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Resumo sobre o livro “Isto é biologia” de Ernst Mayr, publicado originalmente

em 1997. Versão Traduzida por Claudio Angelo, publicada em 2008 pela


Companhia das Letras.

Cap 1: O que significa a vida?

Para o humano primitivo a resposta não é complexa, talvez explicava-se pela


presença dos espíritos, tanto num animal quanto numa rocha. Essa visão foi
mudando ao longo do tempo, matérias inanimadas foram perdendo o espírito
e foi ficando cada vez mais exclusiva aos animais. Na Grécia Antiga, esse
espírito começou a ser chamado de sopro vital. E no cristianismo, tornou-se
alma.

Descartes foi o responsável pela exclusividade da alma aos seres humanos.


No entanto, a morte ainda era de certo, intrigante, pois ainda não se tinha
resposta da passagem final da alma, se ela ficava na terra ou se iria para
outro plano. Por não conseguirem explicar o que é a vida em si, vamos ter
dois tipos de ideais, os fisicalistas e vitalistas.

Fisicalistas acreditam que qualquer matéria que possua molécula é uma vida,
seja animada ou não. Não há um componente metafísico da vida. Já os
vitalistas acreditam que os organismos animados possuem uma propriedade
única que os seres inanimados não tem.

Fisicalistas: desde a Grécia antiga, Platão, Aristóteles, Epicuro. E durante a


Idade Média, muitos intelectuais árabes continuaram a passar esse
pensamento até a Renascença. Foi após a Revolução Científica, com a ajuda
de Descartes, que o fisicalismo seguiu em frente. Nomes importantes:
Galileu, Newton e Kepler. Eles utilizaram fisiologia, botânica e citologia para
entender a vida, explicando como uma energia/movimento. É uma ideia
reducionista, por isso muitos biólogos não a seguiam. Nota: fisicalistas
criticavam os vitalistas por usarem “força vital” mas viam a vida como energia
e movimento, e também não conseguiram chegar a uma explicação completa
sobre a vida, falhando de não entender a complexidade do organismo vivo e
suas propriedades adaptativas.

Vitalistas: iam contra a teoria de Descartes de ver a vida como uma máquina.
O vitalismo é um contra movimento que suriu no século xvii. Havia muitas
hipóteses.
● Subst. especial = protoplasma, q n era encontrada no organismo
inanimado
● estado coloidal = estado especial da matéria
● força especial = Lebenskraft, Entelechy ou Élan vital.
● forças psicológicas = psc vitalismo ou psico lamarckismo
São argumentos utilizados para esclarecer que a força vital não podia
pertencer aos seres inanimados por falta dessas qualidades.
O agente vital passou a ser chmado de fluido, a partir da metade do séc xvii,
com a desculpa que a gravidade e o calor também eram invisiveis.

A Alemanha foi onde o vitalismo mais ascendeu, foi Muller que percebeu que
o conceito de força vital fazia mais sentido que a ideia de movimento de
partículas dos fisicalistas. Tanto o vitalismo quanto o fisicalismo foram se
tornando supérfluos com o passar do tempo, pois ambos falham em explicar
os conceitos biológicos como a genética e o darwinismo, já que o vitalismo
tinha ideais teleológicos e anti-selecionismo. Surge então, os organicistas.

J.S Haldane foi o primeiro a apresentar ideias organicistas, pois não defendia
o vitalismo nem o fisicalismo. Já que novos paradigmas foram encontrados,
como entender que a complexidade de um organismo vivo não está em sua
composição e sim na sua organização, de suas inter-relações, interações e
interdependências, incluindo o conceito de emergência, o surgimento de
novas propriedades, fazendo com que a teoria organicista se tornasse anti
reducionista.
O conceito da emergência era muito significativo para a evolução, já que
muitos desses acreditavam que a evolução era descontínua e feita em saltos
grandes (já sabemos que não é verdade.) Muitos evolucionistas modernos
dizem que a emergência de um novo nível elevado é questão de variação
genética e seleção, por isso ela não é feita individualmente, e sim
compreendida por toda uma espécie. Os integrons evoluem por meio da
seleção natural e em cada nível são novos sistemas adaptados
(complementa o darwinismo).

O organicista acredita na dualidade, o organismo deve ser considerado como


um todo e ao mesmo tempo, que essa totalidade deve ser analisada e
estudada. Todos os níveis devem ser estudados para achar novas
informações. Cada integrante perde característica quando dissociado, e as
interações dos componentes de um organismo ocorrem em um nível alto de
integração. Acreditando-se que o programa genético é que controla o
desenvolvimento e a atividade dos integrantes.

Hoje sabemos que a nível molecular, todas as funções de um organismo


seguem as leis físico-químicas. E ainda sim, esses organismos vivos são
diferentes da matéria inanimada, já que possuem uma organização
diferenciada e única, como a programação genética sendo a maior
controladora de suas atividades, algo que não vemos nos objetos
inanimados. O dualismo da biologia moderna é físico-químico e o fato de que
os organismos vivos possuem diferenças genéticas e fenotípicas que órgãos
inanimados não possuem.

Programas específicos de seres vivos:


● Programa evolutivo: o comportamento de um organismo é advindo de
sua genética, que possui informações acumuladas através da história
da vida.
● Programa químico: os seres vivos possuem moléculas únicas, como o
ácido nucleico, péptidos, enzimas, hormônios e componentes das
membranas que não são encontradas na natureza inanimada.
● Programas regulatórios: os seres vivos possuem controles e
mecanismos regulatórios, como a homeostase. Não encontrado na
natureza inanimada.
● Programa de organização: A organização dos seres vivos é diferente
dos órgãos inanimados.
● Sistema telefônico: evoluções feitas para um único objetivo. Como o
desenvolvimento embrionário.
● Ordem limitada de magnitude: o ser vivo tem um limite de tamanho que
ele deve ocupar. Isso é variado. Garantindo flexibilidade evolutiva aos
seres vivos.
● Ciclo de vida: temos o estágio inicial de vida, zigoto, até o estágio final,
morte. A reprodução é um passo importante para o ciclo de vida,
podendo ser sexual ou assexual.
● Sistemas abertos: os seres vivos interagem com a energia e material
do ambiente externo, e eliminando os dejetos de metabolismo. Sendo
um sistema aberto, não irá participar da segunda lei da termodinâmica.

Ou seja, os seres vivos são diferenciados pois possuem a capacidade de


evoluir, replicar (auto tbm), crescer, se diferenciar, de fazer metabolismo,
homeostase, interagir com os estímulos do ambiente, e mudar de níveis
(genotipo e fenotipo).

Cap. 2: O que é ciência?


A biologia pode ser chamada de ciência da vida. Mas o que podemos explicar
como “ciencia”? Qual sua característica? Podemos dizer que a ciência é uma
atividade e um corpo de conhecimento, que utiliza da exploração, explicação
e teste, assim como precisa de organização e da classificação de um
conhecimento com base em princípios explicativos. A Revolução Científica
deixou a indução como um legado da ciência, ainda damos ênfase na
aquisição de dados e no acúmulo de conhecimento quando nos referimos à
ciência.

A revolução científica foi importante para o início da ciência moderna, que


contou com nomes como Copérnico, Galileu, Kepler, Newton, Descartes e
Leibniz. Foi desenvolvido o método científico, as disciplinas como
matemática, mecânica e astronomia foram muito importantes para a ciência
nessa época. Essa nova ciência tinha como ideais a objetividade, o
empirismo, o indutivismo e eliminar o resquício da metafísica (explicações
mágicas sobre fenômenos).

A descrição ou observação, é um método muito utilizado durante a Revolução


Científica, e foi muito importante para o avanço da ciência. Esse progresso foi
feito graças aos estudiosos que descobriram, avaliaram e compararam
experimentos em campos naturais, onde um experimento de laboratório era
impraticável. O problema é que a biologia era uma ciência que ficou dormente
até os séculos XIX e XX, pois a história natural, anatomia, fisiologia e
botânica eram para fins medicinais. Por isso, a ideia que os organismos são
não diferentes da matéria inerte era bem aceita na Revolução Científica,
graças à mecânica. Foi a partir do século XX, com a ascensão do
organicismo, que a biologia entrou para a ciência.

No entanto, a biologia era considerada como ciência provinciana, já que não


incluía a universalidade e seus achados eram reduzidos à física e a química.
Podemos nos perguntar se a biologia é considerada uma ciência como a
física e a química? Para isso, podemos utilizar os critérios de John Moore:
1. A ciência deve se basear nos dados coletados por observações em
campo ou laboratório, sem utilizar do misticismo.
2. Os dados devem responder perguntas e as observações como provas.
3. Deve-se empregar métodos objetivos, de modo a minimizar qualquer
viés.
4. As hipóteses devem ser consistentes com as observações e
compatíveis com o arcabouço teórico geral.
5. Todas as hipóteses devem ser testadas e comparadas.
6. Generalizações devem ser aceitas universalmente, e eventos
singulares não devem ser explicados por misticismo.
7. Uma descoberta só é aceita após ser testada repetidamente e
confirmada por outros pesquisadores.
8. A ciência é o aprimoramento contínuo das teorias científicas, solução
de teorias incompletas e de problemas intrigantes.

Quando analisamos por esses critérios, a biologia poderia ser considerada


uma ciência. Mas por que era considerada província? Pois a biologia era
utilizada para objetos específicos e localizados, e não universais como a
física e a química. Ronald Munson (1975), demonstrou que a biologia não
está restrita a um único objetivo. Mesmo a vida sendo localizada somente na
Terra (até onde sabemos), as suas leis e princípios são universais, valendo
para toda a existência no planeta. Sendo assim, não há razões para limitar a
biologia como ciência provinciana, e sim autônoma. Temos que estabelecer
quais as características que a biologia compartilha com as outras ciências,
tanto em metodologia, quanto em princípios e conceitos.

A diferença entre a ciência e a teologia é que a segunda invoca um poder


divino, e é inviolável, diferente da ciência que tem um grau de abertura para
correção, já que novas descobertas são feitas e acabam refutando ideias
mais antigas. Porém, os cientistas já possuem princípios básicos para estudar
o mundo. O método para verificação da ciência vai depender do que está
sendo testado, se é um fato ou uma explicação.

Já entre a ciência e a filosofia é um pouco mais difícil de separar, já que essa


separação começou na Revolução Científica, e mesmo assim, muitos
cientistas eram filósofos. É fato que teorizar, generalizar e estabelecer um
arcabouço conceitual é um campo científico, porém, muitos filósofos da
ciência afirmam que teorizar é um feitio filosófico. O que podemos concluir é
que esses pensamentos filosóficos reforçam a responsabilidade dos
cientistas em serem mais precisos. Um problema da filosofia da ciência é que
essa tomo a física como uma ciência frontal.

E como a ciência se difere das humanidades? Devemos ter em mente que, a


biologia evolutiva é mais próxima a história do que a física. E.M. Carr, um
humanista, encontrou cinco diferenças:
1. A história é única, já a ciência em geral.
2. A história não ensina lições.
3. A história não faz previsões.
4. É subjetiva enquanto a ciência é objetiva
5. A história reconhece as questões religiosas e morais.
No entanto, essas diferenças são mais para a ciência física que biológica.
Não temos como ignorar a importância da biologia nas ciências humanas.

A curiosidade é um fator principal para a ciência, é através dela que


realizamos as questões iniciais e o desejo de compreender melhor o mundo
em que vivemos, sem utilizar do misticismo. Um cientista ideal seria aquele
que é dedicado, motivado, honesto, generoso e cooperativo. No entanto,
sabemos que são apenas seres humanos, ou seja, acabam interferindo com
política, religião ou motivos financeiros no julgamento científico. No entanto,
qualquer fraude na ciência é descoberta, por isso deve-se tomar muito
cuidado na pesquisa científica. É claro que há falhas induzidas pela
esperança, como por exemplo o número de cromossomos dos humanos, o
pesquisador acreditava ser 48, no entanto descobriu-se que é 46 após três
novas técnicas diferentes serem induzidas. Por isso, Karl Popper (1981),
propôs um código de ética para o cientista:
1. não há autoridade, as interferências vão além de qualquer indivíduo.
2. Os cientistas cometem erros, já que são inevitáveis, precisamos
procurá-los, analisá-los, e compreender esses erros. Nunca devemos
escondê-los.
3. A autocrítica é importante, no entanto, a crítica de terceiros deve ser
sempre bem vinda.
4. Ter consciência dos próprios erros quando se chama atenção para os
dos outros.

A internacionalidade da ciência no século XX, ajudou a ciência a ter um


consenso entre os cientistas. O que mantém um cientista, e mais importante
um biólogo, é a fascinação pela vida, por novas descobertas.

Cap 3. Como a ciência explica o mundo natural?

Desde os primórdios, os humanos tentavam explicar os fenômenos, muitos


eram por explicações místicas. Na Grécia antiga tivemos o início das
explicações através das forças naturais, que eram baseadas em observações
e reflexões. Por último, temos a ciência como explicação, que surgiu com a
Revolução Científica e com isso a filosofia mudou seu objetivo também, não
buscava mais explicar a ciência e sim analisar as atividades dos cientistas. O
objetivo da ciência é nos trazer conhecimento do mundo, por isso, um
cientista formula perguntas sobre o desconhecido e tenta respondê-las,
formulando uma hipótese que por meio de verificações, pode se tornar uma
resposta verdadeira, ou mais próxima da verdade.
*Nomes importantes na filosofia da Ciência: Descartes, Leibniz, Locke, Hume,
Kant, Herschel, Whewell, Mill, Jevons, Russell e Popper.
**Popper foi o único filosofia da ciência que teve uma metodologia mais aceita
pelos biologos, apesar de não ser muito colocada em prática (falseamento)

Devemos entender que a desconfiança dos filósofos com a ciência é dada


principalmente, ao método cartesiano. No entanto, não há como negar uma
teoria já comprovada, ainda mais aquelas que continuam sendo confirmadas,
como a do darwinismo, que teve críticas de todos os campos, porém segue
como a mais aceitável na biologia. Contudo, como somos humanos e como
falíveis, a filosofia nos ajuda a continuar testando as descobertas para que
não haja falhas no conhecimento, um ramo muito importante da filosofia
nesse meio é a epistemologia.

Durante a Revolução científica, a epistemologia foi de suma importância, e


podemos citar dois nomes importantes, Francis Bacon (indução) e Descartes
(geometria). A indução foi tida como um método científico por dois séculos, e
é o desenvolvimento de teorias por registro e descrições feitas em campo,
sem hipótese prévia ou expectativa concebida. No século XIX, Darwin
declarou ser um seguidor de Bacon, mesmo que sua abordagem chegasse
mais perto de uma observação hipotético-dedutiva, e mais tarde, criticou o
método indutivo. Já Liebig (1863) refutou a indução baconiana, dizendo que
nenhum cientista deveria seguir a Novum organum de Bacon, já que a
indução por si só não pode criar uma teoria. No entanto, devemos tomar
cuidado ao criticar o método indutivo, já que esse é importante para o estágio
inicial da formação de uma teoria, já que se baseia nas coleções de dados.

Para a matemática e a física, a lógica era um fator importante, no entanto, na


biologia não era tão apropriado, já que o pluralismo, o probabilismo e
fenômenos qualitativos e históricos eram abundantes. Logo, a filosofia da
ciência não se encaixava para a biologia.
No século XX, o positivismo lógico estava em ascensão, e com isso os
métodos hipotético-dedutivo e o da verificação eram usados para confirmar
uma teoria. No entanto, Popper ainda insistia no método do falseamento,
juntamente com os os outros dois métodos, para reforçar que uma teoria era
verdadeira. Se a teoria não passasse no falseamento, logo ela é inválida,
podendo ser falseada. O problema é que o falseamento não é um método
simples. Ainda mais na biologia, onde temos muitas teorias probabilísticas.
Logo, via a necessidade de um novo método de explicação científica.

No final dos anos 40, a filosofia da ciência moderna teve seu início, com Carl
Hempel e Paul Oppenheim. Em seus ensaios, Hempel propôs um modelo
chamado de dedutivo-nomológico, que teve seu apogeu nos anos 50 e 60, e
ficou conhecido como visão recebida. Esse método se dá por uma explicação
científica baseada num argumento dedutivo que foi feito a partir da descrição
de um evento deduzido a partir de leis universais e alguns fatos particulares
(o autor chama de regra de correspondência). Resumindo, uma teoria
científica é um sistema axiomático dedutivo, cujas premissas são baseadas
em uma lei. No entanto, esse modelo era muito tipológico e determinista, e foi
modificado com o tempo para se encaixar nas leis probabilísticas.

Foi Beatty (1981) que introduziu a concepção semântica da estrutura das


teorias. Uma teoria é a definição de um sistema e sua aplicação é a instância
(cópia) da teoria. Essas aplicações podem ou não ser espacialmente restritas,
ou seja, não são gerais nem permanentes, sendo compatíveis com a
pluralidade e a mudança evolutiva. Thompson e Lloyd foram alguns dos
filósofos a adotarem essa visão semântica. O problema é, como esse método
vai ser aplicado na biologia. Já que não é o suficiente para o biólogo criar
novas teorias. Logo, foi se tornando obsoleta.
Cientistas e filósofos pareciam concordar em uma coisa, que a ciência é um
processo de dois passos, o primeiro sendo a descoberta de novos fatos,
irregularidades, exceções ou contradições na natureza e a formação de
hipóteses para explicá-los e o segundo é a justificativa da teoria por testes e
validações. Para os filósofos, uma nova teoria é formada a partir de uma
hipótese sobre uma dúvida, e então é submetida a testes rigorosos. Para um
cientista, durante a fase da descoberta, ele ainda faz inúmeras observações e
descrições do acontecimento, e quando encontra uma anomalia, esse enigma
o leva a fazer perguntas que podem virar uma hipótese. Apenas o teste pode
fazer uma hipótese se tornar verdadeira.

O que muitos filósofos tentam discutir dentro da ciência é se há um fator


externo na influência da criação de uma teoria por um cientista. Um desses
fatores seria o meio socioeconômico. No entanto, cientistas como Darwin e
Alfred Wallace, que tinham origens distintas, chegaram a mesma teoria da
evolução mostra como esse fator é irrelevante. O que sabemos é que
algumas teorias ou pseudo teorias são usadas por ativistas políticos para
suas agendas particulares. Assim, devemos entender que crenças (pessoais)
já estabelecidas podem gerar conflitos na aceitação de novas teorias, como
aconteceu com a teoria da seleção natural de Darwin.

No que condiz a realização de testes, a aplicação desses por cientistas e


filósofos são bem diferentes, até porque filósofos aplicam regras mais
rigorosas e dependem do tipo de escola a que pertence. Os que pertencem à
ciência, por exemplo, sempre reforçaram a capacidade das teorias de fazer
previsão lógica, ex: dado que um conjunto de fatores existem, podemos
esperar tal resultado. Isso não tem a ver com a previsão do futuro. Não
teríamos como prever que os dinossauros, seres dominantes durante o
cretáceo, seriam extintos por conta de um meteoro. Por isso o biólogo não se
atenta tanto com as falhas ocasionais de uma previsão, já que as
regularidades biológicas raramente têm a universalidade das leis da física.
Devido a grande variabilidade da maioria dos fenômenos biológicos e a
ocorrência de contingências e a multiplicidade de fatores em interações que
podem afetar o curso dos eventos, o biólogo acha mais importante que sua
teoria resolva um problema exposto do que passar pelo teste da previsão.

O empirismo lógico foi um grande motivo pelo qual os biologos criaram


desconfiança em relação á filosofia da ciência. Isso levava o biologo a usar
qualquer método disponível que o levava a resolver seu problema da maneira
mais conveniente, o que Feyerabend (1975) chamou de “Qualquer coisa
serve” (pg 86).

Por isso, criou-se um sistema flexível de construção de testes. Consistia em


cinco estágios:
1. Observações sobre a natureza ou experimentos que não poderiam ser
explicados por teorias vigentes ou que entram em conflito com visões já
adotadas.
2. Formulam perguntas como por que e o que relacionadas ao primeiro
estágio.
3. Construir uma hipótese baseadas nas perguntas.
4. Teste rigoroso, que fortalecerá ou enfraquecerá a hipótese, com
observações adicionais usando diferentes estratégias.
5. A explicação adotada será aquela que foi testada e obteve mais
sucesso durante o processo.

Para o autor, a necessidade de definições era extremamente importante e


cita Popper como um dos filosofos que era contra definições. No entanto,
Mayr o critica por ter ignorada a demanda cientifica de uma definição, pois
não tem o mesmo significado para um filosofo. Uma definição pode ser sim
confusa na ciência, ainda mais se uma mesma palavra tiver vários
significados ou ser usada em mais de um ramo (o que acontece na biologia).
Para o cientista, a definição é a demanda da eliminação de equivocos. Se
não tivermos definições clara não teremos nenhum progresso ou
esclarecimento de conceitos e teorias. A definição também pode ser mudada
se um conceito for provado erroneo.

Filósofos insistem na distinção entre teoria e hipótese, já um cientista usa


ambas em um sentido mais livre. No entanto, devemos estar mais
preocupados com a distinção entre teoria e fato. Sabemos que para uma
teoria ser aceitável tem que ter uma base factual. Mas o que torna essa teoria
um fato? Podemos dizer que ela é substituída por um fato. Exemplo: Quando
Urano e Netuno apresentaram irregularidades em suas órbitas, foi proposto a
existência de um novo planeta, e com o tempo, Plutão foi descoberto. Assim,
a existência de um novo planeta não era mais uma teoria, e sim um fato.
Podemos definir então, um fato como uma teoria que foi confirmada
repetidamente e nunca foi refutada.
Sabemos que na física, temos a existência das leis universais, que nem
sempre são aplicáveis para a biologia. Por isso, temos outra definição de lei,
nós usamos para referir a um enunciado lógico geral que serve para
explicações e previsões. Essas “leis” são constituintes básicas de qualquer
análise ou explicação científica. Porém, ao tentar usar o conceito de lei na
aplicação de qualquer regularidade ou generalização na biologia, sua
utilidade na construção de teorias se torna questionável, já que as teorias
probabilísticas não são completamente capazes de fornecer um tipo de
certeza para virar uma “lei”. Por último, devemos entender que o conceito é
mais importante na formação da teoria do que uma “lei”. É evidente que as
teorias na biologia são baseadas em conceitos enquanto na física, são em
leis. Isso faz com que a filosofia da ciência (focado na física) tenha tanto
problema em entender a biologia.

Cap 4. Como a biologia explica o mundo vivo?


Um biólogo constrói uma narrativa histórica a partir de seus estudos.
Filósofos mais modernos acham a abordagem histórica válida e talvez a única
que inclui a ciência e filosofia para explicar ocorrências únicas, diferente dos
filósofos da ciência clássica - que acreditam mais no ramo da lógica.
Obviamente, não podemos provar categoricamente que uma narrativa
histórica é verdadeira, já que todas são abertas a falseamento e podem ser
testadas repetidamente. As ciências que mais formam narrativas históricas
são a cosmogonia, geologia, paleontologia, biogeografia e a biologia
evolutiva, já que há fenômenos singulares em todos esses campos.E são
esses fenômenos que frustram os filósofos, já que esses eventos não podem
ser explicados pelas leis causais. No entanto, quando ampliamos a
metodologia da ciência para incluir as narrativas históricas, conseguimos
explicar esses eventos únicos de maneira satisfatória. A razão pela qual as
narrativas históricas têm valor explicativo é que eventos anteriores na
sequência histórica geralmente dão uma contribuição causal a eventos
posteriores. O objetivo mais importante da narrativa é descobrir os fatores
causais que contribuíram para a ocorrência de uma sequência histórica,
essas narrativas tratam da causalidade particular e não se relacionam com
nenhuma lei, e sim com casos mais simples e únicos.

A causalidade acaba por ser uma solução simples, por isso não combina
tanto na biologia, exceto em níveis moleculares e celular. É extremamente
difícil destacar a causa de uma interação de sistemas complexos cujo efeito
final é o último passo de uma longa reação em cadeia. Devemos pensar que
uma interação entre dois indivíduos deve passar por uma série de estágios. E
qual delas o cientista deverá usar será determinada por uma série de fatores
e contingências. Podemos dizer que todo processo pode ser julgado causal,
devido a sua reconstrução a posteriori, ou seja uma causa que consiste em
uma série de passos tomados em conjunto.
Na biologia podemos classificar os processos em duas causas separadas, a
causa próxima (funcional) e a causa última (evolutiva). Na causa funcional
podemos incluir a causação de processos fisiológicos, de desenvolvimento e
comportamentais, que são controlados por programas genéticos e somáticos,
são as respostas do tipo “como?”. As causas evolutivas são as que
conduzem a origem de novos programas genéticos ou a modificação
daqueles já existentes, são os eventos passados que mudaram o genótipo, e
que não podem ser investigados pelo método da fisica ou quimica, somente
com a reconstrução histórica, e são as respostas às perguntas do tipo “por
que?”. É quase sempre possível apontar uma causa próxima ou evolutiva
para um fenômeno biológico. Esse conjunto duplo de causação é uma das
propriedades especiais do mundo vivo, já o mundo inerte, há acusações
causadas pelas leis naturais, que são combinações de processos
randômicos.

Na biologia podemos descobrir uma pluralidade de explicações causais para


um problema, o que pode causar um quebra-cabeça entre os biólogos, pois
esse pluralismo de crenças pode dificultar a verificação e o falseamento do
processo. Esse pluralismo também impede que a filosofia da ciência consiga
lidar com a biologia, já que uma grande parte dos fenômenos podem ser
explicados por uma pluralidade de teorias. No entanto, isso também dificulta
determinar a causa de um fenômeno. Em muitos casos, não conseguimos
determinar com tanta certeza qual a causa particular ou combinação de
causas que foram responsáveis por um determinado evento. (Vemos muito
disso na evolução, ao tentar achar respostas únicas para a extinção de
grupos de espécies no passado geológico).

Outro problema em controvérsias teológicas é que os oponentes esquecem


de considerar uma terceira alternativa a dois pontos de vista antagônicos,
como vimos com os fisicalistas e vitalistas, o primeiro falhou devido a
respostas reducionistas e as repostas vitalistas também eram deficientes,
sobrou aos organicistas que combinavam o melhor de ambas as ideias que
prevaleceu. Quase todas as controvérsias da biologia que se arrastaram além
do tempo necessário acabaram terminando com a rejeição dos dois ideais
antagônicos e a adoção de uma nova ideia.

As teorias biológicas também apresentam causas probabilísticas, já que o


resultado é simultaneamente influenciado por vários fatores, incluindo
aleatórios, e por isso um resultado não consegue ser causado 100% por um
fator individual. Quando dizemos que uma mutação é aleatória, estamos
dizendo que a mutação naquele locus não se relaciona com nenhuma
necessidade atual do organismo ou que não é previsível.

As explicações na biologia (principalmente na evolutiva), podem ser bem


diferentes daquelas encontradas nas ciências físicas. Tomamos como
exemplo a descontinuidade do registro fóssil, que Darwin já tinha consciência.
A continuidade é um dos componentes mais importantes do paradigma
evolucionista, já que a evolução ocorre por mudanças graduais. No entanto,
para registrarmos essa continuidade precisamos de fósseis. Novas espécies
e tipos inteiramente novos de organismos apareciam de repente em um
registro fóssil, no entanto, com ausência de um intermediário entre seus
ancestrais. Darwin insistia que a evolução era sim contínua, só não
conseguimos achar um registro fóssil que mostrasse essa continuidade. O
autor fala sobre sua contribuição sobre a evolução especulativa em 1954, a
especiação geográfica: se um grupo pequeno sofresse uma mutação
genética era altamente improvável que esse pequeno grupo fosse preservado
em registro fóssil. Com isso, ele finaliza que todos os saltos teóricos mais
drásticos na biologia resultam de um salto conceitual.

A epistemologia diz respeito ao problema daquilo que sabemos e como


sabemos. Nos últimos 25 anos, um movimento chamado epistemologia
evolutiva surgiu e promoveu uma nova maneira de enxergar a aquisição de
conhecimento. Esse novo termo foi aplicado em dois processos diferentes,
que o autor chama de epistemologia evolutiva darwinista e epistemologia
evolutiva cognitiva. A cognitiva reivindica que certas estruturas do cérebro,
que evoluíram pelo processo darwinista da seleção, permitem que os
humanos consigam lidar com a realidade do mundo “exterior”. Todos os
indivíduos que não tinham essa capacidade foram eliminados sem deixar
descendentes. A realidade é que vemos o mundo por meio do nosso olhar, é
uma amostra muito limitada das características desse mundo. Nós
enxergamos alguns comprimentos de onda, no entanto não enxergamos raios
infravermelhos e ultravioletas como outras espécies de animais. Ou seja,
cada animal percebe o mundo de uma maneira única. A dúvida que paira é o
que determinou a seleção desses aspectos? A teoria mais aceitável é que
prevaleceu a característica mais importante para a sobrevivência dessa
espécie no mundo. A parte do mundo que é importante para os humanos é o
mundo médio, o mundo das dimensões intermediárias, que vai das moléculas
até a via láctea, abaixo está o mundo das partículas elementares e acima o
mundo trans galáctico do espaço-tempo.

O realismo científico, compartilhado por muitos cientistas, é uma ideia de que


o sucesso de uma teoria requer a crença na teoria de uma entidade teórica
postulada, e que essas entidades são tão reais quanto aquelas observadas.
Apesar da tecnologia da física ter aberto portas para o mundo subatômico e
trans galáctico, esses mundos ainda não fazem parte do nosso mundo
sensorial normal, e nenhum deles contribui para o realismo do senso comum,
e o mais importante, sua compreensão não é essencial para nossa
sobrevivência.

Kant teve impacto considerável sobre o pensamento dos epistemólogos, ele


acreditava que o cérebro é estruturado de tal maneira que as pessoas já
nascem com informações sobre as propriedades do universo. Konrad Lorenz,
em 1941, desenvolveu uma teoria de epistemologia baseada na noção de
Kant, de que a percepção e o pensamento do homem tem estruturas
funcionais que precedem qualquer experiência individual, o instinto sendo um
exemplo. O autor diz que é preciso aceitar a ideia de que durante a evolução
humana a partir de outros primatas, houve a evolução rápida de um cérebro
que era capaz de solucionar problemas mesmo além da capacidade de um
chimpanzé. No entanto, ainda não sabemos quão específica é a estruturação
do cérebro humano.

Indícios mostram que o cérebro humano atinge sua atual capacidade cerca
de 100 mil anos atrás, esse mesmo cérebro é hoje capaz de projetar
computadores. Essas atividades altamente especializadas que vemos hoje
não parecem requerer uma estrutura cerebral selecionada ad hoc. Todas as
conquistas do intelecto humano foram obtidas por um cérebro que não foi
selecionado especificamente para essas tarefas por um processo darwinista.
Sabemos que diferentes capacidades são controladas por diferentes áreas no
cérebro. O cérebro parece conter “programas fechados”, o instinto é um
exemplo de como já nascemos com o senso de reflexo e locomoção. Há
também as partes de “programas abertos”, são áreas do cérebro que podem
processar informações se ela estiver disponível no ambiente do organismo
jovem, nossa capacidade cognitiva de aprender novas línguas são mais bem
adquiridas em certos estágios da infância, essa categoria pode ser chamada
de “imprinting”. Cada nova experiência de um ser humano em
desenvolvimento é registrada no espaço cerebral apropriado e reforça
experiências associadas que já haviam sido gravadas no cérebro. O cérebro
parece conter áreas que permitem o armazenamento das informações
adquiridas ao longo da vida (memória).

A epistemologia evolutiva cognitiva diz a respeito aos programas abertos, ela


lida com as áreas do cérebro que evoluíram por meio da seleção natural para
fornecer ao recém nascido os programas abertos nos quais ele possa guardar
informações cognitivas importantes e específicas. O autor conclui que as
estruturas cerebrais altamente específicas não são necessárias para a
percepção e o conhecimento do nosso mundo. Parece que o aprimoramento
evolutivo melhora a estrutura cerebral, com isso, nosso cérebro não é só
capaz de lidar com desafios aos humanos primitivos, mas também com as
necessárias para o mundo mais “moderno”, como jogar xadrez. Nos parece
que a epistemologia evolutiva cognitiva não é revolucionária, e sim um
desenvolvimento natural da aplicação do pensamento evolutivo darwinista.

A busca da certeza é basicamente o objetivo da ciência. A evolução


documentada pelos fósseis hoje é aceita como verdade irrefutável, no entanto
muitas outras descobertas ainda são tentativas. Podem possuir um razoável
grau de certeza, mas também podem ser substituídas por outra teoria
alternativa. Os cientistas não insistem na “verdade absoluta”, eles chegam a
um consenso pela maior parte, considerando certas teorias como certezas.
Quando ocorre a incerteza entre duas teorias, se torna a “mais verdadeira”
aquela que for mais bem sucedida na resolução de problemas. Por essas
razões, há filósofos e não cientistas que declaram que nada descoberta pela
ciência possui algum grau de certeza.

Cap. 5 - A ciência avança?

A filosofia da ciência crê que a verdade absoluta da ciência é na verdade uma


aproximação da verdade (suposta verdade), e por isso o movimento anti
ciência argumenta que a ciência não está avançando. Mas o que exatamente
é esse progresso científico? São novas teorias que se estabelecem, com
explicações mais completas, e menos vulneráveis à refutação. Temos
exemplos comuns de controvérsias históricas que acabaram rejeitando as
duas principais teorias e optando por uma terceira. No entanto, não devemos
tratar uma teoria como palavra final, não importa o quão completa ela seja.
Isso faz com que os cientistas raramente fiquem satisfeitos com uma só
teoria, eles sempre tentam melhorá-la ou substituí-la por uma melhor.
Também não podemos abandonar uma teoria por completo quando ela é
refutada pela primeira vez, ela deve ser testada diversas vezes e se mostrar
inquestionavelmente errônea. A descoberta da “verdade” (teoria) é como uma
tentativa de mirar num alvo, que acaba por fazer uso do princípio da
aproximação recíproca. Cada nova solução para uma questão científica leva
a novas questões, chamadas de caixas-pretas, são presunções que ainda
precisam de mais análises, e por isso, nunca haverá um fim da ciência.

Um problema entre os pesquisadores é que muitos se restringem a um


campo específico, e não conseguem manter um contato intelectual e
conceitual com pesquisadores de campos vizinhos. É comum que novas
pesquisas acabem tendo repercussões em áreas correlatas. Às vezes o
progresso na ciência não se expressa simplesmente pela refutação de uma
teoria, mas pela ampliação da base explicativa que une várias áreas da
ciência. Aqueles que proferem ataques ao progresso científico não estão
habilitados a avaliar e entender se houve ou não progresso real no nosso
entendimento.

Um dos maiores avanços científicos na área da biologia foi a citologia estudo


das células, que foi possível devido a uma grande inovação tecnológica
chamada microscópio. Robert Hooke foi o primeiro a usar a palavra célula,
em 1667. Foi no começo do século XIX, que houve grandes melhorias
microscópicas e facilitou o estudo das células. Devido a tecnologia ainda ser
primitiva, algumas leituras foram errôneas. No entanto, houve grandes
descobertas, como a de Schwann, que em sua monografia, demonstrou que
plantas e animais eram constituídos de células, e que portanto, existe uma
mesma unidade em todo mundo orgânico. Esse foi um argumento poderoso
para combater o pensamento reducionista. Obviamente, com o passar tempo
e aperfeiçoamento do microscópio, novas descobertas sobre células foram
feitas e muitas ideias foram corrigidas.
Uma ideia muito importante feita durante o século XVIII, foi a de Koellreutter,
que por meio da hibridização, conseguiu provar os aspectos genéticos da
fertilização, com a ajuda do óvulo e do espermatozóide. Oskar Hertwig
mostrou que a fertilização consistia na penetração do espermatozoide no
óvulo, esse núcleo masculino se fundia no núcleo feminino, e com isso
surgiria o zigoto.

O que devemos entender é que muitas teorias descobertas nessa época


foram ignoradas, e redescobertas após muitos anos. Roux abandonou sua
teoria da mitose, que era correta, por uma observação contraditória. Até
1880, os aprimoramentos na microscopia permitiram descrições mais exatas
dos núcleos, do processo da mitose e meiose. A história da citologia expressa
bem o progresso gradual da ciência.

Essas ocorrências de avanços da ciência nunca foram bem explicados.


Temos duas escolas que chegam a uma certa explicação. A primeira é a
Teoria de Thomas Kuhn das revoluções científicas vs. a ciência normal; e a
segunda é a epistemologia evolutiva darwinista. A publicação de Kuhn, A
estrutura das revoluções científicas, lançada em 1962, dizia que a ciência
avança por meio de revoluções ocasionais, separadas por longos períodos de
ciência normal. Durante uma revolução científica, uma disciplina adota um
paradigma diferente, que irá dominar o período seguinte da ciência normal.
Essas mudanças de paradigma são o aspecto principal da teoria de Kuhn, a
qual o mesmo nomeia de matriz disciplinar. Essa matriz é a teoria mais
recente, representando um novo sistema de crença, valores e generalizações
simbólicas.

A teoria da seleção natural de Darwin foi uma grande revolução científica. Ela
encontrou forte resistência devido a seu conflito com o criacionismo,
essencialismo, teleologia, fisicalismo e reducionismo. Essa teoria só foi bem
aceita em 1930. Entre esse meio tempo, tivemos pequenas revoluções na
biologia, como a rejeição da herança por caracteres adquiridos, a da herança
por mistura, a descoberta da fonte da variação genética, e entre outros, foram
essenciais para revolucionar o pensamento dos evolucionistas e dar
credibilidade a Darwin.

Mayr aponta que deveríamos olhar os avanços em diversos campos da


biologia e verificar como eles se qualificam como revoluções, algo que ainda
não foi feito (livro é dos anos 90). Ele aponta que talvez o avanço mais
revolucionário do século XX seja a biologia molecular, que resultou em um
novo campo, novas descobertas e novos métodos experimentais. No entanto,
o autor diz que a ascensão da biologia molecular ainda não foi grande o
suficiente para ser uma revolução kuhniana.

No entanto, todos os autores que tentaram aplicar a tese de Kuhn nas


mudanças teóricas na biologia, descobriram que ela não é aplicável nessa
área. Mesmo quando houve uma revolução, ela não aconteceu de fato como
Kuhn descreve. O que temos é a completa gradação entre mudanças teorias
pequenas e grandes. A grande questão é, a introdução de um novo
paradigma não resulta na substituição imediata do antigo. Essas teorias vão
coexistir. Kuhn não faz distinção entre as mudanças teóricas causadas por
novas descobertas e aquelas que resultam de conceitos novos. As mudanças
causadas por descobertas geralmente possuem impacto menor que
reviravoltas conceituais. O maior impacto que um novo paradigma pode
causar é a aceleração maciça na pesquisa de determinada área.

Voltando à tese da epistemologia evolutiva darwinista, seu foco é saber se a


ciência avança como o mundo orgânico. Portanto, podemos caracterizar o
progresso epistemológico como variação e seleção. Devemos, no entanto,
compreender que quando olhamos mais de perto, as mudanças
epistemológicas ocorrem de maneira diferente da mudança evolutiva genuina.
A variação das teorias ocorre por conta dos raciocínios que promovem essas
teorias. A teoria mais apta a ser aceita pela tese da EE evolutiva é aquela que
encontra menos problemas e consegue explicar o maior número de fatos de
maneira satisfatória. Ou seja, temos constantemente, uma produção
constante de novas conjunturas. Algumas mínimas, outras que merecem ser
chamadas de revoluções.

A partir disso, podemos concluir que, de fato, há revoluções maiores e


menores na biologia, mas mesmo as maiores não significam uma mudança
drástica de paradigma. Logo, teorias velhas e novas podem coexistir por um
longo período, não precisam ser incompatíveis. A biologia sempre terá uma
série de revoluções, simples e complexas ao mesmo tempo. A EE darwinista
parece se adequar melhor às mudanças teóricas da biologia do que as teses
de Kuhn. E devemos lembrar que um paradigma dominante tende a ser mais
fortemente afetado por um novo conceito do que uma nova descoberta.

Tem-se a ideia de que a comunidade científica sempre entra em um


consenso rapidamente. A realidade, no entanto, é outra, são raros os casos
em que uma nova teoria é bem aceita em um campo da ciência. Mayr lista
seis razões pelas quais algumas teorias precisam lutar para serem aceitar por
tanto tempo enquanto outras são rapidamente aceitas:
1. Conjunto diferentes de evidências levam a conclusões diferentes.
2. Cientistas possuem ideologias diferentes, o que torna algumas teorias
mais aceitáveis para um grupo e outras não.
3. Várias explicações diferentes parecem dar conta de um mesmo
fenômeno.
4. Há pluralidade de respostas (alguns casos)
5. O consenso pode não chegar, pois um biólogo está preocupado com as
causas próximas e outro com as causas evolutivas.
6. Algumas vezes, as razões podem não ser científicas, e sim “pessoais”.
Talvez um cientista fique ofendido ao ter sua teoria refutada, diferentes
escolas de diferentes países com métodos diferentes também podem
ser um problema.

O que devemos lembrar é que a ciência não é a resposta para todos os


nossos problemas. Algumas limitações podem ser práticas e outras de
princípio. A maioria dos problemas levam a perguntas como “O que?” e
“Como?”, que são passíveis de elucidação científica. Já as questões “Por
que?” são diferentes. As respostas podem ser muito complexas,
principalmente aquelas relacionadas com as propriedades básicas das
moléculas. Quando nos perguntamos sobre o futuro da ciência, temos que
considerar a sede de conhecimento que o ser humano tem, a incompletude
do nosso entendimento atual e o avanço da tecnologia. São, com toda
certeza, instrumentos para permitir que a ciência possa progredir. Já dizia
Vannevar Bush, a ciência é de fato uma fronteira infinita.

Cap 6. Como se estruturam as ciências da vida?

A biologia é a ciência mais diversificada, estuda dos menores organismos,


como vírus, quanto os maiores dos mamíferos, como a baleia. Além de ser
aplicada em inúmeros campos, como a medicina, agricultura, zoologia,
geologia, oceanografia e etc. Apesar da biologia ser considerada uma ciência
moderna, podemos remeter discussões históricas sobre a biologia desde a
Grécia antiga, Hipócrates influenciou muito na medicina, Galeno foi
importante para o desenvolvimento da anatomia e fisiologia com o passar dos
anos. Aristóteles influenciou na história natural, na origem da sistemática, da
biologia comparativa e evolutiva. Durante a Revolução Científica, a biologia
não foi tão impactada, pois as ciências focadas eram a física e a química. Os
séculos XVII e XVIII foram importantes para a descoberta de diversas
espécies da fauna e da flora em diferentes partes do mundo. Podemos listar a
maioria desses trabalhos como descritivos nesse período. O que não os torna
inúteis, muito pelo contrário. Trabalhos de história natural de Buffon, a
fisiologia de Bichat e Magendie, a morfologia idealista de Goethe, e outros
nomes como Blumenbach, Cuvier, Oken e Owen sobre filosofia natural,
foram de suma importância para o desenvolvimento da biologia.

O termo biologia foi introduzido em 1800 por Lamarck, Treviranus e Burdach.


Esse termo não indicava uma ciência, e sim uma tendência que significava o
afastamento dos esforços descritivos e taxonômicos, e se movimentando no
sentido de um interesse maior nos organismos vivos. O conceito de biologia
como conhecemos hoje, foi introduzida a partir de 1828, por nomes como Von
Baer (embriologia), Schwann e Schleiden (teoria celular), Muller, Liebig,
Helmholtz, DuBois-Raymond, Bernard, Wallace e Darwin.

Por muito tempo, cientistas e filósofos validaram duas abordagens em suas


buscas pelas respostas. A primeira é a procura de leis que deem conta das
regularidades observadas por elas. A outra procura alguma relação/algo em
comum, que só poderia ser estabelecido por meio de comparações. O
método comparativo era puramente empírico, e após a teoria da origem
comum de Darwin, esse processo ficou cada vez mais rigoroso, sendo usado
em diversas disciplinas biológicas. A invenção e desenvolvimento de
instrumentos, como o microscópio, também tiveram muita influência na
ascensão da biologia.

Após 1870, a biologia sofreu uma divisão, a biologia das causas evolutivas
(com enfase na filogenia), que basicamente fazia comparações a partir de
observações e a biologia das casas proximas, que destacava abordagens
experimentas. Havia também uma disputa entre a zoologia e botânica, que
deixou de ter sentido ao descobrirem que os processos moleculares eram
muito semelhantes. Entendeu-se também que havia necessidade de uma
nova classificação, pois descobriram que fungos e procariontes eram
diferentes do reino animal e vegetal.
Houveram tentativas de classificação de todas as áreas da biologia, para lidar
com os fenômenos de uma maneira mais unida. No entanto, não deu certo.
Outra classificação proposta que falhou miseravelmente, foi a classificação da
biologia em três ramos, descritiva, funcional e experimental. O problema é
que essa classificação excluía a biologia evolutiva e ignorava que a descrição
e experimentação são cruciais para análises somente na biologia funcional.

Novas tentativas de estruturar a biologia aconteceram em 1955. Mainx teve


bastante aceitação em sua divisão, morfologia, fisiologia, embriologia e outras
poucas material padrão foram subdivididas em citologia, histologia, fisiologia
e assim por diante, tendo base em considerações morfológicas. P. Weiss
também teve sua estruturação bem aceita, de forma mais hierárquica
estruturou em: biologia molecular, biologia celular, biologia genética, biologia
do desenvolvimento, biologia regulatória e biologia de grupo e ambiental.
Cada autor escolhe sua divisão com base em suas formações. Aqueles que
destacaram o experimentalismo, a redução e os componentes unitários
vieram das ciências físicas. Já os que destacaram diversidade, singularidade,
populações, sistemas, a observação e os aspectos evolutivos eram formados
como naturalistas. Somente em 1970, que o Comitê para as Ciências da Vida
da Academia Nacional estruturou a biologia em doze disciplinas:
1. Biologia molecular e bioquímica.
2. Genética
3. Biologia Celular
4. Fisiologia
5. Biologia do Desenvolvimento
6. Morfologia
7. Biologia Evolutiva e Sistemática
8. Ecologia
9. Biologia Comportamental
10. Nutrição
11. Mecanismos de doenças
12. Farmacologia
Esse sistema tinha um problema porque considerava a biologia evolutiva e
sistemática como uma única disciplina. Acabou-se por perceber que o tipo de
pergunta que se faz na pesquisa científica é a que pode ajudar a classificação
mais lógica das disciplinas. As três grandes perguntas são “O que?”,
“Como?”, “Por quê?"

- Perguntas do tipo “O quê?”

Não temos como fazer ciência sem registro de observações e descobertas


nas quais uma teoria se baseia. Portanto, a descrição é uma parte importante
em qualquer disciplina científica. Não há sentido em reconhecer uma
disciplina separada em biologia descritiva, pois a descrição é o primeiro
passo de qualquer ramo da biologia. Ela é o alicerce indispensável de toda
pesquisa exploratória e interpretativa na biologia. Devemos entender que os
resultados mais importantes da ciência são as generalizações e as teorias
que derivam do material das descrições.

- Perguntas do tipo “Como?” e “Por quê?”

As respostas às perguntas do tipo “O quê?” não são suficientes para


solucionar o problema da classificação das subdivisões da biologia. As
perguntas do tipo “Como?” estão sempre presentes na biologia funcional.
Também foi muito importante para as ciências físicas e a mais predominante
na biologia até os anos 1800, já que a ciência predominante dessa época era
a fisicalista. Essas questões são estudos das causas próximas. As perguntas
“Por quê?” também eram feitas, mas como o cristianismo era a ideologia
principal (do mundo ocidental), essas perguntas eram respondidas com um
simples “Porque Deus quis”.
Perguntas do tipo “Por quê?” lidam com história e evolução, já que esses são
os responsáveis pelos aspectos dos organismos vivos que existem hoje e os
do passado. São estudos das causas últimas. E só viraram questões
científicas graças a Darwin e suas teorias sobre a evolução, introduzindo a
história natural no reino da ciência, que antes era excluída pois não se
encaixava nos princípios metodológicos da física.

A terminologia das causas próximas e últimas têm uma longa história. A


primeira está relacionada com a função de um organismo e suas partes, o
desenvolvimento, investigando a morfologia funcional e a bioquímica. Lidando
com a decodificação de programas genéticos e somáticos. A segunda trata
em responder o por que um organismo é como é, a partir da evolução,
responsável pela origem de novos programas genéticos e suas mudanças. As
causas próximas são em grande parte mecânica, enquanto as causas últimas
são probabilísticas. A determinação das causas próximas é facilitada pela
experimentação, já das causas últimas é por meio das narrativas históricas.

Se formos usar as acusações para classificar as subdivisões da biologia,


ficaria assim:
- causas próximas: fisiologia, maior parte da biologia molecular, biologia
funcional, biologia do desenvolvimento genético e a genética fisiológica.
- causas últimas: biologia evolutiva, genética de transmissão, teologia,
sistemática, morfologia comparada e ecologia.

Dentro da ciência biologia também há disputa hierárquica, sempre que uma


nova subdisciplina se tornava bem sucedida, havia conflitos para que sua
ascensão ocorresse, para que pudesse drenar o máximo possível de atenção
e recursos para a tal disciplina. As disciplinas que ficam mais próximas ao
pensamento das ciências físicas sempre são mais favorecidas pelo governo,
a biologia médica também tira recursos de agências de fomento, enquanto
outras áreas são mais desfavorecidas. A botânica foi uma área discriminada
por muito tempo. Quando o Instituto Americano de Ciências Biológicas foi
fundado em 1947, ele inclui todas as áreas da biologia, inclusive botânica e
zoologia. Em 1975, houve uma reorganização das subdivisões, a zoologia foi
abolida e substituída pela seção de biologia de populações, evolução e
ecologia. Os botânicos foram combinados a fazer o mesmo, no entanto,
rejeitaram a ideia, mesmo que alguns botânicos tenham saído da seção da
biologia vegetal para ir pra genética. A botânica não foi obliterada, ela até
assumiu liderança em alguns estudos. Cada divisão parece ter sua época
áurea, e algumas delas tem várias.

Nos primeiros dois capítulos, tivemos a comparação da biologia com as


ciências físicas, a teologia, a filosofia e as humanidades. Depois, começamos
a ver as diferenças conceituais que existem dentro da própria biologia. Cada
ramo tem seu próprio banco de dados, seu conjunto de teoria, seu material,
periódicos e sociedades científicas.

Referência:

MAYR, Ernst. Isto é Biologia. Tradução de Claudio Angelo. 1º ED. São


Paulo: Companhia das Letras, 2008.

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