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01 de junho de 2022

UNIVERSIDADE IGUAÇU
PROF. JULIANA KRYSSIA LOPES MAIA
DIREITO PENAL IV

Cláudia Valéria Paiva dos Santos


Cristhian Nunes Porto
Daniela Chagas da Silva Costa
Felipe Alves Rodrigues
Jorge Marcos Rocha Junior
Pedro Luciano Carvalho
Sarah Jordão de Carvalho Verdan

LEI MARIA DA PENHA PARA TRANSEXUAIS


APLICAÇÃO OU NÃO APLICAÇÃO

Nova Iguaçu - RJ
2022
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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO
2. ARGUMENTOS CONTRA
3. ARGUMENTOS A FAVOR
4. CONCLUSÃO
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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1. INTRODUÇÃO

A Lei 11.340/2006, mais conhecida como Lei Maria da Penha, deriva-se do


caso de Maria da Penha Fernandes, uma farmacêutica bioquímica brasileira, que
sofreu sérias agressões de seu marido, Marco Antônio Heredia Viveros, um
professor universitário colombiano. Ela foi vítima de duas tentativas de homicídio
dentro de sua própria casa. Maria ficou paraplégica aos 38 anos como resultado de
uma delas.
A denúncia sobre o caso foi apresentada por ela apenas no ano seguinte ao
Ministério Público Estadual e o primeiro julgamento sobre os crimes ocorreu
somente oito anos depois, em 1991, o marido recebeu uma condenação de 10 anos.
Após anos do crime sem desfecho, e tendo em vista um cenário de inefetividade do
sistema judicial brasileiro, ela conseguiu levar o seu caso para a Comissão
Interamericana de Direitos Humanos, e a referida Comissão em decisão inédita,
condenou o Estado brasileiro por negligência e omissão em relação à violência
doméstica cometida contra Maria da Penha.
A vítima se tornou um símbolo de luta pelo fim da violência contra a mulher.
Somente em 7 de agosto de 2006, a Lei foi promulgada no país, criando
mecanismos efetivos de combate à violência contra as mulheres e estabelecendo
medidas para a prevenção, assistência e proteção das mulheres em situação de
violência. A mencionada lei busca criar um círculo de proteção para a mulher, além
de definir diretrizes para as políticas públicas e ações integradas de prevenção e
combate à violência doméstica contra mulheres.
Tais como, a implementação de redes de serviços interinstitucionais, a
promoção de estudos e estatísticas, a avaliação dos resultados, a implementação de
centros de atendimento multidisciplinar, casas abrigo, a realização de campanhas
educativas, a capacitação permanente de integrantes dos órgãos envolvidos na
questão e a celebração de parcerias e convênios.
No contexto atual, dados mostram que enquanto mulheres são vítimas de
67% das agressões físicas no Brasil, o cenário de vulnerabilidade é ainda maior para
transexuais e travestis. A própria residência é o lugar mais perigoso para elas (como
para a maioria das mulheres cis), segundo dados do Sistema de Informação de
Agravos de Notificação (Sinan, parte do Ministério da Saúde). No entanto, quando
chegam à Justiça, elas enfrentam dificuldades para a garantia de seus direitos.

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Marina Ganzarolli, co-fundadora da Rede Feminista de Juristas – deFEMde e


presidenta da Comissão da Diversidade Sexual e Gênero da seção de São Paulo da
Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/SP), lamenta:

“Esse enunciado deveria ser vinculante ao exercício de toda a magistratura nacional, mas
infelizmente a gente sabe que a realidade não é essa. Muitas vezes há negativa da aplicação
tanto da categoria de feminicídio, como da Lei Maria da Penha para mulheres trans”

Em observação ao Princípio da liberdade sexual, no qual afirma que todos


são livres para escolher sua opção sexual, é importante realçar que a orientação
sexual refere-se a qual gênero, masculino ou feminino, a pessoa se sente atraída,
ou seja, de que maneira o indivíduo quer exercer sua sexualidade. Compreende por
orientação sexual, tanto a natureza heterossexual ou homossexual da mulher
(HERMANN, 2007).
De acordo com dados do Dossiê Assassinatos e Violências Contra Travestis e
Transexuais Brasileiras, em 2021 o país registrou 140 assassinatos de pessoas
trans. Entre as vítimas, constam 135 travestis e mulheres transexuais, e cinco
homens trans. O estudo foi realizado pela Associação Nacional de Travestis e
Transexuais (Antra) com apoio de universidades como a Estadual do Rio de Janeiro
(Uerj), Federal de São Paulo (Unifesp) e Federal de Minas Gerais (UFMG).
Os números permanecem altos, mesmo após o Supremo Tribunal Federal
criminalizar a transfobia no Brasil, em decisão de 2019. Há três anos, a Corte
Suprema tipificou atos preconceituosos contra homossexuais e transexuais como
crime de racismo.
O fato é que, enquanto a expectativa de vida da população brasileira é de
quase 75 anos (IBGE), os travestis têm uma expectativa de 35. Essa é a afirmação
de estudiosos ao apontar que travestis e transexuais femininas constituem um grupo
de alta vulnerabilidade à morte violenta e prematura no Brasil. E os números
comprovam a tese. Segundo dados da ONG Transgender Europe (TGEu),
publicados em 2016, o Brasil matou 868 travestis e transexuais em oito anos. Um
dado assustador, que coloca o país no primeiro lugar entre aqueles com maior
número de registros de homicídios de transgêneros.
Há 13 anos no topo dos países que mais matam pessoas trans no mundo, o
Brasil deu um passo para reverter esse quadro. Na última semana, o Superior
Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a Lei Maria da Penha é aplicável para

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mulheres transexuais. A partir da decisão proferida em 5 de abril, a mulher trans fica


protegida pelos dispositivos da lei – que agrava punição para violência de gênero –,
sem contar condição biológica ou cirurgia de redesignação sexual.
Instâncias ordinárias por todo o país já tinham entendimento de beneficiar
mulheres trans com a lei. No entanto, essa não era uma decisão unificada por um
tribunal superior, e quando o recurso que chegou ao STJ tratava-se da negativa de
medidas protetivas a uma mulher trans pelo Tribunal de Justiça de São Paulo. O
Ministério Público de São Paulo recorreu, defendendo que a Lei Maria da Penha
protege a mulher contra qualquer espécie de violência fundada no gênero, e não
apenas no sexo biológico.

2. ARGUMENTOS CONTRA

A lei 11.340 de 2006, trouxe um grande avanço na busca da proteção da


dignidade, a liberdade e o direito das mulheres, das violências cometidas sobretudo
no ambiente doméstico e familiar, onde, aliás, deveria haver maior proteção.
Contudo, muito se discute acerca da possibilidade da sua incidência em relação aos
transexuais e aos transgêneros. Cabe salientar que não estamos tratando do
respeito e da dignidade pessoal que essas pessoas merecem, mas sim da
possibilidade à luz do direito do brasileiro de se fazer uma interpretação extensiva
desta Lei, de modo a se englobar os transexuais e os transgêneros no rol de vítimas.
A questão está longe de ser simples e de ter um entendimento pacificado,
despertando verdadeiros embates jurídicos e doutrinários. No entanto, precisamos, a
fim de esclarecer melhor a temática, definir o conceito de mulher. Primeiramente
podemos definir como um critério de natureza psicológica, física e social, ou seja,
uma experiencia pessoal, que pode ou não corresponder ao sexo biológico. Em
outras palavras, alguém pode nascer do sexo masculino e psicologicamente
acreditar ser do sexo feminino, e vice-versa.
Como bem disse Genival Veloso “o transexualismo é a inversão psicossocial,
uma aversão ou negação ao sexo de origem, o que leva esses indivíduos a
protestarem e insistirem numa forma de cura por meio da cirurgia de reversão
genital, assim, a identidade do seu desejado gênero”. Já o ex-Procurador de Justiça
Rogério Greco, acredita que o único critério que traduz com segurança necessária

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exigida pelo direito, e em especial o direito penal, é o critério denominado jurídico.


Assim, segundo o jurista, somente aquele que for portador de um registro oficial
(certidão de nascimento, documento de identidade) onde configure o seu sexo
feminino, é que poderá ser reconhecido conceitualmente de mulher.
Uma outra forma de conceituar o termo mulher foi cunhada pelo renomado
Procurador Geral de Justiça do Estado de Pernambuco Francisco Dirceu Barros
onde aborda a temática sob o viés biológico, afirmando que através dele
“identifica-se a mulher em sua concepção genética ou cromossômica''. Neste caso a
ressignificação do sexo altera a estética, mas não a concepção genética”.
O Procurador continua a sua explanação afirmando que o critério biológico
identifica o homem ou a mulher pelo sexo morfológico, sexo genético e sexo
endócrino, logo, o conceito de mulher está ligado intrinsicamente ao sexo biológico.
Ao verificar as três vertentes sobre o conceito de mulher, podemos verificar
que o grande problema de usarmos o critério psicológico para conceituar mulher é
que o mesmo é formado pela simples convicção intima da pessoa que entende
pertencer ao sexo feminino, critério que pode ser, diante do caso concreto subjetivo,
algo que não é compatível com o direto penal moderno, sob pena de trazer enormes
inseguranças jurídicas.
Quanto ao critério jurídico cível, também não pode ser aplicado, pois as
instâncias que cível e penal são independentes, assim a mudança jurídica no cível
representaria algo que seria usado em prejuízo do réu, afrontando, assim, o princípio
da proibição da analogia in malam partem.
Outrossim, acreditamos que o conceito correto de mulher é o que advém da
ciência biológica, pois está impregnada no âmago do DNA humano, afinal de contas,
se se examinarem os cromossomas de uma transexual verá que ele possui o
cromossoma do tipo XY. Por conseguinte, acreditamos estar correto o entendimento
da corte estadual paulista quando afirma que “não é a vontade do recorrente de ser
mulher, nem o fato de se sentir mulher, que o transforma em mulher. Pode parecer
mulher, mas mulher ele não é”.
Ademais, nada justifica que o conceito de mulher como descrito na
Constituição Federal de 1988 seja interpretado, ao menos em matéria penal, como
diferente do sentido científico. Dessa constatação científica decorre o empecilho
jurídico, pois a equiparação do transexual e do transgênero à condição de mulher,
ofenderia o princípio da tipicidade estrita, da taxatividade, além é claro, que a norma

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penal incriminadora deve ser interpretada o mais estritamente possível, evitando-se


uma indevida ampliação do seu conteúdo que ofenderia, frontalmente, o princípio da
legalidade.
Não queremos dizer com isso, que não somos sensíveis aos altos índices de
violência contra os transexuais e os transgêneros, nem que desconhecemos os
princípios de Yogyakarta, o que inclusive tem caráter vinculante, e que são
considerados de nível constitucionais, inalienáveis. Contudo, como bem disse o
desembargador Francisco Bruno em seu voto, “Todos esses direitos e obrigações
são devidos; e, repito, ninguém (de bom senso, é claro) discordará disso. Porém,
nenhum deles dá ao transgênero masculino o direito de ser considerado homem;
nenhum, para colocar de outra forma, autoriza a afirmativa de que transgênero
feminino = mulher”.
Portanto, e com todo o respeito, não é possível dizer, como comumente se
diz, que o transexual feminino “se sente mulher”: afinal, somente uma mulher pode
saber o que ela sente. O que se pode dizer com correlação é que o transexual se
sente como ele acredita que o outro sexo sinta; ninguém, a não ser uma mulher,
poderá saber o que a mulher sente.
De resto, concluímos que as implicações de se elevar o transexual a
categoria de mulher e incluí-lo no rol dos contemplados pela lei Maria da Penha,
seria suscitar diversos perigos, como por exemplo sobre o transexual masculino,
além de esvaziar e desnaturalizar a lei, com a ampliação em demasia. No entanto,
acreditamos que já é a hora de o legislador brasileiro se debruçar sobre tal demanda
tão séria, atual e pertinente, afim de elaborar uma legislação específica que atenda
às necessidades dos transexuais e transgêneros.

3. ARGUMENTOS A FAVOR

A visibilidade sociopolítica dada aos transgêneros e transexuais pode ser vista


como algo recente e em construção. A licença de muitos anos para criar as classes
que foram esquecidas pelo Estado e a desvinculação da identidade trans do âmbito
das patologias psiquiátricas proporcionaram a saída destas classes das margens
sociais, no qual durante muitos anos estiveram esquecidas e

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secundarizadas. Portanto, vale destacar a evolução da luta pelos direitos dessa


classe, a fim de fundamentar a necessidade de maior assistência jurídica.
Os movimentos sociais de pessoas transexuais estimulam e direcionam a
atenção para a questão de gênero e da sexualidade. Dessa forma, foi possível fazer
um grande avanço no campo psiquiátrico e observou-se que o sofrimento
encontrado nas pessoas está relacionado a uma condição de vulnerabilidade a
violência e discriminação social que esta classe se encontra.
Atualmente, os movimentos a favor das pessoas transsexuais têm seus
interesses no sentido de combater a violência e os atos de discriminação praticados
com constância na sociedade a partir do reconhecimento da classe e suas
demandas, principalmente, no que se refere a identificação por nome e sexo em
harmonia a identidade de gênero.
Ainda que tenham sido aprovadas políticas públicas que assegurem a
alteração do nome civil em alguns dos documentos de identificação oficiais, com o
objetivo de atenuar desconfortos causados por portarem um nome discordante até
mesmo do próprio reconhecimento, estas medidas são nitidamente ineficientes,
devido ao fato de que elas não preveem a alteração junto ao registro civil, de onde
partem os documentos oficiais de identificação de maior importância no país, e
ainda, não se estende a todas as esferas pública e privada.
Em síntese, é de grande importância a ADI nº 4275- DF, a proposta pela
Procuradoria-Geral da República não qualificou o alento do registro civil de
simplificação, que foi proposta no artigo do registro civil de síntese de muitíssima
importância um indivíduo transexual que é possível sem que haja uma
transformação de sexo. Os ministros do Supremo usaram determinadores da
hermenêutica da Constituição Federal, alguns dos princípios constitucionais
fundamentais como:
• Princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1, III, CF).
Refere-se às necessidades vitais garantidas de cada indivíduo, ou seja, a um valor
intrínseco como um todo. É um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito,
nos termos do artigo 1º, III da Constituição Federal, sendo o fundamento
fundamental da República.
• Princípio da igualdade (art. 5, caput, CF). Todos são iguais perante a lei, sem
distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros

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residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à


segurança e à propriedade.
• Princípio da vedação de discriminações odiosas (art. 3, IV, CF). Promover o
bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer
outras formas de discriminação.
• Princípio da liberdade (art. 5, caput, CF). Ninguém será obrigado a fazer ou
deixar de fazer alguma coisa senão em virtude da lei.
• Princípio da privacidade (art. 5, X, CF). Diz a respeito da vida privada que
consiste no direito que cada pessoa tem de assegurar a paz.
Diante disto, o novo entendimento do STF traz validação ao Direito de
Reconhecimento das transexuais, lhe provendo garantias e sendo um grande
avanço para esse grupo em questão que muitas vezes tem seus direitos
fundamentais mitigados.
O objetivo principal é definir o nome social para pessoas trans e homosexuais,
de forma que nos permita identificar socialmente desde que nos respeitemos, sem
ter que se relacionar com gênero ou sexo biológico.
O nome social é a designação de uma pessoa travesti ou transexual que se
identifica e é socialmente reconhecida, determinada e comprometida. Já a
identidade de gênero é a dimensão da identidade de um indivíduo que respeita a
forma como se relaciona tanto com a masculinidade quanto com a feminilidade e se
traduz na prática social de forma a manter uma relação não necessariamente
atribuída ao gênero.
No entanto, embora este instrumento esteja protegido de categorias de
restrições e discriminação, não é aceito quando é necessário o uso do nome de
registro, como observar a quantificação e normalização do uso do nome nas
instituições privadas. As altas taxas de violência contra travestis e transexuais
tendem aumentar à medida que se desenvolvem, comprovando a necessidade de
maior proteção a essas mulheres, uma vez que a sociedade as vejam como tais
Portanto, é necessário melhorar o âmbito de aplicação da Lei prevista no art. 1º
e ainda no art. 2º, porque o termo não é utilizado para identificar todos os indivíduos
que são mulheres privilegiadas, tanto travestis quanto transexuais.
Desta forma, apesar da não existência de legislação, de jurisprudência e da
doutrina ser bastante divergente na possibilidade de aplicação da Lei Maria da
Penha ao transexual que procedeu ou não à mudança do seu nome no registro civil,

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as omissões não podem ser o ápice para o reconhecimento de tais direitos do


ordenamento jurídico.
Tais problemáticas não podem deixar de serem vistas por quem aplica a lei ao
ponto de não proteger as ofendidas como as mesmas se identificam, somente pelo
fato delas não terem mudado seus nomes no registro geral, pode-se observar uma
inconstitucionalidade e alguns danos que chegam a ser irreparáveis, o embate entre
as garantias que deveriam ser dadas a tais mulheres, não pode ser um impedimento
para haver proteção e garantias a dignidade enquadra na lei Maria da Penha.
Fica claro que para as pessoas de gênero feminino, independem de sexo
biológico, e dependem meramente da atenção dada pelo juizado, sendo assim,
então a necessidade de se estabelecer medidas diretas que as assegure de
quaisquer interpretações. Há uma necessidade imediata de estabelecer medidas
para garantir a interpretação. Não se limita à prevenção e punição da violência
doméstica, mas se estende a todas as mulheres, mesmo reconhecendo que suas
analogias se aplicam a pessoas transexuais que vivenciam a violência, tornando-se
referência no ordenamento jurídico na busca pela segurança das mulheres.
Assim, fica evidente a questão da aplicabilidade da Lei Maria da Penha em
casos de transgêneros, tendo em vista que esses indivíduos são do mesmo gênero
feminino das mulheres amparadas por lei, e fundamentadas nos princípios da
liberdade jurídica da pessoa humana, igualdade e não discriminação. Com base no
Sistema Adicional Brasileiro da CF e na respectiva ADI nº 4275-DF, que estabelece
uma escalada cirúrgica não obrigatória seguida de um resultado inevitável,
imparável e brilhante do método da Lei Maria da Penha.
Este fato foi observado pela 1ª turma criminal do Tribunal de Justiça do Distrito
Federal e Territórios (TJDFT) sobre o processo 20171610076127, onde o Ministério
Público recorreu contra uma decisão de primeiro grau que deferiu medidas
protetivas de urgência em favor de transexual mulher agredida pelo companheiro,
mas declinou da competência para a Vara Criminal Comum, por entender ser
inaplicável a Lei Maria da Penha porque não houve alteração do patronímico
averbada no registro civil.
O gênero feminino decorre da liberdade de autodeterminação individual, sendo
apresentado socialmente pelo nome que adora, pela forma como se comporta, se
veste e se identifica como pessoa.

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A alteração do registro de identidade ou a cirurgia de transgenitalização são


apenas opções disponíveis para que exerça de forma plena e sem constrangimentos
essa liberdade de escolha. Não se trata de condicionantes para que seja
considerada mulher. Não há analogia in malam partem ao se considerar mulher a
vítima transexual feminina, considerando que o gênero é um construto
primordialmente social e não apenas biológico.
Identificando-se e sendo identificada como mulher, a vítima passa a carregar
consigo estereótipos seculares de submissão e vulnerabilidade, os quais
sobressaem no relacionamento com seu agressor e justificam a aplicação da Lei
Maria da Penha à hipótese. O recurso foi provido e determinando o prosseguimento
do feito no Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, com
aplicação da Lei Maria da Penha.
Sendo assim, fica explícito que a aplicabilidade da Lei 11.340/2006 para as
pessoas de gênero feminino, independente do sexo biológico, depende meramente
da atenção aos atos dada pelo juizado, urgindo então a necessidade de se
estabelecer medidas diretas que as assegure de quaisquer interpretações.

4. CONCLUSÃO

O legislativo vem ao longo dos anos trazendo medidas que visam a proteção da
dignidade da pessoa humana através de Leis protetivas, como a Lei do feminicídio e
o Acordo de Não Persecução Penal. Os números oficiais de agressões contra
mulheres transexuais continuam aumentando consideravelmente, o que impõe a
necessidade de discussão sobre uma lei específica de proteção em caráter imediato,
assim como foi utilizado na Lei Maria da Penha.
A criação desta nova lei deverá ser atualizada conforme o desenvolvimento social e
cultural brasileiro, onde a pessoa a ser protegida sofra violência em ambiente
doméstico, familiar ou em relação de afeto entre o agressor e a vítima.
A medida protetiva de afastamento do agressor à vítima é a parte inicial da solução
do conflito. Incluindo também qualquer tipo de aproximação e contato entre os
envolvidos por quaisquer que sejam os meios de comunicação, mantendo também o
afastamento.
A lei seria de caráter inicial educativo, prevendo a reavaliação contínua dessas
medidas ou a substituição da mesma por outras mais prudentes, de acordo com o
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caso concreto. Todas as medidas ou punições deverão ser definidas de forma eficaz,
onde a formalização processual será fundamental com base jurídica especializada,
no intuito de desburocratizar todo andamento processual automatizado.
Conclui-se que a vulnerabilidade das mulheres transexuais necessita de segurança
jurídica em caráter de urgência, por envolver questões sociais, culturais, políticas,
psicossociais e até mesmo religiosas. Contudo, esta nova norma legislativa deixará
de ser critério interpretativo subjetivo dos tribunais, passando a ser uma lei
específica destinada a mulheres transexuais, fazendo valer o princípio da dignidade
da pessoa humana, sendo referência em todo ordenamento jurídico brasileiro.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Mello, Cecília; Silva, Flávia; Jacintho, Julia Dias. Mulher transgênero, Lei Maria da
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Revista Prática Forense, Nº 55 – julho 2021.

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1500028-93.2021.8.26.0312 SP. Acórdão. Disponível em:
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se-15000289320218260312-sp-1500028-9320218260312/inteiro-teor1207888645>.

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