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“BRILHO ETERNO DE UMA MENTE SEM LEMBRANÇAS”

 Filme: Brilho eterno de uma mente sem lembranças


 Roteiro: Charlie Kaufman
 Direção: Michel Gondry

CARACTERÍSTICAS CINEMA MODERNO

As primeiras reflexões sobre a autoria cinematográfica podem ser verificadas já no


período do chamado cinema mudo, quando os teóricos formativos buscaram legitimar o
cinema como arte. Rudolf Arnheim (1996) foi um dos foi um dos primeiros pensadores a
destacar a figura do diretor enquanto “artista de cinema”. Para ele “o filme só se transforma
em arte a partir do momento em que o artista manipula o veículo a fim de expressar uma
percepção pessoal do assunto abordado, diferenciando a realidade do meio de
representação.”, logo o valor estético da obra está mais nas possibilidades de manipulação
do que no conteúdo em si, ou seja, quanto mais elementos o cineasta tiver em mãos para
diferenciar a realidade da representação fílmica, mais ele pode interferir no processo e
deixar evidente a sua visão.

Segundo Marcelo Müller “A base do cinema moderno é exatamente o cinema


clássico, que transcendeu determinados limites, quebrou barreiras e remodelou cânones.
O cinema se reinventou.”.

O cinema moderno surge logo após o fim da Segunda Guerra. A indústria


cinematográfica de Hollywood já estava consolidada nos EUA, porém na Europa, com o
fim da guerra apareceu a realidade catastrófica que foi a consequência do ocorrido.
Mesmo devastados, surgiram movimentos de debates sobre a realidade de desordem
social e política em que a Europa se encontrava. Nasceram diferentes movimentos
nacionais como: a nouvelle vague, o novo cinema alemão, o cinema britânico, entre outros.

No cinema moderno, há uma valorização do comum, do homem comum (e aqui se


trata do homem realmente comum, e não de uma certa elite incessantemente retratada no
cinema hollywoodiano), vivendo uma situação cotidiana, um dia como qualquer outro. As
resoluções também não são mais absolutas, com direito à “the end” sobreposto às
imagens e sons altissonante. Os heróis, ou até mesmo anti-heróis, tem de exercer uma
luta diária, que não é mais necessariamente extraordinária e emocionante, e sim rotineira.

Segundo DELEUZE (2007): A transição do cinema clássico para o cinema


moderno aconteceu a partir da crise da imagem-ação e a emergência de um novo tipo de
imagem, que secundariza o movimento e coloca em primeiro plano o tempo. As
personagens já não são motivadas por situações sensório-motoras (percepção-afecção-
ação), mas sim por situações óticas e sonoras (sentimento/ vidência/ audição).
DELEUZE (2007) diz que: “o importante é que a personagem ou o espectador, e os dois
juntos, se tornem visionários. A situação puramente ótica e sonora desperta uma função de
vidência, enquanto as situações sensório-motoras remetem a uma função visual
pragmática, num sistema de ações e reações”.

A realidade do cinema moderno é a realidade da imagem, a realidade ficcional


enquanto filme, a consciência-câmera, a câmera-caneta, instrumento de diálogo e não
mais de imposição, construção audiovisual múltipla, desprovida de uma essência, porém
cheia de camadas, aparências, versões espelhadas de uma mesma imagem dentro de um
cristal.

Entre as principais características do cinema moderno estão:

 Geralmente a narrativa do filme é feita de forma não linear, ou seja, a


história vai e volta no tempo de acordo com os acontecimentos na vida dos
personagens.
 Os filmes trabalham com a ambiguidade de suas personagens, por isso é
comum vermos tanto heróis quanto anti-heróis no cinema moderno.
 A montagem não tem uma continuidade com o tempo e espaço, cumpre a
proposta da narrativa.
 A fotografia contém planos abertos para evidenciar todos os ambientes e
destacar os lugares em que são importantes para os personagens. Em sua
maioria a gravação é feita com câmera na mão, em certos momentos é
possível ver a imagem tremer mesmo de forma sutil.

BRILHO ETERNO DE UMA MENTE SEM LEMBRNÇAS


O filme que escolhemos foi “Brilho eterno de uma mente sem lembranças” de
2004, escrito por Charlie Kaufman e dirigido por Michel Gondry. O diretor começou a sua
carreira como realizador audiovisual ao ser responsável pelos videoclipes de sua própria
banda, Oui Oui. O estilo artesanal e a manipulação criativa de elementos da mise-en-
scène se tornaram uma marca registrada nos seus trabalhos. Gondry é um dos
precursores da técnica visual chamada bullet time, que se caracteriza pela desaceleração
ou completa paralisação da ação registrada, enquanto a câmera, aparentemente, se
movimenta com liberdade em torno do objeto de interesse. Quando começa a se aproximar
com o cinema, Gondry continua a aplicar a assinatura visual peculiar em prol de suas
narrativas.

“Brilho eterno de uma mente sem lembranças” gira em torno do relacionamento


fracassado de Joel (interpretado por Jim Carrey) e Clementine (interpretada por Kate
Winslet). Clementine resolve acabar com o relacionamento de uma forma inusitada: ela se
submete a um tratamento para apagar Joel de sua memória. Isso nos é mostrado quando
o doutor Mierzwiak, o responsável pela criação desta nova técnica e proprietário da
empresa Lacuna, responsável por prestar esse serviço, explica para Joel que Clementine o
apagou da sua memória dizendo “ela não estava feliz e queria continuar com a sua vida” e
mais adiante na gravação de fita de Clementine, onde ela diz que não gostava da pessoa
que se tornava quando estava junto a Joel. Cansado de sofrer por ter sido apagado da
memória de Clementine, Joel resolve também se submeter ao tratamento, porém,
conforme ele vai relembrando o que viveu ao lado de Clementine, ele percebe que não
quer esquecê-la, que ele quer tê-la em sua memória mesmo que isso lhe traga sofrimento,
e então ele começa a se esconder com Clementine dentro de outras memórias da sua vida
das quais ela não fazia parte, como a sua infância e a sua adolescência, tudo na tentativa
de guardar as lembranças do seu relacionamento.

O filme não possui uma narrativa clássica, e possui as mais diversas


características pós-modernas, como por exemplo a subjetividade, a ludicidade que aparece
algumas vezes no filme, por exemplo, a cena em que Clementine canta a música “Oh my
darling Clementine”, a cena em que Joel volta a sua infância e a cena em que aparecem os
bonecos de batata feitos por Clementine.

O personagem do Joel (Jim Carey) é complexo, tem várias camadas mostrando de


forma sensível o amor e a dor da perda.
Curiosidades (Que não sei se ajuda, mas que pelas pesquisas o cinema moderno
era mais conhecido por não ter atores famosos)

E os atores aceitaram receber bem menos ao invés de salários hollywoodianos por


causa do roteiro.

Bem próximo do estilo "câmera na mão" tem uma rima visual incrível, da
desconstrução de uma memória que insiste em não ir embora. Se analisarmos bem a
estrutura da narrativa, veremos que, nesse momento presente (os dois se conhecendo
pela segunda vez, a consciência de um atrito, e reconciliação) são as únicas que
realmente existiram para Joel e Clementine, o período transitório da narrativa, das
memórias, das alegrias e feridas do casal, não existiam mais.

A fotografia do filme traz o ar gélido de Nova York e nos faz penetrar na sensação
de estar na mente de Joel, algo feito por Kaufman em “Quero ser John Malkovich” e ao
mesmo tempo esboça as características do próprio Joel, já que o que acompanhamos é o
ponto de vista dele. Sob os vários caminhos da sua mente sem lembranças. Por isso, há
uma fusão de cenários e o interessante é observar conforme as suas memórias são
extraídas, a trilha sonora se altera, as cores e o rosto das pessoas vão perdendo o
tracejado. Há uso de efeitos que se realizam em função das necessidades do roteiro,
distanciando-se do que comumente vê-se. Soma-se a isso a escolha estética da
montagem. A linha temporal do filme é um recurso que também leva a reflexão do
espectador, incluindo não apenas o entendimento do filme, mas levantando pensamentos
sobre o modo de encarar as relações. Embora seja uma construção fragmentada, diluída,
ela é construída para que o espectador se mantenha atento e não deixe de ligar os fios
conectores. Quando você acha que sabe o que está acontecendo, um novo acontecimento
muda sua perspectiva sobre a obra.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

MESTRINER, R. S., Redes Interdiscursivas e Convergência de Mídias: uma análise de


“Brilho Eterno De Uma Mente Sem Lembranças”. Universidade Federal De São Carlos.
Centro se Educação e Ciências Humanas. Programa de Pós-Graduação em Imagem e
Som. 2011. https://repositorio.ufscar.br/bitstream/handle/ufscar/5592/3953.pdf?
sequence=1&isAllowed=y

PEIXOTO, M. Cinema Do Olhar: Reflexões sobre a autoria cinematográfica. Universidade


de Brasília. Faculdade de Comunicação. Programa de Pós-Graduação Linha Imagem e
Som. 2010.

KREUTZ, K. As diferenças entre cinema clássico e moderno. AIC.


https://www.aicinema.com.br/as-diferencas-entre-cinema-classico-e-moderno/

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