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A Base da Formação Espiritual

A cada dia a vida nos proporciona várias


oportunidades de crescer com fé, esperança e
amor, ou então permitir que o pecado se
espalhe pelos nossos corações espirituais e
pela nossa relação com os outros. - Virginia
Todd Holeman e Stephen L. Martyn

N
ossa história bíblica como seres humanos se inicia a partir da
criação. Deus, que existia muito antes de suas criações, apenas falou,
e então a luz apareceu em meio à escuridão. Ele então falou
novamente, e assim o paraíso e a terra foram formados, seguidos pelo solo,
as plantas e os animais. Por conseguinte, ao seu trabalho estar completo no
sexto dia, ele criou Adão “à partir do pó . . [e] soprou o sopro da vida” em
seu interior. Adão “se tornou uma pessoa viva” (Gn 2:7).
Nós sabemos que Deus não é um Criador que age sem propósito. Ele
criou com uma finalidade. O próprio livro de Gênesis inicia com a revelação
de que a criação dos seres humanos foi diferente das outras criações. Adão
foi formado pela própria mão de Deus, e seu sopro de vida foi soprado no
interior dele. O próprio sopro de Deus trouxe Adão à vida, como o ápice da
criação. Aqui nós podemos sentir que algo especial aconteceu, um ato que
originou uma relação especial entre Adão e Deus. No entanto, uma
revelação mais profunda, e incrível, é trazida para nós um pouco mais à
frente no livro de Gênesis. Deus disse, “Façamos o homem à nossa imagem,
conforme a nossa semelhança” (Gn 1:26). Podemos ver algo realmente
especial! Com a criação de Eva completando a de Adão, esses primeiros
seres humanos viveram uma relação única com Deus. Diferentemente do
restante da criação, eles foram feitos à imagem de Deus, um fato que é
fundamental para o nosso estudo de formação espiritual como seguidores
de Jesus. Assim como Thomas Merton observou, “Adão, então, foi o
primeiro a viver e respirar em uníssono com Deus, pois, assim como a alma
era a vida no corpo de Adão, o Espírito Santo que o preenchia deveria ser a
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vida de sua alma”.131 Exatamente como o de um foguete lançado em uma
missão espacial para um planeta distante, o curso da humanidade foi
definido desde o começo.
Essas revelações acerca de nossa criação pintam um lindo quadro
sobre a plena, e completa, relação entre nós e nosso Criador. Os fatos
fundamentais que são a base dessa relação foram abordados na primeira
parte deste livro, Da Fé Superficial à Verdadeira Fé. Nossa maior tragédia é
que o pecado destruiu esta relação. No entanto, nossa maior esperança é
que essa relação pode ser restaurada, e a importância dessa relação não
pode ser subestimada. Além disso, quando observamos isso da perspectiva
correta, nós conseguimos entender que o verdadeiro significado de nossas
vidas não pode ser separado desse relacionamento. Nós buscamos
restaurar essa relação por conta da alegria que ela nos trás, e pela plenitude
de saber quem fomos criados para ser. Assim como um antigo teólogo de
uma igreja observou, “a imagem de Deus é o estado ao que nossas almas
devem se esforçar para alcançar.”132
Então, embora seja fácil passarmos pela história de nossa criação à
imagem de Deus, esse na verdade é um ponto extremamente importante. E
aqui, quando falamos de imagem, não significa parecer, no senso normal da
palavra, mas sim ser à imagem de Deus133. Significa conhecer e se apropriar
da imagem do Criador. Em relação a isso, uma pequena reflexão nos ajuda a
perceber o quão dinâmica a imagem de Deus é. Em outras palavras, nossas
vidas devem ser vividas à imagem de Deus, assim como Jesus em sua
humanidade, viveu à imagem de Deus. Jesus perfeitamente demonstrou
como é viver à imagem de Deus, não passivamente tentando parecer com
essa imagem, mas literalmente sendo essa imagem.
Por conseguinte, Deus em sua sabedoria, ordenou que sua graça
viesse a este mundo através destes que vivem em sua imagem. Portanto,
nossa formação espiritual é mensurada a partir da restauração desta
imagem. “Esta é a base da formação espiritual - a re-padronização
intencional e consistente da vida de uma pessoa, de acordo com os padrões
definidos por Deus quando ele criou os seres humanos à sua imagem, que

131
Thomas Merton, The New Man (New York: Farrar, Straus and Giroux, 1962), 53.
132
Anders Lund Jacobsen, “Genesis 1–3 as Source for the Anthropology of Origen,” Vigiliae
Christianae 62.3 (2008): 213–32.
133
Deus está sempre separado de sua criação. Crescemos à semelhança da vida de Deus caráter, mas
nunca compartilhe da essência de Deus. Nota cuidadosamente que Deus é e sempre será diferente de
sua criação. Nós, por graça, podemos compartilhar o caráter de Deus (ou seja, amor ao próximo),
mas nós nunca participamos da essência divina de Deus.
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tornou isso possível apenas por meio de um poder transformador
divino.”134
Mas os filhos de Deus cresceram e se rebelaram contra ele (Isaías
1:2), e tanto a imagem, quanto o relacionamento, foi prejudicada além de
nossa capacidade de restauração. O pecado da desobediência, um resultado
direto da falta de confiança em Deus, proporcionou uma separação a qual
chamamos de a queda da graça. Novamente, na segunda parte deste livro,
será mostrado que Adão e Eva deixaram o jardim do Éden com naturezas
muito diferentes daquelas criadas por Deus. Mesmo eles sendo criado para
viverem e respirarem em uníssono com Deus, eles acabaram fazendo
exatamente o contrário, se afastando de Deus. Foi assim que Martinho
Lutero descreveu o pecado - cor incurvatus ad se, o coração voltou-se para
si mesmo.
Portanto, como pessoas que enxergam Jesus como Senhor e
Salvador, a nossa jornada é a de restauração. No entanto, toda jornada
significativa deve possuir um objetivo, e é esse próprio objetivo que
normalmente define o valor da jornada. Então, qual é o objetivo da
formação espiritual? A resposta para essa questão pode seguir diferentes
caminhos. Alguns falam que esse objetivo é a busca pela Semelhança à
Cristo, outros que é a Santidade, e alguns outros dizem que o objetivo da
jornada é a restauração da imagem de Deus.
Terminologias à parte, o verdadeiro objetivo desta jornada é
realizar uma mudança radical em nossos corações. Pois, um coração
voltado para si tenta encontrar identidade, valor, significado e propósito em
si mesmo. “Quando nos identificamos como separados e separados de Deus
- a essência do falso eu -, também nos identificamos à parte de todo o resto.
Nós nos orientamos a certa distância dos outros. Nós nos posicionamos
‘contra’ a ordem criada.”135
Portanto, como todos nós fomos feitos à imagem de Deus, mas
perdemos essa imagem, a jornada de transformação radical então é buscar
viver uma vida como seguidor de Jesus. Mas, é fácil ignorar isso quando a
igreja está tão focada no evangelismo, em ouvir as “boas-novas”, e em se
arrepender e receber o presente da vida eterna. Tudo isso que foi citado são
eventos maravilhosos, no entanto eles não são o final da nossa jornada de

134
Mel Lawrenz, The Dynamics of Spiritual Formation (Grand Rapids, MI: Baker Books, 2000),
145–46.
135
M. Robert Mulholland Jr., The Deeper Journey: The Spirituality of Discovering Your True Self
(Downers Grove, IL: IVP Books, 2006), 29.
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redenção. Deixar de viver esse crescimento que vem logo após a conversão
é deixar uma enorme lacuna na vida de alguém. Keith Meyer escreveu sobre
essa lacuna na santificação:
É exatamente este elemento perdido de mudança de vida,
ou transformação, que é exigido nas Escrituras Bíblicas.
Esses elementos aparecerem justamente entre a nossa
conversão e o fim de nossas vidas, e eles estão faltando
nos últimos cem anos desde o Grande Avivamento. É
dessa forma que nossas vidas se tornam mais uma
espécie de “sala de espera”, do que uma aventura, ou
jornada, com Deus. ... Muitos desistiram de uma vida livre
de preocupações, luxúria, raiva, desprezo, fofocas e
ganância. ... Não se espera aperfeiçoar ou progredir em
santidade nesta vida, a despeito das muitas passagens
bíblicas que afirmam que essa vida é o único lugar para
aperfeiçoamento que podemos esperar. 136
Vamos ser bem claros aqui: o arrependimento, e o recebimento do
presente da vida eterna é o primeiro passo essencial na restauração de
nosso relacionamento com o nosso Pai Celestial. É o primeiro, mas não o
último passo. Esse primeiro passo é apenas onde somos perdoados pela
graça de Deus através do sacrifício de Jesus Cristo, e nos tornamos
novamente filhos do nosso Pai. Mas esse ainda é apenas o começo, e não o
fim da graça de Deus.
A graça do Senhor continuamente nos trará para mais e mais perto
dele. Como a nossa salvação (conversão) inicial é um gracioso ato de Deus,
o resultado desta salvação é a continuação de sua graça (Fp 2:12). Em
outras palavras, quando somos salvos pela graça de Deus, nós também
somos santificados pela sua graça. Nossa santificação (ser santificado) é,
afinal, a vontade de Deus para nós (1 Ts 4:3)137. Portanto, nós entendemos
que a nossa transformação de inimigos de Deus para filhos de Deus - e
conseqüentemente nos tornando à imagem de Deus - é um resultado da sua
graça. O Espírito Santo trabalha apenas na vida do crente que é ensinado
pela iluminação dos Escritos Bíblicos - que é a palavra de Deus. Enquanto
intercede por nós, o Espírito Santo nos mostra uma alternativa para uma

136
Keith Meyer, “Whole-Life Transformation,” in Alan Andrews, ed., The Kingdom Life: A
Practical Theology of Discipleship and Spiritual Formation (Colorado Springs, CO: NavPress,
2010), 143.
137
Vale a pena notar diferentes traduções deste versículo. O termo grego τρανσλάτες pode ser
traduzido como consagração, dedicação, santificação ou santidade. A Versão King James usa “vossa
santificação”, a Nova Versão Internacional diz “que vocês sejam santificados” e a Nova Versão
Transformadora diz “que vocês vivam em santidade”.
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vida de desobediência pecaminosa e separação da vontade de Deus. É-nos
dada a oportunidade de viver esta vida de acordo com o desígnio de Deus, e
conseqüentemente nos capacitando a viver uma vida com uma confiança
cada vez maior em Deus. Nós participamos da nossa santificação através
dos meios que nos levam a graça, que incluem disciplinas como oração,
estudo da Palavra, jejum e isolamento.
Enxergar nossa antiga separação em desobediência de Deus
significa possuir uma capacidade crescente de ver e entender o nosso eu
caído. Mas isso não deve ser feito meramente por uma questão de
autoconsciência. Essa nossa visão do eu nos permite abrir todas as áreas de
nossas vidas para o Espírito Santo através de pedidos de oração por uma
transformação mais profunda. Esta é uma jornada difícil e contínua. Uma
jornada que deve ser seguida consistentemente pelo discípulo de Jesus
sempre com a certeza do amor de Deus. Caso contrário, as chances são de
que isso se torne uma derrota.
A certeza do amor de Deus deve estar ancorada no entendimento de
que não podemos ganhar ou aumentar seu amor. “Não podemos ganhar
esse amor, manipular coisas para fazer com que Deus nos ame mais ou de
alguma forma nos torne mais amáveis. Nada pode aumentar esse amor; já
nascemos amados ao máximo”.138 Deus não nos ama pelo que somos, o que
fazemos ou o que realizamos. É simplesmente assim: nós somos amados.
Com a certeza deste amor firmemente absorvida, podemos evitar cair na
armadilha de “troca de favores” tão típica de muitos relacionamentos.
Nosso relacionamento com Deus é totalmente diferente dos
relacionamentos onde a aceitação do outro depende totalmente do
desempenho. Você, como um crente, como um discípulo de Jesus, tem a
vitória! Você é um filho amado de Deus! Agora, busque ser tudo aquilo que
Jesus planejou quando te salvou (Fp 3:12)!
Um coração plenamente preenchido pelo foco e devoção era o que
os Padres e as Freiras do Deserto procuravam obter em suas vidas. Esse
grupo de eremitas, ascetas e monges cristãos viveram no deserto do Egito
por volta do século III d.C. Esses homens e mulheres fugiram para o deserto
para evitar as más influências da sociedade, apenas para descobrir a
natureza ímpia e as disposições profanas que habitam em nossos corações.
Eles aprenderam que a graça de Deus é impedida pelo nosso fracasso em
controlar as paixões, pensamentos e atitudes que fluem tão prontamente
138
Gordon T. Smith, The Voice of Jesus: Discernment, Prayer and the Witness of the Spirit
(Downers Grove, IL: InterVarsity Press, 2003), 76
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dessa natureza pecaminosa. Suas vidas de abnegação intensa levaram ao
desenvolvimento dos dísticos conhecidos como os sete pecados capitais e
as sete virtudes.
Na maioria das vezes sendo referido apenas como os sete pecados
capitais, este conceito antecede o cristianismo. Uma referência inicial ligada
à estes sete pecados é encontrada no Testamento de Rúben, uma parte do
Testamento dos Doze Patriarcas, datado em torno de 109–106 a.C..139 Sua
origem, na forma de uma coleção de textos, é mais comumente relacionada
aos esforços de formação espiritual empregados pelos Padres e Freiras do
Deserto.
Estes sete pecados capitais receberam bastante atenção durante o
século IV d.C. Eles foram preservados por João Cassiano, um monge de
origem européia, para que aqueles fora do Egito pudessem ter acesso a seus
ensinamentos. Cassiano originalmente desenvolveu uma lista de oito
pecados capitais que foram adaptados, combinados e reduzidos pelo papa
Gregório I no século VI. O resultado final foi a lista que conhecemos hoje:
orgulho, ganância, luxúria, raiva, gula, inveja e preguiça. Esses pecados são
os “pecados inerentes à alma nas condições comuns da vida”.140 Assim, cada
um deles representa um meio pelo qual o eu caído é mantido no controle da
vida de alguém. Cada um deles representa uma tendência para servir e
exaltar o ego, excluindo o amor a Deus e aos outros (Mc 12:30–31).
Como crentes, devemos considerar cuidadosamente, de maneira
informada, como agir corretamente frente a esses perigos. Holeman e
Martyn conseguiram descrever perfeitamente o desafio de todos os
seguidores de Jesus quando eles escreveram:
Cada dia de nossas vidas nos oferece várias
oportunidades para crescer em fé, esperança e amor, ou
para permitir que as más qualidades do nosso eu caído se
espalhem em nossos corações espirituais e em nossos
relacionamentos com os outros. O livre-arbítrio nos dá
uma escolha essencial: podemos voluntariamente tomar
a decisão de permitir que o pecado progrida em nossas
vidas cedendo a alguma forma de orgulho, inveja, raiva,
preguiça, avareza, luxúria ou gula, ou podemos

139
Stanford M. Lyman, The Seven Deadly Sins: Society and Evil, rev. and exp. ed. (Dix Hills, NY:
General Hall, 1989), 136.
140
Dallas Willard, The Spirit of the Disciplines: Understanding How God Changes Lives (San
Francisco, CA: Harper San Francisco, 1988), 160.
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voluntariamente nos render ao caminho santo de exercer
confiança na bondade de Deus (fé) .141
Novamente, o chamado à santidade, a semelhança à Cristo e à
imagem de Deus, está presente. Nossa resposta a esse chamado é sempre
proporcional à nossa confiança em Deus, e é a atitude intencional do crente
que permite uma resposta adequada.
Os sete pecados capitais “identificam certas disposições básicas do
mal que determinam a orientação de uma pessoa em vida comum; eles são
relativos ao 'caráter', e também universais.” 142 Esse comentário remete
inteiramente às descrições da natureza pecaminosa feita por Lutero (o
coração voltado para dentro de si mesmo) e Wesley (temperamentos e
disposições profanos). Os sete pecados capitais estão presentes na
humanidade desde que foi feita a primeira decisão de seguir o raciocínio e
os meios humanos para encontrar satisfação, ao invés de seguir o caminho
de Deus em confiança. Eles não são “histórias inventadas ou piada, mas sim
duras realidades cujos efeitos terríveis podem ser vistos em todo momento.
Eles pedem uma resposta consistente e igualmente dura de nossa parte,
apoiada pela graça infinita do Pai.” 143 Esses pecados e predisposições do eu
caído são totalmente difundidos e atuam em todas as pessoas, podendo ser
vistos não apenas na conduta do indivíduo, mas também sendo refletidos e,
conseqüentemente, moldando nossa sociedade:
A pornografia é uma conseqüência da luxúria; o abuso de
ingerir alimentos, uma conseqüência da gula; o
terrorismo uma conseqüência da inveja; a violência uma
conseqüência da raiva; a indiferença à dor e ao
sofrimento dos outros é a conseqüência da preguiça;
abuso de poder e posição de influência, confiança
pública, é a conseqüência da ganância. Todos os tipos de
coisas, incluindo um dos males sociais mais difundidos e
debilitantes de nossos dias - a discriminação - são a
conseqüência do orgulho.144
Se o seguidor de Jesus tiver uma compreensão mais profunda desses
sete pecados capitais, e da influência devastadora que eles exercem então

141
Virginia Todd Holeman and Stephen L. Martyn, Inside the Leader’s Head: Unraveling Personal
Obstacles to Ministry (Nashville, TN: Abingdon Press, 2008), 45.
142
Simon Chan, Spiritual Theology: A Systematic Study of the Christian Life (Downers Grove, IL:
InterVarsity Press, 1998), 72.
143
Willard, The Spirit of the Disciplines, 191.
144
Maxie D. Dunnam and Kimberly Dunnam Reisman, The Workbook on the 7 Deadly Sins
(Nashville, TN: Upper Room, 1997), 3.
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ele se torna mais capaz de identificar sua presença. Isso então permite que
o crente abra seu coração para o poder do Espírito Santo, despertando o
desejo de ser cada vez mais caracterizado pelas sete virtudes. Cassiano
observou: “Nenhuma doença pôde ser curada, nem remédios puderam ser
fornecidos aos doentes, sem antes que suas origens e causas tivessem sido
investigadas por meio de uma pesquisa cuidadosa.”145 Se isso for verdade, e
claramente parece ser, então é totalmente necessário que uma análise dos
sete pecados capitais seja aprofundada para assim poder encontrar sua
cura. Tal cura nos moverá em direção à virtude e à mudança profunda.
Merton afirmou isso através de um ensinamento de Cassiano:
Ao explorar esses vícios, deve-se procurar, em primeiro
lugar, conhecer sua natureza, depois suas causas e,
finalmente, os remédios para eles.... Muitas vezes, em
nossa luta pela virtude, não prestamos atenção às causas
ocultas do vício: simplesmente nos opomos à paixão
usando mais paixão e ignoramos as raízes da desordem
que tornam nossa paixão pecaminosa. Por conta disso, o
conhecimento de si mesmo, e dos remédios para o
pecado, foi um dos pilares do ascetismo do Deserto. 146
Os vícios devem ser examinados com o intuito de conhecer sua cura.
Sua cura, que é encontrada nas sete virtudes, é usada como um meio para
se alcançar um coração transformado, através do qual desfrutamos de um
relacionamento mais profundo e íntimo com Deus.
Jesus falou de justiça como algo que excede as competências dos
escribas e fariseus (Mt 5:20). Dessa maneira, ele esperava que isso fosse
realizado “entendendo cada proibição à luz do vício fundamental em sua
raiz, evitando não apenas atos de assassinato ou adultério, mas também
raiva, ódio e luxúria (Mt 5:20-30)”.147 Assim, as principais verdades
teológicas da formação espiritual encontram aplicação através dos sete
pecados capitais e das sete virtudes como um modelo para a criação de uma
autoconsciência e uma mudança radical espiritual através da graça
capacitadora de Deus.

145
John Cassian, John Cassian: The Institutes, trans. Boniface Ramsey (New York: Newman Press,
2000), 256.
146
Thomas Merton, Cassian and the Fathers: Initiation into the Monastic Tradition, ed. Patrick F.
O’Connell (Kalamazoo, MI: Cistercian Publications, 2005), 156.
147
Cheslyn Jones, Geoffrey Wainwright, and Edward Yarnold, The Study of Spirituality (New
York: Oxford University Press, 1986), 66.
101

REFLEXÃO E APLICAÇÃO

1) Neste capítulo, muita atenção foi dada a Adão e Eva


e sua desobediência ao comando simples de Deus:
não comam da árvore do conhecimento do bem e do
mal. Sua falta de confiança na bondade de Deus
estava no centro de seu pecado. Este primeiro
relacionamento entre Deus e a humanidade foi a
base da qual surgiu o Grande Mandamento em que
Jesus nos diz para amar a Deus com todo o nosso
coração, alma, mente e força, e amar o próximo como
a nós mesmos.
a) De que forma a confiança em Deus é essencial
para amá-lo com todo nosso coração, alma,
mente e força?
b) Como a confiança em Deus permite que um
seguidor de Jesus ame seu próximo?
c) Como Deus torna possível (nem sempre fácil,
mas possível) confiar em sua bondade?
2) Thomas Merton escreveu: “Adão, então, era
destinado desde o princípio a viver e respirar em
uníssono com Deus, pois assim como a alma era a
vida do corpo de Adão, o Espírito de Deus que se
formou em Adão seria a vida de sua alma ”. Essa
visão do desígnio de Deus sugere que o próprio
sentido da vida é inseparável de nosso
relacionamento com Deus, nosso Criador e Pai. Leia
Mateus 6: 31–33; Filipenses 3:17–21; Colossenses
3:1–4. Reflita sobre o projeto de Deus para nossas
vidas de acordo com esses versículos.
a) Com o que você concorda nesta sugestão sobre o
significado da vida e por quê?
b) Com o que você não concorda e por quê?
c) Pensando além de uma simples resposta
superficial, o que esses versículos dizem a um
seguidor de Jesus sobre as prioridades da vida de
alguém?
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3) Uma premissa existente ao longo deste livro é que
nossa formação espiritual é aprimorada quando
temos um conhecimento profundo do eu. E isto não é
feito meramente por uma questão de
autoconsciência. Pelo contrário, é um entendimento
essencial para que possamos abrir todas as áreas de
nossas vidas para a obra transformadora do
Espírito Santo. Essa premissa será aplicada com
maior particularidade nos próximos capítulos, mas,
por enquanto, reflita de maneira ampla acerca
dessa premissa.
a) Quais são algumas das maneiras gerais pelas
quais a autoconsciência é importante em nossas
vidas?
b) Como os esforços para desenvolver nossa
formação espiritual são dificultados em áreas
onde não temos conhecimento do eu?
c) Quais são alguns dos obstáculos para a
aquisição do conhecimento de si mesmo e quais
são algumas práticas que ajudariam a combater
esses obstáculos?

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