INTRODUÇÃO.................................................................................................................................................27
Clélia Spinardi Jubran
PARTE I
DA NATUREZA DO TEXTO FALADO
Hesitação. ......................................................................................................................................................49
Luiz Antônio Marcuschi
Interrupção..................................................................................................................................................69
Maria Cecília Souza-e-Silva e Mercedes Canha Crescitelli
PARTE II
ORGANIZAÇÃO TÓPICA DO TEXTO FALADO
TÓPICO DISCURSIVO.............................................................................................................................85
Clélia Spinardi Jubran
PARTE III
PROCESSOS DE CONSTRUÇÃO TEXTUAL
REPETIÇÃO..................................................................................................................................................... 207
Luiz Antônio Marcuschi
CORREÇÃO..................................................................................................................................................... 241
Leonor Lopes Fávero, Maria Lúcia C. V. O. Andrade
e Zilda Aquino
PARAFRASEAMENTO......................................................................................................................... 257
José Gaston Hilgert
PARENTETIZAÇÃO................................................................................................................................ 279
Clélia Spinardi Jubran
REFERENCIAÇÃO.................................................................................................................................... 351
Luiz Antônio Marcuschi e Ingedore Villaça Koch
PARTE IV
MARCADORES DISCURSIVOS
MARCADORES DISCURSIVOS
BASICAMENTE SEQUENCIADORES................................................................................. 391
Mercedes Sanfelice Risso
MARCADORES DISCURSIVOS
BASICAMENTE INTERACIONAIS......................................................................................... 453
Hudinilson Urbano
BIBLIOGRAFIA............................................................................................................................................ 491
OS AUTORES.................................................................................................................................................. 503
APRESENTAÇÃO DA COLEÇÃO
Ataliba T. de Castilho
buscar assunto para suas pesquisas nas centenas de línguas indígenas brasileiras,
na variabilidade do português brasileiro e nas diversas situações de contato lin-
guístico. Daí para a organização de projetos coletivos de investigação foi um pas-
so, logo dado pelas seguintes iniciativas: Projeto de Estudo da Norma Linguística
Urbana Culta (UFBA, USP, Unicamp, UFPE, UFRJ e UFRS, a partir de 1970); Projeto
Censo Linguístico do Rio de Janeiro, hoje Programa de Estudos de Usos Linguís-
ticos (UFRJ, desde 1972); e Projeto de Aquisição da Linguagem (Unicamp, a partir
de 1975). Já nos anos 1990, surgiram o Projeto Variação Linguística do Sul do
Brasil (UFPR, UFSC e UFRS, desde 1992), o Programa de História do Português (UFBA,
desde 1991), o Projeto do Atlas Linguístico Brasileiro (UFBA, UFJF, UEL, UFRJ e UFRS,
desde 1997), o Projeto para a História do Português Brasileiro (UFAL, UFBA, UFCE,
UFMG, UFPB, UFPR, UFPE, UFPO, UFRJ, UFRN, UFSC, USP, Unicamp, Unesp – Araraquara
e São José do Rio Preto, a partir de 1997), entre tantos outros.
Outro fato que assinalou esse período foi a crescente preocupação para que
dispuséssemos de bons dicionários e de boas gramáticas, mais conformes ao uso
brasileiro do português. No domínio dos dicionários, foram publicados: Ferreira
(1986), Borba (1990), Houaiss (2001) e Borba (2002). No domínio das gramáticas,
cinco iniciativas assinalaram a busca da mudança: Perini (1995, 2010), Bechara
(1999), Neves (2000), Castilho (2010) e Bagno (2011).
Quanto à renovação das gramáticas, deu-se uma notável coincidência, pois
no mesmo ano foram publicados no país quatro livros de caráter programático:
Ilari (1985), Perini (1985), Luft (1985) e Bechara (1985). Mesmo partindo de pers-
pectivas diferentes, seus autores confluíam na defesa da preparação de uma “nova
gramática” do português, mais atenta às alterações que se vinham notando na
realidade linguística do país. O surgimento entre nós dos estudos sobre a língua
falada daria uma resposta decisiva aos planos desses autores.
São Paulo – Castilho e Preti (orgs., 1986, 1987), Preti e Urbano (orgs., 1988);
Rio de Janeiro – Callou (org., 1991), Callou e Lopes (orgs., 1993, 1994);
Salvador – Motta e Rollemberg (orgs., 1994, 2006);
Recife – Sá, Cunha, Lima e Oliveira (orgs., 1996, 2005);
Porto Alegre – Hilgert (org., 1997).
tamento dos dados, não tinham ainda sido publicadas tipograficamente as trans-
crições das entrevistas gravadas em Porto Alegre, no Rio de Janeiro, em Salvador
e em Recife, usando-se para esse fim as transcrições datilografadas, preparadas
pelas equipes respectivas. Com isso, as abonações nesta gramática podem não
corresponder exatamente às das edições tipográficas.
Entre 1988 e 1998 foram realizados dez seminários plenos, terminados, os quais
os textos apresentados e debatidos eram reformulados e publicados em uma série
própria, editada pela Editora da Unicamp: Castilho (org., 1990a; org., 1993), Ilari
(org., 1992), Castilho e Basílio (orgs., 1996), Kato (org., 1996), Koch (org., 1996),
Neves (org., 1999), Abaurre e Rodrigues (orgs., 2002). A Fundação de Amparo à
Pesquisa do Estado de São Paulo financiou as atividades, também apoiadas vez e
outra pelo Conselho Nacional de Pesquisas. Atuaram no PGPF cerca de 32 pesquisa-
dores, ligados a 12 universidades brasileiras, distribuídos pelos seguintes GTs:
A perspectiva formal
GT de Fonética e Fonologia
GT de Morfologia
a uma lista de bases com que ocorre. [...] As condições de produtividade de uma
regra devem ser distintas das condições de produção, que dependem de fatores
de ordem paradigmática, discursiva e sociocultural. [Os fatores paradigmáticos
são determinados pela existência de regras em competição; o tipo de discurso
utilizado permitirá ou estimulará certos tipos de formação; as condições cul-
turais criam referentes a serem rotulados.] Tanto as condições de produtivida-
de quanto as condições de produção estão ligadas a funções dos processos de
formação. Temos sobretudo três funções na formação de palavras: a mudança
categorial, a rotulação e a avaliação expressiva. (Basílio apud Castilho, 2006: 18)
GT de Relações Gramaticais
Esse GT estipulou
A perspectiva funcional
que ponto elas são aplicáveis ao estoque de itens constantes do corpus. Atuando
assim, os pesquisadores se deram conta de que nem todos os advérbios, por exem-
plo, podem ser realmente entendidos como tais. Para encaminhar o problema,
foram postulados quatro processos básicos de constituição do enunciado: a refe-
renciação, a predicação, a conjunção e a foricidade, que inclui a dêixis.
Na análise dos advérbios, esses processos foram assim utilizados:
GT de Organização Textual-Interativa
O GT de Organização Textual-Interativa parte de
[...] uma concepção específica de linguagem, que passa a ser vista como uma
forma de ação, uma atividade verbal exercida entre dois protagonistas, dentro
de uma localização contextual, em que um se situa reciprocamente em relação
ao outro, levando em conta circunstâncias da enunciação, de que fazem parte os
entornos espaçotemporal e histórico-social que unem os interlocutores. (Koch
apud Castilho, 2006: 21)
O ponto forte da articulação desse GT está em sua “visão de linguagem como ma-
nifestação de uma competência comunicativa, definível como capacidade de manter
a interação social mediante a produção e o entendimento de textos que funcionam
comunicativamente” (Koch apud Castilho, 2006: 21). Seus pesquisadores insistem em
que essa competência comunicativa não tem, com relação à competência linguística,
um caráter de exclusão ou de adição. Por outras palavras, não se trata de
APRESENTAÇÃO DA COLEÇÃO • 23
O texto enquanto objeto de estudo deve ser definido como um produto lin-
guístico marcado pela dinâmica da atuação interacional. A Pragmática, a Análise
da Conversação e a Linguística do Texto fornecem os marcos dentro dos quais se
movimentam as análises: “a visão do texto falado como uma atividade estrutura-
da, que apresenta regularidades próprias de organização, sustenta a possibilidade
de uma abordagem gramatical do texto”. (Koch apud Castilho, 2006: 21)
Para operacionalizar tais conceitos, esse GT investigou a natureza e especifici-
dade de produção do texto falado, sua organização tópica, os processos de cons-
trução textual e os marcadores discursivos, pondo em destaque as funções textuais
e interacionais desempenhadas pelos processos e mecanismos de elaboração do
texto falado.
Grupo de Organização
Textual-Interativa: desafios
No interior do Projeto de Gramática do Português Falado (PGPF), consti-
tuiu-se um grupo responsável por estudos sobre a organização textual-interativa
do texto falado, coordenado por Ingedore Grunfeld Villaça Koch. Ao finalizar
seus trabalhos, esse grupo era integrado pelos seguintes pesquisadores: Ingedore
Grunfeld Villaça Koch (Unicamp), Luiz Antônio Marcuschi (UFPE), Leonor Lopes
Fávero (USP), Maria Lúcia Victório de Oliveira Andrade (USP), Hudinilson Urbano
(USP), Zilda Gaspar Oliveira Aquino (USP), Maria Cecília Pérez de Souza-e-Silva
(PUC-SP), Luiz Carlos Travaglia (UFU-MG), José Gaston Hilgert (UPF-RS), Giselle
Machline de Oliveira e Silva (UFRJ), Mercedes Sanfelice Risso (Unesp-Assis) e
Clélia Cândida Abreu Spinardi Jubran (Unesp-São José do Rio Preto).
Os textos deste volume são de autoria desses pesquisadores e resultam da reela-
boração dos trabalhos por eles realizados para o PGPF. A consolidação da produção
do grupo foi feita, entre 2000 e 2004, por Ingedore Grunfeld Villaça Koch e Clé-
lia Cândida Abreu Spinardi Jubran e, parcialmente, por Mercedes Sanfelice Risso.
Cumpre destacar a colaboração essencial de José Gaston Hilgert, em vários momen-
tos da elaboração do volume. Dessa consolidação resultou a publicação, em 2006,
pela Editora da Unicamp, do volume I da Gramática do português culto falado no
Brasil: a construção do texto falado, organizado por Clélia Cândida Abreu Spinardi
Jubran e Ingedore Grunfeld Villaça Koch. A organização do presente volume, para
a publicação pela Contexto, ficou a cargo de Clélia Cândida Abreu Spinardi Jubran.
28 • A construção DO TEXTO FALADO
A perspectiva textual-interativa
A seleção de uma perspectiva textual-interativa implica uma opção teórica
em face das diferentes formas de conceber a linguagem e, em decorrência dessa
opção, uma definição da natureza da abordagem gramatical do objeto de análise
recortado a partir desse ponto de vista.
Dado que a linguagem verbal é uma realidade múltipla e complexa, que com-
porta uma variedade de aspectos, são distintos os critérios a partir dos quais ela
pode ser definida, em conformidade com a diversidade de suas concepções: como
sistema de signos, instrumento de comunicação, fenômeno social, humano, históri-
co, psicofísico-fisiológico, meio de transmissão de pensamento, ideias, sentimentos.
A adoção de um enfoque textual-interativo apoia-se na concepção de lingua-
gem como uma forma de ação, uma atividade verbal exercida entre pelo menos
dois interlocutores, dentro de uma localização contextual, em que um se situa reci-
procamente em relação ao outro, levando em conta circunstâncias de enunciação.
Ressalta-se, assim, a visão de linguagem como manifestação de uma competência
comunicativa, definível como capacidade de manter a interação social, mediante
a produção e o entendimento de textos que funcionam comunicativamente.
Essa competência comunicativa não tem um caráter de exclusão ou adição à
competência linguística, entendida como conhecimento de um sistema de regras,
interiorizado pelos falantes, que lhes permite produzir, interpretar e reconhecer
orações. Antes, ela implica esse saber linguístico, na medida em que o requer para
o processamento das estruturas linguísticas na constituição de um texto. A com-
petência comunicativa aciona, pois, tal saber linguístico, conjugando-o a opera-
ções instauradas por uma ordem específica de fatores, que dão estatuto textual ao
produto da interlocução verbal. Os textos, unidades que resultam da ação verbal,
são, nesse sentido, de acordo com Schmidt (1978), entidades comunicativas ver-
balmente realizadas, e não entidades linguísticas com um caráter comunicativo.
Já que a competência comunicativa se manifesta em textos, esse ponto de vista
particular sobre o heterogêneo fenômeno da linguagem, que leva a pesquisar a
INTRODUÇÃO • 33
língua sob a forma com que ela se manifesta na interação, tem por decorrência o
estabelecimento do texto como objeto de estudo.
A concepção de linguagem como atividade de interação social e a consequen-
te eleição do produto dessa interação – o texto – como objeto de estudo assentam-
se em uma base teórica que congrega princípios da Pragmática, da Linguística
Textual e da Análise da Conversação.
A primazia da dimensão comunicativo-interacional é respaldada por uma óti-
ca pragmática, que orienta a descrição de dados linguístico-textuais essencialmente
a partir de seu funcionamento em situações concretas de uso da linguagem. Assu-
mir um ponto de vista pragmático significa considerar a linguagem como atividade
que, realizada verbalmente, deve ser estudada dentro do quadro de suas condições
de efetivação. A entrada da linha Pragmática, no Projeto Gramática do Português
Falado, leva a colocar em foco, na reflexão gramatical, a questão da linguagem re-
lativamente aos usuários reciprocamente situados no processo de interação verbal.
Os estudos apresentados neste volume assumem o princípio de que os fatores
interacionais são inerentes à expressão linguística, pela introjeção natural da ativi-
dade discursiva no processamento verbal de um ato comunicativo. Nesse sentido,
os dados pragmáticos não são vistos como moldura dentro da qual se processa o
intercâmbio linguístico, ou como camada de enunciação que envolve os enuncia-
dos. As condições comunicativas que sustentam a ação verbal inscrevem-se na su-
perfície textual, de modo que se observam marcas do processamento formulativo-
interacional na materialidade linguística do texto. No âmbito de uma descrição
textual-interativa é, portanto, fundamental observar as marcas concretas que a
situação enunciativa imprime nos enunciados, a fim de investigar os processos de
construção textual e as funções textual-interativas exercidas por eles.
Considerando a imbricação dos processos de formulação textual e de inte-
ração, a análise das estratégias de elaboração textual não dicotomiza as funções
textual e interativa, e sim as conjuga, pautando-se, porém, por um princípio de gra-
diência, segundo a dominância de uma ou outra. Ou seja, quando um determina-
do procedimento de construção textual atua preponderantemente na organização
informacional do texto, decresce a manifestação das contingências da interlocu-
ção, sem que se obliterem as demandas pragmáticas para a ocorrência desse pro-
cedimento. Por outro lado, quando um procedimento de textualização apresenta
uma tendência mais acentuada para focalizar a atividade enunciativa, sinalizando
o predomínio da função interacional, sua funcionalidade no andamento do fluxo
informacional passa a segundo plano, sem que, com isso, sejam anuladas as suas
implicações no desenvolvimento do texto. Isso porque a explicitação de dados da
atividade enunciativa na materialidade textual tem papel importante no estabe-
lecimento das referências ativadas pelos interlocutores em suas falas, dentro do
34 • A construção DO TEXTO FALADO
mente linguísticas (cf. Sacks, Schegloff e Jefferson, 1974). Nos seus desdobramen-
tos posteriores, a Análise da Conversação ganhou outras dimensões, porque, ao
examinar a oralidade, incluiu questões mais amplas a propósito da língua falada,
abrangendo situações diversificadas de intercurso verbal. A contribuição da Aná-
lise da Conversação entra em nossos estudos com esse alcance mais abrangente,
ou seja, sem a tendência etnometodológica dos primeiros momentos, que se mos-
tra insuficiente para o tratamento linguístico-textual do corpus, e sem a restrição
às situações altamente informais de interlocução.
Em síntese, a perspectiva textual-interativa, adotada no decorrer deste vo-
lume, apoia-se em fundamentos teóricos que emergem do tripé Pragmática/Lin-
guística Textual/Análise da Conversação, calcado na preocupação com o funcio-
namento da língua em contextos de uso e, portanto, com a atualização da ativi-
dade discursiva em textos. O foco de investigação concentra-se, dessa forma, na
construção do texto falado, integrada aos fatores enunciativos que lhe dão exis-
tência e que se revelam nos próprios processos de elaboração textual. Amparadas
nessa ótica, as pesquisas sobre o texto falado, apresentadas neste volume, não dis-
sociam as suas características estruturais da dinâmica dos processos formulativo-
interacionais sistematicamente envolvidos em sua produção. Nesse sentido, elas
se afastam de referências teóricas fundadas em concepções dicotômicas como lín-
gua/fala, competência/desempenho.
Essa visão integrativa entre estruturas e processamento de estruturas textuais
leva a admitir não só regularidades referentes à estruturação textual, mas também
princípios que norteiam o desempenho verbal – o que significa reconhecer a exis-
tência de regras que caracterizam a organização do texto e a sistematicidade da
atividade discursiva.
É sabido que as regras de construção do texto, seja ele escrito ou falado, não
se firmam como projeção automática de regras que vigoram no nível da frase.
Enquanto unidade sociocomunicativa globalizadora, o texto apresenta proprie-
dades de coesão e coerência fundadas numa ordem própria de relações consti-
tutivas, diferenciadas das que se estabelecem no limite frasal. No caso do texto
falado, essas relações ganham feitios específicos, devido à sua natureza emergente,
de produção momentânea e dinâmica, em uma situação concreta de interlocu-
ção: o texto ancora-se fortemente em dados pragmáticos que interferem na sua
constituição. Por esse motivo, no que diz respeito ao texto, as regularidades se
manifestam prevalentemente como princípios de processamento de estruturas,
e não como princípios constitutivos de estruturas, como se poderia observar nos
sistemas fonológico e morfossintático. A descrição do sistema textual terá, então,
a particularidade de apontar regularidades, na construção do texto falado, mais
relacionadas ao processamento de estruturas. O caráter sistemático de determi-
36 • A construção DO TEXTO FALADO