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1.Introdução
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Arbitragem e acesso à justiça na sociedade da
informação: uso de instrumentos tecnológicos no
procedimento arbitral
Busca-se, por meio deste artigo, analisar a arbitragem como instrumento de acesso à
justiça na sociedade da informação, com a análise do uso das novas tecnologias no
procedimento arbitral como meio de ampliação da efetividade e celeridade. Para isso,
inicialmente serão analisados os conceitos de acesso à justiça e de meios alternativos de
solução de conflitos. Posteriormente, será analisada a arbitragem como meio efetivo de
acesso à ordem jurídica justa. Por fim, serão analisadas as tecnologias disponíveis para
dar celeridade e efetividade ao procedimento arbitral.
Entretanto, é necessário salientar que o acesso à justiça não consiste somente na mera
possibilidade de ingresso em juízo para apreciação de um pedido por meio da atividade
jurisdicional.
O acesso à justiça deve ser tratado como requisito fundamental de um sistema jurídico
moderno que busque garantir os direitos de forma igualitária, e não apenas proclamar os
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direitos de todos . Vale dizer, portanto, que o acesso à justiça não trata apenas de se
possibilitar o acesso ao Poder Judiciário estatal, mas trata de tornar viável o acesso à
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ordem jurídica justa .
Nas palavras de Kazuo Watanabe, o acesso à ordem jurídica justa pode ser caracterizado
“no sentido de que cabe a todos que tenham qualquer problema jurídico, não
necessariamente um conflito de interesses, uma atenção por parte do Poder Público, em
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especial do Poder Judiciário” . Para efeito deste estudo, vale destacar um dos dados
elementares do conceito de acesso à ordem jurídica justa, apresentado por Kazuo
Watanabe, o qual consiste no direito à remoção de todos os obstáculos que se
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anteponham ao efetivo acesso à justiça .
Segundo José Afonso da Silva, o direito de acesso à justiça “não pode e nem deve
significar apenas o direito formal de invocar a jurisdição, mas o direito a uma decisão
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justa” .
Nesse sentido, conforme leciona Maria Tereza Aina Sadek, “o direito de acesso à justiça
não significa apenas recurso ao Poder Judiciário sempre que um direito seja ameaçado.
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Esse direito envolve uma série de instituições estatais e não estatais” .
Logo, verifica-se que a jurisdição estatal não deve ser a única opção para a resolução de
conflitos, tendo em vista que a democracia pressupõe que os cidadãos possam escolher
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outros mecanismos que sejam úteis aos anseios da sociedade .
Dessa forma, partindo do acesso à justiça como um conceito mais amplo do que o mero
acesso ao Poder Judiciário para a tutela de um direito material ameaçado ou violado,
podem ser analisados os meios alternativos de solução de conflitos como integrantes
daquele. Segundo Ivan Martins Tristão e Zulmar Fachin, “o acesso à Justiça deve conter
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diversos meios de pacificação de conflitos, assim como a ordem jurídica deve oferecer
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instrumentos hábeis à consecução, rápida, segura e justa de uma pretensão” .
Por fim, cabe analisar o meio alternativo de solução de conflito com natureza de
heterocomposição, ou seja, a arbitragem, a qual pode ser entendida como “mecanismo
privado de solução de litígios, por meio do qual um terceiro, escolhido pelos litigantes,
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impõe sua decisão, que deverá ser cumprida pelas partes” .
Portanto, é possível dizer que o acesso à justiça engloba tanto a garantia constitucional
de acesso ao Poder Judiciário, como as formas alternativas de solução de conflitos, pois
aquele deve ser entendido além das garantias constitucionais do processo civil em
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sentido estrito. Vale destacar, ainda, que os meios alternativos de solução de conflitos
também são meios de conduzir os litigantes à satisfação do litígio com efetividade, o que
condiz com o acesso à ordem jurídica justa.
Essa equivalência também decorre do artigo 3º do Código de Processo Civil de 2015, que
repete o princípio da inafastabilidade da jurisdição, mas em seguida traz a expressa
possibilidade da realização da arbitragem na forma da lei, bem como o estímulo à
promoção da solução consensual dos conflitos pelo Estado, bem como pelos juízes,
advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público.
Diante disso, é imperioso destacar que a utilização dos meios alternativos de solução de
conflitos “é uma via legítima, por ser democrática, para ampliar e dar maior efetividade
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ao acesso à Justiça, na sua concepção de acesso à ordem jurídica justa” .
No tópico anterior foi possível concluir que os meios alternativos de solução de conflitos
também são instrumentos de ampliação do acesso à justiça, em busca da pacificação
social.
Conforme demonstrado, a busca pelo acesso à justiça não deve, necessariamente, estar
ligada à atividade jurisdicional estatal tradicional. Nesse sentido, a “tutela jurisdicional
tradicional não é o único meio de conduzir as pessoas à ordem jurídica justa, eliminando
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conflitos e satisfazendo pretensões justas” .
Vale dizer, “o meio alternativo de solução de conflito que possui maior destaque, como
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via legítima de ampliação do acesso à Justiça, é a arbitragem” . Ademais, “a sobrecarga
dos tribunais e as despesas excessivamente altas com os litígios podem tornar
particularmente benéficas para as partes as soluções rápidas e mediadas, como o juízo
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arbitral” .
Portanto, uma modalidade de pacificação de conflitos que foi por vezes considerada
inacessível para diversos setores da sociedade passa por uma modernização do
procedimento, com o uso de novas tecnologias, as quais diminuem o custo e a sua
duração. Assim, pode-se concluir que a arbitragem se torna cada vez mais um dos
instrumentos de acesso à ordem jurídica justa, pois consiste em um dos meios
disponíveis para a resolução dos conflitos sociais.
Nesse sentido, nota-se que “o Poder Judiciário não possui o monopólio da efetivação dos
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direitos e da resolução de conflitos. Não é a única porta de acesso à justiça” , e,
portanto, a arbitragem também cumpre esse papel.
Segundo Ricardo Soares Stersi, a arbitragem “não é uma resposta única ou, ainda,
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mágica para as dificuldades de acesso à justiça” , mas é um dos instrumentos para que
isso seja alcançado, o que pode ser confirmado com as lições de Dinamarco sobre a
preocupação do processualista moderno, que “é o aclaramento e agilização dos meios de
acesso à ordem jurídica justa, mediante um sistema em que figure como estrela de
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primeira grandeza a preocupação pelos resultados” .
Diante disso, o procedimento arbitral, regido pela autonomia da vontade das partes,
pode ser conduzido com menor formalidade e, ao mesmo tempo, acentuar a celeridade e
a efetividade. Isso pode ser ampliado com o uso de novas tecnologias aptas a eliminar
barreiras geográficas, temporais e econômicas, conforme se analisará no próximo tópico.
A sociedade passou por uma enorme transformação após a Segunda Guerra Mundial, por
conta das evoluções tecnológicas que nos levaram à atual sociedade, na qual a
informação passou a ser dotada de valor econômico e “flui a velocidades e em
quantidades há apenas poucos anos inimagináveis, assumindo valores sociais e
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econômicos fundamentais” .
traria maior efetividade e agilidade dos meios de acesso à justiça, com redução dos
custos do juízo arbitral.
Segundo Thomas Schultz: “Cost and time reductions can also be obtained through a
form of automation and standardization of certain aspects of an arbitral procedure,
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achieved through information technologies” .
Assim, vale dizer que a redução de custos e o rompimento das barreiras geográficas e
temporais, pelo uso de tecnologias no procedimento arbitral, surgem como instrumentos
ampliadores do acesso à justiça, em total benefício das partes.
É certo que o artigo 4º da Lei 9.307/1996 (LGL\1996\72), em seu § 1º, prevê que “a
cláusula compromissória deve ser estipulada por escrito, podendo estar inserta no
próprio contrato ou em documento apartado que a ele se refira”. Sobre os motivos para
essa exigência legal, assim leciona Gabriel Herscovici: “a imperatividade de a convenção
arbitral estar por escrito, conseguintemente, está ligada à necessidade de conseguir
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acessar o conteúdo da mesma. Ou seja, é uma questão de garantir a integridade” .
Para fixação da sede da arbitragem, a Lei 9.307/1996 (LGL\1996\72), em seu artigo 11,
inciso I, adotou o critério de vontade das partes, de modo que deve constar do
compromisso arbitral “o local, ou locais, onde se desenvolverá a arbitragem”.
Desse modo, é plenamente possível que as partes exprimam sua vontade na celebração
do compromisso arbitral, para a determinação da sede mesmo na arbitragem realizada
em meios eletrônicos.
É certo que, na sociedade atual, existem diversos tipos de tecnologias prontas para
aplicação em qualquer procedimento, o que não é diferente na arbitragem. Os
programas de computadores e páginas na internet elaboradas para a realização dela na
forma virtual se enquadram no âmbito dessas novas tecnologias, disponíveis para que o
procedimento seja mais célere e efetivo. Segundo Gabriel Herscovici, “uma das
importantes funções destes softwares, aliás, reside na capacidade de monitorar e
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gerenciar casos, facilitando o acompanhamento dos mesmos” .
"Information technology can also be used to improve the management of cases, for
instance by using progress tracking software, which for instance shows at which stage a
given case is, what the next expected actions are, and when the deadline is. It may also
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graphically show the relationships between the various actors of the case ."
Vale destacar que a análise realizada neste estudo, sobre a utilização de tecnologia no
procedimento arbitral, configura uma das modalidades de ODR (Online Dispute
Resolution), significando os próprios meios alternativos de solução de conflitos realizados
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em meio eletrônico .
É certo que o presente estudo está voltado para a efetividade da arbitragem pelo uso de
tecnologias e, por esse motivo, analisa-se o fenômeno da sociedade da informação
apenas sob a ótica da arbitragem. Entretanto, conforme mencionado anteriormente, as
tecnologias trouxeram benefícios em todas as modalidades alternativas de resolução de
conflitos, o que levou à criação de diversos tipos de ODR (Online Dispute Resolution).
Logo, pode-se dizer que todos os meios alternativos de solução de conflitos podem ter os
seus custos reduzidos pelo uso da tecnologia da informação e, no caso do presente
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5.Conclusão
O presente estudo demonstrou como as tecnologias podem ser aliadas das partes e do
árbitro para que a solução do conflito seja realizada de forma mais célere e efetiva.
6.Referências
CAHALI, Francisco José. Curso de arbitragem. 5. ed. São Paulo: Ed. RT, 2015.
CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Trad. Ellen Gracie Northfleet.
Porto Alegre: Fabris, 1988.
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Malheiros, 2013. v. 1.
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São Paulo, n. 101, p. 55-66, mar.-abr.-maio 2014.
SANTOS, Ricardo Soares Stersi dos. Arbitragem e Acesso à justiça. Revista Sequência,
Santa Catarina, n. 53, p. 253-268, dez. 2006.
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de Janeiro, v. 216, p. 09-23, abr.-jun. 1999.
TRISTÃO, Ivan Martins; FACHIN, Zulmar. O acesso à justiça como direito fundamental e
a construção da democracia pelos meios alternativos de solução de conflitos. Scientia
Iuris, Londrina, v. 13, p. 47-64, nov. 2009.
1 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Trad. Ellen Gracie Northfleet.
Porto Alegre: Fabris, 1988. p. 12.
5 SILVA, José Afonso. Acesso à justiça e cidadania. Revista de Direito Administrativo, Rio
de Janeiro, v. 216, p. 09-23, abr.-jun. 1999.
6 SADEK, Maria Tereza Aina. Acesso à justiça: um direito e seus obstáculos. Revista USP
, São Paulo, n. 101, p. 55-66, mar.-abr.-maio 2014.
7 TRISTÃO, Ivan Martins; FACHIN, Zulmar. O acesso à justiça como direito fundamental
e a construção da democracia pelos meios alternativos de solução de conflitos. Scientia
Iuris, Londrina, v. 13, nov. 2009. p. 48.
8 TRISTÃO, Ivan Martins; FACHIN, Zulmar. O acesso à justiça como direito fundamental
e a construção da democracia pelos meios alternativos de solução de conflitos. Scientia
Iuris, Londrina, v. 13, nov. 2009. p. 54.
9 CAHALI, Francisco José. Curso de arbitragem. 5. ed. São Paulo: Ed. RT, 2015. p. 44.
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22 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Trad. Ellen Gracie Northfleet.
Porto Alegre: Fabris, 1988. p. 83.
23 SADEK, Maria Tereza Aina. Acesso à justiça: um direito e seus obstáculos. Revista
USP, São Paulo, n. 101, p. 55-66, mar.-abr.-maio 2014.
24 SANTOS, Ricardo Soares Stersi dos. Arbitragem e acesso à justiça. Revista Sequência
, Santa Catarina, n. 53, p. 253-268, dez. 2006.
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