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ALZHEIMER

DESCUBRA O QUE
É ESSE MAL, COMO
AFETA O PACIENTE
E SUA FAMÍLIA E
AS DESCOBERTAS
PARA VIVER COM
MAIS QUALIDADE
DE VIDA

AS FASES DA DOENÇA
COMO O ALZHEIMER SE DESENVOLVE, OS TRATAMENTOS MAIS EFICAZES,
AS RECENTES PESQUISAS CIENTÍFICAS E DICAS DO DIA A DIA

DEPOIMENTOS DE FAMILIARES • GRUPOS DE APOIOS • MITOS E VERDADES


2
GUIA ALZHEIMER

O que é essa doença que se manifesta nos gestos, na


fala, nos olhos de um ser humano que não sabe o gesto
que faz, o que diz, como é a realidade que está à sua
frente e que ele não consegue ver? O que é essa doença
que mantém o ser humano vivo enquanto sua alma
parece ir saindo devagarinho, se despedindo da vida
enquanto parece procurar outros horizontes que não
conseguimos imaginar?
Como conviver com isso? E como, principalmente,
conviver com essa mulher ou esse homem que não
tem a menor ideia de estar passando por isso? Como
cuidar, ajudar, o que fazer quando se vive perto de
uma pessoa com Alzheimer?
Neste guia você terá todas as respostas, inúmeras
informações científicas e também questionamentos
que ajudarão você a compreender o que significa
esse mal e a refletir e agir adequadamente em uma
situação tão difícil como essa.
Você conhecerá as causas, os fatores de risco, os sinais
e o modo como a doença progride, como diagnosticar
o mal de Alzheimer quando existem tantas outras
doenças senis, quais especialidades médicas se deve
procurar, quais os tipos mais eficientes de tratamento.
E, ainda, como cuidar do paciente, quais os
procedimentos indicados para tratá-lo corretamente.
Você também ficará sabendo sobre as novas pesquisas
CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO em busca da cura, assim como sobre os medicamentos
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ pesquisados e aceitos pela comunidade científica.
________________________________________
G971 Também saberá quem são os cuidadores ideais, as
casas que atendem idosos e doentes desse mal, assim
Guia minha saúde especial : Alzheimer. - 10. ed. - São Paulo :
On Line, 2016. como os grupos de apoio criados especialmente para
100 p. : il. ; 28 cm. ajudar quem vive essa experiência como familiar ou
ISBN 978-85-432-1680-5
cuidador profissional. Por fim, conheça os mitos e
verdades e tire todas as suas dúvidas sobre a doença
1. Alzheimer, Doença de - Manuais, guias, etc.
de Alzheimer.
16-37324 CDD: 616.83 Bom conhecimento!
CDU: 616.892.3
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ALZHEIMER ÍNDICE Índice

ALZHEIMER
GUIA MINHA SAÚDE ESPECIAL

6 ALZHEIMER: O QUE É 18 SERÁ QUE ESTOU


ESSA DOENÇA? COM ALZHEIMER?
Conheça o que significa, em termos físicos e Esquecimentos corriqueiros costumam ser
emocionais, a doença que afeta milhões de motivo de preocupação mas podem ter causas
pessoas em todo o mundo. bem diferentes.

12 CAUSAS 24 AS TRÊS
& FATORES DE RISCO FASES DO MAL
Idade, hereditariedade, estilo de vida? Entenda como se desenvolve a doença
Confira as causas e os fatores de risco que desde a fase inicial
provocam o Mal de Alzheimer.

4
30 QUE MÉDICOS
PROCURAR?
Descubra as especialidades
médicas mais adequadas para
tratar o Alzheimer

34 DOENÇAS SENIS
Tipos de demência que afetam
os mais velhos e podem ser
confundidas com Alzheimer

40 COMO DIAGNOSTICAR
O MAL DE ALZHEIMER
Tudo sobre os exames que
detectam a doença

46 TIPOS DE
TRATAMENTO
Quais são os mais comuns e os
mais eficientes?

54 OS DESAFIOS DE UM
FAMILIAR-CUIDADOR
Familiares e/ou cuidadores: como
agir certo quando se convive com um
paciente de Alzheimer

64 CUIDADORES
PROFISSIONAIS
Enfermeiros, atendentes, casas de
repouso? Quem são os cuidadores ideais e como
atuam? 86 MITOS E VERDADES
O que parece ser e o que é verdadeiro
72 ONDE ESTÁ A CURA? sobre a doença
Cientistas de todo o mundo descobrem a cada
ano novas promessas de cura 92 O ALZHEIMER EM NÚMEROS
Estatísticas e projeções no Brasil e no mundo
78 ABRAZ
Conheça o que é e o que faz a Associação 98 REFERÊNCIAS
Brasileira de Alzheimer Fontes e consultas

5
ALZHEIMER CAPÍTULO 1 O que é essa doença?

6
ALZHEIMER
O QUE É ESSA DOENÇA?
Há muito se fala nela, mas só
recentemente o mal que afeta milhões
de pessoas em todo o mundo começou
a ser conhecido

FOTO: SHUTTERSTOCK

7
ALZHEIMER CAPÍTULO 1

A
doença de Alzheimer é progressiva e
incurável. Trata-se de uma desordem
degenerativa que afeta as células cere-
brais, destruindo a memória e outras
funções mentais cruciais.
Em princípio, pode se caracterizar por mera
dificuldade de se lembrar de algo ou de alguém,
e por um certo sentimento de desorientação
(veja Conheça os Sinais da Doença). Mas o
quadro avança até o ponto de levar ao total es-
quecimento de pessoas importantes na vida dos
pacientes, os quais também sofrem mudanças
de comportamento e profunda alteração de
personalidade.
Além da memória, a doença é responsável
pela perda de outras funções cognitivas tais
como atenção, orientação e linguagem. Alzhei-
mer também é a causa mais comum da demên-
cia, um grupo de distúrbios caracterizados pela
supressão da capacidade intelectual e de socia-
bilidade. Como provoca a degeneração e morte
de células do cérebro, o declínio das aptidões
mentais é contínuo.

tecção da doença em seu estágio inicial permitiria a es-


ses pacientes expressar suas preferências de tratamento e
cuidados, considerando que o agravamento dos sintomas
impossibilita a comunicação. Mesmo assim, no Brasil há
quem defenda que, dependendo do nível de comprometi-
Apesar disso, e do fato de não existir cura mento mental do paciente à época do diagnóstico, deva se
para a doença até o momento, recomenda-se optar por omitir do doente o verdadeiro problema.
que o diagnóstico seja feito o quanto antes. Isso Nesse sentido, o diagnóstico precoce é também primor-
porque há medicamentos e estratégias que, se dial para que os familiares e cuidadores se conectem a
não têm o poder de impedir a evolução da do- redes de apoio e assim possam se preparar melhor, apren-
ença, podem amenizar os sintomas e maximi- dendo mais sobre a doença, evitando informações distor-
zar algumas das funções afetadas, prolongando cidas e recebendo todo o suporte emocional necessário.
um pouco mais a independência e a qualidade Embora a doença seja a causa mais comum de demên-
de vida dos pacientes. Pragmaticamente, a de- cia e de outros distúrbios da função intelectual em pes-

8
SER BILÍNGUE
ADIA OS
SINTOMAS
DO ALZHEIMER?
Alguns estudos levantaram a
hipótese de que falar duas ou
mais línguas pode contribuir
para adiar o surgimento da
doença ou diminuir os riscos
do aparecimento dos sintomas.
Apesar de terem sido anunciados
com certo alarde, até agora
nenhum estudo conseguiu
apontar evidências significativas
de conexão entre bilinguismo e
benefícios contra Alzheimer.
Alguns cientistas preferem
acreditar que falar uma ou mais
línguas ajudaria a desenvolver
uma espécie de reserva cognitiva
no cérebro, da mesma forma
que se engajar em outras
atividades de estímulo social e
mental. Ainda são necessárias
muitas outras pesquisas para
se entender completamente
como esta reserva funcionaria
e que papel teria na evolução
e retardamento de sintomas
Alzheimer ou outros tipos
de demência. O que se acredita é que essas
atividades contribuiriam para a o vigor de uma
soas acima de 65, não é parte inerente do en- certa ‘arquitetura cerebral’, melhorando
velhecimento e, portanto, deve ser dissociada a circulação sanguínea e a atividade
de outros sinais de senilidade. Por outro lado, neuronal e colocando seu cérebro para
a maior incidência da doença nos dias atuais se funcionar. Tudo isso compensaria as perdas
deve sobretudo ao envelhecimento da popula- do cérebro para a doença.
ção mundial, incluindo a do Brasil , que agora Embora não exista base científica para se
tem expectativa de vida maior. afirmar que ser bilíngue protege contra a
De acordo com estimativas divulgadas pela Doença de Alzheimer, sem dúvida aprender
Associação Brasileira de Alzheimer, estima-se a se comunicar em uma língua estrangeira
FOTO: SHUTTERSTOCK

que mais de 35 milhões de pessoas no mundo se encaixa entre as atividades que


sofram com a doença. promovem o pensamento intelectual e o uso
No Brasil, calcula-se que haja cerca de 1, 2 das faculdades cognitivas, que são parte
milhão de casos e, acredita-se, a maior parte de- de uma vida mental saudável.
les ainda sem diagnóstico.

9
ALZHEIMER CAPÍTULO 1

Como age
a doença
A doença foi identificada
pela primeira vez em 1906 pelo
médico alemão, Alois Alzhei-
mer, a quem se atribuiu o nome
da enfermidade. Ele descreveu
o caso de Auguste Deter, mu-
lher que começou a apresentar
os sintomas hoje bem conhe-
cidos, quando tinha apenas 51
anos. Auguste morreu quatro
anos depois. O médico definiu
a nova doença com base em
acompanhamento da paciente
e da evolução de seus sintomas
e de posterior exame de seu cé-
rebro em autópsia.
Mais de uma centena de
anos depois da identificação
da doença, suas causas ainda
não são totalmente entendi-
das. Acredita-se, contudo, que
resulte de uma combinação de
genética, estilo de vida e fatores
ambientais que afetam o cére-
bro depois de um certo tempo.
Sabe-se que apenas em 5% dos
casos uma mudança genética
determine que uma pessoa re-
almente irá desenvolver a do-
ença em algum momento. Por outro lado, ainda As placas são formadas pelo acúmulo de fragmentos de beta-
que a comunidade científica não possa apontar -amiloide e de material celular , fora e em torno dos neurônios. Já
causas definitivas para o Alzheimer, os efeitos os chamados emaranhados ou novelos neurofibrilares são fibras
da doença no cérebro são bastante claros. insolúveis entrelaçadas, compostas pela maior parte da proteína
A doença danifica e mata células cerebrais. tau, que se acumulam dentro das células nervosas. As placas po-
Sendo assim, um cérebro afetado por Alzhei- dem danificar e destruir células cerebrais de diferentes maneiras,
mer tem menos células e um número de cone- inclusive interferindo na comunicação entre elas. Embora não se
xões entre as células sobreviventes bem menor saiba se são a causa fundamental da morte dessas células nos pa-
do que um cérebro saudável. À medida que mais cientes de Alzheimer, sabe-se com certeza que estão entre as prin-
e mais células são destruídas, há consequente cipais causas do problema.
diminuição do volume cerebral, como se fosse No caso dos emaranhados neurofibrilares, ocorre que as célu-
gradualmente encolhendo. Examinados sob o las do cérebro dependem de um sistema de apoio e transporte de
microscópio, os tecidos desse cérebro afetado nutrientes e outros materiais essenciais por suas longas extensões.
pela doença apresentam dois tipos de lesões Esse sistema exige que a estrutura e o funcionamento da proteína
muito característicos da doença de Alzheimer: tau sejam normais. Nos pacientes de Alzheimer, os “fios” dessa pro-
placas de proteína beta-amiloide, também co- teína se entrelaçam e se emaranham de tal forma dentro das células
nhecidas como placas senis, e os emaranhados cerebrais que comprometem o sistema de transporte, levando à sua
neurofibrilares. falência. Isso resulta no declínio e morte das células cerebrais.

10
DR. ALOIS ALZHEIMER E O CASO DE AUGUSTE
Em novembro de 1901, o
neurologista alemão Alois
Alzheimer examinou pela primeira
vez Auguste Deter, uma mulher
de 51 anos, numa instituição de
doenças mentais em Frankfurt.
Ela apresentava problemas de
memória e de linguagem e
sofria de distúrbios como
desorientação e alucinações.
O quadro de sintomas era similar
ao que se diagnosticava à época
como demência. Mas o que se
distinguia é que a paciente era
bem mais jovem do que os
pacientes usualmente afligidos
por esse mal. Para diferenciá-lo,
portanto, o doutor Alzheimer
definiu o problema como uma
Demência Pré-Senil.
As condições de Auguste se
deterioraram em poucos anos e
culminaram com sua morte em
abril de 1906. Impressionado com numa conferência de psiquiatras em
o caso, inédito na carreira do médico, BOX 800#
Tübingen, Alemanha, Dr. Alzheimer
ele obteve autorização da família de
Auguste para realizar uma autópsia ou tópicos
apresentou o caso que ele classificou
como “uma enfermidade particular do
em seu cérebro. Durante o exame, foi córtex cerebral” de sua paciente Auguste
encontrada uma significativa atrofia, Deter e, no ano seguinte, publicou essa
especialmente do córtex, a fina camada mesma apresentação em forma de
externa que recobre a massa cinzenta, artigo. Só em 1911, porém, publicou um
que por sua vez se relaciona à memória, artigo interpretando suas observações
à linguagem, ao julgamento, e ao em maiores detalhes. Desta vez, outros
pensamento em geral. Ele então colheu casos foram descritos, como o de
pequenas amostras dos tecidos cerebrais Johann F. , associados ao mal que, já
e os impregnou com sais de prata, antes nessa época, era conhecido como a
de examiná-los sob um microscópio. Em doença de Alzheimer. A escolha do
sua análise, o neurologista observou dois nome foi de Emil Kraepelin, mentor de
tipos de depósitos anormais dentro e fora Alzheimer, e um dos psiquiatras alemães
FOTOS: SHUTTERSTOCK

das células nervosas. Essas ocorrências mais prestigiados de seu tempo. Alois
já haviam sido observadas e descritas Alzheimer morreu em 1915, aos 51
antes, mas nunca em alguém tão jovem. anos, na Polônia, em decorrência de
Em novembro daquele mesmo ano, problemas cardíacos.

11
ALZHEIMER CAPÍTULO 2 Causa e fatores de risco

12
CAUSAS
& FATORES
DE RISCO
Por que uma pessoa tem
Alzheimer? Quais os fatores que
podem facilitar essa doença?
Conheça aqui as respostas para
essas e outras dúvidas
FOTO: SHUTTERSTOCK

13
ALZHEIMER CAPÍTULO 2

O
envelhecimento é conhecido como o
fator de risco mais comum da doença
de Alzheimer e seus sintomas se agra-
vam com o avanço da idade. No entan-
to, é importante lembrar que envelhecer não é
adoecer. É preciso saber distinguir o processo
fisiológico que envolve o envelhecimento nor-
mal, daquele caracterizado pela doença.
Com o passar dos anos assistimos a uma di-
minuição das atribuições dos órgãos e sistemas
e, apesar disso, nosso corpo está equipado para
continuar se mantendo funcional. O mesmo
ocorre com o cérebro. É natural que passe por
alterações em seus neurônios e neurotransmis-
sores e que isso implique em menor capacida-
de cognitiva e na diminuição dos reflexos, por
exemplo. Mas isso não impede, necessariamen-
te, que se leve uma vida normal.
Embora a idade seja o maior fator de risco da
doença, que se conhece atualmente, isso não
significa que seja normal desenvolver os sinto-
mas de Alzheimer na velhice, mas sim que as
chances de ocorrerem são maiores e que, por-
tanto, há aumento na incidência do problema
em indivíduos acima de 65 anos. Depois dessa
idade, os riscos crescem drasticamente. Para
ter uma ideia, os casos de demência ligados ao
Alzheimer dobram a cada cinco anos. Uma em
cada 50 pessoas apresenta alguma forma de
demência entre os 65 e os 70 anos de idade,
comparada com uma em cada cinco entre as
que têm acima de 80 anos.
Sabe-se também que as mulheres são mais
suscetíveis à doença, embora até o momento te parentes mais próximos, como pais e irmãos. Na área
seja usualmente aceito que isso ocorra em fun- da genética, o que já se sabe é que os casos em que há
ção de elas, geralmente, terem maior expectati- início precoce da doença, por exemplo na faixa dos 30, 40
va de vida do que os homens. ou 50 anos, há evidências de uma mutação genética rara
que afeta pelo menos três genes (entre eles a Proteína Pre-

É hereditário?
cursora de Amiloide, conhecida pela sigla em inglês APP)
e somente nessas situações pode-se prever com certeza
que uma pessoa realmente vá desenvolver a doença. Mas,
O histórico familiar deve ser considerado no há de se reforçar, que esse tipo de ocorrência representa
momento de um diagnóstico, mas os mais sé- menos de 5% dos casos da doença como um todo e que
rios estudos até o momento não são conclusivos novos estudos continuam sendo feitos.
nesse aspecto. Por isso não se pode dizer que a A síndrome de Down é um importante fator de risco
doença de Alzheimer seja hereditária. Mesmo ligado à doença de Alzheimer. Há 50% de chances que um
quando a hereditariedade é avaliada como fator portador da síndrome de Down com mais de 60 anos pos-
preponderante, costuma-se considerar somen- sa desenvolver os sintomas da doença. Isso ocorre porque

14
FATORES DE RISCO
IDADE AVANÇADA
MUTAÇÃO GENÉTICA
E HEREDITARIEDADE
o portador da síndrome tem o cromossomo 21
em duplicidade e portanto tem uma Proteína SÍNDROME DE DOWN
Precursora de Amiloide (APP) a mais, a qual
tem sido associada à doença de Alzheimer.
Não existe um único fator ligado ao estilo
ESTILO DE VIDA
de vida que tenha definitivamente reduzido os
riscos da doença. No entanto, há algumas evi- HIPERTENSÃO
dências sugerindo que os mesmos fatores de
risco de doenças cardíacas possam aumentar OBESIDADE
os riscos para a doença de Alzheimer tais como
hipertensão, obesidade, falta de atividade física,
tabagismo, alto nível de colesterol, dieta pobre TABAGISMO
em vegetais e frutas e falta de monitoramento
adequado da diabetes tipo 2. Esses fatores tam- DIETA POBRE EM
bém oferecem risco para a chamada demência
vascular, causada por danos aos vasos sanguí- FRUTAS E VEGETAIS
neos do cérebro. Assim, adotar um estilo de
vida saudável é sempre aconselhável. ALTO NÍVEL DE
COLESTEROL
Atividade
intelectual DIABETES DO
TIPO 2 NÃO MONITORADA
Vários estudos também associam menor in-
cidência ou adiamento dos sintomas da doença BAIXA ATIVIDADE MENTAL
FOTOS: SHUTTERSTOCK

de Alzheimer entre pessoas com uma vida de


intensa atividade intelectual. Isso leva a crer que
aqueles menos engajados em ocupações que TRAUMATISMO
exijam capacidade mental e com menor nível
de educação formal estão mais expostos aos
CRANIANO GRAVE

15
ALZHEIMER CAPÍTULO 2

riscos de desenvolver os sintomas mais cedo. a pessoa seja capaz de tomar um medicamento ou de se-
Portanto, para retardar as chances de desen- guir um tratamento prescrito, ainda que muito simples.
volver a doença, há certa unanimidade em se Da mesma forma, é comum que não possa descrever ou
recomendar estimulação cognitiva complexa e nem mesmo notar a ocorrência de um efeito colateral li-
diversificada ao longo da vida. Há ainda indí- gado a um ou mais de seus medicamentos.
cios de que pessoas que sofreram sério traumatis- Em estágios mais avançados da doença, as mudanças ce-
mo craniano podem ser mais vulneráveis. rebrais começam a afetar as funções físicas mais elementa-
res como deglutição, equilíbrio e o controle da bexiga e do

Incapacidades e intestino. Tudo isso resulta em que o doente de Alzheimer


se exponha a vários perigos, entre eles, a bronco aspiração,
outros danos quando se inala comida ou líquidos para os pulmões e não
para o estômago, e em consequência pode-se desenvolver
É relativamente comum que um paciente de uma pneumonia ou outras infecções.
Alzheimer acabe tendo outros problemas de saú- Por conta da perda do equilíbrio, as quedas também se
de não exatamente decorrentes dos sintomas da tornam mais comuns e por conseguinte as fraturas; estas,
doença, mas certamente a eles conectados. Isso geralmente já de tratamento complicado depois de certa
acontece porque a perda da memória e da lingua- idade, são ainda mais preocupantes, logicamente, para os
gem, além das alterações do senso de julgamento pacientes de Alzheimer.
e de outras capacidades cognitivas, podem com- Outro problema enfrentado por pacientes e seus cui-
plicar o tratamento de outras condições de saúde. dadores são as escaras, crostas ou feridas na pele, pro-
Por exemplo, os pacientes podem não conseguir vocadas em pacientes acamados por um longo período.
comunicar que estão sentindo dor e, em conse- Novamente, a incapacidade de chamar a atenção para o
quência, um simples dente inflamado pode ficar problema pode levar ao agravamento da condição.
sem tratamento até que se torne uma questão bem Por fim, um quadro mais avançado de Alzheimer qua-
mais séria. O mesmo pode ocorrer com outros ti- se sempre é acompanhado de desnutrição ou carência de
pos de dores ou sintomas que acabam não sendo vitaminas fundamentais e até desidratação. Todos esses
percebidos pela família e/ou cuidadores. fatores, consequentemente, abrem as portas para outros
Os danos causados pela doença impedem que males e riscos à saúde.

16
TRANSTORNO OU COMPROMETIMENTO
COGNITIVO LEVE
Conhecido em inglês como Mild especialização em neuropsicologia)
Cogntive Impairment o Transtorno para avaliações regulares, se possível
ou Comprometimento Cognitivo semestrais. Em geral, são feitos testes
Leve (CCL) é geralmente assim para checar se houve piora dos
diagnosticado quando o paciente sintomas ou algum novo fator
apresenta perda de memória ligado a perdas cognitivas. Os testes
consistentemente, mas nenhum neuropsicológicos têm se mostrado
outro sinal de disfunção cognitiva. os mais eficientes para diagnóstico e
Esses casos não são normalmente indicação de tratamentos possíveis.
causados pela Doença de Alzheimer Em caso de evolução para demência,
e podem ou não evoluir para um pode-se iniciar uso de medicamentos,
quadro de demência. Apesar de ser em geral os mesmos prescritos para
rotulado como leve, o transtorno Alzheimer em fase inicial mas em
exige um acompanhamento médico doses ajustadas. Como os sintomas da
e monitoramento da família ou de demência são frequentemente mais
alguém próximo ao paciente, resistentes ao efeito dos remédios
para que sejam observadas e quando o tratamento se inicia entre cinco
imediatamente relatadas quaisquer e sete anos depois dos primeiros sinais da
alterações nos sintomas. doença, a intervenção precoce é benéfica
Ao que se sabe até o momento o CCL é e por isso bastante aconselhada.
uma condição clínica na qual se verifica Ainda se investigam as causas dessa
uma perda de memória maior do que condição, e a praxe nesse momento
a esperada para a idade mas que é entender que sejam as mesmas
contudo não satisfaz os critérios para da demência e que portanto devem
um diagnóstico de provável Alzheimer. ser prevenidas da mesma forma, ou
Mesmo assim, o acompanhamento seja, seguindo o padrão de prevenção
se faz necessário porque o paciente das doenças cardiovasculares. Isso
está mais vulnerável à demência. Em inclui a adoção de hábitos saudáveis,
geral, esse transtorno apresenta-se engajamento em atividades físicas,
como um estado transitório entre intelectuais e sociais, assim como
envelhecimento e uma demência de alimentação balanceada. Seguindo a
proporções mais tênues. mesma lógica, doenças como alcoolismo,
Idealmente, o paciente deve visitar tabagismo e obesidade podem estar
um neurologista ou psicólogo (com associadas ao problema.

Alguns critérios para o correto diagnóstico do problema:


• Queixa de falta de memória, preferencialmente corroborada
por outra pessoa, familiar ou amigo;
• Declínio da memória anormal se comparado a pessoas de
FOTO: SHUTTERSTOCK

mesma idade e nível de educação;


• Outras habilidades cognitivas inalteradas;
• Realização de tarefas diárias sem problemas;
• Não preenche os sintomas das demências mais comuns.

17
ALZHEIMER CAPÍTULO 3 Será que estou com Alzheimer?

18
SERÁ QUE
ESTOU COM
ALZHEIMER?
Os esquecimentos comuns no dia a dia costumam
preocupar quando são frequentes, mas podem estar
bem longe de significar a doença
FOTO: SHUTTERSTOCK

19
ALZHEIMER CAPÍTULO 3

R
econhecer os sinais da doença de sobre um conjunto de sinais que devem, sim, ser observados
Alzheimer ainda causa certa ansiedade e, mais que isso, identificados como alerta de que alguma
e não é para menos. Mesmo com toda a doença relacionada ao funcionamento do cérebro esteja se
informação hoje disponível, como saber desenvolvendo.
se os seus lapsos de memória ou de alguém que Note que tudo o que você vai ler aqui ou em outras fon-
você conhece são apenas decorrência natural da tes pode ajudar, mas jamais deve substituir a visita a um
idade ou um alerta para uma possível demên- profissional de saúde de sua confiança.
cia? Quando os esquecimentos corriqueiros

Sobre esquecimentos
deixam de ser normais? Em que momento pro-
curar ajuda médica?
Se por um lado sofrer por cada pequeno pro-
blema natural da idade pode redundar em para- A perda de memória é de fato um dos primeiros sinais da
noia, por outro, adiar uma visita a um especialis- doença e portanto deve ser sempre considerada com cuida-
ta ou uma análise mais profunda da situação pode do. Os esquecimentos mais comuns são de nomes de pessoas
ser pura negação. Apesar de difícil, a dica é sem- conhecidas, de fatos e informações recentes e do lugar onde
pre o caminho do meio , o que nesse caso significa se deixou certos objetos. Há pacientes que levam meses ou
manter-se saudável e ativo, aceitando as mudanças anos nesse processo, com piora progressiva. É importante
naturais do envelhecimento, mas ao mesmo tem- tentar detectar esses sinais o mais cedo possível, antes que as
po obtendo informação e buscando aconselha- funções cerebrais estejam mais seriamente comprometidas.
mento especializado para se tranquilizar. Enquanto é fundamental não protelar uma consulta mé-
Em primeiro lugar, não se pode generalizar a dica, é também recomendável conscientizar-se de que há
doença e muito menos seus sinais. A forma como outros problemas relacionados a dificuldades com a memó-
aquele seu vizinho foi afetado pela doença e os ria que não são exatamente um quadro de demência.
sintomas iniciais que uma tia teve podem não Em pessoas mais jovens, um dos maiores fatores ligados
ter nenhuma relação com os sinais que você in- a lapsos de memória se deve ao estresse. Alguém executan-
siste em ver em sua mãe ou outro membro da fa- do múltiplas tarefas ao mesmo tempo e com sobrecarga de
mília. Mesmo assim, depois de tantos anos de es- responsabilidades pode experimentar situações em que se
tudos, os especialistas chegaram a um consenso esquece de compromissos ou vai a uma parte da casa para

20
buscar um objeto e percebe que não se lembra ma comumente associado aos lapsos de memória. Nesse
mais o que pretendia pegar; não se lembra onde caso, a pessoa que sofre de depressão usualmente é mais
pôs os óculos ou deixa o guarda-chuvas em al- suscetível à insônia e à dificuldade de concentração. Esses
gum lugar. Esses são apenas alguns exemplos dois aspectos são complementares, -- uma pessoa privada
que quando consistentes podem preocupar. de um número mínimo de horas de sono tende a ter menor
Isso porque, mesmo descartada a hipótese de concentração -- e afetam a qualidade da memória. Os qua-
Alzheimer, significam a necessidade urgente de dros de ansiedade também podem ocasionar efeito pareci-
uma mudança no estilo de vida . Algumas vezes do e provocar falha de memória com mais frequência.
o estresse se associa a um momento específico Em todos esses casos, quando medicamentos são prescri-
de extrema dificuldade na vida de uma pessoa e, tos, é fundamental observar se a perda de memória não está
nesse caso, a perda de memória seria apenas um relacionada a efeitos colaterais dos remédios. Calmantes ,
sintoma entre muitos outros. pílulas para dormir, hipnóticos e antidepressivos costumam
Além do estresse, a depressão é outro proble- estar por trás de muitos casos de esquecimento em pessoas
de qualquer idade.
O alcoolismo é outro problema de saúde que não pode ser
descartado. Além do álcool, o uso de drogas e do cigarro já
vêm sendo por muito tempo associados a casos de perdas
ocasionais de memória.
Entre as prováveis causas que muitas vezes passam des-
percebidas figura a deficiência nutricional. Boa alimen-
tação, incluindo aqueles alimentos com alta qualidade de
proteínas, é fundamental para o bom funcionamento do
cérebro. A deficiência, especificamente, das vitaminas B1 e
B12 podem, de fato, estar associadas ao problema.
Outras doenças que devem ser levadas em conta quando se
investigam as causas da perda de memória são os distúrbios da
tireoide e infecções decorrentes em portadores do HIV , do-
entes de tuberculose ou sífilis. Já os casos de perda de memó-
ria depois de violenta pancada na cabeça, tão apreciados pelo
cinema de todos os tempos, são muito mais raros do que os
relacionados até agora e, ainda que ocorram, podem ser facil-
mente identificados porque se ligam a um evento especifico.
Um outro evento bastante marcante e bem mais comum
do que as famosas pauladas na cabeça é o AVC (Acidente
Vascular Cerebral), popularmente conhecido como derra-
me cerebral. Tanto o AVC isquêmico, quando um vaso san-
guíneo do cérebro é interrompido subitamente, como o AVC
hemorrágico, em que um vaso sanguíneo cerebral se rompe,
FOTOS: SHUTTERSTOCK

‘derramando’ seu conteúdo e levando à formação de um he-


matoma ou coágulo, podem apresentar a perda de memória
entre suas sequelas. Em casos como esse, a perda de memória
surge como consequência, não como alerta. Mais comumen-
te, as vítimas de AVC perdem a memória recente e mantém

21
ALZHEIMER CAPÍTULO 3

vívidas aquelas do passado. São muitas vezes


capazes de visualizar um evento da infância, ao Onde e quando
passo que não podem se lembrar do que come-
ram no almoço. Um sexagenário norte-americano saiu de carro num sá-
Apesar da gravidade de um AVC, muitos pa- bado à tarde para comprar algumas coisas numa casa de
cientes conseguem, com terapia e tratamento material de construção, a qual ele havia frequentado por
adequados, recuperar parte da acuidade da me- mais de trinta anos. A viagem até a loja era de poucas mi-
mória. Sobretudo em casos onde o paciente se lhas e não deveria tomar mais do que uma hora. Muito
esqueceu de coisas tão cotidianas quanto amar- tempo depois, quando a esposa já pensava em chamar a
rar os sapatos, por exemplo. polícia, recebe uma ligação de desconhecidos dizendo que
o marido dela se encontrava em outro estado, quase 200
milhas longe de casa, sem ter a menor ideia de como retor-
Identificando nar. Ironicamente, o homem em questão gabava-se por seu

o mal excelente senso de direção.


Casos como o desse senhor são bastante característicos
e prenunciam que é mais do que hora de buscar ajuda.
É importante ter em mente que as demências Além da memória, são relatados episódios de problemas
não são quadros fisiológicos e sim patológicos. com senso de direção e uma confusão decorrente de não
Isso significa que os esquecimentos normais da se saber onde se está e de como se chegou até tal lugar. A
idade não constituem demência. Antes de diag- escritora Heloísa Seixas, em seu livro O Lado Escuro (veja
nosticar um caso como provável Alzheimer, boxe) conta que a mãe, depois de ter retornado de uma
qualquer médico irá inicialmente identificar os viagem de férias a Caxambu, acordou em sua própria casa
sintomas de demência, que em 60% dos casos uma manhã acreditando ainda estar no hotel de suas férias.
são atribuídos à Alzheimer, mas que podem ser Confusões sobre o tempo, mistura de passado e presente, e
provocados por outros problemas que levam a mesmo dificuldade em acompanhar os dias da semana os
danos das células cerebrais. Em qualquer caso, a horários para determinadas atividades comuns são outros
demência é sempre progressiva e seus sintomas sinais importantes.
começam a interferir no funcionamento do coti- A linguagem é também uma das primeiras faculdades
diano normal de uma pessoa. mentais afetadas. Observe a presença de dificuldade de
Assim, além de esquecimentos contínuos e encontrar a palavra adequada e mesmo circunstâncias em
frequentes, um importante alerta é o nível dessa que não se pode lembrar o nome de certo objeto; impe-
interferência, que pode ser: dificuldade ou inca- dimento para concluir ou dar continuidade a uma frase
pacidade de realizar tarefas que antes eram cor- assim como habilidade para acompanhar uma conversa
riqueiras ou habituais, tais como pagar contas, ou seguir simples instruções.
preencher cheques, preparar uma refeição ou
fazer compras de supermercado. Em geral, nos
quadros de Alzheimer a pessoa pode simples-
O LUGAR ESCURO
Heloisa Seixas
mente desenvolver essas atividades mais lenta-
Lançamento: 01/05/2013
mente ou cometer pequenos erros e aos poucos Formato: 12 x 17
evoluir para a total incapacidade e inabilidade 136 páginas
total para realizar ou concluir as tarefas. Em O lugar escuro, Heloisa Seixas
Novamente, o fato de um paciente idoso apre- narra a história de um pesadelo
sentar falhas em sua atividade cognitiva não sig- familiar. Como diz a resenha da
nificam que estejam dementes. Mas o padrão e a Editora Objetiva, que publicou o livro,
todas as fases da lenta degradação
consistência dos problemas, assim como a gra- de uma mente comprometida são
dual perda de independência são sinais de alerta. descritas de forma minuciosa e
Por exemplo, o agravamento das condições le- assustadora neste livro que, de tão
vam a pessoa a se ver em apuros para o desem- fantástico, às vezes parece ficção,
penho de coisas que nos parecem instintivas tai ou “uma espiral assombrada”, como
define a escritora.
como vestir-se ou escovar os dentes.

22
FOTOS: SHUTTERSTOCK E DIVULGAÇÃO
SINAIS DA DOENÇA
Uma nova
personalidade PERDA DE MEMÓRIA CONSISTENTE
E CRESCENTE
No rol das reclamações mais comuns entre fa-
miliares de um paciente de Alzheimer está o sen-
timento de que se está lidando com uma pessoa DIFICULDADE DE VERBALIZAÇÃO
diferente. Em geral, antes desse estágio ocorrem CONSTANTE
as constantes mudanças de humor. Em alguns
casos, a pessoa desenvolve um sentimento per-
secutório ou de constante suspeição e em outros DISTÚRBIOS DE LINGUAGEM
simplesmente se torna imprevisível, complican-
do muito o convívio social porque as pessoas em DIMINUIÇÃO DO SENSO DE DIREÇÃO
torno nunca sabem o que encontrar pela frente
e como lidar com atitudes atípicas e estranhas.
Num segundo momento, esse quadro evolui SENTIMENTO DE CONFUSÃO LIGADO
para mudanças de personalidade, levando par- A LUGAR E TEMPO
ceiros e cônjuges de anos a desconhecer total-
mente a pessoa afetada pela doença. Muitos nar-
ram situações em que a pessoa perde o interesse DIFICULDADE DE EXECUTAR TAREFAS
em atividades ou hobbies que antes eram uma ANTES ROTINEIRAS
paixão; outros descrevem que quem antes era di-
vertido e interessado torna-se apático e retraído.
Embora todos esses sinais possam ocorrer, DESINTERESSE POR ANTIGOS HOBBIES
eles variam de pessoa a pessoa e enquanto po-
dem avançar rapidamente em alguns casos, em BAIXA SOCIABILIDADE
outros podem se manter estáveis por períodos
mais longos. A ação de medicamentos e cuida-
dos, claro, tem peso importante no ritmo da
MUDANÇAS BRUSCAS DE HUMOR
evolução da doença, mas a variação do histó-
rico de saúde e de hábitos de cada pessoa tam- ALTERAÇÃO DE PERSONALIDADE
bém tem papel considerável.

23
ALZHEIMER CAPÍTULO 4 As três fases do mal

AS TRÊS FASES

24
DO MAL
Os principais sinais do
Alzheimer nas etapas inicial,
intermediária e avançada

FOTO: SHUTTERSTOCK

25
ALZHEIMER CAPÍTULO 4

C
omo a demência é uma condição em contato próximo a um paciente. Mas não são de forma
progressiva e degenerativa, é co- alguma rígidas. Cada indivíduo atinge esses níveis em rit-
mum que se estabeleçam diferentes mos distintos e os padrões de comportamento e de com-
estágios de comprometimento da plicações decorrentes são também particulares.
doença. Muitos dos sintomas são os mesmos A única máxima que vale para todos é que o tratamento
em cada fase, apenas mais agravados. Outros e acompanhamento corretos visam justamente retardar a
são típicos de quadros mais sérios. passagem a um estágio que apresenta condições de com-
As fases servem como orientação para os prometimento cerebral mais agudo e garantir que a quali-
que fornecem serviços de saúde aos portado- dade de vida do paciente e de seus familiares e cuidadores
res de demência, tanto quanto para quem está seja preservada tanto quanto possível.

FASE 1
inicial ou leve
A fase inicial da doença nem sempre é detectada, mes-
mo por profissionais. Isso leva a que alguém só perceba
em retrospecto, observando padrões de comportamento,
que o problema já vinha acontecendo. Apesar disso, é um
momento importante que, quando diagnosticada, permite
buscar as melhores estratégias de tratamento e de prepara-
ção da para as outras fases.

• Lapsos de memória: a pessoa se esquece de


coisas que acabou de aprender ou de informações que
obteve. Não consegue se lembrar de compromissos
e de datas importantes como aniversários, consultas
médicas e outros.
• Linguagem: Esquece o que estava falando no meio de
uma discussão, assim como vocabulário simples. Pode
também ter dificuldade pronunciando algumas palavras.
• Senso de direção: Pode, de repente, sentir-se perdida
em locais que conhece bem.
• Iniciativa: Tem dificuldade de tomar decisões e
tomar e fazer simples escolhas em questões com as
quais tem familiaridade.
• Execução de tarefas: Torna-se incapaz de cumprir
tarefas cotidianas como seguir uma receita, preencher
um cheque ou se esquece das regras de um jogo que
costumava jogar.
• Motivação: Sente-se desinteressada ou desmotivada
para qualquer atividade. Perde subitamente o interesse em
trabalho ou lazer que antes lhe davam muito prazer.
• Instabilidade de humor: Passa por períodos
de tristeza profunda, depressão ou ansiedade. Pode
apresentar sinais de ciúme exagerado e desconfiança.
• Agressividade: reage com raiva desproporcional a
certos episódios normais.

26
FASE 2
intermediária
ou moderada
Usualmente, nessa fase a família e aqueles que convivem,
mesmo que não diretamente com o doente, podem perce-
ber a gravidade do problema pelo padrão de comportamen-
to anormal da pessoa sofrendo com Alzheimer. Veja que
embora novos sintomas possam ser percebidos, a maioria
é simplesmente o agravamento do que já vinha se notando

• Perda de memória: maior constância e agravamento


dos episódios de falta de memória, esquecendo nomes de
pessoas, inclusive as mais próximas, e situações recentes.
• Distúrbios de linguagem: fica mais difícil falar ou
seguir uma conversa, por isso a pessoa passa a evitá-las
; a fala se torna penosa, complicando e algumas vezes
impossibilitando a comunicação.
• Aumento da dependência: perda de autonomia;
nessa fase é comum a pessoa se tornar incapaz de cuidar
da própria vida, não podendo mais cozinhar ou comprar • Problemas de julgamento: pode fazer ou tentar fazer
comida e em alguns casos passa a depender de alguém coisas que contrariam o bom senso, como dar dinheiro a
para seus cuidados de higiene pessoal, que deixa de ser alguém por nenhuma razão ou roubar algo de algum lugar
uma preocupação. sem nem saber que isso é ilegal.
• Senso de direção: Piora ainda mais o senso de direção • Baixa capacidade motora: atividades motoras ficam
e algumas pessoas perdem-se mesmo dentro de casa. mais limitadas, dificultando tarefas cotidianas.
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• Séria alteração de comportamento: repetição • Menor capacidade de mobilidade: o ato de


de perguntas, recontam a mesma história, se tornam caminhar passa a ser mais errático e difícil, em alguns casos
inquietas e facilmente irritáveis. requerendo o uso de cadeira de rodas ou o apoio de alguém.
• Distúrbios de sono: apresenta dificuldades para • Transtornos psicóticos: ocorrência de alucinações,
dormir ou padrões de sono irregulares. delírios e paranoia e surtos nervosos.

27
ALZHEIMER CAPÍTULO 4

FASE 3
Avançada
ou grave
Dependendo da longevidade de uma pessoa, essa
fase pode se desdobrar em duas, por isso muitos
preferem mesmo considerar quatro, em vez de três,
especialmente por entenderem que deva se conside-
rar um estágio terminal.
De qualquer forma, um quadro geral de piora
e declínio apresenta alguns padrões em comum e
nesse momento, mais do que em todos os outros,
os familiares e cuidadores devem se sentir forta-
lecidos para lidar com decisões e situações ainda
mais difíceis.

• Grave perda de memória: em alguns


casos a pessoa perde totalmente a capacidade
de reconhecer mesmo os cônjuges e filhos,
assim como cuidadores que estejam em c
ontato diário com ela.
• Incapacidade de comunicação: a linguagem
verbal cessa completamente em muitos casos.
• Dificuldade de deglutição: tornando muito
complicada ou dolorida a alimentação, mesmo
quando assistida. Em casos mais graves levando ao
risco de aspiração de comida e líquidos.
• Incontinência urinária e fecal
Nessa fase é comum o paciente já manifestar
incontinência urinária e também fecal. O uso de
fraldas é fundamental.
• Deixa de compreender, completamente,
o que se passa à sua volta.
• Locomoção comprometida: resultando
muitas vezes em confinamento à cama ou a uma
cadeira de rodas.
• Comportamento inadequado em público:
uma vez que a capacidade de julgar já está perdida
ou seriamente comprometida.

Como já foi alertado, esses sintomas agrupados


em fases têm somente valor didático. Há, na realida-
de, inúmeras variações que devem ser consideradas
e muitos dos aspectos de uma fase podem se mes-
clar aos de outras. Isso significa apenas que a doença
evolui de formas distintas em cada pessoa.

28
OS QUATRO AS DO ALZHEIMER

Todas as fases dessa


enfermidade englobam
sintomas ligados
a esses quatro
distúrbios cognitivos:
Amnésia: Dá-se esse nome à
perda de memória ou à incapacidade
de se recordar de fatos ou eventos.
A memória pode ser de curto prazo,
que se refere a eventos recentes e
novos; e a de longo prazo, que cobre
acontecimentos remotos, antigos. A
primeira é programada na parte do
cérebro chamada lóbulo temporal, ao
passo que a segunda é armazenada
por meio de extensas redes de células
nervosas, nos lóbulos parietais. Na
doença de Alzheimer, a memória de
curto prazo é a primeira a ser afetada.

Afasia: É definida como a


incapacidade de se comunicar
efetivamente. Há dois tipos de afasia,
a expressiva, que se relaciona à perda primeiras a ser afetadas. Já as funções
de habilidades linguísticas produtivas, mais instintivas como engolir, mastigar
como falar e escrever; e a receptiva, e andar são danificadas nos estágios
que compromete a capacidade de mais avançados da doença.
compreensão oral e de leitura.
Agnosia: Do grego antigo
Apraxia: Impede a realização de a+gnosis (não conhecimento), é a
atividades motoras pré-programadas inabilidade de processar informação
como simples ações cotidianas tais sensorial, ou seja, o indivíduo não
como escovar os dentes, pentear- consegue interpretar ou reconhecer
se ou vestir-se. Um indivíduo pode corretamente os sinais oriundos de seus
‘desaprender’ todas as habilidades cinco sentidos. Em Alzheimer, a agnosia
normais desenvolvidas ao longo da manifesta-se algumas vezes no não
vida. Nos pacientes de Alzheimer as reconhecimento de objetos ou pessoas
atividades motoras mais sofisticadas familiares e, em alguns casos, na falta
FOTOS: SHUTTERSTOCK

como as ligadas a um trabalho de percepção de algo visceral como uma


específico, que necessitam de bexiga cheia ou, mais sério ainda, de
aprendizado mais apurado, são as uma dor no peito, por exemplo.

29
ALZHEIMER CAPÍTULO 5 Que médicos procurar?

30
QUE
MÉDICOS
PROCURAR?
Saiba quem pode lhe dar o diagnóstico
correto, discutir tratamento e planejar
com você e sua família a melhor estratégia
para lidar com o problema

FOTO: SHUTTERSTOCK

31
ALZHEIMER CAPÍTULO 5

E
ntre as poucas certezas que já se têm
acerca da doença de Alzheimer está a PRIMEIRA CONSULTA
importância de se procurar ajuda assim O familiar deve levar:
que apareçam suspeitas de demência. É
unânime entre especialistas e pessoas que tra- Lista do que é preciso perguntar
balham com esse mal que o diagnóstico preco-
ce é fundamental. Isso ajuda a descartar outras
Histórico médico do paciente
razões que levam à demência e até mesmo a se
identificar problemas cognitivos temporários
relacionados a outras causas. E, mais importan- Informação sobre casos similares de
te, garante que se iniciem ações imediatas para parentes próximos
retardar os sintomas.
Quem tem um serviço de saúde de confiança, Lista de sinais como perda de memória
público ou particular, clínico geral ou geriatra, e outros comportamentos suspeitos
deve procurar assistência tão logo perceba per-
sistência dos sinais. Como a doença começa a Lista de medicamentos que o
se desenvolver meses e até anos antes de aflorar paciente toma
com mais força, alguns testes já podem ser feitos
bem cedo durante o processo. Informações sobre eventos não usuais
que podem ter afetado o comportamento.
Clínico geral,
geriatra ou
Os pacientes não se sentem seguros
nem capazes de explicar seus sintomas,

neurologista por isso devem sempre ter alguém na


primeira consulta que conheça bem seu
problema e que seja seu acompanhante.
Há várias abordagens possíveis que muitas
vezes independem do desejo dos pacientes. O
lugar onde vivem, a facilidade ou não de acesso ou de seu ente querido. Os lapsos de memória de uma pes-
a centros de saúde e as condições financeiras de soa com longo histórico pessoal ou familiar de doenças
cada família podem acabar limitando as escolhas vasculares têm mais chances de estarem relacionados à de-
imediatas. Numa situação ideal, procure primei- mência vascular, por exemplo.
ramente uma/um profissional de sua confiança, Para quem não tem um provedor de saúde regular ou
que pode ser generalista ou geriatra (especialis- não sente confiança no profissional médico que lhe atende
ta em saúde de idosos). Note que a Organização usualmente, o melhor é informar-se diretamente sobre um
Mundial de Saúde define como pessoa idosa profissional especializado em Alzheimer. Como se trata de
aquela acima de 65 anos. Pacientes mais jovens uma doença relacionada às funções cerebrais, usualmente
normalmente não vão passar pelo geriatra. os neurologistas são os especialistas mais indicados e os que
As primeiras entrevistas e testes devem acon- normalmente têm mais prática com casos da doença.
tecer nesse primeiro estágio. Muitas pessoas preferem começar justamente por aí, ou
Independentemente do tipo de profissional seja, preferem procurar diretamente um neurologista espe-
que se busque e se a ajuda é para si mesmo(a) cializado em Alzheimer, com ampla qualificação e experiên-
ou alguém de sua família é importante munir-se cia. Esses profissionais, na maioria das vezes, são estudiosos
de toda informação possível sobre seu históri- do tema e estão atentos a todas as novidades na área de pes-
co médico. Para aqueles que se tratam por anos quisa e avanços obtidos no resto do mundo.
com a mesma clínica , profissional ou grupo de Um bom começo é procurar a indicação por meio de al-
profissionais isso pode ser mais fácil. Em qual- guém que já passou pelo problema. Nos dias de hoje, com
quer caso, acesse essa informação e assegure-se a alta da expectativa de vida e o consequente aumento da
de que esses dados estejam disponíveis para a população idosa, há sempre alguém em nossos círculos de
pessoa que vai realizar a avaliação de seu caso amigos, colegas de trabalho ou da comunidade que tenha

32
caso de Alzheimer na família. Essas pessoas são
importantes não somente na indicação de neu-
rologistas, como na futura rede de apoio e soli-
dariedade que se forma, no caso do diagnóstico
de Alzheimer se confirmar.
Obviamente, ter acesso a um especialista ga-
baritado é algo mais complicado. Se você vive
relativamente perto de uma grande universidade
pública, há grandes chances de que essa institui-
ção tenha um centro médico. A vantagem desses
lugares é que, geralmente, há grande interesse
em entender e investigar sobre a doença e co-
nhecer os tratamentos disponíveis. Entenda que
não importa onde você esteja, buscar assistência
médica é crucial.

A equipe ideal
Mas por sua complexidade, uma vez diagnos-
ticada, a doença de Alzheimer acaba envolven-
do uma equipe multidisciplinar, ou seja, outros
especialistas médico, profissionais de saúde e holístico e adequado de Alzheimer. Idealmente todos os
de áreas correlatas. Embora idealmente o tra- profissionais envolvidos no tratamento de Alzheimer de-
tamento seja coordenado por alguém que possa vem ter especialidade em Gerontologia, que é o estudo do
acompanhar o caso desde o início, as necessida- envelhecimento em seus múltiplos aspectos: biológicos, psi-
des dos pacientes ultrapassam o treinamento de cológicos, sociais e outros.
uma só disciplina. É comum, por exemplo, que pacientes sejam vistos por
Em muitos casos, além de neurologista (para nutricionistas, capazes de recomendar dietas mais indicadas
as questões que afetam diretamente a destrui- para cada uma das fases da doença, seja para suprir uma
ção das células cerebrais), os pacientes passam deficiência de vitaminas específica seja para encontrar ali-
por geriatras, muitos deles conhecedores do mentos mais fáceis de deglutir, que mesmo assim garantam
desenvolvimento de Alzheimer porque seu pú- uma base nutricional eficiente.
blico, de idosos, é o mais vulnerável à doença. Entre os profissionais que tendem a participar do trata-
Ao contrário de outras especialidades, a geriatria mento, pode-se mencionar ainda psiquiatras, no caso de o
não trata de um determinado órgão, mas busca paciente apresentar distúrbio neuropsiquiátricos antes ou
ver a saúde do paciente idoso como um todo. depois do diagnóstico. Os psiquiatras também podem pres-
Muitas pessoas começam sua trajetória médica crever remédios que aliviem sintomas relacionados a com-
quando tem suspeitas de Alzheimer exatamente portamento típico de distúrbios mentais e podem monito-
por aí porque esses profissionais são mais pre- rar o perigo de interação medicamentosa.
parados para diferenciar o que faz parte do en- Bastante multidisciplinar, a lista ainda pode incluir den-
velhecimento normal (questões fisiológicas)e o tistas especializados, terapeutas ocupacionais e fisioterapeu-
que de fato é patológico ou anormal (doença). tas; assistentes sociais e psicólogos. Esses últimos muitas ve-
Assim, mesmo que uma demência seja diagnos- zes mais envolvidos com o apoio à família e aos cuidadores
ticada, um/a geriatra pode continuar a cuidar de diretos. Em alguns casos, até mesmo advogados participam
FOTO: SHUTTERSTOCK

algumas sequelas da doença e monitorar a saú- do problema, seja para assegurar os direitos médicos de
de geral do paciente, especialmente no tocante a cada paciente seja para mediar disputas familiares, quando a
outras condições relacionadas à idade. pessoa afetada pela doença não tem mais capacidade mental
Dependendo dos sintomas, mais profissionais para decidir sobre disputas jurídicas em família e aspectos
farão parte do time para um tratamento mais financeiros envolvidos no tratamento.

33
ALZHEIMER CAPÍTULO 6 Doenças senis

34
DOENÇAS
SENIS
Como identificar os sinais
de outros tipos de demência

FOTO: SHUTTERSTOCK

35
ALZHEIMER CAPÍTULO 6

E
mbora a doença de Alzheimer seja, ge-
ralmente, responsável por 60% dos casos
de demência, outros problemas podem
acarretar esse quadro. As coincidências
de sintomas são muitas , o que costuma compli-
car o diagnóstico. Mas conhecer mais sobre ou-
tras doenças senis e o que as diferencia entre si
pode ajudar a reconhecer as causas do mal e no
seu posterior tratamento.

O que é
demência? Além de todos esses sintomas, alguns quadros de demên-
Em primeiro lugar, é bom que se saiba que de- cia, incluindo Alzheimer, podem ser acrescidos de altera-
mência é um quadro médico amplo, de múltiplos ções de comportamento e até mesmo de personalidade. É
sintomas. Trata-se de uma doença mental que importante saber, no entanto, que não há uniformidade
se caracteriza pela perda da capacidade cognitiva de sintomas entre os pacientes de demência, nem mesmo
e que portanto pode incluir uma série de altera- quando a doença é provocada pela mesma causa. Alguns
ções como: serão afetados por apenas algumas das alterações comuns.
Como a doença é progressiva, é também usual que o
sintomas existentes de mantenham, só que mais agrava-
• perda gradativa da memória dos e sendo assim apresentando novos riscos aos pacien-
tes. O diagnóstico correto permite que o tratamento seja
• sentimento de desorientação mais adequado. As drogas prescritas para o Alzheimer, por
com relação a tempo e espaço exemplo, não serão as mesmas necessariamente para quem
tem demência vascular. O grande problema nessa área é
que nos estágios iniciais a dificuldade de diferenciação é
• dificuldades de raciocínio, de grande e requer investimento de tempo e muita paciência.
concentração e aprendizado

• deficiência na capacidade de Demência Vascular


julgar, mesmo em situações A demência vascular consta como a segunda maior causa
corriqueiras dos quadros de demência. É resultado de lesões cerebrais de
origem vascular, daí o nome, e manifesta-se distintamente,
• dificuldade ou dependendo da localização e da quantidade das lesões.
Embora a priori mais fáceis de detectar do que o Alzhei-
impossibilidade de realizar mer, as lesões vasculares cerebrais também podem passar
tarefas medianamente incógnitas se provenientes do chamado infarto silencioso,
complexas que acontece de forma diferente dos ataques reconhecidos
clinicamente e, ainda, como os AVCs (Acidente Vascular
Cerebral), também conhecidos como derrame. Quando
• impedimentos de
de pequenas proporções, os AVCs podem ser tomados ou
comunicação, sobretudo de confundidos com um mal estar súbito, retardando o diag-
linguagem nóstico correto tanto quanto o tratamento adequado.
No caso específico da demência vascular, os fatores de
• perda ou comprometimento risco são a hipertensão arterial, as doenças cardiovascula-
res, fibrilação atrial, trombose, tabagismo, alcoolismo, dia-
de habilidades visuais-espaciais betes mellitus ou do tipo 2 e fatores genéticos.

36
Demência de
Corpos de Lewy
Esse tipo de demência é causado pela presença
dos ‘corpos de Lewy’, um tipo específico de alte-
ração cerebral. Como na doença de Alzheimer,
a idade avançada é o maior fator de risco, em-
bora similarmente existam registros de casos de
desenvolvimento precoce. Ter um membro da
família com demência de corpos de Lewy pode
aumentar os riscos de uma pessoa.
Os sinais usualmente observados para o diag-
nóstico clínico dessa categoria de demência se
referem sintomas associados à Doença de Pa-
rkinson, que incluem rigidez da musculatura
e lentidão de movimentos, algumas vezes com
momentos de paralisia. Os tremores, por sua vez,
são bem mais raros. Outros sintomas marcantes
são alucinações: em geral, os pacientes relatam a
visão de pessoas, animais e objetos. Os sintomas
oscilam durante o dia, assim como as falhas cog-
nitivas e a agilidade mental.
Curiosamente, nesse tipo de demência os sin-
tomas compartilhados com o mal de Parkinson
e as alucinações acontecem no estágio inicial da
doença, ao passo que as alterações profundas da
memória nem sempre ocorrem. Por conta disso,
os doentes da demência de corpos de Lewy estão A doença tem sido associada com a velhice, desde incide
mais suscetíveis a quedas repetidas, desmaios, es- principalmente a partir dos 60 anos. Nos últimos anos, po-
tado de delírio e formas diferentes de alucinação rém, o número de casos entre pessoas jovens tem crescido
como, por exemplo, a auditiva, ou seja, acredita- de forma alarmante.
-se estar ouvindo algo. Há também maior sensi- Usualmente, o diagnóstico só ocorre um ano depois do
bilidade ao uso de antipsicóticos, medicamento início dos sintomas parkinsonianos. Nos casos em que a
indicado para o tratamento de alucinações e de- demência tenha início antes desse período, pressupõe-se
lírios, com reações adversas muito intensas. tratar-se de demência de corpos de Lewi. Note-se que a
atenção é uma das funções cerebrais mais afetadas nesses

Demência casos. A memória, embora possa ser alterada, não se perde


tão intensamente quanto nos pacientes de Alzheimer e esse
da Doença costuma ser um diferencial importante.

de Parkinson
Além da atenção, a pessoa se sente incapacitada para
planejar ou organizar algo e tem dificuldade para realizar
tarefas que exijam funções motoras. Adicionalmente, pode
Cerca de 40% dos pacientes diagnosticados ocorrer depressão.
FOTOS: SHUTTERSTOCK

com doença de Parkinson podem, em algum Não há medicamento que comprovadamente cure Pa-
momento, apresentar um quadro de demência. rkinson, mas uma grande variedade de medicamentos vem
Essa condição é também causada pelos corpos de sendo desenvolvida no sentido de desacelerar a progressão
Lewi, com a diferença de se alojarem em partes dos sintomas e prolongar a funcionalidade e a qualidade
diferentes do cérebro em pacientes de Parkinson. de vida dos pacientes.

37
ALZHEIMER CAPÍTULO 6

Demência higiene pessoal. Alternância entre depressão e ansiedade

Frontotemporal
é também comum.
Observa-se, como forma de diferenciar esse tipo de de-
mência daquela provocada por Alzheimer, que esta apresen-
Esse tipo de demência é assim designado ta alterações cognitivas menos evidentes, que de fato só se
porque sua presença pode ser diagnosticada, pronunciam depois de dois anos do primeiro diagnóstico.
tipicamente, num exame de neuroimagem que
apresente redução da região frontal e temporal
Demência da Doença
de Huntington
do cérebro. Embora também afete a capacidade
cognitiva, distingue-se da doença de Alzheimer
porque as mudanças de comportamento e de
personalidade se sobrepõem aos problemas de A doença de Huntington é uma desordem cerebral de-
memória e orientação. generativa e devastadora, que é transmitida geneticamente.
As mudanças mais facilmente observáveis cos- Qualquer pessoa cujo um dos pais tenha tido a doença tem
tumam incluir maior desinibição do que a pessoa 50% de chances de desenvolvê-la. Ao contrário dos outros
tinha normalmente, altos níveis de impulsivida- quadros de demência conhecidos e do Alzheimer, os sinto-
de e inquietude, incapacidade de julgamento, mas podem aparecer em qualquer fase da vida. No entanto,
oscilação emocional que pode apresentar extre- na maioria dos casos os sintomas têm surgido depois dos 30
mos: de apatia, isolamento e desinteresse ao sen- anos. Até o momento, não há cura para esse mal.
timentalismo excessivo; da ausência de motiva- Os testes genéticos para confirmar a presença do pro-
ção a comportamentos exaltados. Outros sinais blema já existem, mas a decisão de fazê-lo é pessoal. Há
característicos são: hipocondria; facilidade de também a possibilidade de teste fetal intra- útero, embora
chorar, riso em momento inadequado e exagera- existam implicações médicas e legais para obtê-lo. Nenhum
do; irritabilidade, dificuldade de convívio social teste, porém, pode prever quando a doença se apresentará
devido a comportamento inadequado. nem em que nível de gravidade irá se desenvolver.
Alguns exemplos desse comportamento di- A doença afeta todas as funções cerebrais, incluindo a
ficultam a vida tanto do paciente como de seus capacidade de se locomover. Nesse sentido, os sintomas de
familiares e cuidadores, tais como: comentários demência são alguns entre muitos outros. Como também
sexuais inadequados, atos violentos ou conside- trata-se de um mal progressivo, o paciente de Huntington
rados indecentes como urinar em público. torna-se gradualmente dependente de outros. Como a do-
Podem ainda ocorrer alteração dos hábitos ença interfere profundamente na vida emocional, econô-
alimentares, que são habitualmente marcados mica e social das famílias, apoio psicoterapêutico é usual-
pela preferência por doces e negligência com a mente indicado.

38
TRANSTORNOS MENTAIS E EFEITOS
DA INTERAÇÃO MEDICAMENTOSA
Embora não seja uma regra, há várias doenças concomitantemente,
casos em que a demência se faz acaba consumindo grande número
acompanhar de sintomas como de drogas para tratá-las. O uso de
delírios e alucinações, típicos de cada uma deve ser monitorado de
transtornos psicóticos, condição na perto para que um medicamento
qual há alteração de juízo da realidade. não interaja negativamente com
Da mesma forma, transtornos mentais outro. Além de agravar um sintoma,
como depressão, ansiedade e aqueles o uso de determinado remédio pode
no espectro da bipolaridade também diminuir ou anular o efeito que se
podem ser observados. deseja com outro. Em muitos casos,
Esses problemas são, muitas vezes, a simples retirada de uma droga ou
preexistentes, ou seja, já eram sua substituição, podem reverter
latentes ou se manifestavam antes do sintomas que pioram o quadro de
diagnóstico de Alzheimer e, quando demência como um todo.
acrescidos da demência, acabam se Não bastassem os riscos de
confundindo com as perturbações interação medicamentosa, o
cognitivas. organismo da pessoa idosa,
O aspecto positivo em se detectar especialmente, tem características
essas doenças separadamente que requerem, ainda mais, que
do quadro de demência é que são todas as drogas prescritas sejam
tratáveis ou podem ser controladas cuidadosamente avaliadas e
via medicamento. Por outro lado, o ajustadas caso a caso. Especial
grande perigo é que além da toxicidade atenção é recomendada nas
isolada de cada remédio, a interação prescrições de sedativos,
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medicamentosa pode intensificar hipnóticos e, neurolépticos e


sua toxicidade, provocando ou benzodiazepínicos. Mas também se
complicando um transtorno mental. aplicam a diuréticos, antibióticos,
Como o idoso, em geral, tende a ter cardiotônicos e hipotensores.

39
ALZHEIMER CAPÍTULO 7 Como diagnosticar?

40
COMO
DIAGNOSTICAR
O MAL DE
ALZHEIMER
É preciso muito cuidado para
não confundi-lo com outras
doenças típicas da senilidade
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41
ALZHEIMER CAPÍTULO 7

A
ansiedade sobre que testes
serão feitos e sobre como
ter certeza de que o pro-
blema vai ser reconhecido
corretamente é sempre grande. Mas
a visita a um consultório médico é o
primeiro passo para afastar a hipó-
tese da doença ou para, se confirma-
do o diagnóstico, saber como agir.
Hoje, acredita-se que haja cerca
de 90% de acerto num diagnóstico
clínico de Alzheimer, seguido de
acompanhamento do desenvolvi-
mento dos sintomas. No entanto, só
um exame acurado, em que patolo-
gistas analisam se há presença das
placas e emaranhados típicos de Al- gurar que um sinal de demência, como a perda de memó-
zheimer nos tecidos do cérebro, poderia assegurar ria, por exemplo, não seja erroneamente interpretado. Se
com total certeza que se trata realmente da doença. o problema for decorrente da carência de uma vitamina
Infelizmente, por ser um exame altamente invasi- específica ou de um distúrbio da tireoide, por exemplo,
vo e de risco só é realizado para efeito de estudos, pode ser temporário e reversível e nesse caso a simples
em autópsias, ou seja, depois do falecimento do indicação de um tratamento pode ser a primeira medida.
paciente. Em consequência disso, é comum para Descartadas essas hipóteses, entram na mira os quadros de
algumas pessoas no mundo todo conviver com um demências mais facilmente classificáveis, como por exemplo
diagnóstico de “provável” Alzheimer. aquelas ligadas a doenças cardiovasculares ou com caracte-
rísticas bem particulares, como a associada ao mal de Parkin-

Entrevistas
son, até que por eliminação se chegue ao Alzheimer.
Essa precaução é importante. Como os quadros de de-

e exames mência são na maioria progressivamente degenerativos e


incuráveis, seu diagnóstico pode ter um impacto avassala-
dor sobre a família e o doente. Assim, quase sempre nesses
Seja como paciente seja como acompanhan- casos, a menos que os sintomas sejam evidentes e em es-
te, prepare-se para responder a muitas pergun- tágio avançado, evita-se qualquer diagnóstico precipitado.
tas e desconfie se a avaliação clínica que fizer É também de praxe que a avaliação inclua exames am-
não as incluir. Entrevistas, análise de histórico bulatoriais comuns, frequentemente acrescidos de alguns
médico, acidentes, internações, doenças pre- detalhes como exame de reflexos; de força e tônus muscu-
existentes e histórico de saúde de parentes lares; habilidade de se levantar de uma cadeira e andar em
próximos geralmente constam da investigação. linha reta pela sala; acuidade auditiva e visual; coordenação
Normalmente, deve-se considerar Alzheimer motora e equilíbrio.
como possibilidade somente depois de exauri- Espere também um pedido de exames laboratoriais, nor-
das todas as outras causas. malmente de sangue e de urina, e de imagem, como tomo-
Em geral, todo cuidado é tomado para asse- grafias ou, de preferência, ressonância magnética do crânio.

42
Meu pai tinha
esquecimentos comuns
Testes de da idade, mas quando eles se
cognição tornaram repetitivos e preocupantes meus
irmãos e eu resolvemos procurar um
Depois ou juntamente com a entrevista, a médico clínico geral, que nos indicou
análise do histórico médico e dos exames ambu- depois um neurologista. Mas antes dos
latoriais , de laboratório e de imagem, é hora de exames específicos mais aprofundados,
se fazer testes para avaliar em que nível as con- as perguntas do primeiro médico, o clínico,
dições das funções cerebrais e cognitivas estão foram simples:
sendo afetadas.
-- Como está o senhor? -- Ele perguntou
Os testes de acuidade mental envolvem a re-
solução de problemas simples, teste de capacida-
depois de cumprimentá-lo.
de de atenção, habilidade de contar, e jogos de A resposta de meu pai:
memória. Os testes neuropsicológicos, por sua -- Doutor, não sei por que meus filhos me
vez, avaliam o relacionamento entre cérebro e trouxeram aqui. Estou ótimo, com boa
comportamento e ajudam sobretudo a avaliar saúde, não tenho nenhuma doença.
as condições do pensamento, das emoções e do O médico sorriu, concordando
comportamento. Os testes psicológicos avaliam
aparentemente com ele, mas depois de
mais profundamente o estado das funções cog-
nitivas e intelectuais de uma pessoa em várias es- conversar um pouco perguntou:
feras de atuação e podem ainda incluir testes de -- O senhor sabe que dia é hoje?
linguagem e de raciocínio. Alguns médicos po- A resposta veio com grande segurança:
dem, se for o caso, pedir também uma avaliação -- Sei, é lógico, hoje é segunda-feira,
psiquiátrica, considerando que certas condições ontem almoçamos em família, como
tratáveis, como a depressão, podem mimetizar
todos os domingos.
sintomas de demência.
A ordem dos procedimentos como apresenta-
O médico sorriu novamente,
mos aqui serve apenas como referência, poden- tranquilizando meu pai e disse:
do variar de profissional para profissional ou de -- Tudo bem, meu amigo, que bom.
acordo com as regras de cada clínica ou hospital. Mas eu queria saber na verdade
que dia do mês é hoje...
Dessa vez meu pai não conseguiu disfarçar.
-- Espere aí... já vou lhe dizer... Estamos em
outubro, não?
Não, não estávamos em outubro, e sim
no mês de agosto.
Lembro disso porque são perguntas
corriqueiras feitas pelos profissionais
especializados que podem ajudar a
detectar os primeiros sinais da demência.
E, como me disse o mesmo médico depois,,
é preciso ficar alerta sempre, porque
muitos paciente do mal de Alzheimer,
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principalmente quando são muito espertos


e inteligentes, conseguem no início disfarçar
muito bem a própria doença. Enganam os
outros, como a si mesmos. A.G.

43
ALZHEIMER CAPÍTULO 7

Que perguntas
esperar?
O exame clínico é chave para diagnosticar Al-
zheimer. A chamada Anamnese, a entrevista que
todo médico faz (ou deveria fazer) para saber o
motivo de uma dor ou outra mazela desconhe-
cida é normalmente mais extensa, quando há
suspeita de demência. Se possível, o paciente ou
acompanhante deve preparar-se para fornecer as
informações a seguir:

• Quando e como os primeiros


sinais de anormalidade foram
detectados (quanto mais
precisos os dados, melhor)

• De que forma essas


anormalidades ocorreram?
Ex.: quanto tempo durou, em
que circunstâncias, outras
particularidades... Descrições
detalhadas são úteis para a
definição do quadro

• Doenças pregressas,
especialmente as neurológicas
mas não só Memória Em caso de lapsos de memória, tente descre-
ver com precisão com que frequência ocorrem e dê exem-
plos concretos. Ex.: conta a mesma história repetidas vezes
• Doenças de familiares, casos
ou repete a mesma pergunta; esquece nomes de pessoas
similares com parentes próximos próximas ou tem dificuldades para reconhecer outras; colo-
ca objetos em lugares pouco usuais ou estranhos, sem se dar
• Problemas de saúde conta; esquece datas que antes podia lembrar-se bem; não
mal esclarecidos ou não tem desculpas razoáveis para a falta de memória.

diagnosticados: como desmaios, Comportamento Descreva situações em que houve


convulsões, contusões cranianas, mudança brusca de humor; atitudes muito distintas das
quedas sem motivo aparente normais de sua personalidade; apresenta explosões de raiva
sem motivo aparente ou por razões menores; age de forma
antissocial ou muito diversa da sua forma de se relacionar;
• Medicação de uso contínuo sente-se constantemente deprimido ou sem motivação para
ou eventual; possíveis efeitos nada; tem comportamento inadequado em público ou em
colaterais já experimentados. família; sente-se perseguido ou ameaçado.

44
NOVOS ESTUDOS
QUE PODEM
DETECTAR
Linguagem e comunicação:Informe
ESSE MAL
exatamente que tipo de interrupção de lingua-
A doença de Alzheimer ainda
gem costuma ocorrer. Ex.: diminuição de voca-
bulário; sentenças interrompidas por não se lem-
não tem um biomarcador,
brar de palavras; dificuldades de fala ou outras... ou seja, um fator biológico
detectável que indique a
Orientação Sobre problemas com tempo e existência da doença. Mas
espaço: observe se a pessoa confunde os dias da nesse sentido, e os cientistas
semana, não consegue acompanhar o calendário trabalham em incessantes
ou perde a noção das horas; tem facilidade para pesquisas sobre o tema.
perder-se mesmo em lugares familiares; tem a O que se busca é a possibilidade
sensação de não saber onde está. analisar os níveis de beta-
amiloide (que forma as placas
Autonomia Nas tarefas do dia a dia, note se senis) e a proteína tau, dos
há dificuldade ou lentidão incomum para realizar
neurofibrilares emaranhados.
tarefas corriqueiras como tomar banho, vestir-se
Outro aspecto ainda em estudo
ou para realizar atividades um pouco mais com-
plexas como conferir o saldo bancário, resolver
que poderia beneficiar
uma questão relativamente simples por telefone. grandemente o sucesso dos
diagnósticos é o isolamento de
Hábitos Relate o uso de álcool, cigarro ou fatores genéticos que oferecem
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drogas ilícitas no presente ou no passado; padrão maior risco de se desenvolver


de sono e se houve alterações recentes: Ex.: quan- a doença. Por enquanto, tudo
tas horas costuma dormir por noite, tem insô- isso ainda é restrito ao campo
nias, dorme bem... Atividade sexual e mudanças das pesquisas.
no padrão, promiscuidade.

45
ALZHEIMER CAPÍTULO 8 Tipos de tratamento

46
Conheça as melhores
e mais adequadas formas
de ajudar o paciente
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47
ALZHEIMER CAPÍTULO 8

E
nquanto a cura para o Alzheimer ain-
da não foi descoberta, encontrar a me-
lhor forma de tratar seus sintomas é o
grande objetivo de quem se dedica a
estudar a doença.
A doença de Alzheimer é incurável mas não
significa que não possa ser tratada. Muito ao
contrário, quanto mais precocemente diagnos-
ticada e quanto mais cedo puder se iniciar o tra-
tamento, tanto melhor.
O objetivo de qualquer tratamento são avan-
ços relativos mas cruciais, tais como:

• aliviar sintomas já existentes,


estabilizando seus efeitos por
mais tempo

• retardar o aparecimento de
novos sintomas

• diminuir o ritmo de progressão


do quadro sintomático

• prolongar o período de atividade


As drogas
e autonomia dos pacientes mais comuns
• manter por mais tempo a na fase inicial
qualidade de vida do doente
Entre as drogas mais comuns contra a demência, estão
À medida que um tratamento alcança es- as que melhoram a comunicação entre células do cérebro
ses objetivos, beneficia-se ao mesmo tempo a (as sinapses), atuando sobre acetilcolina, uma substância
qualidade de vida dos pacientes e a dos fami- neurotransmissora que se apresenta reduzida em pacien-
liares e cuidadores. tes de Alzheimer.
Há dois tipos de tratamento específicos para Há três medicamentos aprovados no Brasil que atuam
o conjunto de sintomas de Alzheimer: o farma- sobre a acetilcolina, que são de fato inibidores da acetilcoli-
cológico, que envolve a prescrição de medi- nesterase (ou anticolinesterásicos): a rivastignmina, a do-
camentos, e os não farmacológicos, uma va- nepezila e a galantamina. A colinesterase é a enzima que
riedade de estratégias para da mesma forma hidrolisa (destrói) a acetilcolina .
estender a capacidade cognitiva que ainda exis- A melhora é modesta e o tratamento é geralmente receitado
te e com isso ampliar também a independência nos estágios inicial e moderado da doença, momento em que
de cada paciente. há evidência de que tem efeito estabilizador para cognição e

48
nos estágios iniciais. Efeitos colaterais podem incluir prisão
de ventre, tonturas e dores de cabeça.
Nos casos de sintomas neuropsiquiátricos, algumas dro-
gas de uso específico e controlado podem ser prescritas
com bons resultados quando se observa a necessidade de
contenção de agressividade, agitação, delírios e alucinações.
Medicamentos como antidepressantes, usados para aju-
da no controle do comportamento associado a sintomas
de Alzheimer, devem ser usados com grande cautela. Isso
porque alguns, como por exemplo pílulas para dormir bem
populares e vendidas sem receita médica, podem aumentar
os casos de confusão e o risco de quedas. Da mesma forma,
remédios para aliviar a ansiedade podem ter efeito similar
, além de provocarem tontura. Somente um profissional
médico deve coordenar o uso e analisar a interação desses
medicamentos com outras substâncias. e
O uso de qualquer dos medicamentos indicados deve ser
monitorado e dosagens e horários devem ser seguidos ri-
gidamente. É extremamente perigoso, além de ineficiente
para o tratamento, fazer modificações por conta própria.
Além dos medicamentos reconhecidos como efetivos
para o que se propõem, há remédios e substâncias usual-
funcionalidade. Esses remédios também atuam mente mencionados, como o Ômega 3, a curcumina, a
positivamente sobre os sintomas neuropsiquiátri- ginkgo biloba, a selegilina, a vitamina E, os redutores de ho-
cos como agitação ou depressão. Mas impacto po- mocisteína, o estrogênio, anti-inflamatórios e estatina cuja
sitivo se atenua com a progressão da doença. eficácia nunca foi comprovada.
Os efeitos colaterais provocados por esses me- Enquanto os ácidos graxos de Omega3, encontrados em
dicamentos variam de pessoa a pessoa, e tam- peixes como o salmão, por exemplo, são conhecidos por
bém de acordo com a dosagem prescrita. Em evitar o declínio cognitivo, nenhum estudo até hoje pro-
geral, podem incluir perda de apetite, mudanças vou os benefícios de suplementos à base de óleo de peixe.
no padrão do sono, diarreia e náuseas. Pacientes O mesmo ocorre com a cúrcuma, um tipo de açafrão, que
com histórico de complicações cardíacas devem tem propriedades anti-inflamatórias e antioxidantes e que
ser monitorados ainda com mais cuidado porque pode afetar processos químicos no cérebro e com a ginkgo,
podem apresentar reações adversas mais graves. uma planta que contém várias substâncias. Testes clínicos
não encontraram benefícios de ambas no tratamento da
doença de Alzheimer.
Medicamentos Nutricionistas e médicos muitas vezes concordam em

para sintomas
ministrar vitamina E, acreditando que uma dose diária au-
xilia em diminuir a progressão dos sintomas de demência.

específicos Estudos nessa área ainda mostram conflitos, sobretudo so-


bre a dosagem a ser utilizada. Mas sabe-se que a vitamina
não tem a capacidade de evitar Alzheimer, assim como pre-
A memantina é um medicamento aprovado cisa de mais pesquisas para que possa ser incluída rotineira-
e prescrito para fases intermediárias e graves. mente como parte do tratamento farmacológico.
Atua em outra rede de comunicação entre as cé- É importante ressaltar, contudo, que suplementos vitamíni-
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lulas cerebrais, reduzindo um mecanismo de to- cos podem interagir com medicamentos usados por pacientes
xicidade específico dessas células. Pode ser usada de Alzheimer para doença específica ou para o tratamento de
isoladamente, mas muitas vezes é combinada aos outras condições de saúde. Nunca tome ou ministre um deles
anticolinesterásicos. Não há evidência na litera- sem o conhecimento do médico responsável e sem conhecer
tura da doença sobre os benefícios dessa droga plenamente os riscos e benefícios de cada um.

49
ALZHEIMER CAPÍTULO 8

Tratamento
sem remédio
Adaptar a vida cotidiana às necessidades dos
pacientes de Alzheimer é uma parte importante
de qualquer plano de tratamento da doença.
Para alguém que sofre de demência, estabele-
cer e manter uma rotina de hábitos e tarefas
que minimizem a demanda por memória pode
fazer a vida mais fácil. Muitas vezes bem in-
tencionados, familiares e cuidadores sobrecar-
regam os pacientes com atividades que julgam
estimular a capacidade cognitiva e ajudar no O tratamento que investe no treinamento de funções cog-
tratamento quando de fato apenas provocam nitivas como atenção, memória, linguagem, orientação e
resistência, frustração e um ambiente tenso que inclui técnicas compensatórias podem ser muito úteis
para todos os envolvidos. para o bem estar geral dos pacientes. No entanto, tem sido
Embora existam evidências científicas apoian- comprovado que eles se sentem mais seguros e confiantes
do a indicação de atividades de estimulação cog- quando podem realizar tarefas prazerosas e a seu alcance.
nitiva, social e física para manter as habilidades Por isso é tão importante que todas essas atividades e tarefas
ainda não alteradas e favorecer a funcionalidade sejam selecionadas criteriosamente e que sua frequência seja
em geral, é necessário compreender que o objeti- orientada, preferencialmente por profissionais como fisiote-
vo não é fazer que a pessoa afetada com demên- rapeutas e terapeutas ocupacionais.
cia volte a funcionar como antes, algo impossí- Usualmente são utilizadas técnicas para resgatar memó-
vel. A meta é fazer com que funcione da melhor rias antigas que exploram formas alternativas de apren-
maneira possível dentro de seus novos parâme- dizado. O método promove a associação de ideias, exige
tros de saúde. A aceitação dessa realidade é o pri- raciocínio e atenção dirigida. As atividades são sempre re-
meiro passo para que a estratégia dê certo. alizadas em etapa, sequencialmente, e antecipam os resul-

50
ATIVIDADES
FÍSICAS
Assim como as cognitivas, a prática
de atividades físicas traz benefícios
neurológicos além de ganhos em
coordenação motora, força muscular,
equilíbrio e flexibilidade. Estudos
comprovam que atividades físicas
regulares podem desacelerar
a evolução da doença.
As atividades devem ser, obviamente,
moderadas e dentro das condições
e habilidades de cada paciente e
sempre orientadas e monitoradas.
Usualmente incluem alongamentos,
exercícios dirigidos para
fortalecimento muscular e exercícios

Convívio social
aeróbicos leves. O que se nota é que
a atividade física contribui para que
se mantenha independência por
mais tempo e favorece a percepção Há uma tendência, infelizmente, na qual as pessoas que
sensorial, retardando assim sofrem com a doença de Alzheimer se afastam do convívio
o declínio de funcionalidade na social. Os próprios parentes e amigos do doente, em face
atividades cotidianas. das dificuldades com os sintomas, imaginam que não se
deve inclui-los em eventos sociais. O fato é que o estímu-
lo social é tão necessário como o cognitivo e o físico, mas
tados e suas consequências. Dessa forma, são como os anteriores também precisa ser planejado e ter uma
treinadas funções motoras e ao mesmo tempo orientação muito clara para que realmente seja benéfico.
oferecem controle de comportamento ligado a O contato social estimula as habilidades de comunicação,
impulsos e reações. convivência e afeto que por sua vez evitam a inatividade e a
Toda uma gama de tarefas pode ser planejada apatia típicas da doença. Além das intervenções culturais e
incluindo jogos, desafios mentais, treinos especí- de lazer em grupo com outros pacientes, num ambiente de
ficos, pequenos jogos construtivos, reflexões, res- fisioterapia ou terapia ocupacional, as pequenas reuniões
gate de histórias e o uso de materiais que compen- em família são também importantes.
sem questões específicas, como calendários para Pense sempre em organizá-las em torno de experiências
as dificuldades temporais, por exemplo. que foram positivas para a pessoa com Alzheimer. Para as-
O número e a qualidade das atividades de es- segurar-se disso, é sempre aconselhável que se observe em
tímulos de cognição ou físicos devem ser mo- que circunstâncias ela se sente confortável e satisfeita . O
nitorados e avaliados de acordo com o retorno que lhe provoca interesse e motivação? Quem são as pesso-
dos próprios pacientes. Somente atividades as que lhe deixam tranquila e feliz?
agradáveis e compatíveis com o nível de capaci- É essencial que esses encontros se realizem em torno des-
dade de cada pessoa costumam ter o efeito que sas experiências positivas e em lugares pouco movimenta-
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se espera. Em geral, quando conseguem reali- dos, em pequenos grupos. Gente demais e agitação podem
zar as tarefas a que são submetidos, os pacientes reforçar os sentimentos de confusão. Como é mais compli-
melhoram a autoestima e demonstram maior cado desde a primeira fase acompanhar conversas parale-
iniciativa. Como resultado, potencializam as las, o melhor é reduzir estímulos simultâneos e manter o
funções ainda preservadas. ambiente calmo.

51
ALZHEIMER CAPÍTULO 8

Lembre-se que o contato com a família é im- Alzheimer começa a perder a autonomia, vai cada vez mais de-
portante e passa a ser o principal recurso de inte- pender muitas vezes de membros da família e de um ou mais
ração social de muitos pacientes, por isso devem cuidadores para realizar atividades da vida diária. Um número
ser mantidos. Apenas deve-se sempre observar maior de profissionais de saúde acabam se envolvendo com o
esses cuidados com o ambiente e não forçar situ- tratamento, que já deve incluir suporte maior à funcionalidade
ações constrangedoras . Uma boa ideia é resgatar básica. Nesse momento, o foco do tratamento passa a ser o de
memórias de família, sempre as mais relevantes e minimizar as dificuldades na realização das tarefas fundamen-
que trazem mais alegria à pessoa em questão, ou tais.
falar de atividades rotineiras que estejam sob seu O avanço dos sintomas passa a exigir outros tratamentos volta-
alcance. O afeto e o contato físico também devem dos a problemas específicos que decorrem da perda de algumas
acontecer normalmente, sempre respeitados os capacidades, como alimentação, deglutição e fala, por exemplo,
momentos e o nível de conforto de cada paciente. área que exige a atuação de um fonoaudiólogo e/ou nutricionis-
ta. A partir deste momento, o tratamento toma novos rumos
porque não se concentra na potencialização da função cognitiva
Cuidados ou na minimização de efeitos dos sintomas, mas muitas vezes

específicos
busca evitar que se exponham a situações de risco muito sérias.
Hoje vários profissionais como enfermeiros, atendentes e cui-

para cada fase


dadores, entre outros, são especialmente treinados para com-
preender essas necessidades específicas do paciente de Alzhei-
mer e atuar com mais eficiência e respeito à dignidade de cada
Na fase inicial da doença o choque do próprio um. Idealmente, todos os doentes deveriam ter direito e acesso a
paciente e o de se seus familiares mais próxi- um tratamento humanizado.
mos pode envolver e provocar muitas emoções
e sentimentos de frustração. É comum que, ainda
consciente do que virá pela frente, pacientes se
sintam desmotivados e arredios. Por isso, nesse
momento o foco de qualquer tratamento é, assim
que avaliados os danos, investir na preservação.
da aptidões que ainda não foram afetadas pela
doença. A socialização e os estímulos, obviamen-
te associados ao medicamento prescrito, são a
principal linha de tratamento.
Num segundo momento, quando o doente de

52
CRIANDO UM AMBIENTE SEGURO

Organizar um ambiente tranquilo


pode melhorar as nuances de humor,
a relação com as outras pessoas e
até mesmo influenciar na capacidade
cognitiva. No sentido de apoiar o
sentimento de bem estar e de que
continua “funcionando”, algumas
medidas podem ser adotadas criando
para quem sofre de Alzheimer um
ambiente seguro e mais fácil de
navegar, tais como:

• Estabeleça rotina simples e estável.


• Deixe objetos como chaves e
celulares sempre no mesmo lugar;
• Tente conversar com o médico para
que a medicação possa ser tomada em
uma dose por dia ou da forma menos
complicada possível.
• Visitas de rotina ao médico
também devem ser preferencialmente
agendadas sempre no mesmo dia da
semana e horário.
• Em questões financeiras, arranje
para que recebimentos como • Equipe a casa com corrimãos
aposentadorias e pagamentos de conta nas escadas e barras de apoio em
sejam feitos automaticamente. corredores e banheiros.
• A pessoas em estágios inicias de • Limpeza e organização inspiram
Alzheimer devem ter um telefone menos sentimentos confusos.
celular com todos os números mais • Sapatos devem ser confortáveis,
importantes programados para resistentes e sobretudo seguros para não
que possam acessá-los em caso de causar ou facilitar escorregões e quedas.
necessidade com apenas um toque. • Reduza o número de espelhos pela
E se possível, com mecanismo de casa. Usualmente confundem e assustam.
localização pois assim poderiam ser • Mantenha o maior número de fotos da
localizados caso se percam. família pela casa para reforçar a presença
• Anote tarefas e compromissos em dos entes queridos na memória.
um quadro ou calendário grande • Evite situações imprevistas,
em parte visível da casa e cheque cada sobretudo as que possam ser
um a medida que forem cumpridos. interpretadas como ameaçadoras.
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• Remova tapetes pequenos e • Mantenha um tom de voz ameno


excesso de móveis, criando espaços e evite barulho e ruídos
mais abertos e seguros. • Amenize estímulos luminosos intensos

53
ALZHEIMER CAPÍTULO 9

54
OS DESAFIOS DE UM
FAMILIAR-CUIDADOR
Cuidar de uma pessoa próxima com
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Alzheimer exige conhecimento sobre a


doença e muita dedicação

55
ALZHEIMER CAPÍTULO 9

A
confirmação do diagnóstico de Al- Talvez o maior desafio seja exatamente este, tentar se adap-
zheimer, uma doença degenerativa e tar a uma doença cujos sintomas são erráticos. Isso quer di-
incurável, pode causar um impacto zer que, quando você pensa que agora sabe exatamente como
de enormes proporções emocionais e agir diante de determinado problema, um outro, de caracte-
práticas para o doente e sua família. Passado o rística completamente diferente surge, ou aquele que parecia
choque inicial e as etapas de aceitação, chega o sob controle se agrava e muda todo o cenário. Não bastasse
tempo de tomar decisões para garantir que to- tudo isso, aquela pessoa doce, compreensiva e razoável que
dos os envolvidos passem pela experiência de você conhecia, de repente se transforma em um ser estranho:
forma menos traumática e sem tanto estresse. sem os mesmos interesses de antes, com hábitos esquisitos e
Uma doença em família causa comoção, per- personalidade desagradável. E não adianta reclamar porque
turba a rotina e angustia não só a pessoa diag- aquela pessoa ali, em frente de você, não faz nada disso por-
nosticada mas seus entes queridos também. que queira machucar você; aquela pessoa sofre de um mal
No caso das demências, tudo isso é elevado ao que causa justamente toda essa transformação.
quadrado porque sabe-se de antemão que não Como cuidar de um ente querido sem se deixar abater
há cura e que gradativamente o quadro só vai demais durante o processo? Como levar uma vida saudável
piorar. Tudo isso é verdade. No entanto, com o e normal sem negligenciar as necessidades da pessoa que
aumento da incidência de casos, uma vez que agora está sob seus cuidados? Há muito que se pode fazer
a população mais vulnerável ao problema, os para se preparar e se fortalecer, mas acima de tudo é pre-
idosos, tem aumentado bastante, muita coisa já ciso lembrar que o isolamento não ajuda. De fato, este é o
foi observada e aprendida. Sabe-se por exemplo momento de buscar redes de apoio e solidariedade entre os
que é preciso lidar com as demandas da doença, que vivem uma situação parecida e não limitar demasiada-
preservando a qualidade de vida do doente, cla- mente sua vida social.
ro, mas sem jamais se esquecer da integridade Diante de um diagnóstico positivo, os sentimentos mais
física e emocional dos familiares-cuidadores. comuns são de impotência, revolta e de injustiça. Triste, cer-

56
to? Triste demais. Mas se você é a cuidadora ou • Não acredite que suas relações com
cuidador, precisa urgentemente entender algumas
a pessoa doente estejam para sempre
“regras básicas de sobrevivência”. Aos poucos, e
com calma, a convivência com a doença e com a destruídas; uma nova relação pode
pessoa com Alzheimer pode-se tornar mais tran- estar se estabelecendo. Mantenha-se
quila e a nova realidade mais administrável: flexível às mudanças.

• Informe-se sobre a doença • Prepare-se para tomar decisões no


em fontes fidedignas e evite âmbito financeiro e legal, se a pessoa
estereótipos. Só assim vai se com Alzheimer ainda puder expressar
preparar para as reflexões e suas preferências, tente envolve-lo(a)
decisões importantes que cada nas decisões tanto quanto possível.
etapa da doença exige. Este seria também o momento de
conhecer os desejos da pessoa para
• Faça perguntas nas consultas decisões futuras.
médicas e desfaça as dúvidas
que tiver com todos os
profissionais envolvidos no
tratamento para entender
melhor o que cada ação
significa; questione e discuta
formas de tratamento. Em
outras palavras, envolva-se no
tratamento de seu ente querido.

• Nunca feche os olhos para


novos sintomas; fingir que eles
não existem só piora o quadro.
Quanto mais cedo eles forem
detectados, mais chances de se
retardar seus efeitos.

• Paciência vai ser fundamental


para sua sanidade física e
mental. A aceitação da nova
realidade vem aos poucos,
convivendo e aprendendo
com a evolução da doença .
FOTO: SHUTTERSTOCK

Permita-se um período de
adaptação, que é natural e
necessário.

57
ALZHEIMER CAPÍTULO 9

A missão
de cuidar
Os dicionários de Língua Portuguesa nos
oferecem várias definições para o verbo
cuidar. Em geral, entende-se como: tratar
de alguém, garantir seu bem estar , preser-
vação e segurança; tomar conta de alguém.
E mais: ocupar-se de uma coisa ou pessoa;
responsabilizar-se por alguém ou dedicar
esforço e tempo com determinado obje-
tivo; ter interesse por algo ou alguém ou,
ainda, como nos ensina a origem latina
da palavra ‘cogitare’, (que significa pensar,
cogitar), cuidar de uma situação ou pessoa
implica em pensar e planejar. Nada poderia
se aplicar melhor à tarefa de quem vai se
tornar cuidador ou cuidadora de uma pes-
soa com Alzheimer. E seguindo essa lógica,
os melhores cuidados envolvem sempre
muito pensamento e planejamento.
As tarefas dos cuidadores mudam de acor-
do com cada fase da doença. Em princípio,
quando a pessoa com Alzheimer ainda mantém a autono-
• Fortaleça-se. Busque
mia, o trabalho se restringe a acompanhar as visitas médicas,
apoio, peça ajuda se precisar, envolver-se no tratamento e garantir que o medicamento e
participe de grupos e esteja em os cuidados necessários sejam tomados e a rotina mantida.
contato com os amigos. Delegue É hora de adaptar a casa onde o doente vive para pro-
e não tome para si todas as mover um ambiente seguro e de fácil navegação e estar
mais perto para observar cada alteração e novo sintoma.
responsabilidades. Sempre que Lembre-se que não se pode mais confiar somente no que
possível, compartilhe tarefas conta o próprio doente. Você de alguma forma vai ser a
com outros membros da família fonte dessa informação e como não pode estar em todos
ou cuidadores profissionais. os lugares ao mesmo tempo, deve para isso contar com a
colaboração de familiares, amigos próximos do doente e,
quando for o caso, trabalhadores domésticos ou cuidado-
• Tenha um tempo só para você res profissionais.
todos os dias. Um questionamento comum dos familiares-cuidado-
res é quando começar a interferir ou em que momento
ter certeza de que seu ente querido com Alzheimer não
• Não se descuide da própria
pode mais cuidar de si próprio e em quais situações? Veja-
saúde. Pratique exercícios mos alguns exemplos hipotéticos mas bem comuns: uma
regularmente, durma bem e pessoa que insiste em continuar dirigindo (situação que
alimente-se de forma saudável. costuma afetar mais os homens); ou alguém que se torna
agressivo ou irritável porque quer manter o controle sobre
seu dinheiro; raiva ou desespero quando surge a percep-
• Não hesite se precisar ção de que a casa está mudando; dificuldade em abando-
de apoio psicológico. nar o trabalho e uma vida produtiva.

58
Minha mãe começou maravilhosos. Foi esse o primeiro indício,
percebido pela minha irmã, de que havia
a apresentar um problema. Num dia de semana,
sintomas de enquanto preparava o almoço, minha
Alzheimer mãe perguntou se era melhor
com 75 anos. servir o estrogonofe com arroz ou com
macarrão, não se lembrava...
Até então sempre havia sido uma Como era muito inteligente, disfarçou
pessoa ativa, mesmo aposentada da logo em seguida dizendo “ah, essa
área de educação. Inteligente e culta, cabeça, desculpe, estava distraída”.
adorava ler livros de suspense e o que Nesse tempo, éramos vizinhas, e no
mais lhe caísse nas mãos. Alguns anos final do dia, ao voltar da editora onde
antes da doença, porém, parecia uma trabalhava, eu me encontrava com
pessoa mais triste, principalmente depois ela e conversávamos, vez em quando
que se divorciou de meu pai, que ela tomando uma dose de uísque com
nunca mais quis ver por ter se sentido guaraná, como ela pedia e gostava.
profundamente magoada por ele quando Tinha parado de fumar havia muito tempo
ambos já estavam na casa dos 60 anos... e se alimentava bem, saudavelmente. Mas
Nunca se arrependeu da separação, eu estranhava o olhar distante e triste
imposta por ela (até quando ele morreu quando ela dizia e repetia nessas noites
não quis ir ao enterro), mas com certeza coisas que nunca havia nos contado,
se sentia mais sozinha, apesar de ainda lembrando de sua infância e adolescência,
morar com minha irmã. Além disso, de seus pais e avós... Até que um dia
os netos, seu amor maior, estavam ela me chamou de mãe, ficando
crescidos e menos dependentes dela, brava quando eu disse que ela era
que tanto cuidara deles. a mãe, e eu, a filha.
A mágoa sentida foi marcante e parece Não percebi, não admiti, não
ter se estendido nos anos seguintes, acreditei que aquela mulher antes tão
embora ela sempre tentasse disfarçar. independente e forte, estivesse doente.
Tenho comigo que minha mãe se tornou Até que a realidade se mostrou inteira
deprimida, solitária, vivendo longe e foi necessário encará-la. Minha irmã
das irmãs amadas, que moravam em e eu a acolhemos enquanto pudemos.
outra cidade, sem amigos próximos, Depois de alguns anos foi preciso
sem atividades prazerosas com outras interná-la numa clínica especializada em
pessoas. A exceção eram os almoços de pacientes com Alzheimer. Morreu aos 86
domingo em família, quando ela cozinhava anos, sem nos conhecer. Nunca deixou
para as filhas e netos e parecia feliz. de reconhecer, porém, nossos beijos e
FOTO: SHUTTERSTOCK

Ela cozinhava muito bem, desde abraços carinhosos, que a faziam sorrir.
jovem, fazia pratos salgados e doces C.M.C.

59
ALZHEIMER CAPÍTULO 9

POR QUE
PARTICIPAR DE
UM GRUPO
DE APOIO
No mundo todo, o papel dos grupos
de apoio são fundamentais porque:
são centros importantes de difusão
de informação sobre a doença para
que a família cuidadora se sinta mais
preparada para suas tarefas; é um local
onde se aprender com as experiências
de pessoas que passam por situações
similares, com suas frustrações,
dificuldades, e compartilhar o que
esteja funcionando.
Em geral, os grupos oferecem também
um espaço em que os familiares
podem sentir que não estão sós e que
podem inclusive atuar para advogar em
defesa dos direitos dos pacientes de
Alzheimer na sociedade. Para a a Abraz
-Associação Brasileira de Alzheimer,
os grupos de apoio têm se mostrado

Como confrontar
uma ferramenta eficaz para o familiar-
cuidador da pessoa com demência.

Conheça alguns dos benefícios os desafios


da participação:
• Troca de informações, facilitando a Cada problema deve ser abordado de acordo com varian-
identificação de sintomas mais cedo e tes: identifique em que nível os sintomas já estão afetando
estimulando adesão ao tratamento; o paciente e se ainda podem avaliar em bom juízo, correta-
• Ajuda na aceitação do quadro da mente, uma situação. Sua própria avaliação é válida porque
doença e suas consequências; não existe uma regra que se aplica a todos. Mas a experi-
• Oferece oportunidade de integração, ência de outros e o bom senso podem ser bons indicativos
convívio social e troca; para saber como agir. Então vejamos exemplos de boa con-
• Conhecimento de outras experiências dução de conflitos no que se refere aos exemplos acima.
pode inspirar maior flexibilidade e
adaptabilidade; DIRIGIR CARROS
• Permite maior reflexão sobre o papel Muitas pessoas, por dirigirem anos a fio, acabam incor-
do familiar-cuidador com pessoas porando a atividade como algo automático. Assim, pode
passando pela mesma situação e isso parecer que não tiveram sua capacidade de condução afe-
pode aliviar o estresse; tada. Desconfie disso. Conduzir um automóvel é um ato
• Possibilidade de criação e complexo que depende de reflexos e tomada de decisões
desenvolvimento de estratégias para rápidas. Portanto, deve ser restringida. Tente convencer
o enfretamento dos problemas mais a pessoa, de preferência na presença de outro familiar ou
comuns a todo cuidador. com a ajuda do próprio médico, dos perigos de continuar

60
QUEM ASSUME OS CUIDADOS?
Em algumas culturas ancestrais, os vezes configurações diferentes.
papeis de cada membro da família eram Em muitos casos, a pessoa que se vê
bem definidos e imutáveis, portanto como cuidadora não fez exatamente uma
não passíveis de discussão. Mas hoje, opção mas acabou tendo de assumir
felizmente, os papeis são flexíveis e esse papel. A experiência mostra que
intercambiáveis. Como as famílias a falta de diálogo entre os familiares, a
modernas decidem quem vai ter a divisão injusta de tarefas e as diferenças
responsabilidade de cuidar de um pai, de percepção entre os que estão em
mãe, tia ou avó com Alzheimer? constante contato com o doente e a
Ao que se observa, os cuidados são realidade da doença e os visitantes
assumidos na maioria dos casos pelos eventuais causam conflito e tensão.
parentes mais próximos: filhos ou Idealmente, todas as etapas de cuidados
cônjuges, na maioria mulheres. devem ser compartilhadas assim como
A decisão pode ser porque o as decisões relativas ao doente e seu
familiar-cuidador mora na mesma bem estar. Embora seja quase inevitável,
casa (proximidade física) caso dos por questões práticas, que haja um
cônjuges, ou por proximidade de cuidador principal, o apoio efetivo de
parentesco ou afeto, como filhos e todos os familiares, financeira, logística e
netos. Mas os novos modelos familiares afetivamente são importantes e nas fases
apresentam algumas mais agudas da doença, fundamentais.

dirigindo. Nem sempre é necessário referir-se ESPAÇO EM TORNO


diretamente à deterioração cognitiva, mas refor- Quanto ao espaço em torno da pessoa com Alzheimer há
çar que é uma questão de saúde e que coloca em duas medidas importantes a serem observadas: se por um
risco não somente o/a motorista como outros. lado é urgente transformar o ambiente em um lugar seguro,
Se possível, venda o carro ou mantenha a pessoa que não exponha o paciente a riscos, por outro isso tudo
afastada dele e prefira evitar confrontos. deve ser feito da forma mais sutil e menos dramática possí-
vel. Instale equipamentos de apoio e segurança aos poucos
AUTONOMIA FINANCEIRA e sem grande alarde para não assustar e confundir a pessoa.
A questão de autonomia sobre as finanças é Uma mudança drástica que torne o lugar irreconhecível
também muito delicada. Familiares muitas vezes num primeiro momento pode ameaçar a estabilidade dos
discordam em como agir e podem tirar toda a sintomas e causar piora.
autonomia do doente quando a pessoa ainda tem
condições de avaliar o que está acontecendo. Pre- RELAÇÃO COM O TRABALHO
ferivelmente, uma decisão desse porte deve sem- Por fim, quanto à relação com o trabalho, as medidas
pre ser tomada enquanto a capacidade cognitiva e também diferem de acordo com o nível de comprometi-
de julgamento do paciente ainda esteja presente. mento intelectual e com a ocupação de cada pessoa. Para
Evite brigas familiares na presença da pessoa, em os que ainda se encontravam ativos no mercado de traba-
FOTO: SHUTTERSTOCK

qualquer caso. Gradualmente, controle o acesso a lho, a transição tende a ser mais difícil. Se a aposentadoria
cartões de crédito, cheques e grandes quantias de compulsória é complicada mesmo nos casos em que não
dinheiro. Uma boa transição é permitir que a pes- há comprometimento cognitivo, imagine quando a pes-
soa mantenha cédulas de pouco valor e impedir soa não tem mais toda a habilidade mental para decidir e
que ela faça compras desacompanhada. compreender a necessidade de parar de trabalhar? Quan-

61
ALZHEIMER CAPÍTULO 9

do possível, o ideal é criar uma situação em


que a pessoa ainda possa realizar pequenas Todos os verões
tarefas em casa. Isso fica totalmente inviabi-
lizado quando o trabalho envolve atividades da minha infância
perigosas ou com instrumentos que possam foram passados
causar acidentes.
Em qualquer caso, o ideal é oferecer ativida-
com meus avós
des laborativas alternativas que o paciente pos- paternos, em Mobile,
sa cumprir e que não ofereça riscos à integri- Alabama onde eles viviam ou, na
dade física. Terapeutas ocupacionais poderão maior parte das vezes, viajando
auxiliar na escolha dessas atividades e na forma
pelo país. Eu fui por sete anos
como podem ser introduzidas como tarefas re-
levantes aos pacientes. o único neto deles e portanto o
O nível de intervenção dos cuidadores au- centro das atenções. Em 1981,
menta à medida que um/a paciente perde a in- meu avô se aposentou com uma
dependência. Assim, num primeiro momento grande festa e homenagem da
as principais tarefas geralmente se resumem a: empresa onde ele trabalhou como
engenheiro elétrico. Já naqueles
• organizar a rotina da anos era possível perceber a
pessoa doente;
crescente frustração dele ao não se
• garantir que os horários e as lembrar das regras dos inúmeros
doses dos medicamentos sejam jogos de baralho, que era nosso
cumpridos à risca; costume jogar por tardes inteiras.
Às vezes, ele esquecia o que tinha
• favorecer os tratamentos na geladeira ou outros detalhes
e ajudar efetivamente para corriqueiros e isso o deixava muito
que haja adesão por parte
do doente; zangado. Mas minha avó , meu
pai e meus tios pareciam ver tudo
• monitorar as alterações e o simplesmente como "coisa da
agravamento de qualquer sintoma; idade". Em 1996 eu o vi pela última
vez quando ele já estava em uma
• preservar a higiene e a segurança instituição fazia alguns anos. Ele já
do doente, equipando da melhor
não falava e não me reconheceu .
forma sua casa ou espaço;
Quando saímos -- eu, minha avó e
• garantir autonomia ao paciente, minha esposa --, ele nos seguiu. Até
permitindo que ainda faça escolhas que parou como se não soubesse
sempre que possível; mais o que estava fazendo. E
nós o vimos parado no fundo de
• tomar decisões de ordem um longo corredor com o olhar
financeira e jurídica quando a
pessoa afetada já não tiver mais na nossa direção, mas perdido.
capacidade crítica e de julgamento; Meu avô morreu no dia do meu
aniversário de 30 anos, enquanto
• manter e estimualar os dormia. Ele tinha 83 anos.
laços afetivos , de modo que o doente D. P.
se sinta acolhido e amado.

62
VOCÊ
JÁ VIU
ESSE
FILME?
Quando os
cuidados O FILHO DA NOIVA
são essenciais Argentina, 2001
(El Hijo de la Novia)
Direção: Juan José
Desde os primeiros sinais da doença, uma Campanella.
pessoa com Alzheimer vai precisar contar com a Com Ricardo Darín,
ajuda de alguém: cônjuges, filhos, companheiros, Norma Aleandro
sobrinhos, amigos mais próximos. Dependendo e Hector Alterio
da velocidade com que a doença evolua, a frequ- Rafael, de 42 anos, é um
ência de cuidados e o número de tarefas de um dono de restaurante,
incomodado por se ver
cuidador aumentam intensamente. Quando o
sempre à sombra do pai
doente perde a autonomia e muitos dos movi-
e vivendo em constante
mentos motores , passa a depender de alguém estresse. Dedica pouco
para muito mais tarefas do dia a dia, incluindo PARA SEMPRE tempo à filha, não assume
para locomover-se, para realizar sua higiene pes- ALICE de fato a namorada e
soal e para a segurança mais elementar. EUA, 2014 raramente visita a mãe,
Na chamada fase moderada dos sintomas é (Still Alice) Direção: que sofre da doença
também quando podem ocorrer mudanças de Richard Glatzer, de Alzheimer. Um
personalidade e as relações se tornam mais deli- Wash Westmoreland. pequeno enfarte o leva a
cadas. O paciente pode também perder a noção Com Julianne Moore, reencontrar –se com um
de autopreservação e deixar de reconhecer pesso- Alec Baldwin amigo de infância e o faz
as, incluindo seu próprio familiar-cuidador. e Kristen Stewart repensar sua vida. Entre
A vida de Alice (Julianne seus novos planos está a
Para se adaptar ao agravamento do quadro
Moore), uma prestigiada organização do casamento
sintomático, às vezes são necessárias transfor-
professora de Linguística de seus pais na igreja, um
mações extremas na rotina do doente, como e mãe de três filhos, se desejo que a mãe tinha
mudança de casa ou a presença de outros cui- transforma quando e que o pai, agora, nesse
dadores. E também podem afetar e resultar em ela é diagnosticada momento tão delicado
mudanças no cotidiano profissional e domésti-
FOTOS: SHUTTERSTOCK E DIVULGAÇÃO

com um caso de da vida deles, quer


co para o familiar-cuidador e sua família. Alzheimer precoce. cumprir com sua ajuda.
A tarefa de cuidar de alguém sofrendo com de- Como sempre acontece, O filme demonstra com
mência é de enorme responsabilidade e apresenta toda a família é afetada. grande lirismo a tristeza
demandas físicas e psicológicas intensas. É peno- O filme rendeu a da condição de Norma
sa demais para uma só pessoa porque é múltipla e Julianne Moore um (Norma Aleandro), a noiva,
de variada carga de dedicação e tempo. Por todas Oscar de melhor atriz. e como isso afeta a família.
essas razões, deve ser dividida com outros mem-
bros da família.

63
ALZHEIMER CAPÍTULO 10

64
CUIDADORES
PROFISSIONAIS
Alguns anos atrás, a profissão
foi regulamentada legalmente.
Mesmo assim, ainda sobram
dúvidas sobre que papel
ocupam os cuidadores nos
tratamentos e cuidados aos
doentes de Alzheimer

FOTO: SHUTTERSTOCK

65
ALZHEIMER CAPÍTULO 10

N
o passado, em algumas comunidades, Compreendidas as peculiaridades deste trabalho e de-
havia divisão de várias tarefas entre as pois da decisão tomada, como escolher a melhor ou o me-
pessoas, incluindo o cuidado das crian- lhor profissional em cada caso? A seguir algumas conside-
ças e dos velhos. Hoje, especialmente rações importantes:
nas grandes cidades, essa dinâmica desapareceu.
Sem contar a industrialização e modernização • Em primeiro lugar a pessoa deve ter experiência
da sociedade , muitas vezes o cônjuge, pessoa com pacientes com Alzheimer ou, pelo menos, ter
que se encarregaria desses cuidados, já faleceu conhecimento sobre os sintomas e as características
ou também já está em idade avançada, tornan- da doença. Isso evita problemas comuns com
do sua função de cuidador ou cuidadora ainda cuidadores que interpretam as atitudes dos doentes
mais árdua. Vivemos ainda o agravante de um como preguiça ou má vontade.
crescente número de pacientes de Alzheimer
nos últimos anos, uma condição que traz mais • Experiência geral é sempre desejável. Ainda mais
complicações e novas exigências na área de saú- se o paciente a ser cuidado já se encontra em fases de
de do idoso, mesmo no espectro das demências. moderada a grave.
Além do trabalho propriamente braçal: dar
banhos, alimentar, cuidar da troca de fraldas nos • É sempre aconselhável pedir referências e confirmar
que já não têm mais controle urinário e fecal, com antigos empregadores a veracidade das
ajudar na locomoção e todos os cuidados bási- informações.
cos que fazem da tarefa de cuidar de um pacien-
te de Alzheimer um trabalho pesado, a condição • Hoje já existem cursos de treinamento e formação
dos doentes requer humanidade, compreensão de cuidadores, que devem ter no mínimo o ensino
e compaixão. fundamental. Procure conhecer as escolas e cursos
O cuidador de um paciente de Alzheimer tem por meio dos grupos de apoio de sua região e dê
de lidar com tarefas difíceis, com uma pessoa preferencia aos que preparam para o trabalho com
em que a interação social e habilidade cogniti- pacientes com demência.
va declina a cada dia. Mesmo assim, essa pessoa
tão fora dos padrões e com tantas necessidades • Como qualquer outro trabalhador, o cuidador
é um ser humano, uma pessoa amada por sua deve ter seus direitos trabalhistas respeitados. Um
família, que vai esperar que ele/ela receba os cui- contador ou escritório de contabilidade pode ser
dados que precisa. Por esse motivo, a ansiedade consultado sobre os tipos de contrato legais.
é sempre grande, especialmente porque alguns
pacientes resistem à introdução a uma pessoa • Além de cuidadores autônomos, há agências
nova ou já estão apegados demais ao familiar- especializadas que fazem todo o trabalho de
-cuidador. Mesmo assim, poder dividir a carga checagem de antecedentes e tentam combinar os
de trabalho e de responsabilidades contribui perfis de paciente e cuidador. Outra vantagem é que
muito para a qualidade de vida do familiar-cui- podem oferecer substitutos se um cuidador precisar
dador. Assim, os que têm condições financeiras se ausentar por qualquer razão. Os contratos nesses
de arcar com os custos, veem na contratação de casos são feitos com a empresa que se encarrega de
um cuidador a oportunidade de levarem uma garantir os direitos trabalhistas ao profissional. Pela
vida menos atribulada e mais normal. conveniência, em geral esses serviços podem ser mais
caros, o que não garante necessariamente que uma
pessoa vinda por esse meio vá ser mais eficiente ou ter
melhor relacionamento com o paciente.

• Ao se decidir pela contratação de um profissional,


o ideal é respeitar um certo período de transição
gradual, em que o paciente tenha tempo de se adaptar
à nova realidade.

66
QUALIDADES
INDISPENSÁVEIS
EXPERIÊNCIA ANTERIOR
OU TREINAMENTO
ADEQUADO

COMPREENSÃO DAS
CARACTERÍSTICAS
ESPECÍFICAS DA DOENÇA
DE ALZHEIMER

MATURIDADE PARA
SABER COMO AGIR EM
• Estabeleça desde os início quais serão realmente
todas as tarefas que você precisa do cuidador. SITUAÇÃO DE EMERGÊNCIA
Em muitos casos, dependendo dos custos e da E NO MANEJO DE CONFLITOS
situação financeira de quem contrata, pode-se
alternar cuidadores que atuam como atendentes COM O PACIENTE.
de enfermagem e outros que estão preparados
para engajar o paciente em atividades lúdicas de
melhoria da cognição. ORGANIZAÇÃO
• Um dos motivos comuns de conflito é exatamente
a falta de critérios e delimitação das funções PACIÊNCIA
dos cuidadores, o que leva algumas pessoas a
esperar que desempenhem atividades domésticas
fora de sua alçada. COMPAIXÃO
• Lembre-se que os serviços de cuidadores
noturnos e em finais de semana implicam CAPACIDADE DE
em custos extra. OBSERVAR E RELATAR
• Há cuidadores de ambos os sexos, mas alguns NOVOS SINTOMAS OU
FOTO: SHUTTERSTOCK

pacientes em fase inicial para moderada, podem


se sentir embaraçados sendo atendidos por uma
AGRAVAMENTO DOS
pessoa do sexo oposto. É importante levar em QUE JÁ EXISTEM.
conta essa preferência.

67
ALZHEIMER CAPÍTULO 10

Dicas para familiares-cuidadores


ou profissionais
HIGIENE Lembre-se de respeitar e preservar sua intimidade tanto
Em determinado momento, os pacientes usu- quanto possível. Se o paciente tiver condições de banhar-se
almente oferecerão resistência para realizar a hi- sozinho(a), permita que isso seja feito para lhe dar o sen-
giene corporal e bucal básica. É importante, no timento de autonomia, auxiliando no que for necessário e
entanto, que a higiene seja preservada para que se em alguns casos instruindo o que fazer sem diretamente
mantenha o bem estar e se evitem outras doenças. tomar controle das ações. Banheiras são perigosas para
pacientes com comprometimento da capacidade motora e
nunca devem ser usadas sem supervisão.
BANHO
Uma rotina, com horários fixos, é sempre boa
ideia. Mas diante de uma recusa , o melhor é DENTES
esperar um momento mais adequado. Para A escovação dentária também pode se tornar problemá-
que o banho seja relaxante e não tenso, o ide- tica. Toda a atenção deve ser dada à limpeza bucal, incluin-
al é que seja curto. Simplifique-o tendo tudo o do a higienização de próteses dentárias. Problemas com
que seja necessário à mão e pela ordem de uso. os dentes ou com ferimentos causados por próteses mal
Chuveiro ou duchas manuais devem ser usadas ajustadas podem causar infecções, muitas vezes detectadas
respeitando a preferência do paciente, mesmo tardiamente porque os pacientes não são capazes de pedir
que essa vontade não seja expressa verbalmente. ajuda. À medida que a doença avança a pessoa se esquece
de como escovar os dentes, outras vezes pode ser perigoso
fazer isso por si só. É necessário avaliar cada caso, que tam-
bém muda com o passar do tempo.

ROUPAS
Vestir-se é uma habilidade que também pode ser afeta-
da. Além do ato de vestir-se, outros desafios como a inabi-
lidade para escolher uma roupa adequada à estação do ano
ou à ocasião até a total ausência de necessidade de trocar-
-se podem ocorrer. Sempre que possível, permita que a
pessoa se vista se isso ainda for possível. Apenas tenha a
roupa na ordem em que deve ser vestida e evite peças com-
plicadas, com muitos botões, zíperes ou alças, assim como
cintos e fivelas. Mesmo quando estiver ajudando o pacien-
te a vestir-se, lembre-se de lhe dar certa autonomia, apenas
orientando e interferindo nas situações mais complicadas.
Dê preferência a sapatos bem confortáveis que fiquem bem
presos aos pés e que tenham solado antiderrapante.

ALIMENTAÇÃO
Não há restrição ou dieta específica para quem sofre de
Alzheimer. O que geralmente se recomenda é que a alimen-
tação seja balanceada para que não haja excesso ou carência
de uma determinada vitamina ou proteína. Sabe-se também
que uma alimentação saudável influencia o bem-estar do
organismo, incluindo o funcionamento do cérebro.

68
PERDA DE PESO
Na fase inicial da doença, quando os
sintomas começam a aparecer com
mais frequência, muitos pacientes
ainda têm autonomia e cozinham
para si mesmos. Ocorre que os
sintomas dificultam a organização do
cardápio e das refeições e em alguns
casos questões de coordenação
motora dificultam tarefas na cozinha
que antes era simples. Se não houver
outra pessoa na casa, esse problema
pode não ser detectado, até que haja
alteração de peso ou outro problema.
São comuns as alterações no apetite.
Isso também pode ser agravado por
dificuldades cognitivas ou problemas
de ordem física . É importante que
o cuidador monitore o peso do
paciente mensalmente, em casa ou
na farmácia. Perdas significativas
são aquelas iguais ou superiores
a 5% do peso verificado no mês
anterior. Se isso acontecer, o médico
ou nutricionista deve ser contatado
prontamente para que algumas
providências sejam tomadas.

Isso inclui a capacidade cognitiva do paciente. FATORES COGNITIVOS


Dependendo de como a doença evolui, o médico Algumas vezes o paciente esquece-se de comer ou pensa
responsável pode indicar restrição ou aumento de ter comido quando ainda não o fez. Outras vezes distrai-se
determinado tipo de alimento. quando ainda está comendo e deixa de comer o que deve-
Lembre-se também que toda pessoa idosa pre- ria. Por isso as refeições devem ser sempre monitoradas.
cisa de uma alimentação balanceada. Outra coisa
a ser observada é se há algum outro problema de
saúde anterior ou não relacionado à doença, O
FATORES FÍSICOS
Dificuldades de deglutição e engasgos constantes repre-
melhor é pedir orientação e sugestões ao médico
sentam outro fator que pode resultar em perda de peso.
responsável pelo tratamento ou a um nutricionista.
Há técnicas que podem auxiliar a deglutição. Peça orien-
tação a um fonoaudiólogo. Pequenas lesões bucais tam-
APETITE bém devem ser consideradas. Algumas vezes o paciente
Para estimular o apetite do paciente, tente al- sofre queimaduras ou tem outros problemas na boca que
gumas estratégias, tais como utilizar utensílios lhe causam dor quando comem e o levam a, inconscien-
FOTOS: SHUTTERSTOCK

coloridos para chamar a atenção para a comida. temente, evitar a comida. Por fim, na fase mais avançada
Prefira alimentos que possam ser comidos com da doença, além da deglutição, a mastigação passa a ser
as mãos, porque o contato pode tornar o alimen- problemática. Nesses casos, a dieta deve incluir alimentos
to mais interessante, e sempre o sirva em peque- pastosos e de maior valor calórico. De qualquer maneira,
nas porções de cada vez. busque supervisão médica ou de um nutricionista.

69
ALZHEIMER CAPÍTULO 10

UM NOVO
VELHO PÚBLICO
Segundo dados do IBGE
(Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística), o número de
pessoas acima de 65 anos deve
chegar a mais de 58 milhões em
2060 no país, isso significa mais
de 25% do total da população.
A expectativa de vida média do
brasileiro deve passar dos atuais
75 anos para 81 e as mulheres
continuarão vivendo mais do que
os homens. Estima-se que até lá
tenham expectativa de vida média
de 84,4 anos contra os 78,03 dos
homens. Esse panorama abriu
espaço para um novo mercado que
visa as necessidades desse
EU JÁ COMI?
“novo” público consumidor e
Assim como pode se esquecer de comer, o do-
suas necessidades específicas.
ente de Alzheimer pode simplesmente esquecer
Os serviços de saúde, como
que já comeu e comer novamente. Há também
esperado, estão entre os
confusão de tempo, assim confundem os horá-
primeiros produtos e serviços.
rios das refeições. Outra situação é a de sacieda-
Na esteira dessa mudança,
de, que às vezes fica mais difícil aplacar, como
surgiu a demanda por profissões
outros impulsos, cujo controle diminui. Não bas-
treinadas na área geriátrica,
tassem essas situações, alguns familiares pensam
algumas vezes se especializando
compensar o sofrimento do ente querido com
no atendimento a pacientes com
comida ou ficam suscetíveis a ceder a suas soli-
algum tipo de demência. Além
citações por mais comida. O resultado pode ser
desse grupo mais especializado
desastroso porque o excesso de peso tem conse-
de enfermeiros, médicos,
quências negativas para a saúde geral e a ingestão
fisioterapeutas, para citar algumas
exagerada de alimentos também acarreta proble-
profissões, particularmente
mas digestivos, azia e mal estar. É preciso intervir
nas fases mais avançadas do
e encontrar formas de evitar o exagero:
Alzheimer, -- quando o trabalho
• tente convencer o paciente a comer mais
de um familiar-cuidador pode
devagar;
envolver estar alerta 24 horas por
• ofereça alimentos menos calóricos e em cur-
dia, sete dias por semana, --surgiu
tos períodos de tempo
a necessidade de alguém que
• adapte as quantidade de comida de acordo
pudesse compartilhar , na prática
com o horário (nunca muito à noite) e adequado
do dia a dia, essa carga
às suas reais necessidades;
de responsabilidades.
• não sirva uma refeição antes do horário
normal por insistência do paciente; nesses ca-
sos a distração é uma saída.

70
CASAS DE REPOUSO:
PESQUISE PARA ESCOLHER
A decisão de internar o idoso em uma insti- Muitas visitas aos locais podem ser poupadas eli-
tuição é sempre difícil e cercada de ansiedade. minando-se alguns lugares depois de pesquisas por
Além disso, uma instituição de má qualidade internet e algumas ligações telefônicas. Lembre-se
pode piorar o quadro de sintomas e contribuir que além das preferências pessoais de cada família
para o declínio da saúde geral do doente. Por com relação ao espaço e à limpeza e, obviamente, aos
tudo isso, muitas vezes chega-se a essa opção custos, é fundamental investigar:
quando esgotadas todas as outras.
Outra dificuldade é que muitas casas de re- • legalização e alvarás de funcionamento
pouso para idosos não estão preparadas para re- • médico responsável
ceber pacientes de Alzheimer que não tenham • equipamentos e serviços oferecidos
mais autonomia e que precisem de assistência • horários de visita
intensiva. Para encontrar esse tipo de atendi- • número de residentes e lotação máxima
mento e de boa qualidade, o primeiro passo é • número de funcionários e plantonistas
buscar referências, sempre que possível buscan- • filosofia de trabalho
do indicações e aconselhamento dos profissio- • possibilidade de ter o médico da família
nais de saúde que já trabalham com o doente; acompanhando o caso
grupos de apoio são outra boa fonte de contatos. • métodos de conduta em determinadas
A família, e não somente o familiar-cuidador situações, como para pacientes agitados,
principal, deve ser envolvida no processo de es- filosofia de sedação e outros
colha da instituição para se assegurarem de que • uso de sondas (urinária e para alimentação)
todos concordem com o local selecionado , pre- • atividades socioculturais
ço e preço e facilidade de localização. • segurança

Outros recursos
Algumas famílias optam por alguns outros recursos como os chamados
centro-dia, em que os pacientes podem ser deixados para atividades diurnas
e retornam para casa à noite (aconselhável para fases menos críticas),que
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pode também servir como transição para uma casa de repouso diuturna.
Outros ainda se utilizam do aluguel de equipamentos hospitalares e
contratação de enfermeiros para que as fases avançadas da doença possam
ser tratadas no ambiente doméstico.

71
ALZHEIMER CAPÍTULO 11 Onde está a cura?

72
ONDE
ESTÁ A
CURA? Em institutos de pesquisas,
laboratórios e hospitais de todo o
mundo os cientistas continuam
incansavelmente à sua procura
FOTO: SHUTTERSTOCK

73
ALZHEIMER CAPÍTULO 11

A
lém da grande frustração em relação
aos efeitos devastadores da doença
de Alzheimer, talvez você já tenha se
perguntado como é possível que em
uma civilização com tantos recursos científicos
e tecnológicos uma doença ainda seja incurável
e cercada de tanto mistério depois de mais de
um século de seu descobrimento?
Ninguém até hoje conseguiu responder a essa
questão, e os estudiosos e pesquisadores são os
primeiros a querer esclarecê-la. Enquanto isso,
as pessoas que têm doentes na família, os cuida-
dores e tantos outros continuam ansiosos pela
resposta. Para começar a entender esse tema, ou
seja, onde está a cura, se ela é possível, e o que
as pesquisas até hoje conseguiram realizar de Na trilha dos
positivo e eficaz no que se refere ao controle do
mal de Alzheimer, e primeiro preciso entender
biomarcadores
que não há apenas uma, e sim várias linhas de
pesquisa relacionadas à doença. Mesmo que o A maioria das pesquisas e estudos realizados até hoje pro-
objetivo final de todas seja encontrar a cura para cura entender exatamente como controlar ou prevenir a in-
esse mal, os caminhos são distintos e abordam terferência dos marcadores biológicos da doença, também
uma gama de questões. chamados biomarcadores. Eles os dois componentes quími-
Nos dias de hoje, a estratégia terapêutica pre- cos conhecidos como beta amiloide e a proteína tau.
valente da doença se divide em três bases: Ao que se sabe, esses dois componentes químicos são ne-
• Retardar sua evolução; cessários ao bom funcionamento do cérebro, mas são noci-
vos quando ocorrem em grandes quantidades. Pelo que foi
• Tratar seus sintomas;
observado em tecidos cerebrais em autópsias de pacientes
• Controlar as possíveis alterações que sofreram de Alzheimer, o excesso desses componentes
de comportamento. se aglutinam, no primeiro caso, em placas externas aos neu-
rônios e o resultado disso é que impossibilitam a comunica-
Na verdade, a meta dos principais centros de ção entre eles. No caso da proteína tau, causam até mesmo o
pesquisa mundiais é realmente eliminar a do- emaranhamento das neurofibrilares dentro dos neurônios.
ença dos que sofrem atualmente e dos pode- Embora hoje seja possível, em alguns casos, diminuir a
rão sofrê-la mais tarde. O problema é que no velocidade da ação desses componentes, anda não se sabe
momento atual isso ainda não é possível, e só se como evitar que sejam produzidos em excesso nem como
pode tentar atingir esse objetivo durante o trata- parar seu efeito nocivo. De qualquer modo, a primeira gran-
mento dos doentes que já estão sendo afetados. de questão a ser respondida é se a superprodução e a ação
Os grandes indicadores do que funciona e de anormal dessas proteínas provocam a doença de Alzheimer
qual o caminho a ser trilhado são o modo como ou se seria o contrário, ou seja, se a doença provocaria a
cada um desenvolve os sintomas e tudo aquilo anomalia. Muitos estudos se concentram em abordagens e
que os faz melhorar ou piorar. E os cientistas já métodos diferentes para responder a essa questão.
sabem, desde há muito tempo, que para se che- É bom lembrar que as drogas que hoje conhecemos, por
gar à cura é preciso atuar em três frentes: exemplo, foram resultado de pesquisas que tentam deter a
• Prevenção, formação de placas de beta amiloide . Mas o que vários des-
• Diagnóstico ses estudos têm apontado é a maior dificuldade em eliminar
• Tratamento. as placas senis já existentes.

74
Encontrar um tratamento que possa destruir As linhas hoje adotadas no meio científico, levam em con-
essas placas sem afetar negativamente outras fun- ta estudos sistemáticos do cérebro que demonstram que as
ções é o grande desafio. Isso tornaria a doença, alterações desses marcadores biológicos começam a apare-
pelo menos em parte, realmente reversível. Além cer em um período de 15 a 20 anos antes dos sintomas de
disso, seria um fator fundamental para ampliar os demência em fase inicial. Por isso, a capacidade de identifi-
medicamentos que hoje se oferecem nos estágios cá-las mais cedo e impedir o desenvolvimento de seus ma-
avançados da doença, dos quais apenas a mema- lefícios seria o princípio do fim.
tina tem demonstrado algum efeito.

Exames FALSAS
de imagem ESPERANÇAS
Outra linha de pesquisa relacionada aos bio- Quem acompanha o tema sabe
marcadores refere-se à maior capacidade de que todo ano é possível ler várias
identificar sua presença por meio de exames de notícias online, nas redes sociais
imagem. Nesse caso, o sucesso da investigação e até mesmo na imprensa mais
ajudaria na prevenção da doença, por meio de séria alardeando que esse ou
exames regulares nos grupos de risco. aquele estudo encontrou a cura
A possibilidade de detectar a presença das para o Alzheimer. Esse tipo de
placas e dos emaranhados também permitiria informação pode causar falsas
maior eficácia no diagnóstico precoce, que até esperanças e pouco contribui
o momento tem sido a única forma de retardar para o aprendizado de pacientes
a evolução da doença. Se pudermos contar com
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e seus cuidadores. Nem sempre


exames de imagem mais efetivos, o diagnóstico essas notícias são fruto de má fé
clínico seria grandemente beneficiado e com isso mas é importante saber discernir
o tratamento poderia ser iniciado mais cedo, com o que é fato do que é simples
mais certeza e melhor direcionamento. forma de chamar a atenção.

75
ALZHEIMER CAPÍTULO 11

O sonho
das vacinas
Por outro lado, vacinas, que até pouco tempo
pareciam um sonho, também vêm sendo estu-
dadas e testadas há anos. A ideia é, por meio da
imunização, prevenir a formação das placas de
beta amiloide, evitando assim que elas interfiram
com a comunicação entre os neurônios, ou seja,
as sinapses. Até o momento, porém, introduzir
essas proteínas no organismo para ativar o siste-
ma imunológico ainda não se mostra seguro.
É preciso saber, no entanto, que toda essa in-
formação é genérica e não se relaciona a nenhum
trabalho específico, embora possa estar na pau-
ta de muitos deles. Serve, porém, como forma
simples de exemplificar um pouco do panorama
complexo das pesquisas que acontecem no Brasil,
nos Estados Unidos e nos demais países empe-
nhados em compreender a doença. forma que esta molécula já foi testada por outros pesquisa-
dores mas nunca ninguém havia sido capaz de demonstrar
efeitos benéficos em animais.

Por que as Essa informação positiva significa que o próximo passo é


realizar mais e mais testes para comprovar que os primeiros

pesquisas levam indícios se confirmem. Por exemplo, acompanhando rigo-


rosamente os animais tratados e observando se a evolução
tanto tempo? continua ou se surgirão efeitos colaterais ou retrocessos no
quadro de melhora. O avanço das pesquisas indica vários
outros procedimentos ante de que esse estudo possa ser
O que ocorre é que alguns estudos promissores levado para testes clínicos com seres humanos. Para que a
levam anos para se confirmar, mesmo em cobaias, molécula pudesse se tornar componente de um medicamen-
como camundongos, e muitos outros anos para to, teria de ser testada e acompanhada por anos para que se
que possam ser testados em humanos. Além disso, tenha a exata noção de sua ação no organismo, sob diversas
ainda que possam ser testados em voluntários, de- variantes em um número mínimo aceitável de pessoas.
vem ser acompanhados por um longo período, às É muito bom saber que algo assim está acontecendo,
vezes anos, até que recebam licença para se tornar mas veja que não significa em absoluto que a boa nova vá
um medicamento. Veja alguns exemplos. se confirmar nos testes subsequentes e muito menos que
No ano passado, um artigo em uma revista de vá chegar à indústria farmacêutica nos próximos anos. De
pesquisa biomédica informava sobre um impor- qualquer forma, os artigos médicos servem para demons-
tante estudo realizado no Instituto de Ciência e trar que algo importante está sendo desenvolvido e com
Tecnologia da Coreia do Sul. Por meio de um isso incentivar o financiamento dessas pesquisas por meio
trabalho de equipe, foi possível romper depósi- de fundações, governos e da própria indústria. Lembre-se
tos de proteína beta amiloide em camundongos de que, para que tenham continuidade e sucesso, todos es-
com sintomas de demência. Aparentemente, o ses estudos muito sofisticados necessitam de investimento
grupo de pesquisadores realizou uma série de ex- em tecnologia e pesquisadores de alto nível.
perimentos nos quais ministrou uma molécula, Enquanto é muito positivo que exista cada vez mais
EPPS, que adicionada à água estaria revertendo investimento nessa área, há algumas questões éticas que
alguns dos sintomas apresentados. O artigo in- devem ser notadas. Se um laboratório da indústria farma-

76
TESTES CLÍNICOS:
O QUE OS
VOLUNTÁRIOS
DEVEM SABER
cêutica, por exemplo, apoia financeiramente um Muita gente tem interesse em se oferecer
estudo que visa confirmar efeitos positivos de ou ter um ente querido como voluntário
uma droga que esse laboratório já produz para nos testes clínicos de uma nova droga
outras doenças, é preciso ter cuidado na análise ou terapia. Isso é compreensível e pode
dos resultados, que podem ser tendenciosas. contribuir para que no futuro a doença
seja melhor compreendida e tratada. Mas

Estudo de caso
algumas considerações são fundamentais.

• Qualquer atitude nesse sentido deve


Em 2008, um estudo de caso foi publicado no ser discutida com o médico ou a equipe
Journal of Neuroinflammation sobre o uso de Eta- médica que acompanha seu caso.
nercept, uma droga utilizada em pacientes com • Mesmo quando a sugestão parte do
inflamações do sistema nervoso e que já é pro- próprio médico, há fatores a serem
duzida comercialmente. Apenas minutos depois considerados. E o voluntário que
da aplicação de uma injeção desse medicamento, pretende receber medicamentos deve
o paciente de 81 anos, que demonstrava sintomas conhecer e discutir todos eles com os
associados ao Alzheimer há dois anos, já teria profissionais responsáveis.
percebido melhora de suas funções sinápticas, de • O fator primordial, que deve ser
acordo com relato de sua esposa e filho. Sinais de compreendido pela pessoa que vai se
melhora também foram confirmados em testes submeter aos testes e também por seus
neurológicos e pela comparação de resultados an- familiares, é conhecer exatamente
tes e depois das aplicações regulares da droga. os riscos envolvidos e o compromisso
O sucesso dessa experiência, como de outros exigido que permite o monitoramento
casos isolados, inspira novos estudos mas exige do novo tratamento e da doença
que seja testado em um número maior de pessoas, por bastante tempo.
com características distintas e em fases diferentes • É preciso saber também que mesmo
da doença. Mesmo quando chegam a ser apro- quando uma droga ou tratamento se mostra
vadas algumas drogas acabam sendo abandona- eficaz para um tipo de pessoa, pode ter
das por que seus riscos se mostram maiores que efeito diverso ou contrário para outra.
os benefícios demonstrados incialmente. Foi o • Os possíveis efeitos colaterais que
caso da tacrina que, depois de anos, foi finalmente ainda são desconhecidos e que podem ter
aprovada no início dos anos 1990 porque atuava diferentes configurações dependendo das
com sucesso sobre a acelticolina remanescente no condições gerais de saúde de cada pessoa
cérebro dos pacientes de Alzheimer. Mas à medida também devem ser relatados pelo médico.
que começou a ser regularmente usada apresentou • Não menos importante é estar consciente
graves efeitos colaterais e hoje já não é prescrita. de que a pessoa testada pode estar
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O lado positivo é que, apesar do fracasso da ta- simplesmente tomando um placebo. Assim,
crina, suas pesquisas abriram portas para outras embora as observações de seu caso sejam
três drogas que atuam de forma similar, com me- úteis para a pesquisa e a ciência, podem não
nos efeitos colaterais: a donepezilla, a rivatgsmina lhe trazer benefícios diretos imediatos.
e a galantemina, usadas nas fases iniciais.

77
ALZHEIMER CAPÍTULO 12 ABRAZ

ABRAZ
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ALZHEIMER
Essa entidade privada, sem
fins lucrativos, é uma das
maiores apoiadoras dos
que lutam contra a doença

78
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79
ALZHEIMER CAPÍTULO 12

A
ABRAz – Associação Brasileira de
Alzheimer -- foi fundada em 16 de
agosto de 1991 em São Paulo e reúne
familiares de pessoas com Alzheimer,
familiares-cuidadores e cuidadores profissionais.
Trata-se de uma entidade privada, sem fins lucra-
tivos, que a partir das vivências de seus associa-
dos desenvolve ações em favor das pessoas com
Alzheimer e oferece apoio ao familiar cuidador.
Sua missão é ser referência para pessoas envol-
vidas com Alzheimer e outras demências no país
A criação da organização inspirou-se no mo-
vimento internacional iniciado por Yasmin Aga
Khan, filantropa americana, que em 1984 fun-
dou a ADI -- Alzheimer’s Disease International,
enquanto cuidava de mãe, a estrela de cinema
Rita Hayworth, que morreria em decorrência
da doença três anos depois.
A entidade desenvolve sua missão por meio
do trabalho voluntário de profissionais das área
de saúde, educação, jurídica e outras, além de
familiares de pessoas com Alzheimer, que so-
mam hoje 400 voluntários. Com sede em São
Paulo, atualmente a ABRAz tem cerca de 13 mil
associados e representantes nas cinco regiões do como discutir formas mais eficazes de lidar com o cotidia-
país , espalhados em 21 regionais (e 51 sub-re- no de quem convive com a doença.
gionais), por meio das quais oferece informação Os grupos de apoio ligados à ABRAz atendem direta-
e apoio, facilitando a vida dos que lidam com a mente 4 mil familiares que por sua vez multiplicam a in-
doença, assim como ações em defesa do bem- formação a outros membros de sua família e muitas vezes
-estar e dos direitos do paciente, dos familiares os agregam aos grupos. Esses encontros, que acontecem
e cuidadores. Da mesma forma, promove a in- mensalmente, objetivam promover a qualidade de vida
tegração e articulação com a Rede de Proteção de todos os envolvidos nos cuidados com o paciente de
à Pessoa Idosa. Alzheimer e contam com a participação de profissionais
Para sua manutenção, a associação conta com multidisciplinares.
contribuições dos membros, doações e parcerias Por meio dos grupos, familiares e cuidadores têm a
com a iniciativa privada. Todos os recursos ob- oportunidade de aprender mais sobre a doença, sobre os
tidos são utilizados para custear a produção de sintomas e sobre o impacto da doença na vida da família.
material informativo, treinamento de voluntá- Essa estratégia facilita a aceitação da nova situação e enco-
rios e manutenção das regionais, sub-regionais, raja maior consciência sobre a importância de se preservar
grupos de apoio e de assistência aos idosos. a qualidade de vida de todos.
Além de se apoiarem emocionalmente, os grupos são

Grupos de apoio excelente fonte de estratégias práticas para driblar os pro-


blemas cotidianos mais comuns, enfrentados por quem
cuida de um doente de Alzheimer. Isso significa oferecer
Entre suas muitas ações, a entidade mantém ao familiar cuidador preparo e, com isso, mais segurança
cerca de 100 grupos de apoio a familiares em para garantir estímulo e cuidado adequado, preservando
todo o Brasil. Os grupos representam um espa- tanto quanto possível a autonomia de seu ente querido.
ço de troca, no qual os familiares e cuidadores Indiretamente, o paciente será beneficiado pelo melhor
de pessoas com Alzheimer podem compartilhar preparo de seu cuidador. Como resultado, a relação entre
experiências , encontrar solidariedade, assim familiar cuidador e paciente também tende a melhorar.

80
PRINCÍPIOS QUE
NORTEIAM
A ENTIDADE
• Ética
Atendimento • Igualdade de Direitos
e estimulação • Transparência
• Coletividade
cognitiva • Flexibilidade
• Criatividade
A ABRAz também mantém grupos de aten- • Perseverança
dimento e estimulação cognitiva para idosos • Participação Política
diagnosticados com Alzheimer ou outros tipos
de demência. Esse serviço busca complementar
o tratamento não farmacológico para preservar Por fim, a ABRAz também se coloca na defesa dos ci-
o que cada paciente ainda tem de capacidade dadãos com Alzheimer articulando projetos e políticas
cognitiva , visando estender e fortalecer sua in- públicas que fomentem maiores investimentos na área de
dependência por mais tempo. Em algumas uni- saúde, voltada para esse público. Atuando em comissões
dades, há grupos de estimulação física por meio nacionais e internacionais de Alzheimer, a associação bra-
de atividade corporal e oportunidade de conví- sileira está representada nos conselhos de saúde das esferas
vio social. Essas medidas, em conjunto, auxiliam municipais, estaduais e federal, assim como no Conselho
na restauração da autoestima dos pacientes. Nacional de Direitos do Idoso. Por meio do engajamento
Além do trabalho direto com a comunidade de seus associados, membros em conselhos dos direitos do
em torno da doença de Alzheimer, a ABRAz idoso, da saúde e da assistência social, a entidade fiscaliza
atua na disseminação de informação sobre a a observância e implementação de legislação como o Esta-
doença para o público em geral, despertando tuto do idoso, de 2003, assim como sugere novas políticas
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a consciência das pessoas para um problema que atendam as necessidades dessa população.
de saúde com mais visibilidade a cada dia. Por O website da entidade www.abraz.org.br é sempre um
meio de ações pontuais e campanhas de esclare- bom ponto de partida para os familiares de quem acaba
cimento, a associação busca chamar a atenção de receber um diagnóstico de Alzheimer, bem como para
da mídia para a seriedade e relevância do tema. aqueles em busca de maior apoio e recursos de informação.

81
ALZHEIMER CAPÍTULO 12

Informativo:
palestras,
aulas e debates
Abordam temas relevantes sobre a doença como
tratamentos e cuidados e outros tópicos de inte-
resse. A informação é normalmente oferecida em
palestras ou aulas com especialistas convidados ou
em alguns casos ministradas pelo próprio coorde-
nador do grupo.
Em alguns grupos, é comum que os cuidadores
contribuam para o debate com o palestrante tra-
zendo para a discussão sua própria experiência e
Como funcionam perguntas sobre o tema proposto.
Esse tipo de grupo é particularmente útil para o
os Grupos de cuidador que busca maior preparo para desempe-

Apoio da ABRAz
nhar com confiança suas tarefas cotidianas no au-
xílio ao paciente de Alzheimer.
Sob o ponto de vista teórico e prático, as pales-
Coordenados e mediados por voluntários tras e cursos fornecem compreensão das necessi-
selecionados e treinados pela entidade, os dades e dificuldades que a doença impõe à pessoa
Grupos de Apoio da ABRAz , em geral, se sob seus cuidados. Desfazendo conceitos errados e
reúnem mensalmente. esclarecendo dúvidas sobre a evolução da doença,
Os participantes cuidadores podem tratamentos farmacológicos ou não, a relação cui-
encontrar: dador-paciente também pode ser aprimorada.
• Informação atualizada sobre a
doença e tratamentos disponíveis,
que serve como embasamento para Apoio social
a escolha de cuidados e tomada de
decisões; e emocional:
• Apoio pra a aceitação da nova
situação, que implica em alterações
um fórum de
significativas na vida dos envolvidos;
• Diretrizes para garantir a qualidade
acolhimento
de vida do cuidadores; Às vezes o cotidiano de um familiar cuidador
• Desenvolvimento de um plano tem efeitos nocivos sobre sua saúde, qualidade de
positivo e saudável para enfrentar o vida e equilíbrio emocional. Esses grupos são um
impacto da doença e das perdas a ela fórum para compartilhar suas experiências, angús-
associadas; tias e dificuldades, recebendo e oferecendo apoio;
• Auxílio na busca da melhor forma um espaço para experimentar sentimentos de per-
de interagir com a pessoa idosa, tencimento, acolhimento e conforto.
estratégias de manejo e compreensão Classificados como grupos de caráter vivencial, eles
das necessidades e sintomas se apresentam como oportunidade de interagir com
decorrentes da demência; pessoas que passam pelas mesmas experiências e que
Os grupos de apoio são divididos em dois portanto são capazes de compreender e se identificar
tipos, um com enfoque Informativo e outro com a prática de cuidados e os desafios que envolvem
de Apoio Social e Emocional. os pacientes de doenças neurodegenerativas.

82
ALZHEIMER:
QUANTO ANTES
SOUBER, MAIS
TEMPO VOCÊ
TERÁ PARA
LEMBRAR
O vídeo protagonizado
pelo ator e colaborador da
ABRAz, Carlos Moreno, tenta
esclarecer as diferenças entre
o envelhecimento saudável
Os temas podem variar de situações rotineiras, e o patológico, ou seja, que
como dar banho ou ministrar medicamentos até apresente sintomas de
discussões sobre as mudanças na vida pessoal ou demência. A diferenciação é
familiar após o diagnóstico e a tomada de deci- útil não somente como alerta
sões importantes no rumo do tratamento ou no para a doença, que pode
âmbito jurídico. Podem também incluir os pro- ser diagnosticada no tempo
blemas em entender algumas das alterações cog- certo, mas também para evitar
nitivas pelas quais passam os pacientes. Nos gru- preconceitos sobre o envelhecer.
pos coordenados por psicólogos ou psiquiatras, é O ator personifica 12 situações
possível se aprofundar na questão das emoções e baseadas em fatos reais. O vídeo
na busca de soluções flexivas e criativas para su- pode ser encontrado na internet,
perar problemas e evitar o estresse. no canal Youtube.

Grupos de
convivência
promovem Visitas aos grupos
atividades Algumas das regiões oferecem grupos de atendimen-

sociais
to que desenvolvem atividades para a estimulação social,
cognitiva ou física com pacientes de Alzheimer em fases
iniciais. Em geral, para esses grupos é necessária inscrição
Em algumas regionais, há os chamados gru- prévia e dependendo da programação é também realiza-
pos de convivência que promovem a socializa- da uma triagem para avaliar se as atividades previstas são
ção entre os membros por meio de atividades adequadas para cada pessoa.
organizadas esporadicamente, algumas vezes É importante verificar quais atividades requerem ins-
por ano, como passeios a parques, idas ao cine- crição e agendamento. Alguns grupos são abertos, mas é
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ma, festas em datas comemorativas. Essas ativi- prudente sempre conferir o status de cada um. A ABRAz
dades, programadas com antecedência, abrem também recomenda que pesquisadores e estudantes con-
a oportunidade para que familiares-cuidadores sultem os coordenadores dos grupos para obter autoriza-
possam se desligar um pouco de suas tarefas e ção de visita a um grupo. Essa medida visa não prejudicar
responsabilidades, de forma leve e agradável. o andamento dos grupos.

83
ALZHEIMER CAPÍTULO 12

DIREITOS DO IDOSO

O Violência e Abandono
Estatuto do Idoso foi aprovado em se-
tembro de 2003 e sancionado por Luiz
Inácio Lula da Silva, então presidente • Nenhum idoso poderá ser objeto de negligência,
da República, no mês seguinte, am- discriminação, violência, crueldade ou opressão.
pliando os direitos dos cidadãos com idade aci- • Quem discriminar o idoso, impedindo ou dificultando
ma de 60 anos. Mais abrangente que a Política seu acesso a operações bancárias, aos meios de transporte
Nacional do Idoso, uma lei de 1994 que dava ga- ou a qualquer outro meio de exercer sua cidadania pode
rantias à terceira idade, o estatuto institui penas ser condenado e a pena varia de seis meses a um ano de
severas para quem desrespeitar ou abandonar reclusão, além de multa.
cidadãos da terceira idade. • Famílias que abandonem o idoso em hospitais e casas
Veja os principais pontos do estatuto, como de saúde, sem dar respaldo para suas necessidades básicas,
informa o Guia de Direitos, e saiba fazer valer podem ser condenadas a penas de seis meses a três anos
esses direitos. de detenção e multa.
• Para os casos de idosos submetidos a condições

Trabalho
desumanas, privados da alimentação e de cuidados
indispensáveis, a pena para os responsáveis é de dois
• É proibida a discriminação por idade meses a um ano de prisão, além de multa. Se houver a
e a fixação de limite máximo de idade na morte do idoso, a punição será de 4 a 12 anos de reclusão.
contratação de empregados, sendo passível de • Qualquer pessoa que se aproprie ou desvie bens,
punição quem o fizer. cartão magnético (de conta bancária ou de crédito),
• O primeiro critério de desempate em pensão ou qualquer rendimento do idoso é passível de
concurso público é o da idade, com preferência condenação, com pena que varia de um a quatro anos
para os concorrentes com idade mais avançada. de prisão, além de multa.

84
Saúde NÚCLEO
• O idoso tem atendimento preferencial no ESPECIALIZADO DOS
Sistema Único de Saúde (SUS).
• A distribuição de remédios aos idosos, DIREITOS DO IDOSO
principalmente os de uso continuado
(hipertensão, diabetes etc.), deve ser gratuita,
Os defensores públicos são advogados
assim como a de próteses e órteses.
• Os planos de saúde não podem reajustar as
que trabalham gratuitamente para
pessoas que não têm condições
mensalidades de acordo com o critério da idade.
• O idoso internado ou em observação em
de pagar um advogado para:
a) dar orientações em relação
qualquer unidade de saúde tem direito a
a seus direitos;
acompanhante, pelo tempo determinado pelo
b) para defender a pessoa em caso
profissional de saúde que o atende.
de serem réu em processo judicial
c) para entrar na justiça e fazer valer
Entidades de direitos da pessoa.

Atendimento A Defensoria Pública do estado de

ao Idoso
São Paulo possui vários centros
especializados para orientar
• O dirigente de instituição de atendimento judicialmente as pessoas e um
ao idoso responde civil e criminalmente pelos desses núcleos é especializado
atos praticados contra o idoso. em direito dos idosos.
• A fiscalização dessas instituições fica a Composto de vários defensores
cargo do Conselho Municipal do Idoso públicos, o Núcleo Especializado dos
de cada cidade, da Vigilância Sanitária e Direitos do Idoso, tem como atribuição
\do Ministério Público. principal contribuir para atuação dos
• A punição em caso de mau atendimento defensores públicos na defesa dos
aos idosos vai de advertência e multa até direitos dos idosos, desenvolvendo teses
a interdição da unidade e a proibição do institucionais, e fomentar a criação de
atendimento aos idosos. políticas públicas na área.

Transporte
coletivo Lazer, Cultura
• Os maiores de 65 anos têm direito ao e Esporte
transporte coletivo público gratuito. A carteira • Todo idoso tem direito a 50% de desconto em
de identidade é o comprovante exigido. atividades de cultura, esporte e lazer
• Nos veículos de transporte coletivo é
obrigatória a reserva de 10% dos assentos
para os idosos, com aviso legível. Habitação
• Nos transportes coletivos interestaduais, • É obrigatória a reserva de 3% das unidades residenciais
o estatuto garante a reserva de duas vagas para os idosos nos programas habitacionais públicos ou
gratuitas em cada veículo. Se o número de subsidiados por recursos públicos.
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idosos exceder o previsto, eles devem ter


50% de desconto no valor da passagem,
Fonte: Guia de Direitos, http://www.guiadedireitos.org/index.
considerando-se sua renda. (Caso o idoso não
php?option=com_content&view=article&id=352&
tenha como comprovar sua renda, ele deve Veja mais no Estatuto do Idoso, em http://www.planalto.gov.br/
providenciar a Carteira do Idoso) ccivil_03/leis/2003/L10.741.htm

85
ALZHEIMER CAPÍTULO 13 Mitos e verdades

MITOS
Veja nesta e nas
próximas páginas
as perguntas mais

VERDADES
comuns sobre
o tema, o que
realmente são fatos
e o que são mitos
sobre o Alzheimer

86
Toda pessoa velha com problema A doença é genética, se ninguém da sua
de memória tem Alzheimer. família teve você não vai ter.
MITO É importante entender que embo- MITO Certamente, quem tem um dos pais ou irmãos
ra a idade avançada seja o maior fator de risco com Alzheimer vai ter esse fator considerado no momento
conhecido, nem toda pessoa vai desenvolver al- de receber um diagnóstico, mas qualquer pessoa está vul-
gum tipo de demência dos 60 anos. O envelhe- nerável à doença, mesmo que não tenha ocorrido um só
cer é um processo fisiológico normal, enquanto caso na história recente da família.
os sintomas de Azheimer dizem respeito a uma
patologia do cérebro. Demência é o mesmo que loucura.
MITO Loucura é como são popularmente designados
Só velhos têm Alzheimer. distúrbios psiquiátricos como a esquizofrenia e a psicose.
MITO Enquanto os casos mais comuns se- Já a doença de Alzheimer é um tipo de demência, ou seja,
jam entre idosos, há uma minoria de casos entre um quadro de sintomas desencadeados pela perda de neu-
pessoas mais jovens, algumas vezes associados rônios e sinapses (a comunicação entre eles) e das funções
a um fator genético específico. Auguste Deter, a a eles associadas. Entretanto, em alguns casos, sobretudo
primeira mulher diagnosticada com a doença, na fase mais avançada da doença, os pacientes de Alzhei-
tinha penas 51 anos quando começou a desen- mer podem apresentar sintomas similares aos psiquiátri-
volver os sintomas e costuma-se dizer que a atriz cos, levando alguns médicos a adotar o uso de psicotrópi-
norte-americana Rita Hayworth já apesentava cos, medicação indicada para problemas psiquiátricos. O
sinais da doença na faixa dos 40 anos de idade. uso e a dosagem, porém, são específicos para cada caso e
exigem monitoramento médico.
Quanto mais cedo diagnosticar,
mais fácil tratar. Há inúmeras formas de Alzheimer.
VERDADE Embora a doença seja incurá- MITO O que existe são muitos tipos de demência,
vel, o diagnóstico e o tratamento precoces per- embora a Doença de Alzheimer seja a causadora de 60%
mitem que uma série de medidas sejam toma- dos quadros desse problema neurodegenerativo. O que
das para se potencializar a capacidade cognitiva ocorre é que o Alzheimer evolui de formas diferentes
que ainda não foi afetada e medicamentos que em cada pessoa, que pode ver um ou outro sintoma mais
podem postergar os sintomas por alguns anos. acentuado ou menos proeminente levando à falsa ideia de
A experiência aponta que o medicamento tam- que se tratam de doenças diferentes.
bém funciona melhor quando prescrito desde
os primeiros sinais. Começar a se esquecer das coisas indica
que a pessoa já tem a fase inicial da
O mal de Alzheimer afeta o doença.
sistema imunológico. MITO O declínio da memória é geralmente o primei-
MITO Os idosos com Alzheimer podem ro sinal de Alzheimer, mas pode estar associado a vários
apresentar quadros de infecção urinária ou res- outros problemas e não necessariamente à doença.
piratória com mais frequência porque em certa
fase da doença tornam-se incapazes de perce- Uma tomografia pode mostrar se alguém
ber e chamar a atenção para desconforto e dor, tem Alzheimer
fazendo com que sintomas infecciosos fiquem MITO Infelizmente, os exames de imagem disponí-
FOTO: SHUTTERSTOCK

incógnitos. Geralmente é recomendado aos cui- veis, hoje, mesmo os mais avançados não podem diagnos-
dadores que estejam atentos à cor e ao odor da ticar os efeitos da doença no cérebro. Podem no entanto
urina dos pacientes, que podem ser bons indi- ser úteis para detectar outros problemas e assim excluir a
cadores de que algo está errado. probabilidade de Alzheimer.

87
ALZHEIMER CAPÍTULO 13

Testes neuropsicológicos fazem Vitamina E é parte do tratamento.


parte dos exames de diagnóstico. MITO Estudos analisando o uso de antioxidantes
VERDADE Em geral, os testes neuropsi- como as vitaminas E e C para diminuir o efeito maléfi-
cológicos se aplicam para identificar proble- co dos radicais livres sobre as células não comprovaram
mas da capacidade cognitiva, que são parte sua eficácia. Como as defesas orgânicas naturais que nos
da Doença de Alzheimer. Mesmo assim, uma protegem contra a ação dos radicais livres declinam com
pessoa pode ter de fazer tais testes para checar o envelhecimento, alguns pesquisadores sugeriam que
a existência de outras condições, algumas in- elevar o consumo de antioxidantes poderia fortalecer as
clusive curáveis. células cerebrais inibindo o início da doença. No entan-
to, o acompanhamento de um grupo submetido a dietas
O SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS) e suplementos desses componentes durante anos não de-
não atende pacientes com monstrou os resultados esperados.
Alzheimer.
MITO De acordo com a Portaria 703 do Uma pessoa com Alzheimer não gosta de
Ministério da Saúde, o paciente de Alzheimer ninguém.
tem direito à atendimento e medicamento gra- MITO Como os sintomas se apresentam em ordem
tuitos. Por questões de praticidade, preferência e intensidade diversos, é possível ter-se um paciente in-
e maior opção de profissionais e serviços, as diferente e outro bastante agressivo. Isso faz com que as
pessoas que têm recursos financeiros optam pessoas se afastem de seus entes queridos e evitem expres-
pelo atendimento privado. De qualquer forma, sar afetividade. Com delicadeza e respeito ao momento
informe-se e reivindique seus direitos. do doente, sempre que não lhe cause medo, é importante
manter o afeto e o toque.
O hábito de fazer “palavras
cruzadas” evita a doença. Alzhheimer é doença de mulher.
MITO Atividades mentais e cognitivas MITO Na realidade o número de mulheres afetadas
como jogos de palavras cruzadas de fato funcio- pela doença é significativamente maior do que o de ho-
nam como exercícios para as funções de cog- mens. Contudo, a razão aceita até o momento é que a ex-
nição, uma capacidade seriamente afetada com pectativa de vida da mulher é maior. Com mais mulheres
a progressão do Alzheimer. Acredita-se que, idosas, aumenta também o risco de incidência da doença.
mantendo-se engajado em situações que exijam
raciocínio, pensamento lógico e acuidade inte- Antigamente não existia Alzheimer.
lectual, uma pessoa estaria menos vulnerável MITO A doença foi identificada pela primeira vez
ao avanço dos sintomas. Mas não existe nada pelo médico neurologista Alois Alzheimer, na Alemanha.
comprovado cientificamente. Por outro lado, Há razões para crer que bem antes disso já existia. Hoje se
palavras cruzadas, Sudoku e jogos similares são tem a impressão de que se veem mais casos ao nosso redor
bons estimulantes da cognição e recomendados por duas razões: a primeira é porque, graças à dificulda-
como parte do tratamento não farmacológico. de de diagnóstico e impossibilidade de confirmação via
exames de laboratório, a demência associada a Alzheimer
Demência não é Alzheimer era atribuída a outros problemas ou era simplesmente se
EM TERMOS A maioria das demências, um desenvolvia sem tratamento de nenhum tipo. A segunda
quadro de sintomas em que há degeneração neuro- razão deve-se ao aumento no número de idosos no mun-
lógica, é causada por Alzheimer. Assim, Alzheimer do todo. Como a idade é o maior fator de risco da doença,
é de fato o tipo de demência mais frequente. é natural que a incidência agora seja maior.

88
VOCÊ
O tema é extenso
e sempre
aparecem novas

AINDA TEM
questões sobre
os termos, as
condições e as

DÚVIDA circunstâncias
que cercam
essa doença
FOTO: SHUTTERSTOCK

89
ALZHEIMER CAPÍTULO 13

Problemas cognitivos? É verdade que alguém com suspeita de


Afinal, o que é cognição? Alzheimer tem de fazer exame
Cognição define conhecimento e envolve di- psicotécnico?
versos fatores como pensamento, linguagem, Neste caso, são testes neuropsicológicos para avaliar as
percepção, memória, raciocínio e portanto tudo condições das funções cognitivas em várias esferas. Em
o que faz parte do desenvolvimento intelectual geral, essa avaliação é complementada por entrevista, his-
de uma pessoa. A Doença de Alzheimer afeta tórico de saúde, hábitos e comportamento do paciente
justamente as funções cognitivas, dificultando e podem reforçar ou excluir um diagnóstico. A bateria de
gradualmente impedindo as principais delas que testes também pode ser usada para monitorar se o quadro
são memória recente, atenção, orientação tem- tem se agravado ou se estabilizado.
poral e/ou espacial, planejamento e linguagem.
Como são esses testes
Se Alzheimer não pode ser neuropsicológicos?
diagnosticado por exames São questões e atividades que vão de simples a mais com-
de laboratório, por que eles plicadas e visam avaliar a memória, capacidade de concentra-
são pedidos? ção, planejamento e linguagem, entre outras funções. Esses
Para que se descartem outras doenças. O diag- testes são instrumentos importantes para auxiliar no diag-
nóstico da Doença de Alzheimer acontece por nóstico e também no tratamento porque com os resultados
eliminação de outras possibilidades de demência, pode-se planejar melhor a estimulação cognitiva e orientar
por exemplo. Numa visita ao consultório médico os familiares cuidadores sobre atividades, autonomia, riscos
espere a prescrição dos seguintes exames laborato- e desafios envolvidos na rotina de cada paciente.
riais: hemograma completo, sódio, potássio, crea-
tinina e vitamina B12. Mais exames de imagem: Quanto tempo levam os
tomografia computadorizada, ressonância mag- testes neuropsicológicos e
nética, eletroencefalograma e outros. onde são feitos?
Em média, uma bateria de testes pode levar até cinco
Por que minha avó que tem horas. Podem ser feitos em clínicas, consultórios e até mes-
Alzheimer não pode falar? mo na casa do paciente, se for o caso. O mais importante
Como a linguagem é uma função cognitiva, é que sejam coordenados por um profissional especialista,
pode ser afetada pela doença depois da fase ini- em geral psicólogos com treinamento em neuropsicologia.
cial da doença. Assim, ainda que não perca a fala,
a pessoa pode ter dificuldade de expressar-se Sempre vejo nas redes
verbalmente. Há de se lembrar que falar envolve sociais anúncios de pessoas idosas,
tarefas mentais complexas, pois depende de vá- possivelmente com Alzheimer,
rios outros fatores. Para formular uma sentença perdidas. Como pode se prevenir isso?
ou frase coerente, necessitamos estar atentos ao Muita famílias incluem informações sobre a pessoa,
contexto, ter capacidade de acompanhar uma com telefone para contato, em colares, pulseiras, costu-
conversa ou situação, compreender o que se pas- radas ou escritas com caneta permanente na roupa. Essa
sa ao nosso redor, reter informações. Qualquer medida infelizmente dá margem a golpes por pessoas mal
falha em uma dessa etapas pode comprometer a intencionadas. O mais recomendável é que o paciente
fala. Não bastassem todas as questões cognitivas, nunca saia sem companhia. Assim, evita-se tanto o risco de
há ainda a ocorrência de problemas motores, que perder-se ou de atropelamento, possibilidade aumentada
impedem a articulação adequada das palavras. pelo déficit de atenção.

90
O que é “síndrome Todos os medicamentos
do pôr do sol”? usados no tratamento da doença
Trata-se de uma síndrome comum entre pa- são controlados?
cientes de Alzheimer que ocorre com mais fre- As substâncias indicadas – rivastigminina (Exelon),
quência ao final da tarde, daí o nome. Nesse donepezil (Eranz), a galantamina (Reminil) e a meman-
período do dia, a pessoa tende a sentir-se con- tina (Ebix) – são todas de uso controlado, só podem ser
fusa e como parte do sintoma começa a dizer e ministradas com prescrição médica e observada a dosa-
insistir que quer “voltar para casa”. Isso faz parte gem para cada caso. Os três primeiros medicamentos, re-
do quadro da doença. comendados para as fases inicial e moderada da doença,
podem ser acessados pelo sistema de saúde público, mas
Como o cuidador deve não a memantina. Esta última deve ainda constar da lista
reagir quando a pessoa quer de governo porque ainda não existia na época em que a
“voltar para casa”? portaria governamental foi aprovada. A ABRAz já solici-
O cuidador deve simplesmente tentar dis- tou sua inclusão.
trair o paciente para acalmá-lo, evitando con-
frontos e discussões. O importante é encontrar Por que uma pessoa com Alzheimer
uma estratégia que funcione. Apegue-se a ela tem tantos problemas com o sono?
e repita sempre que necessário. Nesses casos, Pessoas idosas podem apresentar maiores problemas
consistência e rotina são mais importantes que com o padrão do sono por vários motivos. Esse quadro é
criatividade para o bem do paciente e menos ainda mais agravado em alguns pacientes de Alzheimer
estresse para todos. e podem se aprofundar sobretudo nas fases mais avan-
çadas da doença. Assim, é comum que experimentem
É comum interditar inversão no ciclo do sono se sentindo sonolentos durante
juridicamente uma pessoa os dias e inquietos à noite. Em algum momento, peque-
com Alzheimer? nos cochilos sem interrupção podem substituir as noites
Sim, isso acontece com alguma frequência de sono mais profundo perdidas e restaurar a tranquili-
porque com a evolução dos sintomas a capaci- dade da pessoa.
dade de discernimento declina muito e o doente
passa a não avaliar a consequência de seus atos. É preciso adaptar uma casa onde vive
Além desse problema, outras habilidades podem uma pessoa com Alzheimer?
ser afetadas como o raciocínio lógico para deci- Sim. O espaço deve ser seguro para prevenir acidentes
dir uma questão importante ou o comprometi- e facilitar a navegação do paciente pela casa. Devem ser
mento da comunicação pode impedir a manifes- observados tapetes, tacos soltos, quinas pontiagudas de
tação da vontade. Só diante dessas circunstâncias móveis, portas de vidro, portas com fechaduras que po-
e depois de avaliação rigorosa, o paciente pode dem facilitar que o paciente se tranque e outros perigos
ser declarado legalmente incapaz. A interdição em potencial que normalmente não notamos. É também
surge como medida para proteger o paciente de aconselhável desobstruir as passagens e regular o acesso
riscos envolvendo a posse e administração de a escadas muito íngremes ou sem corrimão, entre outros
seus bens. Com a interdição, a pessoa é declarada cuidados. Um casa adaptada permite que o paciente te-
incapaz e não poderá mais exercer determinados nha mais autonomia sem se expor a riscos desnecessá-
atos da vida civil e passando a ser representado rios. Apesar de tudo isso, é importante não transformar
por um representante, em geral familiar, que é totalmente um lugar para não assustar ou causar descon-
chamado de curador. forto ao doente.

91
ALZHEIMER CAPÍTULO 14
O Alzheimer em números

92
O ALZHEIMER
EM NÚMEROS
São poucas as estatísticas no Brasil. Mas
com base em estudos de outras partes do
mundo é possível fazer algumas
estimativas e projeções reveladoras
FOTO: SHUTTERSTOCK

93
ALZHEIMER CAPÍTULO 14

O
s relatórios do censo nacional brasileiro
informam algo importante: tal como a
maioria dos países, estamos envelhecen-
do e com isso a prevalência da doença
deve aumentar, uma vez que a idade avançada é
um de seus principais fatores de risco.
Mas embora seja possível estimar-se , com
base em censo demográfico do IBGE (Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatísticas) que mais
de 1milhão de pessoas sofre os sintomas do Al-
zheimer, sabe-se também que grande parte des-
se número de casos segue sem diagnóstico. Esse
é um dado preocupante que, infelizmente, não é
exclusividade brasileira.
Para ter uma ideia, pouco mais de dez anos
atrás, a França, primeiro país europeu a desenvol-
ver um plano nacional de ação para o tratamento
da doença, admitia que 50% dos franceses viven-
do com Alzheimer desconheciam seu diagnóstico.
No Reino Unido (Inglaterra, País de Gales e Irlan-
da do Norte), somente 44% dos casos de Alzhei-
mer estimados já receberam um diagnóstico.
O perigo do baixo índice de diagnósticos é
que enquanto muitos casos de demência con-
tinuam sem identificação, o tratamento certa-

O Brasil envelhece
mente vai ter início mais tarde, quando os sin-
tomas serão mais graves e consequentemente
mais difíceis para o paciente e seus familiares,
e mais oneroso para sociedade como um todo. Talvez porque pela primeira vez tenhamos uma popu-
Perde-se a chance, por exemplo, de prolongar lação em grande parte mais velha, vários tabus ligados
a autonomia do paciente com medicamento e ao envelhecimento ainda precisam ser derrubados com
terapia integrada adequada e de com isso asse- informação e campanhas de esclarecimento. Assim, em
gurar um pouco mais de qualidade de vida aos vez de ligarmos lapsos de memória simplesmente à idade
doentes e seus cuidadores. avançada, estaríamos mais aptos a reconhecer fatores pa-
No caso do Reino Unido, por exemplo, 60 mil tológicos aos quais os idosos são mais vulneráveis como a
mortes são atribuídas a complicações dos sin- demência, ao invés de os considerarmos como parte nor-
tomas de Alzheimer por ano e acredita-se que mal do processo.
postergando os sintomas mais sérios por cinco Essas mudanças serão necessárias uma vez a estimativa
anos mais, esses números cairiam pela metade. é que, em 2060, 58 milhões de brasileiros terão mais de 65
Curiosamente, apesar das conhecidas dificulda- anos, o que vai representar cerca de 25% da população. Por
des para reconhecer os sinais num primeiro mo- conta desses dados, é possível determinar como certo o cres-
mento, tem sido geralmente aceito que exames cimento do número de casos de demência. Vale lembrar que
clínicos podem diagnosticar a doença com acer- menos de 5% dos casos de Alzheimer ocorrem entre pessoas
to em 85 a 90% das vezes. de 30 a 60 anos de idade.

94
TEMPO
DE VIDA
Como uma doença
degenerativa, cuja
velocidade e intensidade da
evolução pode variar
bastante, nem sempre é
possível prever o tempo de
vida de alguém que recebeu
o diagnóstico de Alzheimer,
mas novamente a idade é o
maior indicativo. Em média,
uma pessoa diagnosticada
com mais de 80 anos tem
expectativa de vida entre 3 e
4 anos. Aqueles que
começam a ter sintomas
mais jovens podem viver até
10 anos mais. No entanto,
há registros de casos de
sobrevida de até 20 anos.

Em termos estatísticos, a previsão é a de que até Impacto na sociedade


2050 o mundo tenha cerca de 2 bilhões de habitan-
tes com mais de 60 anos, e os casos de Alzheimer Os custos sociais e familiares, além do desgaste emocio-
devem triplicar, chegando a 115,4 milhões. Dois nal e de todo o estresse, são com certeza altos. Não há estu-
terços desse número devem ocorrer em países em dos extensivos no Brasil dando conta do impacto econômi-
desenvolvimento, o que deveria ser um alerta para co sobre as famílias cuidadoras de um doente de Alzheimer.
que todos se preparem melhor. Entretanto, em estudos menores, indica-se que os gastos
Nos Estados Unidos há hoje mais de mil gru- nas fases iniciais muitas vezes deixam de ser contabiliza-
pos oficiais de apoio a famílias afetadas pelo Al- dos porque referem-se ao tempo de dedicação exigido dos
zheimer e mais de duas centenas de associações familiares cuidadores que, como consequência, em grande
regionais. Além dos investimentos em preven- parte dos casos, têm de abandonar o trabalho, ver diminu-
ção e políticas para lidar com o problema, nos ída sua fonte de renda ou empreender recursos para con-
últimos dez anos o Canadá investiu cerca de 236 tratar ajuda adicional. Os maiores custos, no entanto, são
milhões de dólares em pesquisas relacionadas à percebidos nas fases mais avançadas, quando há necessida-
FOTOS: SHUTTERSTOCK

demência. Enquanto lá, nos Estados Unidos e de de institucionalização. Daí mais uma vez a necessidade
em vários países europeus já se desenha um de se investir esforços para diminuir o impacto de pacientes
plano abrangente de enfrentamento da doença que perdem totalmente a capacidade de cuidar-se nas mais
nos próximos anos, no Brasil as iniciativas são básicas tarefas. O que se observa é que muitas famílias bus-
escassas e isoladas até o momento. cam a institucionalização como último recurso.

95
ALZHEIMER CAPÍTULO 14

Instituições
com mais frequência trabalho voluntário, doações e apoio
financeiro de órgão e organizações estatais.
Por outro lado, como reflexo do crescimento da nova
Dados de um estudo publicado em 2010 de- demanda de um mercado para idosos: 57% das institui-
monstram que das instituições de longa perma- ções fundadas entre 2000 e 2009 são privadas. O estudo
nência para idosos, apenas 6,6 % são públicas menciona que quase 35% dos idosos residentes nas insti-
e 65% filantrópicas. Um perfil de caráter de tuições de longa permanência são independentes e mais de
assistencialismo social que sempre foi associa- 50% mulheres. Um problema para famílias, mesmo as que
do ao envelhecimento no Brasil. Nesse sentido, podem arcar com os custos de uma instituição desse tipo,
alguns estudiosos propõem como medida so- é que nem todas aceitam pacientes sem autonomia, o que
ciopolítica a criação de casas de apoio, como os representa grande parte dos casos em fase avançada de Al-
centros-dia, que barateariam esses cuidados, ao zheimer. Embora o alcance dos estudos nessa área seja pe-
mesmo tempo permitindo um atendimento de queno, pode-se inferir que os custos dessas instituições por
mais democrático e de qualidade . Isso tornaria um leito variam entre 1 e 10 salários mínimos, dependendo
o apoio ao envelhecimento saudável uma ques- de sua estrutura, conforto e serviços oferecidos, lembrando
tão de saúde. Entretanto, há de se lembrar que que os pacientes que não independentes pagam mais. As
as instituições filantrópicas são na maioria isen- instituições gastam a maior parte de sua receita em instala-
tas de impostos e taxas municipais e recebem ções e pessoal e não cobrem despesas com medicamentos.

CUIDADORAS
Um paradoxo interessante com relação à
doença de Alzheimer no Brasil e em boa
parte do mundo tem a ver com a questão de
gênero. Se por um lado, as mulheres são
diagnosticadas quase 50% mais do que os
homens, elas também estão na linha de
frente como cuidadoras. Calcula-se que no
Brasil, 90% dos familiares-cuidadores sejam
mulheres, entre elas esposas e filhas.

96
MAIS NÚMEROS
• A doença foi diagnosticada pela • Uma em cada 50
primeira vez há 116 anos pessoas apresenta
• No Brasil calcula-se que haja 1,2 alguma forma
milhão de casos de Alzheimer de demência na
faixa etária de
• Estimam-se 35,6 milhões em 65 a 70 anos.
todo o mundo, mais de 5 milhões
só nos EUA • De acordo com dados da ONU, a
população mundial com mais de
• Calcula-se que 1,55% da 60 anos deve chegar a 2 bilhões
população da Europa sofra com em 2050. Mais de 430 milhões
algum tipo de demência acima de 80 anos de idade.

• Segundo projeções da OMS • Casos de demência ligadas


(Organização Mundial de Saúde) ao Alzheimer dobram a cada
serão 65, 7 milhões os casos em 5 anos, depois dos 65 anos
todo o mundo em 2030 e 115, 4 de idade
milhões em 2050
• Há 50% de chances de
• Segundo dados dos um portador da Síndrome
E UA, dois terços dos familiares de Down ter Alzheimer
cuidadores são mulheres e 34% depois do 60 anos.
delas têm mais de 65 anos
• Exames clínicos podem
• O mesmo relatório estima que diagnosticar Alzheimer
um novo caso seja diagnosticado hoje com chances de
no mundo a cada 4 segundos. 85 a 90% de acerto.

• Em média, 60% dos quadros • Casos entre pessoas de


de demência são causados 30 a 60 anos representam
por Alzheimer menos de 5%

• Alzheimer é a sexta causa de • No Brasil, estima-se que


morte nos Estados Unidos e a 90% dos familiares-cuidadores
terceira entre idosos sejam esposas e filhas
FOTOS: SHUTTERSTOCK

• Mulheres recebem o diagnóstico quase


50% mais vezes que os homens

97
ALZHEIMER REFERÊNCIAS Referências

REFERÊNCIAS
ABRAz Associação Brasileira de Alzheimer Organização das Nações Unidas (Departamento de
www.abraz.org.br Questões Econômicas e Sociais)
http://www.un.org/en/development/desa/news/
Alzheimer Med population/2015-report.html
www.azheimermed.com.br

Mayo Clinic
www.mayoclinic.org articles/10.1186/1742-2094-5-2

AFA Alzheimer Foundation of America Revista Brasileira de Estudos da População, vol.27,


www.alzfdn.org no.1 São Paulo/Jan/Jun 2010
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid
WebMed Health Search =S0102-30982010000100014
www.webmed.com
Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia
Academia Brasileira de Neurologia (Órgão da http://sbgg.org.br/
Sociedade Brasileira de Neurologia)
http://www.abneuro.org.br/ Abrata – Associação Brasileira de Familiares, Amigos e
Portadores de Transtornos Afetivos
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https://www.alzheimers.org.uk/
Associação Brasil Huntington
Instituto Alzheimer Brasil http://www.abh.org.br/
http://www.institutoalzheimerbrasil.org.br/
Semiologia Médica – Estudos de Semiologia Médica e
Alzheimer’s Association (Canadá) História da Medicina
http://www.alz.org/ca/dementia-alzheimers- http://semiologiamedica.blogspot.br
canada.asp
BBC Brasil (Número de Idosos no Brasil vai
Alzheimer Europe Quadruplicar até 2060, diz IBGE
http://www.alzheimer-europe.org/Alzheimer- http://www.bbc.com/portuguese/
Europe
populacao_brasil_lgb
National Institute on Aging (US Department
od Health and Human Services) Ciência e Saúde Coletiva 19 (11)
https://www.nia.nih.gov/ http://www.scielo.br/pdf/csc/v19n11/1413-8123-
csc-19-11-4479.pdf
FOTO: SHUTTERSTOCK

World Population Ageing Report


(Organização das Nações Unidas, 2015) The Brain from Top to Bottom (McGill University,
http://www.un.org/en/development/desa/
population/publications/pdf/ageing/WPA2015_ histoire_jaune03.html
Report.pdf

98
99
ALZHEIMER
ALZHEIMER CAPÍTULO 3

SERÁ QUE
ESTOU COM
ALZHEIMER CAPÍTULO 7

COMO
DIAGNOSTICAR
ALZHEIMER? O MAL DE
Os esquecimentos comuns no dia a dia costumam
preocupar quando são frequentes, mas podem estar
bem longe de significar a doença.
ALZHEIMER
É preciso muito cuidado para não
se confundir a doença com outras
típicas da senilidade

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ALZHEIMER CAPÍTULO 10 ALZHEIMER CAPÍTULO 8

CUIDADORES
PROFISSIONAIS Alguns anos atrás, a profissão
foi regulamentada legalmente.
Mesmo assim, ainda sobram
dúvidas sobre que papel
ocupam na dinâmica de

TIPOS DE
tratamentos e cuidados aos
doentes de Alzheimer

TRATAMENTO Conheça os melhores e


mais adequados tipos de
tratamento para cada caso

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