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2. ENREDO
Imagine fechar os olhos no movimento involuntário de piscar e ao abrir, se ver
tomado por uma branquitude leitosa? Pois foi exatamente o que aconteceu na
apresentação da narrativa com o chamado “o primeiro cego”, um homem que estava
apenas parado em um sinal vermelho ao piscar, simplesmente estava cego! Neste primeiro
momento, a história é ambientada em uma rua movimentada, com pessoas em suas vidas
normais, que não esperavam o que estava por vir, mas grande parte da história irá se
passar em um manicômio abandonado, ao ser percebida a complicação do enredo: esse
mal é contagioso. Dentro desse lugar serão colocadas, por determinação do governo, todas
as pessoas que forem atingidas pela cegueira branca que “surgiu” no primeiro cego.
Dentro deste manicômio, as pessoas vão ser levadas ao limite (tanto mental, quanto
físico), fazendo com que possamos ver humanos em um estado quase animal, não
vivendo, mas sobrevivendo e nos fazendo refletir sobre a nossa essência como ser vivos,
sobre até onde vai nossa racionalidade.
Após vários episódios extremos, como a falta de comida no manicômio, a
necessidade de pagar por essa comida que já era escassa (inclusive pagar com os corpos
das mulheres, que eram coletivamente estupradas), o enredo começa a se encaminhar para
o seu clímax quando a mulher do médico mata o chefe da gangue de cegos maus.O clímax
chega quando uma das mulheres que era estuprada ateia fogo aos colchões da camarata
dos cegos estupradores, se sacrificando junto no ato e causando um incêndio que destrói
todo o lugar. Os cegos que conseguem escapar do fogo fogem, e partir da fuga, o que
podemos considerar o núcleo de personagens principais (os cegos da primeira camarata)
se mantém juntos à mulher do médico passam a explorar o novo velho mundo epidêmico
até que a única que enxerga entre eles perceba que toda a gente do mundo havia cegado.
Depois de visitarem as casas de cada uma das pessoas do grupo guiados pela
mulher do médico, enquanto enfrentam os mesmos problemas por falta de comida que
existiam dentro do manicômio, os cegos se estabelecem na casa do médico, e a narrativa
tem seu desfecho tão inusitado quanto sua apresentação: da mesma forma que a cegueira
veio, ela vai embora, e todos continuam ignorantes quanto aos motivos que causaram tal
surto.
5. NARRADOR
Nós sabemos que “O narrador é o elemento interno à narrativa que conta a estória”
(PINNA, 2006, p. 157), o que faz com que esse acabe sendo o elemento mais próximo do
leitor, visto que eles estão em contato direto. O narrador de Saramago é um dos elementos
mais curiosos construídos pelo autor, pois de acordo com ele “Não se pode contar como se
não há o que contar, mas pode acontecer de você ter o que e ficar paralisado porque não tem
o como.” apud (COSTA, 1998). Ou seja, Saramago dá bastante importância à forma que suas
histórias vão chegar ao leitor. Dessa forma, em Ensaio Sobre a Cegueira, nós encontramos
um narrador em terceira pessoa, observador, heterodiegético, que não é um personagem, e
sim uma figura que observa o desenrolar da história de forma onisciente e onipresente. Além
de tudo, ele é também um narrador intruso, pois ao passo que narra, ele vai tecendo
comentários próprios e até mesmo dialogando com o leitor.
A narrativa saramaguiana subverte os sinais de pontuação, retira traços convencionais
de diálogo e cria novas regras de construção textual. Tal forma de narrar remete à realidade,
de certa forma, pois Saramago acredita que “Para que a palavra soe desperta é preciso dizê-la;
ler silenciosamente as palavras não é suficiente” apud (COSTA, 1998). Graças a esse tom de
realidade, a voz do narrador se assemelha a de um antigo sábio contador de histórias,
justamente para remeter à oralidade e fazer com que a palavra soe desperta. Ao mesmo tempo
que essa subversão das regras remete à realidade, ela também causa estranhamento no leitor,
o que exige um papel ativo para a compreensão do que está sendo retratado e faz com que a
leitura seja tão interessante.
6. PERSONAGENS
Ensaio sobre a cegueira apresenta personagens redondos, tendo como protagonista a
mulher do médico, que vai guiar todos os outros cegos ao longo da narrativa. No núcleo de
personagens mais relevantes, encontram-se, além dela, o Médico, a rapariga dos óculos
escuros, o velho da venda preta, o primeiro cego, a mulher do primeiro cego e o menino
estrábico.Os personagens da obra não são identificados por seus respectivos nomes, mas sim
por suas profissões ou por uma característica física marcante. Essa é uma ferramenta usada
pelo autor para inconscientemente despertar no leitor um dos principais conflitos abordados
no livro: a desconstrução do conceito de humanidade como se conhece. É senso comum que o
nome próprio é uma maneira de identificação, representando o direito humano à
personalidade. Ao tirar isso dos personagens, Saramago inicia o processo de detrimento da
individualidade em meio ao caos que se instala com a epidemia.
Outro ponto abordado é que o autoquestionamento dos personagens guia a narrativa.
Neste aspecto, é importante citar que as suas ações são motivadas pelo instinto de
sobrevivência, o que os leva a cometer atos extremos, que seriam condenados numa
sociedade civilizada, como a troca das mulheres por comida, por exemplo. Isso faz com que
todos constantemente se questionem acerca das suas crenças e valores, e, por conseguinte,
retomando o processo de fragmentação da sua identidade e humanidade (CAMARGO, 2015).
É a postura extremamente solidária e empática da Mulher do Médico durante toda a
obra que torna a sua personalidade protagonista; a encarregada de ser os olhos dos que já não
o tem. Em meio a todos os horrores que não pode evitar presenciar, ser a encarregada de estar
sempre pronta para servir aos cegos torna-se um fardo, o que a leva a uma crise identitária e,
portanto, encaixando-se na descaracterização prevista por Saramago.
7. TEMPO
8. ESPAÇO
Em uma narrativa é o lugar onde se passa a ação, os acontecimentos. Quando lemos
uma história pensamos no seu elemento visível, o espaço, o tempo é o elemento invisível que
é preenchido pelo espaço, por isso eles são indissociáveis. Nós temos, em Ensaio sobre a
cegueira, vários espaços onde ocorrem a narrativa. Primeiramente em uma rua, onde o
primeiro cego estava quando cegou. Temos sua casa, para onde ele espera sua mulher, que o
leva ao consultório do médico. Entretanto, apesar de aparecerem vários espaços muito bem
descritos, temos o espaço principal onde se passa uma grande parte da narrativa: o
manicômio abandonado onde os primeiros cegos fazem quarentena.
“Havia mais camaratas, corredores longos e estreitos, gabinetes que deviam ter sido
de médicos, sentinas encardidas, uma cozinha que ainda não perdera o cheiro de má
comida, um grande refeitório com mesas de tampos forrados de zinco, três celas
acolchoadas até à altura de dois metros e forradas de cortiça daí pra cima. Por trás
do edifício havia uma cerca abandonada, com árvores mal cuidadas, os troncos
davam a ideia de terem sido esfolados. Por toda parte se via lixo.” (SARAMAGO,
José. 1995, p. 47)
9. REFERÊNCIAS
A DESCONSTRUÇÃO do romance na pós-modernidade. Todas as Musas, [S. l.], ano 10,
p. 117-144, 25 jul. 2018. Disponível em:
file:///C:/Users/SERVIDOR/Downloads/19Alvaro_Cardoso%20(1).pdf. Acesso em: 7 maio
2022.
IBEIRO, Luiz A. O dia em que José Saramago teve a ideia do livro Ensaio Sobre a
R
Cegueira. Disponível em:
<https://notaterapia.com.br/2020/10/13/o-dia-em-que-jose-saramago-teve-a-ideia-do-livro-en
saio-sobre-a-cegueira/>. Acesso em: 13 maio. 2022.
SARAMAGO, José. Ensaio sobre a Cegueira. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.
SILVA, Maria Ivonete C. Ensaio sobre a cegueira: um olhar que transcende o olho. 2002.
Tese (Mestrado) - Pós-Graduação em teoria da literatura, Universidade Federal de
Pernambuco, Recife, 2002.
SILVA, Hudson Marques da. O VISÍVEL E O INVISÍVEL EM ENSAIO SOBRE A
CEGUEIRA, DE JOSÉ SARAMAGO. 2012. Tese (Mestrado) - Pós-Graduação em
Literatura e Interculturalidade, Universidade Estadual da Paraíba, 2012