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12ºano

Ortónimo, Fernando Pessoa


Temáticas:
Fingimento artístico
Na perspetiva de Fernando Pessoa, a criação poética resulta da intelectualização
das sensações, o que remete para a temática do fingimento artístico. Isto significa que,
para este poeta, um poema é um produto intelectual e, por isso, não acontece no
momento da emoção. Assim, a elaboração de um poema define-se como um
“fingimento”. Tal significa que a criação poética apenas pode comunicar uma dor
fingida, inventada, pois a dor real continua apenas com o sujeito, que, através da sua
racionalização, a exprime através de palavras, construindo o poema.
Nos poemas que abordam esta temática, “Autopsicografia” e “Isto”, o verbo
fingir significa transformar e recriar. Por isso, “o poeta é um fingidor” e elabora
mentalmente conceitos (“dor fingida”) que exprimem emoções (“dor sentida”). Por
outras palavras, o sujeito poético racionaliza e transforma o que sente.
Em suma, a criação poética constrói-se através da conciliação e permanente
interação da oposição razão/sentimento.
A dor de pensar
Fernando Pessoa sente-se condenado a ser lúcido, a ter de pensar, isto é,
considera que o pensamento provoca a dor, teoria que assenta na temática da “dor de
pensar”. Na sequência da mesma, o poeta inveja aqueles que são inconscientes e que
não se despertam para a atividade de pensar, como uma “pobre ceifeira” ou como “gato
que brincas na rua”.
Assim, o poeta inveja a felicidade alheia, porque esta é inatingível para ele, uma
vez que é baseada em princípios que sente nunca poder alcançar, a inconsciência. O
poeta deseja ser inconsciente, mas não abdica da sua consciência, deste modo,
manifesta a sua vontade de conciliar ideias inconciliáveis.
Em suma, a “dor de pensar” que o autor diz sentir, provém de uma
intelectualização das sensações à qual o poeta não pode escapar, como ser consciente
e lúcido que é.
A nostalgia da infância
Uma das temáticas de Fernando Pessoa é a nostalgia da infância. O poeta
procura recordar a sua infância e sente nostalgia. Um profundo desencanto e angústia
acompanham o sentido da brevidade da vida e da sua fragilidade. Ao mesmo tempo que
gostava de ter a infância das crianças que brincam, sente a saudade de uma ternura que
lhe passou ao lado.
De facto, no poema “Pobre e velha música”, Pessoa imagina ter sido algúem
diferente na infância, “outro”, não sabendo sequer se fora feliz: “E eu era feliz? Não: Fui-
o outrora agora”. Estas dicotomias, sempre presentes na sua obra, mostram a dualidade
de pensamento do poeta.
Para Fernando Pessoa, o passado é um sonho inútil, pois nada se concretizou,
antes se traduziu numa desilusão. Por isso, a constante dúvida perante a vida real e de
sonho. Daí, também, uma nostalgia do bem perdido, do mundo fantástico da infância,
único momento possível de felicidade.
Sonho e realidade
Sonho e realidade é uma das temáticas que percorre a poesia ortónima e retrata
a multiplicidade do “eu” que faz introspeção. O sonho é muitas vezes, para o poeta, uma
forma de escapar a uma realidade amarga, dececionante, onde a angústia
experimentada o leva a uma fragmentação do interior. O sonho surge como uma
dimensão de evasão para um mundo de fantasia, refúgio de uma realidade que
desencadeia nele uma angústia existencial. Pessoa sente-se separado de si próprio,
distante do passado e do futuro. Assim, Pessoa exprime nos seus poemas um misto de
inquietação e absurdo perante esta divisão do “ser” que o faz sentir-se estranho de si
mesmo.
Linguagem, estilo e estrutura:

• Uso de formas da lírica tradicional portuguesa: quadras e quintilhas e versos em


redondilha menor e maior;
• Regularidade estrófica, métrica e rimática;
• Musicaliddade: presença de rima e aliterações;
• Vocabulário simples, mas pleno de símbolos;
• Simplicidade na construção sintática;
• Uso de pontuação expressiva;
• Recursos expressivvos abundantes – metáfora, antítese, comparação, repetição,
interrogação retórica,...

Heterónimos, Fernando Pessoa


Alberto Caeiro

Alberto Caeiro apresenta-se como um poeta bucólico, um poeta do real objetivo,


pensa vendo e ouvindo, recusa o pensamento metafísico.
Ao assumir-se metaforicamente como um “guardador de rebanhos”, o poeta
exprime o seu desejo de viver de forma simples e tranquila, procurando estar em
comunhão e harmonia com a natureza.
Caeiro é o poeta do olhar, faz o primado das sensações e atribui maior
importância à visão. Assim, ele recusa o pensamento, pois “pensar é estar doente dos
olhos”. O poeta deambula e surpeende-se com a renovação e novidade do mundo que
observa.
Ele escreve sobre a ordem natural do mundo, a simplicidade da vida rural e a
objetividade, valorizando as sensações e recusando o pensamento.
Concluindo, a natureza constitui o maior exemplo de vida para Alberto Caeiro.
Temáticas:
Fingimento artístico (o poeta bucólico):
Na poesia de Caeiro, os elementos naturais assumem uma importância
fundamental, constituindo o tema de muitos do seus poemas. Assim, a Natureza é
configurada, por um lado, como objeto de amor, com o qual o sujeito poético está em
plena comunhão. Por outro, é apresentada como um espaço de deambulação. Nas suas
deambulações, pode apreciar os diferentes aspetos do cenário campestre, captando,
através dos sentidos, a sua diversidade. Na relação com a Natureza, Caeiro defende que
o homem deve viver em harmonia com a Natureza, integrado nela e vivendo de acordo
com os seus ritmos. Por fim, a Natureza é referida como objeto de observação, o espaço
onde se colhe as suas sensações, que constituem matéria da sua poesia captada através
dos sentidos.
Reflexão existencial (o primado das sensações):
Caeiro é o “Mestre” que Pessoa criou, o poeta que ele gostaria de ser: alguém
que não procura um sentido para a vida ou para o universo, porque lhe basta aquilo que
vê e sente em cada momento. Vive segundo o primado das sensações, sente sem pensar.
É o criador do sensacionismo e também o Mestre dos outros heterónimos. Caeiro não
procura conhecer nem adivinhar o sentido oculto nas coisas. Expressa um conceito de
vida baseado na aceitação serena do mundo e da realidade, saboreia tranquilamente
cada impressão captada pelo olhar. É o poeta do real objetivo, que vive no presente,
sem pensar no passado e, por isso, não sofre de nostalgia, e sem pensar no futuro e, por
isso, não tem medo da desilusão, nem mesmo da morte.
Linguagem, estilo e estrutura:
• Linguagem simples, familiar e objetiva;
• Vocabulário concreto;
• Irregularidade estrófica, rítmica e métrica;
• Ausência de rima (versos soltos);
• Recursos expressivos: comparação, metáfora, anáfora, repetição

Ricardo Reis

Ricardo Reis é o poeta clássico que aceita com calma e lucidez a relatividade e a
rapidez de todas as coisas. Através da influência da Antiguidade Clássica defende o
epicurismo, o estoicismo, o neopaganismo e o horacianismo.
A sua consciência da efemeridade da vida leva-o à indiferença à morte e à
reflexão sobre a inexorabilidade do tempo, comparando a vida ao curso de um rio. A
aceitação estoica do poder do destino é reveladora da atitude de abdicação,
conduzindo-o à recusa das emoções. A filosofia estoica une-se à epicurista na medida
em que esta defende a procura da felicidade relativa e da ataraxia e, por isso, da fuga
aos sentimentos extremos e ao sofrimento e a indiferença face à morte. Assim sendo,
Reis pretende aproveitar a vida e os prazeres do momento presente, já que tem
consciência da efemeridade da vida.
Concluindo, a aceitação passiva da realidade e da tranquilidade fazem da vida
uma natural condenação à morte.
Temáticas:
Fingimento artístico (o poeta clássico):
Reis é um monárquico, educado num colégio de jesuítas latinistas. Ele é a
representação de toda a sabedoria do passado, todo o património moral da tradição
humanista, mas também é um esforço lúcido e disciplinado para obter a calma. Escreve
essencialmente em odes de tipo horaciano e cultiva temas como o neopaganismo, o
horacianismo, o estoicismo e o epicurismo. Uma Ode era um texto lírico que se
destinava a ser cantado, retratando temas importantes, com o objetivo de elogiar ou
homenagear.
• O neopaganismo defendia a hierarquização ascendente – animais, homens,
deuses e Fado, que a todos preside.
• O epicurismo demanda da felicidade e do prazer relativos; indiferença perante
as emoções excessivas e preferência pelo estado de ataraxia (tranquilidade sem
perturbação; moderação nos prazeres; indiferença face à morte);
• O estoicismo é a aceitação das leis do Tempo e do Destino; resignação perante
a frágil condição humana e o sofrimento; culto da autodisciplina e da abdicação
voluntária de sentimentos e compromissos.

Reflexão existencial: a consciência e a encenação da mortalidade:


Ricardo Reis, consciente do fluir inexorável do tempo, aceita a efemeridade da
vida bem como a inevitabilidade da morte. Tem consciência da mortalidade, sendo parte
da condição humana, pois na vida tudo passa. Para enfrentar o medo da morte, faz uma
autêntica encenação da mortalidade: defende que é preciso viver cada instante, sem
pensar no futuro, numa perspetiva epicurista de saudação carpe diem, através da
autodisciplina, da abdicação, da renúncia a compromissos afetivos e sociais, da
aceitação da calma e serena da vida, da submissão ao Destino e da aceitação da
inevitabilidade da morte. É um conformista que pensa que não vale a pena nenhum
desejo, pois o homem não pode escolher e tudo está determinado por uma ordem
superior.
Linguagem, estilo e estrutura:
• Linguagem culta e erudita;
• Estilo e forma complexos;
• Ausência de rima (versos soltos);
• Regularidade estrófica, rítmica e métrica;
• Recursos expressivos: anástrofe, metáfora, aliteração, apóstrofe.

Álvaro de Campos
Temáticas:
O imaginário épico:

Reflexão existencial (sujeito, consciência e tempo, nostalgia da infância):


Campos toma consciência profunda de si próprio, da falta de coincidência entre
o que idealiza e o que consegue concretizar e, ainda, da inevitabilidade da passagem do
tempo. Diferentes sentimentos disfóricos invadem a sua consciência: a abulia, o tédio,
o cansaço e a solidão. Na sua face intimista, verifica-se ainda o isolamento e o desejo de
recuperação da infância, encarada como paraíso perdido. E é aqui que, tal como Pessoa,
experimenta a “nostalgia da infância”, vivenciada como um tempo simbólico da
inconsciência e de felicidade. Além disso, é dominado por uma angústia existencial e
pela “dor de pensar”.
Linguagem, estilo e estrutura:
• Verso livre e longo;
• Irregularidade estrófica, rítmica e métrica;
• Ausência de rima;
• Linguagem simples, objetiva;
• Inclusão de vários registos de língua;
• Privilégio do presente do indicativo;

Mensagem, Fernando Pessoa


Estrutura da obra:
A Mensagem divide-se em três partes fundamentais:
• 1.ª Brasão (nascimento) – Fundação da nacionalidade e presença de heróis
lendários e históricos, de Ulisses a D. Sebastião, passando por D. Afonso
Henriques e D. Dinis
• 2.ª Mar Português (realização) – ânsia do desconhecido e luta contra o mar.
Apogeu dos portugueses nos Descobrimentos
• 3.ª O Encoberto (morte) – Morte de Portugal simbolizada no nevoeiro; afirmação
do mito sebástico na figura do “Encoberto”; apelo e ânsia da construção do
Quinto Império
Estas três partes conduzem à ideia de renascimento futuro do país
O imaginário épico (exaltação patriótica):
Mensagem é um poema épico de exaltação de um passado glorioso da pátria e
de glorificação de um destino que está reservado a Portugal, enquanto construtor de
um Império Universal. Na primeira parte, a obra exalta o ciclo da terra, a criação de uma
pátria à custa do sacrifício e ação corajosa de determinados heróis. A segunda enaltece
o ciclo do mar e a grande aventura das descobertas, mas com a partida de A Última Nau
e a derrota em Alcácer Quibir, a pátria entra em decadência. Todavia, na terceira parte,
exorta-se a que Portugal se assuma como o construtor do Quinto Império. Assim, a obra
enaltece o passado glorioso, constata a crise de identidade que se vive no presente e
exalta o futuro glorioso destinado a Portugal.
O imaginário épico (dimensão simbólica ho herói):
As figuras criadoras da pátria portuguesa, identificadas na primeira parte da
obra, são apresentadas, sobretudo, na vertente mítica e simbólica mais do que na sua
dimensão histórica. Assim, os heróis assumem uma dimensão mais de natureza
espiritual do que material, são figuras eleitas por Deus. Pretende-se transmitir, com
esses heróis erguidos à categoria de símbolos míticos, a imagem de um Portugal
construído à custa e coragem de diversas personalidades. Todas estas figuras se
caracterizam mais pela sua insatisfação e pelo seu espírito de sacrifício do que pelos
seus gloriosos triunfos. Por exemplo, Ulisses é uma figura mítica que, com as suas
navegações, antecipa a imagem de um Portugal voltado para a aventura marítima.
Todos os heróis individuais assumem um valor simbólico coletivo.
O imaginário épico (natureza épico-lírica da obra):
A Mensagem, exaltando os heróis e feitos do passado, acentuando a dimensão
mítica e simbólica dos heróis, na primeira e segunda partes, opera numa lógica
determinista que expressa a crença na grandeza futura. A terceira parte da obra
dissocia-se definitivamente da epoepia camoniana, erigindo e alimentando o mito
sebastianista. A Mensagem apresenta marcas épicas e líricas. As épicas verificam-se em
alguns poemas de cariz narrativo, no relevo dado à História de Portugal, na referência a
feitos históricos heroicos, marcados pelo recurso à terceira pessoa, na presença do
maravilhoso e na caracterização do génio português ou mesmo na mitificação do herói
e na superioridade deste em relação ao homem comum. As características líricas estão
patentes no recurso à primeira pessoa do singular, na expressão da subjetividade e do
mundo interior através da exteriorização dos sentimentos ou das emoções do sujeito
poético.
Sempre é uma companhia, Manuel da
Fonseca
Caracterização das personagens:
➢ António Barrasquinho, o Batola:
• Preguiçoso, sonolento, improdutivo e sem energia para agir;
• Bêbado;
• Existência entediante;
• Agride a mulher, situação já conhecida por todos na aldeia;
• Assume atitude assertiva quando decide ficar com a telefonia, alterando o
seu comportamento para energético;
• Consegue no fim a admiração da mulher.

➢ Mulher do Batola:
• Responsável pela logística da loja;
• Contrasta física e psicologicamente com o marido;
• Trabalhadora e domina a relação;
• Ameaça o marido a escolher entre ela e a telefonia
• Ao aceitar a proposta do vendedor, está a permitir que o marido ganhe mais
controlo, levando-a a pedir ao Batola que decida no fim, se ficam ou não com
a telefonia.

➢ Velho Rata:
• Companhia habitual de Batola;
• O reumatismo provoca o seu suicídio atirando-se à ribeira.
• Velho mendigo e viajante.

➢ Vendedor e Calcinhas:
• Persuasivo, instala o conflito no casal, mas consegue agradar o casal;
• Calcinhas é passivo na ação.

➢ Ceifeiros e habitantes da aldeia:


• Habituados a uma vida estéril e secante, estes homens e mulheres decidem
juntar-se na venda do casal para ouvir música e as novidades do mundo,
afastando a solidão das suas vidas.
Solidão e convivialidade:
• A planície alentejana como símbolo não só de silêncio e pacatez, mas como
um «deserto» em que as pessoas fazem a sua vida de camponeses -
«ceifeiros» - maquinalmente, trabalhando desde manhã até à noite, não
tendo vida social. O convívio dá-se, porventura, dentro de casa. A solidão está
espelhada no protagonista António Barrasquinho. O Batola, e no mendigo
«velho Rata», que acaba por se suicidar.
• Com a chegada de uma telefonia, tudo muda: as pessoas passam ajuntar-se
na venda de Batola para ouvir as notícias do mundo e as belas melodias que
motivam festas e bailes. O convívio passa a ser evidente, aproximando as
pessoas e ligando-as ao resto do mundo.
Caracterização do espaço:
Físico
• Aldeia de Alcaria – pequena aldeia no Alentejo;
• Planície alentejana – campos solitários;
• A venda do Batola – espaço de desleixo e de sujidade.
Psicológico
• Num primeiro momento, o espaço é opressivo e negativo;
• A mulher passa de uma figura autoritária para uma não restritiva;
• Batola torna-se ativo;
• Os ceifeiros e os outros habitantes da aldeia afastam a solidão;
• No fim, o espaço torna-se libertador.
Sociopolítico
• Alentejo rural dos anos 40;
• Estado Novo – ditadura militar em Portugal;
• Rural pobre;
• Duras condições de vida;
• Falta de informação

George, Maria Judite de Carvalho


A complexidade da natureza humana
• Tudo começa com uma crescente insatisfação com a vida pacata, vivida numa
família com poucos recursos e ausência de cultura/de conhecimento do mundo.
Daí surge a sensação de incompreensão e a luta pela autonomia e pela liberdade.
• O escape/a evasão pelo desenho, durante a juventude com os pais, como único
meio de libertação.
• Durante a idade adulta, George tenta livrar-se de tudo o que a prenda a algum
lugar, o que se nota no facto de gostar de vender os seus livros, estando sempre
pronta a sair para qualquer outro mundo, sem amarras.
• Nesta fase, a complexidade manifesta-se também pelo constante mudar de sítio,
de aspeto físico, de namorados, pelo casamento, divórcio e recomeço de outras
(e novas) formas de viver.
• Na velhice, esta complexidade fica demonstrada pelo inevitável reconhecimento
da decrepitude física (o espelho não engana), da vida agora sem grandes
objetivos e do regresso a uma «casa mobilada» (símbolo de estabilidade),
esperando, resignadamente, a morte.
Metamorfoses da figura feminina
As transformações físicas de George, que refletem diferentes estados
psicológicos e existenciais, acompanham as várias fases e facetas da sua vida adulta:
alteração de visual; mudanças frequentes de residência e inconstância amorosa.
As três idades da vida:
• Infância - adolescência - juventude — Gi: a obediência aos país: o conflito de
gerações - pais incultos e ligados à terra natal versus filha ambiciosa que quer
uma vida melhor e liberdade, por isso emigra, deixando tudo para trás;
• Idade adulta — George: o tempo atual, de realização pessoal, profissional e
amorosa (George conseguiu ter sucesso como pintora, o que lhe deu bons
rendimentos/ dinheiro e liberdade para ir vivendo os seus amores);
• Velhice— Georgina: o que considera «um crime» - «o único sem perdão», pois
o espelho será implacável e dir-lhe-á a verdade: está fisicamente enrugada,
decrépita e vive até à morte na sua «casa mobilada».
O diálogo entre realidade, memória e imaginação:
• Realidade: George com 45 anos a fazer a viagem de comboio até à sua terra natal
em Portugal: George no regresso a Amesterdão.
• Memória: lembranças do passado, da sua antiga vida, da família (através do
reencontro e diálogo imaginados com Gi); outras lembranças que vão
desaparecendo, à medida que o comboio se afasta da estação onde entrou.
Lembranças no futuro, prevendo-se velha (Georgina) e refletindo sobre o que
terá acontecido dos 45 até aos cerca de 70 anos.
• Imaginação: apesar de fisicamente não conversar com Gi nem com Georgina, da
sua imaginação resulta a verdade de uma realidade - a vida nas suas três grandes
idades: Juventude, idade adulta e velhice. É a partir desta relação Imaginação e
Realidade que Maria Judite de Carvalho consegue caracterizar cada uma dessas
fases da vida, totalmente reais e irreversíveis.
Poeta Contemporâneos
Memorial do Convento, José Saramago
As relações amorosas em Memorial do Convento/ linha de ação Baltasar e Blimunda:
No Memorial do Convento, estamos diante dois tipos de amor totalmente
opostos. Por um lado, o amor sincero e mútuo de Blimunda e Baltasar e, por outro, os
interesses e razões de Estado que unem reis e princesas.
Entre os primeiros, a cerimónia de união não pode ser mais simbólica e mais
significativa do que a presidida pelo padre Bartolomeu Lourenço frente a uma colher
de sopa. O seu amor é físico, espiritual, verdadeiro, simples e genuíno.
Em oposição, a relação do rei e da rainha era contratual, politicamente
conveniente: o único objetivo é procriar, no sentido de assegurar um sucessor ao
trono. Assim, a relação era pautada pela distância física e pela ausência de afetividade.
Em suma, a obra apresenta-nos o contraste entre duas relações da mesma
época.

A importância do sonho/A construção da passarola:


Em Memorial do Convento, há um belo exemplo de realização plena do
trabalhador em relação ao objeto do trabalho. Isso acontece na construção da
passarola, conseguida com o conhecimento do Padre Bartolomeu, com o poder
artesanal de Baltasar e magia de Blimunda.
No obra, o que faz subir a passarola são as vontades dos homens e das
mulheres. Todas estas vontades unidas por uma mesma causa ou num mesmo sonho,
foram capazes de vencer a ignorância, o fanatismo, a intolerância, libertando o
homem, projetando-o para uma nova idade, abrindo-lhe perspetivas de um mundo
diferente.
O próprio voo da passarola poderá representar o poder que o homem tem
quando é capaz de sonhar e não desiste dos seus sonhos. Como a passarola, o homem
libertar-se-á das limitações do seu quotidiano e da mesquinhez do dia a dia, tornando-
se mais livre e cada vez mais senhor de si.
Assim, a história da construção da passarola representa no seu conjunto a força
criadora que revoluciona o mundo, a esperança num mundo livre e diferente, e o
sofrimento que a sua conquista acarreta para quem se atreve a lutar por ele.

A visão crítica:
A sátira e a crítica social estão presentes ao longo de toda a narrativa, muitas
vezes, aliadas à ironia e ao sarcasmo. Saramago traça uma crítica da sociedade
portuguesa de setecentos.
O narrador pronuncia-se sempre a favor dos mais fracos e humilhados da
História e critica as instituições que simbolizam o poder político, económico, social e
religioso. A nível político, ele critica o facto do rei, sem razão aparente, decidir
aumentar a lotação do palácio (de 13 frades para 300 frades). Em termos económicos,
satiriza a forma como o dinheiro era distribuído pelas várias instituições (em primeiro
lugar a igreja por esta o proteger). Socialmente, são julgados os trabalhadores por se
deixarem vencer pelo ceticismo. Por último, a nível religioso, ridiculariza-se os milagres
atribuídos aos santos e dramatiza-se a tirania dos autos de fé.
Assim, são sobretudo as personagens de estatuto social privilegiado o alvo da
crítica do narrador que denuncia as injustiças sociais, a omnipotência dos poderosos e
a exploração do povo.

A dimensão simbólica:
Ao logo da leitura de Memorial do Convento podemos encontrar vários
elementos que assumem uma dimensão simbólica.
O número sete adquire significado especial nesta obra, na medida em que
simboliza a perfeição entre Blimunda e Baltasar. Sete-Sóis (alcunha de Baltasar) é o
símbolo da vida e da força física. Sete-Luas (alcunha de Blimunda) é o símbolo do
transcendente e da magia. O Sol e a Lua combinados representam a passagem dos sete
dias da semana e a renovação do período lunar. Então, o número sete evidencia uma
ideia de mudança, de renovação constante após o final de um ciclo. Blimunda
reencontra Baltasar na sua sétima passagem por Lisboa, repetindo um itinerário de há
vinte e oito anos (7x4), fechando o ciclo da narrativa e da vida do herói cuja vontade
recolhe, assim lhe perpetuando a vida.
Por fim, a vida é efémera, mas a vontade humana perdura.

O número nove - simboliza o coroamento dos esforços, o concluir de uma criação, e


anuncia um fim e um recomeço. (9 anos que Blimunda procurou Baltasar)
Trindade terrestre- simboliza a união do Homem e o seu poder infinito de construir, a
conjugação dos saberes (cientifico, artesanal e sobrenatural): o sonho tornado
realidade.

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