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EU TENHO AQUI, A ÍNTEGRA DA ENTREVISTA DE "JOSÉ

CARLOS PACE” À REVISTA VEJA EM 1975


ADAPTAÇÃO DE: WILIAM JOSÉ TOMAZ

Isso que trago aqui, é uma relíquia...


Tenho isso guardado há alguns anos.
Na realidade, eu tirei isso do Acervo Digital Veja – que visitei somente nesse dia.
Mas, brevemente vou lá dar minhas pescoçadas, ávido que estou por assuntos que
me propiciem dar continuidade ao meu livro.
Mas, tive muita sorte ao encontrar essa entrevista do nosso José Carlos Pace, para a
Revista Veja, em sua edição nº 325, do dia 15 de Janeiro de 1975.
É importante salientar, que essa revista saiu exatos 11 dia antes do Grande Prêmio
do Brasil, lá em Interlagos.
E, nessa corrida, José Carlos Pace conquistaria sua primeira vitória na Fórmula 1,
pilotando um carro da equipe Martini Racing (Brabham BT44B), tendo Emerson
Fittipaldi como segundo, ao seu lado no pódio, numa dobradinha histórica para nós.
Essa entrevista, que publico aqui, é cópia fiel da que a revista exibiu na época.
Faça você mesmo um parâmetro que vou te propor agora:
nas palavras de José Carlos Pace, ele deixa claro seu descontentamento com os
rumos que aos poucos a Fórmula 1 começava a tomar.
Você que veio “na lâmina do tempo”, pode dizer isso que vou dizer aqui?
Tudo isso que hoje está acontecendo na Fórmula 1, poderia ter sido evitado, caso os
administradores tivessem agido com mais sobriedade.
A Fórmula 1 dos tempos de Pace, começava a se transformar em espetáculo... digo:
em show.
Já começava a deixar de lado o romantismo das amizades extra pistas entre os
pilotos, e se deixava levar pela rivalidade rixosa entre alguns desses pilotos – fato
que também se estendia para as equipes.
Aqui você vai ler e sentir nas palavras de Pace, a franqueza peculiar ao cara que
enxerga competição como um sacerdócio – onde tudo para ele deve ser levado a
sério.
O mesmo Pace de 1975, se reencarnou no Piquet de 1978, e no Senna de 1984,
vindo mais tarde encontrar Barrichello e Massa nesse mesmo dilema.
Isso fez desses caras vencedores iguais ao cara, que no dizer de Piquet “colocou o
ovo em pé” para o Brasil na Fórmula 1: Emerson Fittipaldi.
...
Leiam com bastante atenção essa entrevista do nosso José Carlos Pace – o nosso
“CAMPEÃO MUNDIAL SEM TÍTULO”.
A ÍNTEGRA DA ENTREVISTA

<< JOSÉ CARLOS PACE - A FÓRMULA DOS MILHÕES >>


O segundo piloto brasileiro a vencer na Fórmula 1 fala dos problemas da sua
profissão.
Por:
Armando Salem e Fernando Sandoval

No último domingo, dia 12, a bandeirada que deu início ao Grande Prêmio da
Argentina recolocou em movimento, mais uma vez, a complexa e lucrativa
engrenagem da Fórmula 1, que ao longo de todo esse ano vai semear corridas e
alguns milhões de dólares em pistas de três continentes. Em recesso desde outubro
último, quando Emerson Fittipaldi sagrou-se campeão mundial de pilotos em 1974, no
Grande Prêmio dos Estados Unidos, dirigentes de equipes, mecânicos, máquinas e
pilotos retornaram ao ritmo das temporadas passadas, com seus sonhos de vitórias,
ambições financeiras e problemas.
Como no ano passado, eles deverão preencher um calendário que compreende quinze
provas a serem disputadas nas Américas, África e Europa. E, a exemplo de 1974, os
favoritos para os títulos mundiais de construtores e pilotos permanecem com os
carros e os pilotos pertencentes a Ferrari, Brabham, McLaren, Tyrrel e Lotus, com
pequenas diferenças. A Ferrari – a grande favorita na temporada passada – este ano
está mais veloz ainda, girando 1 segundo mais rápido por volta em cada um dos
circuitos em que foi testada. Por outro lado, Brabham, McLaren, Tyrrel e Lotus
também anunciam melhoramentos técnicos que aumentarão os rendimentos dos seus
carros. E assim, com promessas e chances de vitórias mais ou menos equilibradas,
reinicia-se a luta de sempre.
As maiores novidades, para os brasileiros, ficam na estréia do primeiro Fórmula 1
fabricado no Brasil, o Copersucar-Fittipaldi, dirigido por Wilson Fittipaldi. E também,
nas maiores chances de progresso de José Carlos Pace, que começa a temporada
pilotando um carro realmente competitivo, na Brabham. Patrocinada pela Martini, a
equipe inglesa (que no ano passado já havia vencido três grandes prêmios) entra em
1975 com uma verba de patrocínio das mais altas da F 1 – e o piloto brasileiro, até
hoje apenas uma sombra de Emerson, pela primeira vez inicia um campeonato com
reais possibilidades de obter uma vitória na categoria.
Pace, que começou o ano perdendo 30% do que recebia pelo seu contrato de
exclusividade de promoção com a Brahma – Bernie Ecclestone, chefe de equipe da
Brabham, acabou vencendo para a Martini uma parte da propaganda os macacões
dos seus pilotos -, acredita que este poderá ser o seu ano na Fórmula 1. Entrevistado
por VEJA, porém, ele fala menos do seu otimismo em relação à temporada de 1975
do que das disputas financeiras e inimizades que formam os bastidores da F 1.

“ DEPOIS DE STEWART, A ORDEM É FATURAR ”

01 - VEJA – Até que ponto o dinheiro é tudo na vida de um piloto de Fórmula


1?

PACE – O bom piloto profissional, e em particular um piloto de Fórmula 1, é um


nome. Por isso, além de faturar nas pistas, ele tem de aproveitar esse nome por
todos os meios.
Sua carreira é curta, e portanto é preciso ganhar o máximo no menor tempo possível.
Um piloto só fatura enquanto não atinge o seu ponto de saturação dentro do
automobilismo – depois vem a decadência.
Esse tipo de consciência profissional do piloto de Fórmula 1 é recente, começou com o
“Vesgo” (Jackie Stewart).
Foi ele, realmente, quem deu essa projeção para o piloto de Fórmula 1. Foi ele quem
começou a vender o seu nome para tudo: calça, gravata, sei lá mais o quê. No meu
caso, o automobilismo deixou de ser um hobby a partir do dia em que eu assinei o
meu primeiro contrato com um patrocinador – o Banco Português do Brasil, em 1971.
Mas nessa época eu ainda não cobrava para aparecer em outros compromissos
sociais. Quando eu fui amadurecendo como piloto, passei a cobrar. Como Stewart.

02 - VEJA – E você acredita que o nome de um piloto possa realmente valer


tanto assim?

PACE – Vale. E muito. Hoje em dia, a maior parte do mercado é jovem, e todos
querem agradar, cativar, o jovem.
Então, utilizar o nome de um piloto de Fórmula 1 – que indiscutivelmente atrai os
jovens em geral – é uma forma de se conquistar essa faixa de mercado.

03 - VEJA – Quer dizer então que aquela imagem romântica do amor dos
pilotos pelas pistas, pelo ronco dos motores e pelo cheiro da gasolina,
estaria sendo enterrada?

PACE – Não é bem assim. Eu acredito que os principais pilotos da Fórmula 1 ainda
gostem, e muito, do automobilismo. Mas é uma questão de se unir o útil ao
agradável: não se pode viver apenas de amor pelas corridas…
Agora, eu posso dizer que o automobilismo é um tipo de trabalho sensacional de se
fazer. E eu acredito que tanto eu como os demais pilotos da F 1 não teríamos
condições de chegar ao topo do automobilismo mundial sem condições emocionais
para tanto. Porque não se pode fazer bem uma coisa que não se gosta de fazer.

“ NA FÓRMULA 1 NÃO PODEMOS FAZER AMIGOS ”

04 - VEJA – A propósito, quanto ganha em média, numa corrida, um piloto de


Fórmula 1?

PACE – Isso depende. Se o piloto vencer o Grande Prêmio dos Estados Unidos, ele vai
ganhar uma belíssima nota – o prêmio final anda por volta dos 150 000 cruzeiros.
Mas normalmente os dez melhores da F 1 recebem, como prêmio de largada, uma
média de 1 300 dólares (8 200 cruzeiros) por corrida e mais uma série de pequenas
importâncias que implicam o número de voltas que ele dá na prova, em que lugar ele
dá estas voltas, em que lugar ele termina na prova, etc.
É uma série de contas complicadas, feitas pelo chefe da equipe, dividindo-se a parte
do dinheiro que fica para ele, a que vai para os mecânicos e a que fica com o piloto.
Mas muitas vezes um piloto que não vence corrida acaba ganhando mais dinheiro do
que aquele que chegou em primeiro lugar.
É o caso, por exemplo, do Carlos Reutemann no Grande Prêmio da Argentina do ano
passado: ele não ganhou a corrida, mas liderou a prova da primeira à penúltima
volta. Eu diria que, de um modo geral, os dez melhores pilotos da Fórmula 1 ganham
mais de 100 000 cruzeiros por mês.
05 - VEJA – Por que os pilotos são assim tão vagos quando falam de
dinheiro?

PACE – Garanto que não é só por causa do imposto de renda que a gente não gosta
de falar em dinheiro. O problema é que o segredo em torno de quanto o piloto recebe
é uma arma – que ele pode jogar contra as equipes, quando é procurado para assinar
contratos.

06 - VEJA – Quer dizer que os chefes das outras equipes não saberiam
quando você ganha na Brabham?

PACE – Aí é que está. Eles não sabiam, mas agora estão se organizando para tentar
controlar os rendimentos dos pilotos. O resultado é que está havendo uma verdadeira
guerra entre a GPDA (Associação dos Pilotos da Fórmula 1) e os construtores. E por
que isso? Ora, se os construtores estão ganhando, é porque nós, pilotos, estamos
sentados dentro dos seus carros, arriscando as nossas vidas. Os palhaços do circo
somos nós. Então, quem tem de ganhar mais?

07 - VEJA – E de que forma os construtores poderiam controlar ou reduzir os


vencimentos dos pilotos?

PACE – Eles acham que as ofertas das equipes para que os pilotos dirijam os seus
carros, para que mudem de escuderias, estão ficando altas demais. E como são eles
mesmos que fazem estas ofertas, acreditam que podem controlar os nossos futuros
contratos. No momento, o que vigora é a lei da oferta e da procura. O Emerson, por
exemplo, é o piloto que mais fatura na F 1. Afinal de contas, ele já ganhou dois títulos
mundiais, e os patrocinadores querem seu nome. Mas agora os construtores
decidiram que as ofertas para contratar o Emerson ou outros pilotos terão um teto.
Querem, também, instituir uma espécie de passe que uma equipe teria de pagar para
a outra, caso quisesse a transferência de um piloto. Nós somos contra isso, claro. É
tudo um absurdo.

08 - VEJA – Haveria entre vocês uma união suficientemente forte para


enfrentar os problemas surgidos com os construtores?

PACE – Não, os pilotos não são unidos. Em 1973, por exemplo, no autódromo de
Zolder, na Bélgica, o recapeamento da pista estava péssimo, soltando asfalto. Além
disso, não havia guard-rails. Então, pela primeira vez todos os pilotos se uniram e
disseram que não iriam correr. Mas os construtores pressionaram – e, no fim, todos
acabaram correndo. Sempre aparece alguém para furar o boicote. Daí os outros
acham que o boicote fracassou de todo, e acabam entrando na pista para conseguir
bons tempos durante os treinos de classificação. Além disso, há os pilotos novos,
inseguros, com medo de perder a chance de continuar pilotando na F 1… Esses
entram em qualquer pista. Não, não há mesmo união nenhuma entre os pilotos.
Como também não existem muitas amizades. Os pilotos não gostam de se ligar uns
aos outros, para não sofrer ainda mais quando alguém morre numa corrida. A gente
tem de ser muito frio diante de uma situação dessas.

09 - VEJA – O medo da morte entre os pilotos é tão grande assim?

PACE – É. Nenhum piloto gosta de falar nisso. Quando a gente vê um de nossos


colegas morrer, a sensação é brutal. Um carro bate, se arrebenta, queima, e para
todo aquele público que vai ao autódromo é como se não houvesse nada e anormal.
Prosseguem a corrida, os risos e aplausos. Quebrou um robô, a ordem é substitui-lo.
Mas, enfim, essa é a lei da vida. No fundo, nós não significamos nada. Nenhum de
nós, seres humanos.

10 - VEJA – Não há um certo exagero nisso?

PACE – Exagero? Nós somos 25 pilotos, em média, na F 1. E nos últimos anos têm
morrido dois pilotos a cada ano. Em 1973, por exemplo, morreram François Cevert e
Roger Williamson. E em 1974 morreram Peter Revson e Helmut Koinigg. Isso significa
que morrem cerca de 10% dos pilotos por ano. O que torna inevitável um
distanciamento entre os pilotos.

“ O MEDO DA MORTE ACABA COM OS PILOTOS “

11 - VEJA – Mas o fato de os pilotos serem concorrentes entre si, sempre


haver altas somas em jogo, não seria o motivo maior da rivalidade existente
entre os pilotos? Afinal, nas pistas de corrida existem indícios de que não há
muita preocupação com a vida dos outros concorrentes…

PACE – Não é o meu caso. Mas, de fato, alguns pilotos fecham os outros. Veja o
Regazzoni, por exemplo: a maior parte dos pilotos não gosta de andar nem na frente
e nem atrás dele. Ele é imprevisível e inconseqüente. Agora, a preocupação com a
vida dos companheiros é um fato. Por isso os pilotos se desgastam brutalmente.
Parecem velhos, quando ainda são jovens.

12 - VEJA – Você falou, no início da conversa, em decadência e saturação de


um piloto de F 1. O que seria isso, mais exatamente?

PACE – A decadência de um piloto, obviamente, acontece quando ele não consegue


mais obter bons resultados, não por quebra do seu carro, mas por deficiências dele
próprio. No meu caso, eu acho que saberei quando parar. A gente tem de saber qual
é o nosso limite. Quando se atingir esse ponto, então, estará na hora de ir para casa.

13 - VEJA – Graham Hill e Jackie Stewart, em situações opostas, seriam os


melhores exemplos de decadência e saturação?

PACE – Graham Hill – como também Denny Hulme, que abandonou as pistas no fim
da temporada passada – foi um grande piloto. Campeão do mundo. Mas tanto ele
como Hulme foram sendo superados pelos novos valores que iam surgindo – Ronnie
Peterson, Niki Lauda, Emerson. E por essa molecada nova que dá o sangue e a vida
para aparecer e se firmar na Fórmula 1.
O Graham Hill continua correndo, mas não vai conseguir obter boas classificações.
Quanto ao Stewart, parou no auge de sua forma técnica e física. Creio que para ele o
automobilismo já havia atingido o ponto máximo de saturação. Ele deveria estar
cansado de correr.

14 - VEJA – Em princípio, qual seria o limite de um corredor?

PACE – Em termos de idade, os 35 anos. Espiritualmente, o momento em que o


automobilismo já não reserve mais nenhum prazer ao piloto.
Porque viver viahando de um lado para o outro, correndo aqui e ali, comendo os
pratos mais variados possíveis, em diferentes fusos horários, é uma vida
extremamente sacrificada. Há dois anos atrás, quando eu ainda não tinha o prestígio
que tenho hoje no automobilismo, minha vida era uma loucura. Eu vivia correndo do
carro para o avião: disputava provas de Can-Am, Protótipo e Fórmulas 1 e 2. Eu
precisava aparecer, fazer o meu nome. Ganhava bem menos do que hoje, mas
trabalhava uma barbaridade.

“ PARA MIM, A FÓRMULA 1 FOI UMA DECEPÇÃO ”

15 - VEJA – Você acha a Fórmula 1 melhor do que Can-Am, Protótipos,


Fórmula Indy?

PACE – Melhor do que tudo o que existe, tanto em carro como em pilotos. É o
máximo dos máximos. Na Fórmula Indy, por exemplo, as pistas são ovais, é sempre
a mesma coisa.
Se um piloto de Indy corre na F 1, ele não faz nada – uma vez que não tem a
versatilidade de recursos de um piloto de F 1, onde se corre em todo tipo de pistas
num único ano. A Can-Am também é mais amadorística, é distração. E o mundial de
marcas é corrida de resistência. É chata. Já corri no mundial de marcas, e hoje não
agüentaria mais. Depois que a gente chega à F 1, não senta em qualquer carro.

16 - VEJA – Mas a Fórmula 1, ultimamente, tem sido apontada como um


ambiente de muitas desilusões.

PACE – De fato, de um certo ponto de vista, a Fórmula 1 foi uma grande decepção
para mim. Eu achava que estava entrando num lugar onde só havia gentlemen,
honestidade, técnica e perfeição. Eu ouvia falar em Jim Clark, John Surtees, Jacky
Ickx, Stewart, e ficava maravilhado, acreditando que eles fossem uns super-heróis,
que viviam numa espécie de irmandade. Depois, naturalmente, fui descobrindo que
não era nada disso.

17 - VEJA – Você ainda vibra ao passar por um adversário?

PACE – Depende. Antigamente, se eu passasse pelo Stewart, em qualquer


circunstância, é claro que eu vibraria horrores. Afinal, ele era o Stewart, objetivo de
todos os pilotos, sinônimo de perfeição.
Era o que o Emerson significa hoje para os novatos. Mas, atualmente, se eu passar
por qualquer adversário, há uma série de coisas que devo levar em consideração. Em
primeiro lugar, as condições do seu carro: se tem alguma falha técnica, se está tão
competitivo quanto o meu, e assim por diante. Hoje em dia, eu só me entusiasmo
verdadeiramente quando a ultrapassagem é conseqüência exclusiva de minha
habilidade.

18 - VEJA – Com que estado de espírito vocês se sentam em seus carros para
correr?

PACE – Eu sento no meu carro sem nenhuma preocupação. A única preocupação que
tenho nos dias de corrida é chegar logo ao autódromo. E também não vejo a hora de
a corrida começar.
Depois, há mais tranqüilidade. Eu, como os demais pilotos, sou capaz de ver, com
nitidez, tudo acontecer junto às pistas.
Sei se um amigo meu está numa curva me fazendo sinais, por exemplo. Durante a
corrida, o domínio do piloto sobre o carro é total. O coração só bate mais rápido
mesmo é antes da largada.

19 - VEJA – Como você sente um carro de F 1? Nos pedais, nas mãos?

PACE – Vocês vão ficar surpresos, mas um piloto sente o seu carro nos quadris. É nas
costas, na ponta da coluna, na linha da cintura mesmo, que você sente todas as
reações de um carro. Por isso é difícil acertar o cockpit de um Fórmula 1.

20 - VEJA – Há alguma coisa que o irrite numa prova?

PACE – A coisa mais irritante que já aconteceu comigo, na F 1, foi guiar o Grande
Prêmio de Mônaco de 1972 com chuva.
Normalmente, a gente não gosta de guiar com chuva; deixa de ser esporte e passa a
ser loteria. É como guiar um carro de passeio em dia de temporal, sem limpador de
pára-brisa e com o vidro embaçado.
E naquele dia, em Mônaco, caía tanta água que eu não via nada. Eu me lembro que
tinha de fazer uma bendita curva…
Não sei bem o que havia, mas meu carro estava com problemas. Por três vezes
seguidas, quando eu ia virar o carro não obedecia, seguia reto; eu tinha que parar,
dar marcha à ré, e voltar à pista.
Então eu pensei: puxa, que situação besta.
Todo mundo deve estar pensando “lá vem aquele louco que não gosta de fazer a
curva”. Outra coisa que me irrita é dar autógrafo em papel sujo, que visivelmente vai
ser jogado no lixo logo depois de autografado.

21 - VEJA – Você acredita em sorte e azar?

PACE – Não. Só acredito na técnica.

22 - VEJA – Mas nos últimos anos você cansou de afirmar que era um piloto
sem sorte.

PACE – Era só maneira de dizer.

“UMA BRABHAM MAIS VELOZ DO QUE A FERRARI”

23 - VEJA – É supersticioso?

PACE – Bom, de superstição mesmo, só aconteceu comigo uma coisa. Foi na


temporada do ano passado, na última corrida.
Eu usava no meu capacete uma flecha amarela com a ponta indicando para baixo, e
os meus amigos me disseram que flecha assim não dava certo.
Que eu tinha que mudar.
Mudei a flecha no Grande Prêmio dos Estados Unidos. E afinal consegui o melhor
resultado da minha carreira. Um segundo lugar.

24 - VEJA – E se pedirem para mudar a flecha de novo, você muda?

PACE – Se tiver de mudar, eu mudo.


25 - VEJA – Quais seriam as equipes favoritas, para você, nesse
campeonato?

PACE – A Ferrari, sem dúvida, é a grande favorita. Mas seguida de perto pela
Brabham, McLaren, Tyrrel e Lotus. Com 40 HP a mais no motor, a Ferrari deverá
andar sempre na frente dos carros que têm motor V-8. Esta diferença de potência é
invariavelmente sentida na saída de curvas e nas grandes retas. Mas dentro do
automobilismo existe uma série de outros fatores, além do motor. Os carros com boa
aerodinâmica, mesmo equipados com motores Ford V-8, têm condições de equilibrar
as competições.
E deverão ganhar muitas corridas, principalmente nos circuitos de média velocidade
para cima. É preciso também levar em conta a experiência e capacidade de alguns
pilotos que correm com motores Ford. Além disso, os construtores procuram sempre
melhorar os seus carros.
Recentemente a Brabham partiu para os testes com o motor Alfa-Romeo, que, no
dinamômetro, revelou 525 HP.
Ou seja, cerca de 65 cavalos a mais do que os de um motor Ford, e 25 a mais do que
os da Ferrari. E é possível que até o fim desta temporada, nós já estejamos correndo
com ele. O que aumentará ainda mais as minhas chances de vitória.

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