem dó nos manifestantes. Os tiros dos cossacos
res de Trotski, já na época conhecido do Partido e alia- foram a “ponta de lança” de uma revolução que, a partir
do dos mencheviques, a Revolução de 1905 foi o “ensaio dali, se espalharia por toda a Rússia por meio de greves,
geral para a Revolução de 1917”. revoltas e ações de boicote.
As consequências negativas da guerra contra o Ja-
O ENSAIO DA REVOLUÇÃO pão desde o ano anterior marcaram um dos pontos al-
Conforme escreveram Dorothy e Thomas Hoobler em tos de insatisfação da população. Seus efeitos seriam
Grandes Líderes – Stálin (Nova Cultural, 1985), “foi a como fermento para a Revolução, tanto que, em setem-
primeira confrontação séria entre o poder czarista e o bro de 1905, o governo russo firmou um acordo de paz,
descontentamento popular provocado pelos salários e a fim de fazer voltar ao país as tropas ocupadas com a
pelas condições de trabalho nas indústrias em expan- guerra para combater os revolucionários.
são, pelo peso crescente dos impostos, pela evolução da No final de outubro, a economia russa parou. En-
guerra com o Japão e pela falta de direitos civis e meios tre os revolucionários, no mesmo outubro, foi criado o
de expressão e ação política”. Soviete de São Petersburgo, um conselho de depu-
tados operários liderado por Leon Trotski. Queriam
participação política e incitavam a população a não
Lênin e Stálin em 1922 pagar impostos. Seu poder, por um breve período –
até a prisão de seus principais membros em novem-
bro e dezembro –, rivalizou com a administração ofi-
cial. O governo do czar, diante da situação calami-
tosa, passou a querer negociar. Era ceder para não
cair. Assim, em 30 de outubro, no que se chamou de
“Manifesto de Outubro”, a Rússia era convertida em
uma monarquia constitucional, em que a liberdade
de expressão e as organizações partidárias e sindi-
cais eram adotadas, e foi convocada uma assembleia
representativa, a Duma.
O Soviete de Moscou, em dezembro, rebelou-se
e foi sumariamente liquidado numa repressão que
deixou mais de mil mortos. A partir desse momento,
a Revolução começou a perder força na mesma me-
dida em que o regime se fortalecia baseado na for-
ça repressora. Era hora de unir forças para resolver
o que deveria ser feito. Assim foi que, em abril de
1906, o IV Congresso do Partido teve lugar na Fin-
lândia, território sob domínio do império russo. Ali
se encontrariam todos os principais líderes da Re-
volução e do partido. Ali também nasceria a briga e
a birra entre Trótski e Stálin, que culminaria no as-
sassinato do primeiro em 1940 a mando do segundo.
Seria nessa ocasião também que Stálin conheceria
pessoalmente seu líder e mentor, Wladimir Lênin.
AFP

STÁLIN | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | 11


De 1905 a 1917

A gestação da grande
Revolução
A derrota na Revolução de conseguiu fugir e chegar a tempo de participar do con-
gresso e deixar clara sua opinião contrária, assim como
1905 abriu um período de se posicionou toda a facção menchevique, a ataques de
contrarrevolução que só seria brigadas de combate com o objetivo de expropriar ban-
cos, transportes de tesouros e tropas. O que Trótski não
invertido com a explosão da queria, e o congresso ratificou, era que os socialistas fi-
Primeira Guerra Mundial. Com ela, zessem uso da violência (roubos, extorsão etc.) para an-
gariar produtos e dinheiro para a Revolução. O tema já
o czarismo assinou seu atestado de tinha sido debatido no congresso de abril de 1906, mas
óbito e possibilitou a ascensão dos as resoluções tomadas na ocasião não foram definitivas
– ficaram permitidos apenas ataques para tomar armas
revolucionários. Enquanto as coisas e munição.
se precipitavam, Stálin passava os Com a intervenção de Trotski, mesmo os bolchevi-
ques se mostraram contra a insurreição armada, isolan-
dez anos entre as duas revoluções do Stálin e Lênin, que eram favoráveis e se abstiveram
preso ou fugindo da prisão de falar e votar. Muitos biógrafos colocam que, nesse
momento, vendo a estrela de Trótski brilhar, bateram
em Stálin a inveja e o ressentimento, sentimentos que
ele carregaria consigo até o fim da vida.
Por Lucas Pires Os ânimos revolucionários do povo arrefeceram ao

A
mesmo tempo que a força do regime cresceu. Greves
expectativa do encontro de Stálin com Lê- foram se tornando mais raras com o passar dos anos,
nin foi daquelas entre fã e ídolo, mas o even- assim como aumentava o ceticismo dos envolvidos. A
to efetivo marcou Stálin por outro fator: o de Revolução entrou num período de perda de vitalida-
ver Lênin como um ser humano normal. Es- de que só seria modificado por algo maior que abalas-
creveu Stálin sobre o líder bolchevique: “Esperava en- se as estruturas do regime. Em 1907, Lênin profetizou
contrar uma águia-real de nosso partido, um grande esse abalo: “Começou uma era de contrarrevolução; e
homem, não apenas do ponto de vista político, como vai durar uns 20 anos, a não ser que o czarismo nes-
também do ponto de vista físico. Porque, para mim, Lê- se meio-tempo seja abalado por uma grande guerra”. A
nin era um gigante, cheio de autoridade e força. E qual Primeira Guerra Mundial veio dar aos revolucionários
não foi o meu desapontamento ao ver aquele homen- todas as armas para a derrubada do czarismo, mas, antes
zinho comum, de altura média, absolutamente igual a disso, é preciso conhecer o papel de Stálin e suas ações
qualquer um de nós... Literalmente idêntico...”. no período entrerrevoluções.
Em maio de 1907, houve novo encontro do Parti-
do, dessa vez em Londres, que serviu para Stálin co- ENTRE PRISÕES E FUGAS
nhecer Trotski. Ali nascia uma rivalidade que marcaria Em 1903, Stálin se casou com uma jovem georgia-
a história da Revolução Russa. Preso em novembro de na, Ekaterina Svanidze, de quem parece, pelos relatos,
1905 e condenado à prisão perpétua na Sibéria, Trótski ter gostado e amado muito. Um amigo do casal falou

12 | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | STÁLIN


a respeito da relação deles: “Stálin não era capaz de se

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sentir igual a nenhum outro ser humano. Os dois tive-
ram um casamento feliz porque Ekaterina via o mari-
do como um semideus e porque, sendo georgiana, havia
sido criada na sacrossanta tradição de que as mulheres
nascem para servir”.
Apesar disso, e sabendo que para a época e a re-
gião um tipo de relação como a descrita era absoluta-
mente normal, o casamento durou apenas quatro anos
– Ekaterina morreu em 1907, deixando-lhe um filho,
que seria criado pelos avós no Cáucaso. À beira do cai-
xão para o enterro, Stálin teria dito: “Ela era a única
criatura que conseguia entender meu coração... Com
ela morre uma parte importante de minha vida. Está
tudo vazio aqui, tudo absolutamente vazio... É impos-
sível dizer o quanto”.
Depois de perder a esposa, Stálin mudou-se para
Baku a fim de agitar os operários da indústria de petró-
leo. Sua ação na cidade não durou mais de nove meses,
mas rendeu uma greve geral. Seus ativistas foram elo-
giados por Lênin como sendo “nossos últimos ativistas
capazes de organizar uma greve de massas com objeti-
vos políticos”. O resultado do evento foi a prisão de Ko-
ba-Stálin. Condenado a dez anos de exílio, em junho de
1909 ele fugiria e retornaria para Baku.
Em 1910 voltaria ser preso e enviado para a Sibé-
ria, fugindo novamente em fevereiro de 1912. Nes-
se mesmo ano foi eleito membro do comitê central
com a ajuda de Lênin e se empenhou em lançar o jor-
nal Pravda, cuja primeira edição saiu com editorial a fim de escrever o referido ensaio “encomendado” por
dele. O ano de 1912 seria marcado também pela po- Lênin. O resultado foi um dos textos mais bem-escri-
sição de total ruptura de Lênin com os mencheviques tos e originais de Stálin, e o primeiro a ser assinado
e pela aproximação com o grupo bolchevique radical por ele com o pseudônimo pelo qual ficaria marcado
do Cáucaso, do qual Stálin fazia parte. Em janeiro de na história mundial. De Koba passava a ser K. Stálin,
1913, Lênin enviou Stálin para Viena a fim de escre- que significa “o homem de aço”. O Marxismo e a Ques-
ver um ensaio sobre a questão das minorias nacionais tão Nacional seria aprovado por Lênin e publicado na
na Rússia e o socialismo. revista de sociologia do partido, a Prosvechtchenie (Ilus-
Antes disso, Stálin entrou em conflito aberto com tração). No artigo, seu autor defendia a unidade dos
Trótski quando este passou a atacar Lênin pela ruptu- povos de diferentes nacionalidades sob a orientação de
ra com os mencheviques. Trótski era um menchevique um só partido. Ou seja, o socialismo marxista estaria
e escreveu artigo defendendo a unidade partidária e, ao acima das nacionalidades.
mesmo tempo, atacando Lênin e o encontro em Praga Ao voltar para São Petersburgo, Stálin acabaria pre-
em que foi ratificada a cisão. Este encontro seria con- so, delatado por Malinovski, colega do comitê central e
siderado por ele uma “fraude e usurpação”. A resposta deputado bolchevique no Duma. Na verdade, ele era um
veio por intermédio de Stálin no Pravda de Petersbur- infiltrado da Okhrana. Dessa vez, não teve escapatória.
go, no qual o futuro ditador zombou da tentativa que O Homem de Aço foi condenado ao exílio e enviado
considerava hipócrita de Trótski pela unidade, e o cha- para a Sibéria, onde permaneceu até o alvorecer da Re-
mou de “campeão de musculatura frouxa”. Sobre o epi- volução, em fevereiro de 1917. Seria dali, sob o frio da
sódio, Deutscher escreveu: “Com toda a vulgaridade da região, ao lado de companheiros políticos, lendo e pes-
expressão, o autor dela claramente apreendia a fraqueza cando, que ele veria explodir a Primeira Guerra Mundial
de Trótski – a incapacidade para o jogo e a manobra tá- em 1914. Com a implantação da lei marcial, a ideia da
tica, em que Stálin se mostraria mestre consumado”. fuga acabou abandonada, pois, caso fosse preso, seu des-
Em seguida, o futuro líder russo viajou para Viena tino seria o fuzilamento.

STÁLIN | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | 13


A GUERRA E O FIM DO CZARISMO fiança ao assunto e se mantido sem opinar, sem se po-
Hobsbawm é um dos historiadores a reforçar o caráter sicionar, esperando que as coisas se precipitassem e, as-
contraditório da Rússia imperial pré-revolução. Segun- sim, pudesse apoiar o lado do vencedor.
do ele, “a Rússia era tanto um país industrial importan- É difícil crer que o Homem de Aço não tenha des-
te como uma economia camponesa tecnologicamente de o início apoiado o derrotismo revolucionário leni-
medieval; uma nação imperial e uma semicolônia. (...) nista. Ele fazia parte do grupo mais radical bolchevi-
O único elemento que faltava para fazê-la explodir em que e acreditava na Revolução acima de tudo. Dessa
erupções simultâneas era a guerra mundial, que a Euro- forma, qualquer oportunidade para abreviar o czarismo
pa cada vez mais esperava e que foi incapaz de evitar”. e implantar a Revolução seria bem-vinda.
A guerra explodiu, e a Europa se viu dividida em É bom ressaltar que a ideia de Revolução de Lênin
dois blocos. A Rússia entrou ao lado da França e da e dos bolcheviques não era a tomada do poder do pro-
Sérvia, contra a Alemanha e a Áustria (Império Aus- letariado para a implantação do socialismo. Seguiam à
tro-húngaro). No início, contra os austríacos, o exército risca o ideário marxista de que o socialismo só poderia
russo obteve vitórias que ajudaram a inflar o naciona- ser adotado após o desabrochar da burguesia e do capi-
lismo do povo. Mas, quando passou a guerrear contras talismo. Na Rússia de então, o que se buscava era der-
as tropas alemãs, as coisas foram vistas pela sua reali- rubar a autocracia czarista e implantar um regime libe-
dade: derrotas que deixavam clara a diferença de capa- ral que pudesse, aí sim, levar ao socialismo e à ditadura
cidade de guerra entre os dois países, o mesmo atraso do proletariado. A Revolução na Rússia deveria servir
detectado na guerra contra o Japão em 1904-1905. “Na de estopim para “acordar” os operários europeus, es-
guerra regular entre a metralhadora e a baioneta, a lo- tes, sim, vivendo na etapa prévia ao socialismo. O pró-
comotiva e o cavalo, o canhão e o fuzil, tendeu a pre- prio Lênin, poucos dias antes da queda do czar, ques-
dominar o melhor equipamento”, escreveu Daniel Aa- tionava-se se viveria para ver o socialismo na Rússia.
rão Filho. Em seguida, o autor detalha o problema do Eric Hobsbawm, em Era dos Extremos (Cia das Letras,
exército russo: “A Rússia tinha soldados de valor, mas 2000), aponta esse caráter global da Revolução de Ou-
faltavam-lhes armas modernas, munições, transportes, tubro de 1917. “Foi feita não para proporcionar liber-
oficialidade sintonizada com as exigências da guerra dade e socialismo à Rússia, mas para trazer a revolução
moderna, apoiada na grande indústria”. do proletariado mundial. Na mente de Lênin e de seus
Assim, a situação do regime do czar tornou-se ex- camaradas, a vitória bolchevique na Rússia era basica-
tremamente delicada, piorando com o posicionamen- mente uma batalha na campanha para alcançar a vitó-
to contrário à guerra e ao próprio regime por parte dos ria do bolchevismo numa escala global mais ampla”.
bolcheviques. Além disso, o caos econômico adveio, Foi dentro desse cenário de incertezas, de caos po-
com inflação alta e escassez de produtos alimentícios. lítico e econômico, que, em 2 de março de 1917 (o ca-
Lênin, na Suíça, recebeu a notícia da guerra com fer- lendário russo vigente era o juliano e não o gregoria-
vor. “Este é o melhor presente que o czar poderia nos no, o que dava uma defasagem de 13 dias em relação
dar”, teria dito. Em seguida, entrou em depressão ao ver ao Ocidente; assim, tais eventos, inclusive a abdicação
que os deputados socialistas alemães apoiavam a guer- do czar, ocorreram na Rússia em fevereiro – daí esses
ra. Então, passou a agir contra a guerra e em favor da acontecimentos serem chamados de “Revolução de Fe-
Revolução. Lançou o slogan de “Transformar a guerra vereiro”), depois de uma greve geral que parou o país
imperialista em guerra civil” e se declarou um “derro- por quatro dias, o czar abdicou. “Quatro dias espontâ-
tista revolucionário”. Tal postura, que seria adotada pe- neos e sem liderança na rua puseram fim a um Impé-
los bolcheviques, seria tratada como traição pelo czar, e rio”, escreveu Hobsbawm. A fragilidade do regime fi-
a resposta veio em forma de prisão dos deputados so- cava aí evidente.
cialistas que se declaravam contra a guerra.
Trotski, de Paris, também se posicionou contra a Em 1907, Lênin profetizou:
guerra, pregando “nem vitória nem derrota, mas Revo- “Começou uma era de
lução”. Enquanto isso, Stálin continuava preso. Histo-
riadores divergem quanto ao papel dele nesse período. contrarrevolução; e vai
Alguns dizem que, com as novas prisões, ele teria con-
vivido com diversos novos companheiros que o atuali-
durar uns 20 anos, a não ser
zaram quanto à situação da guerra e à posição “derro- que o czarismo nesse
tista” de Lênin. Outros dizem que Stálin teria defendi-
do ardorosamente o ideal leninista e ficado a seu lado.
meio-tempo seja abalado
E existem os que afirmam que ele não teria dado con- por uma grande guerra”

14 | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | STÁLIN


AFP

Leon Trótski

O Marxismo e a Questão Nacional seria aprovado


por Lênin e publicado na revista de sociologia do
Partido, a Prosvechtchenie (Ilustração). No
artigo, Stálin defendia a unidade dos povos de
diferentes nacionalidades sob a orientação
de um só partido. Ou seja, o socialismo marxista
estaria acima das nacionalidades
STÁLIN | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | 15
Revolução de 1917

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C
om a abdicação do czar, um governo pro- suicida e gerou descontentamento geral. Marinheiros
visório passou a controlar o país. Mas, de da base de Kronstadt rebelaram-se e marcharam para
fato, ele não conseguia fazer valer sua von- a capital. O governo renunciou, mas em pouco tempo
tade sem que tivesse o apoio do Soviete de estava recomposto, só que os sovietes ocupavam maior
Petersburgo, o Conselho dos Deputados Operários e espaço em sua composição. Em compensação, a reação
Soldados. Enquanto isso, o novo governo dava anis- aos bolcheviques foi violenta – prenderam diversos de
tia geral a presos para juntar homens para a guerra. seus líderes, inclusive o recém-convertido Trótski – e
Stálin foi convocado, mas seu problema no braço não o VI Congresso do Partido, em fins de julho, acabou
permitiu que fosse enviado. Em março, quando voltou acontecendo na clandestinidade. Lênin teve de fugir
a Petersburgo, reassumiu seu cargo de editor do Pravda para a Finlândia, mas, antes, se escondeu na casa de um
e, por quase um mês – até a chegada de Lênin da Suíça velho amigo de Stálin, Sergo Alliluiev, que viria a ser
–, dirigiu o Partido. sogro do Homem de Aço no ano seguinte. O futuro
A partir de abril, quando do encontro bolchevi- ditador, que não gozava de popularidade e era pratica-
que em Petersburgo, ficou evidente o descompasso do mente um anônimo do Partido, ficou novamente com
grupo com o governo provisório. A chegada de Lênin o papel de dirigente dos bolcheviques com a ausência
trouxe o slogan que marcaria a luta revolucionária até de Lênin em Petrogrado.
outubro – “Todo o Poder aos Sovietes!”. Como já dito,
a ideia bolchevique não era implantar o socialismo e a A DECISÃO POR UMA
ditadura do proletariado na Rússia, mas fazer uma re- NOVA INSURREIÇÃO
volução democrático-burguesa que instigasse a Euro- A ideia de uma nova revolução, embora no ar, não
pa à revolução socialista. Os bolcheviques viam a Re- era aspirada diretamente por Lênin, pois os bolche-
volução na Rússia como uma faísca para a revolução viques não eram maioria nos sovietes, e sua pregação
mundial socialista. Daí as desavenças com os menche- era exatamente a favor do poder aos sovietes. Mas, aos
viques de Kerenski, que assumiram o governo provisó- poucos, a situação convergiria a seu favor, com mas-
rio, quando estes passaram a não levar o programa re- sas de operários sendo convertidas ao bolchevismo e os
volucionário desejado adiante. apoiando cada vez mais. Em setembro, deu-se o even-
A posição dos bolcheviques bateu de frente com o to que seria fatal ao governo provisório: o comandante
governo quando se pronunciaram novamente a favor supremo das Forças Armadas da Rússia, Kornilov, pre-
de um cessar-fogo e da saída do país da guerra. O go- parou um golpe para depor o governo e instalar-se no
verno respondeu com a organização e o ataque con- poder. Informados de que Kornilov estava a caminho
tra a Alemanha em junho, empreitada que se mostrou de Petrogado, os homens do governo mandaram soltar

Todo o poder aos


bolcheviques!
A Revolução de Fevereiro derrubou o czar, mas manteve o poder nas mãos
de revolucionários considerados conservadores. As coisas se precipitavam
com a Rússia cada vez mais pobre e derrotada na guerra quando, em
outubro, uma nova revolução levou o poder aos bolcheviques. Começava ali
a luta para se manter no governo e a implantação de um regime socialista
Por Lucas Pires

STÁLIN | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | 17


Stálin, como fora sua característica até aquele mo-
mento, trabalhava nos bastidores. Ao lado de Lênin e
Trotski, arquitetou a Revolução de Outubro (novem-
bro pelo calendário ocidental). Com o primeiro ain-
da no exterior, ficou a cargo de Stálin a ligação entre
Na noite de 24 de outubro, seu líder e o Partido, enquanto Trótski militava no
quando o governo ocupou as
Soviete de Petersburgo. Em 15 de setembro, Stálin
recebeu duas cartas de Lênin que foram apresenta-
instalações da gráfica do partido das ao Comitê Central. Elas continham as seguintes
bolchevique, uma delegação
orientações: “Os bolcheviques devem tomar o poder”
e “Marxismo e insurreição”.
de tipógrafos solicitou A ideia de insurreição de Lênin rapidamente passou
a ser discutida pelo Partido. Adeptos e opositores come-
ao Comitê Militar Revolucionário çaram a dialogar a fim de chegar a um consenso. Trótski
que enviasse tropas concordou com a insurreição, mas achava que ela deveria
ser mais bem planejada em termos políticos e militares, e
para garantir o que estivesse associada aos sovietes. Após a tentativa de
funcionamento do local. golpe de Kornilov, os sovietes montaram o Comitê Mi-
litar Revolucionário, que passou a ser o defensor legal da
Dali partiu o levante. A briga capital. O comitê era presidido pelo próprio presidente
teve início na gráfica e, do soviete, no caso, Trotski. Com isso, os bolcheviques
camuflavam a insurreição como algo legal.
rapidamente, tomou “Trótski – todos os fios da insurreição estavam em-
estações, ferrovias e pontos suas mãos – conseguiu dar ao levante a aparência de uma
operação defensiva destinada a prevenir ou, antes, a rea-
estratégicos da cidade. gir à contrarrevolução, expediente tático que trou-
As tropas comandadas por
xe os setores hesitantes da classe operária e das tropas
para o lado dos insurretos”, escreveu Deutscher em sua
Trótski tomaram a capital biografia sobre Stálin, que não deixa de enxergar em
sem dar um tiro sequer Trótski o grande herói da Revolução e Stálin como um
aproveitador. Essa é uma discussão que traremos mais
adiante, quando da briga aberta entre ambos.
Lênin retornou clandestinamente para a Rússia no
dia 8 de outubro. Sua presença servia para tentar de
uma vez jogar os bolcheviques na insurreição. No dia
Trótski e armaram os sovietes para a defesa da cidade. 10, em reunião do comitê central, Kamenev e Zino-
O que estava em jogo era a própria Revolução, pois o gol- viev, altos membros do partido, discursaram contra a
pe de Kornilov era o início do movimento contrarrevolu- insurreição: “Diante da história, diante do proletaria-
cionário – contra o governo e contra os bolcheviques. Em do internacional, diante da Revolução Russa e da clas-
compensação, essa oposição serviu para unir marxistas re- se operária russa, não temos o direito de arriscar todo o
volucionários e bolcheviques – enfim, toda a facção socia- futuro, todas as fichas no levante armado. Existem situ-
lista, o que se mostrou mortal ao governo, pois, nas elei- ações históricas nas quais a classe oprimida deve reco-
ções de setembro, aos sovietes, depois de abortado o golpe, nhecer que é melhor seguir até a derrota do que desistir
os bolcheviques emergiram com ampla maioria. Assim, o da luta. Será que a classe operária russa se encontra no
slogan “Todo o Poder aos Sovietes” deveria ser lido como momento em tal situação? Não, mil vez não!!!”.
“Todo o Poder aos Bolcheviques”. Eram Kamenev e Zinoviev que os bolcheviques
Lênin apelou aos mencheviques de Kerenski que pró-insurreição tinham de combater, pois eles apoia-
passassem o poder aos sovietes e que, caso aceitassem, ram a participação do partido numa conferência que
os bolcheviques fariam oposição legal e constitucional. definiria o que Kerenski chamou de “Pré-parlamen-
Lênin abrira a brecha para um governo realmente re- to”. Na dita reunião, Trótski juntou seus partidários
volucionário dentro da legalidade, mas sua proposta foi e todos abandonaram o recinto aos brados de “Pe-
recusada. Estava selada a decisão de uma insurreição. tersburgo corre perigo! A Revolução corre perigo! O
Era, a partir daquele momento, preparar a Revolução. povo corre perigo!”.

18 | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | STÁLIN


A historiografia passou a estudar qual a natureza desse evento
de outubro na Rússia: golpe ou revolução? Alguns contrários
aos bolcheviques afirmam ter sido um golpe de Estado. Já os
“de esquerda” e a historiografia que prevaleceu consideram
a insurreição como de fato uma revolução
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STÁLIN | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | 19


No encontro do comitê, foi votado o caso, saindo zê-lo. Na verdade, a ordem tinha vindo do comitê
vitoriosa a facção pró-revolucionária. A rigor, dos 12 central do partido bolchevique”, escreveu ele.
votantes, apenas Kamenev e Zinoviev foram contrá- Ao mesmo tempo, lembra o autor, a insurreição
rios. Na mesma ocasião, foi eleito um politburo para foi submetida ao congresso dos sovietes no dia se-
a direção futura imediata após a insurreição. Entre guinte e foi aprovada por larga maioria. Na verda-
os sete membros do politburo constavam Lênin, Stá- de, Daniel Aarão enxerga nos eventos de outubro
lin, Trotski, Kamenev e Zinoviev. Mesmo assim, os de 1917 resquícios de golpe e de revolução. Escre-
dois últimos ficaram contra a posição de Lênin, que ve ele: “Golpe na urdidura, decisão e realização da
os acusou de “fura-greve” e “traidores da Revolução” insurreição, um funesto precedente. A política dos
e pediu ao comitê a expulsão de ambos do partido. fatos consumados, empreendida por uma vanguarda
Kamenev decidiu, então, renunciar à sua liderança, que se arroga o direito de agir em nome das maio-
sendo defendido por Stálin. Quando a renúncia foi rias. Revolução nos decretos, aprovados pelos sovie-
aceita, o futuro ditador resolveu também sair. Mas tes, reconhecendo e consagrando juridicamente as
sua renúncia não foi aceita pelo comitê. aspirações dos movimentos sociais, que passaram a
Enquanto bolcheviques se preparavam para o le- ver imediatamente no novo governo o intérprete e a
vante, o governo tentava manter sua parca autori- garantia das reivindicações populares”.
dade, mas a Rússia já não mais era comandada pelo Mas, retomando o pensamento de Hobsbawm em
Governo Provisório. Tanto que, na noite de 24 de Era dos Extremos, a questão que mais importava na
outubro, quando o governo ocupou as instalações da época era outra: qual grupo político, diante do caos
gráfica do partido bolchevique, uma delegação de ti- em que vivia a Rússia, conseguiria chegar ao poder
pógrafos solicitou ao Comitê Militar Revolucioná- e, mais importante, permanecer no poder? O pró-
rio que enviasse tropas para garantir o funcionamen- prio historiador britânico responde: “Nenhum ou-
to do local. Dali partiu o levante. A briga teve início tro partido, além dos bolcheviques de Lênin, estava
na gráfica e, rapidamente, tomou estações, ferrovias preparado para enfrentar essa responsabilidade sozi-
e pontos estratégicos da cidade. nho – e o panfleto de Lênin sugere que nem todos os
As tropas comandadas por Trótski tomaram a ca- bolcheviques estavam tão determinados quanto ele”.
pital sem dar um tiro sequer. Hobsbawm lembra que Onde estava Stálin?
“mais que tomado, o poder foi colhido”, já que, diz- Dentro do contexto da Revolução de Outubro,
se, mais gente se feriu nas filmagens de Outubro, fil- qual o papel desempenhado por Stálin? Eis a opi-
me de Eisenstein realizado em 1927 sobre a tomada nião de Trotski: “Não que fosse covarde. Não há base
do Palácio de Inverno, do que na tomada de fato do para acusar Stálin de covardia. Ele simplesmente não
palácio em 1917. Deutscher escreveu: “O Governo estava politicamente comprometido. O conspirador
Provisório estava politicamente tão isolado e os su- cauteloso preferiu ficar neutro no momento crucial.
blevados gozavam de apoio tão esmagador que, com Esperava para ver como é que a insurreição se re-
um leve empurrão, tiraram o governo de cena”. solveria antes de se comprometer com uma posição.
Em caso de fracasso, poderia dizer a Lênin, a mim e
GOLPE OU REVOLUÇÃO? aos nossos partidários: ‘A culpa é toda de vocês!’ De-
A historiografia passou a estudar qual a natureza ve-se reconstruir a atmosfera apaixonada daqueles
desse evento de outubro na Rússia: golpe ou revolu- dias a fim de avaliar devidamente o sangue-frio do
ção? Alguns contrários aos bolcheviques afirmam ter homem ou, se quiserem, seu caráter traiçoeiro”.
sido um golpe de Estado. Já os “de esquerda” e a his- A descrição de Trótski soa um tanto exagerada e
toriografia que prevaleceu consideram a insurreição exala rancor, se pensarmos no que viria em segui-
como de fato uma revolução. da na relação entre ambos: a disputa interna após
Daniel Aarão Reis Filho, em seu livro As Revo- a morte de Lênin e as manobras políticas de Stálin
luções Russas e o Socialismo Soviético, ajuda a clarear para expulsar Trótski e acabar com suas ambições
a questão. “Um golpe? Formalmente, sem dúvida. A de poder na Rússia revolucionária. Não que Trótski
insurreição desdobrou-se como uma operação mili- não tivesse motivo para tanto, mas, certamente, há
tar, sem prévia autorização do governo legal, nem se- em suas palavras traços de exagero, de descrédito de-
quer das organizações soviéticas. A autoridade que a corrente do desprezo que sentia por Stálin quando
desencadeou foi o comitê militar do Soviete de Pe- essas linhas foram escritas. Muitas colocações suas
trogrado, com anuência e sob liderança de seu presi- são infundadas – como veremos mais adiante, quan-
dente, Trotski. Não haviam recebido delegação, nem do Trótski levantou levianamente a suspeita de Stá-
autorização de nenhuma instância soviética para fa- lin ter envenenado Lênin. Ao mesmo tempo, é fato

20 | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | STÁLIN


que o futuro ditador não teve papel de destaque na racterística mais marcante: a habilidade de traba-
Revolução, não saiu às ruas e nem pegou em armas. lhar nos bastidores, de não chamar a atenção. Se-
Tanto que, ao final da Revolução e mesmo depois da ria devido a essa característica que, após a morte
guerra civil, as duas figuras mais populares entre os de Lênin, os líderes que disputavam o poder não
russos e tidas como heróis continuavam sendor Lê- se preocupariam com o camarada Stálin, que mui-
nin e Trotski. tos consideravam inofensivo e intelectualmente
Em compensação, o fato de um indivíduo não limitado. Só que o futuro ditador daria um “nó”
pegar em armas e não “aparecer” aos olhos do povo em todos eles, e começaria a mostrar suas garras e
numa Revolução não é atestado de que nada ou sua ambição sem limites de crueldade já na guerra
pouco tenha feito. Stálin permanecia com sua ca- civil que se seguiu à Revolução de Outubro.

Lênin, o grande herói e inspirador


Depois de Marx, nenhum outro nome ligado ao pensamento
marxista foi tão lembrado e respeitado como o de Wladimir
Lênin. Ele foi um dos pensadores e líderes políticos
revolucionários mais importantes do século 20. Isso porque
planejou a tomada do poder pelos bolcheviques na Rússia em
1917 e foi o arquiteto do estado socialista que viria a nascer
com a União Soviética. Querendo ou não, a Revolução Russa
foi dos acontecimentos mais marcantes do século 20 e criou
um modelo político-econômico que teria seu auge no período
pós-Segunda Guerra, mas se esgotaria no início da década de
1990. Wladimir Ilich Ulyanov – que passou a usar o nome
Wladimir Lenin em 1901 – nasceu em Simbirsk, perto de
Moscou, em 22 de abril de 1870, em uma família nobre.
Orlando Figes, professor de História especializado em Rússia
da Universidade de Londres, acredita que ele adorava seu foi exilado na Sibéria, onde acabou se casando com a russa
modo de vida. “Na sua juventude, era orgulhoso de se poder Nadezhda Krupskaya, que também havia sido condenada
designar como ‘filho de um nobre’. Uma vez se descreveu ao exílio. É importante ressaltar que Krupskaya foi mais
mesmo na polícia como ‘Wladimir Ulyanov, de nobre família’”. que a esposa ideal de Lênin. Afinal, por admirar a força
Mesmo após a morte de seu pai, ele, os irmãos e a mãe revolucionária do marido, ela cuidava dele, mimava-o e
continuaram vivendo confortavelmente dos arrendamentos e ainda fazia os serviços de secretária, organizando seus papéis
das vendas dos terrenos. diariamente. Esse seria um dos motivos da briga com Stálin, às
Lênin foi um excelente aluno e resolveu estudar Direito. vésperas da morte de Lênin.
Na universidade, tomou contato com os pensadores Depois do exílio na Sibéria, Lênin passou anos na Europa,
revolucionários, o que acabou influenciando seu próprio escrevendo e estudando o marxismo, adaptando o ideário
pensamento. Auxiliou em sua guinada revolucionária o fato de marxista a seu pensamento e à Rússia. Em Paris, conheceu
seu irmão Alexandre Ulyanov, com 21 anos, envolver-se com uma linda moça, que, por pouco, não abalou por completo
o grupo terrorista Pervomartovtsi, que empreendeu diversas seu casamento. Tratava-se de Inês Armand, filha de uma atriz
tentativas de assassinar o czar Alexandre III. Ele acabou com um cantor de ópera. Como prova da influência que Lênin
condenado à morte e executado em 1887. causava na época, Inês Armand, ao ler sua obra, tornou-se uma
Por causa de sua postura extremada, Lênin foi expulso da bolchevique.
universidade e teve que terminar a graduação no exterior, em Em 30 de agosto de 1918, Lênin foi vítima de uma tentativa
1891. Então, mudou-se para São Petersburgo e tornou-se um de assassinato, crime que fez parte de diversos atentados contra
“revolucionário por profissão”. Como seus contemporâneos, bolcheviques naquele ano. Foram disparados três tiros pela
militante Fanny Kaplan, que, anos antes, fora encarcerada pelo
regime czarista. Um dos tiros atingiu Lênin no ombro e o outro
no pulmão. Ele não morreu, mas sua saúde ficou fragilizada.
Quatro anos depois, em maio de 1922, sofreu o primeiro
Fotos: Divulgação/ Discovery Networks

derrame, que deixou o lado direito de seu corpo parcialmente


paralisado. Com isso, seu papel no governo começou a diminuir.
Tanto que, em dezembro do mesmo ano, sofreu outro derrame
e deixou suas funções. Três meses depois, ocorreu um terceiro
derrame, que o deixou praticamente sem poder falar. Lênin
morreu em 24 de janeiro de 1924. Por iniciativa de Stálin,
que queria manter vivo o culto a Lênin no país, seu corpo foi
Lênin embalsamado e colocado em um mausoléu em Moscou.

STÁLIN | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | 21


Nascimento da URSS

Em defesa da

revoluc-
AFP

22 | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | STÁLIN


-
Após a isurreição de outubro, seguiu-
se uma guerra civil na Rússia. O novo

ao
governo tinha de lidar com a fome
da população, a contrarrevolução, as
regiões que queriam sua independência
e mesmo ataques de países ocidentais
na Primeira Guerra Mundial. A muito
custo, os bolcheviques venceram, e daí
nasceu o Estado socialista batizado de
"União Soviética"
Por Lucas Pires

O
novo governo bolchevique, formado logo
após a Revolução de Outubro, era com-
posto por lideranças do partido. Lênin, seu
maior líder, tornou-se Presidente do Con-
selho dos Comissários do Povo (o mesmo que primei-
ro-ministro); Trótski foi nomeado Comissário do Povo
para Assuntos Internacionais, e Stálin acabou como
Comissário do Povo para as Nacionalidades. Dos 15
integrantes do governo, apenas quatro eram operários.

SALVAR A REVOLUÇÃO COM A PAZ


Uma das primeiras ações de Lênin foi negociar um acor-
do de paz com a Alemanha. Segundo ele, essa era uma
condição essencial para que a Rússia pudesse começar a
pensar em si e em sua população esfomeada e miserável
em decorrência dos anos de guerra. Assim, enviou Trótski
para negociar uma paz que não fosse tão desfavorável aos
russos. Na Rússia e dentro do partido, a intenção de Lê-
nin foi discutida e muito combatida. Os que eram con-
tra tal resolução afirmavam ser uma traição ao socialismo
internacional fechar um acordo em que a Rússia cedes-
se territórios ao imperialismo alemão. Mas a questão que
Lênin colocava era outra: ceder para salvar a Revolução.
Trótski conduziu as negociações em Brest-Litovsk. In-
tegrantes do partido trabalhavam para uma “guerra re-
volucionária”, que, a contar pela debandada geral de
soldados do front quando da redistribuição de terras
no campo, seria assinar o precoce atestado de óbito da
Revolução. Trótski “criou” a ideia de “nem guerra nem
paz”. Queria ganhar tempo para ver os resultados da
guerra. Aos poucos, Lênin foi convencendo o partido
de que a paz a qualquer preço era a única forma de sal-
Soldados do Exército var a Revolução. Stálin ficou a seu lado e, numa reunião
Vermelho durante o do comitê central, falou sobre as alternativas diante da
período da guerra civil
decisão a ser tomada e criticou Trotski:

STÁLIN | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | 23


“Ao aceitar o slogan da guerra revolucionária, caí- talmente neles, designou comissários políticos ligados
mos nas mãos do imperialismo. A posição de Trótski ao partido para acompanhá-los. Trótski descreveria tal
não é posição alguma. Não há movimento revolucio- formulação como a “construção do socialismo com os
nário no Ocidente, não há nenhum fato de movimento tijolos retirados das ruínas da velha ordem”.
revolucionário, há só potencialidades; e, no nosso tra- Muitas lideranças do partido foram contra, e de
balho, não podemos nos basear só em potencialidades. fato tiveram razão, pois diversos casos de traição e de-
Se os alemães começarem a avançar, isto reforçará a serção foram detectados. Casos como de toda uma di-
contrarrevolução neste país. (...) Em outubro, falamos visão passar para o lado dos “brancos”. Mas a verdade
de guerra santa contra o imperialismo porque nos dis- era que o governo revolucionário não tinha outra alter-
seram que a palavra ‘paz’ apenas faria surgir a Revolu- nativa. Era correr o risco ou se entregar.
ção no Ocidente. Não foi o que aconteceu”. O auge da guerra civil aconteceu com o desembar-
Quando assinado o acordo, Lênin não escondeu seu que de tropas ocidentais em diversos pontos da Rús-
“caráter vergonhoso”, mas sabia que aquela seria a úni- sia. Americanos na Sibéria; ingleses pelo norte e pelo
ca solução viável para a Rússia. Pelo tratado, o país ce- sul, na região de Baku, onde ficava a indústria do pe-
dia a Polônia e os territórios do Báltico e da Ucrânia tróleo russo; e o conflito com a Alemanha na Ucrânia.
à Alemanha. Em compensação, com a derrota germâ- Fora isso, um ex-general cossaco, Krasnov, liderando
nica e a queda da monarquia naquele mesmo ano de um grande exército, marchava do sul rumo a Moscou.
1918, o exército alemão desocuparia a Ucrânia. A produção de alimentos que abastecia os combatentes
Diante da paz e dos conflitos, os social-revolucio- e a população vinha justamente da Sibéria, da Ucrânia
nários de esquerda, que compunham o governo ao lado e da região de Tsaritsin. Krasnov sabiamente fechou a
dos bolcheviques, romperam e abandonaram o gover- última via de transporte dos alimentos para Moscou,
no. Começava ali o regime de um partido só na Rússia, já transformada na capital por iniciativa de Lênin. Era
que dominaria o país até a queda da União Soviética, uma forma de estrangular o adversário.
no início dos anos de 1990. A ideia inicial bolchevique
não era um governo de um único partido, muito me-
nos a implantação um regime autoritário. Como toda
Revolução, o que movia as emoções e as ações iniciais
Os descontentes com os
eram o bem-estar do povo e a justiça social. Fizeram
a Revolução em nome do povo e para ele, mas, com o
desenrolar dos acontecimentos, as coisas mudaram de bolcheviques deram início
figura e, quando os bolcheviques perceberam, já viviam
num país ditatorial. Stálin foi o indivíduo que, de fato, à contrarrevolução. Social-
deu o passe final para o autoritarismo. Mas tudo come- revolucionários de esquerda,
çou com a guerra civil, que dividiu a Rússia até 1921.
inclusive, partiram para
A CONTRARREVOLUÇÃO
Os descontentes com os bolcheviques deram início à
atentados contra Lênin e
contrarrevolução. Social-revolucionários de esquerda, in- outras lideranças bolcheviques.
clusive, partiram para atentados contra Lênin e outras
lideranças bolcheviques. Aconteceram motins e movi-
Aconteceram motins e
mentos de insurreição, que atingiram o ápice com a or- movimentos de insurreição, que
ganização de uma força contrarrevolucionária – denomi-
nada de “Exército Branco” em oposição ao Vermelho dos
atingiram o ápice com
bolcheviques – que teria apoio das potências ocidentais. a organização de uma força
Depois de assinado o acordo de paz, Trótski perdeu
crédito e acabou deixando seu cargo de Comissário de contrarrevolucionária – denominada
Relações Exteriores. Passou a ser o novo Comissário de "Exército Branco" em
oposição ao Vermelho
de Guerra, posto em que alcançaria o ápice de sua po-
pularidade ao criar o Exército Vermelho, que se des-
tacaria na defesa da Revolução durante a guerra civil. – que teria apoio das
Trótski idealizou o exército com voluntários e campo-
neses convocados. Para as lideranças das divisões, co- potências ocidentais
locou ex-oficiais czaristas. Como não podia confiar to-

24 | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | STÁLIN


Foi nesse momen-
to, de “perigo supremo”,
auge
O da guerra civil aconteceu melhos. A barcaça afundou
“acidentalmente” com todos
nos dizeres de Deuts- desembarque
com o de eles a bordo, ao menos foi a
cher, que “quase todos
os membros do gover- tropas diversos
ocidentais em
versão que se correu na épo-
ca. Mas, posteriormente, em
no deixaram Moscou e Rússia:
pontos da carta a Vorochílov, Stálin
correram para os setores admitiria que não fora aci-
mais vitais das linhas norte-americanos dente. Quando questionado
de frente. No Kremlin,
Lênin, com uns pou-
na Sibéria; ingleses pelo norte e sobre o acontecimento, teria
dito: “A morte resolve todos
cos especialistas, dirigiu no sul , na região de Baku, onde os problemas. Nenhum ho-
toda a luta em contato
permanente com os ho-
ficava a indústria do petróleo mem, nenhum problema”.
A defesa de Tsaritsin sai-
mens de cada setor”. russo; e o conflito com ria vitoriosa apenas em ou-
Assim, Lênin des-
pachou Trótski para
aAlemanha na Ucrânia tubro de 1918, quando Stá-
lin fora reenviado à cidade,
Kazan, a fim de evitar agora com funções milita-
que os contrarrevolucionários pudessem chegar a Mos- res. Mas a discussão sobre os louros dessa vitória, cujos
cou; e Stálin, para Tsaritsin, para organizar o transporte créditos foram requisitados por Stálin e seus colegas, pa-
dos cereais para a capital. Segundo os especialistas, foi recem ser mais justas se creditadas à Frente Sul, sob co-
em Tsaritsin que começaria de fato a grande rivalidade mando de generais a mando de Trotski. Certo é que Lê-
entre Stálin e Trotski, por questões de autoridade e hie- nin queria evitar o conflito entre ambos, e acabou cha-
rarquia. O grupo ao redor de Stálin não aceitaria a au- mando de volta Stálin, dando-lhe honras pela ação. Anos
toridade de um general czarista designado ao comando mais tarde, Tsaritsin passaria a se chamar Stálingrado.
por Trotski. Queixas de insubordinação foram frequen- A defesa do país seguiu-se no decorrer de 1919,
tes por parte de Trótski a Lênin, que tentava conter o ím- quando principalmente forças inglesas e francesas es-
peto de Stálin. Este, por sua vez, enviava uma carta pe- tiveram em território russo, e o exército branco che-
dindo plenos poderes militares. gou próximo a Moscou e Petersburgo. Havia desorga-
nização entre eles e, pouco a pouco, suas forças foram
STÁLIN MOSTRA SUAS GARRAS abatidas ou dispersadas pelos bolcheviques. Ao final do
Segundo Simon Sebag Montefiore, em Stálin – A Cor- ano, a guerra civil estava praticamente decidida a favor
te do Czar Vermelho (Cia das Letras, 2006), “foi ali que de Lênin e seu grupo. Em 1920, já livres de qualquer
Stálin compreendeu a conveniência da morte como o ameaça externa, enfim os revolucionários puderam co-
instrumento mais simples e eficaz”. O autor descreve meçar a governar o país.
dois casos na cidade que comprovam sua tese. No pri- “O país estava simplesmente arrasado. O produto
meiro, logo ao chegar a um trem blindado com 400 industrial registrava um declínio de mais de dois ter-
guardas vermelhos, Stá- ços. Na grande indústria,
lin mandou fuzilar todo a perda chegava a 80%. A
AFP

Stálin
suspeito de ação contrar- produção de petróleo, de
revolucionária e traição. energia elétrica e de car-
Um segundo caso, que só vão caíra em mais de 70%.
recentemente foi desco- Em relação a outros se-
berto como ação arbitrá- tores estratégicos para o
ria do ditador russo, ocor- equilíbrio da economia,
reu quando ele e seu gru- como ferro, aço e açúcar,
po, que incluía Vorochílov, uma situação ainda mais
prenderam alguns “espe- desoladora: quase 100%
cialistas” designados por de queda. (...) Quanto à
Trótski no Rio Volga den- produção agrícola, dimi-
tro de uma barcaça. Eram nuição de quase metade”,
soldados e homens do re- escreveu Daniel Aarão Fi-
gime czarista que Trótski lho sobre o momento rus-
reaproveitava para os ver- so no fim da guerra civil.

STÁLIN | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | 25


Assinatura
do acordo
de paz com
AFP/ Roger Viollet

a Alemanha,
em dezembro
de 1917

“A morte resolve todos os problemas.


Nenhum homem, nenhum problema”, Stálin
VITÓRIA E DESCONTENTAMENTO dos), a fim de incentivar o crescimento da indústria e o
É interessante relembrar que, desde outubro de 1917, direcionamento para a ditadura do proletariado.
o novo governo vinha incentivando a reforma agrária Logo as ações do governo revolucionário geraram
por meio da distribuição de terras para os campone- descontentamento, e uma revolta explodiu entre os
ses. Quem saía perdendo com isso eram os chama- marinheiros de Kronstadt, que reivindicavam liberda-
dos “kulaks”, grandes proprietários e produtores de de de expressão e dos presos políticos, além de novas
alimentos, tidos como uma burguesia rural. No iní- eleições para os sovietes e o fim da ditadura do prole-
cio, era preciso manter boa parte dessas fazendas em tariado, que, na verdade, mostrava-se como o início da
funcionamento para assegurar a produção, mas, com ditadura de um partido. No começo, os bolcheviques
a guerra civil, o processo de cobrança dos “kulaks” se negociaram e aceitaram alguns termos, mas, ao final,
acentuou. O governo exigia alimentos dos campone- fizeram valer sua vontade, esmagando a rebelião que já
ses em escala cada vez maior para assegurar o abas- ganhava ares de contrarrevolução. Mais de 2.500 pes-
tecimento. Nessas “cobranças”, a violência era corren- soas foram deportadas ou fuziladas.
te e, muitas vezes, se transformava em pura pilhagem. A situação política e econômica começava a se es-
Tais ações do governo revolucionário acabaram geran- tabilizar, quando Lênin teve um derrame cerebral. Ali
do descontentamento, que seria maior com a decisão começava sua derrocada e um processo de substituição
da “militarização do trabalho” (o uso dos soldados para do poder, o qual Stálin manobraria a seu favor até se
ajudar em atividades essenciais da economia e, poste- tornar governante absoluto. Trótski pagaria caro pela
riormente, o emprego de trabalhadores como solda- ambição do “mão de ferro”.

26 | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | STÁLIN


Na Revolução, a vanguarda artística russa
Por Martinho Junior

Ao pensar na arte russa durante o período revolucionário da Malevich. E tratava-se de uma arte “de pura abstração geométrica”,
queda dos czares, a questão de uma reestruturação estética se nas palavras de Amy Dempsey em seu livro Estilo, Escola e Movimentos
coloca. Conforme Argan, em Arte Moderna (Cia das Letras, (Cosac & Naify, 2003). Evidente que, em seus quadros, reduzidos à
1999), entre as vanguardas que foram animadas por revoluções, a forma do quadrado, ele pretendia transcender o mundo regido pelas
russa foi a única a “colocar explicitamente a função social da arte aparências. Essa transcendência em Malevich está intimamente ligada
como uma questão política”. Sob a égide dos acontecimentos, a um caráter religioso, católico. Lembremos que a arte russa cultivou
artistas foram impulsionados a manter-se em paralelo com ícones até o século 19, à maneira de Bizâncio. O Estado não só era
a política. Com o entusiasmo romântico provocado pelas liberal em relação à produção dos artistas, como também os apoiava.
revoluções de 1917, vários artistas e alunos da arte de esquerda Em 1919, por exemplo, a série Branco sobre Branco participou da
começaram a estruturar novos meios artísticos. Em setembro de Décima Exposição Estatal: Criação Abstrata e Suprematismo. Embora
1918, estabeleceram os svomas (ateliês livres), que procuraram tenha feito desenhos para porcelanas, joalharia e em diversos muros da
atender a uma democracia do ensino, estruturando-se em três cidade, sua obra nunca foi funcionalista ou prática; ela tinha por ideal
tipos: os cujos professores eram eleitos pelos alunos, os que alcançar a essência do projeto, a arte pura.
não possuíam professores e aqueles com mestres designados Se o Suprematismo tinha a insistência de Malevich, o construtivismo
previamente. A intenção desses artistas era tão transgressora, que teve como figura central Vladimir Tátlin. Como base, o construtivismo
o objetivo primeiro de uma nova arte era de que ela fosse livre de tinha a utilização de materiais industriais, como o metal, a madeira
qualquer envolvimento, quer seja político ou ideológico. Assim, e o vidro, e sua exibição se dava por meio de um espaço real
deveria se preocupar prioritariamente com ela mesma. tridimensional, como um material escultórico. A utilização de materiais
É preciso constatar que o ambiente era propício a uma arte “reais” conjugados com um espaço “real” conferia um grande efeito
revolucionária, e de modo algum isso é o mesmo que dizer que a revolucionário ao movimento, já que atuava diretamente na sociedade.
Revolução foi o estopim para os acontecimentos vanguardistas. Para O impacto, para os construtivistas, deveria ser diretamente exercido
tanto, se retornarmos a 1913, verificaremos sobre a sociedade. O grande símbolo do movimento
que Malevich já executava diversas telas é o Monumento à Terceira Internacional, feito
AFP

suprematistas, assim como Tatlin fundava o por Tátlin, de 1919. Esta obra foi edificada para o
construtivismo (veja a seguir). É o que indica Congresso da Terceira Internacional Comunista
Faerna e García-Bermejo em seu livro sobre e era uma espécie de síntese da arte que se quis
Malevich (Malevich, Editora Globus, 1995), socialista. Tratava-se de uma enorme torre em
quando dizem que a revolução russa “deu lugar espiral, de ferro, com um centro de informação
a uma situação em que, por algum tempo, que se utilizava de alta tecnologia, a partir de onde
os artistas modernos tocaram com a ponta seriam transmitidas notícias e propagandas com telas
dos dedos a oportunidade da sua utopia: um ao ar livre. Além disso, havia outro equipamento, em
Estado revolucionário onde a vanguarda conjunto à peça principal, para transmitir imagens
poderia, por fim, realizar seu programa de nas nuvens.
transformação do mundo à medida do homem
novo”. Muitos artistas russos já gozavam de A vitória do Realismo Socialista
certa notoriedade na Europa neste início do Composição suprematista de Entretanto, o apoio vindo do Estado não
século 20, como Kandinsky, Pevsner, Gabo Kasimir Malevich durou muito. Com a morte de Lênin em
e Chagall, que, no período da 1a Guerra 1924, a situação mudou drasticamente. De
Mundial, retornaram à Rússia, onde tiveram um papel ímpar na fato, as mudanças stalinistas foram taxativas, e a liberdade
constituição de uma “arte proletária”. Marc Chagall, que possuía artística acabou podada. Em 1932, todo grupo artístico isolado,
uma pintura particular que tangia o folclore judaico e temas oníricos portanto livre, foi eliminado, e, em 1934, foi completamente
e de fábulas, foi alvo de seus compatriotas, que afirmavam ser a suprimida toda investida na pesquisa e no incentivo à arte. A
verdadeira revolução feita com bastante rigor e nada de fantasia. partir de então, a única forma de produção artística aceitável
Entretanto, muitos teóricos afirmam a força das fábulas na formação foi o chamado “Realismo Socialista”. Este movimento foi
de uma arte que se queria revolucionária e socialista, pois a fábula sancionado pelo governo, que o indicara como “estilo artístico
seria um elemento da expressão criativa do povo. Portanto, tendo oficial da União Soviética”. Logo, todos os artistas tiveram
alguma força popular, teria igualmente certa de fazer parte do Sindicato dos Artistas Soviéticos, que era
força revolucionária. controlado pelo Estado; e a criação deveria ser feita de acordo
com o modelo aceito. Segundo Amy Dempsey, “o realismo
Experimentações revolucionárias socialista destinava-se a glorificar o Estado e celebrar a
A interferência europeia é bem clara quando observamos a superioridade de uma nova sociedade sem classes que estava
vanguarda na Rússia pré-revolucionária. Como dissemos, muitos sendo construída pelos soviéticos”. Ou seja, não era difícil
artistas já tinham uma carreira internacional, o que, de certa forma, encontrar, nas pinturas dessa época, retratos de mulheres e
influenciou a arte de toda uma geração. Antes das grandes guinadas homens no trabalho ou na prática de esporte, em assembleias
vanguardistas, Malevich, por exemplo, nos primeiros anos do século políticas ou em outros segmentos sociais. Sua escala sempre
20, esteve atrelado às propostas do Pós-impressionismo, do Cubismo tendeu para o monumental; a ordem era estabelecer um
e do Futurismo (mesmo Marinetti, grande nome do futurismo otimismo heroico. Dessa forma, todo o furor inicial e a
italiano, realizou, em 1914, palestras em Moscou para um grupo possibilidade de abertura para uma arte socialista, ou mesmo
de futuristas). Toda a teoria e a arte não-figurativa de Kandinsky livre de qualquer imposição, foram aos poucos suplantados
tiveram suas bases fincadas na Alemanha. O Suprematismo foi um por diversas medidas que atolaram as artes russas numa série
movimento quase exclusivamente de um único homem, Kasimir puramente direcionada à propaganda política.

STÁLIN | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | 27


Stálin versus Trotski

AFP/ Roger Viollet


GUERRA
Trótski

de
ideais
AFP

28 | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | STÁLIN Stálin


Cada vez mais debilitado, Lênin humor menos caprichoso etc.. Mas, em meu enten-
der, para nos preservar da cisão e tendo em conta o
acabou se afastando do poder, ao que já escrevi anteriormente sobre as relações entre
mesmo tempo que Stálin estabelecia Stálin e Trotski, isso não é um detalhe, ou melhor, é
um que pode se tornar de importância decisiva”.
suas garras por todo o partido, Interessante recuperar o contexto daqueles dias
preparando sua ascensão. O único para entender o testamento. Em abril de 1922, Lê-
nin indicou Stálin para a secretaria-geral do Partido.
obstáculo era Trótski No mês seguinte, sofreu seu primeiro derrame, que
Por Lucas Pires o deixou temporariamente paralisado. Novo ataque
em dezembro iria colocá-lo definitivamente “de mo-

L
ênin foi o pai da Revolução Russa e ficou co- lho”, sendo informado da situação política por Stá-
nhecido por adaptar os pensamentos de Karl lin, designado pelo Politburo a ser o elo com Lênin,
Marx e deixar como legado o marxismo-le- e por sua esposa, Krupskaia, que era sua secretária.
ninismo. A seu lado sempre estiveram pre- Essa relação não poderia dar muito certo, pois os
sentes dois nomes – Stálin e Trótski – que exerceram médicos pediam que Lênin não fosse incomodado,
papéis díspares. mas ele era teimoso e queria saber de tudo. Logo pi-
A historiografia costuma colocar a relação entre pocaram informações de que Stálin escondia as no-
Trótski e Stálin como algo ao estilo “o bem contra vidades de Lênin, que, mesmo assim, soube de ações
o mal”. Assim, com esse antagonismo criado pos- nada dignificantes do futuro ditador, como a repres-
teriormente, não há jeito de se olhar Stálin e en- são aos camponeses.
contrar nele algo elogioso. E costuma-se ver em Querendo obter maiores informações a respeito
Trótski o herdeiro legítimo de Lênin, aquele que do X Congresso do partido, realizado em feverei-
daria à Revolução um caráter menos ditatorial. A ro de 1923, Kuprskaia ligou para Stálin, que acabou
questão que se coloca é a seguinte: mesmo que se sendo rude ao repreendê-la, e isso chegou aos ou-
estudem as ideias trotskistas, nunca se saberá o que vidos de Lênin. Em 5 de março, Lênin escreveu a
seria a URSS se Trótski superasse Stálin na direção Stálin as seguintes linhas: “Vós tivestes a rudeza de
do Partido e do país. Diante desse fato intangível, convocar minha mulher ao telefone para repreendê-
tudo o que se diga e se coloque não passa de jogo de la. Não tenho a intenção de esquecer tão cedo que
deduções, que poderiam se tornar verdade se não isso foi feito contra mim, e é inútil sublinhar que eu
fosse justamente essa palavra “se”. A História não considero que o que é feito contra minha mulher é
é feita de “ses”. Em compensação, sabemos que os feito contra mim. Por esta razão, eu peço, examineis
homens repetem erros do passado, e temos muito a seriamente se aceitais retirar o que dissestes e apre-
aprender com essa ciência. sentar vossas desculpas ou se preferis romper as rela-

O TESTAMENTO DE LÊNIN
Uma das coisas que definiram a posição de Stálin
como “o mal encarnado” foi o testamento de Lênin. “Stálin é muito brutal, e
“Stálin, tendo se tornado secretário-geral”, decla- esse defeito, perfeitamente
ra o testamento de Lênin, “concentrou um imenso
poder em suas mãos e não estou certo de que ele tolerável em nosso meio
sempre saiba como usar esse poder com suficiente e nas relações entre nós,
cautela”. Dez dias mais tarde, Lênin acrescentou o
seguinte trecho: comunistas, não o é
“Stálin é muito brutal, e esse defeito, perfeita-
mente tolerável em nosso meio e nas relações entre
mais nas funções de
nós, comunistas, não o é mais nas funções de secre- secretário-geral... Proponho
tário-geral... Proponho então aos camaradas estuda-
rem um meio de destituir Stálin deste posto e nome-
então aos camaradas
ar em seu lugar uma outra pessoa que não tenha em estudar um meio de
todas as coisas sobre o camarada Stálin senão a úni-
ca vantagem, aquela de ser mais tolerante, mais leal, destituir Stálin deste
mais polido e mais atencioso com os camaradas, de posto”, Lênin
STÁLIN | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | 29
ções entre nós”. Assim, as palavras de Lênin podem calou – “tinha orgulho demais para intervir numa
não condizer com o pensamento real dele a respeito situação que também afetava a própria posição”, se-
de Stálin, pois, como vimos, ele estava irado com o gundo Deutscher – e os votantes ratificaram. Stálin
companheiro em razão da confusão com sua espo- estava a salvo.
sa. Mas também é certo que ele estava dando rumos
à Revolução que Lênin não aprovaria por absoluto. IDEIAS CONTRÁRIAS
Enfim, a verdade parece ser que, até a guerra civil, A briga entre Stálin e Trótski teve início quan-
Lênin via Stálin com bons olhos, mas suas ações de- do ambos se conheceram – em 1907, em congres-
pois disso, e quando assumiu a direção do partido, so do partido. A partir dali, um bolchevique e o ou-
não lhe agradaram totalmente. tro menchevique, passaram por situações opostas até
Ludo Martens, em Stálin – Um Novo Olhar (Re- que Trótski se converteu ao bolchevismo, em julho
nan, 2003), assume a defesa do ditador explicita- de 1917, e tornou-se um dos heróis da Revolução. O
mente e se coloca como um stalinista. A partir disso, ódio de Stálin deve ter crescido ao ver o colega re-

A briga entre Stálin e Trótski teve início quando ambos se


conheceram em 1907. A partir dali, um bolchevique e o outro
menchevique, passaram por situações opostas até que Trótski se
converteu ao bolchevismo, em julho de 1917, e tornou-se um
dos heróis da Revolução. O ódio de Stálin deve ter crescido
ao ver o colega recém-chegado ganhar popularidade e a
confiança de Lênin. Boa parte do partido não gostava
de Trótski em razão de seu passado, e isso facilitaria o trabalho
de Stálin para marginalizar o adversário até sua eliminação
do partido, da URSS e da vida

já se pode duvidar de muitas de suas colocações, mas cém-chegado ganhar popularidade e a confiança de
há outras que temos de aproveitar. Um de seus ar- Lênin. Boa parte do Partido não gostava de Trótski
gumentos é o de que Trótski e seus seguidores qui- em razão de seu passado, e isso facilitaria o trabalho
seram criar em torno do testamento de Lênin um ar de Stálin para marginalizar o adversário até sua eli-
de que ali estava indicado Trótski como seu sucessor. minação do Partido, da URSS e da vida.
No entanto, nada em seu texto sugere isso. A dissidência de Trótski com o Partido Comu-
O pai da Revolução Russa, ao contrário do que nista veio a público quando ele publicou, em 1924,
diz seu testamento, tinha enorme estima por am- um prefácio de seus escritos de 1917, chamado As
bos e, a partir do momento em que a rixa entre eles Lições de Outubro. No texto, criticava a falta de estra-
se tornou explícita, passou a intermediar e a apazi- tégia revolucionária de Stálin, e dizia que a indecisão
guar os dois lados. O testamento só foi divulgado demonstrada por Kamenev e Zinoviev às vésperas
em maio, quatro meses depois de sua morte, e deve- da Revolução de Outubro era absurda. Estas discor-
ria ser lido no próximo congresso do partido. Houve dâncias afastaram mais ainda politicamente Trótski
uma reunião do comitê central para decidir se seria de Stálin.
divulgado ou não o conteúdo. Na ocasião, seria sela- Eles divergiam em várias questões, mas a princi-
do o destino de Stálin. E foram Zinoviev e Kamenev pal era a de como construir o socialismo. Para Stá-
que tomaram a defesa do futuro ditador, sugerindo lin, a revolução socialista deveria ser consolidada
que este permanecesse no cargo, pois “os temores de internamente na URSS, pois o país estava interna-
Lênin se mostraram infundados”. Lembraram-se do cionalmente isolado e sofrendo represálias comer-
bom serviço de Stálin e colocaram que, se a decisão ciais. Nascia aí a tese do “socialismo em um país
fosse a da permanência, o testamento não deveria só”, creditada a Stálin, mas, de fato, desenvolvida
ser colocado a público. A viúva protestou, Trótski se por seu colega Bukharin, que seria morto na déca-

30 | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | STÁLIN


da de 1930. Para Trotski, a revolução socialista de- decadência do comunismo soviético e de sua der-
veria ser levada para onde o capitalismo estava em rocada para o autoritarismo. Em 3 de setembro de
crise. Acreditava ser inviável a construção do regi- 1938, Trótski e seus seguidores fundaram a IV In-
me socialista na URSS caso não ocorresse em ou- ternacional, herdeira do legado revolucionário de
tros países, afinal as nações capitalistas acabariam todas as organizações mundiais da classe trabalha-
com a URSS. Essa é a tese da chamada “revolução dora, para contrapor à III Internacional de Stálin.
permanente”, segundo a qual o socialismo deveria Em uma carta aberta aos trabalhadores soviéticos,
ser construído em escala internacional. Trótski falou: “O objetivo da IV Internacional é re-
Diante desse debate, Stálin saiu-se vitorioso. Sua cuperar a URSS na eliminação de sua burocracia
personalidade condizia mais com a necessidade da parasitária”. Era 1940, a URSS se preparava para
ocasião. Sua esperteza política contrastava com cer- entrar na guerra. Talvez Trótski estivesse pensando
to ar de ingenuidade de Trotski, que o impedia de nos mesmos moldes de 1917 – incitar uma revolu-
perceber as manobras nas hierarquias do partido ção quando o governo estivesse enfraquecido pela
travadas por Stálin. Segundo Deutscher, “Trótski participação numa guerra. Os críticos dele colocam
subestimava desdenhosamente o rival; e até os úl- que estava incitando uma insurreição contra o go-
timos dias o trataria como ‘enfadonha mediocrida- verno soviético que acabaria ajudando os nazistas, o
de’”. Quando Trótski se deu conta, a burocracia do que equivaleria dizer que Trótski ia contra seu pró-
Partido Comunista estava toda controlada por se- prio país. Na verdade, durante todo o seu período
guidores de Stálin, e seus partidários, isolados e sem pós-exílio, ele não se calou. Continuava a escrever
poder de decisão. A formação do triunvirato Stá- e a enviar panfletos para a URSS. Sua luta tornara-
lin-Kamenev-Zinoviev – dava maior poder a Stá- se outra – a derrubada do Stálinismo.
lin, já que os outros dois eram também contrários As coisas se precipitaram naquele mesmo ano
a Trotski. Apenas alguns anos depois veriam o erro de 1940. Em 24 de maio, Trótski sobreviveu a um
que cometeram e tentariam uma união a Trotski, atentado a mando de Stálin. Em agosto, houve um
mas aí já seria tarde demais. novo ataque, dessa vez bem-sucedido. Um agente de
Trótski foi perdendo todas as suas funções no go- nome Ramón Mercader conseguiu entrar disfarçado
verno. O culto leninista endossado por Stálin dava na casa de Trótski e aplicou-lhe um golpe de pica-
munição a seus opositores, que resgatavam críticas reta em seu crânio. Era o fim que Stálin queria para
feitas por ele no passado a Lênin, criando o retrato seu grande rival.
de um Trótski contrário a Lênin, contrário, portan-
to, à União Soviética. Não pôde fazer nada quando Stálin matou Lênin?
votaram pela sua expulsão do partido, em 12 de no-
vembro de 1927, quando foi exilado na Sibéria em Umas das teses levantadas por Trótski, e que não merece
credibilidade porque foi colocada sem provas, é a de que
31 de janeiro de 1928, e, para completar, quando foi Stálin teria matado Lênin. Trótski escreveu na década de
expulso da União Soviética em 1929. 1930 que certa vez, quando Lênin já estava moribundo,
Stálin foi fazer-lhe uma visita. Lênin teria morrido logo
A MORTE DE TRÓTSKI em seguida.
Fora da URSS, permaneceu na oposição a Stálin, “Entretanto, numa reunião dos membros do Politburo,
redigindo comentários em um jornal fundado por com Zinoviev, Kamenev e eu, Stálin nos informou,
depois que o secretário saiu, que Lênin o havia chamado
ele. Ele morou em diversos países antes de se fixar de repente e lhe pedira veneno. Lênin estava perdendo a
no México. fala outra vez, considerava sua situação sem esperanças,
A partir de 1937, Trótski se dedicou a construir previa que iria ter um novo derrame e não confiava nos
uma alternativa à política dos partidos comunistas in- seus médicos. Sua mente estava perfeitamente clara e
fluenciados por Moscou. Escreveu livros a respeito seu sofrimento era insuportável. Mas será que Lênin de
fato pediu veneno a Stálin? Ou terá sido essa história
dessa burocracia, sobre a Revolução de 1917 e mesmo
toda nada mais que uma invenção de Stálin para preparar
sobre Stálin. Passou a atuar contra o que ele chamou seu álibi? Ele não tinha por que temer uma investigação,
de uma “nova aristocracia”, a aristocracia bolchevique, pois ninguém poderia interrogar Lênin, já tão doente”,
que teria deturpado os rumos da Revolução. escreveu Trotski.
A teoria de Trótski ganhou maiores respaldo e A verdade é que a morte de Lênin era do interesse de
credibilidade quando, posteriormente na História, Stálin, pois se manifestava como a grande chance dele
tomar o poder na União Soviética. Mas, historicamente,
as ações de Stálin foram sendo reveladas. O com- não há provas desse envenenamento e a realidade aponta
bate à burocracia bolchevique arquitetada por Stá- para um Lênin extremamente doente e frágil desde 1922.
lin seria, quando revelada, uma das razões para a Não haveria a razão para Stálin matar um moribundo.

STÁLIN | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | 31


MÃOS DE FERRO SOBRE A
Stálinismo

URSS
Sem Trótski para atrapalhar, o poder de Stálin tornou-se soberano. Era
hora de colocar em prática o “socialismo de um só país”, que envolveria
imensa industrialização às custas do trabalho no campo por meio das
fazendas coletivas. Enquanto isso, o ditador passava a ver inimigos em
qualquer companheiro que se destacasse, e acabava com todos que
pudessem lhe tomar o poder. Era o terror stalinista
Por Lucas Pires

A
partir de 1928, Stálin estava livre para pôr do voluntariamente, até conhecer a completa coletiviza-
em prática o que alguns historiadores cha- ção. Foi nessa toada que Stálin anunciou o chamado I
mam de “Segunda Revolução”, dessa vez Plano Quinquenal no final de 1928. Tal plano determi-
empreendida diretamente do topo do poder nou a supressão da NEP leninista e da propriedade in-
e por um único homem. Seria o que se chamou de “re- dividual, além do aumento da produção, estabelecendo
volução feita de cima para baixo”, ou “imposta”. como prioridade a industrialização do país, com foco na
Segundo Isaac Deutscher, essa segunda revolução indústria pesada e de equipamentos. Para a agricultura,
“desembocou na rápida industrialização da Rússia; ficavam estabelecidos dois modelos de unidades de pro-
obrigou mais de 100 milhões de camponeses a aban- dução coletiva: sovcoses, as fazendas do Estado, onde o
donar propriedades pequenas e primitivas e se estabe- camponês era um trabalhador assalariado; e os colcoses,
lecer em fazendas coletivas; retirou, impiedosamente, cooperativas em que o camponês recebia uma pequena
o ancestral arado de madeira das mãos do mujique e parcela de terra e, após pagar um tributo ao Estado pelo
o forçou a segurar o volante do trator moderno; con- uso das máquinas, podia vender o que produzia.
duziu dezenas de milhões de analfabetos à escola e fez A intenção era de que as terras fossem estatizadas
que aprendessem a ler e a escrever; e, espiritualmente, em 20% até 1933. Mas essa intenção não parecia ser o
separou a Rússia europeia da Europa e trouxe a Rús- melhor para os camponeses, tanto que estes se rebela-
sia asiática para perto da Europa. O desfecho dessa re- ram e, antes de ser removidos de suas terras, destruí-
volução foi espantoso, assim como o custo: a completa ram a colheita e mataram o gado. “Entre 1929 e 1934,
perda, por parte de toda uma geração, da liberdade po- o número de cabeças de gado caiu de 70,5 milhões para
lítica e espiritual”. A questão a ser definida por Stálin 33,5 milhões; o de cavalos reduziu-se de 33,5 milhões
naquele momento respondia a dois interesses do país para 17,5 milhões, e as perdas foram maiores ainda nos
que vinham desde os tempos do czar: como industria- rebanhos de suínos, caprinos e ovinos. Somente em
lizar rapidamente a URSS e como lidar com a agricul- meados da década de 1950, os rebanhos voltaram a al-
tura, que não tinha boa produtividade. cançar os níveis do período que antecedeu à implanta-
O problema agrícola já vinha sendo debatido in- ção do plano”, escreveram Dorothy e Thomas Hoobler
ternamente pelo partido. Os bolcheviques de esquerda em Grandes Líderes – Stálin.
queriam a transferência da propriedade privada para a Teve início uma verdadeira guerra entre campone-
propriedade coletiva, processo que seria feito gradual- ses e governo. Diversos camponeses, que não aceitavam
mente e diante do consentimento dos camponeses. E, a “obrigação” de se transferir para as fazendas coletivas,
conforme o sistema fosse se mostrando ágil e economi- foram presos, exilados e fuzilados. Houve um excesso de
camente saudável, os demais camponeses iriam aderin- violência contra a população que acabou gerando dis-

32 | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | STÁLIN


AFP/ Roger Viollet

Stálin e Kirov

STÁLIN | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | 33


Diversos camponeses
cussão e incômodo para Stálin, tanto que ele chegou a
publicar no Pravda um artigo “explicando” os fatos e
se desculpando pelo excesso de alguns funcionários do que não aceitavam a
“obrigação” de se
Partido que estavam “embriagados com o sucesso de seu
trabalho”. O problema da coletivização foi que Stálin a
empreendeu também como uma forma de acabar com transferir para as fazendas
os kulaks, a burguesia rural que tanta dor de cabeça vi-
nha lhe causando desde a época da Revolução. O dita- coletivas foram presos,
dor aproveitou para deportar milhares de kulaks para exilados e fuzilados. Houve
terras distantes e se apropriar de seus bens, que chega-
ram a 400 milhões de rublos. um excesso de violência
Apesar de tudo isso, a coletivização acabou se con- contra a população
solidando no decorrer da década de 1930. Em 1929,
4,1% dos camponeses viviam em fazendas coletivas. que acabou gerando
No ano seguinte, o índice chegou a 58%. Em 1938, a
cifra era de 93,4%.
discussão e incômodo
Ao mesmo tempo, Stálin colocou a economia russa nos para Stálin, tanto que
trilhos da industrialização, o que se tornou o objetivo maior
de toda a nação. Ludo Martens, em seu ufanismo e sua de-
ele chegou a publicar
fesa à pessoa de Stálin, escreveu, na biografia sobre o líder no Pravda um artigo
“explicando” os fatos
soviético, palavras que poderiam ter sido retiradas de um
discurso de seu biografado da época. Anotou ele sobre essa
posição soviética de industrialização a qualquer custo: “A e se desculpando
pelo excesso de alguns
industrialização socialista é a peça-chave da edificação so-
cialista na União Soviética. Tudo depende de seu êxito. A
industrialização deve lançar as bases materiais do socialis-
mo. Ela permitirá transformar radicalmente a agricultura
funcionários do partido
à base de máquinas e de técnicas modernas. Ela abrirá um que estavam “embriagados
futuro de bem-estar material e cultural para os trabalha- com o sucesso de
dores. Ela fornecerá os meios de uma verdadeira revolu-
ção cultural. Ela produzirá a infraestrutura de um Estado seu trabalho”
moderno e eficaz. E somente ela poderá fornecer ao povo
trabalhador as armas modernas para defender sua indepen-
dência contra as potências imperialistas agressivas”.
Da mesma forma, Stálin falou ao país em 1931 sobre cam a melhoria da condição russa foram o metrô de Mos-
a importância da industrialização. “Desejais que nossa Pá- cou, a ferrovia Moscou-Donets, o complexo industrial de
tria socialista seja derrotada e que ela perca sua indepen- Magnitogorsk e o canal entre o Báltico e o Mar Negro.
dência? Nós nos retardamos em cinquenta anos sobre os No plano político, o assassinato de Kirov em 1934 mu-
países avançados. Devemos percorrer esta distância em 10 dou o modo de Stálin lidar com os companheiros. Pri-
anos. Nós o faremos, ou seremos esmagados”. O I Pla- meiro-ministro, Kirov foi morto por um estudante que
no Quinquenal abrangia também outros setores da socie- era acusado de pertencer a um grupo que pretendia eli-
dade soviética. Foram criadas escolas profissionalizantes minar diversos nomes do partido bolchevique, inclusi-
para preparar os trabalhadores para manusear máquinas e ve o de Stálin. Deu-se início ao Stálinismo, período que
equipamentos, programas de alfabetização foram instala- se caracterizou pelo endurecimento político do regime,
dos e fábricas construídas nos Montes Urais. Além disso, pela eliminação de toda e qualquer oposição e pela esti-
teve início um processo de construção de estradas e rodo- mulação de um verdadeiro culto ao Estado e à persona-
vias para ligar as diversas cidades russas, a fim de facilitar o lidade de Stálin.
transporte e a movimentação em caso de conflito com ou- A morte de Kirov acabou recaindo sobre velhos parcei-
tros países. O símbolo do crescimento desse primeiro pla- ros que se tornaram inimigos de Stálin – Kamenev e Zi-
no acabou sendo a barragem do Rio Dnieper. Outro ícone noviev, que foram condenados a cinco e dez anos de traba-
foi o mineiro Stakhanov, que, no entusiasmo nacionalista lhos forçados, respectivamente. O receio de ser eliminado
em prol do país, chegou a superar em 1.300% sua cota de criou em Stálin uma paranoia, uma mania de perseguição
produção. Depois dele, o termo “stakhanovista” passou a que o levou a implantar planos de captura e eliminação de
significar “operário-padrão”. Outras construções que indi- “traidores do povo”.

34 | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | STÁLIN


AFP/ Roger Viollet
As contas finais dos
expurgos stalinistas variam
conforme a fonte.
Falou-se de sete milhões a
até mais de 20 milhões
de mortos. Por exemplo,
dos 140 membros eleitos
em 1934 para o Comitê
Central, apenas 15 estavam
em liberdade três anos
depois. Um dos crimes
mais encontrados
no período foi
o de “trotskismo”

Lev Kamenev

Instaurou-se um período de perseguições, de censu- eles para que seja fuzilado! Stálin jamais permitirá que
ra e de terror. Eram as chamadas “depurações stalinistas”. continue vivo alguém que o faça ver que ele próprio não é
Muitos revolucionários, companheiros de Lênin da época o primeiro ou o melhor”. Poucos dias depois, antes de vol-
da Revolução, foram presos, banidos, torturados e mortos tar para a União Soviética, Bukharin comentou com um
pela repressão. Assim, grandes patriotas foram executados amigo: “Agora ele vai me matar”. De fato, Bukharin foi
como traidores da pátria. Todos aqueles que se opuseram fuzilado em 1938.
a Stálin em algum momento corriam risco de ser pre- As contas finais dos expurgos stalinistas variam con-
sos e mortos. Já a historiografia pró-stalinista coloca que forme a fonte. Falou-se de sete milhões a até mais de 20
essa perseguição tinha razão de existir, pois havia cente- milhões de mortos. Por exemplo, dos 140 membros eleitos
nas de infiltrados no partido a fim de miná-lo por dentro. em 1934 para o Comitê Central, apenas 15 estavam em
A historiografia ocidental vê nos expurgos uma forma de liberdade três anos depois. Um dos crimes mais encontra-
Stálin se livrar de velhos companheiros contrários a seu dos no período foi o de “trotskismo”. O Exército também
modo de governar e aos rumos dados por ele à Revolu- sofreu sérias baixas com os expurgos. Cerca de um terço
ção. Um dos opositores à sua administração foi o ex-ami- dos oficiais de alta patente foi eliminado, o que enfraque-
go Bukharin, teórico do partido que desenvolveu a ideia ceu de forma monstruosa a força do Exército Vermelho, o
do socialismo num único país. Numa entrevista a jorna- que, em 1939, seria uma das razões para o pacto de não-
listas em Paris em 1936, Bukharin deu a seguinte respos- agressão entre Stálin e Hitler.
ta quando perguntado do porquê dos expurgos de tantos As perseguições foram praticamente encerradas em
colegas da Revolução: “Stálin se sente infeliz porque não 1938, bem ao estilo de Stálin. O chefe da polícia secreta,
consegue convencer ninguém, nem a si próprio, de que é responsável prático pelo terror instaurado, Nikolai Yezhov,
maior e mais poderoso do que todo mundo. Essa infelici- foi substituído por Lavrenti Beria e fuzilado. Beria diria
dade talvez seja... o último resquício de humanidade que mais tarde que “Yezhov era um rato. Ele foi responsável
ainda lhe resta. O que não é humano, mas demoníaco, é pela morte de muitos inocentes. Nós o fuzilamos por
que sua infelicidade o leve a querer vingar-se de todos... isso”. Bem stalinista a saída, culpando e exterminando
basta que alguém fale com mais brilho ou clareza do que outros que o serviram com lealdade.

STÁLIN | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | 35


Vida privada

A tragédia pessoal
Stálin teve uma vida pública que superou em muito sua experiência pessoal.
Era pouco afeito à família, mas, apesar disso, casou-se duas vezes
Por Lucas Pires

G
rande homem político, Stálin deixou sua fissional, o que fez que negligenciasse a vida familiar.
mãe para estudar no seminário e sabia que Além disso, Nadia tinha problemas sérios de saúde
nunca mais voltaria para casa. Casa, aliás, é – dores de cabeça, fadiga, angina e artrite, sem con-
o local onde menos Stálin permaneceria em tar uma espécie de esquizofrenia que a enlouquecia
sua vida. Seu tempo estava destinado ao trabalho, e as- de tempos em tempos. Essas crises abalavam o casa-
sim foi quando se casou com Ekaterina Svanidze no mento e a relação com Stálin.
início do século. O casamento durou até que a morte Foi nesse contexto, entre uma relação de paixão e ci-
levasse a jovem esposa quatro anos depois. Da relação, úme, que o casal se preparou para o jantar anual em co-
ficou um filho, que seria criado pelos avós maternos e memoração ao 15o aniversário da Revolução. Era 8 de
passaria a morar com o pai apenas em 1921. novembro de 1932. Nadia, no apartamento do casal,
Dedicado ao Partido, Stálin nunca ligou para fa- vestia um vestido preto longo e moderno, ao qual bor-
mília. Sua vida era o Partido e a União Soviética, dou rosas vermelhas, e resolveu fazer um penteado dife-
tanto que se casou pela segunda vez apenas em 1918, rente. Enquanto isso, Stálin permanecia em reunião com
com a filha de um grande amigo seu, Serge Alliluiev. o chefe da polícia secreta russa. Em seguida, ao lado de
A jovem Nadia Alliluiev tinha três anos quando Stá- Molotov e de outros assessores, saíram para a festa.
lin conheceu a família. “Em algum momento da noite, sem que os outros
Quando voltou da prisão para São Petersburgo, vi- presentes notassem, Stálin e Nadia ficaram bravos um
sitou os Alliluiev e viu uma bela morena de 17 anos. com o outro. O fato não era raro. Para ela, a noite co-
Começava ali seu interesse que resultaria em casa- meçou a desmoronar quando, entre brindes, danças e
mento em 1918. flertes ao redor da mesa, Stálin mal notou como ela
Teria sido em sua ida para Tsaritsin, viagem na se vestira, ainda que fosse uma das mulheres mais jo-
qual Nadia o acompanhou como secretaria, que se vens presentes”, conta Simon Montefiore em Stálin – A
tornaram amantes. Mais de 20 anos os separava. O Corte do Czar Vermelho.
casal era muito apaixonado, mas isso não se traduzia Assim, irritada, Nadia seguiu para o salão e co-
numa vida repleta de convivência. Stálin era casado, meçou a dançar com seu padrinho. Começou um
antes de tudo, com a revolução e com o poder. Pou- jogo de flerte entre ambos, assim como Stálin fler-
cos anos depois, nasceu Vassili, o primeiro filho, se- tava com a esposa de um comandante do Exército
guido de Svetlana. Vermelho. Segundo as descrições feitas por Mon-
Nadia mandava dentro de casa. A comunicação tefiore, era normal a infidelidade na cúpula do po-
entre eles, muitas vezes, era feita por cartas e bilhe- der soviético, e casos entre esposas e maridos alheios
tes, principalmente quando ela viajava de férias com aconteciam com regularidade.
os filhos. Dentro de seu mundo peculiar, Stálin ama- Mas, naquela noite, Nadia ficou irada com o fler-
va Nadia. Podia não ser o cavalheiro romântico de te descarado do marido. Talvez mais ainda ao notar
fábulas, mas nas cartas sempre era carinhoso e amo- que sua provocação a ele não surtira efeito. O orgu-
roso. A relação era difícil, mas sabiam se entender. lho dela estava ferido. Ainda ressoava em sua mente
Talvez o problema maior entre eles brotara no fim talvez uma noite em que foram ao teatro e Nadia teve
dos anos 20, quando Nadia demonstrou interesse um ataque histérico de ciúmes ao ver Stálin flertar
em fazer uma carreira profissional no Partido sem com uma bailarina.
ser considerada a esposa do chefe. Queria subir por Nesse cenário, de provocações e insinuações de
seus méritos. Em 1929, prestou exame para a Aca- ambos os lados, Stálin propôs um brinde. Percebeu
demia Industrial. Seu foco era o estudo e a vida pro- que Nadia não levantara a taça e atirou cascas de la-

36 | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | STÁLIN


ranja nela. Quando ela se virou,
disse: “Ei, você! Beba um drin- A segunda gados, que ligaram para a família de
Nadia, para o padrinho dela, a ami-
que!”. A resposta de Nadia foi esposa, Nadia , ga que a deixara em casa e também
um tanto rude. “Meu nome não
é ‘ei’!”, e complementou mandan- era do partido
o médico.
Stálin soube em seguida e ficou
do-o calar a boca. Em seguida, bolchevique. Stálin arrasado. “Aquela criatura políti-
deixou a sala, com a amiga Po- ca ao extremo, com um desrespeito
lina, que a acalmou e a acompa- e ela tiveram desumano pelos milhões de mulhe-
nhou até sua casa. A hora em que uma vida res e crianças que morriam de fome
Stálin voltou para casa é um mis- em seu país, exibiu mais humanida-
tério, mas tem-se notícia de que marcada por de nos dias seguintes do que o fa-
saiu para beber com outros com-
panheiros, inclusive com a mu-
amor brigas e , ria no resto de sua vida”, escreveu
Montefiore. Stálin tomou um cal-
lher de um deles. Certo é que culminaria
que mante e chorava diante do corpo.
algo fez que ela se desesperas- Clamava: “Ela me aleijou. Oh, Na-
se e se lembrasse de um presen-
no trágico dia, como precisamos de você, eu e
te recebido do irmão – uma pis- suicídio da as crianças!”. Chegou mesmo a de-
tola feminina. Nadia sentou-se e
escreveu “uma carta terrível” para
mulher em 1932 clarar que renunciaria ao poder, que
não podia continuar vivendo da-
Stálin para, em seguida, acabar quele jeito...
com sua vida. Um sobrinho de Stálin, Leoned
A manhã começou em pavor no palácio. Stálin dor- Redens, acreditava que esse suicídio alterara a história
mia de um lado do corredor enquanto, no outro, o corpo e tornara o Terror que viria em seguida – os expurgos
de sua esposa já havia sido encontrado em meio a uma – inevitável. Seria a tragédia pessoal de Stálin um dos
poça de sangue. A governanta chamou outros empre- fatores da tragédia maior de sua nação?

AFP

Stálin com sua


filha Svetlana

STÁLIN | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | 37


Segunda Guerra Mundial

Às vésperas de explodir a
Segunda Guerra Mundial,
receoso de entrar no conflito,
Stálin fechou um pacto de
não agressão com Hitler. Mas,
com o decorrer da Guerra e
a ocupação de quase toda a
Europa, o líder nazista decidiu
romper o acordo e atacar a
União Soviética. Stálin sabia que
essa hora chegaria e preparou o
país para uma verdadeira batalha
pela sobrevivência. O final dessa
história é conhecido: a Alemanha
perdeu a Guerra e a URSS saiu
dela como potência mundial
Por Lucas Pires

E
m meados de 1939, a guerra na Europa estava
prestes a explodir e Stálin não via com bons olhos
a participação, ao menos imediata, da União So-
viética no conflito. Uma das razões mais explíci-
tas e apontadas pelos especialistas para sua postura é que,
para se consolidar no poder, ele praticamente teria acaba-
do com todos os grandes homens do Exército Vermelho,
o que, diante de uma guerra, o colocaria em desvantagem
por não ter comandantes experientes em ação. Assim, era
preciso adiar o máximo possível a chegada da guerra na
frente russa para conseguir se preparar para o inevitá-
vel. Sim, inevitável. A participação da URSS na Segunda
Guerra Mundial aconteceria, cedo ou tarde, pois a locali-
zação geográfica e os ideais russos não poupariam a nação
de lutar contra Adolf Hitler ou a favor dele. A favor, caso
seus líderes chegassem a um acordo referente a territórios
de dominação; contra, se o líder nazista pusesse em prá-
tica o pensamento ariano de superioridade racial, que co-
locava os eslavos e os russos como raças inferiores e passí-
veis de escravidão e eliminação física.
Além do interesse de não guerrear sem militares ex-
perientes, havia outro motivo para Stálin procurar Hitler:
um ano antes, França e Inglaterra, pelo Acordo de Muni-

38 | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | STÁLIN


Hitler e Stálin, um

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jogo de interesses

Winston Churchill, Franklin


Roosevelt e Josef Stálin

STÁLIN | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | 39


que, concordaram em entregar para a Alemanha parte do
território da então Tchecoslováquia. Na ocasião, a União
Soviética era aliada da Tchecoslováquia. França e Inglater-
ra ignoraram a União Soviética sem dó, mas tinham mo-
tivos para tanto. No período entreguerras (1918-1939),
primeiro Lênin e Trótski e posteriormente Stálin ajuda-
ram a Alemanha a se armar, mesmo indo de encontro
aos itens estabelecidos no Tratado de Versalhes, assinado
em 1919, que diziam, entre outras coisas, que os derrota-
dos estavam proibidos de ter exércitos com mais de 100
mil homens, marinha, aviação militar e produzir ou co-
mercializar equipamento bélico. Mas a União Soviética
permitiu que se instalasse em seu território uma indús-
tria bélica a serviço do exército alemão. Com isso, as de-
mocracias europeias isolaram a URSS e deixaram Stá-
lin imaginando que o Ocidente faria uma frente “anti-
imperialista” ao lado da Alemanha. Isso o encorajou – e
Soldados em ação na Segunda
muito – a procurar rapidamente Hitler para um acordo Guerra Mundial
bilateral de “paz”.

OBJETIVOS ANTAGÔNICOS tante do ponto de vista geopolítico, dividia e marcava as


Stálin e Hitler sempre foram líderes ideologicamente an- zonas de influência no leste europeu. Na prática, de ime-
tagônicos. O primeiro tinha como objetivo consolidar a diato, resultou na divisão da Polônia após a invasão alemã
ditadura do proletariado e acabar com o capitalismo, e o na semana seguinte ao pacto. Além disso, acertou-se que
Führer desejava expandir territórios com a colonização a União Soviética não reagiria a uma agressão alemã à Po-
racista e reinar absoluto no mundo capitalista. lônia e, em contrapartida, a Alemanha apoiaria uma inva-
Um mês antes do acordo, Stálin ainda não sabia o que são soviética à Finlândia.
fazer. Em primeiro lugar, não tinha certeza de que Adolf O mais interessante desse pacto de não agressão entre
Hitler iria aceitar o pacto ou se os líderes democratas eu- Alemanha e União Soviética é que ele não possuía ne-
ropeus iriam lhe estender a mão. No livro Stálin – Uma nhuma cláusula suspensiva para caso alguma das partes
Biografia Política, Isaac Deutscher afirma que “ele ainda resolvesse atacar a outra. As segundas intenções de Hitler
estava provavelmente disposto, em vista das incertezas, a estavam previstas na assinatura do pacto de não agressão.
selar um acordo com o lado que primeiro lhe estendesse E Stálin sabia disso.
a mão. Ele certamente teria integrado uma coalizão anti-
Hitler se os termos oferecidos pelas potências ocidentais A POLÔNIA E O INÍCIO DA SEGUNDA
tivessem permitido à União Soviética desempenhar um GUERRA
papel que Stálin considerasse à altura do país”. Uma vez que o pacto Molotov-Ribbentrop havia sido
oficializado, a Alemanha não perdeu tempo e invadiu a
PACTO DE NÃO AGRESSÃO Polônia em 1º de setembro do mesmo ano, precipitan-
Pois bem, quem estendeu a mão a Stálin foi Hitler e não do a Segunda Guerra Mundial. No dia 7 de setembro,
os países ocidentais. O comunista não deixou o nazista no Kremlin, ao lado de Molotov, Jdanov e Dimitrov, o
sem reposta e aceitou a parceria. Para firmar o pacto, o ditador soviético teria comentado: “A guerra está sen-
Ministro das Relações Exteriores da Alemanha, Joachim do travada entre dois grupos de países capitalistas. Eles
von Ribbentrop, viajou em segredo a Moscou em agosto querem novamente dividir o mundo entre si, eles pre-
de 1939. Na noite do dia 23 de agosto de 1939, estavam tendem dominar o mundo! Nós não temos nada contra,
presentes no Kremlin Ribbentrop seu equivalente russo se eles fizerem ataques arrasadores e se destruírem mu-
no organograma soviético, Molotov, e o próprio Stálin. tuamente. Não há mal algum que a Alemanha venha a
O acordo, conhecido como pacto Molotov-Ribben- colocar suas mãos sobre os países capitalistas mais ricos
trop, pacto Nazi-Soviético ou pacto Hitler-Stálin, na ver- (em especial a Inglaterra) e ali causar alguns danos. Sem
dade, transformou-se em dois. O primeiro deles, levado se dar conta, Hitler os enfraquece, pois ele solapa o sis-
ao conhecimento do público, estabelecia que os dois paí- tema capitalista pela base”. A invasão culminou
ses não se atacariam por um período de dez anos, nem na dominação completa da Polônia em 6 de outubro do
apoiariam um país que o fizesse. O segundo, mais impor- mesmo ano. Durante a operação, em 17 de setembro, a

40 | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | STÁLIN


ses conseguiram resistir até março de 1940, quando os
russos forçaram a um acordo, assinado com o nome de
Tratado de Paz de Moscou e que dava à URSS parte do
território finlândes.
Enquanto isso, na outra frente da batalha, Grã-Breta-
nha e França ainda precisavam de tempo para se preparar
para uma guerra entre gigantes. Mas esse tempo era exí-
guo, porque Hitler invadiu Bélgica, Holanda e Luxem-
burgo na primeira metade de 1940. Em junho, o Führer
colocava a França a seus pés numa das mais vergonhosas
derrotas dos militares franceses. Com Portugal e Espanha
permanecendo neutros, só faltava a grande Inglaterra para
o nazismo dominar praticamente toda a Europa.

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E a Operação Leão-Marinho – a invasão da Inglater-
ra – teria início já em julho, quando aviões da Força Aé-
rea Alemã, a Luftwaffe, passaram a bombardear navios no
Canal da Mancha. Entre junho e outubro, as duas potên-
cias travaram o maior conflito aéreo de todos os tempos.
Londres chegou a ser atingida, mas, em 12 de outubro,
Hitler percebeu que sacrificaria toda sua frota aérea para
União Soviética, seguindo uma cláusula secreta do pacto tomar a Inglaterra, um preço muito alto para quem já ti-
Molotov-Ribbentrop, também declarou guerra contra a nha outro plano na manga pronto a ser revelado – a inva-
Polônia, dando início à invasão da parte leste do país, são da União Soviética.
cercando-o de todos os lados.
A invasão foi um teste e uma importante lição para os OPERAÇÃO BARBAROSSA
alemães, que testaram suas forças, assimilaram os resulta- O confronto entre o nazismo de Hitler e o socialismo
dos e corrigiram os erros. Entre outubro de 1939 e maio de Stálin era inevitável, pois cada vez mais o mundo se
de 1940, as Forças Armadas Alemãs passaram por uma tornava pequeno para abrigar dois regimes totalitaristas
reformulação completa. Em compensação, em 3 de se- e fortes, ainda mais sendo vizinhos. Além disso, Adolf
tembro, em resposta às hostilidades, França e Reino Uni- Hitler nunca escondeu seu anticomunismo. No seu li-
do declararam guerra contra a Alemanha. vro Minha Luta (Mein Kampf ), publicado em 1925, o
O objetivo inicial dos nazistas era se apoderar das pro- Führer já falava nos planos de dominar completamente
víncias alemãs que o Tratado de Versalhes tinha dado à o leste europeu.
Polônia depois da Primeira Guerra Mundial. Mas o ver- A Alemanha respeitou o pacto Molotov-Ribbentrop
dadeiro alvo era muito mais sinistro e se tornou evidente por quase dois anos, até a madrugada de 22 de junho de
quando o exército alemão marchou para a Dinamarca e a 1941, quando o ditador alemão lançou a campo o maior
Noruega. Ao mesmo tempo, o Exército Vermelho cercou ataque aéreo-terrestre na história da guerra – a famosa
a Finlândia. Stálin temia que Hitler pudesse atacar a Rús- Operação Barbarossa –, que utilizou três milhões de sol-
sia via Finlândia e resolveu acabar com essa possibilidade. dados, 3.500 tanques e 1.800 aviões.
A guerra russa na Finlândia ficou conhecida como Como era de seu feitio e tinha dado certo até o mo-
Guerra de Inverno, pois aconteceu durante o duro in- mento, a ideia era empreender uma blitz rápida e capaz
verno báltico, quando a temperatura chegava a -40ºC. de liquidar a União Soviética antes da chegada do terrível
Lutando na proporção de um contra três, os finlande- inverno russo. Programada para maio, de fato a Operação

O acordo, conhecido como pacto Molotov-Ribbentrop, na


verdade, transformou-se em dois. O primeiro deles, levado ao
conhecimento do público, estabelecia que os dois países não
se atacariam por um período de dez anos, nem apoiariam um
país que o fizesse. O segundo, mais importante do ponto de vista
geopolítico, dividia e marcava as zonas de influência no leste europeu
STÁLIN | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | 41
sofreu adiamento e foi remanejada para junho, porque, às
vésperas da invasão, Mussolini pediu ajuda a Hitler de-
pois de sua atrapalhada invasão da Grécia, onde seu fra- “E assim, nós, nacional-socialistas,
co exército foi derrotado e ainda estava em vias de perder
a Albânia, conquistada em 1937, para os gregos. Hitler vamos voltar nossas vistas
enviou ajuda e dominou quase toda a região dos Bálcãs, para os países do leste.
atrasando o ataque à URSS, algo que se mostrou decisivo
para os rumos da guerra. Quando falamos hoje em novo
Formaram-se três frentes de batalha: o Norte, en-
carregado de ocupar Lituânia e Letônia rumo a Le-
território da Europa, devemos
ningrado; o Centro, que visava um ataque frontal à pensar principalmente na
capital Moscou; e o Sul, destinado a ocupar os vastos
campos de trigo da Ucrânia e o petróleo do Cáuca-
Rússia e nos seus Estados
so. O avanço alemão foi rápido no começo. Em ju- vassalos limítrofes. Esse
lho, a cidade de Smlensk já havia sido conquistada e
Leningrado (hoje São Petersburgo) estava em estado colossal império no leste
de sítio. Em setembro, a cidade de Kiev foi derrotada está amadurecendo para
a dissolução, e o fim do
com 650 mil soldados. No final do ano, mais de três
milhões de russos tinham sido presos e um milhão
deles, mortos. Os nazistas estavam de olho no Kre-
mlin. Mas Churchill, no dia da invasão alemã à
domínio judaico na Rússia será
União Soviética, fez um discurso de apoio à URSS: também o fim da Rússia como
“O perigo russo é nosso perigo e o perigo dos Esta-
dos Unidos, assim como a causa de qualquer comba-
Estado”, escreveu Hitler
te russo pela família e pela pátria é a causa dos ho- em Minha Luta
mens e dos povos livres em qualquer parte do globo.
Aprendemos as lições ensinadas por essa experiência

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cruel. Redobremos nossos esforços e ataquemos com
a união da força, enquanto nos restarem vida e po-
der”. Certamente, essa declaração era o prenúncio de
uma aliança que iria se consolidar em breve.  
Hitler esperava que Moscou fosse derrotada rapida-
mente. Entretanto, uma resistência feroz fez que os ale-
mães voltassem às planícies geladas. Stálin, que era um
lutador, permaneceu com o objetivo de reerguer o moral
do povo. A resistência russa era a luta pela própria sobre-
vivência, pois a colonização do território pelos alemães
faria das populações russa e eslava escravos, ou mortos.
Mais do que qualquer ideal ou bandeira, os russos luta-
vam para sobreviver.
Stálin entregou a tarefa de defender Moscou dos ale-
mães – que já chegavam a 60 km da capital – a seu mais
competente general, Georgy Zhukov. Tão truculento
e resoluto quanto seu patrão, ele reorganizou o Exérci-
to Vermelho e deslocou boa parte dele da frente oriental
para rechaçar os nazistas das cercanias de Moscou. Já era
dezembro, o inverno ardia em neve e frio. A união desses
dois elementos forçou Hitler a um recuo, salvando a ca-
pital russa das garras alemãs. Na sequência, Zhuvov pas-
sou à contraofensiva, empurrando as tropas nazistas para
mais longe, que a partir daí foram perdendo terreno. Em
janeiro de 1942, os russos já tinham forçado a Alemanha
Adolf Hitler
a recuar cerca de 200 km.

42 | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | STÁLIN


BATALHAS DECISIVAS queda de Mussolini e do regime fascista. Com os rumos
No ano de 1942, no entanto, quem visitasse a Europa acre- que a guerra tomava – o enfraquecimento do Führer em
ditaria que o continente estava nas mãos de Adolf Hitler, várias frentes – Churchill, Stálin e Roosevelt se encontra-
pois nem as derrotas parciais na Grã-Bretanha (1940) e ram em Teerã (Irã) no final de novembro de 1943 para dis-
na União Soviética (1941) tinham virado o jogo em favor cutir o que fariam dali em diante. As conclusões militares
dos Aliados. O começo do fim só aconteceu com a derro- estabeleceram as bases para o desembarque das forças alia-
ta alemã em El Alamein, que significou o fim do domínio das na Normandia (França), episódio que ficaria conhecido
ítalo-germânico no norte da África. como o Dia D, e o avanço da frente leste com os russos.
A grande virada da guerra aconteceu porque Hitler
foi ambicioso demais. Mesmo tendo sido detido pe- AVANÇO FINAL SOVIÉTICO
los soviéticos em Moscou e Leningrado em 1941, ele Ainda em Teerã, Stálin, reconhecido como essencial na
planejou uma nova batalha em 1942. “Continuaremos vitória contra os nazistas, conseguiu impor a Churchill e
a luta no leste. Massacraremos o colosso soviético até Roosevelt a definição de uma nova fronteira com a Po-
fazê-lo em pedaços”, disse o Führer. Com seu espírito lônia, além de confirmar seu direito de exigir governos
megalomaníaco, o líder nazista quis atacar Stálingrado amigos nos Estados limítrofes. Esse foi o primeiro passo
e o Cáucaso de uma só vez, dividindo suas forças. Seus para impor novamente o poder soviético na região. Mas,
generais alertaram que seria mais prudente tomar uma antes, era preciso reconquistar todo o território perdido
cidade por vez, mas ele não deu ouvidos. Do outro lado, para os nazistas. Em 1943, retomaram Kursk, na Ucrâ-
Stálin comandava seus generais para retardar ao máxi- nia, e, em 1944, o Exército Vermelho conseguiu romper
mo a chegada dos nazistas a Stálingrado, para que pu- o cerco a Leningrado. Em maio do mesmo ano, recon-
dessem organizar a defesa. quistou a Crimeia. Outras partes importantes do Leste
O ataque a Stálingrado aconteceu em 23 de agosto foram recuperadas pelo rolo compressor soviético: Fin-
de 1942. A população engajou-se na luta ao cravar trin- lândia, Bulgária, Hungria e Prússia Oriental.
cheiras, produzir tanques nas fábricas e empunhar fu- Antes de se lançar sobre Berlim, os soviéticos
zis. Mesmo assim, estava complicado conter o avanço conquistaram Viena, na Áustria, em 13 de abril de
do Eixo, e as tropas nazistas chegaram a ocupar o centro 1945. Em seguida, foram para o Oeste. Com o fra-
de Stálingrado. Em 16 de novembro de 1942, porém, a casso, Hitler abriu o espaço tão esperado por Stá-
temperatura baixou de forma brusca e os soviéticos vie- lin para a virada do jogo. Mas o Führer não desistiu
ram com uma contraofensiva. Hitler não admitia a ren- e ficou para defender Berlim até o fim, mesmo sa-
dição àquela altura e, por isso, seu general Paulus man- bendo que não havia saída para a Alemanha. Em 16
teve-se na linha da batalha, rendendo-se somente em de abril, os norte-americanos haviam tomado Nu-
31 de janeiro de 1943. A vitória em Stálingrado animou remberg e, cinco dias mais tarde, as tropas soviéticas
– e muito – os soviéticos a resistir em outras cidades. A estavam nos arredores de Berlim. O último ato da
guerra não havia terminado, mas Adolf Hitler havia so- Segunda Guerra Mundial na Europa aconteceu em
frido um dos golpes mais duros. 30 de abril de 1945, quando os soviéticos estavam a
A derrota final da Alemanha nazista estava se aproxi- apenas um quarteirão da Chancelaria. Hitler e sua
mando. A invasão da Itália pelas tropas aliadas precipitou a companheira Eva Brown se suicidaram. Era o fim do
nazismo. Era o fim da Guerra.
Stálin era um homem inteligente que conseguiu,
O confronto entre a foice e o com paciência, virar o jogo. Jogo esse de puro inte-
martelo do senhor do Kremlin
resse dos dois lados. Hitler e Stálin nunca foram ami-
gos, mas apenas estiveram do mesmo lado por alguns
e a suástica do senhor do instantes e por não encontrar outros aliados naqueles
Reich era inevitável, exatos momentos. Por isso, vieram a traição nazista e a
aderência de Stálin aos Aliados. A vitória aliada contra
pois, cada vez mais, o mundo o nazismo rendeu à URSS mais de 20 milhões de mor-
tes e um esforço de guerra como nunca visto antes. A
se tornava pequeno intensidade da industrialização exigida forçou o país a
para abrigar dois regimes produzir material bélico de forma constante, aquecen-
do a economia, e transformando a URSS na segunda
totalitaristas e fortes, ainda maior potência do planeta e abrindo espaço para a dis-
mais sendo vizinhos puta com os Estados Unidos, o que se consolidaria pelo
nome de “Guerra Fria”.

STÁLIN | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | 43


A polarização
do mundo
Morte

Ao fim da Segunda Guerra Mundial, a União Soviética era tida como grande
vencedora do conflito, apesar de sua situação precária. Stálin surgia como
um líder notável, ao lado de Roosevelt e Churchill

N
Por Lucas Pires

ada parecia mais grandioso do que a vitória norte-americana para a reconstrução da Europa –, que
russa sobre os nazistas. E talvez ninguém te- ele via como uma forma de dependência contrária a seus
nha se achado com mais direito de se sentir ideais.
responsável por ela do que Josef Stálin. As Diante disso, renegou qualquer forma de auxílio dos
comemorações e o culto à personalidade dele após a EUA e passou a apoiar governos pró-soviéticos no Les-
Guerra foram de caráter esplêndido. Mesmo totalmente te Europeu. Assim, países como Iugoslávia, Polônia, Ro-
destruída, a população mantinha a fé e a esperança não mênia, Bulgária, Tchecoslováquia e até parte da Alema-
tanto na União Soviética, mas em Stálin. Se ele viveu seu nha – chamada de Alemanha Oriental depois da divi-
apogeu de popularidade, foi naquele momento de 1945. são do país em quatro áreas de influência – passaram
“A nação estava mutilada e faminta. Provavelmen- a ter governos comunistas ou controlados por Moscou.
te esperava que milagres viessem da vitória e do gover- A intenção de Stálin era justamente ter parceiros nes-
no. Queria ver as cidades reconstruídas e as indústrias e a ses países para vender e adquirir provisões. Essa ação foi
agricultura restabelecidas. Ansiava por mais comida, mais chamada por Churchill, de “cortina de ferro”, em que o
roupas, mais escola, mais lazer. Mas nada disso podia ser líder soviético separava a URSS e os demais países sob
obtido rapidamente a partir dos recursos exauridos e de- seu domínio do resto do mundo. Essa “cortina” interes-
sorganizados da Rússia. O sofrimento, em meio ao ar- sava muito a Stálin, pois preservava certo mercado para
rebatamento da vitória, mostrava-se duplamente impa- os russos e ainda impossibilitava a obtenção de informa-
ciente; e Stálin não podia frustrar a nação. Para acelerar ções de seu país por parte do mundo ocidental, que aca-
a reconstrução e melhorar o padrão de vida, devia valer- bava por saber muito pouco do governo soviético e de
-se dos recursos econômicos de outras nações”, escreveu suas ações internas. Para Deutscher, “a ‘cortina de ferro’
Deutscher. escondeu a autocracia de Stálin, seu despotismo sinistro,
E foi isso que Stá- mitos e fraudes. Em ambas as funções, a ‘cortina de ferro’
lin começou a fazer tornou-se a condição indispensável para a própria exis-
quando percebeu que tência do Stálinismo”.
as nações ocidentais o No campo interno, Stálin centralizava tudo em sua
viam com pessoa, eclipsando os generais e militares que tiveram na
des- guerra uma explosão de popularidade, como o marechal
dém e Jukov. Praticamente um ano depois da vitória, imprensa
que pla- e propagandistas tinham esquecido os “heróis” da nação
nos de que lutaram contra os nazistas. Para se ter ideia, a come-
ajuda eco- moração do terceiro aniversário da tomada de Berlim
nômica seriam pelo Exército Vermelho foi feita pelo Pravda, sem que
formas de conver- fosse mencionado o nome de Jukov.
ter o comunismo A população teve que manter a rigidez da vida do
russo em capitalis- período de guerra, com a implantação de um quarto pla-
mo. Mesmo precisan- no qüinqüenal. Mulheres e crianças tinham de traba-
do de ajuda financei- lhar, pois toda uma geração de homens havia morrido
ra, Stálin acabou des- em batalha.
Felipe Azjemberg

denhando do Plano Em 1947, a Doutrina Truman expunha a Guerra


Marshall – a ajuda Fria com seus contornos finais. O que antes estava no

44 | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | STÁLIN


ar, ainda a ser definido, passou a ganhar entornos con-
cretos. Mal uma guerra acabava e outra já se moldava.
Dessa vez, com toques nucleares, já que os EUA pos-
suíam a bomba atômica e, em 1949, os cientistas rus- Até sua morte, em 1953, Stálin
colocou a URSS em oposição
sos a desenvolveram também. O medo de um embate
nuclear entre as duas superpotências tomou conta do
mundo. Cada um desses protagonistas passou a trazer aos demais países vencedores
para seu bloco os demais países. Os Estados Unidos fi-
caram com o mundo ocidental; a URSS transformou da guerra. Sua luta contra
o capitalismo o levaria a
o Leste Europeu em satélites de Moscou e viu a re-
volução comunista chegar à China. A partir de 1950,
Stálin começou a se ausentar de Moscou e do governo,
mas, em compensação, crescia o culto à sua imagem.
incentivar o comunismo
Ele passou a ser figura onipresente em toda parte, des- em diversos países no Leste
de barbearias até cinemas e teatros.
Em 1951, extremo de seu egocentrismo e sua mega- Europeu e a polarizar o
lomania descontrolados, mandou construir uma estátua
sua, de corpo inteiro, para ser colocada no canal Volga-
mundo com os Estados Unidos
Don. Editorial do Pravda em 1950 fazia referência aos
“poderes” de Stálin. “Se você estiver com algum proble- tam mesmo que Stálin foi envenenado. Mas as evidên-
ma, se encontrar alguma dificuldade no trabalho, se ti- cias são todas mesmo de que o grande líder morreu em
ver alguma dúvida quanto ao que é capaz de fazer, pense decorrência de um derrame.
nele, em Stálin, e se sentirá novamente forte e confiante. Na manhã de domingo do dia 1o de março, Stálin não
Se acaso se sentir cansado quando ainda há trabalho a levantou na hora costumeira. Os empregados e demais
ser feito, pense nele, em Stálin, e encontrará novas for- funcionários estranharam que ele não deixara o quarto o
ças. Se você estiver em dúvida quanto à melhor decisão dia todo, mas estavam receosos de bater e entrar em seus
a tomar, pense nele, em Stálin, e verá que é fácil decidir... aposentos. Apenas às 22h30 resolveram entrar e ver o
“Esse pensamento de confundir Stálin com o povo, com que havia acontecido. Foi aí que se depararam com Stá-
o Estado soviético, era de fato algo inerente a ele. Cer- lin caído ao chão de pijamas. Havia tido um derrame.
ta vez, o líder soviético brigou com seu filho Vassili por O estado médico dele era um segredo para todos
este ter se aproveitado de seu nome. “Eu também sou desde quando tivera seu primeiro derrame em 1945.
um Stálin”, teria o dito filho. E a resposta do ditador foi Ele mandara queimar seu dossiê médico. Apesar de ve-
a seguinte: “Você não é um Stálin e eu não sou Stálin. rem que Stálin tivera um derrame, os médicos não fo-
Stálin é o poder soviético. Stálin é o que ele é nos jornais ram chamados, mas, sim, os superiores do Partido, com
e nos retratos, não você, nem mesmo eu!”. Kruschev e Bulganin. Receosos de que a doença che-
gasse à imprensa, retardaram chamar uma junta médica,
A MORTE DE STÁLIN que só avaliou Stálin no dia 2 de março. A opinião de di-
Assim, cada vez mais ausente e menos aberto a pen- versos médicos foi unânime. O líder vivia uma situação
sar num herdeiro, Stálin adentrou o ano de 1953. Do- crítica – havia tido uma hemorragia no lado esquerdo do
ente e avesso a remédios, acabou falecendo no início de cérebro, causada por pressão arterial alta e arteriosclero-
março. Sua morte ainda é tema de polêmica, com al- se – cujo fim seria a morte em questão de dias.
guns historiadores questionando os fatos. Outros apon- No dia 5 de março, em reunião do Partido, Malenkov
foi conduzido ao cargo de Presidente do Conselho de
Ministros. Na ocasião, um relato médico da saúde de
AFP

Stálin foi lido. Ao fim da reunião, os principais nomes


do partido chegaram em tempo à casa de Stálin para ou-
vir do médico, às 21h50, que o líder estava morto.
Talvez tenha sido um alívio a morte dele. A URSS
parecia que seguiria novos rumos com a saída de cena de
seu maior líder e construtor da nação. Em 1956, Kru-
shev seria conduzido a chefe da nação e, no XX Con-
gresso do Partido, faria as revelações sobre as atrocidades
de Stálin. Era o rompimento oficial com o passado stali-
nista. Uma nova geração de russos chegava ao poder.
Stálin morto
em 1953
STÁLIN | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | 45
O legado

O legado

J
osef Stálin é até hoje figura amplamente discuti-
A morte de Stálin foi sobreposta da e, da mesma forma, largamente combatida. No
por revelações de um Ocidente, seu nome causa ojeriza em milhões e
é sinônimo de tudo o que a civilização ocidental
regime cruel e totalitário, que sempre combateu – marxismo, socialismo, totalitarismo,
surpreenderam até mesmo os estatização e economia fechada. O comunismo, incorpo-
rado no Estado bolchevique construído por Stálin, foi o
mais fanáticos dos comunistas. grande inimigo do Ocidente e de seus valores no século
20, assim como o terrorismo é para o século 21, só que
Seus herdeiros, cientes disso, com uma diferença – o comunismo tinha um rosto, um
passaram a governar em vista país a ser combatido. Mesmo concordando com as acu-
sações a Stálin e a seu plano de governo, que envolveu
da Guerra Fria e buscaram trabalho forçado, fome, miséria, prisões arbitrárias, exílio
desmontar o aparelho burocrático e, o pior de tudo, o terror instaurado com os expurgos de
nomes-chave do partido bolchevique nos anos 1930, não
erguido por ele há como escapar de considerações positivas, ao menos em
seu resultado final.
Por Lucas Pires Mesmo Hitler, talvez a maior encarnação do Mal,
pode ser “lido” por seu viés positivo – ao menos em

46 | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | STÁLIN


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sua qualidade de unir uma nação – que foi seguido de lin é seu grande desenvolvimento econômico. De um
propósitos negativos, o de guiá-la a um caminho in- país basicamente agrário, ele transformou a URSS na
sano e totalmente destruidor. Assim também pode ser segunda maior potência do mundo, tendo desenvolvi-
visto Stálin, que, por bem ou por mal, olhe-se o papel do mesmo o poder nuclear. Em 1949, o líder soviético
geopolítico da Rússia pré-revolução e a nação sovié- fez explodir a primeira bomba atômica russa.
tica quando de sua morte, não tem como não confir- Outro ato imensurável de valor realizado pelos rus-
mar a guinada econômico-industrial da União Sovi- sos foi a vitória contra o nazismo. Apesar de parte da
ética. Se há um dado louvável da administração Stá- historiografia rever o papel de Stálin na esfera decisi-

STÁLIN | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | 47


Hoje, olhando para seu legado, há algumas conclusões das
quais não há como escapar: Stálin industrializou e transformou a
URSS em uma potência mundial, mas sob um alto custo humano,
que envolveu milhões e milhões de vidas
va da vitória sobre o exército de Hitler, os louros na épo- Se os fins justificam os meios, como queria Maquia-
ca recaíram todos sobre seu grande líder. Tendo cometido vel no século 16, não é tão certo assim que no século 20
erros no caminho, decisões precipitadas que arruinaram as coisas fossem compreendidas da mesma forma. O sé-
tropas e que simplesmente respondiam a um ego inflado e culo que viveu a maior carnificina empreendida pela hu-
ferido, fato é que, aos trancos e barrancos, a URSS venceu. manidade não pode se dar ao luxo de não prestar aten-
Derrotou os poderosos alemães, tomou Berlim e se posi- ção aos meios. Stálin esqueceu-se disso. Os valores so-
cionou no mundo como um jogador à altura das grandes cialistas por ele e sua Revolução apregoados acabaram
potências ocidentais. Afinal, quem era mais importante ficando em segundo plano diante das atrocidades come-
em 1945: o chefe da nação que encurralou Hitler ou che- tidas. O período do terror, em que houve perseguição e
fes políticos de países como França, que acabaram ocupa- fuzilamento de velhos companheiros, não deixa esque-
dos e vencidos pelos nazistas sem dificuldades? cer a que ponto a obsessão stalinista chegou. Da mes-
O grande erro de Stálin foi ter desleixado dos meios ma forma, a burocracia da corte bolchevique, denuncia-
em favor dos fins. Ou, em frase repetida a respeito dele, da por Trótski nos anos de 1930 e pela qual ele pagaria
foi ter se proposto a “livrar a Rússia da barbárie por com a vida, acabou minando os alicerces da Revolução
meios bárbaros”. Para chegar ao que ele desejava e acha- de 1917, levando seu vagão para outros rumos que não
va que era o melhor para seu país, em nome do parti- os idealizados por Lênin e Trotski. Este, afinal, seria va-
do que representava o povo, Stálin tomou as ações mais lorizado ainda mais após a morte de Stálin e as revela-
destemperadas possíveis, empreendeu planos quinque- ções de seus crimes. Um sentimento de “Trótski estava
nais que causaram, ao final, o desenvolvimento do país, certo” sedimentou-se na historiografia tradicional e rege
mas que deixaram no caminho milhões e milhões de ci- o estudo da história russa até hoje.
dadãos russos mortos. Sem contar os presos, exilados e Mas, afinal, quem foi Stálin? O que ficou de seus
não contabilizados. Fala-se em um expurgo de mais de mais de 30 anos à frente do partido comunista sovié-
50 milhões de russos em seu período. tico? O que ficou de seu projeto de nação construído à
Mesmo durante a Guerra, a lei de ferro de Stá- base de sangue e força bruta? Talvez não tenha ficado
lin não arrefeceu. Na linha de combate, por exemplo, nada além da própria história, que é conhecimento para
aqueles que desertassem eram sumariamente fuzilados. que novos erros não se repitam. Muito temos a aprender
O mesmo acontecia com aqueles que se deixassem ser com Stálin, mas mais ainda com a história da qual ele
capturados. Como a ordem era lutar até a morte, aque- participou. Esta jamais poderá ser apagada ou esqueci-
le que acabasse preso era considerado traidor, pois não da. Assim como uma história das revoluções e das men-
“cumprira” a lei. O resultado foram 20 milhões de mor- talidades tem em Stálin um protagonista de peso no sé-
tos em combate, número que poderia ser muito menor, culo 20, sua revolução inspirou tantas outras pelo mun-
caso Stálin não fosse tão cruel com seu próprio povo do – China e Cuba são as mais notáveis. E, assim como
para obter os resultados esperados. a de Stálin, ambas parecem estar se rendendo ao poder
Essa relação entre desejo de um homem e resultado capitalista, à sociedade de consumo que tomou o planeta
sempre foi perseguida por ele. Era comum Stálin falar definitivamente após a queda da URSS.
ao povo e prever metas de produção para os setores. Na O que, para o século 21, ficou de Stálin foi a expe-
maioria das vezes essas metas eram cumpridas, quando riência comunista em um país atrasado e primitiva-
não superadas. A frieza com que via camponeses traba- mente industrializado. A tentativa, hoje já esquecida e
lhando como escravos para bancar a industrialização era amaldiçoada, de instalar um Estado socialista no mun-
traço marcante e que seus inimigos não perdoariam até do. Quando da Revolução, Lênin tinha noção de que a
hoje. Stálin nutria profunda indiferença à vida alheia. A Rússia não estava pronta para o socialismo. Hoje, pare-
morte fazia parte de seu projeto de nação. Aqueles que ce que ele tinha razão. Stálin, no fim das contas, parece
morressem trabalhando ou lutando pelo país eram cida- que serviu para acabar com certas utopias do homem.
dãos russos de verdade. Seu desejo e sua vontade con- A utopia do socialismo parece ser uma delas. Ao me-
fundiam-se com o interesse da União Soviética. Afinal, nos o socialismo personalizado em Stálinismo. Este
ela fora construída à sua imagem e semelhança. não tem mais chances de brotar.

48 | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | STÁLIN


G u i a

Aprofunde-se no assunto
Por Lucas Pires

UmStálinDesconhecido Stálin – A Corte do


Zhores Medvedev e Roy Medvedev
Czar Vermelho
Editora Record
Simon Sebag Montefiore
Os autores tiveram acesso ao
Cia. das Letras
arquivo soviético revelado em 1990
Obra monumental recém-lançada,
e conseguiram desvelar questões
que trata da personalidade de
enigmáticas da vida de Stálin e da
Stálin através de sua vida privada e
União Soviética por ele criada, como
da biográfia construída a partir de
as elucubrações sobre sua morte, um
bilhetes dos arquivos soviéticos. O
possível herdeiro e os antecedentes
autor trabalha concomitantemente
ao XX Congresso do Partido, em que
eventos de sua vida pessoal junto
Krushev revelou ao mundo um Stálin até
dos de sua vida pública, focando
então desconhecido. São diversos capítulos em que em cada um
o período do auge do poder
dos autores traz à tona novas informações sobre o todo-poderoso
stalinista – a década de 1930 – e o
Stálin.
que ele chamou de sua corte – os
colaboradores mais próximos com
os quais Stálin vivia e se divertia. A linguagem é acessível e de
L I V R O S fácil compreensão.

Stálin – Uma Biografia Stálingrado:


Política Cerco Fatal
Isaac Deutscher
Antony Beevor
Civilização Brasileira
Editora Record
Biografia escrita na década de 1960 sob
Por meio da análise de arquivos e
o impacto das declarações de Kruschev
relatórios extraoficiais, o autor mostra que
no XX Congresso do Partido, quando
a perda de milhares de vidas sofrida pela
os crimes de Stálin foram revelados.
URSS não se deveu apenas à ação dos
O autor faz uma pesquisa longa e
invasores alemães, mas ao desprezo de
completa, focando a ascensão de Stálin
Stálin por seu próprio povo, mobilizado
no partido, a rixa com Trótski e os anos no poder. Como o nome
em prol da guerra.
já diz, busca ser uma biografia política, o que deixa de fora boa
parte da vida pessoal do biografado.

Stálin: Um Novo Olhar


Ludo Martens
As Revoluções Russas e Editora Renan
o Socialismo Soviético Livro de um autor revisionista e
Daniel Aarão Reis Filho declaradamente stalinista, que escreveu
Editora UNESP sua obra buscando derrubar os “mitos”
Obra apresentativa das revoluções de e as “mentiras” em torno da aura
1905 e 1917, passando por todo o período de demônio que o Ocidente teria
comunista da Rússia, então chamada de criado ao redor de Stálin. O autor tem
União Soviética. Ótimo livro para quem argumentos para quase todas as ações de Stálin, mesmo as sem
quer se introduzir no cenário da Revolução explicações, como os expurgos, mas o alvo maior de Martens é
e de como o país tratou de crescer Trotski, a quem pinta como um derrotado ressentido e mesmo
economicamente num sistema socialista. anticomunista.

STÁLIN | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | 49


Lenin e a
Lenin – Coração Revolução Russa
Oziel Gomes
e Mente Editora Expressão Popular
Tarso Genro e Como o nome já diz, o livro aborda a figura
Adelmo Genro Filho de Lênin e o contexto da Revolução Russa
Editora Expressão Popular de 1917 de forma didática e linguagem
A partir da biografia de Lênin e simples.
da Revolução Russa, os autores
buscam apresentar uma síntese do
pensamento leninista. Discorrem
didaticamente sobre as principais
Era dos Extremos –
obras dele, tentando trazer à O Breve Século XX
tona um verdadeiro instrumento Eric Hobsbawm
revolucionário, que é a teoria Cia. das Letras
marxista-leninista. Obra monumental que faz uma análise do
que o autor chamou de “breve século 20”
(teria começado com a 1a Guerra Mundial e
acabado com o fim da URSS). Interessante
notar os valores dados pelo historiador
britânico marxista, que sabe se manter

O Estado e a crítico quanto à experiência soviética, mas, ao mesmo tempo,


enxerga a importância que teve a Revolução de 1917, não apenas
Revolução para a Rússia, como para todo o mundo. Enfim, ótimo livro para
Wladimir Lenin quem quer entender o século 20, que foi o século em que Stálin
Editora Expressão Popular viveu e ajudou a moldar.
Escrito em 1917, logo após a
divulgação das “Teses”, que
subverteram a posição do partido A Revolução Russa
diante da Revolução Russa. Maurício Tragtenberg
Nega a viabilidade do controle Editora UNESP
revolucionário do poder pela Reeditado em 2007, mas originalmente de
burguesia; suscita o problema 1988, este livro faz um estudo da experiência
da transformação do Partido, revolucionária da União Soviética antes de seu
do papel do proletariado na fim oficial, mas ali já estava a análise das razões
Revolução e da tomada do poder do fracasso – segundo o autor, a desconfiança na
pelas classes trabalhadoras. capacidade da classe trabalhadora e a ação não-democrática que
resultou no monopólio político e no controle do Estado.

F I L M E S
O Encouraçado Potemkin (1925) Outubro (1927)
Serguei Eisenstein Serguei Eisenstein
Em 1905, marinheiros do encouraçado Potemkin se Fita encomendada pelo partido para as
rebelam a bordo em razão da má qualidade da comida comemorações dos 10 anos da Revolução, ela
servida. Ao mesmo tempo, acabam se unindo aos retrata o cenário russo de outubro de 1917,
populares revoltosos com o “domingo sangrento”. com a tomada do Palácio de Inverno pelos
Nessa obra clássica do cinema mudo – a obra-prima populares e bolcheviques. A figura de Lênin
de Eisenstein –, o diretor pôs em prática sua teoria da ganha ares messiânicos, e Eisenstein faz outro
montagem, criando um filme poderoso em imagens e filme mudo cuja potência está na montagem
em conteúdo. Era o cinema revolucionário soviético em e na concepção dos personagens e eventos
seu mais alto grau. Indispensável. históricos.

50 | GRANDES LÍDERES DA HISTÓRIA | STÁLIN


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