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Fisiologia Neuromuscular e

Controle do Movimento

Brasília-DF.
Elaboração

Mateus Moraes Domingos

Produção

Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e Editoração


Sumário

APRESENTAÇÃO................................................................................................................................... 5

ORGANIZAÇÃO DO CADERNO DE ESTUDOS E PESQUISA...................................................................... 6

INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 8

UNIDADE I
NEURÔNIOS E CÉLULAS DA NEUROGLIA................................................................................................. 9

CAPÍTULO 1
UM MARCO IMPORTANTE NA NEUROCIÊNCIA: A COLORAÇÃO DE GOLGI............................... 10

CAPÍTULO 2
O SOMA................................................................................................................................ 13

CAPÍTULO 3
O AXÔNIO............................................................................................................................ 17

CAPÍTULO 4
A SINAPSE.............................................................................................................................. 19

CAPÍTULO 5
OS DENDRITOS...................................................................................................................... 21

CAPÍTULO 6
CLASSIFICAÇÃO BASEADA NAS CONEXÕES............................................................................ 22

CAPÍTULO 7
AS CÉLULAS DA NEUROGLIA................................................................................................... 23

CAPÍTULO 8
OUTRAS CÉLULAS NÃO NEURONAIS........................................................................................ 25

UNIDADE II
TRANSMISSÃO DE SINAIS...................................................................................................................... 26

CAPÍTULO 1
O IMPULSO NERVOSO E O POTENCIAL DE REPOUSO DE MEMBRANA........................................ 26

CAPÍTULO 2
DESPOLARIZAÇÃO E HIPERPOLARIZAÇÃO............................................................................... 28

CAPÍTULO 3
POTENCIAIS GRADUADOS E POTENCIAIS DE AÇÃO.................................................................. 30
CAPÍTULO 4
SEQUÊNCIA DE EVENTOS DE UM POTENCIAL DE AÇÃO............................................................ 33

CAPÍTULO 5
PROPAGAÇÃO DO POTENCIAL DE AÇÃO............................................................................... 36

CAPÍTULO 6
A JUNÇÃO NEUROMUSCULAR................................................................................................ 39

CAPÍTULO 7
NEUROTRANSMISSORES.......................................................................................................... 41

UNIDADE III
NEUROFISIOLOGIA DO CONTROLE MOTOR.......................................................................................... 46

CAPÍTULO 1
O SISTEMA NERVOSO CENTRAL............................................................................................... 46

CAPÍTULO 2
O SISTEMA NERVOSO PERIFÉRICO.......................................................................................... 52

CAPÍTULO 3
O SISTEMA NERVOSO AUTÔNOMO......................................................................................... 55

CAPÍTULO 4
INTEGRAÇÃO SENSÓRIO-MOTORA......................................................................................... 58

CAPÍTULO 5
ATIVIDADE REFLEXA................................................................................................................ 61

CAPÍTULO 6
OS CENTROS ENCEFÁLICOS SUPERIORES................................................................................ 65

CAPÍTULO 7
A RESPOSTA MOTORA............................................................................................................ 68

PARA (NÃO) FINALIZAR....................................................................................................................... 70

REFERÊNCIAS .................................................................................................................................... 71

ANEXO............................................................................................................................................... 73
Apresentação
Caro aluno

A proposta editorial deste Caderno de Estudos e Pesquisa reúne elementos que se entendem
necessários para o desenvolvimento do estudo com segurança e qualidade. Caracteriza-se pela
atualidade, dinâmica e pertinência de seu conteúdo, bem como pela interatividade e modernidade
de sua estrutura formal, adequadas à metodologia da Educação a Distância – EaD.

Pretende-se, com este material, levá-lo à reflexão e à compreensão da pluralidade dos conhecimentos
a serem oferecidos, possibilitando-lhe ampliar conceitos específicos da área e atuar de forma
competente e conscienciosa, como convém ao profissional que busca a formação continuada para
vencer os desafios que a evolução científico-tecnológica impõe ao mundo contemporâneo.

Elaborou-se a presente publicação com a intenção de torná-la subsídio valioso, de modo a facilitar
sua caminhada na trajetória a ser percorrida tanto na vida pessoal quanto na profissional. Utilize-a
como instrumento para seu sucesso na carreira.

Conselho Editorial

5
Organização do Caderno
de Estudos e Pesquisa
Para facilitar seu estudo, os conteúdos são organizados em unidades, subdivididas em capítulos, de
forma didática, objetiva e coerente. Eles serão abordados por meio de textos básicos, com questões
para reflexão, entre outros recursos editoriais que visam a tornar sua leitura mais agradável. Ao
final, serão indicadas, também, fontes de consulta, para aprofundar os estudos com leituras e
pesquisas complementares.

A seguir, uma breve descrição dos ícones utilizados na organização dos Cadernos de Estudos
e Pesquisa.

Provocação

Textos que buscam instigar o aluno a refletir sobre determinado assunto antes
mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente para o autor
conteudista.

Para refletir

Questões inseridas no decorrer do estudo a fim de que o aluno faça uma pausa e reflita
sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em seu raciocínio. É importante
que ele verifique seus conhecimentos, suas experiências e seus sentimentos. As
reflexões são o ponto de partida para a construção de suas conclusões.

Sugestão de estudo complementar

Sugestões de leituras adicionais, filmes e sites para aprofundamento do estudo,


discussões em fóruns ou encontros presenciais quando for o caso.

Praticando

Sugestão de atividades, no decorrer das leituras, com o objetivo didático de fortalecer


o processo de aprendizagem do aluno.

Atenção

Chamadas para alertar detalhes/tópicos importantes que contribuam para a


síntese/conclusão do assunto abordado.

6
Saiba mais

Informações complementares para elucidar a construção das sínteses/conclusões


sobre o assunto abordado.

Sintetizando

Trecho que busca resumir informações relevantes do conteúdo, facilitando o


entendimento pelo aluno sobre trechos mais complexos.

Exercício de fixação

Atividades que buscam reforçar a assimilação e fixação dos períodos que o autor/
conteudista achar mais relevante em relação a aprendizagem de seu módulo (não
há registro de menção).

Avaliação Final

Questionário com 10 questões objetivas, baseadas nos objetivos do curso,


que visam verificar a aprendizagem do curso (há registro de menção). É a única
atividade do curso que vale nota, ou seja, é a atividade que o aluno fará para saber
se pode ou não receber a certificação.

Para (não) finalizar

Texto integrador, ao final do módulo, que motiva o aluno a continuar a aprendizagem


ou estimula ponderações complementares sobre o módulo estudado.

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Introdução

Objetivos
» Propiciar a construção de conhecimentos específicos em neurociências.

» Identificar a organização do sistema nervoso.

» Identificar o neurônio e suas características.

» Distingui o impulso nervoso e o potencial de repouso de membrana.

» Identificar diferentes eventos e os princípios básicos de um potencial de ação e da


atividade reflexa.

» Distinguir o estímulo sensorial como origem a uma resposta motora.

» Desenvolver o conhecimento e a compreensão dos processos de intercomunicação


entre o sistema nervoso central, o periférico e o autônomo.

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NEURÔNIOS E
CÉLULAS DA UNIDADE I
NEUROGLIA

Nesta unidade, enfocaremos a estrutura dos diferentes tipos celulares no sistema nervoso (SN):
neurônios e células gliais. Tratam-se de categorias amplas, nas quais há muitos tipos de células
que se diferenciam com base na sua estrutura química e função. Contudo, a distinção entre neurônios
e células gliais é importante. Ainda que existam muitos neurônios no encéfalo humano (ao redor de
100 bilhões), as células gliais excedem em número os neurônios em cerca de 10 vezes. Em face disto,
poderia parecer que devíamos focalizar nossa atenção na glia para compreendermos as funções
celulares do SN. No entanto, os neurônios são as células mais importantes para as funções únicas
do encéfalo. São os neurônios que percebem modificações no meio ambiente, comunicam tais
modificações a outros neurônios e comandam as respostas corporais a essas sensações. Acredita-se
que a glia contribui para a função encefálica, sobretudo por isolar, sustentar e nutrir os neurônios
vizinhos. Se o encéfalo fosse um biscoito e os neurônios pedaços de chocolate, a glia seria a massa
que preenche todos os espaços restantes e assegura que os pedaços de chocolate fiquem suspensos no
lugar certo. Na verdade, o termo glia origina-se da palavra grega empregada para “cola”, sugerindo
que a principal função dessas células seria a de manter a coesão do tecido neuronal. Como veremos
mais tarde, a simplicidade desse ponto de vista provavelmente é um bom indício da profundidade de
nossa ignorância acerca da função glial. Entretanto, ainda acreditamos que os grandes responsáveis
pelo processamento das informações no encéfalo são os neurônios. Assim sendo, despenderemos
90% de nossa atenção aos 10% da população celular do encéfalo: os neurônios.

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CAPÍTULO 1
Um marco importante na neurociência:
a coloração de Golgi

Em 1873, Camillo Golgi (figura 1A) descobriu que submergindo uma amostra de tecido nervoso em
uma solução de cromato de prata – o que hoje é chamado de procedimento de Golgi – um pequeno
percentual de neurônios fica corado de preto em toda a sua extensão (figura 1B). Isso revelou que o soma
neuronal, a região do neurônio ao redor do núcleo, na realidade é somente uma pequena fração do total
da estrutura do neurônio.

Figura 1. A) Camilo Golgi (1843-1926). B) Neurônios impregnados pela técnica de Golgi.

O método de Golgi mostra que os neurônios têm, pelo menos, duas partes distinguíveis: uma região
central, que contém o núcleo, e numerosos tubos finos que dali irradiam. A região dilatada, que
contém o núcleo celular, recebe diferentes nomes que podem ser empregados indistintamente:
corpo celular, soma ou pericário. Os tubos finos que irradiam do soma são chamados de neuritos,
havendo dois tipos: axônio e dendritos (figura 2).

Figura 2. Os componentes básicos de um neurônio.

Do corpo celular frequentemente origina um único axônio, o qual apresenta um diâmetro uniforme
por toda a sua extensão e, quando ele se ramifica, os ramos geralmente projetam-se em ângulos

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NEURÔNIOS E CÉLULAS DA NEUROGLIA │ UNIDADE I

retos (figura 2). Como os axônios podem se estender por grandes distâncias no corpo (de um
metro ou mais), os neurocientistas imediatamente reconheceram que os axônios poderiam atuar
como os “cabos” que transportam a informação que emerge dos neurônios. Os dendritos, por outro
lado, raramente se estendem por mais de 2 mm. Muitos dendritos estendem-se do corpo celular,
terminando geralmente em uma ponta fina. Os primeiros neurocientistas reconheceram que, uma vez
que os dendritos relacionam-se com muitos axônios, devem atuar como uma espécie de “antena” do
neurônio, recebendo os sinais de entrada.

O neurónio (português europeu) ou neurônio (português brasileiro) é a célula


do sistema nervoso responsável pela condução do impulso nervoso em que
está localizada no cérebro. Há cerca de 86 bilhões (até 20 de fevereiro de 2009 se
especulava que havia 100 bilhões) de neurônios no sistema nervoso humano. O
neurônio é constituído pelas seguintes partes: corpo celular (onde se encontra o
núcleo celular), dendritos, axônio e telodendritos.

O neurônio pode ser considerado a unidade básica da estrutura do cérebro e do


sistema nervoso. A membrana exterior de um neurônio toma a forma de vários ramos
extensos chamados dendritos, que recebe sinais elétricos de outros neurônios, e de
uma estrutura que se chama axônio que envia sinais elétricos a outros neurônios.

Fonte: Wikipédia, a enciclopédia livre. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/


Neur%C3%B3nio>. Acessado em: 4 de junho de 2011.

Como vimos, o neurônio consiste de várias partes: o soma, os dendritos e o axônio. O conteúdo
interno de um neurônio é separado do meio externo por uma membrana limitante, a membrana
neuronal, que recobre o neurônio como uma tenda de circo sustentada por uma intrincada rede
interna, dando a cada parte da célula sua aparência tridimensional característica. Vamos examinar
agora o interior do neurônio e aprender um pouco sobre as funções das diferentes partes que o
compõem (figura 3).

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UNIDADE I │ NEURÔNIOS E CÉLULAS DA NEUROGLIA

Figura 3. A estrutura interna de um neurônio típico. RE = retículo endoplasmático.

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CAPÍTULO 2
O soma

Iniciaremos nosso passeio pelo soma, uma estrutura aproximadamente esférica na parte central do
neurônio. Dentro do soma, existe uma grande quantidade de estruturas membranosas chamadas
de organelas.

Em biologia celular, o termo organela ( organelo, organito, orgânulo ou organóide)


é usado para descrever várias estruturas com funções especializadas, delimitadas
por uma membrana própria, suspensas no citoplasma das células vivas. A palavra
“organela” deriva do termo latinizado “organella” (pequeno órgão).

Fonte: Wikipédia, a enciclopédia livre. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Organelo>.


Acessado em: 7 de junho de 2011.

O corpo celular (soma) de um neurônio contém as mesmas organelas presentes nas demais
células animais. As mais importantes são o núcleo, o retículo endoplasmático rugoso, o retículo
endoplasmático liso, o aparelho de Golgi e as mitocôndrias.

Organelas celulares.

Disponível em <http://www.youtube.com/watch?v=vR0TNsT3RGU>. Acessado em:


4 de junho de 2011.

Sugestão de leitura

GUYTON, Arthur C.; HALL, John E. Tratado de Fisiologia Médica. 11. ed. Rio de
Janeiro: Elsevier, 2006. Capítulo 2: A Célula e suas Funções.

O núcleo de uma célula nervosa é esférico, localizado centralmente e delimitado por uma dupla
membrana chamada envelope nuclear. O envelope nuclear é perfurado por poros que medem
aproximadamente 0,1 µm de diâmetro cada.

Dentro do núcleo estão os cromossomos, que contêm o material genético, o ácido


desoxirribonucleico (DNA). Você recebe seu DNA de seus pais, e ele contém o “projeto de
construção” de seu corpo. O DNA de cada um de seus neurônios é o mesmo, sendo também o
mesmo DNA que está presente nas células do seu fígado ou dos seus rins. O que distingue um
neurônio de uma célula hepática são as partes específicas do DNA que estão sendo empregadas na
sua construção particular.

A “leitura” do DNA é conhecida como expressão gênica, e o produto final da expressão gênica é a
síntese de moléculas chamadas de proteínas. A síntese proteica ocorre no citoplasma celular. Como
o DNA nunca deixa o núcleo, necessita de um mensageiro intermediário que carregue a mensagem
genética até os locais de síntese no citoplasma celular. Essa função é realizada por outra molécula de
grande dimensão chamada ácido ribonucleico mensageiro, ou RNAm. O RNAm consiste em

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UNIDADE I │ NEURÔNIOS E CÉLULAS DA NEUROGLIA

quatro diferentes nucleotídios fortemente unidos em sequências que formam cadeias. A sequência
específica de nucleotídios na cadeia representa a informação no gene, assim como uma sequência
de letras dá sentido a uma palavra escrita. O processo de confecção de um RNAm que contenha a
informação de um gene é chamado de transcrição (figura 4) sendo o RNAm resultante chamado
de transcrito.

O RNAm transcrito emerge do núcleo através dos poros presentes no envelope nuclear e desloca-se
para os sítios de síntese protéica em algum lugar do neurônio. Nesses sítios, a molécula de proteína é
sintetizada assim como a de RNAm foi. Muitas moléculas pequenas vão sendo conectadas, formando
uma cadeia. No caso das proteínas, os blocos para a construção são os aminoácidos, dos quais há 20
tipos diferentes. Essa confecção de proteínas a partir de aminoácidos, sob controle do RNAm, é
chamada de tradução (figura 4).

Figura 4. Transcrição e tradução.

Descreva de forma mais elaborada como é realizado o processo de transcrição


(formação de RNAm) e tradução (formação de proteína).

Próximo ao núcleo encontra-se o Retículo Endoplasmático Rugoso (RER). O RER é formado


por sistemas de vesículas achatadas com ribossomos aderidos à membrana que lhe confere aspecto
granular, por causa desse aspecto granular o RER pode ser chamado também de RE granular. O
RER é o maior sítio de síntese protéica nos neurônios. O RNA transcrito liga-se aos ribossomos, que
traduzem as informações presentes no RNAm para sintetizar uma molécula de proteína.

Os ribossomos podem ser encontrados na forma livre quando não estão aderidos à membrana do
retículo endoplasmático.

O retículo endoplasmático é uma organela exclusiva de células eucariontes.


Formado a partir da invaginação da membrana plasmática, é constituído por uma
rede de túbulos e vesículas achatadas e interconectadas, que comunicam-se com
o envoltório nuclear (carioteca). Foi descoberto em 1945 pelo citologista belga

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NEURÔNIOS E CÉLULAS DA NEUROGLIA │ UNIDADE I

Albert Claude. O retículo endoplasmático está envolvido na síntese de proteínas e


lipídios, na desintoxicação celular e no transporte intracelular. Existem dois tipos de
retículos, classificados de acordo com a presença ou ausência de ribossomos em sua
superfície: rugoso ou liso, respectivamente.

Fonte: Wikipédia, a enciclopédia livre. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/


Ret%C3%ADculo_endoplasm%C3%A1tico>. Acessado em: 7 de junho de 2011.

Já o Retículo Endoplasmático Liso (REL) é formado por tubos membranosos achatados que
se assemelham ao RER, porém sem os ribossomos. O REL é muito heterogênio e assume diferentes
funções em distintos locais. Alguns REL estão em continuidade com RER.

O Retículo Endoplasmático Liso (REL), também chamado retículo endoplasmático


agranular, é formado por sistemas de túbulos cilíndricos e sem ribossomos aderidos
à membrana. Participa principalmente da síntese de esteróides, fosfolipídios e
outros lipídios. O REL tem, como uma de suas principais funções, a desintoxicação do
organismo, atuando na degradação do etanol ingerido em bebidas alcoólicas, assim
como a degradação de medicamentos ingeridos pelo organismo como antibióticos
e barbitúricos (substâncias anestésicas). Esse tipo de retículo é abundante
principalmente em células do fígado, das gônadas e pâncreas.
Fonte: Wikipédia, a enciclopédia livre. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/
Ret%C3%ADculo_endoplasm%C3%A1tico>. Acessado em: 7 de junho de 2011.

As pilhas de discos membranosos no soma, dispostas longe do núcleo, constituem o aparelho de Golgi
descrito em 1898 por Camilo Golgi (figura 5). Trata-se de um grande sítio de intenso processamento
bioquímico pós-tradução de proteínas. Acredita-se que uma função importante do aparelho de Golgi
seja a distribuição de certas proteínas destinadas a diferentes partes de um neurônio, tais como axônio
e os dendritos.

Figura 5. Aparelho de Golgi.

Outra organela muito abundante no soma é a mitocôndria.

A mitocôndria é um das organelas celulares mais importantes, sendo extremamente


relevante para respiração celular. É abastecida pela célula que a hospeda por
substâncias orgânicas como oxigênio, glicose, ácidos graxos e aminoácidos as quais
processa e converte em energia sob a forma de trifosfato de adenosina (ATP), que

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UNIDADE I │ NEURÔNIOS E CÉLULAS DA NEUROGLIA

devolve para a célula hospedeira. Sendo energia química que pode ser, e é usada em
reações bioquímicas que necessitem de dispêndio de energia. A mitocôndria está
presente em grande quantidade nas células: do sistema nervoso (na extremidade
dos axônios), do coração e do sistema muscular, uma vez que estas apresentam uma
necessidade maior de energia.

Fonte: Wikipédia, a enciclopédia livre. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/


Mitoc%C3%B4ndria>. Acessado em: 7 de junho de 2011.

O que diferencia os neurônios dos demais tipos celulares encontrados em nosso


organismo?

Até aqui estudamos o soma e as organelas neuronais. Nenhuma destas estruturas (organelas),
entretanto, é exclusiva dos neurônios; elas são encontradas em todas as células do nosso corpo.

Agora estudaremos o axônio, uma estrutura encontrada apenas nos neurônios e altamente
especializada para a transferência de informação entre pontos distantes do SN.

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CAPÍTULO 3
O axônio

O axônio parte de uma região chamada cone de implantação ou proeminência axônica, que
funciona como o segmento inicial do axônio propriamente dito (figura 6). Essa região tem um papel
importante na condução do sinal elétrico – impulso nervoso –, que discutiremos posteriormente.
Duas marcantes características distinguem o axônio do soma:

1. Não exibe RER e os ribossomos livres, quando presentes, são poucos.

2. A composição protéica da membrana do axônio é fundamentalmente diferente


daquela presente na membrana do soma.

Essas diferenças estruturais refletem-se nas dessemelhanças funcionais, pois, se inexistem


ribossomos, não há síntese proteica no axônio. Isso significa que toda proteína presente no axônio
teve de ser sintetizada no soma.

Os axônios apresentam comprimentos variáveis, podendo se estender desde menos de um milímetro


até mais de um metro de comprimento. Eles podem se ramificar e essas ramificações são chamadas
de colaterais (figura 6). Ocasionalmente, uma colateral pode retornar e comunicar-se com a célula
que deu origem ao axônio ou com os dendritos de células vizinhas. Essas ramificações axonais
chamam-se colaterais recorrentes.

Figura 6. Axônio e suas colaterais.

Todos os axônios têm um início (o cone de implatação), um meio (o axônio propriamente dito)
e um fim. Essa região final é chamada de terminal axonal ou botão terminal, pois, de fato,
normalmente se parece com um disco intumescido (dilatado). O terminal é o local onde o axônio

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UNIDADE I │ NEURÔNIOS E CÉLULAS DA NEUROGLIA

entra em contato com outros neurônios (ou outras células) e passa a informação para eles. Esse ponto
de contato, as sinapses, palavra derivada do grego “amarrar junto”, são as regiões de comunicação
entre os neurônios, ou mesmo entre neurônios e células musculares e epiteliais glandulares.

Os terminais axonais formam sinapses com os dendritos ou com o soma de outros neurônios.
Quando um impulso nervoso chegar no terminal axonal pré-sináptico, são liberadas moléculas
neurotransmissoras das vesículas sinápticas na fenda sináptica. Os neurotransmissores, então,
ligam-se a proteínas receptoras específicas, desencadeando a geração de sinais elétricos ou químicos
na célula pós-sináptica.

Em resumo, o axônio é o transmissor do neurônio. Ele transmite impulsos para longe do corpo
celular. Próximo de sua extremidade, um axônio divide-se em numerosos ramos. São os terminais
axônicos ou fibrilas terminais. As pontas desses terminais são dilatadas, formando pequenos bulbos,
e são denominadas botões sinápticos. Esses botões alojam numerosas vesículas (sacos) repletos de
substâncias químicas denominadas neurotransmissores, que são utilizadas na comunicação entre
um neurônio e uma outra célula.

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CAPÍTULO 4
A sinapse

Para que um neurônio se comunique com o outro, deve ser produzido um potencial de ação (impulso
nervoso) como veremos posteriormente. Uma vez disparado um potencial de ação, o impulso
nervoso percorre toda a extensão do axônio e, finalmente, atinge os terminais axônicos.

Como o impulso nervoso se move do neurônio que lhe deu origem a um outro
neurônio?

Os neurônios comunicam-se entre si por meio de sinapses. Uma sinapse é o local onde ocorre a
transmissão de um impulso nervoso de um neurônio a outro. O tipo mais comum de sinapse é a química.

A sinapse tem dois lados: o pré e o pós-sináptico. Esses nomes indicam a direção habitual do fluxo
de informação que vai da região “pré” para “pós”. O lado pré-sináptico geralmente consiste de
um axônio terminal, enquanto que o lado pós-sináptico pode ser o dendrito ou o soma de outro
neurônio. O espaço entre as membranas pré e pós-sináptica é chamado de fenda sináptica. A
transferência de informação através de uma sinapse, de um neurônio para outro, é chamado de
transmissão sináptica.

Na maioria das sinapses, a informação que viaja na forma de impulsos elétricos ao longo de um
axônio é convertida, no terminal axonal, em um sinal químico que atravessa a fenda sináptica. Na
membrana pós-sináptica, esse sinal químico é convertido novamente em um sinal elétrico. O sinal
químico é chamado de neurotransmissor, sendo armazenado nas vesículas sinápticas dentro do
terminal axonal e liberado na fenda sináptica.

Essa transformação da informação em elétrica-química-elétrica torna possível muitas das


capacidades computacionais do encéfalo. Modificações desse processo estão envolvidas na memória
e no aprendizado, e distúrbios nas transmissões sinápticas desencadeiam certos transtornos
mentais. A sinapse também é o local de ação para a maioria das drogas psicoativas.

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UNIDADE I │ NEURÔNIOS E CÉLULAS DA NEUROGLIA

Figura 7. Terminal axonal e a sinapse. Observe a liberação da substância neurotransmissora pelo terminal axonal
pré-sináptico na fenda sináptica, e sua subsequente interação com os receptores específicos localizados sobre a
membrana de um dendrito pós-sináptico.

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CAPÍTULO 5
Os dendritos

A maioria dos neurônios contém muitos dendritos. São os receptores dos neurônios. Geralmente,
os impulsos que chegam ao nervo, de estímulos sensoriais ou de neurônios adjacentes, tipicamente
entram no neurônio através dos dendritos. Essas projeções transmitem, então, os impulsos em
direção do corpo celular. Em comparação, a maioria dos neurônios possui apenas um axônio, o
transmissor do neurônio.

De uma forma mais simples, os dendritos estão adaptados para a recepção e processamento dos
sinais elétricos que chegam de outros neurônios por meio das sinapses. Sendo assim, os dendritos
funcionam como “antena” para o neurônio, estando recoberto por milhares de sinapses. A
membrana dendrítica relacionada com as sinapses (a membrana pós-sináptica) apresenta muitos
receptores, especializados na detecção dos neurotransmissores liberados na fenda sináptica pelo
neurônio pré-sináptico.

Como ocorre o processo de transmissão sináptica?

Agora que já vimos às principais características e estruturas da unidade funcional do SN, estamos
prontos para classificá-los de acordo com suas funções específicas.

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CAPÍTULO 6
Classificação baseada nas conexões

Os neurônios são as unidades funcionais do SN e são identificados três tipos funcionalmente distintos:

a. Neurônios sensoriais: especializados na decodificação dos estímulos físico-


químicos do ambiente em sinais elétricos que são enviados aos neurônios associativos.
As informações (aferências) chegam ao SN pelos neurônios que apresentam neuritos
(figura 2) nas superfícies sensoriais do corpo, como a pele e a retina dos olhos. As
células com tal tipo de conexão são os neurônios sensoriais.

b. Neurônios associativos: encarregados de processar as informações sensoriais,


ou seja, de interpretar e elaborar comandos para os órgãos efetuadores do corpo.
A maioria dos neurônios do SN forma conexões apenas com outros neurônios,
apresentando assim, a função de processar as informações sensoriais e elaborar
comando para os órgão efetores.

c. Neurônios motores: enviam os comandos para os órgãos efetuadores realizarem


algum ajuste fisiológico ou expressar um determinado comportamento. Esses
neurônios apresentam axônios que formam sinapses com os músculos esqueléticos
e comandam os movimentos.

Os neurônios formam redes de comunicação chamadas de circuito nervoso e quanto maior o


número de neurônios associativos entre os neurônios sensoriais e motores mais complexos serão o
processamento e a expressão da tarefa motora.

A figura 8 apresenta um exemplo dessa organização neuronal (circuito nervoso).

Figura 8. Circuito nervoso.

Até este momento do capítulo dedicamos exclusivamente nossa atenção aos neurônios. Em outras
palavras, despendemos exclusivamente nossa atenção aos 10% da população celular do encéfalo: os
neurônios. Nos próximos tópicos despenderemos nossa atenção às células da glia, consideradas por
alguns neurocientistas como “o gigante adormecido”.

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CAPÍTULO 7
As células da neuroglia

As células gliais (ou células da neuroglia) mais numerosas no encéfalo são os astrócitos. Os
astrócitos ocupam a maior parte do espaço no encéfalo que não está ocupada por neurônios ou
vasos sanguíneos, ou seja, essas células preenchem os espaços entre os neurônios.

Os astrócitos são vários tipos de células em forma de estrela (de onde lhes vem o
nome: astro = estrela, cito = célula). Os astrócitos são as células da neuróglia que
possuem as maiores dimensões. Existem dois tipos de astrócitos: os protoplasmasticos
e os fibrosos. Os primeiros predominam na substância cinzenta, e os segundos
predominam na substância branca do cérebro. Os astrócitos desempenham funções
muito importantes, como a sustentação e a nutrição dos neurônios.

Outras funções que desempenham são:

» Preenchimento dos espaços entre os neurônios.

» Regulagem da concentração de diversas substâncias com potencial para


interferir nas funções neuronais normais (ex.: concentrações extracelulares
de potássio).

» Regulagem dos neurotransmissores (restringem a difusão de


neurotransmissores liberados e possuem proteínas especiais em suas
membranas que removem os neurotransmissores da fenda sináptica).

Fonte: Wikipédia, a enciclopédia livre. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/


Astr%C3%B3cito>. Acessado em: 7 de junho de 2011.

É provável que os astrócitos determinem quanto um neurito poderá crescer ou se retrair. Uma
descoberta recente e inesperada é que a membrana dos astrócitos também apresenta receptores para
os neurotransmissores que, assim como nos neurônios, podem desencadear eventos bioquímicos e
elétricos no interior da célula glial.

Um segundo tipo de célula glial, os oligodendrócitos (ou oligodendróglia), são as células da


neuroglia, responsáveis pela formação, e manutenção das bainhas de mielina dos axônios, no
Sistema Nervoso Central (SNC) (encéfalo e medula), função que, no Sistema Nervoso Periférico
(SNP) (fora do crânio e da coluna vertebral), é executada pelas células de Schwann. No entanto,
apenas um oligodendrócito contribui para formação de mielina em vários neurônios, ao contrário
da célula de Schwann que mieliniza apenas um axônio.

Nos axônios de maior diâmetro, a célula envoltória forma dobras múltiplas e em


espiral em torno do axônio. Ao conjunto dessas dobras múltiplas denomina-se
bainha de mielina e as fibras são chamadas de fibras nervosas mielínicas. Sua função
é acelerar a velocidade da condução do impulso nervoso. A bainha de mielina não

23
UNIDADE I │ NEURÔNIOS E CÉLULAS DA NEUROGLIA

é contínua, pois ela apresenta intervalos reguladores, formando os nódulos de


Ranvier. A bainha de mielina está presente somente nos vertebrados.

Fonte: Wikipédia, a enciclopédia livre. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Bainha_de_


mielina>. Acessado em: 7 de junho de 2011.

Sem os oligodendrócitos, os neurônios não sobrevivem em meio de cultura. Em suas características


físicas os oligodendrócitos mostram possuir um corpo celular arredondado e pequeno, com
poucos prolongamentos, curtos, finos e pouco ramificados (daí o nome: oligo = pouco; dendro =
ramificação). Assim como em diversas células do corpo humano, nos oligodendrócitos podem ser
geradas neoplasias (tumores), que nesse caso são os oligodedrogliomas.

A figura 9 demonstra a interação organizacional entre neurônio, astrócito e oligodendrócito. Como


pode ser observado na figura 9a os astrócitos “ancoram”, estabilizam o neurônio, e na figura 9b
pode-se observar a função de nutrição proporcionada pelos astrócitos, e visualizar que os astrócitos
“abraçam” o capilar sanguíneo ao mesmo tempo em que ancoram o neurônio. Proporcionam
a nutrição para o neurônio por meio dessa comunicação, enquanto que os oligodendrócitos são
responsáveis pela formação da bainha de mielina no SNC.

Figura 9. Neurônio, astrócito e oligodendrócito. Observe na figura b como o astrócito “abraça” o axônio de um
neurônio para proporcionar sua nutrição.

24
CAPÍTULO 8
Outras células não neuronais

Ao eliminarmos cada neurônio, cada astrócito e todos os oligodendrócitos, ainda restariam outras
células no encéfalo. Para não excluir nenhum tipo, precisamos mencionar essas outras células. Uma
classe de células chamada de microglia age como “macrófagos” na remoção de fragmentos celulares
gerados pela morte ou degeneração de neurônios e células gliais. Finalmente, também temos as
células que estruturam a vascularização do encéfalo, definindo artérias, veias e capilares.

Essas diferentes células presentes na neuroglia são demonstradas na figura 10.

Figura 10. Células da neuroglia.

A simplicidade deste ponto de vista em relação às células da neuroglia provavelmente


é um bom indício da profundidade de nossa ignorância acerca da função glial.

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25
TRANSMISSÃO DE UNIDADE II
SINAIS

CAPÍTULO 1
O impulso nervoso e o potencial de
repouso de membrana

Um impulso nervoso – uma carga elétrica – é o sinal que passa de um neurônio ao seguinte e
que, finalmente, termina num órgão terminal, como um grupo de fibras musculares, ou retorna ao
Sistema Nervoso Central (SNC). Simplificando, você pode imaginar o impulso nervoso percorrendo
fios elétricos em sua casa. Vejamos como esse impulso elétrico é gerado e como ele percorre um
neurônio até chegar a seu destino final.

Potencial de repouso de membrana


A membrana celular de um neurônio em repouso possui um potencial elétrico negativo de
aproximadamente -70 milivolts (mV). Isso significa que se você inserir uma sonda medidora de
voltagem no interior da célula, as cargas elétricas lá existentes e as cargas encontradas no exterior
da célula apresentarão uma diferença de 70 mV e o interior da célula seria negativo em relação
ao exterior. Essa diferença de potencial é conhecida como Potencial de Repouso de Membrana ou
PRM. Ele é causado por uma separação das cargas através da membrana. Quando há diferença de
cargas através da membrana, considera-se que a membrana se encontra polarizada.

Em repouso, quando o neurônio não esta recebendo, transmitindo e nem integrando informações
no seu interior e entre células, ele possui uma alta concentração de íons potássio (K+) no seu
interior e uma alta concentração de íons sódio (Na+) no seu exterior. O desequilíbrio na quantidade
de íons no interior e no exterior da célula produz o PRM. Esse desequilíbrio é mantido de duas
maneiras. Primeiramente, a membrana celular é muito mais permeável ao K+ do que ao Na+, de
modo que o K+ pode se mover mais facilmente através da membrana celular. Como os íons tendem
a se mover para estabelecer um equilíbrio, parte dos íons K+ movem-se para uma área onde a
sua concentração é menor: fora da célula. Já o Na+ não consegue mover-se dessa maneira, só que
no sentido oposto, do meio extracelular onde é mais concentrado para o meio intracelular onde é
menos concentrado. Essa diferença na permeabilidade da membrana para os íons Na+ e K+, faz
com que o meio intracelular perca cargas positivas deixando o meio intracelular negativo em relação
ao meio extracelular. Em segundo lugar, a bomba de sódio-potássio do neurônio, que na realidade

26
TRANSMISSÃO DE SINAIS │ UNIDADE II

é uma enzima denominada Na+-K+ ATPase, mantém o desequilíbrio em cada lado da membrana
transportando ativamente íons potássio e sódio. A bomba de sódio-potássio move três íons Na+
para fora da célula para cada dois íons K+ que ela move para o seu interior. O resultado final é que
mais íons carregados positivamente encontram-se fora da célula do que no seu interior, criando
uma diferença de potencial através da membrana. A manutenção de um PRM constante de -70 mV
é principalmente uma função da bomba de sódio-potássio.

Outro fator que contribui para o PRM ser negativo é a maior concentração de proteínas no meio
intracelular, uma vez que, as proteínas são moléculas carregadas com carga negativa (moléculas
aniônicas) isto auxilia a deixar o meio intracelular negativo em relação ao meio extracelular.

O registro do PRM e os três fatores determinantes do PRM podem ser visualizados na figuara 11.

Figura 11. Origem do PRM. LIC = líquido intracelular (meio intracelular); LEC = Líquido extracelular (meio
extracelular).

27
CAPÍTULO 2
Despolarização e hiperpolarização

Se o interior da célula se tornar menos negativo em relação ao exterior, a diferença de potencial


através da membrana diminui. Ou seja, em qualquer situação onde o PRM for se tornando menos
negativo, por exemplo, -65 mV, -60 mV, -55 mV etc. a membrana estará menos polarizada.
Quando isso ocorre, diz-se que a membrana está despolarizando. A membrana estará totalmente
despolarizada quando não existir diferença de carga através da membrana, em outras palavras,
quando o PRM for igual a zero mv. Assim, a despolarização ocorre em qualquer momento em que a
diferença de carga torna-se inferior ao PRM de -70 mV, aproximando-se de zero. Tipicamente, isso
resulta numa alteração da permeabilidade da membrana ao Na+, fazendo com que ocorra influxo
de Na+ (movimentação de Na+ do meio extracelular para o meio intracelular) através de canais
dependentes de voltagem.

O oposto também pode ocorrer, se a diferença de carga através da membrana aumentar, ou seja, em
qualquer situação onde o PRM for se tornando mais negativo, por exemplo, -75 mV, -80 m V, -85
mV etc. a membrana tornar-se-á então mais polarizada. Isso é conhecido como hiperpolarização.
A principal causa de hiperpolarização é o influxo de íons cloro (Cl-), que são íons aniônicos e estão
mais concentrados no meio extracelular.

Na realidade, as alterações do potencial de membrana são utilizadas para receber, transmitir e


integrar informações no interior e entre as células. Esses sinais são de dois tipos: potenciais graduados
e potenciais de ação. Ambos são correntes elétricas criadas pelo movimento dos íons. Analisaremos
cada um deles a seguir.

Os canais iônicos dependentes de voltagem são uma classe de canais iônicos


transmembranares que são ativados por alterações de diferença de potencial
elétrico perto do canal; a presença desses tipos de canais iônicos é especialmente
crítica nos neurônios, mas são comuns em muitos tipos de células.

Exercem um papel crucial em tecidos neuronais e musculares excitáveis, permitindo


uma rápida e coordenada despolarização em resposta as alterações de voltagem. Ao
longo de todo o axônio e na sinapse, os canais dependentes de voltagem propagam
direcionalmente os sinais elétricos.

Estrutura: são geralmente compostos por diversas subunidades, dispostas de tal


maneira que se forma um poro central, por meio do qual os íons poderão se deslocar
em função do seu gradiente eletroquímico. Os canais tendem a ser específicos para
um determinado íon.

Exemplos incluem:

» Os canais de sódio e os canais de potássio dependentes de voltagem,


localizados nos nervos e músculos.

28
TRANSMISSÃO DE SINAIS │ UNIDADE II

» O canal de cálcio dependente de voltagem, que desempenha um papel


na liberação de neurotransmissores na fenda sináptica.

Mecanismo: Através de estudos estruturais de cristalografia de raios-X, por exemplo,


de um canal de sódio voltagem dependente e, assumindo que essa estrutura
permanece intacta na membrana plasmática correspondente, é possível supor
que quando uma diferença de potencial é introduzida na membrana, o campo
eletromagnético associado induz uma alteração conformacional no canal de sódio.
Essa mudança de conformação distorce a forma do canal proteico de maneira
suficientemente forte, permitindo que o canal se abra para admitir o influxo de íons
através da membrana. Essa movimentação iônica gera depois uma corrente elétrica
suficiente para despolarizar a membrana.

Fonte: Wikipédia, a enciclopédia livre. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/


Canal_i%C3%B3nico_dependente_de_voltagem>. Acessado em: 7 de junho de 2011.

29
CAPÍTULO 3
Potenciais graduados e potenciais de ação

Os potenciais graduados são alterações localizadas do potencial de membrana. Essas alterações


podem ser tanto despolarizações quanto hiperpolarizações. A membrana contém canais iônicos
com comportas (figura 12) que atuam como vias de entrada e saída do neurônio. Essas comportas
geralmente encontram-se fechadas, impedindo o fluxo iônico, mas se abrem com a estimulação,
permitindo que os íons se movam do exterior para o interior da célula ou vice-versa. Esse fluxo
iônico altera a separação de cargas, modificando a polarização da membrana.

Os potenciais graduados são disparados por uma alteração do ambiente local do neurônio. Dependendo
da localização e do tipo de neurônio envolvido, as comportas iônicas podem abrir em resposta à
transmissão de um impulso oriundo de um outro neurônio ou em resposta a estímulos sensoriais,
como alterações de concentrações de substâncias químicas, da temperatura ou da pressão.

Lembre-se de que a maioria dos receptores neuronais estão localizados nos dendritos (embora existam
alguns no corpo celular) e que o impulso é sempre transmitido dos terminais axônicos localizados na
extremidade oposta da célula. Para que um neurônio transmita um impulso, este deve percorrer quase
toda a sua extensão. Embora um potencial graduado possa produzir despolarização de toda a membrana
celular, geralmente ele é apenas um fenômeno local e a despolarização não se dissemina muito ao longo
do neurônio. Para percorrer a distância total, um impulso deve gerar um potencial de ação.

Figura 12. Características dos canais de sódio (A) e potássio (B) regulados pela voltagem. Observe que o canal de
sódio contem duas comportas, uma de ativação voltada para o liquido extracelular (LEC) e outra de inativação
voltada para o liquido intracelular (LIC), enquanto que o canal de potássio contem apenas uma comporta, a de
ativação que está voltada para o LIC. Será a alteração conformacional (mudança do seu estado de origem)
dessas comportas as responsáveis pela gênese (formação) do potencial de ação. A figura A demonstra o canal
de sódio em três diferentes estados: repouso, ativado e inativado e a figura B demonstra o canal de potássio em
dois diferentes estados: repouso e ativado.

30
TRANSMISSÃO DE SINAIS │ UNIDADE II

Os sinais nervosos são transmitidos por potenciais de ação. Para conduzir um sinal nervoso, o
potencial de ação se desloca ao longo da fibra nervosa até sua extremidade. Um potencial de ação
é uma despolarização rápida e substancial da membrana do neurônio. Em geral, ele dura apenas
aproximadamente 1 milissegundo (ms). Tipicamente, o potencial de membrana altera de um PRM
de -70 mV para um valor de +30 mV e, em seguida, retorna rapidamente ao seu valor de repouso.

Como ocorre essa alteração acentuada do potencial de membrana?

Todos os potenciais de ação começam como potenciais graduados. Quando ocorre uma estimulação
suficiente para causar uma despolarização de pelo menos 15 a 20 mV, há a produção de um potencial
de ação. Em outras palavras, se a membrana despolarizar de um PRM de -70 mV para um valor de
-50 a -55 mV, a célula apresentará um potencial de ação, e essa despolarização da membrana ocorre
tipicamente por meio de um influxo (entrada) de íons sódio o qual faz com que entre carga positiva
no LIC. A despolarização mínima necessária para a produção de um potencial de ação é denominada
limiar. Qualquer despolarização inferior ao valor limiar de 15 a 20 mV não produzirá um potencial de
ação. Por exemplo, se o potencial de membrana alterar do PRM de -70 mV para -60 mV, a alteração
será de apenas 10 mV e não atingirá o limiar. Consequentemente, não haverá a produção de um
potencial de ação. No entanto, sempre que a despolarização atingir ou ultrapassar o limiar ocorrerá a
produção de um potencial de ação, a isso, é dado o nome de princípio do tudo ou nada.

Ativação do canal de sódio. Quando o potencial de membrana se torna menos


negativo que durante o estado de repouso indo em direção a zero mV, ele atinge
a voltagem – em geral, de cerca de -55 a -55 mV – o que provoca alteração
conformacional abrupta da comporta de ativação do canal de sódio, fazendo com
que o canal fique totalmente aberto. Essa condição é referida como estado ativado;
durante esse estado, os íons sódio podem se derramar pelo canal, aumentando a
permeabilidade da membrana ao sódio por 500 a 5000 vezes.

Inativação do canal de sódio. A mesma diminuição da negatividade do PRM que


faz com que as comportas de ativação do canal de sódio se abram permitindo o
influxo de íons sódio faz também com que as comportas de inativação do canal
de sódio se fecham bloqueando a entrada adicional de íons sódio. No entanto, a
alteração conformacional que provoca o fechamento da comporta de inativação é
um processo mais lento que a alteração conformacional que abre a comporta de
ativação. Assim, após o canal de sódio ter permanecido aberto por alguns décimos
de milésimos de segundo, o canal é inativado e se fecha, e os íons sódio não podem
atravessar a membrana, a partir desse momento o potencial de membrana começa
a retornar ao seu estado normal de repouso, que é o processo de repolarização.

Outra característica importante do processo de inativação do canal de sódio é que a


comporta de inativação só vai reabrir – voltar para seu estado de origem em repouso,
como observado na figura 12 na condição de repouso – quando o potencial de
membrana retornar ou se aproximar do potencial de repouso na condição original.

31
UNIDADE II │ TRANSMISSãO DE SINAIS

O canal de potássio regulado pela voltagem e sua ativação. A figura 12 mostra o


canal de potássio em dois estados: durante o repouso (à esquerda), e durante o
final de um potencial de ação (à direita). Durante o estado de repouso, a comporta
do canal de potássio está fechada, e os íons potássio são impedidos de passarem,
através desse canal, para o exterior. Quando o potencial de membrana se torna
menos negativo, essa variação da voltagem provoca a abertura conformacional
da comporta, permitindo aumento da difusão de potássio para o LEC, por meio
desses canais. Entretanto, devido a um pequeno retardo na abertura dos canais de
potássio (alteração conformacional mais lenta da comporta de ativação do canal de
potássio), em sua maioria só abrindo exatamente no mesmo momento em que os
canais de sódio estão começando a se fechar em função de sua inativação (comporta
de inativação do canal de sódio), a redução da entrada de sódio na célula ocorre
simultaneamente com a saída de potássio da célula, fazendo com que o processo
de repolarização seja acelerado, levando à completa recuperação do potencial de
repouso da membrana dentro de poucos décimos de milésimos de segundo.

Resumindo em outras palavras, a alteração conformacional (abertura, ativação)


da comporta de ativação do canal de sódio é um processo rápido, a alteração
conformacional (fechamento, inativação) da comporta de inativação do canal
de sódio é um processo intermediário e, a alteração conformacional (abertura,
ativação) da comporta de ativação do canal de potássio é um processo lento. Se
fossemos colocar isso em uma ordem cronológica, ficaria assim: primeiro abre (ativa)
o canal de sódio, depois fecha (inativa) o canal de sódio e por último abre (ativa) o
canal de potássio. Sendo todas essas alterações conformacionais estimuladas pelo
mesmo estímulo; a despolarização da membrana.

Retorne na figura 12 e monte um texto com suas palavras relacionando as alterações


conformacionais das comportas (ativação e inativação) do canal de sódio e da
comporta de ativação do canal de potássio com a gênese (produção) do potencial
de ação.

Ao impulso nervoso e ao potencial de repouso de membrana, é apresentada


à seguinte colocação: Em repouso, quando o neurônio não está recebendo,
transmitindo e nem integrando informações no seu interior e entre células, ele possui
uma alta concentração de íons potássio (K+) no seu interior e uma alta concentração
de íons sódio (Na+) no seu exterior. Após ter analisado e refletido sobre a figura
12 e, estudado os parágrafos subsequentes até este momento, como se encontra
distribuído os íons sódio e potássio através da membrana após um estímulo que
tenha causado a despolarização da membrana?

32
CAPÍTULO 4
Sequência de eventos de um potencial
de ação

Em cada potencial de ação, ocorre a seguinte sequência de eventos apresentada nas figuras 13a
a 13e:

1. Aumento da permeabilidade ao Na+ e despolarização. O estímulo abre as comportas


de ativação dos canais de Na+ dependentes de voltagem localizados na membrana,
permitindo influxo (entrada) de Na+ (figura 13b) e, quando o limiar é atingido
(principio do tudo ou nada), a permeabilidade da membrana ao Na+ aumenta
centenas a milhares de vezes. Os íons Na+ entram na célula. Durante essa fase
inicial, a quantidade de Na+ que entra na célula excede a quantidade de potássio
que sai, fazendo com que o interior da célula se torne carregado positivamente em
relação ao exterior. A alteração de voltagem (despolarização) comumente é de -70
mV para +30 mV, como mostram as figuras 13b e 13c.

2. Redução da permeabilidade ao Na+. O influxo inicial de Na+ é muito breve. Quando


o potencial de membrana passa a ser 0 mV, ocorre uma resistência ao movimento
de mais cargas positivas para o interior da célula, pois o interior da célula torna-se
positivo e positivo com positivo se repelem. Além disso, as comportas que controlam
a entrada de Na+ fecham muito rapidamente, de modo que o influxo inicial de Na+
é de curta duração, como mostra a figura 13d.

3. Repolarização. Em resposta ao aumento de carga positiva no interior da célula, as


comportas de ativação que controlam o íon K+ se abrem. Como os íons K+ são
carregados positivamente, eles se movem em direção a uma área mais negativa,
nesse momento localizado no meio extracelular da célula. Quando esse ocorre, o
exterior da célula passa a apresentar novamente uma carga mais positiva do que
o interior e a voltagem retorna ao PRM -70 mV. Essa fase final é a repolarização,
mostrada na figura 13d.

4. Bomba de sódio-potássio. Após o término da repolarização, deve ocorrer um evento


final antes que o neurônio retorne verdadeiramente ao seu estado de repouso
normal. Durante um potencial de ação, o Na+ entra na célula. Em seguida, para
reverter a despolarização, o K+ deixa a célula. A concentração intracelular de Na+
é, então, elevada, assim como a concentração extracelular de K+, o oposto do estado
de repouso. Para reverter isso, quando a repolarização estiver completa, a bomba
de sódio-potássio é ativada para fazer com retornem os íons ao lado correto da
membrana (figura 13e)

33
UNIDADE II │ TRANSMISSãO DE SINAIS

Figura 13. Sequência de eventos que ocorrem durante um potencial de ação: a – estado de repouso, b
– aumento da permeabilidade ao sódio e despolarização, c – propagação de um potencial de ação, d –
repolarização e, e – ação da bomba de sódio e potássio.

A figura 14 apresenta um resumo dos eventos de um potencial de ação. Observe que na figura 14
b esta demonstrada às alterações da permeabilidade da membrana aos diferentes íons causadores
do potencial de ação. Note que a permeabilidade ao íon sódio aumenta de maneira muito rápida,
enquanto que a permeabilidade ao íon potássio aumenta de maneira mais discreta, alcançando o
máximo durante a fase de repolarização do potencial de ação. No entanto, ambas as alterações da
permeabilidade são causadas pela aplicação de um estímulo despolarizante.

34
TRANSMISSÃO DE SINAIS │ UNIDADE II

Figura 14. A) Resumo da sequência de eventos de um potencial de ação. B) Alterações na permeabilidade


da membrana aos íons sódio (Na+) e potássio (K+) durante um potencial de ação. 1) Potencial de repouso
de membrana (PRM). 2) Aplicação de um estímulo despolarizante. 3) A membrana despolariza até o limiar,
abertura dos canais de Na+ voltagem dependente e abertura lenta dos canais de K+. 4) Influxo rápido de
Na+ despolariza a célula, e efluxo lento de K+. 5) Fechamento dos canais de Na+ voltagem dependente. 6)
K+ move-se da célula para o liquido extracelular. 7) Canais de K+ permanecem abertos por tempo adicional
causando um excesso de efluxo de K+ o que leva a uma hiperpolarização da célula (hiperpolarização
pós-potencial). 8) Fechamento dos canais K+ voltagem dependente. 9) A célula retorna para sua
permeabilidade normal aos diferentes íons e ao PRM.

Quando o potencial de ação percorre um axônio, da proeminência (ou cone de


implantação) aos terminais axônicos, cada segmento do axônio é submetido à
sequência de eventos descrito e apresentado nas figuras 13a a 13e. Quando um
determinado segmento de um axônio está gerando um potencial de ação e as
comportas que controlam o sódio estão abertas, ele é incapaz de responder a um
outro estímulo. Isso é denominado período refratário absoluto. Quando as comportas
de sódio estão fechadas, as de potássio estão abertas e ocorre a repolarização, o
segmento do axônio pode então responder a um novo estímulo. No entanto, esse
deve ser de uma magnitude substancialmente maior para desencadear um potencial
de ação. Isso é denominado período refratário relativo.

35
CAPÍTULO 5
Propagação do potencial de ação

Agora que sabemos como um impulso neural (sob a forma de um potencial de ação) é gerado,
podemos analisar como o impulso é propagado e como ele percorre o neurônio. Duas características
do neurônio tornam-se particularmente importantes ao considerarmos quão rapidamente um
impulso pode passar pelo axônio: a mielinização e o diâmetro.

A bainha de mielina
Os axônios da maioria dos neurônios motores (motoneurônios) são mielinizados, significando que são
recobertos por uma bainha composta por mielina, uma substância gordurosa que isola a membrana
celular. Como vimos, no sistema nervoso periférico, essa bainha de mielina é formada pelas células de
Schwann, enquanto que no sistema nervoso central é formada pelos oligodendrócitos, um tipo celular
da neuroglia.

Como pode ser observada na figura 14, a bainha de mielina não é contínua. Ao longo do axônio, a
bainha de mielina apresenta espaços entre as células de Schwann adjacentes, deixando o axônio
não isolado nesses pontos. Esses espaços são denominados nódulos de Ranvier (ver figura 14).
São nesses nódulos que são propagados os potenciais de ação. É como se o potencial de ação
saltasse de um nódulo ao nódulo seguinte quando ele percorresse uma fibra mielinizada. Esse
fenômeno é denominado condução saltatória, um tipo de condução muito mais rápido do que o
das fibras não mielinizadas.

A velocidade da transmissão do impulso nervoso nas fibras mielinizadas grandes pode ser elevada,
de até 100 m/s, ou 5 a 50 vezes mais rápida do que a das fibras não mielinizadas do mesmo
tamanho.

Figura 15. Bainha de mielina e nódulo de Ranvier. Observe que a figura também demonstra a direção da
propagação do impulso nervoso.

36
TRANSMISSÃO DE SINAIS │ UNIDADE II

A mielinização dos neurônios motores ocorre nos primeiros anos de vida,


explicando parcialmente a razão pela qual as crianças necessitam de tempo para
desenvolver movimentos coordenados. Indivíduos afetados por determinados
doenças neurológicas, como a Esclerose Múltipla (EM) apresentam degeneração
da bainha de mielina e uma subsequente perda de coordenação.

A EM ou Esclerose Disseminada é uma doença neurológica crônica, de causa ainda


desconhecida, com maior incidência em mulheres e pessoas brancas (pessoas com
genótipo caucasiano). Esse tipo de patologia leva a uma destruição das bainhas de
mielina que recobrem e isolam as fibras nervosas.

Essa doença causa uma piora do estado geral do paciente, ocasionando: fraqueza
muscular, rigidez articular, dores articulares e descoordenação motora. O doente
sente dificuldade para realizar vários movimentos com os braços e pernas,
perde o equilíbrio quando fica em pé, sente dificuldade para andar, tremores e
formigamentos em partes do corpo. Em alguns casos a doença pode provocar
insuficiência respiratória, incontinência ou retenção urinária, alterações visuais
graves, perda de audição, depressão e impotência sexual.

Nos estágios mais graves da doença, pode ocorrer um comprometimento respiratório.


Isso pode acarretar episódios de infecção ou insuficiência respiratória, que devem ser
tratados com atenção e rapidez para minimizar o desconforto do paciente e coibir
uma piora do seu estado geral.

Para minimizar os desconfortos respiratórios causados por essa patologia, são


utilizados métodos tais como:

» Exercícios para desobstruir os brônquios.

» Exercícios para reexpansão pulmonar.

» Reeducação diafragmática e da musculatura acessória, com uso de


incentivadores respiratórios.

Etiologia: A causa direta da EM é a degeneração da camada isoladora lipídica


de mielina que envolve os axônios neurais. Essa é provavelmente causada pela
destruição, pelo próprio sistema imunitário do indivíduo, das células gliais
(responsáveis pela produção e armazenamento da mielina). A ausência de
isolamento eficaz dos neurônios, e da sua sustentação pelas células gliais, leva à
sua degeneração e à perda de função.

As regiões afetadas são as do SNC, ou seja: a medula espinhal e o cérebro. Os


nervos periféricos não são afetados, provavelmente porque a reação imunitária que
danifica as células gliais é específica para as células produtoras de mielina do SNC,

37
UNIDADE II │ TRANSMISSãO DE SINAIS

os oligodendrócitos, que são diferentes das células com a mesma função no SNP,
conhecidas como células de Schwann.

Fonte: Wikipédia, a enciclopédia livre. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/


Esclerose_m%C3%BAltipla>. Acessado em: 7 de junho de 2011.

Diâmetro do neurônio
A velocidade da transmissão do impulso nervoso também é determinada pelo tamanho do neurônio.
Os neurônios de diâmetro maior conduzem impulsos nervosos mais rapidamente do que aqueles de
diâmetro menor, por apresentarem menor resistência ao fluxo de corrente local.

38
CAPÍTULO 6
A junção neuromuscular

Enquanto os neurônios se comunicam com outros neurônios na sinapse, um motoneurônio


(neurônio motor) comunica-se com uma fibra muscular numa região denominada junção
neuromuscular. A função da junção neuromuscular é essencialmente a mesma que a da sinapse.
De fato, a parte proximal da junção neuromuscular é a mesma: ela começa nos terminais axônicos
do motoneurônio, os quais liberam neurotransmissores no espaço existente entre duas células.
Entretanto, na junção neuromuscular, os terminais axônicos expandem-se em discos achatados
denominados placas motoras.

Na junção neuromuscular, o impulso é recebido por uma fibra muscular (ver figura 16).
Observa-se que nos locais onde os terminais axônicos se aproximam da fibra muscular, a fibra
apresenta invaginações (pregas formando cavidades). Esse arranjo aumenta a área superficial
para a interação do neurotransmissor liberado pelo terminal axonal com os receptores
localizados no sarcolema (membrana plasmática) da fibra muscular. A cavidade assim formada
é denominada goteira sináptica, e como nas sinapses, o espaço entre o neurônio e afibra
muscular é denominado fenda sináptica.

Figura 16. Junção neuromuscular, demonstrando a interação entre o motoneurônio e o sarcolema de uma fibra
muscular. Observe as invaginações do sarcolema dando origem à goteira sináptica.

O neurotransmissor liberado dos terminais axônicos motores difundem-se através da fenda sináptica
e se ligam aos receptores localizados no sarcolema da fibra muscular. Essa ligação normalmente
produz despolarização por meio da abertura dos canais iônicos de sódio, permitindo que mais íons

39
UNIDADE II │ TRANSMISSãO DE SINAIS

sódio penetrem na fibra muscular. Como vimos no capítulo 3, desta unidades, se a despolarização
atingir o limiar, um potencial de ação é disparado. O potencial de ação se dissemina ao longo do
sarcolema, e como resultado final, a fibra muscular se contrai.

Como o neurônio, o sarcolema uma vez despolarizado deve sofrer uma repolarização. Durante o
período de repolarização, as comportas que controlam o sódio estão fechadas e as que controlam o
potássio estão abertas, assim, como o neurônio, a fibra muscular é incapaz de responder a qualquer
outra estimulação. Isso é denominado período refratário (já estudado). Quando as condições elétricas
da fibra muscular retornam aos níveis de repouso, a fibra pode responder a um outro estímulo.

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CAPÍTULO 7
Neurotransmissores

Mais de 50 neurotransmissores foram identificados positivamente ou são suspeitos como


possíveis candidatos. Eles podem ser categorizados como (1) neurotransmissores de ação rápida
(moléculas pequenas) ou (2) neurotransmissores de ação lenta (neuropeptídeos) (Tabela 1).
Os neurotransmissores de ação rápida (moléculas pequenas), responsáveis pela maioria das
transmissões neurais, são o nosso maior interesse.

Tabela 1. Classificação dos neurotransmissores

Neurotransmissores de ação rápida (moléculas pequenas)


Classe I: Acetilcolina
Classe II: Aminas: noradrenalina, adrenalina, dopamina, serotonina e histamina
Classe III: Aminoácidos: GABA, glicina, glutamato e aspartato
Classe IV: Óxido nítrico

Neurotransmissores de ação lenta (neuropeptídeos)


Hormônios de liberação hipotalâmicos
(por exemplo, hormônio liberador de tireotropina e somatostatina)
Peptídeos hipofisários
(por exemplo, ß-endorfinas, tireotropina e vasopressina)
Peptídeos que atuam sobre o intestino e sobre o encéfalo
(por exemplo, colecistoquinina, neurotensina e leucina encefalina)
Peptídeos de outros tecidos
(por exemplo, angiotensina II, bradicinina e calcitonina)

A acetilcolina e a noradrenalina são os dois principais neurotransmissores envolvidos na regulação


de nossas respostas fisiológicas ao exercício. A acetilcolina é o principal neurotransmissor dos
neurônios motores que inervam o músculo esquelético e de muitos neurônios parassimpáticos.
Geralmente, ela é um neurotransmissor excitatório, mas ela pode apresentar efeitos inibidores
em algumas terminações nervosas parassimpáticas, como no coração, promovendo diminuição da
frequência cardíaca (bradicardia).

A noradrenalina é o neurotransmissor de alguns neurônios simpáticos e ela também pode ser


tanto excitatória quanto inibitória, dependendo dos receptores envolvidos. Os sistemas nervosos
simpático e parassimpático serão discutidos posteriormente.

Quando o neurotransmissor se liga ao receptor pós-sináptico, o impulso nervoso é transmitido com


sucesso. O neurotransmissor é destruído por enzimas ou é transportado ativamente de volta para o
interior dos terminais pré-sinápticos para ser reutilizado no impulso seguinte.

A figura 17 demonstra a liberação de acetilcolina na fenda sináptica e sua posterior degradação


pela enzima acetilcolinesterase em seus constituintes, colina e ácido acético, com a colina sendo

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UNIDADE II │ TRANSMISSãO DE SINAIS

transportada ativamente de volta para o interior do terminal pré-sináptico para ser reutilizada na
síntese da acetilcolina por intermédio da enzima colina acetiltransferase. Observe que a colina é
recaptada para o interior do terminal pré-sináptico por meio de um transportador específico de
colina (transporte ativo secundário – co-transporte com sódio), e que a acetilcolina é transportada
para o interior da vesícula por meio de um transportador específico para acetilcolina.

Figura 17. Liberação e degradação da acetilcolina na fenda sináptica, e recaptação da colina pelo terminal
pré-sináptico. ACo = Acetilcolina, ACoE = Acetilcolinesterase, CoAT = Colina Acetiltransferase.

A degradação da acetilcolina acontece muito rapidamente, pois a acetilcolinesterase possui uma das
taxas catalíticas mais rápidas dentre as enzimas conhecidas. A acetilcolinesterase é alvo de muitos
gases neurotóxicos e inseticidas.

Não existe uma enzima degradadora extracelular rápida análoga à acetilcolinesterase para os
neurotransmissores: dopamina, noradrenalina e adrenalina, que coletivamente são chamados de
catecolaminas. Ao contrario, a ação das catecolaminas na fenda sináptica é terminada pela captação
seletiva dos neurotransmissores de volta para o terminal axonal por transportadores dependentes de
sódio. Esse passo é sensível a diferentes drogas. Por exemplo, as anfetaminas e a cocaína bloqueiam
a captação de catecolaminas, com isso prolongam a ação desses neurotransmissores na fenda
sináptica. Uma vez dentro do terminal axonal, as catecolaminas podem ser transportadas novamente
para as vesículas sinápticas para serem reutilizadas ou ser enzimaticamente degradadas pela ação
da monoaminoxidase (MAO), uma enzima encontrada na membrana externa da mitocôndria.

Mecanismo de ação da cocaína: A adrenalina assim como outras catecolaminas é


metabolizada (degradada) por duas vias enzimáticas: Catecol Orto Metil Transferase
(COMT) e pela monoaminoxidase (MAO). A cocaína é um inibidor, tanto da enzima
COMT quanto da MAO, do transportador para recaptação das catecolaminas

42
TRANSMISSÃO DE SINAIS │ UNIDADE II

e, estimulante da liberação de noradrenalina e dopamina. A dopamina e a


noradrenalina são neurotransmissores cerebrais que são liberados para a fenda
sináptica, de onde são recaptados para o interior dos neurônios pré-sinápticos por
transportadores específicos que podem ser inibidos pelo uso da cocaína. Ademais,
a cocaína pode inibir as enzimas COMT e MAO responsáveis pela degradação
das catecolaminas. Logo, o uso da cocaína aumenta a concentração e duração
desses neurotransmissores na fenda sináptica. Esses efeitos são similares aos das
anfetaminas, mas, mais intensos e prolongados. O resultado é uma maior ativação
do sistema nervoso simpático, o que deixa a pessoa mais ativa.

Resposta pós-sináptica
Analisamos a geração de um potencial de ação, a condução do impulso ao longo do neurônio e a sua
transmissão à célula seguinte. Continuaremos descrevendo o que ocorre após o neurotransmissor
se ligar aos receptores pós-sinápticos.

Quando o neurotransmissor se liga aos receptores, o sinal químico que atravessou a fenda sináptica
torna-se novamente um sinal elétrico. A ligação produz um potencial graduado na membrana pós-
sináptica. Um impulso aferente pode ser tanto excitatório quanto inibitório. Um impulso excitatório
produz uma hipopolarização, ou despolaização, conhecida como Potencial Excitatório Pós-Sináptico
(PEPS) (figura 18). Um impulso inibitório produz uma hiperpolarização, conhecida como Potencial
Inibitório Pós-Sináptico (PIPS) (figura 19).

Figura 18. Potencial Excitatório Pós-Sináptico (PEPS). Observe na figura que durante a sinapse excitatória ocorre a
abertura de canais de sódio (Na+) na membrana do neurônio pós-sináptico, fazendo com que ocorra influxo de
íons Na+ despolarizando o neurônio pós-sináptico.

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UNIDADE II │ TRANSMISSãO DE SINAIS

Figura 19. Potencial Inibitório Pós-Sináptico (PIPS). Observe na figura que durante a sinapse inibitória ocorre a
abertura de canais de cloro (Cl-) na membrana do neurônio pós-sináptico, fazendo com que ocorra influxo de
íons Cl- hiperpolarizando o neurônio pós-sináptico.

A descarga de um único terminal pré-sináptico geralmente altera o potencial pós-sináptico menos


do que 1 mV. Obviamente, isso não é suficiente para gerar um potencial de ação, pois é necessário
que ocorra uma alteração de, no mínimo, 15 a 20 mV para que o limiar seja atingido. No entanto,
quando um neurônio transmite um impulso, vários terminais pré-sinápticos geralmente liberam
seus neurotransmissores, de modo que eles podem se difundir até os receptores pós-sinápticos.
Além disso, terminais pré-sinápticos de vários axônios podem convergir nos dendritos e corpo
celular de um único neurônio. Quando múltiplos terminais pré-sinápticos descarregam ao mesmo
tempo ou quando somente alguns disparam numa frequência rápida, mais neurotransmissores são
liberados. No caso de um neurotransmissor excitatório, quanto maior for a quantidade que se liga
aos receptores, maior será o PEPS.

O disparo de um potencial de ação no neurônio pós-sináptico depende de efeitos combinados de


todos os impulsos aferentes oriundos desses vários terminais pré-sinápticos. Alguns impulsos
são necessários para produzir uma despolarização suficiente para gerar um potencial de ação.
Especificamente, a soma de todas as alterações do potencial de membrana deve ser igual ou superior
ao limiar. Essa soma dos efeitos de impulsos individuais é denominado somação. Somente quando
a soma de todos os potenciais graduados atinge ou ultrapassa o limiar é que ocorre a produção de
um potencial de ação.

Na figura 20 podemos observar os dois tipos de somação; a somação temporal, quando estímulos
sub-limiares são aplicados sucessivamente (menos de 1 milissegundo), variações nos potenciais
locais podem somar-se e atingir o limiar, levando à despolarização, e a somação espacial, quando
estímulos sub-limiares são aplicados em áreas próximas e simultaneamente, podem somar-se e
levar a despolarização.

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TRANSMISSÃO DE SINAIS │ UNIDADE II

Figura 20. (a) Um potencial de ação pré-sináptico desencadeia um pequeno PEPS no neurônio pós-sináptico. (b)
Somação espacial de PEPSs: quando dois ou mais sinais de entrada pré-sinápticos são simultâneos, seus PEPSs
individuais se somam. (c) Somação temporal de PEPSs: quando a mesma fibra pré-sináptica dispara potenciais
de ação em uma rápida sucessão seus PEPSs se somam.

O processo de somação é muito importante e tem uma grande relevância para a função muscular.
O músculo humano é capaz de gerar uma força considerável, muito maior do que normalmente
se observa mesmo nos levantadores de peso ou nos fisiculturistas altamente treinados. Sob
circunstâncias extremas e potencialmente letais, como um acidente automobilístico ou aéreo,
os indivíduos têm sido capazes de exercer níveis sobre-humanos de força, quebrando ossos e
lacerando músculos das inserções dos ossos durante o processo. Em condições normais, os PIPSs
atuam protegendo o complexo músculo-tendão-osso. Uma redução dos PIPSs pode ser um fator
importante que explica os ganhos rápidos de força que são apresentados após um período curto de
treinamento de força.

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NEUROFISIOLOGIA
DO CONTROLE UNIDADE III
MOTOR

CAPÍTULO 1
O sistema nervoso central

Para compreender como mesmo o estímulo mais básico pode produzir uma atividade muscular,
devemos considerar a complexidade do Sistema Nervoso Central (SNC). Vamos agora, voltar
nossa atenção aos vários componentes do sistema nervoso e como eles produzem o movimento.
Esses componentes estão listados na figura 21. Nesta unidade, estudaremos uma visão geral dos
componentes do SNC e analisaremos brevemente as suas funções.

Figura 21. Organização funcional do sistema nervoso (SN). O SN pode ser subdividido em Sistema Nervoso Central
(SNC) e Sistema Nervoso Periférico (SNP).

O encéfalo
O encéfalo é composto por várias partes. Para os nossos estudos, nós consideraremos quatro regiões:

» Cérebro

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NEUROFISIOLOGIA DO CONTROLE MOTOR │ UNIDADE III

» Diencéfalo

» Cerebelo

» Tronco cerebral ou tronco encefálico.

Essas partes do encéfalo estão ilustradas na figura 22.

Figura 22. As quatro principais regiões do encéfalo. Cérebro, diencéfalo, tronco cerebral e cerebelo.

O cérebro
O cérebro é composto pelos hemisférios cerebrais direito e esquerdo. O hemisfério cerebral direito
está conectado ao hemisfério cerebral esquerdo por feixes de fibras (tratos) denominados corpo
caloso, o que permite a intercomunicação entre eles. O córtex cerebral forma a porção externa dos
hemisférios cerebrais e foi considerado o local da mente e do intelecto. Ela também é denominada
substância cinzenta, o que simplesmente reflete a sua cor particular resultante da ausência
de mielina sobre os corpos celulares localizados nessa área. O córtex cerebral é o seu cérebro
consciente. Ele permite que você pense, perceba estímulos sensoriais e controle voluntariamente
os seus movimentos.

O cérebro é constituído por cinco lobos – quatro lobos externos e a ínsula central. Seus quatro lobos
principais, apresentados na figura 23, possuem as seguintes funções:

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UNIDADE III │ NEUROFISIOLOGIA DO CONTROLE MOTOR

» O lobo frontal: intelecto e controle motor geral.

» O lobo temporal: estímulo auditivo e sua interpretação.

» O lobo parietal: estímulo sensorial geral e sua interpretação.

» O lobo occipital: estímulo visual e sua interpretação.

Figura 23. As áreas funcionais do córtex cerebral. Lobos: frontal, parietal, temporal e occipital.

As três áreas do cérebro que são de principal importância em nossa discussão e que discutiremos
posteriormente nesta unidade são:

1. O córtex motor primário, no lobo frontal.

2. Os gânglios basais, localizados na substância branca abaixo do córtex cerebral.

3. O córtex sensorial primário, no lobo parietal.

O diencéfalo
Essa região do encéfalo é composta principalmente pelo tálamo e pelo hipotálamo. No entanto,
o epitálamo e o subtálamo também fazem parte do diencéfalo. O tálamo é um importante centro
de integração sensorial. Todos os estímulos sensoriais exceto o olfato chegam ao tálamo e são
retransmitidos à área apropriada do córtex. O tálamo, em outras palavras, regula quais estímulos
sensoriais atingem seu encéfalo consciente e, por essa razão, ele é muito importante no controle
motor. Ademais, o tálamo realiza um escalonamento das informações sensoriais que devem atingir
seu encéfalo consciente, priorizando e escalonando quais informações sensoriais devem atingir
primeiro seu encéfalo consciente.

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NEUROFISIOLOGIA DO CONTROLE MOTOR │ UNIDADE III

O hipotálamo, localizado logo abaixo do tálamo, é responsável pela manutenção da homeostasia por
meio da regulação de quase todos os processos que afetam o ambiente interno do organismo. Seus
centros neurais regulam:

» o sistema nervoso autônomo (e, por meio dele, a pressão arterial, a frequência e a
contratilidade cardíaca, a respiração, a digestão etc.);

» a temperatura corporal;

» o equilíbrio hídrico;

» o controle neuroendócrino;

» as emoções;

» a sede;

» a ingestão alimentar e

» o ciclo de sono-vigília.

Podemos dizer então, que o tálamo é um centro de integração, direcionamento e escalonamento


sensorial, enquanto que o hipotálamo é o centro de regulação da homeostasia do ambiente interno
do organismo.

O cerebelo
O cerebelo está localizado atrás do tronco cerebral conectado a várias partes do cérebro e possui um
papel fundamental na coordenação do movimento, como veremos posteriormente nesta unidade.

O cerebelo é primariamente um centro para o controle do movimento que possui extensivas conexões
com o cérebro e a medula espinhal. Ao contrário dos hemisférios cerebrais, o lado esquerdo do
cerebelo está relacionado com os movimentos do lado esquerdo do corpo, enquanto o lado direito,
com os movimentos do lado direito do corpo.

Lesões cerebelares podem causar grandes perdas na capacidade de coordenação motora, os


movimentos ficam descoordenados e imprecisos, uma condição conhecida como ataxia.

Apesar de o cerebelo constituir apenas cerca de um décimo do volume total do encéfalo, ele contém
mais de 50% do número total de neurônios do sistema nervoso central, devido à alta densidade
de neurônios no seu córtex. Neurônios também estão “enterrados” nas profundezas da substância
branca do cerebelo, constituindo os núcleos cerebelares profundos, que retransmitem a maioria das
eferências corticais cerebelares a várias estruturas do tronco cerebral.

Quando o cerebelo é lesado, os principais sintomas são estes.

» Descoordenação e imprecisão dos movimentos (ataxia).

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UNIDADE III │ NEUROFISIOLOGIA DO CONTROLE MOTOR

» Perda do equilíbrio.

» Diminuição do tônus da musculatura esquelética.

» Dismetria: dificuldade para “calcular” o movimento. Pode-se testar


pedindo ao paciente para que toque a ponta do nariz com dedo indicador.

» Decomposição: os movimentos são decompostos, realizados em etapas


por cada articulação.

» Disdiadococinesia: dificuldade para realizar movimento rápido e


alternadamente. Pode-se testar pedindo ao paciente que toque com o
polegar os dedos indicador e médio.

» Rechaço: ao se pedir ao paciente que flexione cotovelo contra resistência,


ao retirar a mão, o braço do paciente tende a ir contra o tórax pela demora
da ação da musculatura extensora.

» Tremor: tremor que se acentua ao final do movimento(tremor intencional).

As lesões hemisféricas do cerebelo manifestam-se do mesmo lado afetado. Já a lesão


do vérmis acarreta perda de equilíbrio com alargamento da base de sustentação na
posição bípede e marcha atáxica.

Fonte: Wikipédia, a enciclopédia livre. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Cerebelo>.


Acessado em: 20 de junho de 2011.

O tronco cerebral
O tronco cerebral, composto pelo mesencéfalo, ponte e bulbo (figura 24), é o eixo principal do
encéfalo, conectando o encéfalo à medula espinhal.

Figura 24. Tronco cerebral

Todos os nervos sensoriais e motores passam através do tronco cerebral quando eles retransmitem
informações entre o encéfalo e a medula espinhal. Esse é o local de origem de 10 dos 12 pares de

50
NEUROFISIOLOGIA DO CONTROLE MOTOR │ UNIDADE III

nervos cranianos. O tronco cerebral também contém os principais centros reguladores autônomos
que exercem o controle sobre os sistemas respiratório e cardiovascular.

Um conjunto especial de neurônios que percorre toda a extensão do tronco cerebral, conhecido
como formação reticular, é influenciado por praticamente todas as áreas do SNC e exerce influência
sobre elas. Esses neurônios auxiliam:

» na coordenação da função da musculatura esquelética;

» na manutenção do tônus muscular;

» no controle das funções cardiovasculares e respiratórias e

» na determinação de nosso estado de consciência (tanto a vigília quanto o sono).

O encéfalo possui um sistema de controle da dor, denominado sistema de analgesia. As encefalinas


e a β-endorfina são substâncias opióides importantes que atuam sobre os receptores opióides no
sistema de analgesia para auxiliar na redução da dor. A pesquisa demonstrou que o exercício de
longa duração aumenta as concentrações naturais dessas substâncias opióides.

A medula espinhal
A parte mais inferior do tronco cerebral, o bulbo (figura 24), forma uma continuidade com a medula
espinhal. A medula espinhal é composta por tratos de fibras nervosas que permitem a condução
bidirecional dos impulsos nervosos. As fibras sensoriais (aferentes) transmitem sinais nervosos dos
receptores sensoriais, como os localizados nos músculos e nas articulações, aos níveis superiores do
SNC. As fibras motoras (eferentes) do cérebro e da medula espinhal superior dirigem-se aos órgãos
terminais (por exemplo, músculos e glândulas).

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CAPÍTULO 2
O sistema nervoso periférico

O Sistema Nervoso Periférico (SNP) é composto por 43 pares de nervos, sendo eles: 12 pares de
nervos cranianos que se conectam com o cérebro e 31 pares de nervos espinhais ou raquidianos
que se conectam com a medula espinhal. Os nervos espinhais inervam diretamente os músculos
esqueléticos. Em cada nervo espinhal, neurônios sensoriais entram na medula espinhal através
da raiz dorsal e seus corpos celulares estão localizados nos glânglios espinhais. Os motoneurônios
(neurônios motores) deixam a medula espinhal através da raiz ventral. Eles são o elo final da cadeia
de controle da atividade muscular, terminando nas junções neuromusculares.

Na figura 25 é demonstrado a imagem de um corte transversal da medula espinhal mostra sua


organização.

Figura 25. Corte transversal da medula espinhal mostrando os nervos espinhais.

Funcionalmente, o SNP possui duas divisões principais: a divisão sensorial e a divisão motora.
Examinaremos agora cada uma delas.

A divisão sensorial
A divisão sensorial do SNP transmite informações sensoriais ao SNC. Neurônios sensoriais
(aferentes) originam-se em áreas como:

» vasos sanguíneos e linfáticos;

52
NEUROFISIOLOGIA DO CONTROLE MOTOR │ UNIDADE III

» órgãos internos;

» órgãos dos sentidos especiais (paladar, tato, olfato, audição, visão);

» pele e

» músculos e tendões.

Os neurônios sensoriais do SNP terminam na medula espinhal ou no encéfalo e transmitem


continuamente informações as SNC sobre as alterações constantes que ocorrem no organismo.
Pela transmissão dessas informações, esses neurônios permitem que o encéfalo detecte o que
está acorrendo em todas as partes do corpo e do ambiente circunvizinho. Neurônios sensoriais
localizados no SNC transmitem o estímulo sensorial às áreas adequadas, onde a informação pode
ser processada e integrada a outras informações que chegam.

A divisão sensorial recebe informações de cinco tipos principais de receptores.

1. Mecanorreceptores: respondem às forças mecânicas como a pressão, o toque, as


vibrações ou o estiramento.

2. Termorreceptores: respondem às alterações da temperatura.

3. Nociceptores: respondem aos estímulos dolorosos.

4. Fotorreceptores: respondem à radiação eletromagnética (luz), permitindo a visão.

5. Quimiorreceptores: respondem aos estímulos químicos, como os originários de


alimentos, odores ou alterações das concentrações sanguíneas de substâncias como
o oxigênio, dióxido de carbono, glicose, eletrólitos etc.

Vários desses receptores são importantes no exercício e no esporte. consideremos alguns deles. As
terminações nervosas livres detectam o toque rude, a pressão, a dor, o calor e o frio. Portanto, elas
funcionam como mecanorreceptores, nociceptores e termorreceptores. Essas terminações nervosas
são importantes na prevenção de lesão durante o desempenho atlético.

Terminações nervosas especiais localizadas nos músculos e nas articulações são de tipos variados
e possuem funções diversas. Cada tipo é sensível a um estímulo específico. A seguir, apresentamos
alguns exemplos importantes:

1. Os receptores articulares cinestésicos localizados nas cápsulas articulares são


sensíveis aos ângulos articulares e às taxas de alteração desses ângulos. Portanto,
eles detectam a posição e qualquer movimento articular.

2. Os fusos musculares detectam a magnitude do estiramento muscular.

3. Os órgãos tendinosos de Golgi detectam a tensão aplicada por um músculo sobre


seu tendão, fornecendo informações sobre a força da contração muscular.

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UNIDADE III │ NEUROFISIOLOGIA DO CONTROLE MOTOR

A divisão motora
O SNC transmite informações para várias partes do corpo por meio da divisão motora, ou eferente,
do SNP. Após o SNC processar a informação que recebe da divisão sensorial, ele decide como o
corpo deve responder ao estímulo. Do encéfalo e da medula espinhal, redes intricadas de neurônios
vão a todas as partes do corpo, fornecendo instruções detalhadas às áreas-alvo.

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CAPÍTULO 3
O sistema nervoso autônomo

O Sistema Nervoso Autônomo (SNA), frequentemente considerado parte da divisão motora do


sistema nervoso periférico, controla as funções internas involuntárias do organismo. Entre as
funções importantes para a atividade física estão incluídas:

» a frequência cardíaca;

» a pressão arterial;

» a distribuição sanguínea;

» a respiração.

O SNA possui duas divisões principais: o Sistema Nervoso Simpático (SNS) e o Sistema Nervoso
Parassimpático (SNP). Elas se originam a partir de diferentes seções da medula espinhal e a partir
da base do encéfalo. Frequentemente, o efeito desses dois sistemas é antagonista (enquanto um
estimula o outro inibe), mas ambos sempre funcionam em conjunto. Lembre-se disso à medida que
examinamos cada um separadamente.

O sistema nervoso simpático


O SNS é o nosso sistema de luta-ou-fuga. Ele prepara seu corpo para enfrentar uma crise. Quando
você está excitado, o seu SNS produz uma descarga maciça pelo seu corpo, preparando-o para a ação.
Um som alto súbito, uma situação potencialmente letal ou aqueles segundos finais que antecedem
uma competição atlética são exemplos de quando você apresenta essa descarga simpática maciça.
Alguns efeitos da estimulação simpática são apresentados abaixo.

» A frequência cardíaca e a força de contração cardíaca aumentam.

» Os vasos sanguíneos coronarianos dilatam, aumentando o suprimento sanguíneo


ao miocárdio para suprir as suas demandas crescentes.

» A vasodilatação periférica permite que mais sangue entre nos tecidos


metabolicamente mais ativos.

» A vasoconstrição, na maioria dos outros tecidos, desvia o sangue para os tecidos


metabolicamente mais ativos.

» A pressão arterial aumenta, permitindo uma melhor perfusão sanguínea e


aumentando o retorno venoso ao coração.

» A broncodilatação melhora a troca gasosa.

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UNIDADE III │ NEUROFISIOLOGIA DO CONTROLE MOTOR

» A taxa metabólica aumenta.

» A atividade mental aumenta, permitindo uma melhor percepção dos estímulos


sensoriais e uma maior concentração.

» A glicose é liberada do fígado para a corrente sanguínea como uma fonte de energia.

» As funções que não são diretamente necessárias tornam-se mais lentas (por
exemplo, função renal, digestão), conservando energia.

Essas alterações básicas das funções corporais facilitam a resposta motora, demonstrando a
importância do SNA no preparo do seu corpo ao estresse agudo, como por exemplo, na atividade física.

O sistema nervoso parassimpático


O SNP é o seu sistema de manutenção do corpo. Ele tem um papel importante em processos como
digestão, micção, secreção glandular e conservação de energia. Esse sistema é mais ativo quando
você está calmo e em repouso. Seus efeitos tendem a se opor aos do SNS. A divisão parassimpática
produz:

» diminuição da freqüência cardíaca;

» broncoconstrição;

» aumenta o peristaltismo.

Os vários efeitos das divisões simpática e parassimpática do SNA são resumidas na tabela 2.

Tabela 2. Efeitos dos sistemas nervosos simpático e parassimpático sobre vários órgãos.

Órgão Simpático Parassimpático


Olho (pupila) Dilatação (midríase) Contração (miose)
Glândulas Salivares Secreção espessa Secreção copiosa
Glândulas Sudoríparas (+) Sem efeito
Coração Taquicardia e inotropismo (+) Bradicardia e inotropismo (-)
Coronárias Dilatação Constrição
Brônquios Dilatação Constrição
Peristaltismo (-), secreção reduzida e esfíncteres Peristaltismo (+), secreção aumentada e
Trato Gastrointestinal
contraídos esfíncteres relaxados
Fígado Glicogenólise Glicogênese
Rins (produção de urina) Diminui Sem efeito
Dilatação (acetilcolina)
Vasos sanguíneos dos músculos esqueléticos Sem efeito
Constrição (adrenalina)
Pâncreas endócrino Glucagon (+) Insulina (+)
Pênis Ejaculação Ereção
Tecido adiposo Lipólise Sem efeito
Atividade mental (+) Sem efeito

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NEUROFISIOLOGIA DO CONTROLE MOTOR │ UNIDADE III

Metabolismo (+) Sem efeito


(+) = estimula, (-) inibe. Glicogenólise: quebra do glicogênio realizada através da retirada sucessiva de unidades de glicose. Peristaltismo: movimentos
peristálticos são movimentos involuntários que empurram o alimento (também denominado bolo alimentar, quimo ou quilo, de acordo com a fase
da digestão) ao longo do tubo digestivo, para que ocorra sua digestão ao nível devido. Esse movimento é impulsionado pela musculatura lisa e
coordenado pelo SNA, por todo o tubo digestivo, iniciando-se no esôfago e terminando no reto. Glicogênese: corresponde ao processo de síntese
de glicogênio no fígado e músculos, no qual moléculas de glicose são adicionadas à cadeia do glicogênio. Esse processo é ativado pela insulina em
resposta aos altos níveis de glicose sanguínea.

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CAPÍTULO 4
Integração sensório-motora

Tendo analisado os componentes e as divisões do SN, estamos prontos para discutir como um
estímulo sensorial dá origem a uma resposta motora. Como, por exemplo, os músculos de sua mão
sabem afastar os dedos de um fogão quente? Quando você decide correr, como os músculos de suas
pernas se coordenam, suportando o seu peso e impulsionando seu corpo para frente? Para realizar
essas atividades, os sistemas sensorial e motor devem se comunicar entre si.

Esse processo é denominado integração sensório-motora e é descrito na figura 26. Para que seu
corpo responda aos estímulos sensoriais, as divisões sensorial e motora do seu SN devem atuar em
conjunto numa sequência específica de eventos:

Figura 26. Sequência de eventos da integração sensório-motora.

1. Um estímulo sensorial é recebido pelos receptores sensoriais.

2. O impulso sensorial é transmitido ao longo dos neurônios sensoriais até o SNC.

3. O SNC interpreta a informação sensorial aferente e determina qual é a resposta


mais adequada.

4. Os sinais da resposta são transmitidos so SNC ao longo dos neurônios motores.

5. O impulso motor é transmitido a um músculo e a resposta ocorre.

58
NEUROFISIOLOGIA DO CONTROLE MOTOR │ UNIDADE III

Estímulo sensorial
Lembre-se de que as sensações e o estado fisiológico são detectados por receptores sensoriais
distribuídos em todo o corpo. Os impulsos resultantes da estimulação sensorial são transmitidos
por meio de nervos sensoriais à medula espinhal. Quando eles chegam à medula espinhal,
eles podem desencadear um reflexo local nesse nível ou podem ir até as regiões superiores
da medula espinhal ou ao encéfalo. Vias sensoriais ao encéfalo podem terminar em áreas
sensoriais do tronco cerebral, do cerebelo, do tálamo ou do córtex cerebral. Uma área em
que os impulsos sensoriais terminam é denominada centro de integração. É lá que o estímulo
sensorial é interpretado e ligado ao sistema motor. Esses centros de integração possuem
funções variadas:

» Impulsos sensoriais que terminam na medula espinhal são integrados nessa região.
A resposta é tipicamente um reflexo motor simples, que é o tipo mais simples
de integração.

» Os sinais sensoriais que terminam na porção inferior do tronco cerebral


resultam em reações motoras subconscientes de uma natureza superior e mais
complexa do que os reflexos espinhais simples. O controle da postural na posição
sentada, em pé ou durante o movimento é um exemplo desse nível de estímulo
sensorial.

» Os sinais sensoriais que terminam no cerebelo também resultam no controle


subconsciente do movimento. O cerebelo é o centro de coordenação, suavizando os
movimentos por meio da coordenação das ações dos vários grupos musculares que
se contraem para realizar o movimento desejado. Tanto os movimentos motores
finos quanto os grosseiros parecem ser coordenados pelo cerebelo em conjunto com
os glânglios da base. Sem o controle exercido pelo cerebelo, todos os movimentos
seriam incontrolados e não coordenados.

» Os sinais sensoriais que terminam no tálamo começam a entrar no nível da


consciência e você começa a distinguir várias sensações.

» Somente quando os sinais sensoriais chegam ao córtex cerebral é que você pode
localizar distintamente o sinal. O córtex sensorial primário localizado no giro
pós-central (no lobo parietal), recebe estímulo sensorial de receptores da pele e de
proprioceptores dos músculos, tendões e articulações. Essa área é um mapa do corpo.
A estimulação de uma área específica do corpo é identificada e a sua localização exata
é instantaneamente reconhecida. Assim, essa parte do nosso encéfalo consciente
permite que estejamos constantemente conscientes das condições externas e de
nossas relações com elas.

59
UNIDADE III │ NEUROFISIOLOGIA DO CONTROLE MOTOR

A figura 27 ilustra vários receptores sensoriais e suas vias nervosas de volta à medula espinhal e a
várias áreas do encéfalo.

Figura 27. Receptores sensoriais e suas vias de volta à medula espinhal e ao encéfalo. T0 = temperatura. Observe
que parte dos estímulos sensoriais antes de atingirem o córtex sensorial deixa uma “cópia” dessa informação
no cerebelo. Pois assim, o cerebelo atuará como um sistema de integração, comparando a sua atividade
programada ou desejada com as alterações reais que ocorrem no seu corpo e, em seguida, iniciando ajustes
corretivos através do sistema motor.

Controle motor
Quando o impulso sensorial é recebido, ele tipicamente provoca uma resposta através de um
motoneurônio, independentemente do nível em que o impulso sensorial é interrompido. Os
músculos esqueléticos são controlados por impulsos conduzidos por motoneurônios (eferentes) que
se originam em qualquer um dos seguintes níveis:

1. medula espinhal

2. regiões inferiores do encéfalo

3. área motora do córtex cerebral

À medida que o nível de controle vai da medula espinhal ao córtex motor, o grau de complexidade
do movimento aumenta de um controle reflexo simples a movimentos complicados que exigem
processos de pensamento básicos. As respostas motoras de padrões de movimento mais complexos
comumente originam-se no córtex motor do encéfalo.

Finalmente, estamos prontos para ligar os dois sistemas através da integração sensório-motora. Sua
forma mais simples é o reflexo e, por essa razão, ele será analisado em primeiro lugar.

60
CAPÍTULO 5
Atividade reflexa

O que ocorre quando você descuidadamente coloca a mão sobre um fogão quente? Primeiramente,
os estímulos do calor e da dor são recebidos pelos termorreceptores e nociceptores localizados
em sua mão e, em seguida, os impulsos sensoriais vão à medula espinhal, terminando no
nível de entrada. Na medula espinhal, esses impulsos são integrados instantaneamente
pelos interneurônios que conectam os motoneurônios e os neurônios sensoriais. O impulso é
transmitido aos motoneurônios e vai até os músculos efetores os quais controlam a retirada
de sua mão. O resultado é que você retira a mão do fogão quente de maneira reflexa, sem dar
atenção a nenhum pensamento.

Um reflexo motor é uma resposta pré-programada. Sempre que seus nervos sensoriais
transmitem determinados impulsos, seu corpo responde instantaneamente e de forma idêntica.
No nosso exemplo, quer você toque algo muito quente ou muito frio, os termorreceptores
desencadearão um reflexo para que você retire a sua mão. Quer a dor seja decorrente do calor ou
de um objeto pontiagudo, os nociceptores produzirão também um reflexo de retirada. Quando
você se conscientiza do estimulo específico (após os impulsos sensoriais também terem sido
transmitidos ao córtex sensorial primário), a atividade reflexa já está ocorrendo, se já não tiver
sido completada. Toda atividade neural ocorre de maneira extremamente rápida, mas um reflexo
é o modo mais rápido de resposta, uma vez que você não necessita de tempo para tomar uma
decisão consciente. Somente uma resposta é possível – não há necessidade de se levar em conta
outras opções.

O nível de controle do SN varia em resposta ao estímulo sensorial de acordo com a complexidade do


movimento necessário. Reflexos simples são controlados pela medula espinhal, enquanto as reações
complexas exigem o envolvimento do encéfalo.

Fusos musculares
Agora que você conhece os princípios básicos da atividade reflexa, podemos analisar mais
detalhadamente dois reflexos que auxiliam no controle da função muscular. O primeiro envolve
uma estrutura especial: o fuso muscular.

O fuso muscular, mostrado na figura 28, está localizado entre fibras musculares esqueléticas
regulares, denominadas fibras extrafusais (fora do fuso). Um fuso muscular contém de 4 a 20 fibras
musculares especializadas pequenas, denominadas fibras intrafusais (dentro do fuso) e terminações
nervosas, sensoriais e motoras, associadas a essas fibras. Uma bainha de tecido conjuntivo envolve
o fuso muscular e o fixa ao endomísio das fibras extrafusais. As fibras intrafusais são controladas
por motoneurônios especializados, denominados motoneurônios gama. Em contraste, as fibras
extrafusais (fibras regulares) são controladas pelos motoneurônios alfa.

61
UNIDADE III │ NEUROFISIOLOGIA DO CONTROLE MOTOR

Figura 28. Fuso muscular

A região central de uma fibra intrafusal não se pode contrair porque ela não contém, ou contém
poucos, filamentos de actina e de miosina. Por essa razão, somente a região central pode se alongar.
Como o fuso muscular está fixado às fibras extrafusais, sempre que essas fibras são alongadas, a
região central do fuso muscular também se alonga.

Quando essa região é alongada, as terminações nervosas sensoriais localizadas em torno dessa
região central do fuso muscular transmitem informações à medula espinhal, informando ao SNC
o comprimento do músculo. Na medula espinhal, o neurônio sensorial forma sinapse com um
motoneurônio alfa, o qual desencadeia a contração muscular reflexa (das fibras extrafusais) para
resistir a um maior alongamento.

Ilustremos essa ação com um exemplo. O seu braço é flexionado na altura do cotovelo e sua mão
é estendida, com a palma virada para cima. Subitamente, alguém coloca um peso elevado sobre a
palma de sua mão. O seu antebraço começa a cair, alongando as fibras musculares do seu braço
(músculo bíceps braquial), as quais, por sua vez, alongam o fuso muscular. Em resposta a esse
estiramento, os neurônios sensoriais enviam impulsos à medula espinhal, a qual então excita
os motoneurônios alfa. Eles fazem com que o músculo bíceps braquial se contraia, superando o
alongamento. Esse exemplo esta ilustrado na figura 29.

62
NEUROFISIOLOGIA DO CONTROLE MOTOR │ UNIDADE III

Figura 29. Reflexo do fuso muscular

Os motoneurônios gama excitam as fibras intrafusais alongando-as previamente e de maneira


discreta. Apesar da porção média das fibras intrafusais não se poder contrair, as extremidades
podem. Os motoneurônios gama produzem uma contração discreta das extremidades dessas fibras,
o que alonga levemente a região central. Esse alongamento prévio torna o fuso muscular altamente
sensível, mesmo aos graus mínimos de alongamento.

O fuso muscular também auxilia a ação muscular normal. Parece que, quando os motoneurônios
alfa são estimulados a contrair as fibras musculares extrafusais, os motoneurônios gama também
são ativados, contraindo as extremidades das fibras intrafusais. Isso alonga a região central do
fuso muscular, dando origem a impulsos sensoriais que vão à medula espinhal e, em seguida, aos
motoneurônios. Em resposta, o músculo se contrai. Assim, a contração muscular neural é melhorada
por meio dessa função dos fusos musculares.

As informações que chegam à medula espinhal pelos neurônios sensoriais associados aos fusos
musculares não terminam simplesmente nesse nível. Os impulsos também são enviados às partes
superiores do SNC, fornecendo informações ao encéfalo sobre o comprimento exato e o estado
contrátil do músculo, assim como a velocidade com que esses estados estão mudando. Essas
informações são essenciais para a manutenção do tônus muscular e da postura e para a execução
dos movimentos. Antes que o encéfalo possa dizer o que o músculo deve fazer a seguir, ele deve
saber o que o músculo está fazendo no momento.

Órgãos tendinosos de Golgi


Os órgãos tendinosos de Golgi são receptores sensoriais encapsulados através dos quais passa um
pequeno feixe de fibras tendinosas. Esses órgãos estão localizados proximalmente ao local de fixação
das fibras tendinosas às fibras musculares, como mostra a figura 30.

63
UNIDADE III │ NEUROFISIOLOGIA DO CONTROLE MOTOR

Figura 30. Órgão tendinoso de Golgi

Aproximadamente 5 a 25 fibras musculares estão em geral conectadas a cada órgão tendinoso


de Golgi. Enquanto os fusos musculares monitoram o comprimento de um músculo, os órgãos
tendinosos de Golgi são sensíveis à tensão do complexo músculo-tendão e atuam como um aferidor
de tensão, um dispositivo que detecta alterações da tensão. Sua sensibilidade é tão grande que eles
podem responder à contração de uma única fibra muscular.

Esses receptores sensoriais são inibidores por natureza, desempenhando um papel protetor ao
reduzirem a possibilidade de lesão. Quando estimulados, esses receptores inibem os músculos
agonistas (que se contraem) e excitam os músculos antagonistas.

Alguns pesquisadores especulam que a redução da influência dos órgãos tendinosos de Golgi resulta
na desinibição dos músculos ativos, permitindo uma ação muscular mais forçada. Esse mecanismo
poderia explicar, pelo menos parcialmente, os ganhos de força muscular que acompanham
o treinamento de força, principalmente no inicio do treinamento quando os ganhos de força
decorrentes da hipertrofia muscular não são aparentes.

Um exemplo de reflexo com origem no órgão tendinoso de Golgi (reflexo tendíneo) é representado
na figura 31.
Figura 31. Reflexo tendinoso de Golgi (reflexo tendíneo). Observe as informações referentes aos eventos de 1 a
4. O que faz o órgão tendinoso de Golgi disparar é a tensão gerada pelo músculo no tendão, local onde se
encontra o órgão tendinoso de Golgi.

64
CAPÍTULO 6
Os centros encefálicos superiores

Os reflexos envolvem a forma mais simples de integração neural. No entanto, a maioria dos
movimentos utilizados nas atividades esportivas (atividades físicas) envolve o controle e a
coordenação através dos centros encefálicos superiores, especificamente:

» no córtex motor primário;

» no gânglios da base;

» no cerebelo.

Analisemos algumas funções de cada um deles.

O córtex motor primário


O córtex motor primário é responsável pelo controle dos movimentos musculares finos e definidos.
Ele se encontra localizado no lobo frontal, especificamente no giro pré-central. Os neurônios
dessa região, conhecidos como células piramidais, permitem que controlemos conscientemente
os movimentos dos nossos músculos esqueléticos. Imagine o córtex motor primário como parte
do encéfalo que decide qual movimento você deseja realizar. Por exemplo, se você estiver sentado
e deseja ficar em pé, a decisão para realizar essa ação é tomada pelo seu córtex motor primário,
enquanto todo o seu corpo é cuidadosamente mapeado. As áreas que exigem o controle motor mais
fino apresentam uma maior representação no córtex motor e, por essa razão, é fornecido um maior
controle neural a elas.

Os corpos celulares das células piramidais estão localizadas no córtex motor primário e seus axônios
formam os tratos extrapiramidais. Estes também são conhecidos como tratos córtico-espinhais
porque as projeções nervosas se estendem do córtex cerebral até a medula espinhal. Esses tratos
provêm o principal controle voluntário de nossos músculos esqueléticos.

Além do córtex motor primário, existe um córtex pré-motor, localizado anteriormente ao giro
pré-central no lobo frontal. As habilidades motoras aprendidas de natureza repetitiva ou padronizada
são nele armazenadas. Acredita-se que essa região seja o banco de memória das atividades motoras
especializadas.

Os gânglios da base
Os gânglios (núcleos) da base não fazem parte do córtex cerebral. Ao contrário, eles estão localizados
na substância branca, profundamente em relação ao córtex. Esses gânglios são aglomerados de
corpos de células nervosas. As funções complexas dos gânglios da base não são bem conhecidas,
mas sabe-se que os gânglios da base são importantes para o início dos movimentos de natureza

65
UNIDADE III │ NEUROFISIOLOGIA DO CONTROLE MOTOR

sustentada e repetitiva (como o balanço dos braços durante a marcha) e, portanto, eles controlam
movimentos complexos semivoluntários, como a marcha e a corrida. Essas células também estão
envolvidas na manutenção da postura e do tônus muscular.

O cerebelo
O cerebelo é fundamental para o controle de todas as atividades musculares rápidas e complexas.
Ele auxilia na coordenação do “timing” das atividades motoras e da progressão de um movimento
ao seguinte através da monitorização e da realização de ajustes corretivos das atividades motoras
desencadeadas por outras partes do cérebro. O cerebelo auxilia as funções tanto do córtex motor
primário quanto dos gânglios da base. Ele facilita os padrões de movimento, suavizando-os. Se isso
não ocorresse, os movimentos seriam espasmódicos e descontrolados.

O cerebelo atua como um sistema de integração, comparando a sua atividade programada ou


desejada com as alterações reais que ocorrem no seu corpo e, em seguida, iniciando ajustes
corretivos através do sistema motor. Ele recebe informações do cérebro e de outras partes do
encéfalo e também de receptores sensoriais (proprioceptores) localizados em seus músculos
e articulações que mantêm o seu cerebelo informado sobre a posição atual do seu corpo. O
cerebelo também recebe informações visuais e sobre o equilíbrio. Portanto, ele processa todas
as informações aferentes sobre a tensão e a posição exatas de todos os músculos, articulações e
tendões e sobre a sua posição atual em relação ao meio ambiente. Em seguida, ele determina o
melhor plano de ação para produzir o movimento desejado.

Consideremos o nosso exemplo anterior no qual você está sentado e deseja ficar em pé. O seu
córtex motor primário é a parte do encéfalo que toma a decisão de ficar em pé. Essa decisão é
retransmitida ao cerebelo. O cerebelo capta a ação desejada e, em seguida, analisa o estado atual
do corpo, baseando-se em todos os estímulos sensoriais que ele recebe. Em seguida, ele decide,
baseando-se nessas informações, qual é o melhor plano de ação para realizar o seu movimento
desejado, ficar em pé.

Engramas
Quando você aprende uma nova habilidade motora, os períodos iniciais de prática exigem uma
intensa concentração. À medida que se familiariza com a habilidade, você acha que não é necessário
se concentrar tanto. Finalmente, quando aperfeiçoa a habilidade, ela pode ser realizada sem nenhum
ou com muito pouco esforço. Como você chega a esse ponto?

Padrões motores específicos aprendidos parecem ser armazenados no encéfalo, sendo repetidos
sempre que solicitados. Esses padrões motores memorizados são denominados programas
motores ou engramas. Aparentemente, os engramas são armazenados tanto na porção sensorial
quanto na porção motora do encéfalo, como o córtex pré-motor. Os armazenados na porção
sensorial do cérebro são para os padrões motores mais lentos e os armazenados na porção motora

66
NEUROFISIOLOGIA DO CONTROLE MOTOR │ UNIDADE III

são para os movimentos rápidos. Pouco se sabe sobre os engramas e os seus mecanimos de ação.
Por essa razão, eles representam uma área importante para a pesquisa futura.

Descreva com suas palavras o que você entende como integração sensório-motora.
Após realizar sua descrição complemente seu texto com auxilio de consultas
bibliográficas.

67
CAPÍTULO 7
A resposta motora

Tendo analisado como o estímulo sensorial é integrado para determinar a resposta motora
adequada, o último passo do processo a ser levado em consideração é como os músculos respondem
aos impulsos motores quando eles chegam às fibras musculares.

A unidade motora
Quando um impulso elétrico atinge um motoneurônio, ele percorre a extensão do neurônio até
a junção neuromuscular. A partir daí, o impulso dissemina-se para todas as fibras musculares
inervadas por esse neurônio. Lembre-se de que o motoneurônio e todas as fibras por ele inervadas
formam uma unidade motora. Cada fibra muscular é inervada por apenas um motoneurônio, mas
cada motoneurônio inerva até milhares de fibras musculares, dependendo da função do músculo.
Os músculos que controlam movimentos finos, como os que controlam os olhos, apresentam apenas
uma pequena quantidade de fibras musculares por motoneurônio. Os músculos com funções mais
gerais apresentam muitas fibras por unidade motora.

Os músculos que controlam os movimentos oculares (músculos extraoculares)


apresentam uma relação de inervação de 1:15, significando que um motoneurônio
inerva apenas 15 fibras musculares. Em contraste, os músculos gastrocnêmio e tibial
anterior, localizados na perna, apresentam relações de inervação de aproximadamente
1:2000, significando que um motoneurônio inerva 2000 fibras musculares.

As fibras musculares de uma unidade motora específica são homogêneas em relação


ao tipo de fibra. Portanto, você não encontrará uma unidade motora que possua
fibras musculares de contração rápida e de contração lenta. De fato, acredita-se que
as características do motoneurônio realmente determinam o tipo de fibra muscular
da unidade motora.

O recrutamento ordenado das fibras


musculares e o princípio do tamanho
A maioria dos pesquisadores concorda que as unidades motoras geralmente são ativadas baseando-se
numa ordem fixa de recrutamento. Isso é conhecido como principio do recrutamento ordenado, no
qual as unidades motoras de um determinado músculo parecem ser classificadas. Consideremos
a utilização do músculo bíceps braquial como um exemplo: supondo-se um total de 200 unidades
motoras, elas são classificadas numa escala de 1 a 200. Para uma ação muscular extremamente fina
e que exige a produção de uma força muito pequena, a unidade motora classificada como número
1 será recrutada. À medida que as exigências de produção de força aumentam, são recrutadas as

68
NEUROFISIOLOGIA DO CONTROLE MOTOR │ UNIDADE III

unidades número 2, 3, 4 etc., até chegar a uma ação muscular máxima que ativa 50% a 70% das
unidades motoras. Para a produção de uma determinada força, todas as vezes as mesmas unidades
motoras são recrutadas.

Um mecanismo que pode explicar parcialmente o princípio do recrutamento ordenado é o princípio


do tamanho, o qual afirma que a ordem de recrutamento de unidades motoras está diretamente
relacionada ao tamanho de seu motoneurônio. As unidades motoras com motoneurônios menores
serão recrutadas em primeiro lugar. Como as unidades motoras de contração lenta possuem os
motoneurônios menores, elas são as primeiras a serem recrutadas num movimento graduado
(indo de taxas muito baixas a muito altas de produção de força). As unidades motoras de contração
rápida são recrutadas quando a força necessária para realização do movimento aumenta. Ainda
permanecem algumas questões sobre como o princípio do tamanho está relacionado com a
maioria dos movimentos atléticos, pois ele foi examinado somente em movimentos graduados que
representam ações musculares com uma intensidade relativa inferior a 25%.

A atividade neuromuscular é graduada baseando-se numa ordem fixa de


recrutamento do grupo disponível de unidades motoras. Quando mais força for
necessária para a execução de um determinado movimento, mais unidades motoras
são recrutadas.

69
Para (não) Finalizar
Hipócrates, Acerca das doenças sagradas (século IX a.C.)

O homem deve saber que de nenhum outro lugar, mas do encéfalo, vem a
alegria, o prazer, o riso e a diversão, o pesar, o ressentimento, o desânimo e
a lamentação. E por isso, de uma maneira especial, adquirimos sabedoria e
conhecimento, e enxergamos e ouvimos e sabemos o que é justo e injusto, o
que é bom e o que é ruim, o que é doce e o que é amargo... E pelo mesmo órgão
tornamo-nos loucos e delirantes, e medos e terrores nos assombram... Todas
essas coisas suportamos do encéfalo quando não está sadio... Nesse sentido
sou da opinião de que o encéfalo exerce o maior poder sobre o homem.
BER, M. F.; CONNORS, B. W.; PARADISO, M. A. Neurociências: desvendando o sistema
nervoso. 2. ed. Porto Alegre: Artmed, 2002.

É da natureza humana ser curioso sobre o que vemos e ouvimos; por que algumas coisas são prazerosas e
outras não; como nos movemos, como pensamos, aprendemos, lembramos e esquecemos; a natureza do
ódio e da loucura. Esses mistérios estão começando a ser revelados pela pesquisa básica em neurociências.

A palavra “neurociência” é jovem. A Sociedade de Neurociências, uma associação de neurocientistas,


foi fundada somente em 1970. O estudo do encéfalo, entretanto, é tão antigo como a própria ciência.
Historicamente, as ciências que se devotam ao estudo do sistema nervoso abrangem diferentes disciplinas:
medicina, biologia, psicologia, física, química e matemática. A revolução das neurociências ocorreu
quando os cientistas perceberam que a melhor abordagem para o entendimento da função do encéfalo
vinha da interdisciplinaridade, a combinação das abordagens tradicionais para produzir uma nova síntese,
uma nova perspectiva. A maioria das pessoas envolvidas na investigação científica do sistema nervoso
considera-se, hoje, neurocientistas.

A Sociedade de Neurociências é a maior associação de cientistas profissionais em toda a biologia


experimental e, também, a que mais cresce. Longe de ser muito especializada, o campo é tão amplo
quanto o das ciências naturais, com o sistema nervoso servindo de ponto comum. Compreender como o
encéfalo funciona requer conhecimento sobre muitas coisas, desde a estrutura da molécula da água até as
propriedades elétricas e químicas do encéfalo.

Por isso, efetue as leituras recomendadas, reflita, faça relações entre dados, informações e ideias, desafie o
senso comum, pesquise, troque opiniões.

Em pouco tempo você estará surpreendido. Verá que, além de ter alcançado maiores conhecimentos, a
aprendizagem foi um acontecimento natural e que a sua capacidade de estudos terá sido ampliada pelo
exercício e pela satisfação em sentir o próprio crescimento.

Por tudo isso, lembre-se de que o assunto não termina aqui. Há muito o que aprender. O que foi visto
nesta etapa é um caminho apontando para fontes inesgotáveis de estudos e experimentações.

Caminhe, sempre, rumo à descoberta. Dessa forma, seus horizontes se ampliarão e, consequentemente,
seu desempenho profissional.

Desejamos-lhe sucesso.

70
Referências
BARBANTI, V. J. Dicionário de educação física e esporte. 2. ed. Barueri: Manole, 2003.

BER, M. F.; CONNORS, B. W.; PARADISO, M. A. Neurociências: desvendando o sistema nervoso.


2. ed. Porto Alegre: Artmed, 2002.

BONFIM, T. R.; BARELA, J. A. Efeito da manipulação da informação sensorial na propriocepção e


no controle postural. Fisioterapia em Movimento. v. 20, no 2, pp. 107-117, 2007.

CINGOLANI, H. E.; HOUSSAY, A. B. Fisiologia humana de houssay. 7. ed. Porto Alegre:


Artmed, 2004.

FODSTAD, H.; HARIZ, M. Electricity in the treatment of nervous system disease. Acta
Neurochir Suppl, v. 97, no 11, 2007.

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GUYTON, A. C.; HALL, J. E. Tratado de fisiologia médica. 11. ed. Rio de Janeiro: Guanabara
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KNIKOU, M.; CONWAY, B. A. Effects of electrically induced muscle contraction on flexion reflex in
human spinal cord injury. Spinal Cord, v. 43, 2005.

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NOHAMA, P. Efeitos da estimulação elétrica funcional no controle neuromuscular artificial.
Revista Neurociências. 2010.

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São Paulo: Manole, 2000.

MCARDLE, W. D.; KATCH, F. I.; KATCH, V. L. Fisiologia do exercício: energia, nutrição e


desempenho humano. 5. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2003.

PEREIRA, B.; SOUZA JÚNIOR, T. P. de. Metabolismo celular e exercício físico: aspectos
bioquímicos e nutricionais. São Paulo: Phorte, 2004.

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São Paulo: Phorte, 2005.

71
REFERÊNCIAS

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VANDERTHOMMEN, M.; DUCHATEAU, J. Electrical stimulation as a modality to improve


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WILMORE, J. H.; COSTIL, D. L. Fisiologia do esporte e do exercício. 2. ed. São Paulo: Manole,
2001.

72
Anexo
Estratégias de controle em movimentos
complexos: ciclo percepção-ação no
controle postural

José Angelo Barela. Estratégias de Controle Em Movimentos Complexos: Ciclo Percepção-Ação no


Controle Postural. Rev. paul. Educ. Fís., São Paulo, supl. 3, pp. 79-88, 2000.

O funcionamento do sistema postural envolve a necessidade de coordenar e controlar os segmentos


corporais com base nas informações sensoriais. Desta forma, mesmo um comportamento cotidiano
como a manutenção da posição ereta, ao contrário do que parece, é uma tarefa complexa que
envolve um intricado relacionamento entre informação sensorial e atividade motora. Apesar dos
avanços no entendimento do funcionamento do sistema postural, uma questão central relacionada
ao seu funcionamento começou apenas recentemente a ser respondida: “como informação sensorial
e ação motora estão relacionados um com outro durante a manutenção de uma posição corporal
desejada”. O objetivo deste trabalho é discutir alguns aspectos do funcionamento do sistema
postural, enfatizando o relacionamento entre informação sensorial e ação motora.

Controle postural: uma tarefa complexa


A manutenção de uma posição corporal desejada envolve a coordenação e controle dos segmentos
corporais com relação aos outros segmentos corporais e a coordenação e controle desses segmentos
corporais com relação ao meio ambiente. Horak e Macpherson (1996) definiram dois objetivos
comportamentais do sistema de controle postural: orientação e equilíbrio corporal. A orientação
postural está relacionada à manutenção da posição dos segmentos corporais com respeito aos
outros segmentos corporais e com respeito ao meio ambiente. O equilíbrio postural está relacionado
ao equilíbrio das forças internas e externas que agem no corpo durante as ações motoras.

Um problema que o sistema de controle postural tem que resolver, durante a manutenção de
uma posição corporal, é que as forças atuando nos segmentos corporais não são constantes. Uma
consequência da variação dessas forças é que, mesmo em uma posição estática, como por exemplo
a manutenção da posição ereta, o corpo nunca está totalmente imóvel. A figura 1 apresenta
um estabilograma, onde a posição do centro de massa nas direções médio-lateral (abcissa) e
ântero-posterior (ordenada), de uma pessoa adulta mantendo a posição em pé o mais estável
possível, durante o intervalo de 25 segundos, é apresentada. Como pode ser verificado a posição
do centro de massa oscila de um lado para o outro e para frente e para trás. Essas oscilações
são decorrentes da dificuldade em manter os muitos segmentos corporais alinhados entre si
sobre uma base de suporte restrita, utilizando um sistema muscular esquelético que produz
forças que variam ao longo do tempo (DE LUCA; LEFEVER; MCCUE; XENAKIS, 1982). Desta
forma, os segmentos corporais controlados pela ação muscular são incapazes de permanecer em
orientações estritamente constantes (COLLINS; DE LUCA, 1993). A questão que surge é: como

73
ANEXO

a manutenção de uma orientação corporal é mantida por um sistema que sofre a ação de forças
constantemente mudando? Sem dúvida, a manutenção de uma orientação é alcançada com base
em um intrincado relacionamento entre informação sensorial e atividade motora. Uma sugestão
de como esse relacionamento ocorre é discutida no próximo tópico.

Controle postural: ciclo percepção-ação


O sistema de controle postural recebe informação sensorial predominantemente dos sistemas
visual, vestibular e somatosensório (NASHNER, 1981). Essas informações sensoriais informam
sobre a posição relativa dos segmentos corporais e sobre as forças internas e externas, atuando
nos segmentos corporais. Todas essas informações sensoriais são, então, utilizadas para estimar
e antecipar as forças agindo no corpo e, combinadas com atividade muscular apropriada, para
produzir ou manter a posição corporal desejada (HORAK; MACPHERSON, 1996).

Essa visão de funcionamento do sistema de controle postural assume que informação sensorial e
atividade motora estão entrelaçados entre si com o objetivo de atingir ou manter o equilíbrio e a
orientação postural. Em muitas situações, o relacionamento entre informação sensorial e atividade
muscular dá-se de forma contínua, como por exemplo, durante a manutenção da posição ereta
por algum período de tempo. Nesse caso, informação sensorial influencia a realização das ações
motoras relacionadas ao controle postural e, simultaneamente, a realização dessas ações motoras
influencia a obtenção de informação sensorial. Por exemplo, na manutenção da posição ereta, uma
oscilação para frente é detectada pelos sistemas sensoriais e, consequentemente, ocorre contração
dos músculos posteriores para que essa oscilação seja revertida. Entretanto, assim que a oscilação é
revertida, agora para trás, um novo fluxo de informação faz-se disponível, indicando a nova direção
da oscilação. Com base nessa informação, ocorrerá nova contração, agora, dos músculos anteriores
e assim sucessivamente. Nas situações em que essa dependência mútua entre percepção e ação é
manifestada regularmente, o padrão percepçãoação (SCHÖNER, 1991) ou o ciclo percepção-ação
(BARELA, 1997) é formado.

74
ANEXO

O uso da informação sensorial para atenuar


oscilação corporal
A influência da informação sensorial no controle postural tem sido estudada basicamente através
de duas estratégias. A primeira estratégia baseia-se na manipulação da informação sensorial, ou
seja, quando ela está presente, ausente ou é deficiente. Por exemplo, a oscilação corporal verificada
na manutenção da postura em pé quase dobra quando a informação visual é eliminada, seja pelo
ato de fechar os olhos ou de deixar o ambiente escuro (PAULUS; STRAUBE; BRANDT, 1984;
PAULUS; STRAUBE; KRAFCZYK; BRANDT, 1989). Além da disponibilidade de informação, a
qualidade da informação visual também é importante e influencia no controle postural. Paulus e
colegas (PAULUS; STRAUBE; BRANDT, 1984; PAULUS; STRAUBE; KRAFCZYK; BRANDT, 1989)
observaram que qualquer manipulação na qualidade da informação visual, como por exemplo,
diminuição da acuidade visual ou aumento da distância entre o observador e o cenário visual,
provoca aumento da oscilação corporal.

A explicação de como a informação visual influência o controle postural foi formulada baseando-se
no deslocamento do cenário ambiental na retina do observador (PAULUS; STRAUBE; KRAFCZYK;
BRANDT, 1989). Quando a informação visual está disponível, por exemplo, durante a manutenção
da posição em pé com os olhos abertos, o cenário do ambiente está sendo projetado na retina do
observador. Conforme o observador oscila para frente, a projeção desse cenário na retina aumenta
e o observador interpreta esse aumento como sendo decorrente de sua oscilação para frente. Essa
informação é usada na produção de atividade muscular com o objetivo de diminuir e reverter a
oscilação. Quando informação visual não está disponível, por exemplo quando o observador está
com os olhos fechados ou em um ambiente escuro, a projeção do cenário na retina não pode ser
utilizada e, consequentemente, outras fontes de informação sensorial devem ser utilizadas. Essa
explicação também é coerente com as situações em que a informação visual é manipulada. Por
exemplo, diminuição da acuidade visual ou aumento da distância entre o observador e o cenário
influencia a projeção da cenário na retina. Com o aumento da distância, a projeção do cenário
na retina é reduzida. Consequentemente, o observador necessita ter uma amplitude de oscilação
maior para que a projeção seja alterada em uma mesma quantidade do que quando a distância do
observador e o cenário era menor. Dessa forma, o sistema de controle postural parece minimizar
a expansão da imagem na retina com o objetivo de manter um relacionamento estável entre o
observador e o cenário ao seu redor.

Recentemente, o efeito da informação somatosensória no controle postural tem sido investigado


utilizando a estratégia do toque suave em uma superfície rígida (HOLDEN; VENTURA; LACKNER,
1994; JEKA; LACKNER, 1994; 1995). Nesses estudos, indivíduos adultos na posição em pé tocaram
a ponta do dedo indicador em uma superfície rígida estacionária, posicionada ao lado deles, em
duas condições experimentais: a) podiam aplicar o quanto de força quisessem ; b) podiam aplicar
no máximo 1 N de força (toque suave). Em ambas situações, foi verificada uma redução significante
da oscilação corporal comparadas com a situação sem toque. No caso da situação em que a quantia
de força aplicada era ilimitada, a redução da oscilação corporal ocorreu decorrente do suporte
mecânico fornecido pela superfície. Entretanto, no caso do toque suave, a força aplicada na superfície
era insuficiente para fornecer suporte mecânico (HOLDEN; VENTURA; LACKNER, 1994; JEKA;
LACKNER, 1994; 1995).

75
ANEXO

Mais interessante ainda, foi a constatação que, em ambas as condições experimentais, variações
da força aplicada na superfície e variações da oscilação corporal estavam relacionadas. Na
situação de força ilimitada, mudanças na força e mudanças na oscilação corporal ocorriam
espacial e temporalmente de forma semelhante, sem qualquer diferença temporal. Por outro
lado, na situação de toque suave, as mudanças estavam espacialmente relacionadas mas com uma
diferença temporal entre a força e a oscilação corporal. Mudanças na força aplicada ocorriam de
200 a 300 milésimos de segundo à frente de mudanças na oscilação corporal (JEKA; LACKNER,
1994). Um exemplo desse relacionamento entre força aplicada na superfície e oscilação corporal
é apresentado na figura 2.

Jeka e Lackner (1994) sugeriram que o toque suave da ponta do dedo com a superfície fornece
informação sobre a oscilação corporal que é utilizada na forma de “feedforward” para implementar
o controle postural e, consequentemente, reduzir oscilação corporal. Por exemplo, conforme uma
pessoa oscila na direção da superfície que está tocando, a força aplicada na superfície aumenta na
mesma direção que a pessoa está oscilando, indicando a oscilação da pessoa. A partir da constatação
dessa oscilação, a pessoa diminui a força aplicada na ponta dos dedos, para evitar ultrapassar o
limite imposto (1 N), e utiliza essa informação para iniciar a oscilação do corpo na direção oposta ao
movimento que estava ocorrendo. Dessa forma, mudanças na força aplicada ocorrem à frente das
mudanças correspondentes na oscilação corporal. A diferença de 200 a 300 milésimos de segundo
é decorrente, sugeriram Jeka e Lackner (1994), do tempo necessário para processamento e tomada
de decisão e do tempo necessário para produzir ativação muscular e reverter o momento de inércia
do corpo.

Em um estudo subsequente, Jeka e Lackner (1995) investigaram o mecanismo de “feedforward”,


referente ao uso de informação somatosensória a partir do toque suave com uma superfície, de
forma mais detalhada. Jeka e Lackner (1995) investigaram a atividade eletromiográfica dos
músculos responsáveis pela reversão da oscilação corporal na direção médiolateral, na situação de
toque suave. Os resultados indicaram que a ativação muscular ocorre por volta de 150 milésimos
de segundo após mudanças na força aplicada e, após outros 150 milésimos de segundo, a oscilação
corporal ocorre. Baseados nesses resultados, os autores concluíram que o contato da ponta dos

76
ANEXO

dedos com uma superfície estacionária fornece informação sobre a oscilação corporal que é utilizada
para produzir ativação muscular apropriada, de forma antecipatória (feedforward), com o objetivo
de controlar a oscilação corporal (JEKA; LACKNER, 1995).

Os estudos desenvolvidos por Jeka e Lackner (1994, 1995) indicaram a utilização do ciclo percepção-
ação pelo sistema de controle postural. Informação sensorial e ação motora estão intimamente
relacionados na obtenção da tarefa de manter o corpo em uma determinada posição desejada. Mais
ainda, o funcionamento do sistema de controle postural necessita que esse relacionamento entre
informação sensorial e ação motora seja coerente e estável. Recentemente, esses dois aspectos foram
verificados em estudos desenvolvimentais (BARELA; JEKA; CLARK, 1999a, 1999b). Seguindo
longitudinalmente bebês durante a aquisição da posição em pé independente, Barela, Jeka e Clark
(1999a) observaram que a aquisição de um relacionamento coerente entre informação sensorial e
oscilação corporal é essencial para a solução do problema de manter um corpo composto de muitos
segmentos sobre uma pequena superfície de apoio. Bebês, no curso de aquisição da posição em
pé independente, apresentaram melhoras significativas na manutenção da posição ereta quando
conseguiram incorporar as informações sensoriais provenientes do toque em uma superfície com
uma mão, utilizando a mesma estratégia de feedforward verificada para adultos.

Em outro estudo, Barela, Jeka e Clark (1999b) examinaram a estabilidade do ciclo percepção-ação em
crianças de quatro, seis e oito anos de idade. Essas crianças foram testadas na situação experimental do
toque suave. Os resultados revelaram, primeiro, que oscilação corporal foi reduzida significantemente
com o toque suave da ponta do dedo em uma superfície. Crianças, nas três diferentes idades,
apresentaram redução de 30 a 50% da oscilação corporal na situação de toque suave em comparação
com a situação sem toque. Esse resultado sugere que crianças na faixa de quatro a oito anos estavam
utilizando a informação somatosensória proveniente do contato da ponta dos dedos com a superfície
estacionária. Segundo, essas crianças utilizavam a informação sensorial empregando a mesma
estratégia de “feedforward”, verificada para os adultos. Mudanças na força aplicada pela ponta do
dedo na superfície estacionária estavam relacionadas espacial e temporalmente com mudanças na
oscilação corporal. Semelhantemente aos adultos, mudanças na forças estavam por volta de 300
milésimos de segundos à frente das mudanças na oscilação corporal.

Apesar dessas semelhanças verificadas entre as crianças e os adultos, a estabilidade temporal do


ciclo percepção-ação é mais fraca em crianças do que em adultos. Embora mudanças na força e na
oscilação corporal estivessem relacionadas, os coeficientes de correlação observados para as crianças
foram mais baixos dos observados para os adultos (Barela; Jeka e Clark, 1999b). Um exemplo das
semelhanças e diferenças entre crianças e adultos utilizando o toque suave para atenuar a oscilação
corporal é apresentado na Figura 3. Claramente, pode ser observado que mesmo uma criança de
quatro anos de idade consegue utilizar o toque suave para atenuar a oscilação corporal (comparação
da oscilação nas Figuras 3a e 3b), entretanto, ela não consegue manter um relacionamento
estável entre oscilação corporal e informação sensorial durante a tentativa toda, indicando que o
acoplamento não está desenvolvido nos níveis verificados para adultos. De forma geral, informações
sensoriais são incorporadas na tarefa de controle da posição corporal desejada. Mais ainda, essas
informações são utilizadas de forma contínua, como sugerido ocorrer no ciclo percepção-ação. O
objetivo desse ciclo, como exemplificado para ambos os casos, visão e toque suave, é o de manter
a relação entre a pessoa e o ambiente o mais estável possível. O sistema de controle postural tenta

77
ANEXO

manter a imagem projetada na retina o mais estável e estacionária possível. Da mesma forma, a
relação entre as mudanças de força na ponta do dedo e da oscilação corporal também é mantida a
mais estável possível, pelo menos no caso de adultos. Então, a estratégia utilizada pelo sistema de
controle postural é minimizar as alterações no ciclo percepção-ação, ou seja, minimizar alterações
entre o relacionamento da pessoa e o ambiente.

O uso da informação sensorial para induzir


oscilação corporal
Tendo sugerido que o sistema de controle postural procura minimizar a relação do observador
e o ambiente, a questão que surge é: será que essa minimização ocorre mesmo em casos que a
informação sensorial é manipulada? Na década de setenta, Lee e colaboradores (LEE; ARONSON,
1974; LEE; LISHMAN, 1975; LISHMAN; LEE, 1973) manipularam experimentalmente a
informação visual movendo uma “sala” suspensa. Essa sala, conhecida como “sala móvel”, era
composta pelas paredes laterais, o teto e um dos fundos e podia ser movimentada para frente e
para trás. Adultos e crianças ficavam em pé nela e, quando era movimentada para frente e para
trás, oscilações corporais correspondentes eram observadas. Em alguns casos em que a sala móvel
foi movimentada bruscamente, a manutenção da posição ereta foi comprometida, ocorrendo até
quedas (LEE; ARONSON, 1974). Esses estudos pioneiros de Lee e colegas demonstraram que a
manipulação da informação visual produz alterações na manutenção da orientação postural.
Apesar dos muitos estudos que utilizaram esse paradigma experimental (p. ex.: Bertenthal e Bai,
1989; Butterworth e Hicks, 1977; Delorme, Frigon e Lagacé, 1989; Schmuckler, 1997) muitas
dúvidas ainda persistem com relação ao acoplamento entre informação visual e ação motora no
controle da posição postural.

78
ANEXO

Jeka e colaboradores (JEKA; OIE; SCHÖNER; DIJKSTRA; HENSON, 1998; JEKA; SCHÖNER;
DIJKSTRA; RIBEIRO; LACKNER, 1997; JEKA; SCHÖNER; LACKNER, 1994) examinaram o
relacionamento entre informação somatosensória e ação motora no controle postural. Eles criaram
a versão deles da “sala móvel” para examinar os efeitos do toque suave em uma superfície oscilatória,
posicionada na posição lateral de adultos mantendo a posição ereta. Similarmente à condição do
toque suave na superfície estacionária, contato com a superfície oscilatória ocorreu através da ponta
do dedo indicador com níveis de força abaixo de 1 N. Os resultados revelaram que a oscilação corporal
foi semelhante à frequência de oscilação da superfície e que o relacionamento entre a oscilação da
superfície e a oscilação corporal foi temporalmente estável. Análises mais detalhadas indicaram que
o acoplamento entre a informação proveniente do toque suave na superfície oscilatória e a oscilação
corporal foi baseado na velocidade e posição dos sinais somatosensoriais provenientes da ponta dos
dedos quando em contato com a superfície (JEKA; OIE; SCHÖNER; DIJKSTRA; HENSON, 1998;
JEKA; SCHÖNER; DIJKSTRA; RIBEIRO; LACKNER, 1997).

Os resultados obtidos por Jeka e colegas, tanto na atenuação da oscilação corporal através do toque
suave em uma superfície estacionária quanto na indução de oscilação corporal através do toque
suave em uma superfície oscilatória, indicaram que informação sensorial influencia o sistema de
controle postural através de um acoplamento entre informação sensorial e oscilação corporal. Mais
ainda, o sistema de controle postural procura manter uma relação estável com o meio em que a
posição corporal desejada é mantida. Essa relação estável é mantida, mesmo em situações em que o
sistema de controle postural necessita produzir oscilação corporal, como verificado na situação do
toque suave em uma superfície oscilatória (JEKA; OIE; SCHÖNER; DIJKSTRA; HENSON, 1998;
JEKA; SCHÖNER; DIJKSTRA; RIBEIRO; LACKNER, 1997).

Se o acoplamento entre informação sensorial e ação motora no controle postural é crucial, será
que diferenças comportamentais podem ser decorrentes de diferenças nesse acoplamento? Esse
acoplamento está presente em crianças e, se está, é semelhante ao verificado em adultos? Procurando
responder a essas perguntas Barela, Jeka e Clark (1999c) verificaram o acoplamento entre uma
superfície oscilatória e a oscilação corporal em crianças de quatro, seis e oito anos de idade, utilizando a
estratégia experimental desenvolvida por Jeka e colegas. Crianças tocaram uma superfície oscilatória,
aplicando menos de 1 N de força, com o dedo indicador. Os resultados revelaram que o movimento da
superfície oscilatória induziu oscilação corporal correspondente em crianças.

A figura 4 apresenta a oscilação e respectiva análise espectral da superfície de toque e da oscilação


corporal de uma criança de quatro anos de idade e de um adulto, ao longo de uma tentativa.
Como pode ser verificado, o toque suave da ponta do dedo indicador à uma superfície oscilatória
induz oscilação corporal tanto na criança de quatro anos de idade quanto no adulto (figura 4a e
4c, respectivamente). Conforme a superfície oscilava de lado para outro, correspondente oscilação
corporal foi verificada. Mais ainda, a frequência da oscilação corporal foi semelhante à frequência
de oscilação da superfície de toque. No caso das tentativas apresentadas na figura 4, a frequência de
oscilação da superfície foi de 0,2 Hz. Análise espectral revelou picos bem definidos para o movimento
da superfície e para a oscilação corporal (figura 4b e 4d, respectivamente) ao redor de 0,2 Hz. Apesar
do pico bem definido, a análise espectral revelou uma distribuição de frequência muito mais ampla
ao redor desse pico para a criança de quatro anos do que a verificada para os adultos. Isso indica
que apesar de ser influenciada pelo movimento da superfície e oscilar predominantemente com a

79
ANEXO

mesma frequência da superfície de toque, as crianças apresentam outras frequências compondo a


oscilação corporal.

Barela, Jeka e Clark (1999c) verificaram a estabilidade do acoplamento entre o movimento da


superfície e a oscilação corporal verificando a coerência entre os dois sinais. Os resultados indicaram
que a estabilidade do acoplamento entre a oscilação corporal e a oscilação da superfície foi mais
fraco para as crianças do que para os adultos. Dessa forma, diferenças no controle postural em
crianças parecem ser decorrentes de um acoplamento menos estável entre informação sensorial
e ação motora necessário para a manutenção de uma posição postural desejada (BARELA, 1997).

Conclusão
Durante a manutenção de uma orientação postural desejada, há a necessidade de ocorrer um
relacionamento estável entre o executante e o meio ambiente ao seu redor. Para que isso ocorra,
informação sensorial e ação motora são utilizadas continuamente pelo sistema de controle postural,
formando um ciclo percepção-ação. Esse ciclo está baseado em um relacionamento coerente e
estável que, no caso da utilização da informação somatosensória, ocorre utilizando uma estratégia de
“feedforward”. Neste caso, informação sensorial é utilizada para estimar oscilação corporal e, então,
utilizada para produzir atividade motora antecipatória com o objetivo de minimizar esta oscilação
corporal. Este relacionamento parece não estar totalmente desenvolvido em crianças e pode ser a
causa das diferenças comportamentais entre crianças e adultos com relação ao controle postural.

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