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Caro acadêmico,
Para começar o nosso diálogo é importante dizer a você que é um grande prazer tê-lo,
aqui, como estudante nesta disciplina. Para isso, foi traçado com o objetivo de construir ou ampliar
seus conhecimentos sobre psicologia do desenvolvimento e da aprendizagem humana,
privilegiando as mudanças que ocorrem durante todo o ciclo vital humano, a vivência dos
processos psicológicos e psicopatológicos, bem como as contribuições das neurociências para a
aprendizagem.
No segundo capítulo, o debate direcionou seu olhar para o ciclo vital, problematizando as
condições e o lugar da infância, da juventude, do adulto e do idoso e as questões que interferem
nos processos de desenvolvimento humano e da aprendizagem, bem como os processos
psicopatológicos desses sujeitos e sua complexidade em nossa sociedade.
A partir dessas discussões e reflexões propostas, espera-se que você demonstre, ao final
desta disciplina, seu aprendizado com relação à Psicologia do desenvolvimento e da
aprendizagem humana, especialmente, como desenvolvemos e como aprendemos do nascimento
até à morte, bem como as neurociências contribuem para o desenvolvimento e a aprendizagem
dos sujeitos escolares.
FONTE: <http://supervisaoclinicanaenfermagem.wdfiles.com/local--files/desenvolvimento
-pessoal-e-profissional/CONTENT.gif>. Acesso em: 27 de jun. de 2019.
Será que dar apoio a um parente ou amigo com uma escuta sensível, nos dias de hoje,
pode ser “interpretado” como um comportamento psicológico?
A Psicologia, de acordo com Serbena e Raffaelli (2003, p. 31), pode ser compreendida
como o “[...] estudo da alma ou da subjetividade, havendo necessidade de um discurso simbólico
e subjetivo complementando o racional e o objetivo”. O termo ‘alma’ pode ser visto como uma
metáfora da psique e os diversos discursos ou disciplinas psicológicas seriam explorações desta
metáfora, permitindo ampliar sua expressão e compreensão.
Schultz e Schultz (2002 apud SERBENA; RAFFAELLI, 2003, p. 32) apontam algumas
mudanças na Psicologia, especialmente, em sua conceituação ao longo da história. Para os
autores, “a Psicologia Científica surgiu aproximadamente no ano de 1879 por meio da atuação de
William Wundt, na Alemanha, por ocasião da criação do primeiro Laboratório de Psicologia
Experimental”.
Em seu artigo “Psicologia como disciplina científica e discurso sobre a alma: problemas
epistemológicos e ideológicos”, Serbena e Raffaelli (2003, p. 35) afirmam que a Psicologia
“começou a ser vista como um ramo da Filosofia que estudava, mais especificamente, a alma. Ela
foi definida como um “princípio de pensamento” e como a animação do corpo”. Ressaltam, ainda,
que na filosofia moderna a alma também é entendida como sujeito.
Titchener (1924, p. 28 apud SERBENA; RAFFAELLI, 2003, p. 32) afirma, ainda, que “[...] o
objeto da Psicologia era a experiência humana”. Já James (1916, p. 1, tradução nossa) privilegiou
a consciência: “é a Psicologia, usando a definição imbatível de Ladd, a descrição e explicação dos
estados de consciência como tal”.
Serbena e Raffaelli (2003, p. 31) dizem que é, ainda, comum em alguns manuais de
Psicologia trazer a definição de Psicologia como a ciência da alma e da mente, cujo objeto central
dessa ciência “é entender o comportamento humano e dos animais”. Entretanto, ressaltam que a
Psicologia vem, há muitos anos, ultrapassando esse limite. Para os autores, a Psicologia pode ser
entendida como:
[...] “ciência do comportamento” necessita de uma revisão de seus pressupostos
básicos. O cunho comportamentalista dessa definição é evidente e representa o
predomínio histórico das correntes neopositivistas e materialistas no campo
psicológico, contrapondo-se à própria etimologia da palavra Psicologia, que
significa estudo da alma. Esse é, talvez, um dos poucos casos em que uma
ciência não é definida de acordo com a sua etimologia, afinal a Biologia estuda a
vida, a Geologia a Terra, e assim por diante. Esse predomínio torna-se claro
desde a afirmação da psicologia científica enquanto um ramo da biologia e da
fisiologia, apoiada nas perspectivas epistemológicas derivadas da física clássica,
aceitando-se implicitamente o primado da matéria sobre o espírito (SERBENA;
RAFFAELLI, 2003, p. 31).
Com foco na discussão acerca do lugar da afetividade no processo educativo e as suas relações
com a aprendizagem, indicamos que assista às lições sobre o papel das emoções para a
atribuição de significados ao aprender, que estão disponíveis no seguinte vídeo no YouTube:
https://www.youtube.com/watch?v=6QfbBcjtGuM.
Por fim, ao término deste capítulo, esperamos que os estudantes sejam capazes de
demonstrar seu aprendizado com relação à conceituação da Psicologia do desenvolvimento e da
aprendizagem e suas bases teórico-metodológicas, bem como se posicionem acerca da
importância da cognição, da afetividade e das influências na aprendizagem, especialmente como
desenvolvemos e aprendemos ao longo da vida.
Do final do século passado para os dias atuais, constata-se que a sociedade brasileira vem
se tornando mais plural e mais complexa, exigindo novas formas de intervenções e
posicionamentos críticos por parte das instituições e das pessoas em todas as áreas do
conhecimento. A Psicologia do desenvolvimento e da aprendizagem humana são duas dessas
áreas de conhecimento e de aplicação prática que se apresentam como extremamente relevantes
para dar continuidade aos processos de desenvolvimento e de aprendizagem humana.
LÉO - ESTUDANDO:
O termo “psicologia” é usado pela primeira vez em 1590 como título de uma obra escrita por
Rudolf Goclenius (1547-1628), professor da Universidade de Marburgo, na Alemanha, e que ficou
muito conhecido na época por suas contribuições à terminologia filosófica. Logo de início, a
história da Psicologia foi confundida com a Filosofia até meados do século XIX. A partir do século
XIX, com o positivismo de Auguste Comte (1798-1857), a construção do conhecimento psicológico
foi ganhando corpo e delimitando seu objeto de estudo, buscando compreender os processos
mentais, os sentimentos, a razão, o inconsciente, as atividades psíquicas e o comportamento
humano e animal. No século XX, a Psicologia passa a ser vista como ciência. “Uma visão
abreviada de seu nascimento nos remete ao primeiro laboratório de psicofisiologia criado por
Wilhem Wundt (1832-1920), na Universidade de Leipizig (Alemanha)” (NETTO; COSTA, 2017, p.
217).
Biaggio e Monteiro (1998) afirmaram que houve, de certa forma, no período entre 1960 e
1990, um grande interesse em compreender como os homens se desenvolviam e aprendiam.
Essa questão não é novidade. Muitos pensadores e pesquisadores se debruçaram sobre isso
desde a Antiguidade. Nesse período mais recente, foi ampliado, significativamente, o número de
pesquisas nesse campo da Psicologia do desenvolvimento humano e da aprendizagem.
Entretanto, não se pode ignorar que, nesse período, em meados da década de 1970, essas áreas
sofreram, também, grandes influências da teoria behaviorista e da aprendizagem social. Somados
a isso, registrou-se o despertar do interesse dos pesquisadores do desenvolvimento e da
educação pela teoria genética de Piaget, como arcabouço teórico.
Cada vez mais o desenvolvimento foi estudado ao longo do ciclo vital, ao invés da
tradicional ênfase na infância e na adolescência. Magnusson e Cairns (1996) propuseram que as
mudanças de perspectivas do estudo do desenvolvimento humano constituíssem uma Ciência do
Desenvolvimento Humano, uma disciplina independente que englobasse conhecimentos não só
da psicologia, mas de outras áreas afins. Com isso, fundou-se, em 1998, a “Sociedade Brasileira
de Psicologia do Desenvolvimento” no Brasil.
[...] novo domínio científico que reúne diversas áreas do saber em torno da
temática sobre desenvolvimento humano e do seu estudo em uma perspectiva
integradora, com princípios e conceitos que consideram a tessitura singular e
complexa que caracteriza os indivíduos e suas relações contextualizadas. Partindo
dos avanços científicos das últimas décadas do século XX, em diferentes áreas
dedicadas ao estudo do desenvolvimento humano, a Ciência do Desenvolvimento
delineia um conjunto de estudos interdisciplinares que se dedicam a entender os
fenômenos relacionados ao desenvolvimento dos indivíduos, englobando as áreas
social, psicológica e biocomportamental, focalizando a ontogênese dos processos
evolutivos desde seus eventos genéticos constitutivos até os processos culturais
(ARAUJO, 2006, p. 133).
A ontogênese pode ser vista como um processo de construção ao longo do curso de vida pela
Teoria da Evolução de Darwin (BJORKLUND; PELLEGRINI, 2000). Outra explicação para o foco
na mente adulta pode ser encontrada nas ideias de Tooby e Cosmides (1992), no capítulo “The
Psychological Foundations of Culture”, no qual apresentam ideias evolucionistas, partindo da
crítica ao modelo padrão das ciências sociais (STANDARD SOCIAL SCIENCES MODEL/SSSM).
Como esse modelo destaca, prioritariamente, o papel da ontogênese na explicação do
desenvolvimento humano, hipotetiza-se que a negligência da ontogênese pelos autores da
Psicologia Evolucionista deva-se, também, a uma reação a esse modelo. Segundo Tooby e
Cosmides (1992), o SSSM entende o funcionamento humano com base em alguns pressupostos:
1) os bebês nascem com o mesmo aparato biológico, portanto, algo tão constante não seria capaz
de explicar a variação verificada no comportamento dos adultos; 2) como os bebês não possuem
toda competência cognitiva e social dos adultos, sua estrutura rudimentar precisa de uma fonte
externa para desenvolver-se, algo fora deles; 3) a fonte de que o bebê precisa está presente no
mundo social na forma de comportamentos e representações dos membros dos grupos, a cultura.
Assim, a organização mental é categorizada em: inata (o que vem com o bebê, é visível,
geneticamente programada, biológica) e social (cultural, aprendida ou adquirida no ambiente)
(MARTINS; VIEIRA, 2010).
LÉO – OUTRO:
No Brasil, funda-se, em 1998, a “Sociedade Brasileira de Psicologia do Desenvolvimento”. Os
objetos de pesquisa anteriores permanecem, mas observa-se um maior interesse por estudos no
curso da vida e por abordagens contextuais e sistêmicas, como a teoria ecológica de
Bronfenbrenner. Quanto aos métodos de pesquisa propõem-se novos paradigmas metodológicos,
estudos sistêmicos, longitudinais, transculturais, transgeracionais e multimetodológicos (DESSEN;
COSTA JUNIOR, 2005).
Foi possível identificar a partir do novo século, nos anos 2000, que os pesquisadores do
desenvolvimento humano passaram a enfrentar, ainda, mais desafios. Entre eles, o de inserir, em
suas pesquisas, o caráter multidisciplinar com uma linguagem que facilitasse a comunicação entre
profissionais de diferentes áreas de atuação (DESSEN; COSTA JUNIOR, 2005). Outro desafio foi
o de refletir sobre novas metodologias para os estudos, isto é, os pesquisadores precisavam
ultrapassar as metodologias tradicionais e refletir com seus pares que o desenvolvimento humano
ocorre em um contexto.
Mota (2005, p. 110) destacou que as abordagens sistêmicas enfatizaram a relevância dos
“diversos contextos que não só afetam, mas também são afetados pelo desenvolvimento do
indivíduo”. Com isso, o desenvolvimento humano passou a ser estudado como um ciclo. Essa
forma de encarar o desenvolvimento humano trouxe mudanças importantes para os resultados
dos estudos, inclusive pautaram a necessidade de realizar uma discussão mais ampliada sobre
metodologias de pesquisa com as instituições e os grupos de pesquisas.
Por outro lado, Raposo e Queiroz (2008) destacam que, de acordo com a concepção de
desenvolvimento e de aprendizagem escolhidas consciente ou não, fazemos a seleção de um
determinado referencial teórico que estará vinculado a um tipo de mundo que se quer ter, de um
tipo de homem que se quer formar para construir esse mundo e essa sociedade e de um tipo de
educação que propiciará o desenvolvimento e a aprendizagem desse sujeito.
Assim, o processo de desenvolvimento é fruto de toda uma vida. Nenhum ser humano
pode se desenvolver totalmente na infância. É preciso passar por outras etapas da vida para que
tenha um desenvolvimento pleno (BISSOL, 2014).
Enfim, podemos dizer que a Psicologia do desenvolvimento se configura como uma área
que tem como objetivo estudar as mudanças das pessoas, a partir da interação dos processos
físicos e psicológicos durante toda a vida em suas etapas. Essas etapas são vistas como um todo,
ou seja, da concepção ao final da vida. Com isso, é relevante que os profissionais compreendam
os princípios que embasam as teorias do desenvolvimento humano. Ford e Lerner (1992, p. 73)
ressaltam que o desenvolvimento pode ser visto como um:
Um dos aspectos essenciais postulados por Vygotsky (1998) é que o ambiente é a fonte de
desenvolvimento humano e não o lugar ou a situação, uma vez que o ser humano é
essencialmente social e sem a interação com os outros, a pessoa não poderá desenvolver-se,
usufruindo dos resultados construídos na evolução histórica da espécie humana. Tomando como
referência um bebê, na visão do autor, o ambiente exerce influência em seu desenvolvimento
desde o nascimento, uma vez que esse bebê começou a interagir com os adultos, cuja linguagem
verbal e não verbal está presente no ambiente de uma forma desenvolvida, isto é, o bebê vivencia
a linguagem dos adultos normalmente em sua interação. Os adultos não modificam sua fala com
outros sujeitos porque em sua casa tem um bebê.
LÉO – OUTRO:
Apresentamos o fragmento de texto do livro Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento um
processo sócio-histórico, publicado por Martha Kohl de Oliveira (1993, p. 57), com a intenção de
enriquecer seu aprendizado nesta disciplina. Confira a seguir:
Alguns autores vêm afirmando que essas ações, cognição e afetividade, apesar de não
trazerem, ainda, uma definição precisa sobre cada uma delas, estão sendo solicitadas, nos
debates educacionais, pelos gestores, professores, famílias e estudantes para estarem presentes
nas pautas de forma articulada nas propostas e práticas pedagógicas nas últimas décadas
(LEITE, 2012).
Assim, as propostas educacionais devem assumir um fazer pedagógico pautado na
dimensão conhecimentos cognitivo-afetivos (ARANTES, 2002). A partir dessas discussões, é
possível que seja ultrapassada a ideia de que inteligência e afetividade sejam vistas como ações
dicotômicas e/ou separadas no processo de construção do conhecimentos e aprendizagem. Ao
contrário, acredita-se que o conhecimento dos sentimentos e das emoções requer ações
cognitivas, da mesma forma que essas ações cognitivas pressupõem a presença de aspectos
afetivos. Talvez faltem, ainda, em nossa linguagem cotidiana e acadêmica, expressões como
“conhecimento sentido” ou – por que não? –, “sentimento conhecido” (ARANTES, 2002).
Em decorrência dessas discussões, faz sentido refletir que não há oposição entre pensar e
sentir. Com isso parece razoável afirmar que no trabalho pedagógico não exixte uma
aprendizagem apenas cognitiva ou racional, pois estudantes e professores não deixam aspectos
afetivos do “lado de fora” da sala de aula, quando estão construindo o conhecimento escolar ou
não deixam “latentes” seus sentimentos, afetos e relações interpessoais, enquanto aprendem na
escola ou em qualquer lugar.
De forma semelhante a Piaget, Vygotsky (1984, p. 35) diz que a cognição pode ser
compreendida como a “capacidade de uma pessoa processar informações e transformá-las em
conhecimentos, com base em um conjunto de habilidades mentais e/ou cerebrais, tais como: a
percepção, a atenção, a associação, a imaginação, o juízo, o raciocínio e a memória”.
[...] dimensão constituinte de todo ser humano, pois ela exerce um papel
fundamental na vida psíquica das pessoas, pois emoções e sentimentos são
“combustíveis” que alimentam o psiquismo e estão presentes em todas as
expressões de vida. Enfim, a afetividade parece a mais evidente manifestação da
nossa subjetividade, na qual se encontram os sentimentos, as emoções, as
paixões, o medo, o sofrimento, o interesse, a tristeza, a alegria.
Barreto (1998, p. 71) menciona outros elementos para aprimorar a definição do termo
quando diz que a afetividade pode ser compreendida como “[...] o conjunto de fenômenos
psíquicos que se manifestam sob as formas de emoções, sentimentos e paixões, acompanhados
sempre da impressão de dor ou de prazer, de satisfação ou insatisfação, de agrado ou desagrado,
de alegria ou tristeza”. Portanto, é a mistura de todos os sentimentos: amor, ciúme, raiva, inveja,
saudade. Uma forma de aprender a cuidar corretamente de todas essas emoções poderá
possibilitar ao sujeito uma vida emocional plena e equilibrada.
Por outro lado, a dimensão afetiva pode ser considerada, ainda, como a energia vital que
impulsiona os sujeitos durante sua existência, ou seja, ela conduz o sujeito para desempenhar as
ações. Desse modo, é um elemento indispensável ao desenvolvimento humano, pois a sua
presença ou a sua ausência influencia significativamente o desenvolvimento humano, pois ela é a
“substância” que nutre as ações e que, consequentemente, potencializa a vida humana.
Bases teóricas
Este é um tema sobre o qual é fundamental a construção de um modelo teórico adequado, que
possibilite uma compreensão que ultrapasse o olhar tradicional ou o senso comum sobre a
relação razão x emoção, como já foi discutido. Um modelo teórico que nos ajude a entender que o
Homem é um ser único; que o dualismo é uma leitura artificial da constituição humana, produzido
pelo próprio Homem em função de determinadas condições históricas, políticas e sociais; que o
Homem é um ser que pensa e sente simultaneamente, sendo que a emoção está sempre
presente na relação do Homem com a cultura; que, portanto, razão e emoção são indissociáveis,
o que aponta para uma concepção holística/monista sobre a constituição humana. Enfim, este é
um tema que exige estudo e o exercício da reflexão, uma vez que essas questões frequentemente
esbarram e colidem com velhas concepções ideológicas, de natureza liberal, muitas delas ainda
fortemente presentes na própria constituição de nossa subjetividade.
Portanto, no campo da teoria psicológica, buscamos respaldo, para ancorar as pesquisas do
Grupo do Afeto, em autores que apresentam, em comum, teorias com pressupostos centrados na
concepção materialista dialética, segundo a qual o processo de desenvolvimento humano e,
portanto, as funções superiores que caracterizam o homem devem ser explicados pelas relações
que o homem mantém com a sua cultura, no seu ambiente social. Para esses autores, o objetivo
da teoria psicológica é explicar os mecanismos pelos quais os processos naturais/filogenéticos,
presentes no recém-nascido, se mesclam com os processos culturais e sociais para produzir as
funções complexas que caracterizam o homem maduro.
Wallon (1968; 1971; 1978) desenvolveu uma teoria sobre o processo de desenvolvimento humano
centrado no processo de relação entre quatro grandes núcleos funcionais, determinantes do
processo: a afetividade, a cognição, o movimento e a pessoa. Para o autor, o processo de
desenvolvimento, que ocorre através da contínua interação entre esses núcleos, só pode ser
explicado pela relação dialética entre os processos biológicos/orgânicos e o ambiente social – ou
seja, o biológico e o social são indissociáveis, estando dialeticamente sempre relacionados.
Para Wallon (1968), as emoções são manifestações de estados subjetivos, mas com
componentes orgânicos (contrações musculares, viscerais etc.). Assim, na teoria walloniana, a
emoção é o primeiro e mais forte vínculo que se estabelece entre o sujeito e as pessoas do
ambiente, constituindo as manifestações iniciais de estados subjetivos, com componentes
orgânicos. Apresenta três propriedades: a) contagiosidade – a capacidade de contaminar o outro;
b) plasticidade – a capacidade de refletir sobre o corpo os seus sinais; c) regressividade – a
capacidade de regredir as atividades ao raciocínio. Para o autor (WALLON, 1971), caberá às
manifestações emocionais, através do seu poder de contágio, possibilitar ao recém-nascido
sensibilizar as pessoas do ambiente para satisfazer suas necessidades e desejos.
A afetividade, por sua vez, envolve uma gama maior de manifestações, englobando as emoções
(de origem biológica) e os sentimentos (de origem psicológica). Neste sentido, é um processo
mais amplo, que envolve a emoção, o sentimento e a paixão. Segundo Mahoney (2004, p. 17-18),
“as emoções são identificadas pelo seu lado orgânico, empírico e de curta duração; os
sentimentos, mais pelo componente representacional e de maior duração. A paixão é encoberta,
mais duradoura, mais intensa, mais focada e com mais autocontrole sobre o comportamento”.
Assim, a afetividade é um conceito mais amplo, constituindo-se mais tarde no processo de
desenvolvimento humano, envolvendo vivências e formas de expressão mais complexas,
desenvolvendo-se com a apropriação, pelo indivíduo, dos processos simbólicos da cultura, que
vão possibilitar sua representação. É um conceito que “além de envolver um componente
orgânico, corporal, motor e plástico, que é a emoção, apresenta também um componente
cognitivo, representacional, que são os sentimentos e a paixão” (DÉR, 2004, p. 61). Deve-se, no
entanto, relembrar que a complexificação das formas de manifestação afetivas – que alguns
autores caracterizam como cognitivização do processo de desenvolvimento afetivo – só pode ser
atingida através da mediação cultural, a partir, portanto, de um ambiente social (DANTAS, 1992).
Desta forma, emoção e cognição coexistem no indivíduo em todos os momentos, embora, nas
diversas etapas do desenvolvimento, Wallon defende que há um predomínio alternado entre as
duas funções. Como lembra Almeida (1999, p. 29), “a inteligência não se desenvolve sem
afetividade, e vice-versa, pois ambas compõem uma unidade de contrários”.
Vygotsky (1993; 1998), por sua vez, de maneira semelhante, assume uma posição segundo a
qual o indivíduo nasce como ser biológico, fruto da história filogenética da espécie, mas que,
através da inserção na cultura, constituir-se-á como um ser sócio-histórico, ou seja, o ser humano
nasce com as chamadas funções elementares, de natureza biológica. Cabe à teoria psicológica
explicar como tais funções, a partir da inserção cultural, vão se constituir nas chamadas funções
superiores, que caracterizam o ser humano.
Oliveira (1993) resume as ideias basilares da teoria vygotskyana: a) as funções psicológicas
superiores têm suporte biológico, pois são produtos da atividade cerebral; o cérebro, assumido
como a base biológica do funcionamento psicológico, é entendido como um sistema aberto e de
grande plasticidade, o que permite as imensas possibilidades de realização humana e a enorme
capacidade de adaptação do homem; b) o funcionamento psicológico fundamenta-se nas relações
sociais concretas entre o indivíduo e o mundo exterior, as quais se desenvolvem num processo
histórico; assim, as funções superiores constituem-se na/pela cultura; c) a relação homem-mundo
é sempre mediada por sistemas simbólicos, o que coloca o conceito de mediação como central na
teoria. Dentre os sistemas simbólicos, a fala é considerada fundamental para a construção das
funções superiores, sendo internalizada nos anos iniciais do processo de desenvolvimento,
passando a funcionar como um instrumento do pensamento.
O desenvolvimento humano pode ser entendido como um processo de apropriação dos elementos
e processos culturais, ocorrendo no sentido do externo (relações interpessoais) para o interno
(relações intrapessoais), mediado pela ação do outro (pessoas físicas ou agentes culturais). A
aprendizagem desempenha, portanto, um papel crucial na medida em que possibilita o processo
de desenvolvimento.
É inegável o impacto dessas concepções no pensamento pedagógico. De um lado, aponta que o
processo de mediação pedagógica é fundamental na relação que se estabelece entre o
sujeito/aluno e o objeto de conhecimento/conteúdos escolares, lembrando que, em sala de aula, o
professor é o principal agente mediador, embora não o único. De outro lado, sugere que a
mediação pedagógica ocorre através de práticas e situações concretas, o que significa que elas
podem ser planejadas de forma a aumentar as chances da aprendizagem com sucesso pelo
aluno. Este, por sua vez, é entendido por Vygotsky (1998) como um sujeito interativo, ou seja, um
sujeito que desempenha um papel ativo nos processos de interação vivenciados.
Com relação à afetividade, Vygotsky (1993) denuncia a divisão histórica entre os afetos e a
cognição, apontando-a como um dos grandes problemas da Psicologia na sua época, ao mesmo
tempo em que critica as abordagens orgânicas. Para o autor, as emoções deslocam-se do plano
individual, inicialmente biológico, para um plano de função superior e simbólico, de significações e
sentidos, constituídos na/pela cultura. Nesse processo, internalizam-se os significados e sentidos,
atribuídos pela cultura e pelo indivíduo aos objetos e funções culturais, a partir das experiências
vivenciadas, sendo crucial o papel do outro, como agente mediador entre o sujeito e os objetos
culturais. Assim, para o autor, “as emoções isolam-se cada vez mais do reino dos instintos e se
deslocam para um plano totalmente novo” (VYGOTSKY, 1998, p. 94).
Comparando-se as posições de Wallon e Vygotsky sobre a afetividade, percebe-se que os autores
apresentam pontos comuns com relação aos aspectos essenciais do fenômeno em pauta: a)
ambos assumem uma concepção desenvolvimentista sobre as manifestações emocionais:
inicialmente orgânicas, vão ganhando complexidade na medida em que o indivíduo desenvolve-se
na cultura, passando a atuar no universo simbólico, ampliando e complexificando suas formas de
manifestação; b) assumem, pois, o caráter social da afetividade; c) assumem que a relação entre
a afetividade e inteligência é fundante para o processo do desenvolvimento humano.
FONTE: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-
389X2012000200006>. Acesso em: 30 jul. 2019.
Parece clara a importância trabalhada nesta seção sobre a relação positiva entre cognição
e afetividade em nossa sociedade. Entretanto, algumas escolas ou alguns professores possuem
práticas pedagógicas que privilegiam mais os aspectos cognitivos em detrimento da afetividade no
processo de ensino-aprendizagem. Para ampliar o nosso olhar sobre essa relação, explicitou-se, a
seguir, o resumo do estudo “A influência da afetividade no processo de aprendizagem de
estudantes nos anos iniciais do Ensino Fundamental”, realizado por Josiane Regina Brust no ano
de 2008, que traz a importância da mediação do professor que considera tanto a cognição quanto
a afetividade em sua prática pedagógica.
LÉO – ESTUDANDO:
Para este estudo, foi realizada uma pesquisa bibliográfica a partir da produção de autores
clássicos e contemporâneos que trabalham com a questão da afetividade no processo de
aprendizagem, buscou-se obter o máximo de informações e esclarecimentos que contribuíssem
para a resolução dos problemas aqui apresentados.
Realizou-se, também, uma pesquisa de campo de caráter investigativo exploratório, através de
questionários com perguntas objetivas e subjetivas. Essas questões foram respondidas por
estudantes de 4º e 5º anos do Ensino Fundamental I. As informações continham questões sociais,
econômicas e culturais, que ajudam a compreender melhor o ambiente cognitivo e afetivo dos
estudantes, segundo a pesquisadora.
O questionário referente à pesquisa de campo foi aplicado em uma escola estadual de Londrina,
localizada na região oeste, distante do centro da cidade. Participaram dessa pesquisa 22
estudantes matriculados no 4º ano e 18 do 5º ano do Ensino Fundamental I, os quais
responderam às questões em sala de aula.
Os estudantes residem em um bairro de médio porte econômico, e a maioria dos pais trabalha em
fábricas próximas. A escolarização dos pais abrange o Ensino Fundamental e Médio, com
algumas exceções, pois alguns, não concluíram a 1º e 2º anos do Ensino Fundamental.
A conversa com os estudantes sobre o que mais valorizam na escola, teve como principais
respostas as boas notas (quinze alunos) e a importância do professor (dez alunos). O interessante
é que as boas notas (dez alunos) também foram consideradas o segundo elemento mais
importante pelo ponto de vista do que os pais mais valorizam na escola, sendo que o primeiro foi o
aprender (dezenove).
Percebe-se na fala dos estudantes que pelo fato dos pais esperarem deles uma nota alta no fim
do bimestre, o incentivo que eles têm para estudar se apoia principalmente na nota. Na escola, o
objetivo dos estudantes é a busca por uma nota alta, sendo que o olhar desses estudantes para a
importância da nota não é uma surpresa, uma vez que a escola se organiza historicamente para
atingir esse objetivo.
Entretanto, percebe-se, também, a importância que o professor tem para uma parte dos
estudantes. Em suas respostas pode-se constatar que para eles o professor representa uma forte
influência em seu aprendizado. Desse modo, como foi mencionado anteriormente, Souza (1986)
afirma que a influência mais importante no processo educativo é a figura do professor; ele pode
contribuir para modificações positivas no comportamento infantil.
Outro aspecto relevante é que ao questionar os estudantes sobre o que o pai, a mãe ou outra
pessoa faz que os deixa mais felizes, as respostas deles apontam para o carinho que recebem
(vinte estudantes) e o tempo durante o qual ficam juntos (nove estudantes). Consequentemente, o
que eles mais admiram nos professores dos quais mais gostam também é o carinho (dez
estudantes) para com eles.
Percebe-se assim o quanto esperam tanto dos pais quanto dos professores, que sejam
carinhosos, pacientes e respeitosos. Isso pode ser verificado com base no gráfico a seguir, o qual
traz as características de um bom professor na visão dos estudantes:
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Série 1
Com base no gráfico anterior, destacam-se, entre as características de ser bom professor: a
paciência (quinze estudantes) e as boas explicações (nove estudantes). Os estudantes esperam
que o professor tenha paciência durante a aula, como ponto de grande valor para que haja
reciprocidade entre ambos. Contrapostas às características de um bom professor, entre as
principais atitudes dos professores dos quais não gostam, apontam o “brigar” (broncas) (dezenove
estudantes) e o não ter paciência (sete estudantes) durante as aulas. Das falas dos estudantes,
pode-se concluir que, na maioria dos casos, os professores esquecem-se de ouvir os estudantes,
tornando-os meros recebedores de informações.
As palavras dos estudantes deixam bem claro que a afetividade representa um aspecto
importante no processo de aprendizagem, que tem como base o respeito mútuo, o diálogo e,
principalmente, o carinho recíproco. Todos os estudantes que participaram da pesquisa disseram
que gostam quando o professor conversa com eles, que gostam de conversar com o professor e
de serem ouvidos por eles. Ao observar o gráfico a seguir, pode-se destacar o quanto os
estudantes gostam de discutir sobre questões pessoais (doze estudantes), sobre dúvidas da aula
(dez estudantes) e receber elogios das atividades desenvolvidas (sete estudantes).
Série 1
Para os inatistas, segundo Davis e Oliveira (1994, p. 27), o homem já nasce pronto, ou
seja, ele nasce com as possibilidades de adquirir conhecimentos, uma vez que essas condições
são herdadas, inatas e predeterminadas geneticamente, por exemplo, a “inteligência é transmitida
dos pais para os filhos”.
Com isso, apesar de o ser humano ser dotado de dons divinamente justificáveis e inserido
em uma sociedade harmônica, hierarquizada, ele é impossibilitado de realizar mudanças em seus
dons e potencialidades, embora o discurso liberal afirme o contrário, isto é, o sujeito não tem
possibilidades de mudanças, não age efetivamente e não recebe interferências significativas do
ambiente social.
Os inatistas afirmam, ainda, que o sujeito sofre pouca ou quase nenhuma transformação
do meio ambiente em seu desenvolvimento humano e na aprendizagem. Portanto, o destino
individual de cada sujeito é determinado antes mesmo do nascimento, ou seja, as possibilidades
de o sujeito aprender, de tornar-se inteligente e de ser criativo entre outras habilidades são
herdadas, principalmente, quando esse sujeito tem interesse de aprender “coisas”.
Nesse caso, as implicações educacionais que essa concepção nos traz são conhecidas e
representam àquelas argumentações recorrentes de que o estudante pode ou não ter aptidões
para aprender a lidar com conteúdos escolares ou de que há necessidade de esperar o
desenvolvimento biológico e a maturação dele para que determinados conhecimentos sejam
ensinados e aprendidos. Por muito tempo se justificou com esse argumento da maturidade a
idade de sete anos para a criança ingressar na escolarização obrigatória.
Becker (1993) destaca que cabe à educação escolar, nessa concepção, despertar o
conhecimento que está dentro do estudante para que ocorra a formação dele como o homem que
assegurará a manutenção do status quo da sociedade em que ele está inserido. Nesse caso, o
professor pode definir os conteúdos de forma unidirecional, assumindo a centralidade do processo
educacional. Ao contrário de outras concepções, nas quais o professor, os estudantes e a
comunidade educacional atuam uns sobre os outros de forma que cada um vai transformando
ativamente suas ações sobre os outros.
Assim, observa-se que essa concepção pode facilitar determinadas ideologias que não
consideram a diversidade dos sujeitos, marginalizando e rotulando esses indivíduos,
argumentando que eles não se desenvolvem e não aprendem devido exclusivamente por suas
dificuldades pessoais e da falta de condições de suas famílias.
Por outro lado, a inspiração dessa concepção foi a Filosofia empirista, na qual a
experiência é a fonte de conhecimento que vai originando determinados comportamentos. Assim,
essa concepção ficou conhecida como empirista, behaviorista ou comportamentalista. Os
representantes teóricos dessa concepção atribuem, exclusivamente, ao ambiente a constituição
das características humanas. Com isso, privilegia a experiência como fonte de conhecimento e de
formação de valores e hábitos comportamentais.
Se o professor acredita que a capacidade individual dos estudantes esteja vinculada a uma
tendência natural, oriunda de características genéticas ou de um interesse pessoal, e sobre as
quais pouco pode alterar, então, é possível que este professor conceba o desenvolvimento e a
aprendizagem a partir de uma concepção inatista, como discutimos na seção anterior.
Por outro lado, se o professor considerar que a aprendizagem e as dificuldades dos
estudantes não estão associadas aos estudantes, mas à escola e ao trabalho pedagógico, talvez
sua concepção de desenvolvimento e aprendizagem seja a ambientalista ou empirista. Nessa
perspectiva, cabe ao professor interferir e disponibilizar ao estudante o conhecimento socialmente
construído, de forma que ele tenha condições de ir assimilando essas informações e reproduzi-las
corretamente.
LÉO – ESTUDANDO:
No seu imaginário, ele, e somente ele, pode produzir algum novo conhecimento no
aluno. O aluno aprende, se, e somente se, o professor ensina. O professor
acredita no mito da transferência do conhecimento: o que ele sabe, não importa o
nível de abstração ou de formalização, pode ser transferido ou transmitido para o
aluno. Tudo que o aluno tem a fazer é submeter-se à fala do professor: ficar em
silêncio, prestar atenção, ficar quieto e repetir tantas vezes quantas forem
necessárias, escrevendo, lendo etc, até aderir em sua mente o que o professor
deu.
FONTE: <http://repositorio.furg.br/bitstream/handle/1/3453/Vygotsky%20e%20as%20teorias
%20da%20aprendizagem.pdf?sequence=1>. Acesso em: 30 jul. 2019.
Por fim, se o professor acredita que a aprendizagem está relacionada à interação ativa do
estudante com o conhecimento e com o outro social (professores, colegas mais experientes, pais,
irmãos, adultos etc), talvez sua concepção seja a interacionista (RAPOSO; QUEIROZ, 2008). É
interessante ressaltar que a interação ativa do estudante está sendo entendida como o processo
no qual o estudante tenha a oportunidade de ter acesso à informação, conhecer a história de sua
produção, compreender seu significado social, estabelecer relação com a sua história e com os
conhecimentos prévios que tinha a esse respeito, construir e reconstruir o conhecimento a partir
dessa interação.
LÉO – OUTRO:
Sugerimos que assista ao filme Gattaca. Esse filme se passa em uma sociedade imaginária, na
qual o conhecimento sobre o funcionamento dos genes está muito avançado. Assim, é possível
fazer uma completa avaliação das predisposições genéticas de cada indivíduo. Acreditamos que
por meio dessa ficção você poderá refletir sobre como o pensamento dessa sociedade expressa a
dicotomia entre a determinação inatista versus a determinação ambiental do comportamento.
Acesse o filme indicado no endereço a seguir: https://www.youtube.com/watch?v=mV40nDD7gDk.
FONTE: A autora
Piaget entende que o sujeito herda uma série de estruturas biológicas (sensoriais e
neurológicas) que amadurecem em contato com o ambiente e predispõem o surgimento de certas
estruturas mentais. Dessa forma, para o autor, não herdamos inteligência, mas um organismo que
vai amadurecer em contato com o meio e resultará na formação de estruturas cognitivas que
ampliarão a possibilidade do sujeito de interpretação da realidade. Nesta perspectiva, as
estruturas que dão origem à inteligência não são inatas, mas construídas pelo sujeito com o meio
ambiente.
A fase seguinte é o estágio pré-operacional, que corresponde à faixa etária que vai dos 2
aos 7 anos de idade aproximadamente. Nesse estágio, a criança formará esquemas simbólicos,
ou seja, ela já consegue representar uma coisa por outra (brincadeira de faz de conta). Esses
esquemas representam as cópias internalizadas dos esquemas sensório-motores, isto é, ela
passa do pensamento explícito – motor – para o pensamento interiorizado – mental. Nessa fase, a
criança inventa suas próprias explicações a respeito dos fenômenos da realidade como um
exercício mental do que construiu com seus esquemas sensório-motores.
Piaget definiu como terceira fase o estágio operacional concreto. Nele, os conhecimentos a
respeito da realidade externa adquiridos na fase anterior (pré-operacional) são gradualmente
transformados em verdadeiros esquemas conceituais. Isso significa que neste estágio
(operacional concreto) a criança dos 7 aos 11 anos de idade já forma esquemas conceituais e já
trabalha com eles de acordo com os princípios da lógica, mas depende da existência dos objetos
do mundo exterior.
Já no estágio das operações formais é que a criança atinge os objetivos básicos de seu
desenvolvimento mental, seja pensar abstratamente ou pensar sobre situações hipotéticas de
modo lógico e organizar regras em estruturas mais complexas. Será, portanto, na adolescência
que o sujeito será capaz de conceituar termos, como bondade, amizade, Deus, entre outros.
É importante ressaltar que, segundo o autor, as novas estruturas que vão surgindo em
cada um desses estágios não desaparecem. “O essencial dessas construções sucessivas
permanece no decorrer dos estágios ulteriores, como subestruturas sobre as quais se edificam as
novas características” (PIAGET, 1999a, p. 79).
A partir dessa ideia, é possível entender o que Piaget (1999a) definiu por processo de
aprendizagem. Para o autor, a aprendizagem é um processo de construção ativa do sujeito, no
qual o sujeito constrói seus próprios conhecimentos quando colocado em situações de
desequilíbrio mental. Nessa situação, o sujeito tentará explicar o fenômeno estudado a partir de
seus conhecimentos prévios e, em um processo de tentativa de acerto e erro, irá construindo
novas hipóteses pessoais. Errar, portanto, ganha um significado diferenciado daquele conhecido
na escola tradicional, uma vez que representa uma etapa obrigatória do processo de construção
de conhecimentos. Será exatamente a partir das respostas erradas construídas no processo de
adaptação que o professor poderá atuar para conduzir o estudante a novos desequilíbrios mentais
e construção de novos esquemas, provocando, assim, o desenvolvimento e a aprendizagem.
Após essa discussão, parece ter ficado mais fácil sistematizarmos as contribuições dessa
abordagem para a educação. No que se refere ao processo educacional, torna-se fundamental
que o estudante tenha a oportunidade de viver situações que sejam desequilibradoras, de forma
que seja possível a construção progressiva das noções e operações. Tais situações, no entanto,
devem considerar tanto o aspecto intelectual como o aspecto moral, uma vez que, segundo Piaget
(1999a, p. 69):
A escola, nessa perspectiva, deve organizar-se de forma que o estudante tenha uma
atividade intelectual baseada em ações, investigações e pesquisas orientadas. Para isso torna-se
fundamental que ela possibilite tentativas de ensaios e erros com base em uma atividade real.
6 ABORDAGEM SOCIOINTERACIONISTA
Outro conceito relevante que se torna o centro da explicação vygotskyana diz respeito à
mediação. Ele é reconhecido como um processo essencial que possibilita a realização de
atividades psicológicas voluntárias, intencionais e controladas pelo próprio sujeito. É importante
compreender, também, o conceito de internalização. Para Vygotsky (1998), ao longo do
desenvolvimento humano, cada sujeito utiliza marcas
externas, as quais vão se transformando em processos
internos, ou seja, o sujeito constrói ao longo de sua história
representações mentais que substituem os objetos do mundo
real. Esse mecanismo é chamado de internalização. Para
ele, essa capacidade de lidar com representações que
substituem o próprio real é que possibilita ao homem libertar-se do
espaço e do tempo presentes, fazer relações mentais na
ausência das próprias “coisas”, imaginar, fazer planos e ter
intenções.
Com base em sua teoria, Vygotsky (1984) ressalta que ao longo da história da espécie
humana, os signos passam a ser compartilhados pelo conjunto dos membros do grupo social,
permitindo a comunicação entre os indivíduos e o aprimoramento da interação social. Os sistemas
de representação da realidade, portanto, são socialmente dados, ou seja, “é o grupo cultural, com
o qual o indivíduo se desenvolve que lhe fornece o modo de perceber e organizar o real, que vai
constituir os instrumentos psicológicos que fazem a mediação entre o indivíduo e o mundo”
(OLIVEIRA, 1993, p. 37).
Nesse sentido, a interação face a face entre sujeitos particulares desempenha um papel
fundamental na construção do ser humano: é por meio da relação interpessoal concreta com
outros homens que o sujeito vai chegar a interiorizar as formas culturalmente estabelecidas de
funcionamento psicológico. Entretanto, o processo pelo qual o sujeito internaliza as informações,
conceitos e significados culturais não é um processo de assimilação passiva, mas de
transformação e síntese. Tal processo ocorre num constante movimento de recriação e
reinterpretação, no qual cada sujeito é ativo e cria significados para a interação entre o mundo
cultural e o mundo subjetivo de cada um.
LÉO – ESTUDANDO:
Por outro lado, Vygotsky, devido à natureza dialética de seu pensamento, defende que o sujeito é
social em essência e não pode ser separado ou compreendido fora do âmbito social. O homem é
sua realidade social, e sua ecologia cognitiva pode assumir diferentes características,
dependendo desta. Em razão disso, Vygotsky (1982) buscou superar os unilateralismos na análise
da relação sujeito-objeto e ao mesmo tempo compreender as especificidades dessa relação,
quando sujeito e objeto são históricos e quando a relação entre eles também é histórica. Não é
possível compreender essas especificidades, quando se adota o modelo biológico da interação
entre organismos e meio ambiente. Portanto, usamos a categoria do interacionismo, que resulta
de um modelo essencialmente biológico, para caracterizar a escola de Vygotsky. Nesse sentido,
essa escola é vista como um modelo que contraria a pretensão fundamental de construir uma
psicologia histórico-cultural do homem (DUARTE, 1999).
Uma leitura atenta de Vygotsky demonstra que a sua concepção de social não incluía apenas a
interação entre pessoas. Para ele, essa interação entre subjetividades era sempre historicamente
situada, mediatizada por ferramentas sociais – desde os objetos até os conhecimentos
historicamente produzidos, acumulados e transmitidos (DUARTE, 1999).
Quanto ao “professor vygotskyano”, Freitas (2000) explica que é aquele que, detendo mais
experiência, funciona intervindo e mediando a relação do aluno com o conhecimento. Ele está
sempre, em seu esforço pedagógico, procurando criar Zonas de Desenvolvimento Proximal (ZDP),
isto é, atuando como elemento de intervenção e procurando contribuir com a aprendizagem dos
estudantes.
Na ZDP, o professor atua de forma explícita, interferindo no desenvolvimento dos alunos,
provocando avanços que não ocorreriam espontaneamente. Vygotsky, dessa forma, resgata a
importância da escola e do papel do professor como agentes indispensáveis do processo de
ensino-aprendizagem. Assim, o professor pode interferir no processo de aprendizagem do
estudante e contribuir para a transmissão do conhecimento acumulado historicamente pela
humanidade. É nesse sentido que as ideias de Vygotsky sobre a educação constituem-se em uma
abordagem tanto da transmissão cultural quanto do desenvolvimento humano.
FONTE: <http://repositorio.furg.br/bitstream/handle/1/3453/Vygotsky%20e%20as%20teorias
%20da%20aprendizagem.pdf?sequence=1>. Acesso em: 30 jul. 2019.
Para finalizar esse capítulo, é necessário trazer algumas considerações para orientar o seu
estudo, especialmente, no tocante às bases epistemológicas que procuram explicar como os
sujeitos aprendem e se desenvolvem a partir da concepção de mundo, de sociedade e de homem.
Para isso, na primeira seção, foram discutidos os conceitos de desenvolvimento e de
aprendizagem, demonstrando que o desenvolvimento vai além de apenas mudanças físicas,
intelectuais, emocionais e sociais que fundamentam as diversas concepções apresentadas.
Demonstrou-se, ainda, a importância de um desenvolvimento humano de qualidade para
corroborar com o processo de aprendizagem humana dos saberes culturais e dos conhecimentos
científicos necessários para intervir no processo de humanização das pessoas.
É possível concluir que a afetividade deve estar presente em todas as escolas e salas de
aula, uma vez que ela produzirá impactos positivos na aprendizagem escolar e no
desenvolvimento humano dos estudantes. Ela trará, também, impactos positivos na mediação
pedagógica, de acordo com o estudo realizado por Brust (2008, p 27), pois “é preciso haver
empatia entre professor e aluno, pois isso favorece o aparecimento de uma simpatia mútua entre
ambos. O professor deve ter claro que o processo de ensino e aprendizagem é uma via de mão
dupla, um vai e vem dele para o estudante e do estudante para ele”.
Se, por outro lado, a aprendizagem do estudante não está associada a ele, mas à escola,
ao professor ou à organização de uma atividade pedagógica eficiente, a partir dessa concepção
ambientalista, cabe ao professor colocar o estudante em contato com o conhecimento socialmente
construído, de forma que ele tenha condições de ir assimilando essas informações e
reproduzindo-as corretamente. Os casos de fracasso ou de sucesso na escola, portanto, estão
muito mais relacionados às contingências de reforço que o aluno teve ao longo de sua vida
escolar do que a sua ‘capacidade natural’.
REFERÊNCIAS
DAVIS, C.; OLIVEIRA, Z. M. R. de. Psicologia na educação. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1994.
ELDER, G. H. Human lives in changing societies: life course and developmental insights. In:
CAIRNS, R. B.; ELDER, G. H.; COSTELLO, E. J. (Orgs.). Developmental science. New York:
Cambridge University Press, 1996.
SCHULTZ, D. P.; SCHULTZ, S. E. História da Psicologia Moderna. São Paulo: Thomson, 2007.
SNYDER, C. R.; LOPEZ, S. J. Psicologia positiva: uma abordagem científica e prática das
qualidades humanas. Tradução COSTA, R. C. Porto Alegre: Artmed, 2009.
TOOBY, J.; COSMIDES, L. The psychological foundations of culture. In: BARKOW, J. H.;
COSMIDES, L.; TOOBY, J. (Eds.). The adapted mind: evolutionary psychology and the
generation of culture. New York, NY, US: Oxford University Press, 1992.
VYGOTSKY, L. S. A formação da mente. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.