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NECESSIDADES EDUCATIVAS ESPECIAIS, Universidade Aberta

Book · January 2003

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2 authors:

Isabel Pizarro Madureira Teresa Leite


Instituto Politécnico de Lisboa Instituto Politécnico de Lisboa
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Unirersidade
aberta

NECESSIDADES EDUCATIVAS
ESPECIAIS

ISABEL PIZARRO MAIRREIRA


TERESA SA\TOS LETTE
f.sabel Pizarro Madureira
Feresa Santos Leite

ECESSIDADES EDUCATWAS
.ESPECIAIS

tjuiver:idade Aberta
Capa: Fmnuisco

Copyright UNIVERSIDADE ABERTA —2003

Pakício Ccia • Rua da Escola RAik'cuica, 147

1269-001 Lisboa — Portugal

Www.univH.1b.pt

e-rn;d1: cycndas@univ-alipt

UE:

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\ie iv s E peci ais

Introdução

1. Evolução das Perspectivas sobre a Educação da Criança Dife-


rente

17 Da perspeetiva assistencial 7i perspectiva educativa

A evolução da Educação Especial da segregação a integração

27 O conceito de Necessidades Educativas Especiais

A perspectiva inclusiva

43 Actividades

2. ,kvaliação e Identificaçáo de alunos com Necessidades V.doca-


ti .s, as F,speciais

Perspectivas na avídiaçao de alunos com necessidades educativas especíais

63 fdentificação e Avaliação — claríficação de conceitos

t,t) identificação de alunos com necessidades educativas especiais — processos e


instrumentos

Actividades

3. (7urrícuto e Necessidades Educativas Especiais

()0 flexibilidade curricular

Processos de dit'erct)CiaÇao pedagót>ica

I 01 Adaptacões curriculares individualizadas

117 Currículos k'speciais

I I Actividades

. fsores e a incin-ão


127 iboracao n


1111 íl,hT ',15„K(fOL/t 1 iii ii 4Iwç S14/1 n 4,'.; 111 occe educ.Ai.hls
2 ctiv idades

Bibliogratia
1n trodução
A inclusão de alunos com necessidades educativas especiais no sistema regular
de ensino constitui uma inovação educativa actualmente defendida, a qual
surge na sequência de princípios que se têm vindo a preconizar desde a
publicação da Lei de Bases do Sistema Educativo, em 1986. Desde então se
aponta para a necessidade de garantir a igualdade de acesso e sucesso educativos
a todos os alunos e, nesse sentido, já nas últimas décadas do século passado,
se desenvolveram processos que visavam a integração escolar dos alunos com
necessidades educativas especiais.

Tendo também como preocupação fundamental a educação de todos os alunos,


a perspectiva que preconiza uma escola inclusiva abrange, no entanto, não
apenas aqueles que apresentam necessidades educativas especiais, mas também
todos os que provêm de contextos étnico-culturais diferentes. Esta perspectiva
fundamenta-se em pressupostos inovadores já que as diferenças dos alunos na
aprendizagem são equacionadas como positivas, uma vez que permitem
desencadear processos de mudança na forma como as escolas e os professores
organizam o currículo.

Preconizar uma escola inclusiva não significa, no entanto, que todos os alunos
devam participar no currículo comum e atingir os níveis académicos nele
previstos. De facto, existem crianças e jovens com problemáticas mais profundas
que necessitam de processos educativos específicos, os quais devem ser
equacionados no contexto escolar, embora não necessariamente na sala de aula.

Com efeito, uma vez que o acto educativo tem como finalidades últimas a
integração/adaptação na sociedade e o desenvolvimento da autonomia, à escola
compete a educação de todos os cidadãos. Nesse sentido, não pode restringir-
-se à escolarização de alguns, devendo garantir de forma efectiva a educação
de todos.

No entanto, a implementação prática destes princípios constituiu e constitui


ainda um processo difícile lento, uma vez que as escolas e os professores não
estão suficientemente preparados para as exigências que uma escola inclusiva
supõe. De facto, esta exige que se desenvolva, na escola, uma cultura e uma
dinânica organizacionais baseadas na colaboração entre profissionais e entre
estes e outros agentes educativos, desiLmadamente os pais. Exige ainda
mudanças significativas em termos de atitudes, capacidades e conhecimentos
dos docentes, no sentido de desenvolverem práticas pedagógicas que respeitem,
reconheçam e valorizem as diferenças individuais.

Docentes de diferentes niveis de ensino manitestam frequentemente preocu-


paçoes, dificnkktdes, e carências em termos de fonnação para desempenhar
eficazmente as competências que tetualmente lhes estão atribuídas neste
dominio. Com eteito, a maior parte das reservas expressas pelos professores
em relaçâo i nelusâo de alunos euni necessidades educativas especiais
decorrem de preocupações com a falta de condicões estruturais nas escolas e
com a ausência de preparação profissional. Neste contexto, a inclusão é
percebida e vivida, por vezes, como fonte de insatisfação pessoal e profissional,
devido a sentimentos de frustração e insegurança, evidentes nos receios que
manifestam sobre a relação pedagógica com estes alunos e sobre os processos
de ensino mais adequados. Por outro lado, os docentes revelam, muitas vezes,
representações negativas sobre as possibilídades educativas destes alunos que,
n ecessariamente, influenciarão a relação pedagógica e o próprio desempenho
dos alunos.

A inclusão pode conduzir ainda a um aumento de trabalho e de dificuldades


na prática pedagógica, n omeadamente na organização do processo de ensino/
aprendizagem, no que respeita à planificação para grupos h eterogéneos, à
selecção de actividades e recurSos diferenciados, à gestão clo tempo, à motivação
dos alunos... No entanto, em muitos casos, estaS dificuldades decorrem na
natural heterogeneidade dos grupos, a qual continua a ser ignorada na prática
docente. Nesse sentido, a inclusão de alunos com necessidades educativas
especiais poderá constituir um analisador profissional, pondo em evidência
preocupações e dificuldades pré-existentes na prática docente.

Perante este cenário, toma-se imprescindível assegurar, na formação inicial e


contínua de professores, o desenvolvimento de competências e atitudes que
permitam um maior conhecimento sobre estes alunos e sobre os processos de
gestão e organização da escola e do grupo/turma, que tenham em conta a
diversidade da população escolar.

Porque pensamos que muitas das dificuldades e receios dos docentes estão
associadas a um d esconhecimento sobre a educação dos alunos com
necessidades educativas especiais, elaborou-se este manual que pretende
contribuir para a formação neste domínio.

O manual encontra-se organizado em quatro capítu los. No primeiro,


c
aracteriza-se a evolução das perspectivas e formas de atendimento desen-
volvidas face à criança diferente e definem-se os principais conceitos subjacentes
às abordagens actualmente preconizadas.
O segundo capítulo
começa por deserever e analisar de forma comparada
diferentes perspeetivas equacionadas no âmbito da avaliação de alunos com
necessidades educativas especiais, para, em seguida, distinguir os conceitos
de id
entificação e avaliação e apresentar os processos e instrumentos
correspondentes.
No terceiro capítulo,
enquadra-se e analisa-se a problemadea da flexibilidade
currieular e da d
iferenciação pedagógica, para depois deserever os processos
vi
dwdizados de adaptação currieular e de elaboração de eurrícu los
especiais.
Por último, no quarto capítulo, perspectivam-se formas de organização da
escola que facilitam a educação dos alunos com necessidades educativas
especiais, dando relevo ao trabalho em equipa e à articulação com as famílias
destes alunos.
No final de cada capítulo elaborou-se um conjunto de actividades que
entendemos poder facilitar a sistematização e reflexão, por parte dos formandos.
1. Evolução das Perspectivas sobre a Educação
da Criança Diferente
Objectivos gerais do capítulo:

• Caracterizar a evolução das perspectivas e formas de atendimento à


população com diferenças significativas em relação à maioria;

• Dar aconhecer os principais conceitos subjacentes às abordagens actuais


nesta área;

• Permitir a análise crítica dos conceitos abordados e das práticas em


vigor neste domínio:

Conhecímentos, capacidades e atitudes a desenvolver

No final deste capítulo, o formando deverá ser capaz de:

• Identificar as etapas mais significativas da evolução do atendimento a


crianças e jovens diferentes;

• Identificar as linhas de força desse percurso evolutivo e relacioná-lo


com as modificações sociais e científicas;

• Caracterizar as tendências político-educativas actuais;

• Definir os conceitos de educação especial, necessidades educativas


especiais, escola inclusiva;

• Analisar as suas próprias concepções face à diferença, em termos


pessoais e profissionais e situar-se em relação à problemática.

Temas a desenvolver

• Da perspectiva assistencial à perspectiva educativa;

2. A evolução cia Educação especial — da segregação à integração;

3. O conceito de necessidades educativas especiais

4. A perspectiva inclusiva

1$
1. 1 Da perspectiva assistencial à perspectiva educativa

"Não há, não,


duas folhas iguais em toda a criação.
ou nervura a menos, ou célula a mais,
não há, de certeza, duas folhas iguais."

António Gedeão

A história do atendimento a indivíduos que apresentam diferenças físicas,


motoras, sensoriais, mentais e emocionais significativas em relação à restante
população, mais do que constituir o estudo da situação particular destes
indivíduos, reflecte e restitui a imagem da evolução da própria sociedade, ao
longo das épocas: do modo como se foi perspectivando a si própria como
comunidade; dos valores que a nortearam nas diferentes épocas; das
capacidades e atitudes que foi valorizando ou desvalorizando em diferentes
períodos históricos.

O estudo das perspectivas sobre a população com problemas graves e das


consequentes formas de atendimento não apresenta uma linha linear e
progressiva; pelo contrário, mostra que, num mesmo período histórico, comu-
nidades com diferentes características tratam de modo diferente os indivíduos ' Consideramos aqui não
apenas a classificação tradi-
que apresentam defíciências (ou sobre-eficiências)' ; e que, mesmo na sociedade cional das deficiências
ocidental, o processo se fez com desvios, retrocessos, saltos bruscos, fenómenos (motora, auditiva, visual,
mental e multideficiência) e
de moda, etc., na maior parte dos países. das perturbações (dificulda-
des de aprendizagem e pro-
Estas características devem-se, em grande parte, ao facto de o atendimento a blemas emocionais), mas
também a sobredotação (Cf.
ndivíduos que apresentam diferenças significativas em relação à maioria da Suran e Rizzo, 1979; Kirk e
população sofrer as influências da evolução de diferentes áreas do conhecimento Gallagher,I987; Sprinthall
e Sprinthal1,1993, entre ou-
e de diferentes áreas de actividade social. A predominância de uma área sobre tros).
a outra, na forma de considerar esta população (quer ao nível das perspectivas
sociais e científicas que sobre ela se tinham, quer ao nível dos processos práticos
de acompanhamento) veio a marcar indefectivelmente os vários períodos da
história da educação especial.

A maior parte dos autores que se debruçaram sobre esta temática distingue
quatro grandes fases na forma de atendimento a esta população.

Considerada por esses autores como a Pré-História da Educação Especial, a


primeira fase não tem marcos precisos quanto ao seu início. Da antiguidade
cl ássica, c hega-nos notícia, como é sabido, do infanticídio perpetrado contra
os bebés deficientes, em cidades como Esparta; na klade Média, sabemos que

I7
os deficientes eram considerados possuídos pelo demónio e submetidos a
exorcismos e,.por vezes, abandonados sozinhos em matas e florestas.

Nos séculos XVJIe XVIII, os deficientes eram internados em asilos, hospícios


ou prisões, muitas vezes tratados como criminosos por se considerar que a
deficiência era o reflexo de uma falha moral grave do indivíduo ou dos pais.
Nessas instituições, os deficientes jovens cresciam junto com idosos, marginais
e indigentes, não lhes sendo prestado qualquer atendimento especial.

Durante este período, porém, é de salientar o carácter inovador de estudos e


experiências levados a efeito por alguns médicos, religiosos ou estudiosos de
várias áreas do saber, ainda que numa base individual e sem repercursões
imediatas no atendimento geral a esta população.

Um dos exemplos mais antigos de que temos conhecimento é o do trabalho de


Ponce de Léon que, em 1520, criou, num mosteiro beneditino espanhol, uma
classe de 12 jovens adultos surdos a quem ensinou 1 inguagem escrita
(associando-a a objectos), a partir da qual se treinava posteriormente a articula-
ção oral das palavras e frases e conseguindo resultados que, à epoca, foram
considerados s
ignificativos. Outra experiência realizada com jovens surdos
= Soletração de palavras com foi desenvolvída por J. Pablo Bonet, também espanhol, em 1629. Bonet
as mãos, formando eom os desenvolveu um processo de ensino baseado no alfabeto manuar em associação
dedos diferentes símbolos
que representam as letras do com a linguagem escrita, à qual posteriormente se associava o treino da fala.
alfabeto.
Em 1755, em França, o abade L'Épée criou a primeira escola pública para
Sistema de eomunicação
formado por gestos padro- alunos surdos, mais tarde denominada Instituto Nacional de Surdos Mudos de
nizados, com vocabulário, Paris. O abade L'Épée baseou-se na noção de que a linguagem gestual
regras e processos de uso 3éa
próprios. língua natural dos surdos e desenvolveu um sistema codificado de gestos a
partir daqueles que naturalmente os alunos surdos já usavam. Este sistema
' Cada país tem uma língua
gestual nacional, que não codificado de gestos veio depois a dar origem à Lingua Gestual Francesa
co rresponde à língua falada 4eo
seu processo de ensino e associação com a linguagem escrita vieram a ser
nesse país e que, tal eomo as largamente divulgados.
línguas orais, se foi forman-
do a partir de earacterístieas
eulturais, g eográficas, bis- Ern 1784, Valentin Ffiiy criou, também em Paris, um Instituto para Cegos.
tóricas, ete.
Louis Braille, que viria mais tarde a desenvolver o sistema Braille
' Rep resent:tção das e tias do
5 de leitura
para cegos, foi aluno dessa instituição.
; n Ifabeto ;itravés de padrdes
fo rniado% por conjuntos dc
pontos t:ictilniente identi- Estes exemplos (entre muitos outros que seria possível retèrir) servirão para
riczívcis_ mostrar que as primeiras experiéneias de co
mpreensão, estudo e eduegão
nesta area se orientaram para os indivíduos com
pr
deficiências sensoriaís, cuja
oblemática á mais delimitada e, nesse sentido, mais facihnente abordável
termos elínicos, técnicos e educacionais.

Também em Portugal, durante este período foram sendo eriados os primeiros


stitutos e asi los para cegos e para surdos, partindo de iniciativas religiosas e
uom finalidades de benemerência.
Os estudos antes referídos e as instituições assistenciais a que deram origem
podem ser considerados como percursores de uma segunda fase do
atendimento a individuos com diferenças significativas, marcada pelo
aparecimento de estruturas de atendimento especializadas para os vários tipos
de deficiência.

Nesta segunda fase, cujo início podemos situar no século XIX, generaliza-se
a noção de que a sociedade é responsável pela protecção e apoio à população
deficiente e surgem instituições especializadas para deficientes. A criação
destas não obedeceu, na maior parte dos países, a um plano pré-definido,
sendo criadas de forma mais ou menos aleatória por particulares, pela Igreja,
por instituições de beneficência social ou pelo estado e apresentando entre si
muitas diferenças quanto a finalidades, qualidade de atendimento ou mesmo
qualidade de acolhimento. Assim, enquanto algumas dessas instituições
prosseguiam fins puramente assistenciais, outras tinham já finalidades
marcadamente educativas, e esta distinção delimitava, por sua vez, diferentes
formas de funcionamento e intervenção.
Neste período, foram desenvolvidos vários trabalhos de índole científica, nos
quais se procurava diferenciar não só tipos de deficiência, como também graus
e formas de uma mesma deficiência, sendo portanto necessário definir métodos
e técnicas de avaliação de capacidades visuais, auditivas, motoras, intelectuais.

Entre os estudiosos que se debruçaram sobre estas problemáticas, referiremoS


Pinel (1745-1826), que escreveu os primeiros tratados sobre o atraso mental;
Esquirol (1722- 1840) que estabeleceu a diferença entre idiotismo e demência;
Itard (1775-1838) que estudou a deficiência audítiva e a deficiência mental e
que, durante alguns anos, acompanhou de perto o caso do "menino selvagem"
de Aveyron; e Séguin (1812-1880) que se debruçou sobre a deficiência mental
e desenvolveu propostas de educação para esta população baseadas no treino
sensório-motor.
Por sua vez, Galton (1822-1880) e Binet (1857-1911), como é sabido, no
início do século XX desenvolveram técnicas de avaliação da inteligência que
foram depois muito usadas na classificação dos níveis de deficiência intelectual
e na possibilidade da educação ou treino destes alunos.

Também no início do século XX, Montessori e Décroly deram um impulso


decisivo aos processos de intervenção em educação especial. Através do
desenvolvimento da "pedagogia eientifica" estes autores, que começaram por
se debruçar sobre os alunos com deficiência, vieram a contribuir para as
profundas reformas escolares que tiveram lugar na Europa da época, nomea-
damente através do movimento que veio a ser denominado "educação nova" .
Contribuíram ainda para a compreensão das problemáticas das crianças e jovens
diferentes e para a criação de métodos e técnicas de desenvolvimento das suas
capacidades, influenciando directa OU indirectamente os estudos, processos
de intervenção e até mesmo as políticas educativas que foram implementadas
durante o século XX.

Em síntese, durante esta segunda fase, assistimos a uma progressiva mudança


da perspectiva assistencial que referenciámos no seu início, para uma
perspectiva clínica que se foi gradualmente estabelecendo a partir dos trabalhos
citados, notando-se ainda uma cada vez maior preocupação com as questões
terapeuticas e educativas.

" Usava-se muito nesta altu-


Nas décadas 30/40 do século XX, inicia-se aquela a que poderemos chamar
uma terceira fase, esta de carácter marcadamente educativo
ra o termo reeducação ou 6 e dominada pela
mesmo reabilitação. Estes procura das soluções pedagógicas mais adequadas.
termos só deveriam ser usa-
dos no caso dos adultos que,
por qualquer doença ou aci- De facto, é a partir desta altura que, nas sociedades ocidentais se inicia e/ou
dente, ficam deficientes. De
expande a escola básica pública e se estabelece a sua obrigatoriedade (ainda
facto, a maior parte das de-
ficiências das crianças e jo- que com grandes diferenças cronológicas, formais e processuais nos diversos
vens surgem no período pré-
natal, neo-natal ou pós-na-
países). Embora a população deficiente fosse excluída da obrigatoriedade de
tal, exigindo portanto pro- frequência escolar, estas medidas tiveram consequências positívas a nível da
cessos de educação e/ou ha-
bilitação. sua educação, uma vez que, por um lado, contribuiram para um rastreio e
i
dentificação das suas problemáticas e, por outro, levaram à reorganização
das instituições de atendimento a esta população e à criação de escolas ou de
classes especiais, funcionando estas últimas anexas às escolas regulares.

Em Portugal, na década de 40, organiza-se o primeiro centro de observação e


diagnóstico mé dico-pedagógico para
"crianças anormais", o Instituto António
Aurélio da Costa Ferreira, e abrem-se as primeiras classes especiais, anexas às
escolas públicas do 1. 0 Ciclo.

Assiste-se, neste período, à classificação sistemática dos tipos e graus de


deficiência, baseada em perspectivas médicas e psicológicas e ao encaminha-
mento dos alunos considerados diferentes para situações educativas especi-
ficamente organizadas para dar apoio a determinado tipo ou grau de perturbação.

Se a fase anterior pode ser considerada a da criação da Educação Especial


enquanto preocupação social, é
porém nesta terceira fase que se pode falar da
criação de urn sub-sistema educativo — o Ensino Especial Público.
As perspectivas so
ciológicas e antropológicas da época vão contribuir para a
concepção de que é direito destes alunos serem educados em escolas adequadas
e que é dever da sociedade apoiar a criação dessas escolas e a formação de
professores para a população deficiente; as mov
imentações sociais e políticas
da altura vão incentivar a ideia de que é
ao estado que eabe o dever de dar
resposta a esta população, no
meadamente através dos organismos centrais de
tutela da educação e não apenas através dos organismos sociais; por outro
lado, as pe
rspectivas médieas e os avanços tecnológicos fundamentam o
20
aparecimento de metodologias de ensino especiais, visando potencializar
capacidades e superar algumas das incapacidades.

Em síntese, até meados do século XX, a história do atendimento a crianças e


jovens com deficiências ou perturbações acentuadas tem dois grandes eixos
de evolução:

- da necessidade de assistência e proteção ao direito à educação


especializada;

- da responsabilidade social difusa à responsabilização pública


organizada.

A partir dos anos 60 do século XX, as modificações sociais, políticas,


económicas e culturais da sociedade ocidental vão influenciar decisivamente
a Educação Especíal e desenvolver novas abordagens pedagógicas, que
constituirão a quarta fase do processo aqui sintetizado. De facto, a educação
destas crianças e jovens, até aqui com um cunho marcadamente segregacionista,
quer a nível social, quer a nível escolar, vai passar a inserir-se progressivamente
nas estruturas regulares de ensino, como veremos no ponto seguinte.

2.2 A evolução da Educação Especial — da Segregação à Integração

Nas últimas décadas do sée. XX, a forma de conceber a Educação Especial


evoluiu significativamente, sendo evidentes as mudanças ocorridas quer nos
pressupostos e princípios que Ihe estão subjacentes, quer nos modelos . de
atendimento que se privilegiaram. De facto, como vimos, este campo da
educação centrava-se no estudo das deficiências específicas, das carências
pessoais e do seu atendimento, sendo a Educação Especial considerada como
"um conjunto de programas educativos dirigidos às crianças e jovens
deficientes" (0CDE-CERI, 1984), pressupondo a organização de estruturas
educativas em função de determinadas categorias.

Tendo subjacentes critérios essencialmente médicos, a implementação desta


perspectiva teve como consequência o privilegiar de respostas educativas cuja
tónica fundamental foi a segregação da criança/jovem do sistema educativo
regular.

Não deixando de ter em atenção os critérios médicos e/ou psicológicos que


podiam ajudar a compreender melhor as características das diversas proble-
máticas, a partir dos anos 60/70 começa-se a tentar identificar as implicações e

21
exigências específicas que essas características colocam à educação da criança,
no sentido de promover a sua integração na escola regular.

A integração de alunos com deficiências nas estruturas regulares de ensino


tem subjacente o princípio da normalização, com o qual se pretende acentuar
a relatividade do conceito de normalidade, a partir da constatação das diferentes
conotoções que este termo teve, ao longo dos séculos. De facto, não se pretende
fazer corresponder todos os indivíduos a uma normalidade-padrão, mas aceitar
eada pessoa com as suas diferenças particulares, re conhecendo-lhes o direito
de ter uma vida tão normal quanto possível.

As primeiras definições de normalização referem-se especificamente aos


resultados que se podem obter integrando deficientes mentais em situações de
vida quotidiana natural, mas rapidamente a tónica deixa de ser colocada no
aluno e nos seus resultados, para se acentuar a necessidade de criar condições
e meios para que essa normalização ocorra. Pretendia-se que o uso de meios
sóci o-educativos n
ormalizantes viesse a estabelecer e/ou a manter
co mportamentos e características também elas normalizantes, constituindo a
integração o principal meio de atingir a normalização.

Birch (1974) define integração escolar como um processo que pretende reunir
a educação regular e a educação especial, visando o apoio adequado às
necessidades de aprendizagem de todas as crianças.

Por sua vez, a National Association of Retarded Citizens (NARC), nos EU.A.
considera que:

a integração é uma filosofia ou um princípio de oferta de serviços


educativos que se põe em pratica mediante a provisão de uma
variedade de alternativas de ensino, de aulas adequadas ao plano
educativo de cada aluno, permitindo a ntaxima integração
educacional, temporal e social entre alunos deficientes e não
deficientes (cit. in: Bautista, 1997:29).
A
integração mais adequada não tem que ser, forçosamente, a integração
escolar, como geralmente se pensa. Existem pelo menos quatro formas de
integração:

a integração tísica, que se realiza em centros


de educação especial
situados perto de escolas regulares, com as quais compartilham alguns
espaços, mas mantendo uma organização pedagógica diferente;
a integração funcional,
que implica a utilização dos mesmos recursos
e espaços por parte dos alunos deficientes e não deficientes, em tempos
succssivos ou simultâneos, com ou sem objectivos comuns, conforme
os casos;
a integração escolar, que se caracteriza pela inserção de alunos
diferentes em grupos/turmas regulares;

a integração na comunidade, que pressupõe a continuação da


integração na vida extra-escolar, durante a infância, a juventude e a
idade adulta.

A integração pode também ser perspectivada através de níveis que vão


ambiente escolar normal a contextos mais restritivos, dando origem aos
chamados "modelos em cascata". Estes modelos correspondem a sistemas
em pirâmide, em que os ambientes mais restritivos são considerados adequados
apenas para um número mínimo de casos e os ambientes mais normalizantes
são aconselhados para um maior número de casos. Um dos primeiros modelos
deste tipo, apresentado por Reynolds (1962), previa oito níveis educativos de
atendimento (escola residencial; escola especial; classe especial; maior parte
do tempo na classe especial; classe regular com classe de apoio; classe regular
com especialistas itinerantes; classe regular com apoio consultivo; classe
regular) e três níveis de serviços não educativos (centros de diagnóstico e
tratamento, hospitais e apoio domiciliário). Em relação aos níveis educativos,
Reynolds aconselhava que se começasse sempre por analisar a hipótese das
situações mais normalizantes (classe regular, sem ou com apoios) sendo os
outros níveis de atendimento considerados apenas quando tal se mostrasse
manifestamente impossível. Uma década mais tarde, o modelo apresentado
por Deno (1973) define sete níveis de atendimento educativo a partir das
necessidades das crianças/jovens, pressupondo que o maior número de
alunos possível deverá ser colocado nos primeiros níveis (inserção em elasses
normais a tempo inteiro, com professor de apoio) e apenas uma minoria se
situará nos últimos (escolarização nos hospitais ou em casa, serviços médicos
e supervisão de assistência social).

É neste sentido que, em 1975, nos Estados Unidos, a Public-Law 94-142,


"The Educationfor Ail Handicapped Children" vem exigir que, em todos os
estados da federação, se respeitem os seguintes princípios e procedimentos:

- identificação de todos os deficientes dos 4 aos 21 anos;

- planificação e progamação adequadas às necessidades de cada um;

- participação dos pais nas decisões educativas;

- educação com recurso à alternativa inenos restritiva possível;

- não discriminação •

A maior inovação desta lei é exactamente a noção de "ambiente o nienos


restritivo possível", que significa que os alunos com deficiência devem ser
educados em situações tão normais quanto as suas necessidades especiais o
permitirem. Significa ainda que as escolas regulares devem aceitar todas as
crianças e encontrar para cada uma o modelo - de integração mais adequado.

Em 1986, o relatório C.O.RE.X. de Quebeq (cit. in. Bautista, 1993) propõe


oito níveis de integração que se apresentam tío quadro 1.

Quadro 1 — Modelo em eascata (Quebeq, 1986)

Níveis de
integração Situação do aluno

1 Turma regular

Turma regular com apoio indirecto (ao professor da turma)


3
Turma regular com apoio indirecto (ao professor) e directo (ao aluno)
4 Turma regular + apoio ao aluno em sala de apoio ou centro
de recursos
5 Turma regular a 1/2 tempo + turma especial a 1/2 tempo
6 Escola de Educação Especial
7 Internato de Educação Especial

8 Apoio em serviço hospitalar ou apoio domiciliário

Por sua vez, na Europa, com a publicação do Warnock Report (Londres, 1978)
detine-se integração como "o princípio que enuncia a educação não segregada
de deficientes e não deficientes"; sublinha-se que a integração é um fim a
atingir, obedecendo a diferentes fases de determinantes múltiplas, devendo a
sua implementação ser progressiva como e quando isso for humanamente
possível .

Segundo Hardman, Drew e Egan (1984, cit. in: Arends, 1995), 88% das
erianças com deficiências ou perturbações podem estar em turmas regulares
sem ou com apoio de um professor especializado; 6% poderá frequentar a
escola regular e a escola especial durante o dia ( a meio tempo cada uma delas);
e apenas 5% terá que frequentar uma escola especial a tempo inteiro ou ser
educado em lares e/ou nospitais.

No nosso país, o movimento para a integração de crianças e jovens deficientes


(fomecou por experiências pontuais em alguns liceus do país e desenvolveu-se
durante a ek.'.eada de 70, promovido pela Direcção do Ensino Especial, Inas
ainda sem qualquer suporte legal, o que sucedeu apenas em 1986, com a Lei
de Bases do Sistema Educativo (Lei 46/86 de 14 de Outubro), na qual se
afirma que

é da especial responsabilidade do estado promover a democratização


do ensino, garantindo o direito a uma justa e efectiva igualdade de
oportunidades no acesso e sucesso escolares (n° 2 do art. 2°);

que o sistema educativo se organiza de forma a

assegurar o direito à diferença, mercê do respeito pela personalidade


e pelos projectos individuais da existência, bem como da consideração
e valorização dos dtferentes saberes e culturas (art. 3°);

e que, entre os objectivos do ensíno básico se contam o de

assegurar às crianças com necessidades educativas específicas,


devidas designadamente a deficiências físicas e mentais, condições
adequadas ao seu desenvolvimento e pleno aproveitamento das suas
capacidades;

e o de "criar condições para o sucesso escolar e educativo a todos os alunos"


(art. 7°).
A regulamentação destes aspectos, porém, só veío a oéorrer j á na década de
90, com a extensão da escolaridade obrigatória a todas as crianças e jovens,
incluindo as deficientes (Lei n° 35/90) e com a publicação do Decreto-Lei
n° 319/91, que responsabíliza directamente a escola regular pela educação
desta população, "nutna perspectiva de escola para todos". Este Decreto-Lei
obriga à elaboração de Planos Educativos Individualizados e de Programas
Educativos que definam as necessidades específicas destas crianças/jovens e
as respostas educativas mais adequadas. Também em 1991, o despacho
n.° 173/ME regulamenta as condições e procedimentos necessários à
regulamentação do decreto-lei anterior e confirma a opção pelas "medidas
mais integradoras e menos restritivas, de . forma a que as condições de
frequência se aproximem das existentes no regime educativo comum" .

Nesta área, Portugal segue de perto as alterações introduzidas na maior parte


dos países europeus nas últimas décadas do século XX. De facto, em 1990, a
União Europeia aprovara a resolução 90/C162/02, estabelecendo que em todos
os estados membros se deve promover a integração das crianças e jovens
deficientes no ensino regular, salvaguardando os apoios especializados que
algumas delas necessitem, complementarmente.

Na verdade, na década de 90 coexistiam, na Europa, várias matrizes de


atendimento à população com prohlemáticas específicas: a integração plena
destes alunos, com as necessarias alterações das escolas para lhes dar uma
resposta educativa adequada; a orientação segregada tradicional com algumas
modificações; a compatibilização das escolas especiais com a integração em
escolas regulares, criando sistemas mistos a partir da análise das condições
concretas das escolas/zonas escolares e dos casos específicos dos alunos.

Os argumentos a favor de uma educação integrada baseiam-se na constatação


da falência ou ineficácia das orientações e práticas tradicionais de educação
especial e na di scriminatoridade dos seus fundamentos.

Por outro lado, a integração destes alunos no ensino regular leva também à
r
eorganização da escola de modo a responder às necessidades de todos os
seus alunos — não apenas aqueles que têm deficiências, l'nas também aqueles
que não têm o ritmo de aprendizagem ou grau de sucesso do designado "aluno-
padrão".

Neste sentido, a integração dos alunos com deficiências ou problemáticas


graves contribuiu para o desenvolvimento de respostas educativas adequadas
às diferenças individuais cada vez mais acentuadas numa sociedade
multicultural e com um sistema de escolaridade básica obrigatória.

No entanto, várias questões podem ser levantadas em relação ao movimento


para a integração escolar desta população, nomeadamente:

a falta de condições das escolas regulares para assumir a responsa-


bilidade da educação e escolarização destes alunos ;

a falta de formação dos professores do ensino regular para trabalhar


com estes alunos de forma diferenciada;

um aumento exagerado das funções do ed ucador/professor do ensino


regular, já de si complexas e multifacetadas na estrutura actual ;

a segurança que o sistema de educação especial tradicional fornecia às


famílias.

O debate sobre a integração de alunos com problemáticas graves nas estruturas


regulares de ensino tem tido por base uma série de estudos levados a efeito em
diversos países, a partir da década de 70, os quais incidem sobre:

o efeito cia integração escolar quer nos alunos integrados, quer nos
outros alunos;

as adaptações que as escolas e os professores devem realizar para que


a integração possa ter sucesso;

os processos de articulação entre o sistema regular e o sistema de apoio


especializado ou suplementar.

?.6
Segundo Vieira (1995), os factores facilitadores da integração situam-se
essencialmente a três níveis:

aspectos organizativos da escola — processos de colaboração entre os


diversos agentes educativos, capacidade da organização escolar na
resolução de problemas, tipo de apoio das equipas multidisciplinares
de apoio, processo de liderança da escola;

atitudes dos professores do ensino regular face à integração,


nomeadamente a capacidade de lidar com a diferença;

processos de organização e gestão da prática pedagógica — ambiente


de aprendizagem, programação individualizada, organização e gestão
da classe, diferenciação pedagógica.

Em síntese, podemos considerar que as três últimas décadas do século XX


foram férteis em mudanças no campo da educação especial, orientando-se no
sentido de uma cada vez maior inserção das crianças e jovens diferentes em
ambientes mais naturais. Este movimento para a integração está intimamente
associado ao conceito de necessidades educativas especiais, que analisaremos
em seguida.

1.3 O conceito de necessidades educativas especiais

O conceito de necessidades educativas especiais começa a ser utilizado no


final dos anos 70 e representa um marco decisivo na forma de equacionar a
criança diferente e os problemas na aprendizagem.
Com efeito, aquele conceito, ao pretender substituir a tradicional classificação
tipológica das diversas deficiências baseada em critérios fundamentalmente
médicos, procura sublinhar os problemas na aprendizagem que qualquer criança
poderá evidenciar ao longo do seu percurso escolar, não decorrendo estes
necessariamente de défices individuais.

A utilização deste conceito representou, não apenas urna alteração termino-


lógica e semântica mas, sobretudo, uma intenção efectiva de mudança na forma
de perspectivar a Educação Especial e consequentemente a Educação dita
"regular".
1 O conceito de necessida-
Com e feito, o uso progressivo do termo necessidades educativas especiais no des educativas especiais ra-
pidamente passou a ser uti-
campo da Educação, além de ter possibilitado uma visão socialmente menos lizado para referenciar qual-
estigmatizante dos problemas dos alunos 7 teve também implicações no âmbito quer tipo de problema e/ou
dificuldade dos alunos.
de intervenção da Educação Especial. Esta passa assim a atender não apenas
27
as crianças/jovens com deficiências, mas também todas aquelas que, ao longo
do seu percurso escolar, apresentam problemas na aprendizagem.

Torna-se assim evidente qué a defesa de uma escola para todos e de uma
educação não segregada teve consequências na escola, sendo-lhe atribuída
desde então a responsabilidade de equacionar e disponibilizar respostas
educativas adequadas às diversas necessidades dos alunos.

Com efeito, em 1978 este conceito surge pela primeira vez especificado no
' Warnock Report (.1978).
Special Educational Needs.
Relatório Warnock 8 . Aqui se constata que uma percentagem signiticativa
H.M.S.O. Londres. Paragra- de alunos apresenta durante o seu percurso escolar problemas na aprendizagem,
fos 3.17-18.
precisando, por isso, da intervenção da Educação Especial. Entende-se que
estes problemas podem assumir um carácter permanente ou temporário no
percurso escolar do aluno, uma vez que não decorrem necessariamente de
deficiências no sentido tradicional do termo, mas de um conjunto diversificado
de factores.

O apoio da Educação Especial é perspectivado como imprescindível, na medida


em que pode evitar a agudização dos problemas das crianças, devida a situações
de fracasso demasiado prolongadas.

Nessa medida, considera-se fundamental assegurar ajudas adequadas a todas


as crianças que eventualmente necessitem de qualquer tipo cle apoio durante a
sua vida escolar. Este apoio da Educação Especial assumirá um carácter
permanente ou temporário consoante o tipo de problemas manifestados.

As necessidades educativas especiais são assim definidas em termos das


exigências que colocam às escolas, entendendo-se estas como responsáveis
primeiras pe1a educação de todos os cidadãos. Defende-se uma "escola para
todos" , um sistema educativo integrador, devendo a escola garantir condições
efectivas de acesso ao currículo e de sucesso escolar.
Ibidem, parrigrafo
Assim, na definição proposta no Relatório Warnock 9 as necessidades
educativas especiais incluem situações que implicam, por parte da escola:
(i) a disponibilização de meios especiais de acesso ao curriculum;
(ii) a elaboração de currículos especiais ou adaptados, e

De not;ir que, estas neces-


(iii) a amilise crítica sobre a estrutura social e o clima emocional nos
idades nao se exuille1/1 Inu- quais se processa a educação.'"
tudmente, podendo mna
dada crianç:i .1prescmar um
A disponibtlização de meios especiais de acesso ao eurrículo revela-se
ou mais problemas asocia-
dos.
fundamental perante erianças portadoras de deficiências de ordem sensorial
Oti motora, as quais exigem a aprendizagem de k,'enicas de ensino especial
(si,,tcma de leitura e escrita Braille, téenicas de mobilidade, linguagem gestual,
sistemas alternativos de comunicação...), a implernentação de modificaçóes
)
no meio físico da escola (adaptação de instalações) e a aquisição de recursos/
equipamentos específicos.

Por sua vez, a elaboração de currículos especiais torna-se imprescindível face


a crianças com dificuldades significativas na aprendizagem devidas a situações
de imaturidade intelectual, social e emocional. Já a adaptação curricular será
pertinente perante dificuldades na aprendizagem de mültiplas origens; estas
dificuldades surgem normalmente associadas a alunos que, embora sem
qualquer défice intelectual, experimentam, devido a uma multiplicidade de
factores, situações graves de atraso escolar em determinadas áreas currículares
(por exemplo, na leitura, na escrita, no cálculo...).

Por último, a escola enquanto instituição veiculadora de atitudes e valores


" O currículo oculto decor-
deverá desenvolver processos de reflexão sobre o currículo oculto n existente, re das formas de organiza-
ção e funcionamento da es-
uma vez que algumas das dificuldades na aprendizagem podem estar associadas cola e da classe enquanto
a relações sociais frustantes e a um clima de escola que não respeita a grupo social onde se esta-
belecem interacções, nas
individualidade e singularidade do aluno. quais se revelam atitudes,
valores e sentimentos. Em-
Nos anos oitenta, outras definições do conceito de necessidades educativas bora habitualmente estes
aspectos não esteiam expli-
especiais surgiram com o intuito de procurar a sua operacionalização e nas
citados nos planos curri-
quais é evidente a preocupação em abranger, não só os alunos tradicionalmente culares e nos programas de
ensino constituem parte in-
portadores de deficiências físicas, sensoriais, motoras e mentais, mas também tegrante e efectiva das
todos os que apresentem dificuldades na aprendizagem, decorrentes de causas aprendizagens realizadas
pelos alunos na escola.
várias, durante o seu percurso escolar.
"uma criança tem
Assim, in Education Act (Londres, 1981) considera-se que
necessidades educativas especiais se tiver dificuldades na aprendizagem que
requerem a intervenção da educação especial". Entende-se que uma criança
tem dificuldades na aprendizagem:

se tiver dificuldades significativament e maiores para aprender do que


a maioria das crianças da sua idade, ou

se tiver uma incapacidade que a impede ou que Ihe coloca dificuldades


Cit in: Brennan (1990:34).
no uso dos meios educativos geralmente oferecidos nas escolas

A análise comparativa das definições do conceito apresentadas revela que,


enquanto o Warnock Report
se centra nas exigências que estas populações
colocam às escolas, na definição proposta na Education Act acentuam-se
novamente as dificuldades da criança em aceder ao currículo escolar.
necessidade
Por outro lado, Brennan (1988:36) considera que existe uma
educativa especial quando, e citamos:
uma deficiência Vísica, sensorial, intelectual, emocional, social ou
(/ualquer combinação destas) atecta a aprendLa g em até tal ponto
que são necesscurios aluns 011 todos os acessos especiais ao currículo
O
" No preambulo deste de-
ereto refere-se: Facto especial OU modificado, ou a umas condições de aprendizagem
preocupante é, também, o especiahnente adaptadas para que o aluno seja educado adequada e
baixo indice de es1 . 01ar1-
cficazmente. A
;:ação das crunicas com ne- necessidade pode apresentar-se em qualquer ponto de
cessidades educativiLs espe- tun continuum que vai desde a ligeira à grave: pode ser permanente
cificas, devidas a deficiên-
ou ser unta fase temporária no desenvolvimento do aluno.
cias fisicas e mentais, a quem
garantir as condi-
( . (ies educativas adequadas Por sua vez, Casanova (1990) entende que as necessidades educativas especiais
às suus caracterisncas e o são,
seu pleno acesso à educa-
pào, em todo a período
escolaridade obrigatória". aquelas que têm certos alunos com dificuldades maiores que o habitual
Determina-se assim no art°
(mais amplas e mais prolUndas) e que precisam, por isso, de ajudas
2", n° 2 que: "os alunos com
necessidades educativas es- complementaws especfficas. (...) Determinar que um aluno apresenta
pecificas, resultantes de de- necessidades especiais supõe que para atingir os objectivos educativos
ficiências fisicas e mentais,
estão sujeitos 00 cumpri- necessita de apoios didácticos ou serviços particulares e definidos,
mento da escolaridade obri- em júnção das suas características pessoais (...).
gatória, não podendo ser
isentos da sua jreqüência".
No nosso país o conceito de necessidades educativas especiais, rapidamente
começou a ser utilizado nas instituições escolares, v erificando-se, no entanto,
" Neste Decreto-lei, onde
surge pela primeira vez a de-
alguma confusão terminológica nas designações atribuídas a alunos com
signaçào - necessidades problemas na aprendizagem: por exemplo, necessidades educativas específicas,
educativas especiais - con-
sagram-se um conjunto de
necessidades especiais, necessidades educativas especiais... Aliás, de certa
medidas relativas à inte- forma, essa confusão terminológica é evidente nas disposições oficiais que,
gração nas escolas regula-
res, apontando-se 110 respec-
após a publicação da Lei de Bases do Sistema Educativo, vieram consubs-
tivo preâmbulo para um tanciar princípios então preconizados e fundamentais no domínio da Educação
conjunto de aspectos rele- Especial.
vantes, dos quais salienta-
mos:
- "A •ubstituição da dassi- Os princípios gerais e organizativos da lei atrás referida, bem assim como os
ficaçõo em diferentes ca- objectivos que se definem para o Ensino Básico fundamentam-se claramente
legorias, baseada em de-
cisões foro médico, numa filosofia da educação que preconiza a democracia, a liberdade, a
pelo conceito de -alunas igualdade, a autonomia e a solidariedade. Estes princípios, por si só, são
com necessidades educa-
tivas e specui.s", baseado reveladores de uma particular atenção face ao aluno com necessidades
em Critérios pedagógi-
educativas especiais, em virtude de terem subjacentes o respeito e a valorização
do indivíduo enquanto ser diferente.
r
- "A erescente esponsabi-
lizacão da escola regular
pelos problemas dos alu- No entanto, só no início dos anos 90 se verifica a publicação de disposições
nos com deficiência ou
com d ri cul d ade s de
oficiais que vieram regulamentar efectivamente os princípios antes referidos
;lprendizagem-;
( no meadamente os já referidos Decretos-Lei n° 35/90
13 , u" 319/91" e o
Despacho n° 73/ME/91 15
eVt',11q
ciun nec,' Ii idodes
) e nos quais é evidente a utilização legal, ora do
o ducativas conceito de necessidades educativas e specíficas, ora do conceito de
espe ciais,
11111110 pervoectiva necessidades educativas especiais.
rola para todos-

Julgamos pois irnportante distinguir o que se entende por necessidades especiais


despacho regula- e ne
owniam-se
cessidades educativas especiais, em virtude clestes conceitos constituírem
Condiçoes
os procdimentos necessii- fon te de imprecisão e confusão entre teóricos e práticos.
rios do Decreto-
lei 11" 3 1W9 as quais Assim, diríamos que o conceito de necessidades especiais se refere a:

30
salienta que: "Compete ao
- populações que devido a factores de cariz sócio-cultural e/ou a dife- professor do l" ciclo do en-
renças linguísticas estão ou podem estar em risco de insucesso escolar; sino básic() identificar os
alunos com necessidades
este tipo de situações pode ser reduzido drasticamente, melhorando a educativas especiais e dar
qualidade do ensino (aqui se incluem as situações de sobredotação, de cindlecimento ao coordena-
dor de núcleo
desvantagem cultural e linguística, de aprendizagem de uma segunda
língua...);

- situações que embora graves em termos de deficiência podem não ter


qualquer consequência no processo e progresso educativo do aluno,
exigindo apenas um amplo serviço de apoio no sentido de facilitar o
ic Brennan (1990) apresen-
acesso ao curriculum escolar'' ; ta tona distinção entre ne-
cessidades especiais e neces-
necessidades educativas especiais, definindo-se estas como situações sidades educativas especiais
onde são evidentes dificuldades na aprendizagem, ou seja em aceder quando analisa os efeitos de
diferentes deficiências na
ao curriculum oferecido pela escola, exigindo um atendimento aprendizagem e quando as-
especializado, de acordo com as características específicas do aluno. sinala a inexistência de uma
relação simples e directa
entre a gravidade da defici-
À escola compete dar resposta às necessidades especiais nas quais, como vimos, ência e os seus efeitos na
se incluem as necessidades educativas especiais, o que significa, em última aprendizagem. Tendo como
exemplo duas crianças com
análise que deve ter em atenção as diferenças individuais dos alunos que a problemas físicos/motores
com diferentes níveis de
frequentam. gravidade, demonstra que:
uma situação grave em ter-
O conceito em análise acentua, pois, as dificuldades na aprendizagem que mos motores pode não ter
qualquer aluno pode apresentar durante o seu percurso escolar. A sua utilização qualquer consequência no
processo e progresso edu-
prática implicou a atribuição à escola e aos professores de competências no cativo do aluno (necessida-
processo de identificação dos alunos no sentido de definir formas de acesso des especiais) e uma situa-
ção mais ligeira em termos
ao currículo adequadas às necessidades de cada um. Esta situação veio eviden- motores pode dificultar (le
ciar a natureza relativa do conceito de necessidades educativas especiais. forma acentuada o acesso ao
currículo escolar normal, ou
seja, à aprendizagem pro-
De facto, a análise do processo de identificação de necessidades educativas movida para os alunos do
especiais realizado pelos professore& nas escolas revela que, embora estas mesmo grupo de referência
(necessidades educativas
surjam quer de dificuldades na aprendizagem, quer de limitações efectivas no especiais).
acesso ao currículo comum, resultam ainda de uma combinação múltipla de
circunstâncias ( de referir, a título de exemplo, o currículo, os materiais de
ensino, os métodos pedagógicos privilegiados e o clima social e emocional
existente na escola). Nessa medida, a identificação de necessidades educativas
especiais inclui não somente as deficiências e dificuldades individuais, mas
também e de forma relevante as condições gerais do processo de ensino/
aprendizagem desenvolvidas por cada escola. Torna-se assim claro o papel
determinante desta, enquanto organização, e dos professores enquanto indi-
víduos na identificação das necessidades educativas especiais.

Assim sendo, parece legítima e fundamentada a variabilidade constatada nas


diferentes escolas. no que diz respeito ao número de alunos identificados com
necessidades educativas especiais. Esta variabilidade é determinada, entre outros
aspectos:
- pela forma como são definidos os objectivos de ensino;

pelos processos de avaliação dos progressos dos alunos desenvolvidos;


- pelas áreas de aprendizagem mais valorizadas pelo professor;

- pelas atitudes que este desenvolve face a alunos com níveis menores
de sucesso escolar, e , em suma,
- pela forma como encara as diferenças individuais dos alunos.

É ainda nesta linha de ideias que as escolas podem agravar, ou mesmo criar
problemas considerados situações de necessidades educativas especiais; a
análise do papel dos professores neste processo, permite perceber a forma
variada como interpretam o c omportamento dos alunos. De facto, o compor-
tamento do aluno pode ser visto pelo professor como um problema decorrente
do processo de ensino ou como um problema existente na aprendizagem do
aluno. Estas duas situações contrastantes têm ímplicações diferentes nas
atitudes do professor, pois se o problema reside "no" aluno, a sua respon-
sabilidade é necessariamente reduzida, ao passo que se reside no processo de
ensino, competir-lhe-á equacionar e desenvolver estratégias que facilitem a
aprendizagem do aluno.
Estudos a nglo-saxónicos sobre o processo de identifícação de alunos com
necessidades educatívas especiais realizado pelos professores revelam a
existência de algumas características comuns, entre as quais são de assinalar
as seguintes

- Tendência para enfatizar as condições só cio-familiares e físicas dos


alunos em vez das suas aquisiç õ
es/resultados e do seu desenvolvimento
no seio do currículo escolar;

- Tendência para realizar julgamentos globais, não existindo informação


factual e registada relativamente às experiências e aprendizagens
escolares realizadas pelos alunos;
- Facílidade na identificação de problemas sensoriais, motores e de saúde
mais óbvios, mas dificuldades na detecção de problemas deste tipo
que, sendo menos óbvios, podem ter também implicações educacionais;
- Facilidade na identificação de dificuldades
co mportamentais cujas
causas conhecem; no entanto, dificuldades emocionais de outro tipo,
quando menos óbvias, não são identificadas;

Tendência a não diferenciar necessidades especiais e necessidades


educat i vas especiais.
No entanto, sobretudo a partir dos anos 90, a preocupação em distinguir os
conceitos antes referidos (necessidades especiais e necessidades educativas
especiais) tem vindo a ser posta em causa por diversos autores que criticam de
forma acentuada as políticas e práticas decorrentes cla integração, preconizando
e defendendo uma escola inclusiva.

Com efeito, embora a introdução do termo necessidades educativas especiais


tivesse tido como intenção inicial um claro afastamento do modelo médico,
caracterizado pelo diagnóstico e pela categorização, tal não significou que as
práticas desenvolvidas posteriormente continuassem a fundamentar-se em
formas de pensar clínicas, segundo as quais as necessidades decorrem de
défices, equacionando e centrando as respostas educativas nos indivíduos e
nos seus problemas.

Por sua vez, o carácter vago, vasto e relativo do conceito de necessidades


educativas especiais antes analisado, permitiu que em diferentes contextos
assumisse diferentes significados, o que conduziu, ora a encobrir categorias e
desvantagens sem as especificar e sem lhes dar a resposta educativa adequada,
ora a ser usado abusiva e extensivamente perante crianças que não apresentavam
qualquer deficiência.
De facto, o conceito baseia-se habitualmente em juízos de valor de carácter
profissional, possibilitando assim a infiuência dos contextos educativos em
que é usado, nos quais o desenvolvimento profissional do educador, a sua
experiência enquanto docente e a fase da carreira em que se situa assumem
particular significado.

Os problemas práticos que a introdução deste termo gerou, criaram um número


de contradições e complexidades no domínio educativo. Com efeito,
paradoxalmente, o conceito de necessidades educativas especiais tornou-se
uma categoria, referente a um grupo homogéneo, grupo esse que continua a
ser percepcionado pela escola como deficitário em algum aspecto do
desenvolvimento ou da aprendizagem.

Por outro lado, alguns autores sublinham as inconsistências da sua utilização


em termos das medidas políticas desenvolvidas desde então. De facto, apesar Note-se que no nosso país
mesmo quando linalmente
de ter subjacente a defesa de princípios educativos que preconizam a integração se proclama o final da isen-
e a de fesa de uma escola para todos, em termos burocráticos, legislativos' 7 e ção da escolaridade obriga-
tória para alunos com ne-
administrativos permitiu práticas educativas exclusivas onde as diferenças entre cessidades educativas espe-
os alunos continuam a ser factores que legitimam a ineficácia cla escola, dos cíficas (Decreto-lei n" 35/
90) admite-se que a sua fre-
professores e o insucesso dos alunos. quência escolar pode pro-
cessar-se em escolas re!,11-
Com e feito, as dificuldades educativas são perspectivadas como o resultado lares ou em instituições es-
pecíficas de educaçao espe-
da interacção entre as características de determinado aluno, as formas de ciad conforme O tipo e grau
organização escolar e/ou as adaptações curriculares efectuadas perante tais de deticiencia clii causa.

características.
vi
Nesse sentido, justificam-se algumas respostas educativas actualmente
desenvolvidas em inúmeras escolas, que abrangem adaptações curriculares,
materiais altemativos, apoios extra na sala de aula, processos de diferenciação
pedagógica.

Importa, no entanto, notar que nesta perspectiva, as dificuldades educativas


são mais uma vez consideradas de forma individual, centrando-se a atenção
em determinado aluno e no processo como este interage face aos diferentes
contextos de aprendizagem que a escola Ihe proporciona.

1.4 A perspectiva inclusiva

O aparecimento, nos anos noventa, da perspectiva inclusiva decorre


fu ndamentalmente das críticas que foram sendo desenvolvidas por diversos
autores à integração e às práticas educativas que legitimou, continuando a
permitir que alguns alunos não frequentassem a escola quando esta não dispunha
de meios humanos e materiais capazes de responder com eficácia às suas
necessidades.

Na perspectiva inclusiva,
as dificuldades são agora entendidas como
decorrendo de limitações existentes no currículo (planificado ou não) oferecido
a todos os alunos e, nessa medida, implicam que a escola desenvolva processos
de inovação e mudança curricular que respondam com eficácia a todos os
alunos que a frequentam.

Preconiza-se, portanto, uma abordagem mais ampla das dificuldades educativas


dos alunos, centrada na organização, d esenvolvimento e implementação de
currículos que melhorem as condições de aprendizagem de todos e na qual, as
dificuldades de alguns alunos constituem refe
rentes/indicadores a ter em conta
nos processos de mudança necessários a uma boa aprendizagem.

Assim, as dificuldades que alguns alunos experimentam no seu processo


educativo podem constituir fontes i mportantes no que diz respeito à
compreensão das limitações existentes no currículo escolar, sendo, portanto,
perspectivadas de forma positiva, uma vez que desencadeiam processos de
mudança curricular que poderão melhorar a aprendizagem de todos os alunos.
Os autores que preconizatn esta perspectiva entendern que
é fundamental o
dcse
nvolvimento de um trabalho de cooperação entre os diferentes inter-
v
enientes no processo cducativo (docentes, ót-Lãos de gestão,
te,nieos es pecializados), urna vez professores e
que a análise conjunta das limitações do
eurrículo existente permitirá a identificação das dificuldades que alguns alunos
experimentam no seu processo educativo e a definição das mudanças neces-
sárias a introduzir no currículo.

Convém notar que, esta perspectiva que preconiza uma escola inclusiva, capaz
de reconhecer e satisfazer as necessidades dos seus alunos implica,
necessariamente, o afastamento de uma viSão tecnicista das dificuldades dos
alunos (a habitual procura do método de ensino certo, das estratégias os dos
materiais que serão mais eficazes para determinado aluno) e a adopção de
uma nova abordagem que valoriza os factores contextuais, culturais e estruturais
inerentes ao processo de ensino aprendizagem.

Nessa medida, trata-se fundamentalmente de reequacionar as percepções que


cada educador tem sobre a aprendizagem, sobre os alunos e sobre determinados
alunos que apresentam qualquer situação de desvantagem educativa, de forma
a tomar consciência da eventual infiuência que a perspectiva do défice continua
a ter na prática pedagógica dos professores e na atitude das escolas.

Assim, os professores que pretendem promover a aprendizagem de todos os


a1unos deverão necessariamente estar disponíveis para realizar processos críticos
de reflexão sobre as práticas pedagógicas que desenvolvem, de forma a
poderem identificar eventuais aspectos que urge mudar ou aperfeiçoar.

É portanto à escola, enquanto instituição responsável pela educação de todos


os alunos, e aos professores em particular, que este desafio da educação
inclusiva se coloca com particular ênfase: respeitar os alunos que apresentam
dificuldades na aprendizagem, perspectivando-os como potencialmente
activos, capazes de aprender e facilitadores de processos de mudança em termos
pessoais e profissionais.
" A Declaração de Sala-
É na Declaração de Salamanca 18 (1994) sobre os princípios, políticas e práticas manca foi elaborada pelo
na área das necessidades educativas especiais que se preconiza uma educação Congresso Mundial sobre
NEE realizado pelo gover-
inclusiva, acentuando-se o papel determinante das escolas ditas regulares, no no espanhol em colabora-
combate às atitudes discriminatórias, na criação de sociedades inclusivas e na ção com a Unesco, com a
participação de 92 países e
defesa de princípios já anteriormente preconizados'9. 25 organizações internaci-
onais.
Nesta declaração, o conceito de necessidades educativas especiais abrange
"todas as crianças e jovens cujas necessidades se relacionam com deficiências " Aqui se incluem os prin-
ou dificuldades escolares" (1994:17) que surgem em determinado momento cípios educativos enuncia-
dos na Declaração Univer-
da escolaridade. À escola compete, através de uma pedagogia centrada na sal dos Direitos Humanos,
criança, educar com sucesso estas crianças e jovens, incluindo aquelas que na Declaração de Educação
para Todos e nas Normas
apresentam incapacidades graves. sobre Igualdade de Oportu-
nidades para Pessoas
A pedagogia centrada na criança é entendida corno benéfica para todos os Defieiencia.

-Llunos e consequenternente para a sociedade em geral, urna vez que pode


permitir a redução substancial do insucesso e abandono escolares. Nela
preconiza e assume a naturalidade das diferenças existentes entre os seres
humanos, diferenças essas que são evidentes na forma corno cada indivíduo
aprende; nessa medida, o processo de ensino
e quacionado tendo em linha de conta as normais -aprendizagem deve ser
diferen ças-existentes entre
os alunos, deixando estes de ter de se adaptar a modelos únicos e rígidos de
ensino que, muitas vezes, os conduzem ao insucesso, ao abandono e à exclusão
escolar e social.

Trata-se pois de garantir uma "genuína igualdade de


de e oportunidades" em termos
ducação, o que, perante crianças e jovens com necessidades educativas
especiais será conseguido nas escolas que educam as crianças da comunidade
em que se inserem, facilitando assim os seus processos de autonomia e
i ntegração social.

Assim sendo, nas escolas inclusivas, todos os alunos deverão aprender juntos
e, para tal, será fundamental:

- d
esenvolver processos de adaptação perante os vários estilos e ritmos
de aprendizagem;

- criar e i
mplementar currículos adequados à população escolar;
- o rganizar a escola de forma a responder às
n ecessidades de todos os
alunos;

- equacionar estratégias pedagógicas


d iversificadas e que impliquem
actividades funcionais e si
gnificativas para os alunos,
d esenvolver processos de
coopera ção/colaboração com a comunidade
em que a escola se insere, e

-
utilizar e rentabilizar recursos humanos e materiais existentes.
Pr
econiza-se, em suma, uma escola, na qual, todos os alunos de uma mesma
co
munidade, sempre que possível, aprendam juntos,
inde pendentemente das
diferenças e dificuldades individuais.

No que diz respeito ao at


endimento dos alunos com necessidades educativas
especiais, e
ntende-se que estes deverão receber os apoios su
plernentares que
precisam de forma a terem uma educação eficaz. Admite-se, como medida
ex cepcional, a esc
olarização de crianças em escolas especíais ou em aulas
especiais dentro da escola regular. Mas, esta situação apenas serd aconselhavel
perante easos em que se torne evidente uma total
i
regular em dar resposta às n ecessidades do aluno. ncapacidade da educação

Na D eelaração de S
co alamanca (1994) que temos vindo a analisar, refere-se um
njunto de mudanças em termos educativos im
prescindíveis à integração de
crianças com necessidades educativas especiais nas escolas inclusivas, das
quais destacamos as mudanças relativas ao currículo e à gestão escolar.

Relativamente às mudanças em termos de gestão escolar, a Declaração de


Salamanca sublinha o papel determinante dos serviços educativos locais e dos
directores das escolas na resposta eficaz às necessidades educativas especiais.
Considera-se que uma boa gestão escolar envolve de forma activa, criativa e
cooperativa , professores, auxiliares de educação, pais e comunidade. Entende-
se atribuir aos directores das escolas a responsabilidade de promoverem atitudes
positivas por parte de toda a comunidade escolar e de colaborarem de forma
eficaz com os professores e com o pessoal de apoio, sendo para tal fundamental
equacionar processos de decisão baseados na consulta e na negociação entre
os diferentes parceiros educativos.
Ver Mel Ainscow (1995);
É nesta linha de ideias que alguns autores 2° assinalam a influência da cultura Gordon Porter (1995);
escolar na atitude que a escola e o conjunto de professores manifestam perante Margaret Wang (1994).
alunos com necessidades educativas especiais. Nessa medida, entendem ser
fundamental considerar a escola como uma "organização de aprendizagem"
que continuamente procura melhorar as respostas educativas para os alunos
de toda a comunidade escolar.

Os factores de mudança da escola referidos são:

liderança eficaz — neste tipo de liderança observa-se uma distribuição


do poder e a assumpção conjunta de responsabilidades por parte de
toda a equipa educativa; a direcção da escola deverá procurar
desenvolver um clima escolar no qual se respeita e valoriza a
individualidade e, simultaneamente, se estimulam as actividades de
grupo facilitadoras da resolução de problemas;

envolvimento da equipa de protissionais, almos e comunidade


nas orientações e decisões da escola — aqui se enfatiza também o
papel activo e participativo a desempenhar pelos alunos nos processos
de aprendizagem desenvolvidos na sala de aula;

compromisso relativo a uma planificação realizada colaborati-


vamente — o que implica a capacidade de equacionar processos de
planificação cooperativa, na qual a definição de objectivos comuns e a
resolução de eventuais situações problema por parte dos professores,
constituem também uma base de acção para cada um deles;

estratégias de coordenação — todo o trabalho a desenvolver deverá


basear-se numa efectiva coordenação e cooperação entre docentes,
que lbes permita encontrar respostas adequadas para os alunos, quer
em grupo, quer em situação individual na sala de aula.
focalização da atenção nos benefícios potenciais da investigação e
tia reflexão — implementar processos que estimulem os professores a
investigarem e a reflectirem sobre a prática pedagógica que desen-
volvem na sala de aula, uma vez que, a observação mútua da prática
pedagógica entre professores e a respectiva troca de opiniões constituem
factores que facilitam a mudança curricular;

política de valorização profissional de toda a equipa educativa — a


formação contínua deverá ser assegurada tendo em conta a equipa
enquanto todo , não esquecendo, no entanto, as necessidades de cada
um dos seus membros.
As mudanças relativas ao currículo
implicam flexibilidade por parte da escola
e dos professores, no sentido de:

- desenvolver currículos que se adaptem a alunos com interesses e


capacidades diferentes;

- proporcionar às crianças com necessidades educativas especiais apoios


pedagógicos suplementares tendo como referência o currículo comum
e não um currículo diferente;
- equacionar processos de ensino motivadores da aprendizagem,
relacionados com a experiência dos alunos e com situações práticas;
- integrar no processo educativo a avaliação formativa, para assim ser
possível, a alunos e professores, ter informação quer sobre as aprendi-
zagens realizadas, quer sobre as dificuldades ainda existentes, de forma
a poder resolvê-las;

- garantir diferentes formas de apoio aos alunos com necessidades


educativas especiais — por exemplo, apoio na sala de aula, programas
de compensação educativa, apoio especializado realizado ou por um
professor ou por outros técnicos;
- usar os recursos/ajudas técnicas neeessários ao sucesso educativo e ao
acesso ao currículo escolar, facilitando assim a mobilidade, a comuni-
cação e a aprendizagem de alguns alunos.

Mas a construção efectiva de uma escola inclusiva depende fundamentalmente


de mudanças a d esenvolver nas
práticas pedagógicas de docentes que
persistem em utilizar formas de gestão e organização das situações pedagógicas
eentradas na figura do professor e nas quais a integração de um aluno diferente
neee
ssariamente será perspectivada como peurbadora do "normal" funciona-
n.rmto do grupo/turma.
Tendo como fundamento a crença de que as mudanças metodológicas e
organizativas que têm por fim responder aos alunos que apresentam dificuldades
írão beneficiar todas as crianças, alguns autores entendem que é possível e
imprescindível desenvolver processos de mudança da sala de aula. Estes
processos têm como finalidade última assegurar uma educação para todos, ou
seja, a aprendizagem de todos os alunos.

A nível da sala de aula considera-se que um dos factores mais relevante se


prende com a forma como o professor conceptualiza as tarefas de aprendizagem
que propõe aos alunos. Nessa medida, a criação de salas de aula inclusivas
implica por parte do docente, capacidade de:

planificar para a classe no seu conjunto, abrangendo assim todas as


crianças;

utilizar os recursos humanos existentes na sala de aula — os alunos —


que naturalmente podem contribuir para a aprendizagem (através de
trabalhos de grupo cooperativo e de trabalhos a pares), uma vez que
esta é em grande parte, um processo social;

improvisar, ou seja, a capacidade de alterar a planificação em função


das situações singulares que surgem no dia-a-dia escolar, em função
dos comportamentos manifestados pelos alunos.

Em síntese, nos últimos anos assiste-se a todo um movimento que preconiza a


educação inclusiva, a qual, como vimos, implica fundamentalmente a
reestruturação da escola enquanto instituição, uma vez que é sua função
responder de forma eficaz às necessidades de todos os alunos.

Este movimento implica necessariamente um reequacionar do papel da escola


regular e do papel da educação especial.

De facto, alguns autores que preconizam a escola inclusiva chegam a sugerir


a completa desmantelação das estruturas de educação especial, defendendo
que toda a educação se deve realizar em salas de aula comuns, dadas as
vantagens em termos de resultados sociais e académicos. Este posicionamento
significa em última instância que se considera não exístirem mais alunos da
educação especial e portanto serem dispensáveis os serviços que esta
proporciona.

Outros autores têm uma visão mais crítica e cautelosa relativamente à inclusão,
entendendo que a questão central da perspectiva inclusiva se relaciona com o
encaminhamento/colocação considerado mais adequado. Assim, defendem a
existência de um conjunto de diferentes respostas educativas, uma vez que só
assim é possível garantir a cada aluno a educação que necessita (Jim Kauffman,
Lynti Fuchs e Doug Fuchs, 1)9•1, cit. in: Bailey, 1098).
No nosso país, muíto embora em termos de política educativa se tenha veri-
ficado uma adesão aos princípios enunciados na Declaração de Salamanca,
(nomeadamente através da publicação do Despacho-conjunto n.° 105/97, que
preconiza a Escola Inclusiva e regulamenta os Apoios Educativos), continuam
a existir instituições de educação especial vocacionadas para o atendimento
de problemáticas mais acentuadas.

O Despacho antes referido envolve mudanças de ordem conceptual, com


implicações no atendimento das populações com necessidades educativas
especiais.

Efectivamente, este define vários intervenientes no apoio educativo: orgãos


de gestão e coordenação da escola, docentes da turma, alunos, docente de
apoio educativo, auxiliar de acção educativa, família, equipas de coordenação
dos apoios educativos e outras estruturas e serviços da comunidade. Neste
sentido, e dentro da perspectíva inclusiva que abordámos anteriormente, a
re sponsabilidade pelo percurso educativo dos alunos com necessídades
educativas especiais deixa de ser imputada apenas ao professor da turma e ao
professor de educação especial; pelo contrário, prevê-se a articulação entre
vários agentes educativos e, sobretudo, a responsabilização da escola pelo
processo a desenvolver.

Cria-se a figura do docente de apoio educativo, cujas funções não se limitam


às do tradicional professor de educação especial (apoio directo ao aluno com
necessidades educativas especiais), enfatizando-se agora o seu papel como
recurso da escola, na optimização do processo de aprendizagem e socialização
de todos os alunos (privilegiando-se, sobretudo, a colaboração com os
professores das turmas e a participação na organização escolar).
Con sequentemente, o docente de apoio educativo é entendido como um dos
recursos humanos da escola, fazendo parte integrante da sua equipa pedagó-
gica. A vinculação do docente de apoio educativo a determinada escola constitui,
com efeito, uma inovação em termos de atendimento, uma vez que, anterior-
mente, este implicava a deslocação do professor de educação especial a
diferentes escolas, de fonna a prestar apoio a alunos com problemáticas relacio-
nadas com a sua área de e specialização. Tal forma de atendimento garantia
que os alunos fossem apoiados por docentes com conhecimentos específicos
relativos às suas necessidades, mas, por outro lado, a intervenção centrava-se
no aluno, sendo escassa a sua implicação no contexto pedagógico e escolar.
Av
inculação do docente de Apoio Educativo a determinada escola teve como
intencão última equipar a instituição escolar de recursos humanos capazes de
r esponde •
eficazmente a todos os alunos, numa perspectiva inclusiva, na qual,
como vimos, as dificuldades dos alunos são entendidas como decorrentes de
limitações existentes no currículo.
No entanto, a implementação prática das medidas preconízadas no Despacho-
conjunto n." 105/97 gerou perplexidades, excessos e contradições com conse-
quências no atendimento aos alunos com necessidades educativas espec iais e
na organização escolar.

Efectivamente, os professores especializados em determinada área de educação


especial não tinham, à partida, formação que Ihes permitisse um trabalho
consistente de cooperação com as escolas e com os professores, uma vez que
as suas competências incidiam, sobretudo, no trabalho directo com a criançai
jovem. O leque diversificado de funções que agora lhe são atribuídas, ao
deslocar o centro da intervenção do aluno para a escola e os professores, gerou
nos docentes de educação especial uma "crise de identidade" com repercussões
nas práticas desenvolvidas nas escolas.

Por outro lado, a intenção de garantir uma escola inclusiva implicou um


substancial aumento do número de docentes de apoio educativo; o recrutamento
destes docentes processou-se de forma muito rápida, sem que tenha havido
critérios que fundamentassem a colocação de determinado docente nas funções
de apoio. Com efeito, em inúmeras situações, foram exercer funções de apoio
educativo não os docentes experientes e, consequentemente, com possibilidades
de desenvolver processos de supervisão e colaboração mas, professores recém-
-licenciados ou outros, a quem, por razões pessoais e circunstânciais não tinham
sido atribuídas funções lectivas.

O atendimento a alunos com necessidades educativas especiais na escola


passou, assim, a ser assegurado quer por professores especializados em
educação especial, quer por professores inexperientes ou sem qualquer formação
específica. Nessa medida, em algumas circunstâncias, a resposta educativa às
necessidades de determinados alunos não foi garantida, o que, paradoxalmente,
contraria os pressupostos e princípios educativos subjacentes à perspectiva
inclusíva.

Por sua vez, esta situação acentuou as dificuldades dos professores e das escolas
no que diz respeito à identificação de alunos com necessidades educativas
especiais. Em termos práticos, verificou-se um aumento significativo do número
de alunos identificado para apoio educativo, o qual, em muitos casos, não se
fundamentava em dificuldades significativas nas aprendizagens, mas antes
em factores de ordem pedagógica e de natureza sócio-cultural.

Nos factores de ordem pedagógica e de natureza sócio-cultural incluem-se as


situações que, embora sendo identificadas como dificuldades na aprendizagem,
não decorrem de causas intrínsecas ao próprio aluno, sendo antes devidas à
forma como é gerido e organizado o processo de ensino-aprendizagem e à
relação pedagógica estabelecida entre professor e alunos. Com efeito, alguns
estudos ernpíricos sugerem que práticas pedagógicas centradas no aluno e nas

41
suas capacidades de realização lhes permitem o acesso ao currículo e o sucesso
escolar; já as práticas centradas no professor se revelam ineficazes na resposta
à diversidade dos alunos que actualmente frequentam a escola. Neste tipo de
práticas, as diferenças entre os alunos constituem fonte de preocupação e de
dificuldades profissionais, as quais têm servido para legitimar os inúmeros
pedidos de apoio educativo.

Neste sentido, torna-se imprescindível a aquisição de competências no domínio


da avaliação e identificação das necessidades educativas dos alunos, aspecto
que abordaremos no capítulo seguinte.
Actividades

E. "A educação especial organiza-se preferencialmente segundo modelos


diversilicados de integração em estabelecimentos regulares de ensino,
tendo em conta as necessidades de atendimento específico e CO171 apoios
(te educação especializados" (Lei de Bases do Sistema Educativo
Português — Lei 46/86, art.18°, n.° 1)

a) Situe os princípios subjacentes a esta afirmação numa das fases de


evolução do atendimento aos alunos com necessidades educativas
especiais e justifíque a sua opção.

b) Enuncie os argumentos que considera mais siginificativos a favor da


educação integrada de alunos com necessidades educativas especiais

c) Refira os principais obstáculos que foram levantados ao movimento


para a integração escolar dos alunos com necessidades educativas
especiais.

2. Consídere a seguinte situação:

Comparando os valores referentes a 1989 com os de 1992, em


determinada região, verificou-se um aumento de 60% no número
de alunos identificados como tendo necessídades educativas
especiais.

Explique algumas das razões que podem estar na origem desta situação,
tendo em conta a relatividade do conceito de necessidades educativas
especiais.

3. "O enquadramento normativo dos apoios educativos deve materializar-


-se 1711111 conjunto de medidas que constituem tuna resposta articulada e
integrada aos problemas e necessidades sentidos nas e pelas escolas, de
acordo com um conjunto de princípios orientadores, nomeadamente:

centrar nas escolas as intervenções diversificadas necessárias para


o sucesso educativo de todas as crianças e jovens;

assegurar, de modo articulado e flexível, os apoios indispeasciveis


ao desenvolvimento de uma escola de qualidade para todos;

perspectivar uma solução simultaneamente adequada as condições


e necessidades actuais, mas orientada também para mna evolução
gradual para mais amplas e novas respostas" (Despacho Conjunto
105/97, Preâmbulo).

Compare este excerto com aquele que se apresenta no exercício 1 (extraído


da Lei 46/86) e refira:

a) a mudança no enfoque da análise das necessidades educativas espe-


ciais dos alunos;

b) as mudanças na organização e gestão


escolares decorrentes da pers-
pectiva inclusiva;

c) as mudanças relativas à organização e gestão do currículo.

44
2. Avaliação e Identificação de Alunos com Necessidades
Educativas Especiais
Objectivos gerais do capítulo

• Caracterizar perspectivas desenvolvidas no âmbito da avaliação de


alunos com necessidades educativas especiais;

• Dar a conhecer os principais conceitos subjacentes às diferentes


perspectivas de avaliação;

• Permitir a análise comparativa de diferentes perspectivas;

• Facilitar a análise crítíca das práticas de avaliação desenvolvidas.

• Dar aconhecer instrumentos de avaliação facilitadores da identificação.

Conhecimentos, capacidades e atitudes a desenvolver

• Identificar e caracterizar diferentes perspectivas de avaliação de alunos


com necessidades educativas especiais;

• Analisar de forma comparada essas perspectivas.


Distinguir os conceitos de identifícação e avaliação de alunos com
necessidades educativas especiais;

• Compreender o papel do professor/educador no processo de identifi-


cação de alunos com necessidades educativas especiais;

• Identificar processos facilitadores da identificação;

• Distinguir instrumentos de avaliação facilitadores da identificação.

Temas e conteúdos a desenvolver

1. Perspectivas na avaliação de alunos com necessidades educativas


especiais

2. Identificação e Avaliação — clarifícação de conceitos

3. Identificação de alunos com necessidades educativas especiais —


processos e instrumentos

47
2.1 Perspectivas na avaliação de alunos com necessidades educa-
tivas especiais

"Tive a sorte de sofrer da dificuldade de


adaptação à aprendizagem da leitura e da escrita,
a que se chama `dislexia' antes de o quadro ter
sido descrito como entidade nosológica.

Mereci, é facto, os epítetos de `mandrião' e de


`distraído', mas escapei à colagem à minha pessoa
dum diagnóstico impregnado da poderosa magia
das palavras cient(ficas".

João dos Santos, 1982

A análise das diferentes perspectivas que se têm vindo a desenvolver no âmbito


da avaliação da criança diferente mostra, de forma evidente, a influência de
várias áreas do saber, entre as quaís são de destacar, a medicina, a psicologia e
a sociologia.

. Com efeito, a evolução e afirmação progressiva destas ciências em termos


científicos pennite compreender a grande influência que exerceram na avaliação
da criança diferente, verificando-se apenas nas últimas décadas do século
passado uma maior afirmação da educação enquanto ciência neste domínio,
situação que é compreensível se tívermos em linha de conta o ainda polémico
estatuto epistemológico desta área do saber.

A problemátíca da avaliação em educação permite à partida constatar o carácter


polissémico do conceito, facto que é facilmente verificável se questionarmos
um grupo de pessoas sobre o que significa avaliar. Assim, poderão surgir-nos
um conjunto de expressões verbais diferentes, mas que pretendem todas elas
definir o acto avaliativo: comparar, classificar, medir, verificar, analisar, obser-
var, julgar, etc (1-ladji, 1994).

As diferentes definições que o conceito de avaliação pode assumir no campo


educativo são também reveladoras dos paradigmas que as fundamentam e que
têm obviamente consequências nas finalidades e funções da avaliação, nos
instrumentos e técnicas que utiliza, nos intervenientes que privilegia e na forma
como os resultados são entendidos e utilizados em termos educativos.

Estas dimensões são particularmente relevantes quando equacionadas no ambito


da avaliação da criança com necessidades educativas especiais.

49
Efectivamente, a analise das díversas perspectivas de avaliação desenvolvidas
durante o século passado na educação especial mos tra mudanças significatívas
em termos das finalidades, dos instrumentos e dos actores privilegiados e das
respostas educativas que, cons equentemente, se preconizaram.

A avaliação e compreensão da criança diferente começou por ser objecto de


estudo
da medicina, uma vez que se entendia que as diferenças eram sintomas
de doença física, j ustificando-se assim uma
abordagem médica.

No seu sentido etimoló- Com efeito, durante vários anos, a avaliação da criança diferente centrou-se
gieo, diagnósaieo significa no diagnóstico' médico, tendo como preocupação fundamental a classificação
proeurar através da análise
de sinais e sintomas e da uti- do tipo de deficiência (mental, física, sensorial, motora) para assim ser possível
lização de reeursos téenieos, decidir sobre qual o tratamento adequado.
localizar as eausas, a fim de
preserever tratamentos para
os respeetivos quadros iden- Importava, portanto, realizar um diagnóstico detalhado da deficiência da
tificados. criança, pois este constituía si
multaneamente condição necessária e suficiente
para iniciar o tratamento. Nesse sentido, resulta evidente a relação direeta entre
diagnóstico e tratamento, embora estas duas actividades fossem entendidas
como diferentes (Piji e Van Den Bos, 1998).

O diagnóstico e a classificação com base em procedimentos médicos


constituíram assim condição primeira e fundamental para a tomada de decisão
sobre o tipo de educação conveniente para determinada criança, tendo em
conta as suas c aracterísiticas específicas.

As instituições de educação especial que existem com vista à educação de


crianças com diferentes tipos de deficiência resultam desta abordagem médica,
na qual a c
lassificação da criança em determinada categoria está directamente
relacionada com a sua colocação numa escola especializada no respectivo
atendimento.

Entende-se que a resposta às necessidades educativas decorrentes de uma dada


deficiência só poderá ser facultada em escolas especializadas nesse domínio,
o que pressupõe, por um lado, conceber como iguais e comparáveis as
necessidades educativas especiais decorrentes de urna mesma deficiêncía e,
por outro, considerar fundamental uma intervenção
e specialistas em diversas áreas. co mpartimentada de

Esta abordagem médica das ne


cessidades especiais foi no século passado, e
continua a ser actualmente, alvo de acesas críticas, n
s ubfinham as c omeadamente as que
onsequências negativas em termos sociais e educativos do uso
da c lassificação em diferentes tipologias.

COI n
efeito, rotular uma criança com dificuldades com base num diagnóstico
pode constituir uma forma de e
stigmatiza4 discriminar, insultar e limitar
criança. Como sabiamente assinalava João dos Santos (cit in: Carvalbo e
Branco, 2000: 199)
O diagnóstico pode sobrepor-se ao doente, como a doença pode
sobrepor-se à pessoa. Devemos evitar diagnosticar alguém, como pode
acontecer quando se diz depreciativamente: 'é um psicopata, um
neurótico, 11171 débil'.

O diagnóstico de alguém pode tornar-se o diagnóstico contra alguém.

Por sua vez, quando se pretendem desenvolver processos de intervenção junto


da criança no sentido de minimizar ou ultrapassar os problemas, a utilização
de categorias revela-se de escassa utilidade, podendo apenas servir para fornecer
uma indicação global do encaminhamento/colocação mais adequado às suas
características.

De facto, este tipo de rótulos em nada ajudam no processo educativo das


crianças, constituindo antes, em algumas situações, factores determinantes nos
processos de desculpabilização e desresponsabilização desenvolvidos pelo
educador quando confrontado com a necessidade de as educar e ensinar.

Acresce que os rótulos, porque sublinham apenas os défices da criança, podem


desencadear umconjunto de expectativas 2 negativas no educador relativamente = Para um maior aprofun-
damento sobre a importân-
à aprendizagem, o que, como é sabido, vai influenciar a relação pedagógica cia das expectativas do pro-
desenvolvida, a comunicação estabelecida durante o processo de ensino e os fessor nos resultados dos
alunos ver Sprinthall e
níveis de exigência do professor/educador relativamente à aprendizagem, Sprinthall (1993) Psicologia
aspectos que irão ter consequências no nível de desempenho escolar cla Educacional, capítulo 14.

criança.

Para além destas críticas, considera-se que a utilização de classificações pode


constituir também um processo de despersonalização das crianças (Bailey,
1998); esta despersonalização é evidente quando nas escolas há referências a
determinadas crianças com expressões do tipo: "o mongolóide que está no
3° ano...", ou "no ano passado tivemos um autista integrado", etc.

Em sintese, as críticas que vêm sendo desenvolvidas relativamente à abordagem


médica prendem-se fundamentalmente com as consequências que teve na
criação de estruturas educativas segregadas, nos processos de estigmatização
social e escolar decorrentes da categorização e na escassa utilidade desta quando
se pretende educar a criança com problemas.

Importa, no entanto, assinalar que a evolução havida no âmbito da investigação


médica, sobretudo após a Segunda Guerra Mundial, nomeadamente no que
diz respeito à caracterização das diversas problemáticas, à definição e
clarificação sobre a respectiva etiologia e à definição de formas de prevenção,
constituiu e constitui ainda um contributo fundamental e imprescindível para
o conheeimento científico e aprofundado das diferenças individuais e para a
definição de formas de atendimento que garantam uma efectiva igualdade de
oportunidades educacionais.

51
Com efeito, no que diz respeito à avaliação de crianças com necessidades
educativas especiais decorrentes de problemas com
3 Simeonsson (1994, eit "altas probabilidades de
Bairrão, 1998:29) conside- terem uma etiologia biológica, inata ou congénita" 3
ra que neste grupo se inelu- fu (Bairrão, 1994: 29) é
em, entre outras, as situa- ndamental a intervenção médica no sentido de diagnosticar e detectar os
ções de deficiência visual, problemas e de definir formas de a
tendimento precoce e de acompanhamento
de deficiência auditiva, o posterior.
autismo e a defieiência
mental grave, as quais de-
signa por "problemas de
Por sua vez, a análise do modelo médico pode constituir urna referência
baLva incidência e alta in-
tensidade" . importante relativamente ao processo de avaliação dos alunos com necessidades
educativas especiais que actualmente se preconiza na educação especial (Ver
quadro 2).

Quadro 2 — Elementos do modelo médico, adaptado de Oates (1996)


In: Bailey (1998)

Elementos constituintes do modelo médico

1. Estudar o problema c
uidadosamente para encontrar os factores etiológicos, o que inclui
uma boa recolha de dados para entender a epidemiologia do problema;
2. E xperimentação para ajudar a determinar a forma mais eficaz de tratamento;
3.
Intervenção, que normalmente implica algum tipo de tratamento ou mudança no estilo de
vida;

4. Avaliação rigorosa dos resultados da e


xperimentação e tratamento;
5.
Seguimento a longo prazo dos doentes, observando os seus progressos para determinar a
eficácia do tratamento e verificar se alguns efeitos colaterais nefastos se desenvolveram.

De facto, em termos de educação dos alunos com n


ecessidades educativas
especiais é fundamental que os professores sejam capazes de desenvolver
processos de avaliação que incluam a definição das c
di ompetências e das
ficuldades, a pesquisa sobre os factores de ordem pedagógica que podem
justificar os problemas, a tomada de decisões sobre a melhor forma de intervir,
e a recolha sistemática e regular
de informação sobre a eficácia e pertinência
da intervenção entretanto reali zada.

Por sua vez, tal como na medicina, a


como preocupação inicial a abordagem psicológica teve também
cat egorização e c
por razÕes ent -to ainda de lassificação das crianças que,
sconhecidas, não conseguiam ter sucesso na escola.

52
De notar que, a introdução da escolaridade obrigatória iniciada no séc. XIX e
a consequente massificação do ensino implicaram mudanças sociais e
educativas significativas, as quais facilitaram a afirmação progressiva da
psicologia enquanto ciência no início do século passado, uma vez que o seu
contributo se revelava fundamental na avaliação dos conhecimentos dos alunos,
dos níveis de eficácia de processos de ensino, dos níveis de coerência de sistemas
educativos, ou seja, do rendimento conseguido após a implementação de
determinada política educativa, etc.

Sob a influência das perspectivas desenvolvidas nas ciências experimentais, a


abordagem psicológica reflecte os pressupostos daquelas ciências, valorizando-
-se enquanto objecto de avaliação fundamentalmente dimensões que permitem
a quantificação, o tratamento matemático e estatístico, uma vez que apenas
' Estes testes são aplicados
este tipo resultados garante um conhecimento objectivo e válido em termos em períodos previamente
científicos. estabelecidos, implicam que
se considerem rigorosamen-
te as normas de aplicação e
No que diz respeito aos instrumentos e técnicas de avaliação, são desenvolvidas cotação definidas e permi-
tem a quantificação dos re-
e utilizadas várias provas objectivas, estandartizadas e normalizadas 4 — exames
sultados obtidos (ex: Quo-
escritos e testes — e escalas de medida de desempenho escolar para avaliar cientes de desenvolvimen-
to, percentis, etc). Os testes
progressos em diferentes áreas disciplinares. de referência a normas têm
como objectivo a caracteri-
A concepção, desenvolvimento e generalização deste tipo de instrumentos de zação da criança não em
termos absolutos, mas sim
avaliação está necessariamente associada à massificação do ensino já por comparação com os
anteriormente referida, a qual exige processos de avaliação mais abrangentes, seus pares.

dado o aumento da população escolar. Em suma, neste contexto, avaliar


significa fundamentalmente medir. 5 Com efeito, a escala de
Binet e Simon constituiu a
É este cenário que justifica o interesse verificado no início do séc. XX pelo base de posteriores testes de
inteligência desenvolvidos
governo francês em compreender as razões que poderiam justificar o facto de nos Estados Unidos da
alguns alunos que frequentavam a escolaridade obrigatória não terem sucesso América no âmbito da
psicometria por Lewis
escolar. Assim sendo, a pedido do governo francês, Alfred Binet e Theodore Terman (1916) da Univer-
Simon (1905) desenvolveram a primeira Escala Métrica de Medida da sidade de Stanford. Após
várias edições, urn dos ins-
Inteligência, que constitui, sem dúvida, um marco histórico, quer na avaliação trumentos ainda usado é a
das crianças ditas diferentes ã , quer nas respostas educativas que consequen- Escala de Inteligência de
Stanford-Binet. Na cotação
temente se equacionaram. do teste, Terman (1916)
uson o conceito de Quoci-
ente Intelectual — Q.I t(n-
A elaboração desta escala de inteligência mostra a preocupação existente na dice psicolnétrico introdu-
época em medir com o máximo rigor processos mentais complexos, através zido pelo psicólogo alemão
William Stern em 1913).
de um conjunto de tarefas com um grau de dificuldade crescente. Actualmente, um dos testes
de inteligência mais
Binet entendia que "ajuizar bem, compreender bem e raciocinar bem são os dos é o Wechsler lntelli-
gence Scale for Children,
aspectos essenciais da intéligência. Uma pessoa pode ser atrasada ou WISC, construído por
se lhe fidtar a capacidade de julgal; mas com bons julgamentos não pode ser David Wechsler, que permi-
te avaliar erianças com ida-
nenhuma das duas"(1905, cit in: Sprinthall e Sprinthal1,1993). des compreendidas entre os
seis e os dezasseis anos.

53
Muito embora o c
"Os resultados da aplicaçao onhecimento sobre a natureza dos processos cognitivos e
desta Escala de Medida da
sobre as diversas dimensões que podem constítuir objecto de avaliação da
bueligencia não eram abso-
lutos. tuna vez que se fun- inteligência fosse ainda escasso, importa assinalar a preocupação em caracterizar
damentavam na comparação o desempenho de um indivíduo c
do desempenbo de uma de-
omparando-o com o de outros, e a posterior
terminada criança com a seriação e ordenação numa escala onde se definia a Idade Mental do sujeito.
inédia das crianças da mes-
O conceito de Idade Mental foi usado por Binet para cotar o teste, determinando,
ma idade, respondendo ao
mesmo teste. por exemplo, quantas tarefas conseguia realizar correctamente uma criança
1 média de seis anos. A atribuição de uma idade mental interior à idade
A deficiência mental refe-
re-se ao funeionamento in- cronológica acontecia perante crianças que apenas obtinham sucesso num
telectual geral significativa- número de tarefas inferior à média das crianças da mesma idade6.
mente sub-normal, coexis-
tindo paralelamente com
défices no comportamento A constatação, através da utilízação de escalas de inteligência, de uma idade
adaptativo e rnamfestando-
-se no período de desenvol-
mental inferior à idade cronológica justificou e fundamentou respostas educa-
vimento (Grossman,1977). ti vas segregadas (até meados do século passado), uma vez que se entendia que
crianças nestas c
ircunstâncias não tinham condições de acompanhar com suces-
' Níveis de atraso mental ten- so o currículo escolar, devendo ser criadas escolas separadas para as educar.
do como critério o
(Grossman, 1977): deficien- De facto, estudos posteriormente d
cia mental ligeira (QI entre esenvolvidos permitiram a avalíação e
c lassificação da deficiêncía mentaF em
50 até 70); deficiência men- diferentes tipologias 8
e a definição de
tal moderada (QI entre 35 prognósticos em termos educativos 9 e co
até 55): deficiência mental mportamentaís em função do grau
severa (Q1 entre 20 a te 40) de deficiência, ou seja, do valor do quociente intelectual lo
deficiência mental profun-
(QI) revelado pela
da (f.2I menor ou igual a 25).
criança, após a aplicação de testes de inteligência e de escalas de medida do
co mportamento adaptativo u
. Esta avaliação fundamentava as decisões sobre
Grossman associou os ní-
o tipo de ensino considerado adequado face a cada tipologia de deficiênciau
veis de atmso mentaI basea-
dos em critérios psicome- No entanto, nos anos 60, a avaliação na educação especial deixou de se centrar
tricos a níveis que tinham na classificação, preocupando-se funda
su bj acentes critérios educa- mentalmente com os problemas
e
cionais, definindo assim: ducacionais decorrentes de determinada deficiência ou perturbação do
atraso ligeiro — educáveis do dese
ponto de vista eseolar; atra- nvolvimento, o que, como vimos no primeiro capítulo, decorre da
so moderado — treináveis; progressiva integração destas crianças no sistema regular de ensino. Procurar
atraso severo — depen- identificar
dendes; atraso profundo — em que aspectos determinada deficiência podia afectar a educação
situação de vida não autó- da críança constituiu a grande finalidade da avaliação psicológica então
noma, precisando de apoio desenvolvida.
e cuidados constames.

Esta avaliação valorizava também a medida das diferenças individuaís


o é determinado e
idmdo a idade mental (1M)
implicou a coneepção e aplicação durante várias decadas de inúmeros
pcla idade c ronolágica 1.1(2)
in strumentos que pretendiam medir outras
d imensões do desenvolvimento,
mu ltiplieando o resultado nom eadatnente c
por 11)0, ou seja / apacidades consideradas fun
a prendizagem (como sejam a damentais ao sucesso na
1C X 100, sendo que para i dentificação auditiva de fonemas, memória
udda silI p o ctario a inédta
auditiva de palavras e frases, coordenação oc
do Q1 lem de ser 100. Asstm ulo-manual, percepção (le relações
sendo, ulna criança Coni espaciais, noção do corpo, l
allOs le idade cr e mocional, ete). ateralidade, equilíbrio, atenção, estabilidade
onoloa0ca e
unia tdade Inental ile etneo,
teta uni 1)1 de 5/6 100
su lsaudo-se porianto aba,xo `ma vez que se entende que os problemas na a
da inddia ,:perada. insuliciente dcsenvol V imento de d prendizagem decorrem de urn
eterminadas capacidades que lhe são
ibjacentes, a avaliação tem então como objectivo primordial identilicar defices " O cotnportamento adap-
tativo define-se em termos
nessas capacidades e consequentemente procurar a sua remediação' 3 . da cficacia ou grau. segun-
do os quais um indivíduo
realiza os padrões de inde-
A avaliação das capacidades da criança em diversas áreas do desenvolvimento
pendência pessoal e de res-
pretendia estabelecer hipóteses explicativas das diferenças e dos problemas tionsabilidade social espera-
dos para o seu grupo etário
na aprendizagem, para assim ser possível equacionar programas de treino das
e cultural. As áreas de avali-
capacidades e estratégias de ensino adaptadas às suas características' . Trata- itção consideradas podem
ser, por exemplo, a comu-
-se de programas simultaneamente de rernediação e de compensação, já que,
Meação, os cuidados pesso-
para além de pretenderem treinar as "áreas fracas" da criança, procuravam ais, as aptidões interpessoais
em relação à vida familiar e
igualmente manter e desenvolver as suas "áreas fortes".
social, o auto-controlo, as
aptidões escolares, o ócio.
A relação entre os resultados da avaliação dos processos psicológicos e a o trabalho, ete.
consequente definição de estratégias de ensino para crianças com dificuldades
na aprendizagem é evidente nos exemplos que seguidamente se apresentam: Ajuriaguerra (1970), ten-
do como referência cada ní-
vel de defieiência mental,
- perante uma criança com um bom nível de desenvolvimento nas
classifica o respectivo com-
diversas capacidades visuais (memória, sequencialização...) prescreve- portamento adaptativo, des-
crevendo os comportamen-
-se determinado método de leitura que privilegia a visualização de
tos passíveis de serem
palavras ou letras; servados em termos de
maturação e desenvolvi-
mento (0 -5 anos), de apren-
- face a uma criança com dificuldades na escrita e défices a nível do
dizagem e educação (6 —21
desenvolvimento perceptivo-auditivo (discriminação, identificação, anos) e de adaptação social
e profissional (a partir dos
sequencialização e memória), mas com um adequado desenvolvimento
21 anos). São também de
perceptivo-visual, entende-se necessário treinar os défices auditivos referir os estudos de Kirk
(1972) nos quais o autor
utilizando as suas capacidades visuais; descreve a natureza do com-
poltamento face a cada tipo
- a constatação de défices ao nível da linguagem expressiva da criança, de deficiência mental, defi-
nindo fundamentalmente as
nomeadamente ao nível fonológico permite, por um lado, associar estes
possibilidades em termos de
défices às suas dificuldades na escrita e, por outro, prescrever a aprendizagem escolar e de
antonomia pessoal e social.
intervenção da terapia da fala para resolver défices articulatórios.
A título de exemplo são
Assim sendo, a par da avaliação dos processos psicológicos, assistiu-se à de referir o "Teste de De-
senvolvimento da Percep-
proliferação de programas de ensino que pretendiam desenvolver e treinar, ção Visual" de M. Frostig
entre outras, capacidades relacionadas com as áreas perceptivo-visuais, (1903). o ''Illinois Test of
Psicholinguistic Abilities de
perceptivo-auditivas, psico-linguísticas, etc. S. Kirk, L. MeCarthy e W.
lKiik 11')6) e o "Diagnós-
A planificação e intervenção educacional baseava-se, portanto, em constructos tico das AquisiçOes
Perceptivo - Amlitivas",
psicológicos hipoteticamente subjacentes e facilitadores da aprendizagem, Jdaptado por Vitor ila Fon-
entendendo-se que o treino desses constructos constituía garantia cla superação (197M.

das dificuldades de aprendizagem da criança.


Estes programas educa-
Em síntese, a procura das causas que podem justificar as dificuldades centra- nvos inode-
H, e tecias ohre dificul-
-se, tal como na aborda g em médica, em factores intrínsecos ao indivíduo, dades de .1prenduagem que
presumindo-se que o treino de determinadas capacidades constitui o cerne da descrevem cApaçidades es-
peolicas. res cild1) coa-
sua resolução. oqueatensentd mdtodw,
cdth.dcionais oi remedia-
tivos para tratar os défiees
deteetados naquelas capaci- Quer as explicações médicas da deticiência, quer as explicações sobre processos
dades. Os modelos de trei- psicológicos hi poteticamente subjacentes à
no de capacidades (Ability a prendizagem foram alvo de várias
Training Models) ou mode- críticas, relativas, por um lado, ao uso excessivo de testes, à falta de relação
los de capacidades específi- destes com a a prendizagem realizada na sala de aula
cas constituem exemplos t5 , ao seu escasso valor
desta perspectiva (Reid, preditivo e, por outro lado, ao facto de terem como objectivo final, novamente,
1988). a c ategorização dos alunos, a qual pode ser injustat6.
A este respeito são de re-
ferir as críticas que subli- É este contexto que fundamenta o aparecimento nos anos sessenta da
nharn a falta de evidências abordagem compo rtamentalista
empfricas sobre os efeitos
Com efeito, na avaliação e educação da criança diferente.
do treino de deterrninadas
"mais do que qualquer outra perspectiva na educação especial,
capacidades na superação a influência b
efeetiva das difieuldades na ehaviorista foi grandetnente responsável pela rejeição dos
aprendizagem (Poplin, modelos médicos e p sicológicos" (B ailey 1998:44).
1988).

De facto, baseando-se nas teorias de Skinner sobre os aspectos


do com portamento humano, os determinantes
16 A utilização de testes comport amentalistas entendem que a avaliação
estandartizados pode ser in-
justa face a grupos mino- da criança deve apenas incidir no que pode ser observável, mensurável e
riMrios uma vez que as re- repetível, uma vez que apenas os com
gras de aplicação e cotação portamentos observados são relevantes
não são re presentativas da para a educação e testáveis em termos científicos.
população que está a ser tes-
tada. A avaliação deve ser objectiva e, conse
quentemente, centrar-se na observação
e medição de co
mportamentos previamente definidos e clos contextos em que
estes ocorrem, não sendo relevante pesquisar as causas dos problemas da criança
em hipotéticos processos psicológicos.

avaliação tem assim como objectivo fu


ndamental observar e identificar os
pré — requisitos subjacentes a determinado com
estar cl evidamente adquiridos pela criança. Estaportamento e que poderão não
id entificação fundamenta a
tomada de decisão sobre o que importa ensinar, ent
sistemático dos pr endendo-se que o treino
é-requisitos é suficiente para uma realização adequada de
toda a tarefa.

É neste cenário que a análise de tarefas assume particular relevo, uma vez que
permite, por um lado, avaliar com precisão qual a sub-tarefa (pré-requisito)
que a criança é capaz de realizar e, simul
tamento que se guidamente se deve ensinar.taneamente, indicar qual o compor-

Nessa medida, para avaliar o d


esempenho da criança em determinada área
com portamental é necessário realizar
p reviamente a h ierarquização ordenada
dos diversos pré-requisitos que lhe estão subjacentes
e, seg uidamente, observar
e registar de forma sistemática os comportamentos manifestados.

Tomemos como exemplo a intenção de avaliar a autonomia pessoal de uma


criança rel
ativamente à tarefa de lavar as mãos. A análise prévia desta tarefa,
com vista à avaliação dos co
1.1inte forma: mportamentos da criança, pode ser realizada da
AUTONOMIA PESSOAL

Nome: Data: / /

Comportamento a observar: Após indicação verbal a criança é capaz de


lavar as mãos.

Observador:

Instruções: Assinale na respectiva coluna os comportamentos observados.

COMPORTAMENTOS , SIM NÃO

1. Dirige-se ao lavabo

2. Abre a torneira

3. Molha as mãos

4. Pega no sabonete

5. Ensaboa as mãos

6. Coloca o sabonete no respectivo lugar

7. Esfrega as mãos

8. Passa as mãos por água

9. Fecha a torneira

10. Seca as mãos na toalha

A observação e constatação sistemáticados pré-requisitos aindanão adquiridos


pela criança permite ao educador identificar com precisão qual a sub-tarefa
que importa ensinar e treinar, com vista à realização bem sucedida e completa
do comportamento esperado.

Esta abordagem comportamentalista influenciou e continua a influenciar em


grande medida as práticas de avaliação e intervenção desenvolvidas naeducação
especial.
O condieionamento ope-
De facto, nas escolas para alunos portadores de deficiências severas e nos rante prmende aumentar ou
diminuir a frequência de
grupos com problemas de comportamento implementam-se currículos, determinados comporta-
constroem-se materiais e desenvolvern-se técnicas de ensino cuja finalidade mentos através da manipu-
lação das consequencias
principal se prende com a modificação de comportarnentos, tendo como base desses comportamentos (re-
os prineípios do condicionamento operante''. forços).
Relativamente às tecnicas de avaliação, esta abordagem pemlitiu a valorização
da construção de i
nstrumentos informais (listas de verificação de comporta-
mentos, escalas de graduação e testes r
eferenciados a critérios). Este facto
facilitou uma progressiva participação do educador no processo de observação
e avaliação da criança, não se limitando a pôr em prática indicações por vezes
pouco relacionadas com a sua experiência diária na sala de aula.

Por outro lado, o grande impacto que a abordagem co


mportamentalista teve
na intervenção realizada junto de alunos com problemas de co
mportamento e
com deficiências severas na a
prendizagem, decorre da possibilidade do
educador acompanhar de forma sistemática a evolução da criança, podendo
ser, por isso, gratificante em termos profissionais.

No entanto, também esta abordagem foi e é alvo de críticas, no


meadarnente as
que apontam as limitações educativas dos currículos desenvolvidos, já que
apenas incidem em co mportamentos o
bserváveis. Dessa forma, algumas
dimensões do de
senvolvimento da criança são sub-valorizadas OU mesmo
esquecidas, uma vez que não são passíveis de ser previarnente operacionalizadas
em termos com
portamentais (a título de exemplo, são de referir as áreas relativas
ao desenvolvimento sóci o-emocional, ao
de senvolvimento expressivo, à
imaginação e à criatividade). Por sua vez, a ênfase
dada nesta abordagem ao
treino sistemático de com
portamentos, descurando, por vezes, a importância
da aprendizagem co
ntextualizada, constitui também uma das suas limitações,
já que a utilização de co mportamentos s
upostamente aprendidos pelas crianças/
jovens nas situações nas quais são necessários nem sempre acontece, o que
significa que aqueles não foram generalizados, ou seja, que não se verifica a
manutenção dos co mportamentos ao longo do tempo.

Como co nsequência das críticas de


senvolvidas surge nos anos 80 uma nova
abordagem cognitivo -comp ortamentalista
Esta aborda g em desenvol- na avaliação da criança com
veu-se s obretudo no âmbi- necessidades educativas especiais". Esta integra os princípios das duas
to das difieuldades de
ap rendizagem na leitura, na perspectivas antes caracterizadas (a que sublinha a importância de avaliar os
e:;crila e 110 cáleulo, eviden- processos psicológicos e a que enfatiza a avaliação de comportamentos
le ein alunes que revelam o bservávers) e fu
utna di,: crepancia significa- ndamenta-se na investigação d
esenvolvida sobre o proces-
tiva entre o nível de (lesen- satnento cognitivo da informação, sobre as teorias met
sol Si men to e ognitivo e o a-cognitivas e sobre os
princípios do auto-reforço e da a
nível de realitaç:io eseolar uto-regulação do comportanlento.

A avaliação centra-se na forma como se realiza o processamento de informação


e nos processos me
ta-cognitivos considerados determninantes para o sucesso
ac adémico, uma vez que a preocupação
fu ndamental é a integração escolar.
Tendo como base as estratégtas de a
prendizagem usadas por alunos com
sucesso, pretende-se avaliar os com
a o r endizagem que desenvolvem. portamentos dos alunos e as estratégias de
Nesta abordagem considera-se fundamental avaliar as condições do contexto
ensino—aprendizagem, as estratégias cognitivas desenvolvidas pelo aluno,
bem como as características que este revela em termos sociais, emocionais e
motivacionais, já que se perspectiva a aprendizagem como um processo activo,
construtivo, e contextualizado.

Re ati vamente às tecnicas e instrumentos usados na avaliação do desetnpenho


do aluno face às actividades escolares, privilegiam-se os testes 19 , a análise de Estes testes pretendem
ntedir o funcionamento
tarefas, a observação, os questionários e as entrevistas. cognitivo do aluno e. em-
bora sejam mais sofisticados
Os autores que preconizam esta abordagem entendem que os processos ou que os usados anteriormen-
te, continuam a ter como
fontes do conhecimento são interactivos, não perspectivando o funcionamento intenção medir constructos
mental como um conjunto de capacidades específicas e independentes. Assim psicológicos hipotécticos.

sendo, os problemas na aprendizagem não decorrem de défices físicos ou


estruturais, mas sim de falhas ou insuficiências no processamento da informação
necessária ao desenvolvimento adequado de estratégias de aprendizagem e,
nessa medida, considera-se fundamental a activação e utilização desses
processos.

Com base nesta abordagem cognitivo-comportamentalista desenvolveram-se


práticas de avaliação com preocupações diversas, dadas as diferentes correntes
psicológicas que as fundamentam.

Com efeito, os autores que preconizam a abordagem comportamentalista


preocupam-se em avaliar as estratégias de aprendizagem e as técnicas de estudo O locus de controlo refe-
usadas pelo aluno; já os que integram a abordagem cognitivista procuram re-se à expectativa que o
aluno desenvolve sobre a
avaliar as estratégias cognitivas (entre as quais são de referir, os estilos de relação entre o seu compor-
aprendizagem, a motivação, o locus de controlo 20 e a atribuição causaP (los tamento e os resultados que
obtém. Se o aluno acredita
alunos, as suas crenças e atitudes). que os resultados dependem
do seu comportamento, diz-
-se que tem um locus de
Em termos de avaliação, a abordagem cognitivo-comportamentalista, para além controlo interno; se acredi-
de procurar combinar a utilização de instrumentos formais (testes normalizados) ta que dependem de facto-
res externos (sorte, dificul-
com instrumentos informais (listas de verificação de comportamentos, escalas dade da tarefa, critérios ar-
de graduação, testes centrados em critérios, entrevistas e questionários), sublinha bitrários do professor) diz-
-se que tem um locus de
a importância da participação do educador no processo de avaliação, elaborando controlo externo.
e aplicando estes instrumentos face às características individuais de cada criança.
A atribuição eausal ou cs-
Por sua vez, o facto de se valorizarem as crenças e atitudes do aluno perante as tilo atribucional do aluno diz
diversas situações de ensino/aprendizagem, bem como os aspectos moti- respeito às razões que este
turibut ao sucesso/msucesso
vacionais que lhe subjazem, permite conceber o aluno como sujeíto que expertmentado após a rea-
participa de forma activa e partícipatíva no pfOCCSSO de avaliação do seu Iiiaçao das tarefas, as quais
podem ser iluerthc, (falta de
desempenho. capacidade, de estorço pos-
soal, de atençao) ou extcr-
nas tthliculdatles
Com efeito, as entrevistas e os questionarios sobre as crenças e atitudes que o
aluno desenvolve face a determinado conteúdo curricular constituem exemplos :1/ar).
da sua participação activa no processo de avaliação, facilitando posteriormente
a detinição conjunta de contratos pedagógicos sobre as áreas a trabalhar, tendo
em vista um melhor desempenho escolar.

Em termos educacionais, preconiza-se um currículo comum a todos os alunos


e, face àqueles que revelam dificuldades na aprendizagem, pretende-se
valorizar e desenvolver de forma progressiva as suas áreas fortes, adaptando
os contextos, as estratégias e os materiais de ensino às características individuais.

Após a análise das diferentes abordagens que descrevemos sobre a avaliação


da criança com necessidades educati vas especiais pensamos que:

é evidente a grande influência cla medicina e da psicologia neste


domínio, bem como a relação entre as abordagens desenvolvidas e as
respostas educativas consideradas adequadas ;

a classificação e categorização das diferentes problemáticas constituiu


uma das preocupações fundamentais daquelas ciências, o que, nas
últimas décadas, tem vindo a ser amplamente criticado em termos
educativos;

as causas atribuídas aos problemas educativos centraram-se predo-


minantemente em factores intrínsecos à criança, com excepção das
perspectivas compo rtamentalistas, nas quais as condições do meio
ambiente constituem também factores de relevo;

- predominou a utilização de instrumentos formais — testes — cuja


aplicação acontece em períodos p ré-estabelecidos, fora dos contextos
de vida da criança;

os aspectos cognitivos da criança sob revalorizaram-se em detrimento


dos d eterminantes pedagógicos subjacentes à aprendizagem;

a avaliação da criança com problemas tem vindo a servir para legitimar


uma determinada ordem social e para sustentar um sistema de ensino
in
questionável, o qual, muito embora se pretenda inclusivo, para-
doxalmente, continua a afastar da escola aqueles que mais dela
precisam;

apesar dos actores privilegiados terem sido principalmente os médicos


e os psicólogos, a integração na escola e o
de senvolvimento de técnicas
e i nstrumentos de avaliação informal no âmbito da educação, faci-
litaram a progressiva valorização da participação dos educadores no
processo avaliativo;
as práticas de avaliação foram
i nfluenciadas inevitavelmente pela
pred
ominância em determinadas épocas de eertas ahordagens, ou seja,
60
por "fenómenos de moda", o que constitui sempre factor limitativo de
urna avaliação que se quer compreensiva e abrangente, dadas as
problemáticas complexas dos alunos em causa.

o conhecimento e a experiência resultantes das diversas abordagens


desenvolvidas neste domínio constítui, sem dúvida, um contributo
imprescindível para uma compreensão abrangente dos problemas que
alguns alunos revelam na aprendizagem,uma vez que se pretende
garantir melhores oportunidades educacionais e melhores resultados
para esses alunos.

Actualmente, a avaliação na educação especial tem como preocupação analisar


as consequências em termos educativos das necessidades especiais dos alunos,
tendo assim como finalidade a tomada de decisões sobre qual o tipo de educação
adequado às suas necessidades.

Perspectivada como um processo pelo qual se delimitam, se obtém e se fornecem


informações úteis que permitem julgar decisões possíveis (Stuffiebeam,1985),
a avaliação implica que se observe e analise a situação presente da criançal
jovem tendo como referente a situação ideal, para assim poder definir as acções
susceptíveis de a melhorar (Hadji,1994).

Em termos de avaliação da criança com necessidades educativas especiais


preconiza-se uma abordagem educacional, a qual, para além de integrar o
contributo de outros técnicos (médicos, psicólogos, terapeutas...) perspectiva
corno fundamental a participação do educador, uma vez que, dada a
especificidade das suas funções, constitui sem dúvida o elemento capaz de
efectuar uma avaliação contextualizada e diversificada do desempenho da
criança nas diversas áreas do desenvolvimento e da aprendizagem.

A avaliação é entendida como umn juízo de valor que se efectua relativamente


à situação da criança, do qual necessariamente devem resultar indicações para
a intervenção pedagógica a desenvolver.Assim sendo, permite a elaboração
de um relatório detalhado das competências e dificuldades da criançaljovem,
das áreas que importa desenvolver e das estratégias que se consideram mais
adequadas. Este relatório deve descrever as necessidades do aluno e permite a
elaboração do respectivo programa educacional, o qual constitui a base de
uma intervenção conjunta a desenvolver pelos diversos actores envolvidos
(educadores, professores, pais, psicólogos, médicos, etc.)

Assim, em termos de avaliação educacional resulta evidente a estreita articulação


entre intervenção e avaliação, não sendo adequado equacionar estes dois
processos como inseparáveis, mas sim como complementares e contínuos. De
facto, o educador só poderá avaliar a criança/jovem através de uma intervenção

61
pedagógica que tem como intenção última conhecer e compreender a
problemática da criança, devendo para tal, observar e registar de forma
sistemática os seus desempenhos, progressos e atitudes face à aprendizagem.

É este processo contínuo de avaliação e intervenção que permite ao educador


compreender o aluno com necessidades educativas especiais. Nesse sentido,
só trabalhando com a criança com necessidades educativas especiais se poderá
compreender v erdadeiramente a natureza dos seus problemas.

Os objectivos principais da avaliação educacional que actualmente se preconiza


são:

descrever as características do aluno nas seguintes áreas: curriculares/


educativas, sociaís, emocionais e cognitivas;
definir as c ompetências e dificuldades no sentido de identificar e
sistematizar as consequentes necessidades educativas;
tomar decísões relativamente à intervenção julgada adequada, o que
implica a elaboração de um programa educativo;

definir tempos e actores privilegiados na avaliação processual e final


do programa e elaborar os respectivos instrumentos de registo que
permitam ajuizar sobre a sua ad equabilidade, pertinêncía e eficácia.

Neste contexto, vários autores vêem preconizando uma


perspectiva ecológica
na avaliação, sublinhando a i
mportância do conjunto de influências do contexto
no co
mportamento e- desempenho da criança (por exemplo, a intluência
familiar, social e escolar). Sublinha-se que, para c
ompreender as necessidades
educativas de um aluno, é i
mprescindível ter em consideração a complexidade
dos múltiplos contextos que intluenciam o seu c
omportamento (Pimentel, 1997;
Bairrão, 1998; Bailey,1998).

Assim sendo, a avaliação procura caracterizar os vários contextos nos quais a


criança vive e aprende (familia, escola e outros sig
e nificativos...), identificar as
xpectativas de pais e professores sobre seu futuro, de forma a analisar a
influência destas dimensões na relação que a criança estabelece com os outros
(pais, irmãos, professores, e colegas) e no nível de de
senvolvimento e de
desempenho escolar verificado.

Esta perspectiva ecológica supõe a participação conjunta e concertada de


equipas plu
ridisciplinares (médicos, psicólogos, educadores, professores,
terapeutas, assistentes sociais, etc,) que d
esenvolvem todo um processo de
recolha de informação sobre os contextos familiar e escolar da criança, sobre
a sia situação actual (em termos desenvolvimentais, com
e portamentais e
scolares) e, se necessário, sobre a sua história pessoal, familiar e escolar.
6?
A análise cuidada e compreensiva dos resultados deste processo permite a
tomada de decisões relativamente às respostas educativas julgadas pertinentes,
sendo importante que todos os profissionais envolvidos tenham consciência
das implicações das suas decisões na vida e no futuro da criança.

A análise dos resultados da avaliação fundamenta-se em processos de inferência


e, nessa medida, importa também sublinhar o carácter relativo das inferências
realizadas, uma vez que decorrem do que se considerou objecto de avaliação,
do tempo e dos contextos em que esta ocorreu e dos intervenientes e
instrumentos privilegiados (Pimente1,1997).

Note-se que, relativamente à compreensão das causas ou da natureza dos


problemas que a criança/jovem apresenta, a ideia antes veiculada de que apenas
após esta formulação era possível e legítima a intervenção, é actualmente, em
termos educativos, posta em causa. Aquela ideia tem subjacente o pressuposto
de que é possível estabelecer relações causais entre as dificuldades da criança
e determinada perspectiva teórica sobre a aprendízagem que fundamenta a
tomada de decisão.

No entanto, a falta de perspectivas teóricas explicativas de problemáticas


complexas, implica, por vezes, que as decisões têm de ser tomadas com alguma
incerteza, a qual deve ser perspectivada e entendida de forma responsável
pelos profissionais envolvidos na avaliação (Pij1 e Van Den Bos,1998). De
facto, as decisões que tomamos após a avaliação da criança/jovem são relativas
e a verificação da sua pertinência e adequabílidade só poderá verificar-se após
uma intervenção e avaliação contínua.

Efectuar a avaliação educacional da criança exige ainda uma estreita articulação


e colaboração entre o professor do ensino regular e o professor especializado.
Só assim será possível definir em conjunto o que importa mudar, os objectivos
a atingir e as estratégias a implementar facilitadoras do processo de ensino/
aprendizagem do aluno.

2.2 Identificação e avaliação — clarificação de conceitos

Como vimos no pri meiro capítulo, a identíficação de alunos com necessidades


educativas especiais pode constituir um processo difícil para o educador/
professor. Esta situação acontece fundamentalmente perante problemáticas que,
por razões diversas, não foram atempadamente identificadas pela família e/ou
pelos serviços de saúde pública.
De facto, a identificação e avaliação de crianças com
" Simeonsson (1994,cit in:
frequência e alta intensidade n problemas de baixa
Bairrão:29) considera útil a deverá ser realizada à partida pelos serviços
distinção entre problemas
de baixa freqüência e alta
de saúde e de segurança social. A estes serviços compete efectivamente
intensidade versus proble- idenfificar e avaliar as necessidades especiais que poderão decorrer de défices
mas de alta frequência e biológicos, inatos ou congénitos e, conse
baixa intensidade. Enquan- quentemente, equacionar processos
to os primeiros têm urna de intervenção precoce que facilitem a posterior integração escolar (aqui se
prevalência baixa, e exi-
gem, em seu entender, uma incluem as situações de deficiência visual, de deficiência auditiva, de deficiência
articulação e colaboração motora, de deficiência mental, de autismo, entre outras)23.
estreita entre os serviços de
saúde, de segurança social Nestes casos, a c
e de educação especial, os riança/jovern chega à escola já devidamente identificada e,
segundos constituem um
muito embora seja f
undamental uma efectiva articulação entre aquela e os
grupo de risco em termos
escolares com uma dimen- serviços de saúde, de segurança social e de educação especial, a resposta às
são crescente, o qual extge suas necessidades educativas pode ser conseguida, sempre que existam os
sobretudo de uma educação
diversificada e de qualida- recursos humanos e materiais adicionais que se revelem indispensáveis
de. (Bairrão,1998).

Já perante crianças com problemas de


alta frequência e baixa intensidade a
id entificação é realizada num primeiro momento
=3 No Warnoek Report, ape- pelo educad
sar da introdução do con-
or/professor, uma
ceito de necessidades
vez que é, sobretudo, na escola que os problemas se irão manifestar.
educativas especiais com a Com efeito, um número si
intenção clara de não estig- gnificativo de crianças apenas quando integradas
matizar as crianças mantém- no grupo (pré-escolar ou escolar) manifesta problemas de saúde, de socialização,
se as c ategorias • de deficiên- de comportamento e de a
cia uma vez que estas po- prendizagem, sendo portanto ao educa dor/professor
dem facilitar quer a recolha que compete identificar as ne
de dados, quer a definição cessidades educativas especiais no sentido da
dos recursos humanos e
escola desencadear processos de avaliação plu
c omprovar a l egitimidade da ridisciplinares que permitam
materiais que aquelas exi- id entificação realizada e, cons
gem. Esta opinião é parti- equentemente,
lhada por Bairrão (1998) elaborar planos e programas de intervenção adequados.
quando refere que a cate-
g orização das diversas defi- Emporta, pois, definir o que se entende por i
ciências continua a ser per- crianças com n dentificação e por avaliação de
tinente em termos científi- ecessidades educativas especiais, uma vez que estes dois
cos e epide rniológicos, não conceitos, porque rel acionados, apelam para
d eixando, no entanto, de c ompetências específicas que
a ssinalar a sua inutilidade actualmente são exigidas ao educador/professor.
quando se procura dar res-
posta às neeessidades
A i dentificação das n
edueativas especiais, ou seja, ecessidades educativas especiais de urna criança constitui
quando se pretende elabo- a primeira indicação de que poderão existir problemas significativos no
rar e implementar progra- des envolvimento e/ou na a
Inas educativos. prendizagem, face aos quais o educador não encontra
estratégias pe dagógicas eficazes.

Esta primeira id entificação é da res


ponsabilidade do educa dor/professor do
ensino regular. A sua l egitimidade e fund
do processo de avaliação d esenvolvido e,amentação dependem, por um lado,
por outro, do co nhecimento que o
educador tem sobre o desenvolvimento "normal" e sobre as
c ompetências
no currículo escolar nas diferentes idades.
Com etèito, de forma consciente OU
inc onseiente, os educador
i dentificam as necessidades es/professores
edueativas das crianeas eom base em processos
64
de avaliação que têm como referente ou o nível de desenvolvimento esperado
em determinada faixa etária ou o nível de realização escolar previsto para
dado ano de escolaridade.

O excerto de um diário de um professor que a seguir se transcreve, ilustra de


forma sobremaneira evidente esta situação, bem como as preocupações e
dificuldades que alguns docentes experimentam na identi ficação das necessi-
dades educativas dos alunos:

"O João continua a preocupar-me porque não consigo que ele avance
nas aprendizagens. Ele tem oito anos, dois de escolaridade e ainda
não conta até 20, só até 12 e concretizando! Lê e escreve palavras de
duas stlabas, mas se alguém lhas silabar Será que é uma criança que
precisa de ensino especial?"

O educador tem assim um papel determinante na identificação das necessidades


educativas especiais dos alunos. A identificação adequada e fundamentada
depende não só de competências profissionais relacionadas com a capacidade
de desenvolver processos sistemáticos de avaliação dos alunos, mas também
de capac idades de análise crítica e reflexiva sobre a prática pedagógica.

De facto, a identificação das necessidades educativas especiais, para além de


exigir ao educador competências pedagógicas relacionadas com a avaliação
das crianças/alunos, exige ainda competências críticas sobre a intervenção
pedagógica desenvolvida.

É com base nesta primeira identificação realizada pelo educador/professor


que a escola poderá desenvolver os mecanismos necessários que garantam a
avaliação da criança pelos Serviços de Educação Especial, dependendo esta
decisão do consentimento dos respectivos pais. E, uma vez que esta avaliação
tem uma grande infiuência na vida da criança deverá ser obrigatoriamente
abrangente, compreensiva e fundamentada (Bailey, 1988).

A avaliação realizada pela Educação Especial implica, como já referimos


anteriormente, a existência de equipas pluridisciplinares capazes de caracterizar
de forma ampla e compreensiva, não só o nível de desenvolvimento e de
realização da criança, mas também a qualidade dos diversos contextos
educativos nos quais aquela se insere, de forma a elaborar planos e programas
educativos que respondam às suas necessidades educativas.

As equipas pluridisciplinares devem integrar técnicos ligados à saúde, à


segurança social e à educação, uma vez que o contributo de todos será
fundamental para equacionar as respostas educativas imprescindíveis a uma
efectiva integração social e escolar da criança.

Assim sendo, a avaliação tem como objectivo fundamental tomar decisões


sobre o tipo de educação adequada para o aluno tendo em conta as suas
necessidades. A descrição e análise destas necessidades permitem a formulação
de juízos de valor e a consequente elaboração de programas educativos. As
necessidades educativas da criança constituem assim a base da intervenção
conjunta d
eeducadores, de professores, de pais e de outros técnicos envolvidos
na sua educação.

2.3
Identificação de alunos com necessidades educativas especiais
— processos e instrumentos

Para a identificação de alunos com necessidades educativas especiais julgamos


que será fundamental desenvolver, à partida, uma avaliação formativa,
uma
vez que esta se centra no processo de ens
ino-aprendizagem durante o seu
decurso (Rosales,1992; Valadares e Graça,1998). Com efeito, nesta moda-
lidade de avaliação é o processo de ensin
o/aprendizagem enquanto tal que
deve ser considerado, sendo assim clara a necessidade do professor analisar
de forma crítica e reflexiva a sua prática pedagógica. E, muito embora essa análise
possa ' ser percebida pelo professor como ameaçadora (
Perrenoud,1993), uma
vez que lhe exige processos de reflexão e de questionamento sobre a prática
pedagógica, entendemos ser i
mprescindível, no sentido de perceber em que
medida as eventuais necessidades educativas especiais decorrem de factores
contextuais e pedagógicos ou de factores intrínsecos ao aluno.
Assim, numa primeira fase,
a identificação das necessidades educativas
especiais deve centrar-se na análise que o educador faz sobre a sua prática
enquanto profissional. E
fectivamente, apenas após esta primeira fase será
pertinente equacionar processos de avaliação tendo em atenção os problemas/
dificuldades que a criança revela e que importa identificar.

Deste modo, o educador deverá desenvolver processos de auto-avaliação cla


intervenção pedagógica que desenvolve junto clo grupo/turma (sobre a
planificação, sobre a avaliação contínua dos alunos, sobre as formas de gestão
e organização do processo de ensino — a
prendizagem, sobre a forma como
intetpreta os co
mportamentos dos alunos...), podendo, para tal; utilizar escalas
de graduação e registar eventuais
incidentes críticos que surjam na situação
pedagógica.

A escala de graduação que s


eguidamente se apresenta poderá constituir um
instrumento facilitador do processo de auto-avaliação referido.
O educa dor/professor poderá solicitar
aTcolaboração de colegas, a fim de
des
envolverem processos conjuntos de observação da situação pedwgógica,
usando a eseala de graduação apresentada. O confronto dos resultados
ESCALA DE GRADUAÇÃO

AUTO - AVALIAÇÃO DO PROFESSOR

Nome: Data: / /

Indicações: Faça um círculo na palavra da escala que melhor descreve o seu comportamento na
sala de aula.

1. Avalio o conhecimento prévio dos alunos antes de iniciar ÀS COM


NUNCA
uma nova aprendizagem VEZES FREQUÊNCIA

2. Organizo o processo de ensino tendo em conta o ÀS COM


NUNCA
conhecimento prévio e os interesses dos alunos VEZES FREQUÊNCIA

3. Selecciono e disponibilizo materiais e recursos adequa-


Às com
dos para diferentes níveis de aprendizagem e caracte- NUNCA
VEZES FREQUÊNCIA
rísticas dos alunos
4. Utilizo estratégias de ensino diversificadas(trabalho
ÀS COM
individual, a pares, .de grupo, debates, apresentações NUNCA
VEZES FREQUÊNCIA
orais, etc.)
5. Observo e registo comportamentos dos alunos durante a ÀS COM
NUNCA
realização das tarefas VEZES FREQUÊNCIA

6. Avalio oralmente o desempenho dos alunos em ÀS COM


NUNCA
actividades individuas e de grupo VEZES FREQUÊNCIA

7. Valorizo não só o desempenho final mas também o ÀS COM


NUNCA
esforço e progresso individuais VEZES FREQUÊNCIA

8. Tenho em consideração as propostas dos alunos na ÀS COM


NUNCA
planificação das actividades VEZES FREQUÊNCIA

9. Na gestão do tempo e das actividades procuro integrar


ÀS COM
um espaço que permita a auto e hetero-avaliação dos NUNCA
VEZES FREQUÊNCIA
alunos
10. Negoceio e defino com os alunos regras de ÀS COM
NUNCA
comportamento na sala de aula VEZES FREQUÊNCIA

I I . Antecipo conjuntamente com os alunos as aprendizagens ÀS COM


NUNCA
que irão ser realizadas (diárias e/ou semanais) VEZES FREQUÊNCIA

12. Organizo a sala de aula de modo a facilitar o acesso fácil ÀS COM


NUNCA
a diferentes materiais VEZES FREQUÊNCIA

13. Op*anizo o processo de ensino de forma a promover a ÀS COM


NUNCA
autonomia dos alunos VEZES FREQUÉSCIA

14. Procuro compreender o comportamento dos alunos tendo com


Às
em conta o contexto em que ocorre (lipo e nível de NUISCA
V EZES FREQUÊ,NCIA
exigência da tarefa)

67
obtidos através das respectivas observações, facilitará uma caracterização mais
objectiva da realidade pedagógica.

A análise periódica e sistemática desta auto-avaliação permite ao educador tomar


consciência das competências subjacentes à sua prática docente e equacionar
formas de melhorar ou modificar aquelas que considera indevidamente
desenvolvidas.

Por sua vez, o registo de incidentes críticos que ocasionalmente acontecem na


situação pedagógica constitui também uma técnica que possibilita a identi-
ficação das inferências que o educador realiza perante comportamentos de
determinados alunos, perceber em que contextos estes ocorrem e qual é a sua
frequência.

FICHA DE REGISTO DE INCIDENTES CRÍTICOS*

ALUNO

ANO TURMA DISCIPLINA


SITUAÇÃO

COMPORTAMENTO

INFERÊNCIAS Este tipo de c omportamento é:

Frequente O

Pouco frequente O

Raro O

In: Estrcla, 1994.


Uma vez que o registo de incidentes críticos permite reduzir a margem de
subjectividade que caracteriza a observação ocasional (Estrela,1994), a sua
utilização sistemática revela-se fundamental no processo de identificação de
alunos com necessidades educativas especiais.

De facto, como se pode observar na ficha de registo de incidentes críticos


apresentada na página anterior, este instrumento contempla a definição da
situação em que o comportamento do aluno ocorreu, a descrição desse
comportamento, a forma como este é interpretado e em que medida é percebida
a sua frequência, por parte do educador.

Esta primeira fase de análise e reflexão sobre a prática pedagógica poderá


facilitar a alteração de metodologias de ensino/aprendizagem, a experimentação
de processos diferentes de gestão do tempo e das actividades, a utilização de
materiais pedagógicos diversificados, o estabelecimento de novas formas de
comunicação e de relação pedagógica com o grupo/turma. Estes novos
processos terão consequências na dinâmica do grupo/turma, ou seja, na
motivação e atitude dos alunos face à aprendizagem, no comportamento que
revelam, na forma como interagem com os colegas e com o educador e também
nos resultados que obtém em termos de aprendizagem.

Neste cenário, a avaliação assume funções que visam a tomada de decisões


relativamente à regulação cio processo de ensino aprendizagem, à orientação
sobre determinado caminho a seguir e não apenas à certificação das aquisições
escolares no final de um ciclo de estudos (Perrenoud, 2001).

Constituindo-se então como elemento integrante do processo educativo


(Ribeiro,1989; Rosales,1992; Valadares e Graça,1998; Perrenoud,2001) com
o qual interage, a avaliação tem como objectivo tomar decisões no sentido de
melhorar o processo de ensino-aprendizagem. Nessa medida implica a recolha
e interpretação sistemática de informação e a consequente formulação de juízos
de valor por parte do educador.
Uma vez que a avaliação consiste na análise descritiva e objectiva das
aprendizagens realizadas durante o processo de ensino, tem como funções
informar quer o professor quer os alunos sobre as competências adquiridas e
sobre as dificuldades sentidas. Nessa medida permite ao professor re-orientar
o processo de ensino, definindo novas estratégias e experiências que facilitem
a aprendizagem, faculta ao aluno informações precisas sobre as competências
adquiridas motivando-o para outras que importa desenvolver e, por último,
constitui uma base indispensável para a classificação e seriação dos alunos
numa dada escala. Esta classificação embora constitua uma forma fácil de
comunicação dos resultados obtidos pelos alunos e permita a sua selecção
durante a escolaridade, não fornece, no entanto, a informação necessária à
adequação e melhoria do processo de ensino/aprendizagem.

69
De facto, já que a avaliação consiste numa "operação descritiva e informativa
nos meios que emprega, formativana intenção que lhe preside e independente
fàce à classificação" (Ribeiro,1989:74), resulta evidente a distinção entre
avaliar e classificar.

Por sua vez, enquanto processo sistemático de acompanhamento da evolução


do aluno, a avaliação deve ser realizada pelo professor no decurso da própria
aula, tendo neste contexto uma função fundamentalmente pedagógica
(Valadares e Graça,1998).

Neste sentido, numa segunda fase, a identificação das necessidades educativas


especiais implica que o educador/professor realize uma avaliação diagnóstica
ou prévia.

Segundo a1guns autores a avaliação diagnóstica ou prévia faz parte da avaliação


formativa, o que vem ao encontro de recentes disposições oficiais sobre
avaliação, nomeadamente, o Depacho Normativo n.° 30/2001, no qual se
preconiza que

" (...) a avaliação formativa inclui uma vertente de diagnóstico tendo


em vista a elaboração e adequação do projecto curricular de turma e
conduzindo à adopção de estratégias de diferenciação pedagógica."

De facto, embora as duas modalidades de avaliação possam ser consideradas


de forma distinta, tendo em conta a fase temporal do processo de ensino/
aprendizagern em que ocorrem (Ribeiro, 1989; Rosales, 1992), importa
sublinhar que a avaliação diagnóstica se pode realizar quer no início do ano
lectivo, quer em qualquer outro momento do processo de ensino-aprendizagem,
constituindo-se assim como um elemento da avaliação formativa.
Ind ependentemente do tempo em que possa ocorrer, a avaliação diagnóstica
ou prévia tem como funções:

- verificar se o aluno tem adquiridos os pré-requisitos necessários às


novas aprendizagens (Ribeiro,1989);
- determinar as características da situação inicial de um determinado
processo educativo, aprofundar o conhecimento das causas de deter-
minados problemas no sentido de serem tomadas medidas para a sua
melhoria, identificar problemas que o aluno apresenta em dado
momento do processo (Rosales,1992);
" Sobre a delinição, cons-
tftyão e ufflização de dife-
rentes tipos de itens, eon- - descobrir onde residem as dificuldades dos alunos no decorrer do
sultar Valadares, J. e Graça, processo de aprendizagem (Valadares e Graça,1998).
l. (1988). Ahdiando para
me/horar a
lit
Lisboa: Plitano Edições vez que esta avaliação diagnóstica ou prévia permite ao educador/professor
'Uenieas.
recolher e obter inforrnações sobre uma dada situação inicial de forma a

70
organizar e adequar o processo de ensino-aprendizagem às características do
grupo/turma, bem como conhecer as dificuldades ou problemas dos alunos,
constítui urna modalidade fundamental quando se pretende identificar as
eventuais necessidades educativas especiais.

Como antes se assinalou, a avaliação diagnóstica ou prévia que o educador/


professor realiza tem necessariamente um referente, ou seja, um termo de
comparação face ao qual se compara o desempenho dos alunos. A este
propósito, importa distinguir, dois tipos avaliação que usam referentes diversos:
a avaliação normativa e a avaliação criterial.

A avaliação normativa parte do princípio de que os alunos naturalmente se


distribuem em alunos bons, médios ou maus, de acordo com a Curva Normal
ou de Gauss e, nessa medida, os resultados obtidos num mesmo teste por um
determinado aluno ou grupo de alunos são comparados face ao grupo-padrão
a que pertencem (Ribeiro, 1989; Lemos,1993; Valadares e Graça,1998).

Já a avaliação criterial incide no desempenho de um aluno relativamente a


determinada aprendizagem ou competência, tendo como referentes os nívéis
de consecução previamente definidos, ou seja os critérios de desempenho
aceitáveis (Ribeiro, 1989; Valadares e Graça, 1998).

A definição de critérios deve realizar-se tendo em linha de conta os objectivos


previstos no programa e que foram desenvolvidos durante o processo de ensino-
aprendízagem. Assim sendo, resulta evidente a necessidade do professor
seleccionar os seus próprios critérios, tendo em linha de conta o que pretende
avaliar, bem como o contexto de ensino—aprendizagem dos seus alunos.

Quando equacionada com o propósito de identificar as eventuais necessidades


educativas, a avaliação diagnóstica deve permitir caracterizar as diferenças
entre os alunos, mas englobando-as numa perspectiva de diversidade, o que
significa que deve, sobretudo, fornecer informações sobre estratégias
pedagógicas que facilitem a superação dos problemas dos alunos, não se
centrando nas suas limitações, nem na sua classificação (Ainscow,1990, cit
in: Jesus e Martins,2000).

Na identificação de alunos com necessidades educativas especiais será


fundamental realizar uma avaliação baseada no currículo, a qual implica
que os educadores/professores utilizem os materiais pedagógicos e didácticos
da sala de aula para avaliar as competências e os ní‘íeis de desempenho do
aluno nas diversas áreas e contextos educativos. Este tipo de avaliação permite,
por um lado, avaliar os alunos em contextos onde habitualmente estão inseridos
e, por outro, compreender os resultados da avaliação, facilitando assim o
eventual processo de adequação/adaptação do currículo às necessidades dos
alunos.

71
Esta avaliação deverá ser coerente, ou seja, deve existir uma estreita articulação
entre o as estratégias e experiências de aprendizagem desenvolvidas na sala
de aula, osconteúdos que se avaliam e os instrumentos que se utilizam para tal.

A observação e o registo dos comportamentos revelados pelo grupo/turma e


pelo aluno que à partida preocupa o educador permitir-lhe-á decidir se deve
desenvolver processos de avaliação sistemáticos, no sentido de compreender
de forma mais aprofundada as dificuldades que aquele revela em termos de
comportamento e/ou de aprendizagem.

A propósito do desenvolvimento de processos de avaliação sistemáticos


centrados no aluno importa ter consciência de factores circunstanciais, profis-
sionais e psicológicos que o podem influenciar.
Nos factores circunstanciais
incluem-se as áreas/conteúdos que o educador
avalia, os referentes face aos quais compara o desempenho da criança, o tempo
e o espaço que privilegia para a avaliar, as fontes de informação que elege, as
técnicas e instrumentos que usa e a forma como regista e analisa os resultados.
De facto, todos estes factores são determinantes para uma avaliação válida e
fiável.

Relativamente aos factores protissionais


que podem influenciar os resultados
da avaliação, são de referir: as atitudes que o educador tem face às diferenças
individuais, os valores educativos que fundamentam a sua prática proflssional,
a concepção que tem sobre o que "é um bom aluno"
e as crenças que
desenvolve face à aprendizagem de todos e cada um dos alunos.
No que diz respeito aos factores psicológicos
que podem influenciar a
observação e a avaliação da criança, são de referir:
a) Efeito de Halo — manifesta-se na tendência para ser influenciado pela
impressão geral acerca de um indivíduo, situação ou actividade. Este
efeito é particularmente relevante face determinadas problemáticas de
alunos com necessidades especiais, podendo conduzir a processos
avaliativos à partida pouco válidos;
b) Efeito de Rosenthal ou Pigmaleão — efeito evidente quando perante
informações prévias que são fornecidas ao professor, este desenvolve
expectativas sobre a criança, podendo estas influenciar a forma como
a avalia, ou seja, as áreas de avaliação que privilegia, os referentes que
define como aceitáveis, levando a . uma avaliação restrita e não
abrangente do desempenho da\criança;
c) Efeito de Hawthorne — o facto das crianças se sentirem objecto de
av aliação/observação pode influenciar os resultados positivos ou
negativos obtidos, o que vem acentuar a importância da avaliação ser
72
perspectivada como um processo contínuo de intervenção, anterior-
mente assinalada.

Para o desenvolvimento de processos de avaliação centrados no aluno é


necessário que, à partida, o educador decida e defina: o que pretende avaliar,
que instrumentos vai usar no sentido de obter a informação pretendida e quais
vão ser os referentes (termos de comparação) que vai usar para fundamentar
os juízos de valor que formulará sobre o nível de desenvolvimento e de
aprendizagem, ou seja, para legitimar os resultados obtidos. Nessa medida, o
educador deverá planificar o processo de avaliação, definindo quais as áreas
curriculares que pretende avaliar, identificando nestas os itens' que serão objecto Sobre a d finição, cons-
trução e util zação de dife-
de observação. rentes tipos de itens, con-
sultar Vala ares e Graça
Em função desta primeira decisão, resulta necessário construir e seleccionar (1988). diando para
melhorar a prendizagem.
os instrumentos de avaliação tendo em conta o currículo desenvolvido na Lisboa: PL tano Edições
sala de aula, bem como as características dos alunos. Isto significa que o Técnicas.

educador deverá conceber e usar instrumentos que lhe permitam a observação


dos alunos, o registo dos seus comportamentos, a avaliação das suas
competências.

A avaliação com vista à identificação das necessidades educativas deve recorrer


a vários tipos de instrumentos, de forma a ser possível uma ampla recolha de
informação sobre os desempenhos, comportamentos e competências do aluno
nos diversos contextos de ensino aprendizagem em que está inserido.

A escolha dos instrumentos de avaliação está directamente relacionada com o


tipo de avaliação formal ou informal que se pretende realizar. Assim, a avaliação
informal permite avaliar interacções, hábitos e comportamentos e baseia-se
fundamentalmente na observação do aluno, não tendo este a noção de que
está a ser avaliado. Por sua vez, a avaliação formal permite ao professor avaliar
o processo e o produto final, sabendo o aluno que está a ser avaliado, uma vez
que os momentos e os instrumentos de avaliação são previamente estabelecidos.

Entendemos pertinente o desenvolvimento de processos que combinem os


dois tipos de avaliação antes referidos, sendo, para tanto, necessária a concepção
por parte do professor de instrumentos facilitadores da observação e verificação
dos desempenhos, dos comportamentos e das aprendizagens dos alunos.

A utilização destes instrumentos na avaliação revela-se pertinente em termos


educativos, urna vez que, são construídos em função de um determinado grupo
e/ou aluno, fornecem informação sobre o processo de ensino/aprendizagem,
os resultados que se obtém são expressos em termos educacionais e, assirn
sendo, facilitam a adequação do currículo às características dos alunos.

Relativamente aos vários tipos de instrumentos que o professor pode conceber


de forma a desenvolver o processo de identificação de alunos com necessidades

73
educativas especiais, são de referir, entre outros: as listas de verificação, as escalas
de graduação, os questionários, as entrevistas, os testes de referência a critérios,
os testes de referência à norma e as grelhas de análise dos produtos do aluno.

Quando o educador decide observar o aluno com vista à recolha de informação


facilitadora da avaliação, deve definir com rigor o que pretende observar,
quando e onde vai realizar tal observação e que processos de registo vai usar,
ou seja, que instrumentos são imprescindíveis nessa avaliação. Com efeito, a
observação constitui uma estratégia facilitadora da avaliação do
de senvolvimento ou do desempenho do aluno face às diversas actividades
escolares.

A observação directa dos comportamentos do aluno deve ser realizada em


diferentes situações de ensi no/aprendizagem e em períodos de tempo
diversificados. Para tal, as listas de verificação de comportamentos
constituem instrumentos facilitadores da recolha sistemática ou ocasional de
informação sobre o aluno, relativamente à presença ou ausência de
co mportamentos específicos ou de resultados da aprendizagem.

As vantagens decorrentes da utilização de listas de verificação na avaliação


prendem-se com o facto de permifirem ao educador avaliar quer o processo de
aprendizagem (uso ocasional) quer o produto (uso sistemático), objectivar a
observação, acompanhar regularmente a aprendizagem, possibilitando ainda
ao próprio aluno a verificação dos seus progressos (Valadares e Graça,1998).

Para a construção destas listas de verificação é necessário listar comportamentos


ou características importantes relacionados com a área a avaliar (avaliação do
produto), incluindo aqueles que são mais habituais (avaliação do processo),
embora possam ser considerados incorrectos. A listagem de comportamentos
não deve ser demasiado extensa e cada um dos itens deve focar apenas um
co mportamento ou característica (Valadares e Graça, 1998).

S
eguidarnente apresentam-se três exemplos de listas de verificação elaboradas
a fim de avaliar: o co
mportamento global da criança, alguns comportamentos
emergentes de leitura e competências na área da matemática.
COMPORTAMENTO GLOBAL*
(Educação Pré-Escolar)

Nome: Data: / /

Observador:
Instruções: Assinale na respectiva coluna os comportamentos da criança.

COMPORTAMENTOS SIM NÃO

Sorri durante a leitura de uma história


Faz comentários positivos acerca da leitura.Como por exemplo: Eu gosto de
ler ou Gostei da história.
Quando tem que fazer uma tarefa realiza-a em tempo razoável
Mostra a outro colega a maneira como se faz qualquer coisa
Completa uma tarefa sem pedir ajuda ao educador ou a outros colegas
Os colegas escolhem-na como líder numa actividade
Cumpre uma tarefa da sua responsabilidade sem ser preciso lembrar-lhe
Fala com satisfação sobre as actividades realizadas no recrelo

'Adaptado de Cartwright e Cartwright, 1984.

LISTA DE VERIFICAÇÃO — COMPORTAMENTOS EMERGENTES


DE LEITURA
(Educação Pré-Escolar)

Nome: Data: / /

Observador:
Instruções: Assinale na respectiva coluna os comportamentos do aluno.

COMPORTAMENTOS SIM NÃO

Ouve histórias curtas sem interromper


Pega correctamente no livro
Sabe virar as folhas
Observa as figuras de um livro do princípio ao fim
Olha para as palavras escritas da esquerda para a direita
Pede ao educador/professor que lhe leia um livro
Completa uma história inacabada
Diz a ideia principal de uma história que ouviu
Repete rimas ou lenga-lengas que ouviu muitas vezes
Dita ao educador/prolessor 3 ou 4 frases de uma história que inventou
Ilustra adequadamente as suas histórias

'Adaptado de Cartwright c Cartwright, 1984.

75
LISTA DE VERIFICAÇÃO DE MATEMÁTICA
(I" ciclo)

Nome:
Data: / /
Observador:
Instruções: Assinale na respectiva coluna os
c omportamentos do aluno.

COMPORTAMENTOS
SIM 1 NÃO

Compara objectos e mostra o maior e o menor


Ordena objectos por ordem crescente
Conta até 10 sem errar

Aponta um conjunto vazio

Faz agrupamentos de objectos de 1 a 5


Faz c orrespondência de objectos 1 a 1

Identifica formas geométricas: círculo, quadrado, rectângulo e triângulo


Reconhece euros e cêntimos
Conta de 2 em 2 até 50

Conta para trás a partir do I O

* Adaptado de Cartwright e Cartwright, 1984.

Para além da verificação da presença ou ausência de co


muitas situações de ensi mportamentos, em
no-aprendizagem é necessário avaliar a frequência
em que se manifestam determinadas ca
racterísticas ou comportamentos do
aluno, usando-se, para tal, escalas de graduação.

Estas permitem ao educador avaliar características importantes que os alunos


devem manifestar durante a realização das tarefas escolares (em situação
individual ou de grupo) e nos seus produtos.

Para construir uma escala de graduação, é necessário listar características ou


co
mportamentos considerados importantes na área a avaliar, incluindo aqueles
que são considerados mais vulgares, embora inadequados, e definir uma escala
" Sobre a construção de di-
de graduação para avaliar cada aspecto ( Valadares e Graça, 1998).
ferentes tipos de esealas,
consultar Valadares,J. e Gra- Há diferentes tipos de escalas de graduação: numéricas, deseritivas ou nominais
ça, M. (1988). Avoliondo e nurnérie
para melhorar o-deseritivas. Compete ao educador decidir qual o tipo de escala
mai.s adequada às ea
Lisboa: Plátano Edi- racterísticas que pretende avaliar, sendo sempre conve-
Oes Táenicas,
niente definir os pontos extremos e o ponto médio da escala".
76
As vantagens da utilização de escalas de graduação prendem-se com o facto
de permitirem avaliar competências menos objectivas (como por exemplo
objectívos da área afectiva), facilitarem a formulação mais objectiva de juízos
de valor e, por último, proporcionarem a observação contínua dos progressos
dos alunos.

A seguinte escala de graduação descritiva permite ao educador avaliar o


comportamento do aluno durante a realização de um trabalho de grupo.

ESCALA DE GRADUAÇÃO

TRABALHO DE GRUPO

Nome: Data: / /

Observador:
Descrição da actividade:

O aluno gosta de trabalhar em grupo. NUNCA C/FREQUÊNCIA SEMPRE N/O


1.

2. Mostra interesse nas actividades a NUNCA C/FREQUÊNCIA SEMPRE N/O


realizar

3. Participa na planificação e distri- C/FREQUÊNCIA SEMPRE N/O


NUNCA
buição de tarefas

4. Incentiva os colegas a participarem SEMPRE N/O


NUNCA C/FREQUÊNCIA
no trabalho de grupo

5. Tem comportamentos que perturbam C/FREQUÊNCIA SEMPRE N/O


NUNCA
o bom funcionamento do grupo

6. Contribui com ideias durante o N/O


NUNCA C/FREQUÊNCIA SEMPRE
trabalho de grupo

7. Pesquisa e fornece materiais para o C/FREQUÊNCIA SEMPRE N/0


NUNCA
trabalho de grupo

NUNCA C/FREQUÊNCIA SEMPRE NIO


5. Auto-avalia o seu desempenho

9. Aceita as avaliações dos colegas NUNCA C/FREQUÊNCIA SEMPRE N/O


(críticas ou sugestões)

'Adaptado de Cartwright e Cartwright, 1984.

Por sua vez, quando se pretende avaliar as preferências dos alunos face às
diversas actividades realizadas na sala de aula, poder-se-á aplicar de forma
sistemática uma escala de avaliação descritiva semelhante à da página seguinte.

77
ESCALA DE AUTO-AVALIAÇÃO

Nome:
Data: / /
Indicações: Regista cada tarefa feita e assinala com uma cruz se gostaste
muito, pouco, ou se não gostaste de a fazer.


Não gostei Gostei pouco Gostei muito

Com esta escala é possível implicar o aluno no processo de avaliação, facilitando


a posterior reflexão sobre as razões que podem justificar as suas preferências,
ed
esenvolver estratégias que motivem o aluno para actividades consideradas
i mportantes no seu percurso educatívo.

Por sua vez, as entrevistas e os qu


estionários,constituindo formas de obser-
vação indirecta
utilizam-se quando o educador pretende avaliar atitudes,
percepções, s
entimentos, expectativas e crenças dos alunos.
Este tipo de i
nstrumentos permite obter informação personalizada sobre as
opiniões dos alunos r
elativamente a aspectos que o educador entende pertinente
conhecer, para uma melhor c ompreensão das suas
ca racterísiticas e compor-
tamentos.

A realização de entrevistas
implica que o educador previamente defina com
clareza qual a i
nformação que pretende obter e que escolha a forma de abordad
questionar o aluno, uma vez que o tipo de linguagem usado, a sequência das
questões e o seu co
mportatnento não verbal são factores cruciais para a obtenção
de i nformação fiável.

Hab
itualmente as entrevistas são realizadas a um número restrito de alunos,
em situação individual ou de pequeno grupo, podendo ser directivas ou semi-
directivas, c onsoante o tipo de
i nformação que se pretende obter. Embora as

78
entrevistas possam ser efectuadas na sala de aula, permitindo assim uma
avaliação contextualizada das opiniões dos alunos, a sua utilização por parte
dos professores é ainda escassa dadas as exigências inerentes à sua utilização
(em termos de concepção das questões e, posteriormente, relativamente ao
tratamento da informação recolhida, o qual exige processos de análise de
conteúdo e de síntese).

Já a utilização de questionários permite a recolha de informações de todos os


alunos da turma ao mesmo tempo, proporcionando respostas escritas a questões
que o professor entende necessário conhecer melhor (opiniões sobre áreas
curriculares onde experimentam mais diticuldades, razões a que atribuem essas
dificuldades, estratégias usadas para a sua superação, etc).

Com efeito, este tipo de instrumento é particularmente útil na avaliação diagnós-


tica já que permite a recolha rápida de informações quer sobre dados pessoais,
quer sobre opiniões, atitudes, motivações e expectativas dos alunos face à
aprendizagem.

Para a sua elaboração é necessário ter em conta as seguintes etapas:

definir os objectivos (o que se pretende conhecer);

definir os temas das diferentes questões;

- identificar a população e seleccionar a amostra;

- elaborar e posteriormente testar as questões;

- elaborar as instruções de aplicação;

- redigir a versão definitiva e seguidamente aplicar o questionário.

No entanto, estes instrumentos são escassamente utilizados pelos professores,


uma vez que a sua concepção é morosa, sobretudo no que diz respeito à elabo-
ração e testagem dos itens.

Uma das limitações decorrente da utilização de questionários prende-se, como


é sabido, com a dificuldade de controlar a autenticidade das respostas, podendo
estas corresponder não a opiniões autenticas dos alunos, mas àquelas que julgam
ser as expectativas do professor. Por sua vez, quando os questionários implicam
apenas respostas fechadas a informação que se obtém pode ser superficial,
não permitindo assim uma compreensão aprofundada das opiniões dos alunos.
Estas limitações podem, no entanto, contornar-se integrando no questionário
algumas questões abertas ou, então, utilizando posteriormente outros instrumen-
tos (por exemplo, entrevistas) que permitam a compreensão das respostas obtidas.

71)
Os questionários que seguidamente se apresentam pretendem avaliar as
opiniões que o aluno tem sobre a importância da aprendizagem da leitura e da
escrita e as razões que entende contribuírem para a realização com sucesso ou
insucesso das tarefas escolares que realiza.

QUESTIONÁRIO

Nome:
Data:
Indicações:
Assinala com uma cruz (X) se concordas ou discordas com as
seguintes afirmações

Concordo 1 Discordo
1. O que gosto mais de fazer é jogar à bola e ver televisão.
2. É importante saber ler e escrever para saber as notícias das
revistas e dos jornais.
3. Gosto de todos os meus colegas da escola.
4. No recreio gosto de jogar à bola com os meus amigos.
5. Ler não me serve para nada, só me aborrece.
6. Gosto mais de escrever no computador porque sei quando a
palavra está mal escrita.
7. Gosto de ir ao cínerna com os meus amigos.
8. Quando não consigo ler fico irritado e desisto.
9. Os livros da escola não são giros.
10. Escrever um texto é muito diffcil.

o
QUESTIONÁRIO DE AUTO-AVALIAÇÃO

Nome: Data:
Tarefa realizada:

Indicações: Acabaste de realizar uma tarefa! Agora vais assinalar com uma
cruz (X) as afirmações que achas que são verdadeiras (V) ou
falsas (F).

O trabalho que fiz está bem porque... V F

I. Estive com muita atenção à explicação do professor.

2. O trabalho era fácil.

3. Estou em dia de sorte e saí-me bem.

4. Tentei várias vezes até conseguir fazer o meu melhor.

O trabalho que fiz está mal porque... V F

I. Era muito difícil.

2. Nunca sou capaz de fazer estes trabalhos.

3. Não me esforcei o suficiente para fazer bem.

4. Hoje estou com azar e tudo o que faço corre mal.

A aplicação deste tipo de instrumentos em diferentes momentos permite ao


professor avaliar as opiniões do aluno e assim identificar algumas das razões
que podem estar associadas aos seus comportamentos e desempenhos escolares.
Esta compreensão facilitará a adequação de estratégias e de materiais de ensino
às características do aluno.

Por sua vez, para a avaliação do aluno é necessário que o professor construa e
utilize testes de referência a critérios e testes de referência à norma. Estes dois
tipos de testes permitem avaliar em que medida os objectivos de determinada
área curricular foram atingidos, no entanto a sua utilização permite ao professor
interpretar os resultados obtidos pelos alunos de forma diferente.

Com efeito, quando utiliza testes de referência a critérios, o professor define


previamente os critérios de desempenho aceitávéis, ou critérios mínimos de
exigência face aos quais compara a performance de cada aluno.

81
A título de exemplo, um professor pretende avaliar se os alunos são capazes
de identificar o grupo nominal e o grupo verbal em diferentes frases. Para tal,
constrót um conjunto de vinte frases e solicita aos alunos que sublinhem os
respectivos grupos com diferentes cores. Define como critério de desempenho
aceitável o facto dos alunos acertarem 18 das 20 frases apresentadas. Quando
analisa os resultados e perante os alunos que não atingiram esse nível de
realização, o professor deverá procurar compreender as razões que justificam
tal situação e implementar estratégias e actividades no sentido desses alunos
adquirirem a competência pretendida.

Assim sendo, resulta claro que os testes de referência a crítérios permitem


verificar a consecução de cada aluno perante objectivos de determinada área
curricular, o que significa que o professor formula juízos de valor sobre a
forma como cada aluno aprendeu determinado conteúdo e em que grau adquiriu
dada competência.
Já os testes de referência à norma
permitem ao professor discriminar e
comparar os alunos entre si relativamente ao nível de realização global do
grupo (a norma é, neste caso, constituída pelo conjunto de notas obtidas pelos
alunos de dada turma).

julgamos que na identificação das eventuais necessidades educativas será funda-


mental a utilização dos dois tipos de teste (de referência a critérios e de referência
à norma), uma vez que permítem por um lado, descrever a performance de dado
aluno perante determinados objectivos e, por outro, compará-lo com os seus pares.

Note-se, no entanto que, a utilização exclusiva de testes de referência à norma


pode conduzir a uma interpretação equívoca dos resultados. Por exemplo, um
aluno médio, numa turma de excelentes alunos, pode ser avaliado, por compa-
ração com os seus pares, de forma mais negativa, o que não aconteceria se
estivesse incluído numa turma constituída por alunos médios ou com um nível
de desempenho inferior ao seu.

Por último, entendemos que a utilização de


do aluno grelhas de registo de produtos
constitui uma estratégia facilitadora cla avaliação de determinadas
áreas c
urriculares, nas quais surgem frequentemente dificuldades. Este
i
nstrumento permite não só verificar as respostas correctas e incorrectas do
aluno perante determinado conteúdo curricular, mas também identificar o tipo
de erros e analisar a sua frequência e persistência.

Nessa medida, o educador deverá recolher um conjunto de trabalhos realizados


(no mínimo referentes a cinco tarefas se
i dentificar de forma precisa as eventuaismelhantes) e analisá-los, no sentido de
d ificuldades do aluno.
Seguidarnente ap
resenta-se uma grelha que poderá faci litar o registo do tipo
de erros na eserita e a posterior análise da sua frequência (nas situações de
cópia, ditado e composição).
GRELHA DE REGISTO-TIPO E FREQUÊNCIA
DE ERROS NA ESCRITA

Nome: Data: / /
,Ano de escolaridade: Idade:

'ripo de erro Cópia Ditado Composição Frequência

Trocas entre grafemas de forma


simétrica (b/d; q/p; u/n).

Trocas entre grafemas de traçado


semelhante (m/n).

Trocas entre fonemas surdos e sonoros


(f/v; tid; p/b).
Inversões de grafemas em sílabas
simples (al/la).

Inversões de grafemas em sfiabas


complexas (par/pra; pal/pla).

Inversões de sílabas (patoll/palito)

Adições de grafemas (andare/andar)

Não segmentação das palavras na frase


(euvouarua/ eu vou à rua)

Desconhecimento das regras de trans-


crição da língua (s, ss, ç, z...)

A análise de produtos do aluno pode permitir a identificação do tipo de erros


mais comuns e a respectiva frequência face às diferentes situações de escrita.
Entendemos que a compreensão por parte do professor do tipo de erros e da
sua frequência poderá fornecer-lhe indicações úteis sobre as dificuldades do
aluno, no sentido de equacionar estratégias de ensino facilitadoras da sua
superação.

Note-se que este instrumento, tal como os que anteriormente se apresentaram,


constitui apenas um exemplo, havendo necessariamente situações que exigirão
a definição de outros itens (tipos de erro) aqui não contemplados.

Todas as técnicas e instrumentos de avaliação que antes apresentamos devem


ser utilizadas de forma complementar e tendo em conta o nível etário e escolar
do aluno, uma vez que só dessa forma será possível garantir uma análise fiável
dos resultados da avaliação.
Após o processo de avaliação do aluno e perante situações nas quais o educador
não se sente capaz de intervir de forma a resolver adequadamente as suas
dificuldades, será necessário realizar um relatório que fundamente a sua
identificação, o qual, como antes referimos, após consentimento dos pais,
justificará uma avaliação pluridisciplinar a efectuar pelos Serviços de Educação
Especial.

Este relatório de avaliação deve começar por referir as áreas curriculares


avaliadas, os instrumentos usados para tal, o tempo em que o processo de
avaliação se desenrolou e os referentes que fundamentaram a análise dos
resultados; seguidamente, deverá descrever o desempenho do aluno nas áreas
curriculares avaliadas, os comportamentos manifestados durante o processo
avaliativo e sintetizar os desempenhos e comportamentos que são percebidos
pelo professor como preocupantes, exigindo, por isso, a intervenção e avaliação
da Educ ação Especial.
Actividades

1. Indique se as afirmações seguintes são verdadeiras ou falsas e justifique


a sua resposta, dando exemplos.

V - F

a) As causas atribuídas aos problemas educativos


centraram-se predominantemente em factores
intrínsecos à criança.

b) Os comportamentalistas entendem que a avaliação


deve incidir nos comportamentos observáveis.

c) A abordagem cognitivo-comportamentalista procura


combinar a utilização de instrumentos formais e
informais de avaliação.

d) Apenas após a análise das causas ou da natureza dos


problemas é legítima e possível a intervenção
educativa.

2. Refira o tipo de problemas da criança/jovem que:

a) normalmente, foi já identificado e avaliado pelos serviços da saúde


quando esta entra na escola;

b) pode justificar a necessidade do educador ou professor do ensino


regular desenvolver processos de identificação e avaliação.

3. Suponba que tem no grupo uma criança que parece revelar problemas a
nível da escrita.

a) Refira os processos que deve desenvolver no sentido da identificação


dos problemas.

b) Construa uma lista de verificação que lhe permita avaliar os compor-


tamentos nessa área.
3. Currículo e Necessidades Educativas Especiais
Objectivos gerais do capítulo

• Enquadrar as perspectivas actuais sobre flexibilidade curricular e


diferenciação pedagógica;

• Dar a conhecer processos de organização e desenvolvimento curricular


adequados às necessidades educativas especiais;

• Promover a reflexão sobre processos e práticas de organização e gestão


do ensino em grupos inclusivos.

Conhecimentos, capacidades e atitudes a desenvolver

No final deste capítulo, o formando deverá ser capaz de:

• Distinguir currículo fechado e currículo aberto;

• Relacionar flexibilidade curricular e diferenciação pedagógica;

• Caracterizar o trabalho cooperativo como estratégia de ensino;

• Identificar processos de organização diferenciada na sala de aula;

• Distinguir diferentes níveis de adaptações curriculares individualizadas;

• Identificar os princípios para a elaboração dos currículos especiais;

• Analisar a sua prática na resposta às diferenças entre os alunos na sala


de aula.

Temas a desenvolver

I. Flexibilidade curricular

2. Processos de diferenciação pedagógica

3. Adaptações curriculares individualizadas

4. Currículos especiais

8()
3. 1 Flexibilidade curricular

"O mesmo aluno, perante duas respostas escolares


diferentes, apresentará um grau de especificidade
diferente nas suas necessidades educativas, uma vez
que, quanto mais segregadora, fechada e Milexível
for a resposta considerada, maior necessidade
teremos de recorrer à atribuição de meios suplemen-
tares e a planos curriculares divergentes do normal."

Manjón, Gil e Garrido, 1997

Para ser devidamente c


ompreendida, a noção de flexibilidade curricular,
recentemente introduzida no sistema educativo português, deve ser enquadrada
num quadro de referências mais amplo, no qual se salienta, em primeiro lugar,
a própria noção de currículo.

Currículo pode ser entendido, numa acepção restrita, como um plano


estruturado de ensin
o/aprendizagem, englobando a proposta de objectivos,
conteúdos e processos para alcançar esses objectivos. Nesta acepção, currículo
é
facilmente confundido com programa e foi esta a definição vigente durante
muito tempo e aquela que ainda hoje caracteriza a perspectiva de muitos
professores.

Pelo contrário, numa acepção ampla, currículo é o conjunto de acções levadas


a efeito pela escola para desenvolver a a
prendizagem dos alunos, englobando,
assim, o conjunto de e
xperiências programadas pela escola (dentro ou fora
dela) e o conjunto de experiências e
fectivamente vivenciadas pelos alunos,
sob orientação da mesma. Nesta acepção prevalecem duas dimensões: aquilo
que se pretende que o aluno atinja (intenções, objectivos) e que se irá exprimir
em resultados efectivos e aquilo que o aluno experiência no percurso que faz
para chegar aos resultados pretendidos (interacções, processos, actividades).

Durante muito tempo, o modelo curricular tradicional que prevaleceu em


Portugal pressupunha a acepção restrita, c
onfundindo-se com programa. Para
tal contribuiu também a tradicional c
entralização do sistema educativo
portuguê s(característica de quase todos
os países de influência latina até há
bem poucas décadas), a qual implicava a existência de um programa oficial
n acional, organizalo em ciclos
e anos de escolaridade e obrigatório para todos
os alunos que a fr
equentassem. Concebido a nível central, de forma detalhada
e rígida, por técnicos da educação, o programa era depois aplicado pelos
professores, indep
endentemente dos contextos reais em que as suas praticas
se desenvolvessem.
Este tipo de concepção e organização correspondia a um currículo fechado,
urna vez que a margem de autonomia do professor era mínima e dizia respeito
apenas à forma de concretização das actividades de aprendizagem; estas, por
sua vez, pautavam-se, em grande parte dos casos, pelos manuais, pelo que
nem essa margem de autonomia era realmente assumida pelos professores,
nas salas de aula.

Pensado para um público relativamente homogéneo, este tipo de currículo foi


progressivamente mostrando a sua ineficácia a nível dos resultados e a nível
dos processos. De facto, a heterogeneidade da sociedade actual começou a
fazer-se sentir cada vez mais dentro dos estabelecimentos escolares,
nomeadamente quando se deu o alargamento da escolaridade obrigatória, quer
a nível vertical (do 4° para o 6° ano e posteriormente para o 9°), quer a nível
horizontal (obrigatoriedade de frequência efectiva de todos os alunos em idade
escolar, sem excepção, como vimos no primeiro capítulo). Esta população
veio pôr em causa a coerência interna de um currículo do tipo fechado e de
um modelo curricular centrado nos resultados, mostrando um desajuste
acentuado entre os objectivos que se pretendia alcançar e os objectivos
efectivamente alcançados e, em consequência, um elevado número de alunos
com insucesso escolar.

Com efeito, a população que, entretanto, começou a encher as escolas básicas


evidenciava características muito diferentes do aluno-padrão que, até aí, a escola
estava habituada a atender. Crianças com experiências familiares, sociais,
culturais muito diferentes entravam para a escola com conhecimentos, valores
e atitudes tarnbém diversos (e, por vezes, divergentes), obrigando as instituições
a rever os processos de socialização e ensino que, até aí, tinham desenvolvido.
Percebeu-se, nessa altura, que não seria possível resolver o problema do
insucesso escolar pelo recurso à substituição de um processo de ensino por
outro: pelo contrário, se os alunos apresentavam diferenças marcantes, era
necessário encontrar processos de ensino também eles diferenciados, que se
adequassem às necessidades individuais de cada aluno. De forma paradoxal,
a massificação do ensino originada pela escolaridade obrigatória veio
evidenciar a individualidade dos percursos educativos e obrigar a escola a
diferenciar os processos de ensino.

Se foram os professores e as escolas a mostrar que era impossível con tinuar a


ensinar todos os alunos clo mesmo modo, a literatura especializada, por um
lado, e as experiências desenvolvidas noutros países, por outro, vieram
confirmar a necessidade de um tipo de currículo diferente e, progressivamente,
foram sendo tomadas medidas correspondentes a uma abertura do currículo
o ficial.

Por currículo aberto entende-se, então, a aplicação flexível de um programa


nacional, de modo a que este possa ser adequado aos vários contextos a que se

91
aplica: regionais, institucionais, grupais, individuais. Ao contrário de uma certa
imagem difundida na opinião pública, um currículo aberto não implica a
indefinição dos níveis de c
ompetências a atingir no final de cada ciclo de
escolaridade ou a mudança de ciclo sem a aquisição dessas co mpetências. De
facto, pressupõe uma definição e delimitação clara das aprendizagens
pretendidas para cada ciclo e a flexibilização currícular só é possível num
quadro de referências preciso, definido em função das aprendizagens conside-
radas socialmente necessárias.

Um currículo aberto permite organizar de forma flexível a estrutura e sequen-


cialização das a
prendizagens, bem como os processos de ensino a desenvolver
para atingir essas aprendizagens. Em termos teóricos, trata-se de abandonar o
modelo curricular centrado nos resultados e adoptar
modelos curriculares
centrados no processo e na situação, isto é, com características acentuada-
mente contextuais. Assim, a elaboração do currículo configura um conjunto
de decisões tomadas quer a nível central, quer a nível das escolas, as quais
constroem a sua proposta curricular tendo por base o documento orientador
nacional, por umlado, e as características específicas da população que atendem
e do contexto em que se inserem, por outro (Pacheco, 1966).

Para tal, é necessário que as escolas tenham, pelo menos, algum grau de
autonomia. A importância das escolas, enquanto organizações mediadoras entre
aa
dministração central e a sala de aula, só recentemente foi reconhecida, quer
pelas próprias Ciências da Educação, que passaram a c
onsiderá-las como
objecto de estudo em si mesmo, quer pelo sistema educativo, através de textos
legislativos e de algumas medidas nesse sentido. Em grande parte, o reforço
da autonomia das escolas, c
orrespondendo a uma tendência para a descentração
dos sistemas educativos tradicionalmente ce
ntralizadores, constituiu uma
resposta à constatação da falência das grandes reformas, elaboradas a nível da
administração central para serem depois aplicadas a nível local, nos estabele-
cimentos de ensino. De facto, a c
omplexidade das situações que a população
escolar a
ctualmente apresenta veio demonstrar a necessidade de respostas
i novadoras e singulares, pensadas
es pecíficamente para determinada comu-
nidade e não generalizáveis a outros contextos.
O est
abelecimento de ensino, encarado agora como organização social com
c aracterísticas próprias e originais, adquiriu, assim, um novo papel:

- na definição de uma política educativa própria (elaborando e imple-


mentando os seus próprios projectos educativos);
- na decisão e gestão curriculares (desenvolvendo propostas eurriculares
de acordo com as n
ecessidades e problemas específicos (le eada
r
ealidade escolar, tendo como referência a proposta curricular nacional).
99
Assim, enquanto o currículo nacional define as opções e prioridades
curriculares, as competências que é necessário que todos os alunos atinjam à
saída do sistema de escolaridade e o corpo de aprendizagens referente a essas
competências, o projecto curricular de escola define os aspectos curriculares
em que esta deve investir, de acordo com as características da população que
atende, organizando as competências e conhecimentos a adquirir por todos os
alunos desse estabelecimento, o que pressupõe a identificação de áreas
disciplinares e de espaços de interacção entre elas. Será a escola, ainda, a
identificar as metodologias de ensino que privilegia e a organização das
actividades que propõe, tendo em conta os princípios organizadores que
constam no currículo nacional. Também ao nível da avaliação, é a escola que
deve definir o tipo de instrumentos a usar para a avaliação contínua dos alunos,
bem como os processos e instrumentos de avaliação interna da própria
escola.

O projecto curricular de escola, por sua vez, terá que ser pensado de forma
ainda mais específica no que respeita a cada turma. Assim, cabe ao professor
(ou grupo de professores consoante o ciclo de ensinc) elaborar um projecto
curricular de turma, definindo as prioridades da sua abordagem aos conteúdos
de ensino, a organização da sequência de actividades e os materiais de apoio
a produzir e operacionalizando os processos de trabalho a utilizar com cada
turma, nomeadamente os critérios de diferenciação a adoptar face aos alunos.

A organização e gestão do currículo a nível local exige, portanto, um conhe-


cimento em profundidade das competências a desenvolver no ciclo que se
lecciona, sem o qual não é possível a reorganização e adequação dos vários
elementos do currículo. Assim, a nível dos objectivos para cada ciclo, é
possível proceder a alterações na estrutura e sequencialidade dos mesmos sem,
no entanto, eliminar nenhuma das competências básicas a desenvolver nos
alunos. Essa reorganização dos objectivos levará, necessáriamente, a uma
selecção e/ou priorização dos conteúdos mais adequados para os atingir.

Em relação às estratégias e sequências de actividades, estas inserem-se, em


última instância numa metodologia de base definida pelo próprio estabele-
cimento de ensino como o conjunto de opções pedagógicas tomadas pelo
colectivo, tendo, obviamente, que ser congruente com os objectivos e conteúdos
a desenvolver. Mas para além das opções da escola, é ao professor, na sala de
aula, que cabe definir os processos pedagógicos e os recursos educativos mais
adequados quer aos objectivos e conteúdos a desenvolver, quer às necessidades
dos alunos, aspectos que abordaremos mais detalhadamente nos pontos
seguintes.

Quanto à avaliação, é importante incorporá-la em todo o trabalho lectivo desdc


o seu início, como elemento regulador do processo, de modo a que não tenha
apenas funções de veriticação de resultados finais, mas também de reorientação

93
dos processos pedagógicos. É a informação fornecida pela avaliação que
permite graduar o ensino, ajustando-o a ritmos e estilos de aprendizagem
diferentes e a necessidades individuaís. Se as mesmas competências básicas
têm que ser adquiridas por todos os alunos, no final de cada ciclo, tal não
implica, forçosamente, que os percursos para aí chegar sejam os mesmos e,
portanto, que a avaliação contínua se processe da mesma forma e com os
mesmos parâmetros. Como afirma Casanova (1999), a atenção à diversidade
implica deixa.r de pensar a avaliação como elemento uniformizador dos alunos,
pondo em prática modelos de avaliação descritivos que forneçam a todos os
implicados no processo educativo — os alunos, os pais, os próprios professores
— informações relevantes não apenas em relação às aprendizagens realizadas,
mas também às formas de prosseguir para alcançar os objectivos pretendidos.

Podemos dizer, assim, que, para além de um novo protagonismo do estabele-


cimento de ensino, o currículo aberto e flexível pressupõe ainda um novo
papel para o professor, a quem não cabe apenas aplicar as orientações do
currículo nacional, mas adequá-las aos alunos, de modo a garantir que as
a
prendizagens sejam realizadas por todos, ainda que por processos e de modos
diferentes. Neste sentido, o professor é, também ele, um agente curricular, e
não apenas o executor das decisões centralmente definidas e, na medida em
que organiza o processo de ensi
no/aprendizagem em função da realidade
prática, torna-se um mediador entre o currículo nacional e os alunos.

Ao professor é assim exigido um maior envolvimento e res


ponsabilização em
todo o processo de organização e gestão curriculares. Um dos requisitos
essenciais para a elaboração (ou co
-elaboração) dos projectos de turma e
respectiva im plementação é que o professor tenha uma visão longitudinal
das competências a adquirir pelos alunos nos vários ciclos de escolaridade,
ao invés do co
nhecimento restrito da matéria a ensinar em determinado ano ou
períodolectívo.

Por exemplo, um professor que leccione o 1. 0


ano de escolaridade e não tenha
uma perspectiva longitudinal sobre as co
mpetências a adquirir e desenvolver
na escolaridade básica, corre o risco de encarar a aprendizagem do mecanismo
de d
escodificação do material impresso como um fim em si mesmo e não
como um meio para extrair informação do texto escrito. Ora ler é, essencial-
mente, um processo de extracção de significado e a fase de a
leitura deve ser e prendizagem da
quacionada em relação à utilização desta como forma de
adqu irir novas a
prendizagens: aprende-se primeiro a ler para depois poder ler
para aprender. Se esta finalidade não for tida em conta, a a
prendizagem da
leitura torna-se um fim em si mesmo, sem significado para o aluno e de difícil
utilização posterior, dando origem a muitos dos casos de iliteracia que
ac tualmente existem.
Por outras palavras, seja qual for o nível de ensino que um professor lecciona,
há que ter em conta a finalidade última das aprendizagens que orienta, sob o
risco destas perderem o sentido. Esta visão a longo prazo cio ensino, a que
Zabalza (1994:11) chama "uma mentalidade curricular" é essencial para a
adequação da proposta curricular nacional ao contexto de uma escola ou turma.
Para tal, o professor tem que conhecer, no mínimo, os objectivos de cada ciclo
e o perfil de saída da escolaridade básica, de modo a inserir a sua actividade
num continuum curricular.

Em síntese, a flexibilidade curricular surge como a principal característica


de um currículo aberto, permitindo a reorganização cia estrutura e
sequencialização das aprendizagens e a definição dos processos de ensino/
aprendizagem e de avaliação contínua de acordo com as características e
necessidades das situações concretas, sem deixar de ter em conta um referencial
nacional, centralmente definido.

Não é demais, no entanto, salientar que a flexibilidade do currículo não implica


uma limitação do nível das aprendizagens a realizar e que, pelo contrário, tem
como finalidade última garantir que as competências de saída de cada ciclo de
escolaridade sejam alcançadas por todos os alunos, ainda que os percursos
sejam diferentes. Como afirma Wang (1997:54),

"(...) ao tentar-se conseguir a igualdade de oportunidades educativas


para assegurar um igual acesso ao currículo normal, a desigualdade
é perpetuada de uma forma bem mais subtil. As escolas não conseguem
responder à equidade simplesmente através de programas especiais
para os alunos. A pratica de compensar as diferenças na aprendizagem
através de uma facilitação do sucesso escolar para grupos
seleccionados de alunos, introduzindo-se padrões diferenciados, não
pode ser aceite como um indicador de equidade educativa."

De facto, qualquer que seja o grau dos ajustamentos curriculares a realizar


dentro de uma escola ou uma turma, estes serão sempre um meio para atingir
os objectivos educativos comuns para determinado ciclo de ensino e nunca
um fim em si mesmo. Tomar a flexibilidade curricular como uma finalidade
do sistema significaria, na realidade, excluir do sistema educativo — e, nesse
sentido, do prosseguimento de estudos e/ou da formação pro fissional — todo
um conjunto de alunos a quem não seria exigida a aquisição das competências
básicas. Esta ressalva é particularmente relevante no contexto português, em
que o conceito nem sempre tem sido bem explicado ou bem aplicado, quer ao
nível da opinião pública em geral quer, o que é mais grave, ao nível das próprias
práticas pedagógicas.

Neste sentido, a flexibilidade curricular não implica, necessariamente, um


nivelamento por baixo da qualidade do ensino, o qual não asseguraria o direito

95
efectivo de todos à escolaridade, acentuando, pelo contrário, as diferenças
pré-existentes e conduzindo, em última instância, a processos futuros de
exclusão social. Há, evidentemente, algumas crianças e jovens que, devido a
p
roblemáticas de vária ordem, não podem seguir o currículo comum. Neste
caso, porém, não se aplica o conceito de fiexibilidade curricular, mas de
curriculo especial, que definiremos mais adiante. Gostaríamos de salientar, no
entanto, que o currículo especial é uma excepção, mesmo para os alunos que
apresentam necessidades educativas especiais.

3.2 Processos de diferenciação pedagógica

A noção de flexibilidade curricular, atrás desenvolvida, está estreitamente ligada


ao conceito de diferenciação pedagógica. De
facto, a fiexibilização do
currículo permite, como vimos, que as escolas definam as suas próprias
prioridades e opções face à população que atendem e que os professores
organizem as a
prendizagens de acordo com as necessidades dos alunos de
cada turma — isto é, que as escolas se diferenciem umas das outras e que, para
cada turma, se tracem caminhos próprios. A diferenciação implica, portanto, a
procura de percursos curriculares diversos para situações que, à partida, são
diferentes, de modo a garantir que o nível de saída seja o mesmo.

A diferenciação não se aplica apenas às escolas e às turmas, mas também a


cada um dos alunos. Para tal, é necessário que se reconheça e aceite a
diversidade
existente entre os alunos a nível sócio-cultural, a nível de estilos
de a
prendizagem, a nível de tipo de inteligência e, portanto, a nível de processos
de resolução de problemas e de realização das tarefas.

O conceito de diversidade envolve uma vasta gama de situações em relação às


quais é necessário definir tipos e graus de d
distinguir: iferenciação. Assim, podemos

- a diversidade decorrente da het


erogeneidade de qualquer grupo e que
corresponde, afinal, a diferentes interesses, capacidades, pré-
-disposições;
- a diversidade que a
própria frequência escolar vai criando, pela
acumulação de diferenças nos ritmos de aprendizagem e nos resultados
dos alunos;
- a diversidade decorrente de pr
oblemáticas específicas dos alunos e
que dão origem a necessidades educativas especiais.
O reco nhecimento da diversidade tem como
c onsequência óbvia a constatação
de
que não é razoável exigir que todos os alunos aprendam da mesma maneira
96
e, portanto, não é aconselhável utilizar um processo único de ensino ou recorrer
sempre ao mesmo tipo de actividades. No entanto, o nível e modo de
diferencíação para dar resposta às situações atrás apresentadas não poderá,
evidentemente, ser o mesmo. Com efeito, entre o primeiro caso apresentado e
o último, percorremos o caminho que vaí da diversificação das estratégias de
ensino e criação de várias situações de aprendizagem ao desenvolvimento de
currículos individuais, com recurso a sistemas específicos de apoio e de
dispositivos de ensino próprios.

A própria consciencialização da diversidade dentro de uma turma pode levar


ao desenvolvimento de atitudes e práticas que, em lugar de favorecerem a
procura das respostas educativas mais adequadas, acentuem as diferenças pré-
existentes, nomeadamente reforçando a tendência para a criação de inúmeras
sub-categorias formadas a partir de características dos alunos ou dos contextos
de que provêm (minorias étnicas, desvantagens sócio-culturais, etc). Levada
ao extremo, a multiplicação de categorias e classificações das diferenças
produzirira uma proliferação das respostas diferenciadas que tornaria impossível
o trabalho de qualquer professor. Como afirma Zabalza (1999:108),

" (...) no final, acabaríamos perdendo o sentido comum do termo e


convertido a normalidade em diversidade, em vez de fazer o contrário:
converter a diversidade em normalidade."

Assim, antes de entrarmos nas respostas específicas que correspondem a


necessidades educativas especíais, será importante definirmos o que pode ser
uma situação de aprendizagem em que, como afirma Zabalza, a diversidade
seja normal.
Para tal, será necessário garantir algumas condições externas à sala de aula,
como o envolvimento de toda a escola num projecto assente na diversidade
dos elementos que a frequentam ou o conhecímento dos sistemas de apoio
com que cada escola pode contar, em termos humanos, materiais e físicos (os
quais não têm forçosamente que ser internos, uma vez que é possível, hoje,
criar parcerias com diversas entidades, rentabilizando recursos da comunidade).
Estes aspectos serão focados no último capítulo.

No que respeita à sala de aula, propriamente dita, a primeira condição para a


criação de situações de aprendizagem diferenciadas é que o professor deixe
de preparar e orientar aulas para o aluno-padrão imaginário e que organize as
estratégias de ensino e as actividades para os alunos que efectivamente é sua
responsabilidade ensinar.
Em segundo lugar, é necessário ter consciência que diferenciar não significa
elaborar 25 projectos curriculares diferentes, nem fornecer aulas individuais a
cada um dos 25 alunos de uma turma. De facto, entre os programas de ensino

97
padrão, aplicáveis a todos os alunos, e a individualização total do processo de
ensino, existe um vasto leque de alternativas intermédias mais eficazes, que
passampela organização do trabalho lectivo, utífização dos recursos disponíveis,
gestão dos tempos e espaços de aprendizagem.

Diferenciar significa, então, desenvolver estratégias de ensino diversificadas e


modelos de organização do trabalho variados, de modo a que cada um dos
alunos possa encontrar pontos de referência significativos e vias de acesso
próprias para a sua aprendizagern.

Em tennos dos modelos da estruturação dos conteúdos e processos de ensino,


a diferenciação pedagógica integra-se num modelo centrado no aluno
(ou
modelo humanista), configurando práticas que se organizam na confluência
dos conhecimentos e competências a adquirir com os interesses e motivações
dos alunos e as suas interacções com o meio. Tomemos como exemplo a
abordagem do "império português no oriente, no séc. XVI", em História. Em
vez de abordar directamente o tema através do manual ou da exposição oral, é
possível começar por explorar o conhecimento do aluno proveniente de Macau,
aprofundar a pesquisa sobre essa região e só depois enquadrar esses conhe-
cimentos no esquema geral da ocupação e comércio.

As práticas que se inserem neste modelo requerem, da parte do professor, um


c
onhecimento profundo dos objectivos para esse ano/ciclo de escolaridade,
de modo a articular e abranger todos os conteúdos, garantindo os resultados a
atingir.

Este tipo de estrutura favorece ainda o desenvolvimento da autonomia e auto-


gestão dos grupos, tendo por base o princípio da actividade como processo prefe-
rencial de aprendizagem. Com
efeito, a diferenciação pedagógica implica a
• eriação de dispositivos de aprendizagem múltiplos, de modo a que o ensino não
fique centralizado e totalmente dependente da intervenção directa do professor.
"O plano de trabalho semanal, a atribuição de tarefas autocorrectivas
e o emprego de softwares interactivos são recursos preciosos.
Organizar o espaço em oficinas ou cantos — entre os quais os alunos
circulam livremente — é uma outra maneira de encarar as diferenças.
Nenluuna delas é, sozinha, uma solução mágica. A
diterenciação exige
métodos c omplementares e, portanto, uma forma de inventividade
didáctica e o
rganizacional baseada num pensamento arquitectónico
e sistémico." (Perrenoud, 2000:58)

Para a criação desses dispositivos é necessário todo um trabalho prévio à


intervenção propriamente díta, mas essa preparação irá permitir que os alunos
possam trabalhar de modo mais autónomo e independente em relação ao
professor, por um lado, e
mais interactívo e cooperante em relação aos seus
pares, por outro.
O trabalho cooperativo é urna estratégia de ensino que favorece a participação
e interacção dos alunos, através da organização de actividades de aprendizagem
em que os alunos trabalham em pequenos grupos com vista à aquisição de
objectivos curriculares partilhados. Os alunos são co-responsáveis pela sua
propria progressão escolar, bem como pelo desempenho do grupo em que
estão inseridos, ao nível da resolução de problemas, aprendizagem de novos
conceitos, criação e realização de projectos e produção de documentos; em
simultâneo, desenvolvem toda uma prática de papeis e funções sociais que
favorece a socialização, a autonomia e a responsabilização.

O trabalho cooperativo na sala de aula existe, sob diversos formatos e com


objectivos vários, há muito tempo: quando o número de alunos/turmaera muito
elevado, por exemplo; ou, pelo contrário, quando o número de alunos/ano era
tão baixo que se tornava necessário juntar num mesmo espaço e tempo alunos
em diversos níveis de escolaridade. Nessas situações, o ensino directo tornava-
se impossível, formando-se então sub-grupos que trabalhavam de forma
autónoma, com a orientação e supervisão do professor.

Os estudos realizados sobre o uso desta estratégia têm mostrado que ela tem
efeitos positiyos quer na aprendizagem dos conteúdos escolares, quer no
desenvolvimento da socialização, nomeadamente pela aceitação das diferenças
pessoais, culturais e étnicas. Vários estudos indicam que este tipo de trabalho
favorece, ainda, uma efectiva mudança de atitude face aos alunos com
necessidades educativas especiais.

O desenvolvimento da cooperação entre os alunos passa pelo conhecimento


de regras necessárias ao bom funcionamento dos grupos e pelo desenvol-
vimento de uma cultura de solidariedade, tolerância e reciprocidade. Obriga,
por outro lado, a uma estruração das actividades de forma a que estas originem
conflitos cognitivos (a partir dos quais a aprendizagem se processa) e que
favoreçam a evolução dos conhecimentos.

No trabalho cooperativo, os grupos são, geralmente, heterogéneos, uma vez


que as diferenças entre os alunos são também factores de aprendizagem. No
entanto, embora a diversidade dos alunos que actualmente frequentam a escola
tenha obri gado a pôr em causa as formas de trabalho pedagógico baseadas no
aluno-padrão, a tendência dos professores para o estabelecimento da
homogeneidade continua a evidenciar-se na formação preferencial de grupos
deste tipo dentro da turma. A tentativa de classificação das diferenças presente
nesta forma de divisão não se integra nos princípios do ensino cooperativo,
que pressupõe, pelo contrário, a criação de grupos preferencialmente
heterogéneos, nos quais os alunos tenham tarefas diferentes para desempenhar
perante um problema a resolver ou urna proposta de trabalho a realizar.

99
Tomemos como exemplo uma turma do 2° ano de escolaridade. Os alunos
foram organizados em grupos heterogéneos de quatro elementos para a
realização do "bilhete de identidade" dos animais (área de Estudo.do Meio).
Este trabalho incluía a selecção dos pontos essenciais a incluh no bilhete
(alimentação, r evestimento do corpo, modo de deslocação, modo de
reprodução, etc) e o seu preenchimento, sendo os animais seleccionados pelo
professor e distribuídos pelos grupos, por sorteio. À disposição dos alunos
foram colocadas e nciclopédias da fauna (infantis), e outros documentos de
natureza vária, alguns deles recolhidos pelos alunos, em casa ou na Internet
existente na escola. Depois do trabalho realizado, cada grupo apresentou o
"bilhete de identidade" dos respectivos animais à turma. O professor foi
registanto os dados fornecidos numa tabela de duas entradas, onde ficou
resumida a informação obtida e a partir da qual foram extraídas conclusões.
Com os bilhetes construídos pelos grupos organizou-se um ficheiro de animais
que ficou para consulta, na turma.

Este exemplo refere-se a uma única actividade, de curta duração, com objectivos
comuns para todos os alunos e um leque restrito de tarefas. No entanto, este
tipo de trabalho pode ser planeado a longo prazo, com objectivos, conteúdos
e actividades diferentes para cada grupo. Por exemplo, um grupo de alunos
do 3. 0
ano foi ver uma peça de teatro. No regresso, depois do debate sobre o
que tinham visto, alguns sugeriram a realização, por eles próprios, de uma
peça. Com o professor, s
eleccionaram uma história e as áreas de trabalho
necessárias à produção e execução do projecto: texto, r
epresentação, música,
cenários, figurinos e adereços. D
istribuíram-se pelos vários grupos a partir
dos seus próprios interesses, tendo o professor sugerido alterações pontuais
para uma mais equilibrada distribuição numérica pelos vários grupos, de acordo
com as exigências das tarefas. O trabalho foi realizado durante um mês, uma
hora por dia, e culminou num espectáculo, antes do qual um elemento de cada
grupo contou o que e como fizeram.

Por outro lado, é necessário também orientar a distribuição de tarefas dentro


do grupo, de modo a que a mesma criança não fique sempre com o mesmo
tipo de tarefas, sobretudo no caso de alunos com necessidades educativas
especiais. Efectivamente, verifica-se por vezes que, dentro do pequeno grupo,
a estas crianças e jovens são distribuídas tarefas que eles conseguem fazer
bem e com facilidade. Este procedimento tem a vantagem de dar auto-confiança
ao aluno com necessidades educativas especiais e de facilitar a sua aceitação
pelos colegas, valorizando o seu desempenho perante ele mesmo e perante os
outros. No entanto, é um procedimento a tempo limitado, urna vez que, a
m anter-se, tem como
co nsequência a não progressão do aluno nas
apr endizagens e a i
funções. O mpossibilidade de outros alunos realizarem também aquelas
potencial cio trabalho em pequeno grupo é exactamente o da
interajuda entre pares, em situações críticas — encontrando as crianças e jovens

10 0
entre eles, por vezes, processos de favorecimento da aprendizagem bem mais
eficazes do que aqueles que os adultos são capazes de planear.

Na orientação de um trabalho do tipo cooperativo, há que:

estabelecer objectivos de forma clara e acessível à idade e desenvol-


vimento dos alunos;

fornecer a informação necessária ou os meios para a obter;

monitorizar os tempos de duração das actividades;

apoiar os trabalhos durante a sua realização;

- fornecer pistas que favoreçam a evolução do trabalho e a aquisição de


novos conhecimentos;

promover a divulgação dos produtos finais ao grupo/turma;

- ajudar os alunos a reflectir sobre o seu próprio processo de trabalho e


as formas de o melhorar.

Nas escolas portuguesas, este tipo de trabalho ainda é visto com desconfiança
pelos professores e, quando previsto, refere-se geralmente a procedimentos a
usar pelos alunos na realização de trabalhos em tempos não lectivos. Por
exemplo, os resultados do Projecto Português 2002, da responsabilidade da
Associação de Professores de Português, mostram que apenas 30% dos
professores utilizam formas de agrupamento dos alunos em actividades de
ensino (neste caso, de leitura). O grupo/turma tende a ser encarado como um
todo e os processos de individualização apenas ocorrem quando há alunos
que demonstraram, anteriormente, não ter qualquer possibilidade de se integrar
nas actividades a desenvolver com o resto da turma — actividades que são
iguais para todos e que cada um deve realizar individualmente.

Não se pretende, com isto, advogar que o trabalho em grupos vai resolver
todos os problemas — de facto, quando mal planeado e gerido, torna-se até
totalmente ineficaz. Por outro lado, nem todos os conteúdos são passíveis de
ser trabalhados desta forma e, dentro dos grupos, há tarefas que devem ser
realizadas individualmente. O trabalho em grupos é uma das estratégias de
ensino e, como dissemos, estas devem ser diversificadas. Focamos aqui as
suas potencialidades, nomeadamente a possibilidade de uma maior actividade
e interactividade por parte dos alunos e o favorecimento da individualização
dos percursos de aprendizagem.

Aqui chegados, parece-nos importante distinguir individualização do ensino


e formas de trabalho individuais. Quando o professor propõe actividades para

01
todo o grupo, cada um realiza esse trabalho de forma individual mas sem
qualquer processo de individualização, na medida em que não há uma aferição
às necessidades educativas de cada aluno. A individualização ocorre quando
a cada aluno são pedidas actividades ou tarefas próprias — ou a partir da
distribuição de tarefas dentro dos pequenos grupos (com base nas etapas
necessárias para atingir os objectivos e realizar o produto final); ou pela
motivação do aluno para a realização de determinado trabalho; ou ainda pela
orientação do professor a partir de dados de observação e avaliação anteriores.
Individualizar o ensino é, assim, menos discriminativo e mais eficaz numa
estrutura de trabalho em pequenos grupos (em que todos têm tarefas diferentes)
do que no modelo de ensino orientado para a classe como um todo, onde um
ou dois alunos com mais dificuldades têm um trabalho diferente dos restantes.
Esta última situação cria problemas adicionais aos alunos que já têm
dificuldades de aprendizagem (problemas de relação interpares, de auto-
confiança, etc.), para além de criar problemas ao professor que se encontra
permanentemente no dilema de ter que decidir a quem dar atenção: se ao
grupo/turma, se aos alunos com um trabalho diferente.

A título de exemplo, tenha-se em atenção o relato de uma professora, a quem


foi pedido que referisse incidentes ocorridos na sua sala de aula. Conta ela
que, em certo momento, trabalhava directamente com um aluno com dificul-
dades numa matéria já abordada, enquanto o resto da turma realizava uma
ficha de trabalho. Dois ou três alunos começaram a chamá-la, porque tinham
dificuldades em realizar a ficha. A professora mandou-os esperar, uma vez
que estava a dar atenção àquele aluno e eles, sem nada para fazer, começaram
a conversar entre si, e ntusiasmando-se depois com a conversa e elevando cada
vez mais o tom de voz, até perturbarem o trabalho do resto da turma. Então a
professora pediu a outro aluno (que já acabara) que ajudasse os colegas, frisando
que não devia realizar o exercício por eles. Este aluno foi para junto dos colegas
e começou a explicar-lhes como haviam de procurar a resposta à pergunta no
próprio texto da ficha e o clima de trabalho restabeleceu-se.

Um trabalho diferenciado na sala de aula comporta, ev identemente, riscos e,


nesse sentido, requer do professor capacidades de organização e gestão que
não se compadecem com improvisos de última hora. A diferenciação peda-
gógica na sala de aula requer, no mínimo:
- organização dos espaços da sala de aula e/ou da escola, em oficinas,
clubes ou "cantos", de modo a que os alunos possam realizar tarefas
diferentes num mesmo espaço e tempo;
- organização dos objectivos específicos e conteúdos a abordar, realizada
em conjunto com os alunos e planeada em linguagem que lhes seja
acessível, de modo a que estes possam antecipar as matérias a abordar
e verificar aquelas que já foram trabalhadas;
10)
organização das actividades a realizar em grande grupo, em pequenos
grupos e individualmente, não descurando qualquer destas dimensões
e não fazendo prevalecer umas sobre as outras;

selecção ou elaboração de recursos didácticos adequados às aprendi-


zagens pretendidas e passíveis de serem usados de forma autónoma
pelos alunos, os quais vão desde os mais simples materiais para cons-
trução de algo pelos alunos, até ao "software" educativo relativo a
determinado tema;

criação de instrumentos de auto-regulação e auto-verificação das


actividades realizadas e das aprendizagens alcançadas, sem os quais o
aluno continua dependente do professor para saber o que vai fazer a
seguir, em que ponto do processo se encontra e o que lhe falta fazer.

Mas, para além do processo prévio de organização, acessível à maior parte


dos professores desde que a isso se disponham, a maior dificuldade reside na
gestão do processo, mantendo, em simultâneo:

a perspectiva geral dos objectivos a alcançar a longo prazo e a


perspectiva específica das tarefas a realizar quotidianamente

uma visão global do percurso realizado pela turma, uma visão parcelar
do funcionamento dos grupos e a ainda a correcta compreensão do
ponto em que cada um dos alunos se encontra.

Com efeito, os estudos realizados nesta área mostram que os professores


experientes e capazes de pensar sobre a sua própria prática a partir do "feed-
back" dos alunos sabem encontrar caminhos para a diferenciação quer a nível
das opções curriculares de base, quer a nível das decisões pedagógicas em
situação. Como afirma Porter (1997:45),

"as boas práticas pedagógicas são apropriadas a todos os alunos,


uma vez que todos os alunos têm áreas fortes e estilos de aprendizagem
individuais. Isto aplica-se a alunos com necessidades educativas
especiais e aos outros. Cada vez há uma maior evidência de que estes
não necessitam de zmmii námero sigmficativo de estratégias pedagógicas
distintas. Podem precisar de mais tempo, mais prática ou de uma
abordagem com variações individualizadas, mas não há uma estratégia
explicitamente clVerente da que é utilizada com os outros alunos."

101
3.3 Adaptações currieulares individualizadas

Como vimos a elaboração de um projecto curricular de escola e de turma


permite a adequação do currículo geral às características de uma dada
população, num contexto específico. A diferenciação dentro da sala de aula,
se correctamente desenvolvida, garante a possibilidade de cada um dos alunos
progredir nas aprendizagens de forma individualizada, mas em interacção com
os seus pares e inserido num grupo/turma para o qual existe uma proposta
curricular comum.

Nesta perspectiva, o projecto curricular de escola e o projecto curricular de


turma constituem já adaptações curriculares, na medida em que contiguram
ajustamentos a realizar face às situações e aos alunos concretos.

No entanto, alguns alunos necessitam ainda de níveis de adequação mais


específicos, isto é, de propostas curriculares individuais, também chamadas
O Decreto-Lei 319/91 pre-
vê que se realizem através
adaptações curriculares'. As adaptações currieulares individualizadas
de Plano Educativo Indivi- correspondem a ajustamentos do projecto curricular de turma a necessidades
dual e do Programa Edu-
cativo, O Plano Educativo específicas de determinados alunos, mas sem pôr em causa os objectivos gerais
Individual é um documen- para cada ciclo de escolaridade.
to elaborado pelo Serviço
de Psicologia e Orientação
(ou equipa substituta dos Estas adaptações devem, no entanto, ser realizadas face a cada um dos alunos
serviços de Saúde Escolar), com necessidades educativas especiais e não em relação a uma categoria de
no qual se identifica e ca-
racteriza o aluno, se define necessidades educativas espciais. De facto, se existem certos funcionamentos
a orientação do seu proces-
so educativo e os inter-
comuns que permitem afirmar que uma criança tem, por exemplo, dificuldades
venientes nesse processo, de aprendizagem, tal não significa que todas as crianças com esta problemática
bem como as medidas apresentem as mesmas necessidades a nível educativo. O mesmo se passa
educativas a aplicar. O Pro-
grama Educativo é elabo- com os alunos que apresentem problemas visuais, auditivos, motores,
rado pelo professor de Edu-
cação Especial ou professor
emocionais ou outros. É importante ter em conta que a recusa da classificação
de Apoio com a colabora- dos alunos por deficiências ou problemáticas não decorre apenas de questões
ção dos professores de En-
sino Regular e outros técni--
éticas ou de politica educativa, mas se deve sobretudo ao impasse a que tinham
cos, quando for caso disso, chegado os sucessivos processos da sua classificação, à medida que a
no qual se definem os ob- capacidade de diagnóstico diferencial foi aumentando. Com efeito, a multi-
jectivos a atingir com a in-
t ervenção educativa, as es- plicação de sub-categorias para diferenciar a imensa gama de situações
tratégias a desenvolver e os
momentos e formas de ava-
possíveis, entretanto detectadas e estudadas, veio pôr em causa a utilidade e
liação a utilizar (DGEBS, funcionalidade prática dessas categorizações. Assim, a classificação a partir
1992).
da problemática central do aluno tem apenas um valor indicativo (e, em alguns
casos, muito relativo), no que respeita às adaptações curriculares a realizar.

Neste sentido, a elaboração de adaptações curriculares individualizadas não


corresponde ao recurso a um programa especialmente construído para aplicar
quando, na sala de aula, surge um aluno com determinado tipo de necessidades
c ducativas especiais, mas a um processo dinâmico e funcional de organização
de respostas para determinado aluno, tendo em conta as suas competências e a
proposta educativa comum. Este processo é realizado pelo corpo docente de
cada escola (antes de mais, pelos professores que trabalham directamente com
esse aluno), com o apoio de professores especializados e técnicos de educação
especial (se e quando for caso disso) e ainda com a colaboração dos pais.

Por outro lado, como vimos anteriormente, o conceito de necessidades


educativas especiais tem um carácter relativo, já que o grau de necessidades
educativas especiais que um aluno apresenta depende tanto do aluno, como
do currículo. Efectivamente, num currículo do tipo fechado e de cariz rígido,
as necessidades educativas especiais de determinado aluno avolumam-se e,
portanto, nessa situação o aluno precisa de mais apoios e mais recursos
adiccionais; num currículo do tipo aberto e de cariz flexível, pelo contrário, as
necessidades educativas especiais tendem a diminuir, uma vez que existe um
planeamento curricular mais adequado aos alunos concretos e à sua
especifidade, bem como processos de resposta diferenciados, dentro da sala
de aula.
As adaptações a fazer ao projecto curricular de turma para dar resposta às
necessidades educativas espec iais de alguns alunos variam, por isso, conforme
as problemáticas dos alunos, mas também conforme o modo como a escola e
os professores perspectivam o currículo. Em qualquer caso, o currículo comum
é sempre o marco regulador para todas as modificações a realizar, as quais não
têm que gerar currículos individuais, antes constituindo processos de
ajustamento das respostas educativas para o acesso de determinado aluno ao
projecto curricular comum.

A relação entre a figura das adaptações curriculares individualizadas com os


aspectos que temos vindo a focar neste capítulo pode ser sintetizada do seguinte
modo:

Quadro 3 — Da flexibilidade às adaptações curriculares


individualizadas

Princípio organizador: Flexibilídade curricular

Princípio orientador: Diferenciação pedagógica

Marco de referência: Proposta curricular nacional

Projecto curricular de escola

1J

Ajustamentos Projecto curricular de turma


curriculares:
li,

Adaptações curriculares individualizadas

105
Nesta perspectiva, as adaptações devem ter em conta, em primeiro lugar, tudo
aquilo que o aluno pode realizar com e da mesma forma que os seus pares e,
apenas depois disso, aquilo que deve ser realizado de forma diferente ou
individualizada. Numa escola orientada para a inclusão, não é razoável começar
por olhar para as diferenças, mas para as características comuns, partindo de
duas permissas básicas:

- o aluno deve seguir o currículo comum sempre que tal seja possível;

- as adaptações curriculares surgem apenas quando as necessidades


educativas individuais as tornam imprescindíveis.

Os aspectos sobre os quais há que fazer adaptações, em relação a cada um dos


alunos, podem relacionar-se apenas com um dos elementos curriculares ou
com vários. A decisão sobre quais os elementos curriculares que vamos adaptar
não é despiciencla, uma vez que uma adaptação ao nível das estratégias de
ensino não altera forçosamente a proposta curricular comum para a turma,
enquanto uma adaptação ao nível dos objectivos constitui uma alteração bem
= Alguns autores, sobretudo
espanhois, definem como mais profunda, com implicações em todas as outras componentes curriculares2.
adaptações significativas O quadro 4 apresenta uma hierarquização de possíveis adaptações nos vários
aquelas que implicam mo-
dificações a nível dos ob- elementos curriculares, de acordo com o nível de afastamento do currículo
jectivos (obrigando a mo- geral que pressupõem. Tal como nos "modelos em cascata"
ditleações em todos os com- apresentados no
ponentes curriculares) e capítulo I, a opção pelas adaptações nos últimos níveis apenas ocorrerá quando
como adaptações-não sig- as adaptações nos primeiros forem consideradas insuficientes, pelo que, em
nificativas aquelas que se
realizam numa ou mais das termos de número de alunos, o quadro poderia ser apresentado como um
restantes componentes triângulo cuja base fosse o nível 1.
currieulares.

As adaptações curriculares mais simples e que podem ser decididas e realizadas


pelo professor da classe ou da disciplina, sem apoios externos, são, como o
quadro mostra, as que dizem respeito a modificações na organização e
disposição do espaço. A organização do espaço da sala de aula decorre,
obviamente, das estratégias e tipo de actividades a desenvolver. No entanto,
há cuidados básicos a ter, a este nível, com alguns alunos, nomeadamente os
alunos cegos e aqueles que apresentem problemas motores ou físicos que
impliquem o uso de cadeiras de rodas ou outro tipo de aparelho para deslocação
ou controle da postura.

No caso dos alunos cegos, é necessário ter em conta que qualquer alteração
na organização do espaço (por exemplo, na disposição (las mesas dentro da
sala) deve ser comunicada previamente e explorada com o aluno, de forma a
evitar dificuldades na sua mobilidade; no caso dos alunos que se deslocam em
cadeiras de rodas, há que prever o espaço suficiente, dentro da sala, para as
suas deslocações, bem como a facilitação dos acessos às várias instalações da
escola, o que implica a existência de ratnpas ou de elevadores, isto é a
eliminação das barreiras arquitectónicas.
Quadro 4 — Níveis de adaptação curricular

Nível Elementos curriculares Relação com o currículo comum

Organização e disposição do espaço Menor afastamento do currículo comum

Estratégias e actividades

Recursos educativos

4 Momentos, formas e critérios de


11f1
avaliação

5 Estruturação do tempo

6 Conteúdos Maior afastamento do currículo

7 Objectivos Comum

As modificações curriculares a nível das estratégias e organização das


actividades configuram adaptações que não se afastam muito do currículo
comum e, na maior parte dos casos, estão implícitas no próprio conceito de
diferenciação pedagógica, que analisámos no ponto anterior.

Com efeito, para . além dos vários factores referidos no capítulo I, um outro
aspecto que contribuiu para a defesa da integração dos alunos com necessidades
educativas especiais nas escolas regulares e, posteriormente, para o
desenvolvimento das concepões e práticas da escola inclusiva, relacionou-se
com a constatação, progressivamente mais consensual entre teóricos e técnicos,
de que não existiam métodos específicos para esta população ou para os vários
sub-grupos de problemáticas envolvidas. Como afirmava o Warnock Report,
estes alunos podem precisar de mais tempo, mais apoio, recursos específicos
ou atenção especial, mas as metodologias de ensino propriamente ditas não
são diferentes daquelas que se usam com os restantes alunos.

Evidentemente, qualquer turma actual exige o uso de estratégias diversificadas,


na medida em que todos os alunos apresentam características diferentes e são
vários e individuais os processos para aceder à informação. Na falta dessa
diversificação, há alunos que ajustam os seus estilos de aprendizagem à
estratégia de ensino do professor e outros que não o conseguem fazer, entre os
quais a maior parte dos alunos com necessidades educativas especiais.

A diversificação de estratégias (e, consequentemente, de actividades) não é,


no entanto, difícil e qualquer professor experiente a usa, de forma mais ou
menos consciente. Itnagine-se, por exemplo, um professor do 1. 0 Ciclo que

107
pretende trabalhar o uso dos sinais de pontuação. Em vez de definir uma
estratégia única (geralmente composta por exposição oral e exercícios de
aplicação prática), o professor poderá planificar um conjunto de actividades a
realizar individualmente ou em pequenos grupos, que permitam o uso de
diferentes processos de apreensão da informação por parte dos alunos. Assim,
poderá:

a) gravar previamente um conjunto de frases e fornecer às crianças as


mesmas frases, por escrito, para colocarem a pontuação correcta,
facilitando a aprendizagem dos alunos que apreendem sobretudo
informação oral;

b) agrupar diversas frases no quadro, consoante os sinais de pontuação


usados, facilitando a aprendizagem dos alunos que apreendem
sobretudo informação visual;

c) dinamiza • uma dramatização a partir da mesma frase, dita com entoações


diferentes, à qual se fará corresponder o respectivo sinal de pontuação,
facilitando a aprendizagem dos alunos que ainda necessitam de
movimento corporal como forma de integrar a informação;

çl) solicitar a elaboração de desenhos ou bandas desenhadas com balões


de fala em que o discurso oral esteja devidamente pontuado, facilitando
a aprendizagem dos alunos que necessitam ainda de material figurativo
para apreender a informação;

e) fornecer aos alunos cartões com frases-tipo contendo os diferentes sinais


de pontuação, os quais funcionarão como "chaves" para aqueles que
apresentam diticuldades de memorização (Wood, 1984).

Como neste exemplo, em muitos casos não é necessário planear estratégias


específicas para determinados alunos, mas apenas diversificar as estratégias
de ensino e as actividades de aprendizagem. No entanto, o conhecimento dos
alunos através de processos de observação e análise de desempenhos e
produtos, pode ajudar à orientação dessas estratégias para determinados alunos,
quando se torna evidente que as modalidades de trabalho antes usadas não
tiveram êxito. Para ta1 é necessário, contudo, que o professor esteja consciente
daquilo que está a pedir que cada aluno realmente faça quando Ihe propõe
determinada actividade, isto é, que tipo de competências essa actividade requer.
Em muitas situações, o que falta ao professor do ensino regular não é mais
i
nformação sobre necessidades educativas especiais,.mas a análise cuidadosa
do tipo de c
ompetências que a realização de cada actividade obriga a mobilizar
e a c onsciência de que diferentes
co mpetências permitem aceder ao mesmo
o bjectivo c/ou conteúdo temático.

I OS
Por outro lado, o modo como se organizam e sequencializam as actividades
pode tornar-se um factor facilitador da aprendizagem ou criar dificuldades
acrescidas.

Os alunos com problemas emocionais e de comportamento, por exemplo,


exigem uma especial atenção ao tipo de estratégias a desenvolver e à
organização das actividades, bem como ao ambiente de aprendizagem a criar
na sala de aula.

Antes de mais, é necessário salientar que grande parte dos chamados problemas
de comportamento não decorrem de questões intrinsecas aos alunos mas de
erros e inadequações na concepção, organização e gestão das actividades de
ensino/aprendizagem pelo professor — aulas mal planificadas ou mal geridas
aumentam exponencialmente a hipótese de ocorrerem problemas de compor-
tamento. Por outro lado, muitos desses problemas podem ser prevenidos se
existirem regras claras de funcionamento na sala de aula e se houver cuidado
na manutenção sistemática dessas regras. Esta constatação torna-se evidente
se observarmos os comportamentos dos mesmos alunos ou turmas, no 2.° e
3.° Ciclos, ao longo de um dia lectivo — o seu comportamento muda conforme os
processos de organização e gestão do ensino de cada um dos vários professores.

Por alunos com problemas emocionais e de comportamento entendemos,


portanto, a pequena e muito heterogénea percentagem de crianças e jovens
que apresentam comportamentos inadequados ou desajustados que causam
dificuldades ou rupturas continuadas e frequentes no relacionamento com a
família, a escola (professores e colegas) e, num âmbito alargado, a própria
comunidade.

Estes alunos necessitam, como o Warnock Report já assinalava, "de uma


particular atenção à estrutura social e ao clima emocional em que decorre a
educação" . Para tal, as regras e procedimentos, bem como as rotinas diárias,
devem ser mantidas em todas as situações e o ambiente da turma deve ser
controlado de forma a que a principal fonte de estímulo seja o próprio material
de aprendizagem. As tarefas a realizar pelos alunos devem ter objectivos claros
e uma sequência bem definida, com uma extensão adequada ao tipo de
funcionamento da criança.
A maior parte dos estudos recentes sobre crianças com este tipo de problemas
mostra que é essencial desenvolver nelas processos de controlo que começam
pela apreensão de um modelo de funcionamento que dá origem à verbalização
oral dos procedimentos a desenvolver (funcionando como guião) e, posterior-
mente, à utilização de instrumentos de auto-controlo de comportamentos ou
procedimentos, até que os alunos consigam regular interiormente a sua
actividade. Os instrumentos de auto-controle podem corresponder a auto-
programação, auto-observação e auto-correcção (Barckley, 1981, Kaplan, 1991
entre outros). Por exemplo, pode ser fornecida ou realizada com a criança um
ficha para auto-registo das vezes que se levanta do lugar sem objectivo relativo
à actividade, e, no final da semana, passar esses dados para um gráfico, no
qual a frequência do comportamento durante determinado período pode ser
visualizada facilmente pelo aluno; ou pode ser construída uma listagem de
comportamentos que o aluno deveria ter, assinalando este todas as vezes em
que esses comportamentos ocorreram, procedendo-se à sua quantificação e
análise, como vimos no capítulo II.

Alguns destes alunos necessitam, para além disto, de outro tipo de apoios,
nomeadamente de acompanhamento psicológico.

Os processos de diferenciação pedagógica na sala de aula, potencializados


ainda com o planeamento de estratégias e actividades orientadas para as
características de apreensão da informação de determinadas crianças, beneficiam
ainda largamente os alunos com dificuldades de aprendizagem.

O termo dificuldades de aprendizagem refere-se a uma desordem num ou


mais dos processos psicológicos envolvidos na compreensão ou uso da
linguagem falada ou escrita e manifesta-se em dificuldades essencialmente ao
nível cla leitura, escrita e matemática.

A identificação destes alunos continua, hoje, a ser difícil, em parte devido às


diferentes perspectivas teóricas sobre as causas das dificuldades apresentadas.
A prevalência desta problemática é, por isso, também difícil de calcular, uma
vez que depende do tipo de classificação usada. No entanto, a prevalência
3 Estas dificuldades, de ca-
rácter intrínseco, não devem comummente aceite é de 5% da população escolar (Barckley, 1981) 3 .
ser confundidas com aque-
las que e xperimentam os A maior parte dos estudos nesta área incide sobre os problemas de leitura,
"maus leitores" — alunos que
não desenvolveram rapidez, definindo pelo menos dois tipos de perturbações: nas competências linguísticas
fluência e eficácia na leitu- e nas competências visuo-espaciais. A maioria das crianças com dificuldades
ra e apresentam, por isso,
dificuldades na extracção de na aprendizagem da leitura insere-se no primeiro grupo, apresentando, numa
significado a partir do ma- fase inicial, um atraso de linguagem e problemas na associação entre os sons
terial escrito e na sua pro-
dução (Sim-Sim, 1996). das palavras e sua representação escrita e, mais tarde, uma leitura muíto lenta
Essas dificuldades decor- e morosa que torna difícil a extracção do significado e o uso da leitura para
rem, na maior parte dos ca-
sos, de factores extrfnsecos,
aquisição de nova informação ou para recreação.
como a falta de acesso a
material escrito e de hábitos Muitos destes alunos não têm, à partida, problemas emocionais e de compor-
de leitura na comunidade ou
a rigidez de formas de ensi- tamento mas desenvolvem-nos face ao insucesso repetido, dando origem a
no orientadas apenas para a situações de falta de motivação generalizada, as quais interferem com as
descodificação e não para a
ex t ração de iii formação aprendizagens escolares. Gera-se assim um círculo vicioso em que, quanto
através da escrita. A maior mais insucesso os alunos apresentam nas aprendizagens escolares, mais
parte dos problemas de lei-
mra e escrita existentes no problemas de comportamento apresentam, os quais não Ihes permitem
ensino básico snua-se a este d esenvolver aprenclizagens, o que provoca insucesso, etc. Neste sentido,
nível.
qualquer intervenção a nível das dificuldades de aprendizagem não pode
restringir-se apenas ao aspecto académico, devendo alargar-se aos processos
de motivação e às crenças 4ue a criança entretanto desenvolveu sobre as suas
próprias (in)capacidades face à aprendizagem.

Estes alunos (e os respectivos professores da classe) devem ser apoiados por


professores de educação especial ou professores de apoio com formação nesta
área, urna vez que, para além dos processos de diferenciação pedagógica antes
referidos, será necessário:

- o trabalho específico nas áreas em que estes alunos apresentam maiores


dificuldades (por exemplo, um trabalho sistemático de segmentação
fonémica de palavras para alunos que apresentem problemas a este
nível; a modelação de estratégias de estudo para alunos que tenham
dificuldade em extrair a informação principal de um texto escrito);

- a utilização frequente de "feed-back" e reforço, de modo a não deixar


que se instale uma atitude de aceitação do insucesso nas tarefas
escolares;

- e a implementação de processos e instrumentos de auto-instrução e


auto-controlo das aprendizagens, tornando os alunos conscientes não
apenas das dificuldades, mas também dos meios para as ultrapassar e
para avaliar os seus próprios progressos.

Já as modificações a nível dos recursos educativos podem ser de carácter


meramente pedagógico e, neste sentido, estar ao alcance de qualquer professor,
ou podem ter um carácter muito especializado, requerendo a intervenção de
4 Em Portugal, o Decreto-
especialistas4. -Lei 319/91, art. 3", prevê,
como equipamento especi-
As primeiras devem ser decididas pelo professor em relação à disciplina ou al de compensação os mate-
riais didácticos especiais (11-
área disciplinar que lecciona, sem necessidade de recorrer a especialistas vros em Braille ou amplia-
externos, urna vez que dizem respeito ao processo de ensino/aprendizagem (los, material audio-visual,
equipamento específico
propriamente dito. Por exemplo, alunos com problemas auditivos ou de para leitura, escrita ou cál-
linguagem oral poderão necessitar de mais material visual pictórico que os culo) e dispositivos de com-
pensação individual (auxi-
restantes elementos da turma em disciplinas corno História ou Geografia; alunos liares ópticos e acústicos,
cegos necessitarão, sobretudo no jardim de infância e primeiro ciclo, de tactear equipamento informático
adaptado, máquinas de es-
e manipular o material apresentado para formar novos conceitos ou, simples- crever Braille, cadeiras de
mente, saber a que é o educador ou professor ou os colegas se estão a referir rodas e próteses).

exactamente; alunos com dificuldades de aprendizagem poderão ter que utilizar


durante mais tempo material concreto para a aprendizagem dos conceitos
matemáticos básicos ou que recorrer a letras móveis para a produção de palavras
e frases, numa altura em que os outros alunos já escrevem.

As segundas correspondem a recursos especiais usados com certos alunos, de


acordo com as características que apresentam. Por exemplo, alunos com visão
reduzida poderão necessitar de ampliações de todo o material escrito a fornecer
na aula ou para estudo e, ev
entualmente, de luz mais forte e incidindo especifi-
camente no lugar em que se encontra na sala de aula; alguns alunos com
Por comunicação aumenta- problemas motores graves podem ter que usar um sistema de comunicação
au mentativa s
tiva entende-se o conjunto ; outros alunos com deficiência motora poderão ter que utilizar
de técnicas que constituem
um suplemento à lingua-
aparelhos especiais para posicionamento e controle da postura.
gem oral (Musselwhite,
1988). Podem funcionar Este tipo de recursos terá que ser decidido pela equipa
como facilitadores da coinu- mu ltidisciplinar que
Mcação ou como comple- acompanha o aluno (provavelmente desde muito cedo) e trabalhado com cada
mentos da linguagem ao ní- um dos professores, ao longo do percurso lectivo daquele.
vel da inte ligibilidade da
fala; ou ainda corno siste-
mas a lternativos de comu- Por adaptações ao nível dos recursos pode ainda entender-se o acréscimo de
nicação, permitindo a trans- recursos humanos que os alunos com ne
missão de informação atra- cessidades educativas especiais
vés de meios não vocais. De requerem. Estes podem ser professores de apoio e/ou de educação especial
entre os que usam materiais com formação e specializada e/ou técnicos
exteriores ao sujeito, os mais e specíficos: técnicos de mobilidade,
conhecidos são os sistemas
para alunos invisuais; fisi
oterapeutas, para alunos com deficiências motoras;
Bliss, Makaton e P1C, usa-
dos es sencialmente por monitores de língua gestual para alunos surdos; terapeutas da fala para alunos
individuos com defieiência com perturbações de linguagem, e ainda psicólogos e assistentes sociais,
motora decorrente de para- conforme as pr
lisia cerebral. oblemáticas envolvidas. A falta destes técnicos na rede escolar
pública poderá ser colmatada através de acordos com instituições existentes
na c
omunidade local, uma vez que não é razoável esperar pela colocação de
um técnico em determinada escola onde existem, pro
vávelmente, um ou dois
casos que requerem a sua intervenção.

As mo dificações ao nível da avaliação


Em Portugal, o Deereto- in strumento, modalidade ou tempo6. podem ser definidas quanto ao
-Lei 319/91, art. 8°, refere
como condições especiais de
avaliação as alterações a re- As m odificações nos i
alizar a nível do tipo de pro- nstrumentos de avaliação re
lacionam-se, regra geral,
va ou i nstrumento de avali- com limi tações sensoriais, motoras ou físicas dos alunos. Por exemplo, alunos
ação, a forma e meio de cegos ne
e xpressão do aluno e ainda cessitarão de testes escritos em Braille, enquanto alunos com problemas
a per iodicidade, duração e inotores graves poderão ter que realizar testes em c
local de realização da avali- omputador. Nestes casos, a
ação.
forma e conteúdo dos testes não são modificados.

As adaptações referentes à modalidade de avaliação ocorrem,


caso dos alunos com prob g eralmente, no
lemáticas relativas à co
municação oral — alunos
com perdas auditivas moderadas ou com perturbações na linguagem oral,
decorrentes ou não de d
eficiências motoras. Neste caso, processos de avaliação
contínua que são desenvolvidos o
ralmente com os restantes alunos, terão que
ser passados a escrito para estes alunos.

As adaptações re
lacionadas com o tempo de duração da avaliação podem ser
nec essarias, por exemplo, para alunos com d
motores que, não exigindo eq u eterminado tipo de probleMas
ipamentos especiais, resultam, no entanto, em
processos mais lentos e morosos de escrita. Numa situação de teste, estes alunos
poderão necessitar de mais tempo que os restantes alunos.
Já os alunos com dificuldades específicas na linguagem escrita podem requerer
adaptações a nível dos instrumentos, modalidades e tempos (duração e,
eventualmente, momentos) de avaliação. De facto, a avaliação sumativa das
aprendizagens realizadas em qualquer disciplina ou área disciplinar processa-
-se geralmente através da forma escrita da língua, o que implica dificuldades
acrescidas para estes alunos, os quais podem, por exemplo, dominar os
conteúdos de determinada disciplina e não o demonstrar através de um teste
escríto. Neste caso, será importante que a avaliação sob a forma escrita seja
complementada por uma avaliação oral ou, em certos casos, que o enunciado
do teste escrito contenha mais elementos pictóricos (mapas, gráficos, etc.) ou
mais questões fechadas (perguntas de resposta múltipla, de resposta verdadeiro-
falso, etc), sob pena de estarmos apenas a avaliar a leitura e escrita e não os
conhecimentos específicos em determinada área 7 . Por outro lado, no 2.° e ' Tal não significa, eviden-
temente, que os alunos com
3° ciclos, alguns destes alunos necessitam de mais tempo para realizar provas dificuldades específicas nes-
sumativas ou, em alternativa, que se dê mais relevo à avaliação contínua. te campo possam fazer todo
o percurso escolar com um
nível de leitura e escrita in-
Quanto às modificações a nível temporal, estas podem dizer respeito a um suficiente. Referimo-nos
período de tempo amplo (o tempo julgado necessário para determinado aluno aqui à necessidade de ade-
quar a avaliação aos objec-
alcançar os objectivos de cada ciclo de escolaridade) ou maís restrito (a previsão tivos específicos da discipli-
do tempo necessário para que o aluno atinja os objectivos e conteúdos na ou unidade didactica.
considerados prioritários em certa disciplina ou unidade didáctica). Em alguns
casos, haverá que prolongar estes tempos em relação àqueles que foram
previstos para o grupo de referência.

Por exemplo, alguns alunos com dificuldades específicas na aprendizagem da


leitura e escrita poderão necessitar de mais tempo para desenvolver as compe-
tências relativas não apenas a essas matérias específicas, mas também a outras
disciplinas ou áreas disciplinares, uma vez que, como vimos antes, o domínio
da forma escrita da língua é requerido para todas as aprendizagens escolares.

já os alunos com Síndrome de Down 8 (que, segundo a maior parte dos Crianças com Síndrome de
Down são portadoras de
especialistas actuais, podem seguir o currículo comum com adaptações urna anomalia cromos-
adequadas a cada caso) necessitam de mais tempo para a maior parte das sómica devida à presença de
um éromossoma suplemen-
aprendizagens escolares, urna vez que apresentam dificuldades a nível dos tar no par 21. Por esta ra-
mecanismos perceptivos necessários à apreensão, memorização e generalização zão, este síndrome é tam-
bém designado por Trisso-
da informação. Requerem, por isso, mais tempo para alcançar os objectivos mia 21. Estas crianças apre-
cIo eiclo de escolaridade em que se encontram. sentam défices essencial-
mente a nível cognitivo e
lin goístico.
Os problemas de tempo também se põem, embora por razões diferentes, no
caso dos alunos com problemas crónicos de saúde, devido às frequentes
hospitalizações ou estadias em casa. Se não for possível a deslocação do
professor de apoio, haverá que garantir ao aluno o tempo necessário (bem
como os materiais e apoio) para realizar as aprendizagens desenvolvidas na
escola durante o período em que esteve ausente.
As modificações ao nível dos conteúdos e objectivos
podem ser constituídas
por alterações na priorização ou sequencialização dos mesmos, pela introdução
de conteúdos e objectivos intermédios, pela substituição de alguns conteúdos
e/ou objectivos por outros ou pela eliminação de alguns conteúdos e/ou
objectivos. Se as modificações a realizar afectarem todos os conteúdos e
objectivos do currículo comum, já não estamos em presença de urna adaptação
curricular, mas de um currículo especial, que analisaremos no ponto seguinte.

As alterações na priorização ou sequencialização dos conteúdos e/ou objectivos


não são específicas das adaptações individualizadas, uma vez que podem
ocorrer logo nos projectos curriculares de escola e de turma. No entanto, podem
ter de ser realizadas também em relação ao projecto curricular de turma,
ajustando-o específicamente para determinado aluno.

A introdução de conteúdos e objectivos intermédios, com vista a alcançar os


objectivos definidos na proposta curricular comum é necessária ern certas
situações, uma vez que há etapas que a maioria dos alunos percorre de modo
rápido e espontâneo e que têm que ser induzidas e orientadas de forma
sistemática em alguns alunos. Por exemplo, algumas crianças com problemas
motores e a maior parte das crianças cegas, no jardim de infância, necessitarão
que se estabeleçam objectivos intermédios em termos do desenvolvimento da
autonomia (vestir-se, alimentar-se, arrumar os seus objectos, etc.).

A substituição de alguns conteúdos e/ou objectivos por outros, alternativos,


ocorre quando se constata que os objectivos do currículo comum são
manifestaniente impossíveis de alcançar, devido a limitações sensoriais, físicas
ou motoras.
Referimo-nos aqui à sur-
dez profunda e não a for- É o caso, por exemplo, dos alunos surdos 9 . Estas crianças são, na maior parte,
mas moderadas de deficièn- filhas de pais ouvintes, pelo que, para adquirirem a língua gestual necessitam
cia auditiva.
de estar inseridas num meio em que esta língua seja fluentemente usada por
adultos e crianças. Por isso, as crianças surdas, sobretudo ao nível da creche,
No caso portugues, estas
Unidades de Apoio à Edu- jardim de infância e primeiro cicio, frequentam Unidades de Apoio'° próprias
cação de Alunos Surdos são
reg ulamentadas no despa- para o seu atendimento, geralmente funcionando nas instalações de uma escola
cho n." 7520/98. regular.

As principais alterações curriculares a realizar para responder às necessidades


educativas dos alunos surdos dizem respeito, por um lado, à substituição dos
objectivos a adquirir na vertente oral da língua portuguesa por objectivos
" De notar que qualquer
uma das línguas gestuais
definidos em função da língua gestual; e, por outro lado, pela reformulação
apresenta diferencas estru- dos objectivos relativos à vertente escrita da língua portuguesa, urna vez que o
turais relevames em relação
à língua oral (e, portanto,
português escrito surge como uma segunda língua a adquirir" . Estes alunos
também à escrita) utilizada seguem o currículo comum em todas as outras áreas curriculares, utilizando,
no mcsmo país. para tal, a língua gestual.
Se a escolarização destes alunos não se realiza em conjunto com a dos alunos
ouvintes, há, todavia, actividades curriculares não disciplinares que podem
ser partilhadas com os alunos das escolas em que as Unidades de Apoio se
inserem e dessa interacção resultam benefícios para ambos os grupos, desde
que, evidentemente, se providencie um tradutor. De resto, em muitas das
Unidades de Apoio, o número de jovens do 2.° e 3.° Ciclos não justifica a
criação de turmas de alunos surdos, pelo que estes frequentam as aulas do
ensino regular com um tradutor.
Assim, para estes alunos, é necessário proceder a uma substituição dos
objectivos ao nível da Língua Portuguesa, enquanto nas outras disciplinas, a
diferença reside na língua em que se comunica. No entanto, nesta como noutras
problemáticas, existem múltiplas diferenças entre os alunos com surdez, e as
adaptações a realizar devem ter em conta as suas necessidades individuais e
não apenas a classificação relativa à audição.
Quanto à eliminação de alguns conteúdos e/ou objectivos que constem no
currículo comum, esta é uma medida que só deverá ser considerada em situações
excepcionais, exigindo uma decisão devidamente fundamentada e tomada por
uma equipa multidisciplinar, uma vez que este tipo de opção pode vir a
condicionar o futuro escolar da criança ou jovem. Situação preferível será
sempre a da substituição desses conteúdos e/ou objectivos por outros, como
focámos anteriormente.
Apresentámos, até agora, uma tipologia de adaptações curriculares elaborada
a partir dos próprios elementos curriculares (estratégias e actividades, recursos,
formas de avaliação, tempos, conteúdos e objectivos) e hierarquizada por grau
de afastamento do currículo comum (das modificações metodológicas, ao
alcance de qualquer professor, às alterações nos objectivos, que exigem uma
decisão conjunta corn os especialistas que acompanhem o processo do aluno).
No entanto, esta forma de apresentar as adaptações curriculares possíveis serve
apenas para sistematização e estudo da questão. Na realidade, um mesmo
aluno pode requerer adaptações de diferentes tipos, conforme:
as competências requeridas para alcançar os objectivos e dominar os
conteúdos de determinada disciplina ou área disciplinar;

as suas competências específicas e o tipo de funcionamento que


apresenta.
Referimo-nos aqui, como
Por exemplo, para um aluno cego' 2 que frequente o 2.° Ciclo, será necessário o nome indica, a alunos
repensar, logo de início, o currículo da disciplina de Educação Visual e e não a alunos com
sio )arcia
Técnológica (o que não significa que o aluno poderá ser dispensado desta); j á
na disciplina de Língua Portuguesa, esse aluno pode, em princípio, inserir-se
na proposta curricular elaborada para a turma, uma vez que as alterações a
real izar dizem respeito essencialmente aos recursos necessários (o uso de urna
115

máquina Braille e o recurso a um professor ou técnico que possa operar as


descodificações; ou o recurso aos novos equipamentos informáticos que
realizam essa reconversão).

Assim, no caso da disciplina de E.V.T. proceder-se-à a uma adaptação que


afecta alguns dos principais objectivos da disciplina e, em consequência, todos
os outros elementos curriculares (conteúdos, estratégias, actividades, recursos,
formas de avaliação). Situação idêntica ocorrerá, provavelmente, no caso da
Educação Física. No caso de disciplinas como a Língua Portuguesa ou
Matemática, a adaptação a realizar respeita apenas a um dos elementos
curriculares. O exemplo anterior poderá, então, ser esquematizado do seguinte
modo:

Quadro 5 — Exemplo de adaptação curricular

Estra tégias Formas


Disciplina Objectivos Conteúdos
Recursos de
actividades avaliação

E.Vis. e Técn. c/ adaptações c/ adaptações c/ adaptações c/ adaptações c/ adaptações

Educ. Física ei adaptações c/ adaptações adaptações c/ adaptações c/ adaptações

Líng. Potug. comuns comuns comuns c/ adaptações comuns

Matemática comuns comuns comuns c/ adaptações comuns

Se analisarmos os exemplos que foram sendo fornecidos em relação às


adaptações a realizar nos vários elementos curriculares, verificamos que os
casos que requerem adaptações com um grau de afastamento menor em relação
ao projecto curricular comum correspondem a casos de alta frequência e baixa
intensidade (Simeonsson, 1994, cit. in: Bairrão Ruivo, 1998), enquanto as
situações de baixa frequência e alta intensidade (ou, na terminologia do Warnock
Report, necessidades educativas especiais de carácter permanente) configuram
adaptações com maior grau de afastamento em relação ao projecto curricular
comum.
Iir,lmenor grau de afastamento do projecto curricular comum não significa,
porém, menor nível de complexidade no seu planeamento e gestão.
Em primeiro lugar, porque os alunos com necessidades educativas especiais
de baixa frequência e alta intensidade são geralmente acompanhados por
professores especializados e/ou técnicos de educação especial e, consequente-
mente, os educadores e professores do ensino regular sentem-se minimamente
apoiados no trabalho que desenvolvem na sala de aula. O mesmo não acontece
com os casos de alta frequência e baixa intensidade, nomeadamente as
dificuldades de aprendizagem e os problemas comportamentais — situações
em que não existe um diagnóstico claro e para as quais nem sempre existem
professores de apoio disponíveis.

Em segundo lugar, porque as problemáticas que configuram os casos de baixa


frequência e alta intensidade, apesar de exigirem uma maior grau de adaptação
curricular (substituição de objectivos e conteúdos, recursos educativos
especializados), podem não ter consequências directas nos resultados de
'3 Sem qualquer outro pro-
aprendizagem. Por exemplo, a maior parte dos alunos cegos' 3 , se forem feitas blema associado ao défice
as adaptações específicas para o seu caso, não apresentam problemas na visual.
aprendizagem e, por isso, a nível da orientação dos processos de ensino
propriamente ditos levantam bem menos dificuldades do que os alunos com
dificuldades de aprendizagem ou com problemas de comportamento.

3.4 Currículos especiais

Existem ainda alunos com necessidades educativas especiais mais graves,


decorrentes de deficiências acentuadas, as quais não lhes permitem o acesso
ao currículo geral, obrigando à definição de um currículo especial. Por
currículo especial entende-se aquele que cujos objectivos gerais são diferentes
da proposta currícular nacional para o mesmo ciclo de escolaridade e/ou idade
do aluno, implicando diferenças em todos os elementos curriculares.

De entre este tipo de currículos, destacam-se, pela sua pertinência, os chamados


currículos funcionais.
Os currículos funcionais pretendem garantir o direito a uma vida de qualidade
às pessoas com deficiências acentuadas, promovendo a autonomia e a
integração familiar, social e laboral, na medida das suas possibilidades. Podem
ser de finidos como "um conjunto de conteúdos de aprendizagem que visam a
a preparação de alunos com deficiência, nas áreas do desenvolvimento pessoal
e social, das actividades de vida diária e da adaptação ocupacional" (Clark,
1994; eit. in: Bénard da Costa et al., 1996: 34).

I 17
Este tipo de currículo tem por base as n
ecessidades educativas específicas da
deficiência mental, no
meadamente a necessidade de seleccionar e restringir
aquilo que se ensina, já que estes alunos levam mais tempo a adquirir qualquer
tipo de co mpetências; a necessidade de praticar mais
frequentemente e durante
toda a vida o que aprenderam, uma vez que esquecem facilmente o que
aprenderam antes; e a necessidade de aplicação prática dos conhecimentos,
devido às dificuldades em abstrair, generalizar e transferir esses conhecimentos.
Trata-se de currículos ind
ividualizados, adequados ao contexto, po tencialidades
e dificuldades específicas de cada aluno e têm como principal característica a
fu ncionalidade dos co
nhecimentos a adquirir, isto é, a sua utilidade para o
aluno e para a comunidade em que se insere. Esta característica foi um marco
fu
ndamental na mudança de perspectiva sobre o ensino desta população, a
qual chegava a passar toda a sua vida escolar (até aos 18 anos ou mais)
realizando actividades a nível de jardim de infância— actividades completamente
desajustadas da sua idade cronológica e preparatórias de uma escolaridade
básica que, na maior parte dos casos, estes alunos não iriam realizar.

Para elaborar um currículo funcional é necessário, antes de mais, definir áreas


cu rriculares. Neste tipo de currículos, as áreas não
c orrespondem a domínios
do saber, mas às situações em que decorre ou decorrerá a vida dos alunos:
easa, co
munidade, escola, espaços de recreação e locais de trabalho (Brown,
1979). A elaboração de cada currículo pressupõe o co
ca nhecimento das
racterísticas de cada uma destas áreas em relação a cada aluno (por exemplo,
se vive numa aldeia ou na cidade; com a família ou num internato) e ainda a
inv
entariação dos ambientes em que o aluno pode vir a inserir-se (serviços da
comunidade a que pode ter que recorrer; ambiente de trabalho em que pode
vir a integrar-se).

Pos teriormente, há que seleccionar


cui dadosamente as actividades que o aluno
pode realizar. Segundo Brown (1986, cit. in: Bénard da Costa et al., 1996:57),
as actividades devem ser sele ccionadas por:

- c
ontribuírem para alargar os ambientes em que o aluno vive e para a
socialização;

poderem ser aprendidas em tempo razoável;

serem funcionais e úteis na vida adulta, podendo ser praticadas com


frequência;

corresponderem às e
xpectativas dos pais;
estarem adaptadas à idade c ronológica do aluno e
co rresponderem
aos seus interesses;
co ntribuírem para o bem estar físico do aluno.
Na fase seguinte, é necessário definir as competências requerídas para a
aprendizagem de cada actividade e as condições em que essas competências
se vão desenvolver para, finalmente, organizar a intervenção pedagógica
correspondente a essas aprendizagens.

As aprendizagens académicas não são, na maioria das situações, o objectivo


principal dos currículos funcionais. Nos casos em que estas podem ocorrer,
deverão surgír inseridas em situações da vida quotidiana do aluno. A leitura,
por exemplo, será trabalhada sobre o material escrito que rodeia o aluno e com
o qual ele tem que lidar todos os dias. A selecção das competências a
desenvolver pelos alunos deverá, por isso, ter em conta o uso que estes poderão
fazer dessas competências fora do ambiente escolar, ao longo da vida.

Este tipo de currículos destina-se essencialmente a alunos com deficiências


mentais severas e profundas e a alunos com multideficiência' 4. Segundo a
maior parte dos estudos, estes alunos constituem aproximadamente 2% da
população da mesma faixa etária.

No entanto, apesar de a escolaridade não poder ser realizada em comum com " Indivíduo com atraso
outros alunos da mesma faixa etária, há actividades que podem ser partilhadas, mental severo ou profundo,
com uma ou mais deficiên-
ainda que comportem objectivos diferentes. Por isso, a maior parte dos técnicos cias sensoriais ou motoras
que trabalham com alunos portadores de deficiências acentuadas advogam e/ou necessidade de cuida-
dos especiais (Orelove e
que estes devem ser atendidos em salas de apoio inseridas no espaço físico das Sobsey, 1991).
escolas regulares ou, no mínimo, em instituições que colaborem (a nível de
troca de recursos humanos e materiais) com as escolas do ensino regular mais
próximas.

Por exemplo, um aluno com multideficiência tem, normalmente, dificuldades


significativas de acesso ao mundo que o rodeia (pessoas, objectos, ambiente).
A sua inserção em algumas das actividades do jardim de infância ou escola
regular é, no entanto, importante para que ele possa ter experiências em
quantidade e qualidade suficiente para lhe permitir realizar novas
aprendizagens. Os objectivos a alcançar com essas experiências e actividades
não são, provavelmente, aqueles que foram definidos para as outras crianças
participantes e a informação que esta criança adquire com essa experiência
depende, na maior parte dos casos, da existência de mediadores' 5 . A sua Por mediador entende-se
o elemento que o ajuda a
participação nessas actividades é, apesar disso, um contributo importante para apreender o meio que o ro-
o desenvolvimento da sua autonomia e socialização, permitindo-lhe a interacção deia. Neste sentido, tanto é
mediador a estrutura (pré-
com pares, como o caso de Jo, uma criança de 8 anos com multideficiência, definida) do mcio-arnbien-
relatado pela mãe e referido por Whittacker e Kenworth (1999:137): te como a interacção com o
educador.

"Agora, (...) Jô senta-se com a cabeça direita. As crianças são encora-


jadas a falar com ela e fazem-no constantemente. Uem-the histórias,
contam-lhe anedotas e cantam para ela. Enquanto fazem isto, tocam-
lhe, limpam-lhe a baba da boca, afastam-lhé o cabelo da testa,
certificando-se que o cinto de segurança não está demasiado apertado.
Põem-lhe creme na cara, lavam-lhe as mãos antes do almoço. Se estão
a eserever, colocam-lhe o lápis nos dedos. Riem-se quando ela se ri e
preocupam-se quando ela chora. No intervalo, brincam com ela no
recreio, empurrando-a a várias velocidades (...)."

120
Actividades

1. Indique se as afirmações seguintes são verdadeiras ou falsas:

V F

a) Em sentido amplo, currículo é o conjunto de acções


levadas a efeito pela escola para desenvolver a
aprendizagem dos alunos.

b) Currículo aberto pressupõe a aplicação flexível da


proposta curricular nacional, adequando-se ao con-
texto específico em que o processo de ensino/
aprendizagem decorre.

c) A organização e gestão do currículo a nível local


refere-se à escolha das estratégias e actividades a
desenvolver na sala de aula.

d) A flexibilidade curricular implica uma redução das


aprendizagens a realizar.

2. Considere a seguinte situação:

Numa turma do 3° ano, os alunos elaboravam um texto colectivo


sobre a ida à lua dos primeiros astronautas. As frases eram ditas
oralmente, discutidas, reformuladas e depois escritas no quadro
por um dos alunos.

Enquanto isso, o António, aluno com necessidades educativas


especiais, realizava operações numéricas no caderno, como a
professora lhe pedira. Durante esse trabalho, levantou-se várias
vezes para ir perguntar à professora se estava a realizar bem as
operações. A professora via-lhe o trabalho, corrigia-o e ele voltava
para o lugar e continuava a trabalhar.

A certa altura, a professora pediu-lhe que esperasse, porque estava


a corrigir uma das frases do texto colectivo. O António foi-se
sentar, de cabeça baixa, e começou a dar pontapés debaixo do
tampo da mesa. Os restantes alunos deixaram de dar atenção ao
que estavam a fazer e ficaram a olhar para ele e a rir.

121
a) Como definiria o problema central desta situação?

b) Como poderia a professora resolver a situação?

3. (...) A elaboração de uma adaptação curricular


i ndividualizada não é
uma resposta automática perante a detecção de determinadas
necessidades educativas especiais, senão o possível resultado final de
um processo adaptador em que convém seguir certa ordem hierárquica.
(Manjón, Gil e Garrido, 1997: 68)

Comente a afirmação anterior, focando essencialmente:

- porque não é uma resposta automática;

em que medida se trata de um processo;

a que ordem hierárquica se referem os autores.

1 )2
4. A Escola e a Inclusão
Ohjectivos gerais

• Enquadrar o trabalho em equipa no modelo colaborativo;

• Equacionar vantagens e dificuldades do trabalho em equipa no contexto


escolar;

• Perspectivar novas formas de articulação com as famílias.

Conhecimentos, capacidades e atitudes a desenvolver

No final deste capítulo, o formando deve ser capaz de:

• Definir as características de uma cultura de colaboração entre o corpo


docente;

• Identificar formas de dinamização e regulação do trabalho em equipa;

• Identificar processos de articulação com os docentes de apoio educativo;

• Reflectir sobre os processos de inserção numa equipa multidisciplinar;

• Reconhecer o papel das famílias no processo escolar;

• Conhecer os principais problemas das famílias com crianças e jovens


com necessidades educativas especiais;

• Identificar alguns processos de articulação com as famílias.

Temas a desenvolver

1. Colaboração e trabalho de equipa na escola (entre professores; em


equipas pluridisciplinares)

2. Articulação escola-família dos alunos com necessidades educativas


especiais
Colaboração e trabalho em equipa na escola

"Cada escola deve ser uma comunidade, conjun-


tamente responsável pelo sucesso de cada aluno. É
a equipa pedagógica, mais do que o professor
individual, que se deve encarregar da educação das
crianças com necessidades educativas especiais."

Art.° 37• 0 da Declaração de Salamanca, 1994

A diversidade da população escolar actual e a inclusão de alunos com


necessidades educativas especiais obrigaram a reestruturações ao nível da
organização da própria escola e, sobretudo modificações nas formas tradi-
cionais de trabalho dos docentes a nível institucional. EStas reestruturações
foram sendo assumidas gradualmente pelas escolas da rede pública, em tempos
e a níveis diferentes conforme as suas próprias características organizacionais
e as características do meio em que se inserem.

Como vimos no capítulo anterior, a autonomia dos estabelecimentos escolares' ' Entre outros textos legais,
o Decreto-Lei 43/89 estabe-
é uma condição prévia para o ajustamento destes às situações concretas, na lece o regime jurídico das
escolas do 2° e 3° ciclos do
diversidade que apresentam, e incide sobre aspectos organizativos e ensino básico e do ensino
administrativos, mas também sobre aspectos curriculares. Nos sistemas educa- secundário e o Decreto-Lei
172/91 o regime de direc-
tivas tradicionalmente centralizados, como o português ou o espanhol, a ção, administração e gestão
transição para um modelo mais descentrado (ou, pelo menos, desconcentrado) dos estabelecimentos de
educação pré-escolar e dos
não tem sido fácil, já que, por um lado, o poder central tende a preservar as ensinos básico e secundário.
suas competências ao nível das iniciativas educativas, quanto mais não seja
através da excessiva burocratização processual que exige às escolas para a
tomada de decisões; e, por outro lado, as escolas, enquanto organizações, e os
professores, enquanto profissinais, não têm hábitos de decisão e responsa-
bilização e tendem a ficar à espera de directrizes centrais para resolver os
problemas que lhes surgem.

De facto, um processo de autonomização, nas organizações como nas pessoas,


não se cria apenas por força de lei: exige tempo, tem avanços e recuos, momentos
de grande iniciativa e momentos de aparente inércia. Na verdade, a tendência
para a estabilidade, numa instituição, é sempre maior que a tendência para a
mudança, e este aspecto torna-se particularmente relevante quando essa
instituição é pública e os seus trabalhadores se vêm como funcionários (Zabalza,
1999). Existem, assim, escolas mais dinâmicas (por imperativos da população
que as frequenta e cla comunidade que servem, por características do corpo
docente ou devido a outros factores) e escolas mais estáticas, sendo possível,
hoje, identificar diferentes níveis de capacidade de iniciativa das escolas, os
quais correspondem aos seus próprios percursos corno instituições.

127
Uma das consequências da autonomia das escolas é a necessidade de avaliação
das próprias instituições. Com efeito, o estado tem um compromisso perante a
sociedade ,J10 que respeita à educação dos seus jovens e há que verificar e
controlar de que forma e com que resultados esse serviço está a ser prestado
pelas instituições que dele dependem ou que legitimou para esse efeito.

Cada escola tem que encontrar, então, caminhos para o seu próprio
desenvolvimento institucional, por referência às condições concretas da
comunidade que serve, sem perder de vista os objectivos da educação a nível
nacional, submetendo-se a mecanismos de avaliação e controle da qualidade
a nível interno e externo.

Para que as escolas públicas assumam plenamente a singularidade da sua


situação e a tomada das decisões institucionais, é necessário que se passe,
como constata Barroso (1999) da "autonomia individual à autonomia
colectiva". De facto, dentro da sala de aula, os professores sempre mantiveram
um razoável grau de autonomia, apesar da rigidez dos programas oficiais. No
entanto, fora da sala sala de aula, no espaço da organização escolar, não temos
tradições de funcionamento colectivo que, em boa verdade, era desnecessário
face à regulamentação exaustiva emanada do poder central.

Actualmente, exige-se que, em cada escola, os professores criem orientações


internas, tomem decisões, proponham iniciativas e resolvam problemas que
não se referem apenas à sua sala de aula, mas a toda organização escolar.
Estes processos terão que ser levados a efeito colectivamente e, para tal, será
necessário desenvolver, no corpo docente e com todos os parceiros educativos,
uma cultura de aceitação de pontos de vista diferentes, de negociação e de
procura de acordos.

Por outro lado, perante a complexidade das problemáticas que actualmente


existem na população escolar e a diversidade de papéis que são conferidos ao
professor, a colaboração entre os profissionais, dentro da escola, é uma condição
para a eficácia desta.
O termo equipa surge,
aqui, na sua acepção mais Neste sentido, o trabalho ern equipa 2
dentro da escola é, mais do que um
simples: um grupo de pes- princípio orientador, uma necessidade actual.
soas e ncarregadas de uiri tra-
halho ein CO11111111.
No interior dos estabelecimentos escolares, o trabalho em equipa pode ser
perspectivado em sentido restrito ou em sentido mais amplo. Perrenoud (2000)
estabelece quatro níveis de trabalho em equipa. Num primeiro nível, a que
chama "pseudo-equipa",
trata-se simplesmente de coordenar o uso dos recursos
existentes no espaço da escola. O segundo nível pressupõe já a troca de
con hecimentos e de ideias, que pode contribuir para um certo ajustamento de
inguagens e de referentes. No terceiro nível, existe a partilha das práticas e,
eve
ntualmente, a sua coordenação para o desenvolvimento de processos
interdisciplinares. E o quarto nível configura um verdadeiro trabalho em equipa,
caracterizando-se por uma co-responsabilização por parte de todos os
professores.

Este último nível pressupõe que a colaboração faça parte das competências
profissionais dos professores. A colaboração pode ser entendida como um
princípio aglutinador e integrador da planificação e da acção num
estabelecimento escolar, favorecendo o desenvolvimento de umacultura própria
e permitindo, designadamente:

- partilhar problemas e apoiar a tomada de decisões;


eliminar a duplicação e redundância de tarefas e actividades;

melhorar a qualidade do ensino e da aprendizagem dos alunos;

partilhar o trabalho e as pressões decorrentes da complexificação do


papel do professor;
reduzir as incertezas anível pedagógico, numa fase de mudanças;

- partilhar perspectivas e aumentar a confiança em situações de inovação;

- desenvolver processos de "feed-back" e comparação de práticas entre


pares;
articular competências diferentes, permitindo respostas adequadas e
rápidas (Hargreaves, 1998).
Mas o trabalho em equipa é um processo lento e gradual, que requer esforço e
envolvimento. Implica o questionamento de crenças, valores, conhecimentos
e capacidades pessoais e profissionais, a consciência da inevitabilidade de
dificuldades e de problemas nas relações inter-individuais e ainda o
reconhecimento da incerteza do próprio saber, adequando os juízos a essa
incerteza. Por isso, muitas vezes a colaboração surge como um princípio de
base que se defende, mas que, na prática, não se procura desenvolver.

Com efeito, uma verdadeira cultura de colaboração numa escola tem que ser
voluntáriarnente decidida por todos os intervenientes, isto é, não pode ser
centralmente definida e regulamentada para aplicação nas escolas e, nestas,
não pode implicar o domínio de um grupo sobre os restantes, para evitar
problemas, confrontos ou prolongamentos de tempo de reuniões. Hargreaves
(1999) mostra alguns dos riscos em aceitar a colaboração como urna "moda",
desenvolvendo aquilo a que chama uma "colegialidade artificial": um processo
confortável e complacente, de cariz marcadamente conformista perante qualquer
tipo de inanipulação e aquiescente face a tomadas de decisão minoritárias, por
desistência de confrontos.

I 29
Pelo contrário, a cultura colaboratíva numa instituição requer a participação
igualitária dos vários profissionais, a decisão consensual na resolução de
problemas comuns, a partilha de responsabilidades e alguma flexibilidade de
papéis. Efectivamente, a equipa tem não só um trabalho conjunto de
intervenção sobre a situação educativa, mas também um trabalho de intervenção
sobre si própria, enquanto grupo.

Em última instância, o funcionamento de uma equipa pedagógica dependerá


sempre da maturidade dos professores que a constituem. No entanto, não é
razoável partir do princípio que todos os professores de uma escola, com idades
e anos de docêncía tão diferentes entre si, possuem maturidade pessoal e
profissional suficientes para lidar do melhor modo com as situações de grupo,
nas quais se jogam diferentes interesses, perspectivas e expectativas. Assim, é
necessário desenvolver, no próprio processo de trabalho em equipa, as
competências necessárias para a evolução pessoal e colectiva dos seus
elementos.

Para a eficácia de um trabalho colaborativo entre professores, há que ter em


conta alguns factores básicos, a saber:

o trabalho sobre problemas concretos da prática profissional;


- o desenvolvimento de capacidades de comunicação e negociação;

- a coordenação do trabalho e das reuniões;

- a reflexão conjunta sobre a intervenção;

a formação contínua centrada na escola.


A discussão de e sobre problemas concretos
é essencial, porque é ela que
permite a centração em objectivos (comuns) e não em posições (diferentes).
Efectivamente, se a discussão recai sobre as posições individuais, é muito
difícil superar as diferenças de perspectivas forçosamente existentes; pelo
contrário, se a discussão se centrar no problema ou situação comum a resolver,
sempre possível encontrar pontos de acordo. A focalização em situações
concretas permite ainda separar as pessoas das posições que assumem ou das
representações que sobre elas se formaram, uma vez que o outro surge como
um aliado na procura de uma solução eficaz.

Neste processo, os professores desenvolvem formas de comunicação e de


negociação que são hoje competências profissionais imprescindíveis.
E videntemente, os professores tem um vasto reportório a este nível que faz
parte da própria essência da profissão. No entanto, essas competências foram
sempre exercidas na relação pedagógica que é, por definição, uma relação
as
simétrica, enquanto o desenvolvimento de urna cultura colaborativa na escola

I 10
implica o seu exercício com pares, o que constitui uma situação nova para
muitos professores.

Para regular os debates, numa reunião, será sempre necessário um coordenador


e esta é também uma função nova, até mesmo pâra aqueles que j á exerceram
cargos de gestão. De facto, as funções dos directores e/ou presidentes dos
conselhos directivos ou executivos, nas escolas, foram, durante muito tempo,
essencialmente administrativas, senão mesmo burocráticas. Ora o coordenador
de um determinado projecto, trabalho ou reunião (exerça ou não funções de
chefia dentro da instituição) tem que conseguir observar e interpretar as várias
situações que se desenvolvem em grupo, o que pressupõe alguma capacidade
de distanciação para poder fazer pontos da situação em momentos de impasse
ou de ruptura. Tem ainda que intervir, quer sobre os processos de organização
da equipa, quer sobre os processos de comunicação que atrasam ou influem
na procura de uma solução para o problema em análise (sem que a sua
intervenção constitua, ela própria, um outro problema).

Ao coordenador cabe, ainda, a gestão de conflitos, porque os conflitos são


parte integrante do próprio trabalho em equipa e, muitas vezes, um factor
decisivo para a clarificação de questões, constituindo marcas de evolução
qualitativa, quando bem resolvidos. Por outro lado, transformar qualquer
pequena divergência em conflito também não é rentável em termos do trabalho
em equipa e é nesta regulação interna das situações em busca de um equilíbrio
que se joga o papel do coordenador e a eficácia do trabalho em equipa.

Uma boa gestão do trabalho em equipa exige, para além do coordenador, a


co-responsabilidade de todos os participantes, nomeadamente através de
competências colectivas de auto-regulação em situações de debate. Em alguns
países, como o Canadá, criaram-se, nas escolas, "equipas de resolução de
problemas", formadas pelos docentes da escola e que têm como objectivo o
desenvolvimento da interajuda para a resolução de problemas surgidos nas
salas de aula (nomeadamente os relativos aos alunos com necessidades
educativas especiais), através de uma abordagem estruturada e eficaz em termos
de resultados e de tempo. Assim, o professor apresenta o problema, para o
qual a equipa sugere soluções possíveis, de entre as quais o professor escolhe
aquela que lhe parece mais adequada ao caso. Um dos docentes pode ficar
responsável pelo apoio mais continuado a esse colega e a equipa volta a reunir-
-se para avaliar os progressos verificados (Porter, 1997).

A capac idade, indivklual e colectiva de reflexão sobre a intervenção decorre


dessa responsabilidade assumida e partilhada. Impl ica que, perante as situações,
por muito urgente que seja a sua resolução, não se comece imediatamente a
agir, sem analisar a realidade e procurar as estratégias adequadas; implica
também que, no decurso da acção, se avalie o que se fez e se reformule o
plano original, quando necessário. A complexidade das situações actuais exige

131
que sejam tidos em conta factores diversos e que as decisões sejam ponderadas.
Há um equilíbrio que as equipas têm que encontrar entre a actividade (que as
mantêm coesas e eficazes) e a análise dessa actividade (sem a qual a acção se
reduz a um conjunto de tarefas mais ou menos planeadas).
Finalmente, a formação centrada na escola é um processo decorrente da
prática profissional que articula a organização da formação com a organização
da intervenção, facilitando o desenvolvimento de inovações. Consiste,
essencialmente, na resposta a dificuldades concretas em contextos específicos
e, nesse sentido, o seu ponto de partida é a identificação dos problemas que
surgem, inevitávelmente, nas escolas, planeando-se a formação de modo a
que esta constitua um suporte para a resolução desses problemas. O
desenvolvimento profissional do professor deixa, assim, de ser um processo
individual de formação contínua (através, por exemplo, da frequência de acções
de formação, seleccionadas face à oferta de uma determinada instituição) e
transforma-se num processo de desenvolvimento colectivo da equipa
pedagógica de determinada escola. Este tipo de formação pressupõe, então,
um contrato entre a escola e a instituição de formação, com base num pedido
concreto por parte da primeira.

O trabalho em equipa numa perspectiva colaborativa é essencial no atendi-


mento a alunos com necessidades educativas especiais. De facto, os resultados
dos estudos que se debruçaram sobre as necessidades dos professores para
dar resposta aos alunos com necessidades educativas especiais (Vieira, 1994;
Madureira, 1997; Leite, 1997, entre outros), mostram que a colaboração entre
os vários agentes educativos (pais, professores do ensino regular, professores
de apoio educativo, técnicos especializados) é um dos factores essenciais quer
para o desenvolvimento de uma atitude positiva face aos alunos com
necessidades educativas especiais nas escolas e nas turmas, quer para os
resultados obtidos por esses alunos na escolaridade.

Neste âmbito, há que destacar a necessidade de colaboração entre os


professores do ensino regular e os docentes de apoio educativo.

Em alguns países, os docentes de apoio educativo são designados como


"professores de métodos e recursos" e actuam como consultores de apoio à
escola e aos professores das classes (Porter, 1997). Estes professores não são,
forçosarnente, especialistas, mas professores experientes do ensino regular,
considerados competentes pelos colegas para os ajudar a definir soluções
adequadas aos problemas que surgem nas salas.

Em Portugal, como vimos no primeiro capítulo, os doeentes de apoio educativo


que, nos primeiros tempos da integração dos alunos com necessidades
educativas especiais, eram elementos de alguma forma marginais às escolas,
onde surgiam apenas duas ou três vezes por semana para dar apoio a

I 312
determinado aluno, passaram, nos últimos anos, a fazer parte do corpo docente
de cada estabelecimento.
Segundo o Despacho 1051
As actuais funções do professor de apoio 3 são as seguintes: 97.

1) em relação à escola:

- colaborar na sensibilização e dinamização da comunidade educativa


para os direitos dos alunos com necessidades educativas especiais no
ensino regular;

- participar na elaboração do Projecto Educativo de Escola e do Plano


de Actividades desta, nomeadamente no que respeita à identificação e
acompanhamento dos alunos com necessidades educativas especiais;

- colaborar na organização de processos e actividades de apoio às


aprendizagens, promovidos pela escola para todos os alunos (centros
de recursos, bibliotecas, clubes de leitura, etc);

identificar, em colaboração com os restantes orgãos da escola, as


soluções mais adequadas à criação de um ambiente de aprendizagem
que promova a igualdade de oportunidades.

2) em relação a equipas pluridisciplinares:


colaborar na articulação de todos os serviços e entidades que intervêm
no apoio aos alunos com necessidades educativas especiais.

3) em relação aos docentes:


colaborar na identificação de necessidades de formação dos professores
da escola, com vista ao desenvolvimento efectivo da diferenciação
pedagógica;

- apoiar os docentes na concepção e implementação de estratégias que


facilitem a gestão de grupos heterogéneos e, especificamente, na
planificação do trabalho a realizar com a turma, tendo em conta os
alunos com necessidades educativas especiais;

- colaborar com os docentes da turma na construção e avaliação de


programas individualizados.

4) em relação aos auxiliares de educação:


enquadrar os auxiliares de acção educativa, ajudando a compreender
as necessidades pedagógicas, técnicas e sociais destes alunos;

133
3) em relação aos alunos com necessidades educativas especiais:

colaborar na organização do processo de apoio aos alunos com


necessidades educativas especiais (identificação de necessidades e
modalidades de apoio a implementar para cada caso);

prestar apoio directo ao aluno com necessidades educativas especiais,


sempre que as características deste o justifiquem (nomeadamente nos
casos em que são necessárias técnicas ou linguagens alternativas ou
equipamento específico).

Como se pode verificar, o papel do professor de apoio na escola abrange


vários níveis organizativos e funcionais que permitirão uma melhor inserção
do aluno com necessidades educativas especiais na escola e no currículo,
fornecendo apoio directo ao aluno apenas quando este for absolutamente
necessário.

O professor de apoio constitui, então, o interlocutor privilegiado do professor


do ensino regular e a colaboração entre os dois, num trabalho em equipa
estruturado, é fundamental para o sucesso escolar e/ou social dos alunos com
necessidades educativas especiais e de outros alunos em situações de risco.
Este trabalho inclui a partilha de informação (análise conjunta dos resultados
da avaliação inicial, avaliação contínua do processo desenvolvido e dos
resultados obtidos); a partilha de decisões (elaboração de adaptações
curriculares, estratégias de diferenciação na sala de aula, modalidade de apoio
ao aluno) e ainda a partilha de responsabilidade.

A colaboração entre o professor dç apoio e o educador ou o(s) professor(es)


da turma comporta, assim:

o apoio à actividade docente (planeamento, avaliação, reformulação);


- o eventual apoio directo ao aluno, dentro da sala de aula e em simultâ-
neo com as actividades lectivas da turma;

- o eventual apoio directo ao aluno, fora da sala de aula e em comple-


mento ao trabalho nesta desenvolvido.

O trabalho do professor de apoio, por sua vez, enquadra-se nas orientações da


equipa de coordenação dos apoios educativos (ECAE) da zona em que a
escola se insere. Estas equipas têm como funções:

a articulação entre as escolas da sua zona e a intervenção ao nível das


comunidades e das instituições e serviços nela existentes, nomeada-
mente através da sensibilização e informação da comunidade local,
mobilização de recursos locais (saúde, segurança social, autarquias,
qualificação profissional, instituições particulares e cooperativas) e
134
apoio aos processos de transição dos alunos para diferentes escolas,
diferentes níveis de ensino e para a vida activa;
a colaboração e apoio aos orgãos de gestão e de coordenação pedagógica
das escolas e agrupamentos de escolas, com o fim de garantir o planeamento
e a organização dos apoios educativos, a comunicação entre os docentes
de apoio e os orgãos de gestão das escolas ou agrupamento de escolas
e fazer o levantamento das necessidades de equipamento e materiais;
a gestão pedagógica de serviços especializados de apoio educativo
afectos às escolas da zona abrangida pela ECAE, promovendo reuniões
periódicas para discussão do trabalho desenvolvido e sessões de
formação que fundamentem os projectos em curso, orientando os
docentes de apoio a nível técnico e científico, gerindo e rentabilizando
os recursos especializados e recolhendo os dados relativos às necessi-
dades das escolas, no que respeita a docentes de apoio.
A acção destas equipas é desenvolvida não apenas a nível dos apoios educativos
à escolaridade, mas também em relação à intervenção precoce e à transição
para a vida adulta. Nesta perspectiva, as equipas de coordenação dos apoiós
educativos estabelecem parcerias com autarquias, serviços de educação (oficial,
particular, cooperativa e de solidariedade social), serviços de saúde, trabalho e
assistência social e ainda com equipas locais de educação de adultos.
A mobilização dos recursos locais para apoio às escolas e aos alunos com
necessidades educativas especiais pode exigir que os professores e educadores
façam parte de equipas que integram técnicos de saúde, psicologia e assistência
social, para além dos professores de apoio. Constituem-se, assim, equipas
pluddiseiplinares, formadas por vários técnicos com formações e funções
diferentes. Ainda não muito frequente nas escolas da rede pública, este tipo de
Como as Cooperativas de
equipas funciona actualmente sobretudo nas instituições de educação especial4 Ensino e Reabilitação de
e nas salas de apoio para alunos com deficiências acentuadas, algumas situadas Crianças Inadaptadas
(C.E.R.C.I), as Associações
no espaço das escolas públicas. de Pais e Amigos do Cida-
dão com Deficiência Men-
Formadas por terapeutas, psicólogos, assistentes sociais, médicos, educadores tal (A.P.A.C.D.M.) e os
Centros de Paralisia Cere-
e professores, estas equipas confrontam-se com problemas específicos que bral, entre outros.
decorrem de diferenças de formação e linguagem e se refiectem, por sua vez,
em divergências quanto a prioridades de intervenção e a orientação de casos.
Cada técnico tem tendência a escudar-se nos seus próprios conhecimentos e
estatuto profissional e a equipa ressente-se da impessoalidade das interacções
e de uma escassa produção de trabalho em grupo. De facto, encontramos, em
muitas equipas pluridisciplinares, uma mera justaposição das intervenções dos
diferentes técnicos, que não se articulam entre si quer para o apoio aos alunos,
quer para o apoio às famílias. Este tipo de procedimento reduz muito a eficácia
da intervenção e torna-se extremamente confuso para as famílias, sobretudo
nos casos de deficiência grave ou multideficiência.
135
De facto, as equipas pluridisciplinares deveriam caminhar no sentido de uma
progressiva dinâmica de confronto de conhecimentos, experiências, técnicas
e opiniões que pode levar ao desenvolvimento de processos inovadores ao
nível da avaliação inicial dos casos e do planeamento e análise da intervenção.
Para tal, será necessária a centração sobre as necessidades concretas do aluno
e das famílias, a partilha das decisões e das responsabilidades e, mais uma
vez, processos de liderança eficazes.

Também para as equipas plutidisciplinares podemos definir níveis de apro-


fundamento do trabalho em colaboração. Orelove e Sobsey (1991) estabelecem
uma classificação do tipo de equipas quanto ao processo de trabalho, que
pode ser sintetizada da forma seguinte:

Quadro 6 — Tipo de equipas quanto ao processo de trabalho

Áreas Multidisciplinar Interdisciplinar Transdisciplinar


Processo de avaliação Cada técnico Cada técnico indi- Planeada em conjunto e
inicial vidualmente vidualmente com a participação da
família
Comunicação entre Informal Reuniões periódi- Reuniões regulares: troca
técnicos
cas: troca de infor- de informações, conheci-
mação mentos e técnicas
Comunicação com as Separadamente Toda a equipa ou Um elemento da equipa é
famflias
um seu represen- responsável pela imple-
tante mentação do plano junto
da família
Planos de intervenção Próprios Próprios, mas parti- Em conjunto e ouvida a
lhados família
Responsabilidade pela Apenas na sua área Apenas na sua área Conjunta
intervenção

Formação contínua Apenas na sua área Apenas na sua área Componente das reuniões
da equipa

Adaptado de Woodruff e McGonigel, 1988. in: Orelove e Sobsey, 1991.

Assim, uma equipa do tipo multisciplinar é constituída por um conjunto de


pr ofissionais com formações diferentes e funções específicas, os quaís
d esenvolvem processos de intervenção proprios com cada caso, comunicando
entre si de modo informal. Enquanto grupo, a sua intervenção constitui um
conjunto de acções justapostas e sem relação entre si.

136
Numa equipa que funcione em termos interdisciplinares existe j á a articulação
de funções entre os profissionais, o que implica a formalização de tempos e
espaços específicos para troca de informação (relativa à avaliação inicial e à
intervenção) e, eventualmente, a escolha de um profissional que represente o
grupo junto da família.
Finalmente, numa equipa com um modo de funcionamento transdisciplinar
existe não apenas a partilha de informação, mas também de decisões sobre a
intervenção (e dos fundamentos que estão na origem dessas decisões), sendo
a equipa, no seu conjunto, co-responsável pelo pelo atendimento ao aluno e à
sua família. Este nível de partilha exige uma dinâmica de confronto de
conhecimentos entre os profissionais envolvidos, através de uma reflexão
sistemática sobre o trabalho desenvolvido. Implica, portanto, uma comunicação
aberta e estratégias de negociação colaborativas.
Uma equipa que funcione de modo transdisciplinar poderá ainda contribuir
para o enriquecimento das funções de cada técnico, através da compreensão
da terminologia e práticas básicas das outras áreas, de modo a poder:
reconhecer que certo aluno necessita de uma intervenção específica
em determinada área (por exemplo, encaminhar um aluno para a terapia
da fala, se forem detectados indicadores dessa necessidade);
aplicar alguns procedimentos básicos de outras áreas, necessárias ao
trabalho quotidiano e sob a supervisão do técnico respectivo (por
exemplo, técnicas de postura para alunos com deficiências motoras
graves);
apoiar os outros elementos da equipa e ser por eles apoiado.
Este trabalho exige, como focámos antes, uma reflexão sistemática não apenas
sobre a intervenção, mas também sobre o funcionamento da própria equipa,
desenvolvendo estratégias de negociação nas discussões dos casos e de
colaboração na resolução de problemas. A grande vantagem dum processo
deste tipo é a compreensão global do aluno com necessidades educativas
especiais, permitindo a análise da situação como um todo e não como a soma
de várias partes, cada uma atendida por um especialista diferente, por vezes
com orientações contraditórias entre si.
Em síntese, a complexidade da população escolar actual exige o desenvol-
vimento de formas de articulação entre os professores da mesma escola e entre
estes e os diferentes profissionais que agem na área educativa (técnicos de
educação, saúde e assistência soc ial). A colaboração entre profissionais é, assim,
uma necessidades das escolas com vista ao desenvolvimento de respostas
elicazes e criativas às situações que se lhes deparam. Enquanto cultura
organizacional, a colaboração configura o desenvolvimento de atitudes

137
profissionais e de competências específicas para um efectivo trabalho em equipa
e cria, ainda, as bases para a articulação com outros parceiros educativos,
como veremos no ponto seguinte.

4.2 Articulação escola-família dos alunos com necessidades


educativas especiais

Uma breve análise da evolução da articulação escola-família mostra que,


durante muito tempo, estas duas entidades se mantiveram separadas,
correspondendo a uma perspectiva social e educativa que encarava a evolução
da criança e jovem como um processo sequencial de integração em contextos
progressivamente mais abrangentes. Assim, a primeira integração da criança
processava-se no contexto familiar restrito e, mais tarde, no contexto escolar,
o qual se ia alargando conforme o aluno transitasse para níveis superiores de
escolaridade, até se integrar, finalmente, no contexto comunitário, com a
iniciação profissional e a passagem para a vida activa. Durante este processo,
a relação entre a família e a escola era constituída por uma troca mínima de
informações, que ocorria essencialmente quando se detectavam problemas.

A inserção das crianças desde muito novas em creches e jardins de infância, a


criação de ateliers de tempos livres e outras actividades extra-escolares para
acompanhamento das crianças e ainda a influência dos media, entre outros
factores, vieram modificar este quadro, obrigando a reequacionar a articulação
entre os diferentes contextos educativos.

Na década de setenta, o modelo ecológico (ou modelo embutido) veio modi-


ficar esta visão, mostrando que os vários ambientes em que a criança se
desenvolve não funcionam isolada ou sequencialmente, mas antes inte-
gradamente.

Segundo Bronfenbrenner (1979), o indíviduo é um sujeito activo que participa


no seu próprio d esenvolvimento, reorganizando-se e reestruturando-se
constantemente, em interacção com o meio, num processo de influência mútua.
O meio que se considera relevante para o processo de desenvolvimento do
indivíduo, por sua vez, não se limita ao ao contexto imediato, mas engloba as
interacções entre contextos próximos e outros, mais distantes do indivíduo,
mas que vêm a ter influências sobre o primeiro.

Este modelo perspectiva os diferentes contextos ou ambientes como um


conjunto de estruturas concêntricas em que cada um se encaixa dentro de
outro mais amplo, todas eles interagindo uns com os outros e com a criança, a
qual, por sua vez, interage também com esses ambientes, num processo
dinâmico de inter-influências e modificações mútuas. Assim, o ambiente rele-
vante para a criança, por muito pequena que ela seja, não é apenas o mais
imediato (a casa ou a escola), engloba também as inter-relações desses contextos
com outros, mais abrangentes (o emprego dos pais, os serviços de saúde, os
média).
Bronfenbrenner (1979) define quatro níveis estruturais que compõem o
ambiente ecológico: o microssistema, que pode ser definido como o ambiente
imediato da criança (casa, escola, jardim, rua, igreja); o mesossistema, que
inclui as relações entre os contextos em que a criança participa (interacções
entre os elementos da família, entre a famfiia e a escola, entre a família e os
arnigos); o exossistema, que engloba contextos em que a criança não participa
activamente, mas no qual ocorrem situações que influenciam ou são
influenciadas pelo contexto imediato em que a criança se encontra (o emprego
dos pais, o conselho directivo da escola, o sistema dos meios de transporte) e
o macrossistema, que se refere à cultura em que os restantes contextos se
inserem, enquadrando valores, atitudes, procedimentos. Segundo este autor, o
indivíduo, durante a vida, vai fazendo transições ecológicas entre diferentes
contextos e essas transições, que podem ocorrer em qualquer das estruturas
referidas, são a base do processo de desenvolvimento.

Na década de oitenta, Epstein (1990, cit. in: Silva, 1997) desenvolveu uma
tipologia de colaboração escola-família que decorre dà definição das áreas e
funções de cada um dos contextos em que a criança se insere, prevendo no
entanto, sub-áreas de sobreposição entre eles.

Neste sentido, família e escola têmcampos específicos de actuação e obrigações


básicas que lhes são próprias, mas também áreas de sobreposição da inter-
venção. Assim, a farmlia participa nas acções promovidas pela escola (acções
de apoio às famílias e acções respeitantes a currículos e progressão dos alunos);
em trabalho voluntário na escola (participação em festas ou mesmo em
actividades na sala de aula); na orientação e ajuda para a realização de trabalhos
escolares em casa; e nos orgãos de administração da escola, nos termos da lei.

Toda a investigação realizada sobre esta temática tem demonstrado que a


colaboração entre a família e a escola tem repercussões positivas no
aproveitamento escolar e comportamento dos a1unos, qualquer que seja o grau
de ensino e o grupo social em que a família se insere. As experiências directas
de implicação e envolvimento dos pais na vida escolar dos filhos, levadas a
efeito quer através da solicitação de uma maior participação dos pais nas
actividades da turma ou da escola (por exemplo, falando da sua actividade
profissional), quer através de programas específicos de acompanhamento em
casa (por exemplo, lendo duas vezes por semana para os filhos), mostram um
aumento significativo dos resultados escolares destes alunos, em relação àqueles
que não estiveram sujeitos a este tipo de trabalho (Marques, 1977).
1 19
Para além destas vantagens óbvias, o envolvimento dos pais na escola é hoje
uma necessidade que decorre também da diversidade dos públicos que
frequenta a escolaridade obrigatória. Quando as sociedades eram mais
homogéneas, a continuidade entre os valores e as tradições culturais da escola
e da família era assegurada de forma natural. Actualmente, para muitos grupos
sociais, existe uma descontinuidade entre a escola, transmissora de uma cultura
padrão, e as famílias com origens e hábitos diferentes, o que provoca
dificuldades de adaptação e de integração em alguns alunos, levando-os a
rejeitar ou ignorar quer o tipo de informações, quer o tipo de comportamentos,
Nos casos em que a articu- que a cultura escolar exige e valoriza5.
lação escola-família se tem
mostrado particularmente
difícil devido a questões Neste sentido, nas últimas décadas, as concepções e as práticas têm evoluído
étnico-culturais, instituiu-se
a figura do mediador, indi- com vista a uma maior articulação entre estas duas entidades, procurando-se,
víduo pertencente à comu- por uma lado, um efectivo envolvimento das famílias na situação escolar dos
nidade de origem de deter-
minados alunos e com for- filhos e, por outro, um maior conhecimento, compreensão e acompanhamento
mação suficiente para de- da escola em relação às situações sociais e familiares dos alunos.
senvolver a troca de infor-
mações de forma eficaz.
Em Portugal, como noutros países, assistiu-se a um reforço da colaboração
dos pais na escola, decorrente, por uma lado, da constatação das vantagens
pedagógicas que daí advêm e, por outro, das reivindicações dos próprios pais
em relação ao seu direito de participação na organização escolar, como
contribuintes e utilizadores de um serviço público.

Assim, os pais participam hoje, através das associações próprias, na definição


da política educativa, na gestão e funcionamento da escola e são parceiros
activos nas decisões relativas à escolaridade dos seus filhos.
Entende-se por parceria
A noção de parceria6 escola-fanulia
"uma aliança Inrmal e um desenvolvida nas últimas décadas, implica
acordo tymtratual no senti-
do de se trabalhar para ob-
a noção de educação participada por todos os agentes educativos. Junto da
jectivos eomuns e de parti- escola, os pais desenvolvem:
lhar benefícios de um inves-
timento matuo" (Epstein,
1992). uma acção individual, que se exerce directamente junto do educador,
professor ou director de turma e se relaciona directamente com o
ac ompanhamento do percurso escolar do seu filho (reuniões, apoio
em casa), implicando também o envolvimento em actividades
realizadas em colaboração (festividades, visitas de estudo, etc.);

uma acção social e cívica, que se exerce nos orgãos de gestão da escola
(através dos representantes dos pais) e se relaciona com a co-
re sponsabilização pelas orientações da escola, com vista à articulação
das práticas educativas (Barroso, 1995).

Em relação ao primeiro tipo de acção, uma das formas de participação mais


usada é a reunião entre o professor (ou educador ou director de turma) e os
pais. No entanto, estas reuniões nem sempre têm os resultados previstos, o

I tO
que se deve, em grande parte, a falhas no planeamento e orientação destas.
Efectivamente, muitos docentes apresentam dificuldades em seleccionar, por
exemplo, os tópicos que devem ser abordados em reuniões gerais e aqueles
que só podem ser referenciados em reuniões individuais, o que dá origem a
situações de mal-estar e a problemas de comunicação dificeis de ultrapassar
(por exemplo, abordando, em público, as dificuldades escolares ou o
comportamento de determinado aluno). Nesta perspectiva, apresentamos no
quadro seguinte as várias etapas a considerar no planeamento, orientação e
avaliação das reuniões com os pais, individuais e/ou colectivas.

Quadro 7 Etapas na realização de uma reunião de pais

A) Preparação da reunião

1. Notificação das famílias ( inclui assegurar uma resposta)

2. Planeamento da reunião

- de reunião geral

• preparar uma OT simultâneamente estruturada, completa


e flexível

• consultar (ou preparar com) os outros profissionais impli-


cados

• planear cuidadosamente a abordagem dos tópicos mais


sensíveis ou perturbadores

de reunião individual

• seleccionar o que pode ser abordado em reunião geral e


o que é de carácter individual

• rever os registos efectuados sobre a criança


assegurar que foram avaliadas as áreas mais problemáticas

recolher exemplos de trabalhos da criança

3. Preparação do ambiente físico (escolher o local mais apropriado


— providenciar um mínimo de conforto e de privacidade)
(cont.)

141
B) Actividades da reunião

1. Desenvolvimento de um ambiente propício

assegurar algum tempo de contacto informal antes do início


da reunião

apresentar os participantes uns aos outros


agradecer a participação dos pais

2. Troca de informações

em reunião geral

Relembrar o objectivo da reunião e as questões a debater,


fornecendo alguma informação

Moderar o debate de forma a que:

• todos se possam expressar


• os tópicos se mantenham de interesse geral
• não se entre em diálogo

Intervir no debate em relação a:

• questões pelas quais o prof. é directamente responsável


• questões pelas quais o prof. é indirectamente responsável

- em reunião individual

Fornecimento de informações pelos pais

• fazer perguntas abertas em número suficiente


• usar expressões faciais e posturais incentivadoras da
comunicação

• pedir para clarificar questões pouco explícitas

Fornecimento de informações aos pais

• falar de forma tão positiva quanto possível sobre a criança


• usar uma linguagem clara e acessível
• recorrer a exemplos para clarificar

(con t.)

1 42
3. Síntese da reunião
rever os pontos mais importantes
assegurar quem é o responsável por cada uma das medidas
pensadas
finalizar a reunião com uma nota positiva

C) Avaliação e consequência s da reunião

1. Fazer uma acta ou memorando da reunião

2. Fazer uma síntese da reunião para o(s) aluno(s)

3. Partilhar os resultados com outros profissionais

4. Dar seguimento às decisões tomadas

Adaptado de Turnbull, A. P. e Turnbull, H. R. (1990)

Quanto à segunda forma de acção atrás mencionada (acção social e cívica),


dos pais na orientação e gestão da escola, através
esta implica o envolvimen to
formal nos orgãos competentes para o efeito. A noção de
da sua representaçã o
leva ao desenvolvimento de formas de gestão
parceria escola-famíl ia s e ajustados às
participativa, com níveis de concretização diversificado
particularidades de cada contexto escolar.
No entanto, este processo de implicação directa dos pais na escola não tem
sido fácil, sobretudo nos países que não tinham tradições a este nível. Para tal
tem contribuído a falta de condições dadas aos pais para que a sua participação
seja efectiva (horários de reuniões, por exemplo), a ausência de participação
destes nas associações (o que reduz a representatividade dos elementos eleitos),
o desconhecimento de muitos sobre o modo como podem intervir na escola e
entre pais e professores que, por vezes, se
ainda os conflitos de competência s
estabelecem. Norneadamente o Decre-
legislação to-Lei n.° 172191, entre ou-
Em Portugal, a Lei de Bases dos Sistema Educativo e a posterior tros.
, a que já fizemos referência neste capítulo,
relativa à autonomia das escolas 7
143
prevêm a participação dos pais nos orgãos de gestão, através dos seus
representantes, e garantem o direito dos pais a conhecer e acompanhar o
percurso escolar dos filhos.

Estes direitos, consagrados em relação a todas as famílias, são particularmente


importantes no caso dos alunos com necessidades educativas especiais e
sugerem uma mudança efectiva nas práticas desenvolvidas com estes alunos e
com as suas famílias.

De facto, a gravidade de algumas problemáticas, sobretudo quando existiam


deficiências, levava a que os pais delegassem nos especialistas (médicos,
psicólogos, terapeutas, professores de educação especial) as decisões sobre o
encaminhamento pré-escolar, escolar e profissional dos filhos. Por outro lado,
havia uma forte tendência para a culpabilização dos pais, sobretudo no caso
de certas deficiências (como o autismo ou os problemas emocionais graves), o
que aumentava ainda mais a ruptura entre as famílias e as instituições educativas.
A prática era a da elaboração de programas para o atendimento a alunos com
necessidades educativas especiais pelos profissionais, os quais se reuniam com
os pais apenas para fornecer orientações sobre o que deveriam fazer com as
crianças, em casa, não partilhando com estes as opções tomadas.

Tratava-se, assim, de uma abordagem do tipo tutelar, em que os especialistas


prescreviam programas educativos para as crianças e as suas famílias, sem
consultarem estes últimos. Esta ausência de comunicação levava a que muitas
das orientações fornecidas consistissem em normas gerais relativas às
características de determinado tipo de deficiência, não tendo em conta a situação
e as condições concretas de cada família. Como resultado, muitas das
orientações dadas aos pais não tinham qualquer viabilidade prática no quadro
de vida destes.
No art.° 18° do Decreto-
Lei 319/91 afirma-se: "1 -
Actualmente, os diplomas relativos ao atendimento a alunos com necessidades
A avaliação do aluno ten- educativas especiais consagram o direito dos pais a participar em todas as
dente à aplicação de qual-
quer medida do regime
decisões que digam respeito aos seus filhos, sendo os pais considerados como
edueativo especial carece da um recurso fundamental no trabalho com estes alunos8.
anuência expressa do encar-
regado de educação. 2 - Os
e ncarregados de educação Assistiu-se também a um alargamento dos interlocutores significativos,
devem ser convovados para passando a considerar-se a família (o agregado familiar com quem o aluno
participar na elaboração e
na revisão do plano
tem relações próximas) e não apenas os pais (sendo que, na maior parte dos
educativo individual e do casos, a mãe era a única interlocutora da escola). Este aspecto é particularmente
programa educativo." Por
sua vez, o Despacho Con-
relevante no caso dos alunos com deficiências que lhes limitam a autonomia
junto 195/97 considera a pessoal (como é o caso de algumas formas de deficiência motora e da
família como interveniente mu ltideficiência), alunos que requerem atenção e cuidados de todos os
nos Apoios Educativos,
desi g nadamente através da elementos do agregado familiar, no meadamente os irmãos e os avós.
sua implicação no projecto
educativo em que o seu fi-
lho se encontra inserido.
Por outro lado, a família deixou de ser considerada como urna entidade abstracta
para a qual se prescreviam formas de intervenção padrão, iguais para todas as
114
famílias com filhos portadores de determinada deficiência, e passou a ser tida
em conta a situação e condições específicas de cada uma, procurando-se as
melhores formas de cada família se organizar para apoiar a criança ou jovem
com necessidades educativas especiais.

Como consequência, a família deixou de ser analisada por confronto com um


modelo idealizado e considerado desejável, face ao qual todas as famílias
apresentam, inevitávelmente, discrepâncias e carências, durante muito tempo
percepcionadas pelos especialistas como patologias ou disfuncionamentos.
Actualmente, pelo contrário, procura-se encarar cada agregado familiar na
sua singularidade, tendo em conta que a existência de crianças ou jovens com
necessidades especiais provoca nestas famílias, mais do que nas outras, factores
de "stress", devido aos problemas que quotidianamente se impõe resolver.
Neste sentido, o papel dos especialistas (entre os quais os professores e
educadores) não se pode limitar ao fornecimento de orientações gerais e à
exigência de determinado tipo de cuidados que a família deve prestar à criança
ou jovem com necessidades especiais. De facto, a própria família deve ser
acompanhada através de um processo devidamente fundamentado e planeado,
para a definição do qual é necessário conhecer e compreender alguns aspectos
fundamentais, designadamente:
as características da criança ou jovem com necessidades especiais (o
tipo e grau de problema ou deficiência e as implicações destes na
autonomia pessoal),
as características de cada familia (estrutura, tipo de interacções,
condições sócio económicas e culturais),

a idade do elemento com necessidades especiais (a qual dá origem a


diferentes preocupações familiares, consoante o ciclo de vida),

- a aceitação e apoio informal com que a família conta no meio em que


se insere.

Assim, o primeiro factor a considerar será a problemática da criança e as


consequências desta na organização familiar. Com efeito, um fílho com
problemas graves e, sobretudo, com uma deficiência, gera inevitavelmente
desiquilíbrios quer no grupo familiar, quer em cada um dos seus elementos,
individualmente considerados. As reacções dos pais e restantes elementos da
família ao nascimento de um filho deficiente ou ao conhecimento de uma
problemática específica encontram-se amplamente descritas na literatura
especializada, designadamente o choque inicial do conhecimento da deficiência
OU perturbação e a ambivalência de sentimentos que se seguem: culpa, vergonha,
rejeição, negação, superprotecção, auto-abdicação. Durante muito tempo, estas

145
reacções inciais foram encaradas pelos especialistas como desajustamentos e
incapacidades das famílias para lidar com a realidade da deficiência e, nesse
sentido, corno etapas que tinham que ser rapidamente ultrapassadas.
Actualmente, reconhece-se que a aceitação da deficiência de um bebé
longamente idealizado é um processo difícil e que, para além dos problemas
psicológicos que pode criar nos pais, implica efectivamente situações de
complexa resolução no quotidiano das famílias. De facto, as necessidades das
crianças com deficiências acentuadas podem ser um factor de "stress" agravado,
uma vez que:

podem criar dificuldades no quotidiano familiar, devido à falta de


autonomia da criança, decorrente do tipo de deficiência;

podem implicar uma diminuição do nível de vida, devido aos custos


de saúde, terapia e educação que a criança requer;

podem causar problemas de isolamento da família, devido às


dificuldades de mobilidade das crianças pelas características da
deficiência;

- podem criar problemas emocionais em um ou vários dos elementos da


família.

Neste sentido, os profissionais tentam sobretudo ajudar as famílias a resolver


as situações práticas, de modo a que a criança deficiente se possa enquadrar
nas rotinas e condições de vida de cada família sem se tornar um peso excessivo
que, por sua vez, irá agravar os sentimentos iniciais de ambivalência.

Para tal, é necessário conhecer as características próprias de cada família,


que decorrem, antes de mais, de factores estruturais: número de elementos,
contexto económico e cultural, características dos elementos que a constituem,
meio geográfico em que habitam. A adaptação da família à deficiência de um
dos seus elementos depende também destes factores, uma vez que acapacidade
de resposta às necessidades da criança não é igual numa família monoparental,
numa família só com esse filho ou numa família numerosa; no meio rural ou
em meio suburbano; num agregado com boas condições económicas ou sem
elas.

Para além da estrutura de cada família, é necessário ainda ter em conta as


interacções nela existentes, isto é, a forma como se relacionam entre si os
diversos elementos e o modo como a existência de urna criança deficiente
altera a dinâmica dessas interacções. Com efeito, em cada família existem
subsistemas: a relação entre o casal, a relação entre pais e filhos, a relação
entre os irmãos e a relação com a família alargada e os amigos. Ao contrário
das perspectivas anteriores sobre trabalho com os pais, que tendiam a exigir
que estes organizassem as suas vidas a partir das necessidades do filho
deficiente, procura-se, hoje, que essas necessidades sejam atendidas com o
auxílio de todos os elementos da família, mas sem que estes deixem de ter a
sua vida própria e interacções privilegiadas entre si.

Por outro lado, há ainda a considerar as funções assumidas por cada um dentro
da estrutura familiar. Os técnicos e especialistas tendem a intervir a este nível
ainda com base no conceito de família tradicional, em que cada elemento
tinha papéis e funções pré-definidos socialmente. No entanto, cada vez mais
existem estruturas familiares diferentes e, mesmo nas famílias com estruturas
tradicionais, os papéis e as funções de cada um não correspondem, for-
çosamente, ao esteriótipo corrente. No trabalho com as famílias, é necessário
aceitar essas diferenças de funcionamento e perceber quem é que, no seio de
cada família, poderá desempenhar cada uma das funções que são necessárias
ao acompanhamento da criança deficiente, sem sobrecarregar apenas um dos
elementos.
Por sua vez, as necessidades da criança ou jovem variam, também, consoante
a sua idade, dando origem a tipos diversos de preocupações familiares. Turnbull
e Turnbull (1990) apontaram os vários ptoblemas que se colocam aos pais e
irmãos dos indivíduos com deficiência, conforme os diferentes ciclos de vida
em que estes últimos se encontravam. Com efeito, embora os primeiros anos
possam ser emocionalmente mais dolorosos para as famílias, à medida que a
criança cresce vão-se colocando problemas mais complexos de resolver,
sobretudo quando, como em Portugal, não existe um sistema de apoio
estruturado para adultos com deficiências graves.

Nos primeiros anos de vida da criança, as principais preocupações dos pais


são, geralmente, a obtenção de um diagnóstico correcto, a procura de serviços
de orientação e encaminhamento e a reestruturação da vida quotidiana com
um bebé deficiente. Por outro lado, para os irmãos, será necessário aceitar
uma eventual menor atenção dos pais e lidar com os medos e concepções
erróneas sobre a deficiência e as suas causas.

Na idade escolar, os pais terão que adaptar-se às implicações educativas da


deficiência e estabelecer rotinas nas funções familiares, tendo em conta as
necessidades da criança, não só em casa, mas também nas deslocações para os
vários tipos de atendimento que este requer. Já os irmãos terão que aprender a
assumir algumas responsabilidades face à criança com deficiência ou problemas
específicos, a aceitar uma eventual limitação do orçamento familiar devido às
exigências do atendimento que este requer e, provavelmente, a lidar com a
integração do irmão na escola ou nos espaços de lazer.

Durante a adolescência, os pais terão que encarar todos os problemas normais


desta fase, mas agravados pela deficiência do filho, que muitas vezes provoca
47
isolamento e afastamento dos pares e, em consequência, problemas emocionais
agravados. Nesta fase, os pais adaptam-se à ideia que a deficiência é permanente
e terão que começar a procurar o encaminhamento vocacional e/ou profissional
mais adequado para os filhos. Por seu lado, é uma fase difícil para os irmãos
com idades semelhantes, que têm que lidar com a sua própria adolescência e
as implicações da deficiência do irmão na sua vida socia1, o que pode provocar
fenómenos de marginalização, rotulação, rejeição.

Com a entrada na vida adulta do seu filho, os pais preocupam-se sobretudo


com o futuro deste, a nível profissional, pessoal e social e, nos casos de
dependência acentuada, com o planeamento da situação de atendimento quando
já não puderem ser eles a apoiar o filho. Esta preocupação face ao futuro
manifesta-se também nos irmãos do jovem com deficiência, que têm que
equacionar as suas próprias escolhas tendo em conta as necessidades de apoio
daquele.

Um outro factor a ter em conta no trabalho com as famílias é o tipo de apoio


informal (não especializado) com que esse agregado pode contar,
designadamente a família alargada, os amigos, os vizinhos, os apoios na
comunidade. De facto, verifica-se uma tendência para o isolamento cm muitas
das famílias cujos filhos apresentam deficiências acentuadas, em parte pela
dificuldade em partilhar com os outros um problema que estes não sentem, em
parte pela incapacidade ou ignorância dos outros para lidar com uma situação
complexa, perante a qual se sentem impotentes. No entanto, vários estudos
mostram que as famílias que melhor se organizam face à problemática do filho
são aquelas que contam com o apoio efectivo de uma rede informal de amigos
e familiares, a qual, para além de ajuda efectiva a nível prático, contribui para
a percepção de ser aceite socialmente.

Em síntese, as famílias dos alunos com necessidades educativas especíais


(sobretudo daqueles que têm deficiências acentuadas) têm dificuldades
acrescidas em relação às outras fanulias e os profissionais de educação podem
ajudar a minimizar alguns desses problemas, se tiverem em conta as
características e necessidades específicas de cada agregado.

Segundo Turnbull e Turnbull (1990), as necessidades de apoio das famílias


(avaliadas, como vimos, a partir das suas características estruturais e relacionais,
dos cuidados que o filho requer em determinada fase da sua evolução e dos
apoios informais disponíveis) podem ocorrer em seis grandes áreas:

na educação do filho, área privilegiada de intervenção dos professores


e educadores, devendo estes partilhar com os pais as decisões de
encaminhamento e orientação escolar do aluno com necessidades
educativas especiais, através de um processo de efectiva colaboração,

148
- no relacionamento com o filho, uma vez que a aceitação do problema
e a capacidade de manter expectativas positivas (mas realistas) são
fundamentais para que a criança ou jovem se desenvolva de forma
emocionalmente equilíbrada e aprenda a lidar com a situação;

na resolução de situações quotidianas, sobretudo no caso de filhos


com deficiências que implicam limitações no funcionamento autónomo
e necessitam de cuidados constantes, podendo os profissionais ajudar
a encontrar soluções que não tornem excessivo o peso dos cuidados
diários que a criança ou jovem requer;

na socialização do filho, devendo os profissionais desenvolver na


criança ou jovem competências a este nível e proporcionar-lhe
oportunidades para a interacção com pares, necessária ao equilíbrio
pessoal e familiar;

na socialização da família, já que a presença de um filho com uma


deficiência acentuada pode reduzir de forma drástica a mobilidade dos
pais e, portanto, o seu espaço próprio de socialização e lazer, podendo
os profissionais incentivar as famílias a procurar soluções alternativas
viáveis na comunidade;

em termos económicos, uma vez que alguns tipos de deficiência exigem


despesas adicionais elevadas, podendo os profissionais prestar
indicações úteis à família sobre o tipo de apoio social existente.

Turnbull e Turnbull (1990) defendem que qualquer intervenção a nível familiar


deve basear-se numa abordagem sistémica da família (tendo em conta os
factores antes enunciados) e dos apoios sociais com que esta pode contar.
A principal preocupação desta abordagem é de tornar a família independente
do apoio especializado dos técnicos, desenvolvendo em cada sistema familiar
a aquisição de competências para a resolução de problemas, para a resposta às
necessidades e para a realização de projectos de forma autónoma.

Neste processo, há que contar com a rede informal de recursos humanos da


comunidade: família alargada, amigos, vizinhos e ainda grupos de pais de
crianças ou jovens com os mesmos problemas. Os primeiros contribuem para
evitar o isolamento e a solidão característicos de muitas famílias com deficientes
graves e fornecem diferentes modelos de funcionamento familiar; o último
visa colocar estas famílias em contacto com outras que também tenham passado
ou estejam a passar pelos mesmos problemas, e tem-se revelado fundamental
para a reestruturação interna de cada agregado famíliar, contribuindo para a
superação de problemas quotidianos de forma mais eficaz que os conselhos
ou orientações dos técnicos.

I 19
Assim sendo, os objectivos da intervenção junto de famílias com crianças/
jovens deficientes ou com problemáticas que requerem cuidados especiais
podem ser definidos do seguinte modo:

- fornecer informação adequada à situação da criança e da família;

prestar apoio em termos estruturantes e com vista à autonomização


das famílias em relação aos serviços;

- assegurar a ajuda de outros pais, nomeadamente promovendo reuniões


entre famílias que tenham que lidar com o mesmo tipo de problemas.

Professores e educadores terão, portanto, que desenvolver capacidades


comunicacionais e relacionais que lhes permitam desenvolver uma interacção
positiva com qualquer tipo de família de alunos com necessidades educativas
especiais, contribuindo para criar nesta a autonomia e competência necessárias
para apoiar e acompanhar o seu filho.

Na verdade, apesar de muitos profissionais se queixarem amiúde da falta de


participação dos pais na escola ou instituição de educação especial, muitas
vezes são eles próprios que, com o tipo de interacção que desenvolvem, afastam
a família dos alunos com necessidades educativas especiais: por um lado, devido
a uma centração exagerada na sua qualidade de especialistas, não permitindo
o estabelecimento de uma verdadeira parceria; por outro, devido a uma
excessiva normatividade, que não tem em conta as condições concretas de
cada agregado e tende a exigir demasiado dos pais.

Para envolver os pais nas várias fases do processo educativo do filho, os


profissionais terão ainda que desenvolver competências de colaboração e
negociação que lhes permitam partilhar decisões relativas aos alunos. Este
não é um processo simples, uma vez que nem sempre as famílias e os
profissionais têm as mesmas perspectivas e expectativas em relação às crianças.
Por outro lado, a maior parte dos professores e educadores (de apoio ou de
educação regular) sente-se mais preparada para trabalhar com os alunos do
que com as suas famílias, o que decorre, em parte, do tipo de formação que
teve e, em parte, da ausência de hábitos de colaboração a este nível. Assim
sendo, é importante tomar consciência do percurso que ainda é necessário
percorrer com vista ao estabelecimento de uma efectiva parceria escola-família.

Num estudo realizado em Portugal, Pereira (1996) concluiu que a maior


preocupação das famílias dos alunos com necessidades educativas especiais
se relacionava com o futuro dos seus filhos, designadamente no que respeita a
apoios sociais e educativos, considerando que não têm informação suficiente
sobre esse tipo de serviços. O mesmo estudo mostra que esta preocupação dos
pais não é percebida como tal pelos professores e educadores de apoio, os
150
quais se centram essencialmente na resolução dos problemas do presente, não
procurando, por isso, fornecer a informação que os pais requerem.

Para além da necessidade de informação, os pais referem ainda necessidades


de apoio efectivo na resolução das situações diárias, aspecto que surge de
forma mais acentuada nas famílias monoparentais. São também estas famílias
que mais valorizam os serviços de apoio existentes na comunidade e as que
mais recorrem a eles. Por sua vez, são os agregados numerosos (10 ou mais
elementos) que apresentam maiores dificuldades de cariz económico.

Face aos resultados deste estudo (que se aproximam dos resultados de estudos
realizados noutros países), parece evidente que os professores e educadores,
tenham ou não o apoio de uma equipa pluridisciplinar, não se devem
responsabilizar apenas pelo programa educativo do aluno, mas constituir
também um recurso privilegiado para a sua família, nomeadamente fornecendo
informação sobre os serviços de apoio (necessários no presente e possíveis no
futuro), a que a famtlia pode recorrer na comunidade e ajudando a melhor
conhecer e lidar com a situação do seu filho.
Em síntese, a participação dos pais na escola é, não apenas um direito social,
como também uma necessidade da própria escola com vista à promoção do
sucesso escolar de cada aluno. Neste contexto, toma especial relevância o
envolvimento escolar dos pais cujos filhos têm necessidades educativas
especiais, já que estes requerem uma maior continuidade entre o contexto
escolar e o contexto familiar. Por outro lado, as famílias destes a1unos enfrentam
situações complexas, que necessitam quer de informação adequada à situação,
quer de acompanhamento e apoio efectivos.

151
Actividades

1. "No início do ano, sentamo-nos e fazemos um plano global para as três


turmas do 40 ano e decidimos as actividades que vamos desenvolver em
conjunto. Depois, cada uma faz as modificações que considera
necessárias para a sua turma. Ao longo de cada período escolar vamos
trocando impressões sobre o que fazemos e sobre as dificuldades que
vamos tendo." (Extracto da entrevista a uma professora do 1° Ciclo)

Face ao extracto da entrevista que se apresenta, refira:


a) as vantagens da colaboração entre professores;

b) os factores que influenciam a eficácia do trabalho colaborativo.

Imagine que, na sua sala de aula, aparecia, no início do ano lectivo, um


aluno com problemas motores. Que tipo de trabalho poderia desenvolver
com o professor de apoio educativo?

• "60.° —Os pais são parceiros privilegiados no que diz respeito às


necessidades educativas especiais dos seus filhos e, na medida do
possível, deve-lhes ser dada a escolha sobre o tipo de resposta educativa
que pretendem para eles.

61. 0 — Deve ser desenvolvida uma parceria cooperativa e de ajuda entre


adrninistradores escolares, professores e pais. Os pais devem ser
encorajados a participar nas actividades educativas em casa e na escola
(onde podem observar técnicas eficazes e aprender como organizar
actividades extra-escolares), assim como a orietztar e apoiar o progresso
escolar do seu filho". (Artigos 60.° e 61. 0 da Declaração de Salamanca,
1994)

Comente as implicações destes dois artigos na prática profissional dos


docentes, focando:

a) os benefícios, para o aluno, da colaboração entre as escolas e as


fanílias;

b) a noção de parceria escola-família;

c) o tipo de necessidades mais frequentes das famílias cujos alunos


apresentam necessidades educativas especiais.

1 5")
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Composto e paginado
na UNIVERSIDADE ABERTA

Impresso e acabado
na Guide, Artes Gráficas Lda.
1.' edição — I. impressão — 1000 exemplares

Lisboa, Abril de 2003

Depósito legal n." 193930/03 •

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