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UFRN – Universidade Federal do Estado do Rio Grande do

Norte

CCHLA - CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES


DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA

SÉRGIO ANTONIO SANTOS DE LIMA

Tópicos Especiais de Metafísica 5

A Imortalidade da Alma

Docente: Dr. Markus Figueira Da Silva

NATAL-2022
O Fédon foi escrito no principal período do pensamento de
Platão, já amadurecido o seu pensamento e influenciado por sua teoria das
ideias e reminiscência que está muito presente nessa obra na qual ele deu
novos conceitos que transcendem a capacidade metafísica da alma onde ele
afirma ser “imortal e renasce, muitas vezes” 1.

A IMORTALIDADE DA ALMA

A palavra grega psykhé é o termo usado por muitos


escritores da antiguidade para o entendimento do que viríamos a chamar na
língua latina de anima ou alma.

Platão considera a alma “a fonte da sabedoria” e das


virtudes, sua valorização é o cerne do Fédon. A questão da imortalidade da alma
e tratada no Fédon nos últimos dias de vida de Sócrates, o grande mestre, que
teve uma atitude tranquila diante seus discípulos por acreditar na imortalidade da
alma argumentava com muita serenidade sobre a morte.

No diálogo com Símias e Cebes, Sócrates ensina que a


Morte não é apenas a separação da alma do corpo, mas uma forma de
conseguir a verdade.

“E é este então o pensamento que nos guia: durante todo o tempo em


que tivermos o corpo, e nossa alma estiver misturada com essa coisa
má, jamais possuiremos completamente o objeto de nossos desejos!”2·.

Para ele a morte é libertação do pensamento. Afirma que a


posse de riquezas é a causa original de todas as guerras, e, se somos levados à
procura de bens, é por causa do corpo, escravos submetidos ao seu serviço. Por
causa de tudo isso que nos ocupamos pouco com a filosofia.

O que é viver com o corpo? São os prazeres e os haveres


que o corpo necessita, nesse sentido quem tem medo de morrer na verdade
tem medo de perder a sensibilidade de continuar gozando tudo o que o corpo
conquistou.

1
Coleção os Pensadores – Fédon. Editora Abril Cultural e Industrial. São Paulo. 1972. P.108 c
2
Ibid, p. 73 – 66b
Mas aquele que construiu a sua alma a viver
independente da dependência do corpo, é preciso considerar que o corpo é
uma prisão da alma3.

Para Sócrates, não se pode querer o assédio do corpo,


devemos apenas concentrar-se apenas naquilo que a alma produz, ou seja, o
pensamento

Antes de tomar a cicuta, Sócrates fala: “Mas pelo menos


há de ser permitido, e é mesmo um dever, dirigir aos deuses uma oração pelo
bom êxito desta mudança de residência daqui para além. É esta minha prece;
assim seja!”4.

Segundo Sócrates, a virtude verdadeira é a sabedoria:


Talvez, ao contrário, exista aqui apenas uma moeda de·real valor em troca da
qual tudo o mais deva ser oferecido: a sabedoria”5

Os argumentos de Sócrates que justificam a imortalidade


da alma são três:

Dos Contrários – Ele prova a crença na metempsicose


em conformidade com uma lei geral da natureza, o Devir (a derivação cíclica dos
opostos).6

“No início de nossa palestra foi afirmado que uma coisa


se forma da coisa contrária; mas, neste momento, o que
se diz é que o contrário em si não se forma de seu
contrário, tanto em nós mesmos como em sua própria
natureza.”

3
Ibid, p.94 83b “Contra essa libertação a alma do verdadeiro filósofo persuade-se de que não
se deve opor, e por isso se afasta tanto quanto possível dos prazeres, assim como dos
desejos, dos incômodos e dos terrores.”
4
Ibid. p. 131e, 132
5
Ibid. p. 77b
6
Ibid. p. 116 b
Para Sócrates, todo o contrário surge do seu contrário: o
feio do belo, o pequeno do grande, etc.; assim a morte nasce da vida e a vida da
morte e que as almas continuam a existir em algum lugar, do qual retornam
ciclicamente, assim como as várias analogias na natureza indicam esta verdade.
De outro modo, o universo estaria parado, não haveria evolução. Noutro polo o
processo de devir ter dois sentidos, de um contrário para o outro e deste
novamente para o primeiro.

Sócrates, afirma que há um ciclo de nascimento, morte e


renascimento. Para que este ciclo se mantenha é necessário que, durante a
morte, as almas existam no Hades de onde regressam, tantas vezes for
necessário até que atinjam a purificação e habitem para sempre no Hades.

“Portanto, meu caro Cebes, a alma é antes de tudo uma coisa imortal e
indestrutível, e nossas almas de fato hão de persistir no Hades”7

Finalizando os argumentos contrários:

“O reviver, o fato de que os vivos - provêm dos mortos, de que as


almas dos mortos têm existência, e – insisto neste ponto - de que a
sorte das almas boas é. melhor, e pior a das almas ruins !”8

Da reminiscência – No entendimento de Sócrates o nosso


conhecimento é um aprendizado de tempos anteriores àquilo que recordamos no
presente9, ou seja, adquirimos antes do nascimento o saber do Belo e do Bom,
do Justo, etc; Isto é possível porque a nossa alma estava em outro lugar antes
de voltar ao corpo. Nesse sentido, a reminiscência é um recordar, pois nosso
saber é um conhecimento que já existia anteriormente.

A teoria das formas ou ideias - Parte de um duplo


princípio entre a distinção das coisas compostas (se decompõem em partes
constitutivas e sempre está em mudança – o corpo) e coisas simples, (não se
decompõem e é imutável – a alma) com base neste argumento ele afirma que a

7
Ibid. p. 120 – 107a
8
Ibid. p. 82e
9
Ibid. p. 85-76a
alma se assemelha com as ideias que são eternas e imutáveis, logo, ela é
imortal.

Com essa argumentação ele afirma e prova para seus


discípulos que mesmo após a morte a alma não se desfaz, permanecendo ativa
no mundo inteligível possuindo uma existência real. A filosofia leva-nos a ter uma
consciência desta imortalidade, não temendo a morte e vendo-a como uma
libertação do pensamento.

Na questão do esquecimento, Sócrates fala:

“De modo que é uma necessidade adquirir o conhecimento de todas


essas coisas antes do nascimento ... E também, supondo pelo menos
que depois de tê-lo adquirido não o esqueçamos constantemente, é
uma necessidade lógica que tenhamos nascido com esse saber eterno,
conservando-o sempre no curso de nossa vida.”10

“O filósofo que está próximo de. morrer a confiança, a convicção de ir


encontrar no além, depois da morte, uma felicidade que jamais teria
alcançado se vivesse doutra forma, essa confiança seria, pensas,
desarrazoada e tola.”11

Sócrates explicita que a morte têm por objetivo a


separação da alma do corpo, sempre discutindo sua posição naquele momento
de sua vida, respondendo os questionamentos dos seus discípulos de forma
espontânea e clara. Esse era o papel do filósofo, ensinar em favor da libertação
da alma que após o cumprimento dessa fase seria iniciada uma nova fase, essa
passagem só pode ser feita pelo amante da sabedoria, tendo em vista que
somente ele não teme a morte, pelo contrário a deseja.

“O homem que realmente consagrou sua vida à filosofia é senhor de


legítima convicção no momento da morte, possui esperança de ir·
encontrar para si; no além, excelentes bens quando estiver morto!”12

10
Ibid., p.85-75e
11
Ibid, p. 108c
12
Ibid, p. 71 – 64a
Só dessa forma o filósofo encontra a verdadeira sabedoria
(no hades), aqueles que temem a morte são homens que então predestinados a
uma vida imoral e desregrada, no sentido contrário, Sócrates declara que um
homem que passou sua vida na filosofia, tem necessariamente coragem para
morrer, pois a filosofia é apenas um exercício para morte

No Fédon, Sócrates responde todos os argumentos que


foram levantados por seus discípulos e afirma:

“Isso, todavia, requer sem dúvida uma justificação, a qual


provavelmente não há de ser coisa fácil, para fazer crer
que depois da morte do homem a alma subsiste com uma
atividade real e com capacidade de pensar.”13

Sócrates defendia que a alma após a morte, não é


destruída nem se desfaz, mas, permanece ativa no mundo inteligível (Hades). A
alma é indestrutível e imortal14 e possui, mesmo após a morte do homem, uma
existência real do pensamento.

13
Ibid. p.78c
14
Ibid, p. 108c

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