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3.
AS CIDADES MÉDIAS NO SISTEMA URBANO NACIONAL
“ As cidades são os núcleos decisivos da organização de sistemas territoriais que as ultrapassam a si próprias...”
DGOTDU, Sistema Urbano Nacional, Vol.3, pág.37, 1999
Nas décadas de sessenta e setenta, a noção de cidade definia-se segundo critérios quantitativos, pelo
que a definição de cidade média era: aglomerado com mais de 20.000 habitantes.
Presentemente estamos a viver um período marcado por fenómenos de globalização e
internacionalização, pela reestruturação económica e uma desregulação do mercado. Num contexto
caracterizado pela proeminente especialização funcional, mobilidade geográfica, tercearização,
desarticulação das estruturas de localização, inovação e pelo aparecimento de redes de fluxos
diversificados, emerge uma diversidade de novas realidades urbanas, dando-se a consequente
reconfiguração de morfologias do sistema urbano.
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O CASO DE ÉVORA
variadas de carácter “atípico” que foram surgindo, com origem em processos de “explosão”, de
expansão e de fragmentação dos aglomerados urbanos, vieram colocar em causa a leitura clássica do
território.
Perante as tendências de evolução urbana, constata-se que a distribuição da população e das diversas
formas urbanas é heterogénea, assistindo-se a uma acentuada a um desenvolvimento assimétrico do
sistema urbano nacional.
No Norte, em torno do Porto, surge uma conurbação que se estende até Viana do Castelo e Aveiro, no
sentido norte-sul, e para este em direcção a Vila Real, e que integra a Área Metropolitana do Porto
(AMP). Trata-se de um sistema polinucleado polarizado pela cidade do Porto, e por um conjunto de
outras polaridades periféricas e cidades médias, cuja estrutura é bastante dinâmica e apresenta um
modelo territorial denso e difuso.
Em Trás-os-Montes e Alto Douro, estamos perante um sistema urbano regional de fraca dimensão
económica e social, que exige o potenciamento estratégico do património do Douro Vinhateiro –
classificado como património mundial – e da sua forte identidade cultural e natural, como recurso
turístico, bem como o posicionamento urbano mais competitivo em termos agrícolas e ambientais. As
cidades médias de Vila Real, Peso da Régua, Lamego, que formam um eixo urbano linear com
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A Região Centro apresenta um subsistema urbano regional policêntrico, formado pela constelação
urbano-industrial constituída por Aveiro, Ílhavo, Alergaria-a-Velha, Águeda e Oliveira do Bairro; pela
constelação centralizada por Viseu e constituída por mais alguns pequenos centros envolventes; pela
constelação centralizada em Coimbra (constituída por Montemor-o-Velho, Condeixa, Soure, Miranda
do Corvo, Penacova, Poiares, Lousã, Cantanhede, Mealhada e Anadia), articulada com a Figueira da
Foz. O eixo urbano Leiria-Marinha Grande cria complementaridades com Pombal, Ourém, Batalha e
Porto de Mós, desenvolvendo um cluster urbano-industrial. Mais a sul, o espaço do Médio Tejo é
estruturado pelas cidades médias de Torres Novas, Tomar, Abrantes e Entroncamento, conjuntamente
com centros complementares de menor dimensão. No centro interior, o eixo urbano formado pela
Guarda, Belmonte, Covilhã, Fundão e Castelo Branco, constitui a âncora social e económica de um
extenso território rural em perda demográfica, potenciando o Arco Urbano do Centro Interior (AUCI)
como um espaço de relacionamento transfronteiriço.
Lisboa constitui o núcleo do sistema urbano português, representando a maior concentração nacional
de população, e a maior e mais diversificada de actividades de base tecnológica, de indústrias e
serviços, e de I&D. Na Área Metropolitana de Lisboa (AML), os processos de suburbanização das
periferias intensificam-se, sendo as multipolaridades metropolitanas reforçadas. Estas polaridades
desenham uma estrutura de centralidades, às quais estão associadas o comércio e serviços, a oferta de
emprego, de I&D, a relocalização de empresas e a mobilidade urbana. Lisboa exerce um poder
centralizador e polarizador sobre as periferias envolventes.
O Alentejo apresenta como centralidades urbanas: Évora, Beja, Portalegre e Sines-Santiago do Cacém.
Esta região é caracterizada pela ruralidade do território, a fraca densidade, e por um modelo de
povoamento muito concentrado e com dinâmicas regressivas significativas. Évora constitui a “cidade-
âncora” desta vasta região, pela sua localização no eixo de forte acessibilidade Lisboa-Elvas-Badajoz.
As cidades de Sines e Santiago do Cacém poderão ver a posição no sistema urbano reforçada com o
potenciamento das infra-estruturas logísticas e com o investimento no corredor ferroviário Sines-
Madrid. Beja mantém uma centralidade funcional, ao passo que Portalegre tem vindo a mostrar
dificuldade em manter a sua centralidade. O sistema desta região é constituído ainda por outros
centros complementares (Elvas-Campo Maior; Borba-Vila Viçosa; e Castro Verde), porém com menor
capacidade polarizadora.
O Algarve apresenta um sistema urbano linear, associado a uma forte urbanização da faixa litoral e a
uma desertificação da serra. Aqui lemos um eixo urbano difuso e um “mosaico urbano-turístico”1,
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cuja origem reportamos à pressão urbanística e a um mercado imobiliário especulativo. Neste sistema
regional, temos a constelação Faro-Loulé-Olhão e um conjunto de centralidades (Vilamoura-Quarteira
e Oura-Montechoro-Olhos-d’Água), e ainda outras cidades como Albufeira, Silves, Lagoa, Portimão,
Lagos, Tavira e Vila Real de Santa António que se destacam pelo poder de concentração. Os diferentes
centros apresentam uma proximidade muito grande o que reforça o cruzamento de movimentos
interurbanos e a interacção das cidades. Este sistema mantém ainda fortes relacionamentos
transfronteiriços com Huelva e Sevilha.
As ilhas, com um crescimento urbano muito acentuado, têm uma estrutura urbana de arquipélago,
cujo modelo de urbanização em termos urbanísticos, sociais e funcionais se aproxima dos padrões do
Continente.
Na assimetria de desenvolvimento urbano que caracteriza o território nacional, Viseu, Castelo Branco
e Évora, entre outras, destacam-se como uma das “cidade-ilha” num interior esquecido.
Num país marcado pelos fenómenos de litoralização e de metropolização, o incremento do
desenvolvimento de centros urbanos fora das ‘áreas metropolitanas’ revela-se da maior importância
na definição de um sistema urbano nacional equilibrado.
As cidades de média dimensão surgem, então, como pólos de desenvolvimento capazes de minorar as
assimetrias territoriais e contribuir para a reestruturação do sistema urbano nacional.
O modelo hierárquico de Christaller, considerado equilibrado e por isso modelar, radicando no
tradicional funcionamento vertical dos sistemas urbanos, foi o preconizador do conceito de ‘Cidade
Média’.
Uma vez que em Portugal a terminologia de ‘Cidade Média’, entendidas vulgarmente na Europa
como aglomerados entre 50.000 a 500.000 habitantes, inicialmente não tinha operacionalidade
conceptual e programática, na medida em que apenas Coimbra se encontrava dentro desse parâmetro,
sugeriu-se a sua substituição pelo conceito de sistema reticular, de nucleação ou eixos do sistema
urbano.
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Depois da adesão de Portugal à União Europeia, foram criados vários instrumentos de intervenção
urbana, todos no sentido de afirmar uma política de desenvolvimento à escala europeia. À semelhança
da economia, também as aglomerações se envolveram nesta mudança de escalas. Sustentabilidade e
melhoria da qualidade de vida das populações, passaram a ser palavras de ordem. As cidades médias,
constituíram o território onde se concentraram as políticas urbanas, tanto globais como sectoriais.
O PROSIURB foi constituído por dois subprogramas, e determinou a obrigatoriedade dos municípios
elaborarem Planos Estratégicos, e definirem um conjunto de intervenções enquadradas numa
estratégia a médio e longo prazo. As cidades ou redes de cidades deveriam ter um PDM ratificado ou
em processo de ratificação e Planos Estratégicos, com definição clara de objectivos e prioridades, para
poderem aderir ao programa.
Embora o PROSIURB não tenha tido continuidade, o programa veio enfatizar a importância das
‘cidades médias’, precipitando algumas estratégias inter-cidades, introduzindo conceitos como
‘sistema’ e ‘eixo urbano’ e dando um contributo na renovação das políticas urbanas. Desta renovação
das políticas urbanas, do legado dos Planos Estratégicos e das parcerias resultou o desenvolvimento
de outros instrumentos como o Programa de acção entre áreas urbanas integrado no QCAII, o
PROCOM, o POLIS, todos eles instrumentos de políticas urbanas dirigidas para o núcleo consolidado,
de intervenção por projectos, perdendo-se a intervenção global à escala do conjunto do aglomerado
urbano.
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AS CIDADES MÉDIAS NO SISTEMA URBANO NACIONAL
Sem dúvida alguma que o desenvolvimento económico-social está dependente da aposta crescente nas
cidades médias, desenvolvendo a competitividade, a sustentabilidade e a coesão social. Como afirmou
José Augusto de Carvalho, impõem-se que as cidades médias protagonizem o reequilibro e a consolidação
do sistema urbano nacional numa perspectiva regional e transfronteiriça.2
Torna-se imprescindível prosseguir com o esforço de estruturação e desenvolvimento das regiões
desfavorecidas, dinamizando as cidades médias e outros centros urbanos complementares.
Assim, as cidades médias devem ser vistas como espaços atractivos de iniciativas e emprego, como
âncoras fundamentais para o desenvolvimento dos territórios de proximidade e influência, como
reforço da transversalidade das relações no espaço nacional.
As cidades médias constituem “nós de intermediação”3 inter-urbana e das dinâmicas de
relacionamento emergentes ou potenciais.
No contexto do sistema urbano nacional, revela-se essencial uma abordagem das redes de inter-
relacionamento e intermediação entre as diversas cidades e entre estas e o sistema territorial na sua
globalidade, tal como a construção de um cenário prospectivo das cidades estruturantes no sistema.
Neste sentido, coloquemos esperança nos Planos Regionais de Ordenamento do Território (PROT) –
presentemente em estudo – os quais, se elaborados de uma forma ponderada, integrada e visionária,
apresentarão com toda a certeza orientações estratégicas da política a implementar em favor da
consolidação e desenvolvimento do tecido urbano regional e nacional.
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As cidades médias, surgem como protagonistas no quadro da interacção a diferentes escalas, desde a
regional à internacional. Constituem polarizações urbanas que visam garantir uma base territorial
equilibrada, contrariando a polarização bicéfala das áreas metropolitanas por um lado e por outro a
rarefacção de áreas afastadas das zonas de maiores dinâmicas territoriais. Desenvolvem-se como
âncoras na estruturação do território, e são espaços de articulação privilegiada entre políticas
nacionais e locais, garantindo equidade e coesão nacional.
O adjectivo ‘médias’ atribuído hoje às cidades, tem mais a ver com a sua posição e função relativa no
território nacional, do que com qualquer quantificação numérica.
As ‘cidades médias’ surgem como aglomerados muito diversos, com dimensões variáveis, localização
geográfica distinta e com uma distribuição territorial heterogénea. Na sua maioria encontram-se
integradas no interior de conurbações não metropolitanas e/ou na esfera de influência directa das
áreas metropolitanas. As restantes situam-se em territórios com perda demográfica e económica,
sendo capitais de distrito, como é o caso de Évora.
Embora possamos afirmar existir uma consciencialização da importância das ‘cidades médias’ no
equilíbrio do sistema urbano nacional, o esforço empreendido não é ainda o suficiente para consolidar
uma rede urbana com uma distribuição regular de ‘cidades médias’. Pois, o esforço significativo
empreendido pela Administração Pública no equipamento estratégico dos principais aglomerados
urbanos do interior, pela descentralização de equipamentos educativos de nível superior, saúde e
instalações de apoio e desenvolvimento de actividade económica (centros de formação profissional e
apoio a sedes de associações empresariais) e melhoria das acessibilidades, não é coadjuvado com
políticas de contenção do investimento público e privado nas áreas metropolitanas e zonas do litoral já
desenvolvidas.
Deste modo, as dinâmicas e sinergias criadas nas zonas mais desenvolvidas, irão sobrepor-se sempre
ao esforço de investimento público nas ‘cidades médias’ a desenvolver. Por outro lado, a globalização
da economia e todo o lobbying que lhe é próprio, acabam por conseguir sempre da Administração a
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AS CIDADES MÉDIAS NO SISTEMA URBANO NACIONAL
aprovação da instalação das suas actividades nos pontos mais desenvolvidos, o que contraria o
desejado equilíbrio de ordenamento e desenvolvimento socio-económico nacional.
Em síntese, para alcançarmos uma estratégia de ordenamento eficaz seria necessário, em traços gerais,
conter e requalificar o crescimento urbano das áreas metropolitanas e das zonas litorais mais
desenvolvidas; promover o crescimento e desenvolvimento das ‘cidade médias’ criando centros
urbanos de excelência, que reúnam um sistema de transportes e comunicações rápidas e eficazes,
instituições de formação e investigação, a disponibilidade de força de trabalho qualificada, a presença
de empresas de serviço qualificadas, e um ambiente cultural e social de qualidade incluindo
instalações culturais, desportivas, de recreio e animação. Tudo factores potenciadores da mobilidade
de actividade económica e criação de condições para inverter o fluxo de desertificação do meio rural,
em torno das zonas do interior do País.
1 Teresa Sá Marques in Cidade e Democracia- 30 Anos de Transformação Urbana em Portugal, Argumentum, Lisboa, Junho de 2006, p. 87
2 José Augusto de Carvalho in MARQUES, T. (coord.), Sistema Urbano Nacional – Cidades Médias e Dinâmicas Territoriais, vol.1, DGOTDU, Lisboa, Outubro 1997, pág. 5
3 MARQUES, T. (coord.), Sistema Urbano Nacional – Cidades Médias e Dinâmicas Territoriais, vol.1, DGOTDU, Lisboa, Outubro 1997, pág. 5
4 Isabel Sousa Lobo in Cidades Pequenas e Cidades Médias, LNEC, 1997
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