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PROPÓSITO
Conhecer as noções gerais de licitações e contratos administrativos para uma compreensão
imprescindível do direito administrativo e da relação do Estado com particulares, assim como
sua consubstanciação em normas influentes em todo o processo de contratações públicas e
gestão de contratos administrativos.
PREPARAÇÃO
Antes de iniciar a leitura deste conteúdo, tenha à mão duas leis (as de nº 14.133/2021 e
8.666/1993) para ter uma melhor compreensão do assunto a ser tratado.
OBJETIVOS
MÓDULO 1
MÓDULO 2
INTRODUÇÃO
O tema das licitações e contratos públicos possui grande relevo na prática administrativa,
sendo objeto de inúmeras discussões na doutrina e na sociedade como um todo. Por meio de
contratos administrativos – em regra, celebrados a partir de procedimentos licitatórios –, a
Administração Pública interage com os agentes econômicos em busca da consecução dos
objetivos constitucionalmente postos a cargo do poder público.
Por fim, registramos que a aprovação da Lei federal n° 14.133/2021, em abril de 2021, abriu
uma nova janela de oportunidades tanto para a sociedade quanto para os profissionais que
pretendem seguir carreira na área, seja no setor privado ou no público. O novel diploma, que
estará plenamente em vigor em dois anos, precisará ser efetivamente operado como uma
ferramenta de modernização da gestão pública por todos que militam na área. O desafio e as
oportunidades, desse modo, estão colocados.
MÓDULO 1
LICITAÇÃO: COMPETÊNCIAS,
RESPONSABILIDADES E PRINCÍPIOS
REGENTE
Imagem: Shutterstock.com.
Com críticas acerca da insegurança jurídica, das obras e dos serviços parados – ou até por
conta das denúncias de irregularidades.
CONCEITO
As licitações podem ser conceituadas, segundo Flávio Amaral Garcia (2018, p. 49), como um
“processo de natureza instrumental” voltado para assegurar a contratação mais eficiente e o
melhor custo-benefício nos contratos públicos.
Esse procedimento, em suma, é uma ferramenta necessária para o atendimento dos princípios
constitucionais da eficiência, da economicidade e da moralidade, com a função precípua de
harmonizar os resultados econômicos e os ditames axiológicos da Constituição da República
Federativa do Brasil (CRFB) de 1988.
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A LICITAÇÃO NA CONSTITUIÇÃO DA
REPÚBLICA E NO DIREITO
INFRACONSTITUCIONAL
A regra licitatória possui matriz constitucional, segundo o artigo 37, XXI, da CRFB/1988,
devendo ser seguida por todos os entes da Federação e por todos os agentes públicos.
Além da previsão acima, o caput desse artigo prevê princípios que informam toda a atividade
administrativa, inclusive as contratações públicas. O artigo 22, XXVII, por sua vez, atesta que é
competência da União Federal legislar sobre regras gerais de licitações e contratos
administrativos. Esse assunto também é previsto em outros dispositivos específicos.
EXEMPLO
Foto: Shutterstock.com.
COMPETÊNCIAS EM MATÉRIA DE
LICITAÇÕES
No artigo 22, XXVII, a CRFB/1988 estabelece competir privativamente à União legislar sobre as
normas gerais de licitação e contratação em todas as modalidades para as administrações
públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, dos estados, do Distrito Federal e dos
municípios. Compete a Estados e Municípios, por outro lado, suplementar as normas gerais
federais no que lhes couber, destaca o artigo 24, §2°.
Foto: Shutterstock.com.
Segundo Rafael Oliveira (2012), essas normas são definidas como um conceito jurídico
indeterminado. Dotadas de elevado grau de abstração, elas pretendem assegurar a
uniformidade do processo licitatório em todas as unidades federativas sem interferir nas
peculiaridades locais de cada ente subnacional.
De acordo com Egon Bockmann Moreira (2021), a doutrina e a jurisprudência, com o passar
dos anos, passaram a reconhecer o caráter “material restritivo” do conceito de normas gerais,
atribuindo aos entes federados uma ampla margem de conformação dos procedimentos
licitatórios – inclusive apontando que algumas normas da Lei nº 8.666/1993 seriam
inconstitucionais por violar o espaço de liberdade de Estados e Municípios.
EXEMPLO
O artigo 87, §3°, teria extrapolado o âmbito de competência da União ao fixar quais agentes
públicos municipais e estaduais deveriam aplicar a sanção de inidoneidade nos contratantes do
poder púbico. Para Garcia (2018), trata-se de matéria eminentemente administrativa e de
organização interna, insuscetível de ingerência pelo governo federal.
EXEMPLO
Marçal Justen Filho (2015) afirma que constituem expressões de normas gerais os dispositivos
da Lei de Licitações referentes a requisitos mínimos de validade da contratação administrativa,
hipóteses de obrigatoriedade e não obrigatoriedade de licitação, requisitos de participação em
licitação, modalidades de licitação, tipos de licitação e regime jurídico da contratação
administrativa.
Verifica-se, assim, que – não obstante a crítica do professor Egon sobre um excesso de
liberdade aos entes subnacionais, o que elevaria a insegurança jurídica – os parâmetros
traçados por Justen Filho reduzem exponencialmente o espaço de inovações em Estados e
Municípios no tocante aos principais aspectos dos certames licitatórios. A jurisprudência se
posicionou sobre alguns casos polêmicos, inúmeras vezes restringindo a liberdade de
conformação dos entes federados.
EXEMPLO
Vejamos o precedente:
COMENTÁRIO
A despeito de possíveis críticas quanto à violação da autonomia federativa, parece ser o caso
de uma norma geral voltada para a defesa dos princípios constitucionais da moralidade e da
transparência.
RESPONSABILIDADES EM MATÉRIA DE
LICITAÇÕES
Outro tema relevante em licitações é compreender as responsabilidades dos atores envolvidos
no processo:
Os particulares
São essas as três figuras que surgem e se relacionam no âmago de licitações, cada uma delas
sujeita a regras e regimes de responsabilidade diferentes.
O assunto possui enorme relevância prática por dois motivos:
Dessa forma, todo profissional ou estudioso do tema precisa conhecer os principais aspectos
das responsabilidades na área. Veja-os abaixo.
MATRIZ DE RISCOS
A nova lei, em seu artigo 89, §2°, dispõe que o contrato precisa prever a responsabilidade das
partes no curso da relação contratual. Isso está em consonância com o espírito de maior
flexibilidade na divisão de responsabilidade no curso da relação contratual.
O TCU, conforme aponta Flávio Amaral Garcia (2018), costuma responsabilizar as autoridades
superiores dos órgãos contratantes por vícios nas fases interna e externa – e até durante a
execução do contrato. A mesma lógica aplica-se ao controle externo pelo Ministério Público
(MP).
COMENTÁRIO
Flávio Amaral Garcia (2018) destaca – a nosso ver, com razão – que responsabilizar as
autoridades superiores por qualquer ato maculado previamente é irrazoável e gera um
desincentivo ao ingresso de pessoas bem-intencionadas no serviço público. Nesse sentido,
Gustavo Binenbojm e André Cyrino (2018), fundamentados no artigo 28 da Lei de Introdução
às Normas do Direito Brasileiro (LINDB), defendem uma maior racionalidade na aplicação de
sanções aos agentes públicos, ressaltando o dever de existir uma tolerância com erros
decorrentes de condutas de boa-fé e cautelosas.
COMENTÁRIO
Outros pontos sobre a responsabilidade dos agentes públicos envolvidos em licitações devem
ser ressaltados. O primeiro é a mudança operada pela nova Lei de Licitações e Contratos
Administrativos, que, rompendo com a lógica até então vigente na Lei nº 8.666/1993, retirou a
regra geral de formação de comissão de licitação (artigo 6°, XVI, Lei nº 8.666/1993) para reger
os procedimentos licitatórios e criou a figura do “ agente de contratação”.
AGENTE DE CONTRATAÇÃO
Aproximou-se da lógica da Lei do Pregão, que, tal como a Lei nº 8.666/1993, será
futuramente revogada por completo pela Lei nº 14.133/2021.
A comissão de licitação fica reservada apenas às licitações que envolvam bens ou serviços
especiais, conforme prevê o artigo 8°, §2°. Nessa esteira, é fundamental que o agente de
contratação tenha a segurança de que não será punido por qualquer equívoco.
O contratado que atua de modo indevido em processo licitatório está sujeito não só à
responsabilização criminal – cuja análise transborda os limites deste estudo –, mas também à
civil e administrativa. Desse modo, ele pode ser punido por:
Administração contratante
ARTIGO 73
Seu teor prevê que, na hipótese de contratação direta indevida ocorrida com dolo, fraude ou
erro grosseiro, o contratado e o agente público responsável responderão solidariamente pelo
dano causado ao erário, sem prejuízo de outras sanções legais cabíveis.
ARTIGO 155
Tal artigo enseja a responsabilização administrativa do licitante caso ele incorra em alguma
destas doze condutas:
Dar causa à inexecução parcial do contrato que cause grave dano à administração, ao
funcionamento dos serviços públicos ou ao interesse coletivo.
Não celebrar o contrato ou não entregar a documentação exigida para a contratação quando
ele for convocado dentro do prazo de validade de sua proposta.
OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
Legalidade
Impessoalidade
Moralidade
Publicidade
Eficiência
Os princípios listados dirigem-se a todos os ramos da atividade pública brasileira; contudo, eles
não afastam a aplicação de princípios setoriais.
EXEMPLO
O princípio da licitação (artigo 37, XXI, CRFB/1988), que impõe a realização de certame
licitatório antes de o poder público escolher seus contratantes.
A Lei nº 14.133/2021 ampliou o número de princípios expressos para 17, abarcando ainda
aqueles previstos no artigo 37 da CRFB/1988.
COMENTÁRIO
O alargamento do rol de princípios trazido pela nova lei vem sendo criticado por parcela da
doutrina sob o argumento de que, por ele ser exemplificativo, a inserção de mais princípios no
dispositivo não é uma vantagem. O crescimento, destaca Oliveira (2021b), não afastou o fato
de que outros princípios licitatórios seguem existindo a despeito de não terem sido
contemplados no artigo 5° da nova lei.
EXEMPLO
PRINCÍPIOS EM ESPÉCIE
SEGURANÇA JURÍDICA
Na sua vertente previsibilidade.
PRINCÍPIO DA IMPESSOALIDADE
A impessoalidade significa “buscar sempre atingir a finalidade pública prevista em lei, sem
privilégios ou favorecimentos a qualquer pessoa”, explica Garcia (2018, p. 63). A licitação,
em si, constitui um instituto jurídico cuja razão de existir é assegurar a impessoalidade na
escolha dos contratantes do Estado, sendo esse um dos princípios fundantes dos
procedimentos licitatórios.
PRINCÍPIO DA MORALIDADE
Segundo Flávio Amaral Garcia (2018), o princípio da moralidade consubstancia-se no conjunto
de regras da boa administração. Ele precisa sempre funcionar com a observância da ética e
em respeito à finalidade a que se destina.
COMENTÁRIO
Mostrou uma evolução a nova Lei de Licitações e Contratos ao estabelecer, no seu artigo 54,
que a publicidade do edital de licitação deverá ser realizada mediante a divulgação e a
manutenção do inteiro teor do ato convocatório e de seus anexos no PNCP. Com isso, evita-se
a prática de editais de licitação divulgados apenas em jornais e diários oficiais locais,
restringindo o acompanhamento do certame e a possível participação de outros interessados.
Da eficácia
Da economicidade
Da celeridade
COMENTÁRIO
Entendemos que eles reforçam a previsão constitucional da eficiência, já que a eficácia não
oferece deveres novos ou um estado de coisas a se atingir diverso daquele exposto pelo
princípio da eficiência. A economicidade é a dimensão do custo-benefício da eficiência; dessa
maneira, a celeridade impõe que a licitação e os incidentes dela decorrentes sejam resolvidos
no menor tempo possível, maximizando a eficiência na atuação estatal.
COMENTÁRIO
Nenhum conteúdo ou comando é extraído do referido princípio que não seja igualmente
extraível do que trata da moralidade. Ele é, portanto, redundante.
PRINCÍPIO DA IGUALDADE
Tal qual o princípio anterior, trata-se de uma repetição, no rol infralegal, de um princípio de
ordem constitucional, já que seus objetivos seriam satisfeitos pelo da impessoalidade.
Contudo, com algum esforço hermenêutico, é possível distinguir a impessoalidade, cujo núcleo
pretende evitar que subjetivismos influenciem na atuação administrativa, da igualdade, que
impõe um dever objetivo de que todo administrado em situação equivalente seja tratado de
forma equânime.
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PRINCÍPIO DO PLANEJAMENTO
A doutrina – a nosso ver, com razão – aponta que o planejamento é um dever da
Administração decorrente do princípio da eficiência – e não um princípio autônomo, pontua
Oliveira (2021a).
PRINCÍPIO DA MOTIVAÇÃO
Segundo Marçal Justen Filho (2016), o referido princípio acarreta o “dever de a autoridade
julgadora expor, de modo explícito, os fundamentos de fato e de direito em que se alicerça a
sua decisão”. Um bom parâmetro normativo para se aferir o grau de respeito ao princípio da
motivação são os requisitos do artigo 489, §1°, do Código de Processo Civil, que tratam da
motivação da decisão judicial.
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Flávio Amaral Garcia (2018) qualifica o princípio da motivação como um corolário do devido
processo legal e um elemento imprescindível para permitir o controle da Administração. Para
que uma atuação pública seja legítima, afinal, é necessário que a sociedade e as partes
diretamente atingidas por um ato administrativo saibam o motivo que ensejou sua expedição.
ATENÇÃO
Apesar de ser uma tarefa simples em casos nos quais é adotado o tipo único de menor preço,
isso ganha contornos mais complexos quando entra em pauta o exame da técnica dos
licitantes.
Ressalte-se, entretanto, que a licitação do tipo técnica ou técnica e preço não significa uma
autorização para o subjetivismo ou a violação ao princípio da isonomia. Para Garcia (2018),
devem ser fixados os parâmetros mais objetivos possíveis mesmo nesses casos, conforme
está expresso no artigo 36 da Lei nº 14.133/2021 e se pode extrair do artigo 46 da Lei nº
8.666/1993.
A segurança jurídica pode ser conceituada como uma norma-princípio que exige de todos os
agentes públicos a adoção de comportamentos que contribuam para a existência de um estado
de confiabilidade, calculabilidade e cognoscibilidade do direito. Ela funcionaria, pontua Ávila
(2016), como um instrumento garantidor do respeito à sua capacidade de – sem engano,
frustração, surpresa e arbitrariedade – plasmar digna e responsavelmente o seu presente e
fazer um planejamento estratégico juridicamente informado do seu futuro.
Já Flávio Amaral Garcia (2018) ressalta que o princípio da segurança jurídica tem de ser
protegido nas licitações em duas vertentes:
Objetiva
Subjetiva
ADEQUAÇÃO
Examina se a atividade administrativa é capaz de efetivamente atingir os fins pretendidos.
NECESSIDADE
Verifica se haveria outros meios menos gravosos ao direito dos particulares para se alcançar o
objetivo estatal.
PROPORCIONALIDADE
Em sentido estrito, consubstancia uma análise de custo-benefício entre os fins almejados e os
direitos atingidos pela medida.
Os atos tomados em licitações públicas, assim como nas demais esferas de atuação estatal,
devem obediência ao princípio da proporcionalidade e da razoabilidade.
Trata-se de um dos princípios setoriais mais importantes para o alcance dos objetivos
constitucionais das licitações. As restrições à competitividade impõem um ônus argumentativo
maior ao administrador, devendo, por isso, ter amparo em lei.
EXEMPLO
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COMENTÁRIO
Sua previsão era mais adequada apenas sob a alcunha de objetivo (o que continua no artigo
11, IV), porém sua inclusão no rol de princípios reforça que o objetivo de alcançar o
desenvolvimento nacional sustentável deve ser um vetor interpretativo de todos os dispositivos
da lei de licitações.
EXEMPLO
O exemplo mais clássico da doutrina é o do licitante com a melhor proposta eliminado por ter
se esquecido de carimbar uma página da sua proposta. Não haveria razoabilidade em tal
medida.
O artigo 12, III, da Lei nº 14.133/2021 agiu bem ao fixar que o desatendimento de exigências
meramente formais que não comprometam a aferição da qualificação do licitante ou a
compreensão do conteúdo de sua proposta não importará seu afastamento da licitação ou a
invalidação do processo, positivando o que já era quase unanimemente aceito como o ideal na
condução de certames licitatórios.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
C) A União possui competência para legislar sobre normas gerais de licitações e contratos e os
Estados-membros, para tratar de normas gerais no âmbito estadual. Os municípios estão
completamente alijados do condomínio legislativo sobre o tema.
D) A competência para legislar privativamente sobre normas gerais atribuída pela Constituição
à União afasta totalmente a possibilidade de Estados-membros e municípios instituírem normas
procedimentais sobre o assunto.
E) A competência privativa da União para legislar sobre normas gerais de licitações e contratos
não impede que Estados-membros e municípios editem normas sobre procedimentos na
matéria.
GABARITO
Os princípios previstos em lei não esgotam o assunto apesar de sua grande quantidade. A
alternativa cita corretamente o do formalismo moderado, único princípio não expresso
trabalhado ao longo do material.
MÓDULO 2
OS TIPOS DE LICITAÇÕES
DEFINIÇÃO
ATENÇÃO
A retirada dessa previsão não fará falta, já que, pela própria lógica da vinculação ao edital e da
isonomia, é possível extrair a proibição de critérios de julgamento não previstos em lei.
Para Oliveira (2021b), a Lei nº 14.133/2021 prevê mais opções de critérios de julgamento
que a de nº 8.666/1993. Na antiga lei, estavam previstos os seguintes tipos no artigo 45, §1°:
Menor preço
Melhor técnica
Técnica e preço
A nova lei, por sua vez, elencou os seguintes tipos em seu artigo 33:
Menor preço
Maior desconto
Técnica e preço
A Lei nº 14.133/2021 inovou ao prever que os julgamentos que envolvam o menor preço ou
o maior desconto precisam observar parâmetros mínimos de qualidade (artigo 34, caput,
da nova Lei).
Jessé Torres Pereira Júnior (2021) celebra essa mudança – e com razão, frisamos – ao
pontuar que o artigo 45, §1º, I, da Lei nº 8.666/1993 considerava exclusivamente mais
vantajosa para a Administração a proposta que oferecesse o menor preço e cumprisse os
requisitos do edital. O problema é que tal visão não observa parâmetros de qualidade mais
elevados além desses requisitos mínimos, o que poderia significar maior economia e eficiência
no longo – ao invés no curto – prazo.
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A nova lei também inovou positivamente ao prever, no artigo 34, §1°, que os custos indiretos
– relacionados, entre outros fatores vinculados a seu ciclo de vida, com despesas de
manutenção, utilização, reposição, depreciação e impacto ambiental do objeto licitado –
poderão ser considerados para a definição do menor dispêndio, conforme disposto em
regulamento, sempre que forem objetivamente mensuráveis.
Entretanto, não há dúvidas de que a maior “novidade” quanto ao tópico dos tipos de licitações é
a inclusão do critério de julgamento denominado “maior retorno econômico”.
COMENTÁRIO
Essa novidade, na verdade, é relativa: tal critério já estava previsto na Lei do Regime
Diferenciado de Contratações (Lei n° 12.462/11), que era uma norma com âmbito de aplicação
restrito aos objetos nela elencados.
MENOR PREÇO
O tipo de licitação considerado como regra geral no Brasil, segundo Garcia (2018), leva em
conta única e exclusivamente o preço cobrado pelos possíveis contratados do poder público.
Não há, portanto, preocupações com a qualidade além dos critérios mínimos previstos no
edital.
Dos licitantes que chegaram até a etapa de julgamento, o vencedor será o que ofertar o preço
mais baixo. Simples assim. Trata-se do único critério previsto na Lei do Pregão (artigo 4°, X, da
Lei n° 10.520/2002).
MAIOR DESCONTO
Tal critério é bastante similar ao do menor preço, pois seu objetivo é gerar o menor dispêndio
ao poder público. A diferença é que o vencedor será o licitante que oferecer o maior desconto
em relação a um preço de referência previamente fixado pela Administração Pública no edital,
explica Garcia (2018).
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O artigo 34, §2°, da Lei nº 14.133/2021 regulamentou esse tipo de licitação. Ele fixou que:
O julgamento por maior desconto terá como referência o preço global fixado no edital de
licitação.
Única hipótese de critério de julgamento não vinculada ao preço, ela tem sua aplicação restrita
para a contratação de projetos e trabalhos de natureza técnica, científica ou artística, conforme
prevê o artigo 35, parágrafo único, da Lei n° 14.133/2021.
Elaboração de projetos.
Cálculos.
Fiscalização.
Supervisão.
Gerenciamento.
O procedimento do tipo melhor técnica foi parametrizado no artigo 37 da nova Lei de Licitações
e Contratos Administrativos, sendo estabelecido nele que o julgamento por melhor técnica
ou por técnica e preço deve ser realizado por:
O artigo 38 destaca que, no tipo de licitação melhor técnica ou por técnica e preço, a obtenção
de pontuação devido à capacitação técnico-profissional exigirá que a execução do respectivo
contrato tenha participação direta e pessoal do profissional correspondente.
Em seguida, eram abertas as propostas de preços dos licitantes que tivessem atingido a
valoração mínima estabelecida no instrumento convocatório. Com isso, podia ser iniciada a
negociação.
COMENTÁRIO
Entendemos que o legislador agiu corretamente ao restringir o tipo de licitação melhor técnica.
O critério melhor técnica e preço possui um espectro de utilização mais amplo, podendo ser
manejado em licitações quando o objeto se enquadrar em uma destas cinco hipóteses:
Qualidade
Produtividade
Rendimento
Durabilidade
O artigo 36, §2°, da nova lei estipula que devem ser avaliados e ponderados dois tipos de
proposta:
Propostas técnicas.
ATENÇÃO
Sem previsão análoga na Lei n° 8.666/1993, uma interessante novidade, por valorizar a
experiência prática de potenciais contratantes e poder auxiliar na melhoria da gestão pública, é
o disposto no artigo 36, §3°, da nova lei: está definido nele que o desempenho pretérito na
execução de contratos com a Administração Pública precisa ser considerado na pontuação
técnica.
Sob a égide da Lei nº 8.666/1993, o tipo melhor técnica e preço é idêntico ao do tipo melhor
técnica – salvo pelo artigo 46, §2°. Esse artigo adiciona o dever de:
Prever que a classificação dos proponentes será feita de acordo com a média ponderada
das valorizações das propostas técnicas e de preço (segundo os pesos preestabelecidos
no instrumento convocatório).
A nova Lei de Licitação e Contratos previu esse novo tipo como o critério de julgamento para
reger os leilões.
LEILÕES
Principal novidade constante na Lei nº 14.133/2021 no que tange aos tipos de licitação, essa
modalidade estava até então restrita – ao menos à luz do direito positivo, já que existia
doutrina militante em favor de sua aplicação ampla – ao RDC. Agora, porém, ela poderá
ser utilizada pela Administração Pública sempre que estiverem presentes seus pressupostos.
Esse tipo se volta exclusivamente para os contratos de eficiência, ou seja, aqueles que, na
forma do artigo 6°, LIII, têm por objeto a prestação de serviços. Essa prestação pode incluir a
realização de obras e o fornecimento de bens com o objetivo de proporcionar economia ao
contratante na forma de redução de despesas correntes, remunerando o contratado com base
em percentual da economia gerada.
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O artigo 39 dispõe que a análise do maior retorno econômico considerará a maior economia
para a Administração, enquanto a remuneração deverá ser fixada em um percentual que
incidirá de forma proporcional à da economia efetivamente obtida na execução do contrato.
Economia que se estima gerar expressa em unidade de medida associada à obra, ao bem ou
ao serviço – e em unidade monetária.
Proposta de preço correspondendo ao percentual sobre a economia que se estima gerar
durante determinado período e expressa em unidade monetária (artigo 39, §1°).
FASES DA LICITAÇÃO
QUAIS SÃO AS FASES DAS LICITAÇÕES?
Na fase externa (ou licitação propriamente dita), há o processo de seleção dos particulares
interessados, esclarece Aragão (2013). Na interna, o poder público define o objeto a ser licitado
e toma as medidas imprescindíveis à abertura do procedimento.
EXEMPLO
Escolha do tipo, cautelas orçamentárias, redação das minutas de edital e contrato, além da sua
análise jurídica.
Preparatória.
II
III
IV
De julgamento.
V
De habilitação.
VI
Recursal.
VII
De homologação.
A contradição, porém, é apenas aparente: a lei apenas prevê, entre os incisos II e VI, o que
a doutrina já classificava como etapas da fase externa.
Oliveira (2021b, p. 238) classifica como “salutar” a preocupação da nova lei com a fase
preparatória por entender – e com absoluta razão – que uma fase interna malfeita ressoa
diretamente na eficiência da licitação e do próprio contrato. Essa fase é indispensável para o
respeito ao planejamento e ao princípio da eficiência.
A definição das condições de execução e pagamento das garantias exigidas e ofertadas e das
condições de recebimento.
O orçamento estimado com as composições dos preços utilizados para sua formação.
A análise dos riscos que possam comprometer o sucesso da licitação e a boa execução
contratual.
ATENÇÃO
Um ponto a ser observado na regulamentação da fase interna, além da questão da
competência já abordada, é como os inúmeros requisitos serão operacionalizados em
municípios menores e em órgãos não equipados, já que as exigências se tornarão enormes.
Contudo, a estruturação prevista nessa legislação pode ter o condão de incentivar uma maior
qualidade na fase preparatória.
A fase externa das licitações se conceitua como o momento em que o poder público leva ao
conhecimento de terceiros sua vontade de celebrar um contrato, tendo como seu marco a
publicação do edital, o que dá ciência formal aos interessados do início do certame e possibilita
que eles preparem sua participação e/ou proposta de preços, conceitua Garcia (2018).
Julgamento
Habilitação
Recursal
Homologação
Seguindo o exemplo de leis mais modernas, como, por exemplo, a do Pregão e do RDC, a
nova lei agiu bem ao inverter a regra da Lei nº 8.666/1993 e colocar a fase de habilitação
depois da etapa de julgamento, evitando, com isso, a análise de documentação de todos os
licitantes sem necessidade.
Por fim, o artigo 164 da Lei nº 14.133/2021 (similar ao artigo 41, §1°, da Lei nº 8.666/1993)
prevê que qualquer pessoa pode ser parte legítima para impugnar um edital de licitação por
irregularidade na aplicação dessa lei ou para solicitar esclarecimento sobre os seus termos,
devendo protocolar o pedido em até três dias úteis antes da data de abertura do certame. A
faculdade se justifica pela importância que os editais possuem no início da fase externa.
FASES DAS LICITAÇÕES
VERIFICANDO O APRENDIZADO
C) O tipo de licitação denominado “maior retorno econômico” está previsto tanto na Lei nº
14.133/2021 quanto na Lei nº 8.666/1993.
A) Assim como a Lei n° 8.666/1993, a nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos não
regulamentou a fase interna das licitações.
D) O gestor público tem discricionariedade para decidir em qual momento deseja iniciar a fase
externa: se na publicação do edital, no chamamento para a habilitação ou no chamamento para
o julgamento.
E) A nova Lei de licitações rompeu com o padrão da Lei nº 8.666/1993 e extinguiu a divisão
das licitações em fases.
GABARITO
A alternativa é a única cujo conteúdo está diretamente relacionado ao novo comando legal – ao
contrário das demais, que contradizem normas citadas. O maior retorno econômico trata-se de
uma modalidade até então restrita ao RDC, passando a poder ser utilizada pela Administração
Pública sempre que estiverem presentes seus pressupostos.
A alternativa está em perfeita consonância com o artigo 18 da Lei n° 14.133/2021, sendo ela
uma das principais novidades da nova lei quanto a esse tema. A fase preparatória dedica-se ao
planejamento, sendo positiva, pois uma fase interna malfeita ressoa diretamente na eficiência
da licitação e do próprio contrato.
CONCLUSÃO
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como vimos neste conteúdo, as noções gerais de licitações envolvem importantes aspectos
para a compreensão do tema, merecendo um olhar atento por parte dos estudiosos do direito.
Tratamos da competência delas, destacando que a CRFB/1988 diz competir à União a edição
de normas gerais sobre o tema e que é permitida aos entes subnacionais uma regulamentação
suplementar sobre procedimentos e questões de interesse local que não violem as normas
gerais. Apesar disso, frisamos que esse tema é envolto em grande celeuma, havendo decisões
dos tribunais e posições doutrinárias com sentidos diversos.
Por fim, descrevemos as fases das licitações. Para tal, apontamos as diferenças da fase
interna, chamada de preparatória na Lei n° 14.133/2021, e da externa (ou licitação
propriamente dita), que se inicia com os particulares sendo informados da realização do
certame.
AVALIAÇÃO DO TEMA:
REFERÊNCIAS
ARAGÃO, A. S. de. Curso de Direito Administrativo. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013.
BRASIL. Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da
Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá
outras providências.
SARLET, I. W.; MARINONI, L. G.; MITIDIERO, D. Curso de Direito Constitucional. 6. ed. São
Paulo: Saraiva, 2017.
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Pesquise este artigo do professor Jessé Torres Pereira Júnior:
CURRÍCULO LATTES