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A HISTÓRIA DE UM BAIRRO SUBURBANO: PROPOSTA DE

MEMORIAL DIGITAL SOBRE A HISTÓRIA DO BAIRRO DE PIRAJÁ,


SALVADOR-BA
SENA, Rodrigo de Souza 1

Grupo de Reflexão Docente n. 10 – Ensino de História e História Pública: desafios para a


formação do pensamento histórico na Educação Básica e no Ensino Superior.
Resumo:
O presente trabalho tem como objetivo desenvolver um memorial digital sobre a história do bairro
de Pirajá, localizado na cidade de Salvador-Ba, e as suas potencialidades de aplicação para o ensino
de história. Em experiências em sala de aula nas escolas da localidade, percebe-se um
conhecimento não aprofundado sobre a sua história, contemplando somente o período das guerras
da independência da Bahia, em virtude disso o trabalho visa justamente suprir essa necessidade,
tanto dos professores com a aplicação do memorial em sala de aula, quando da própria
historiografia baiana que pouco contempla os locais suburbanos da cidade. A dimensão a ser
utilizada é a história pública de cunho praxiológico, embasado na pesquisa histórica clássica onde
será levantado e coletado todo o contexto bibliográfico e documental do objeto de estudo,
analisado e construído de maneira colaborativa com os estudantes de escolas da região e,
posteriormente, será difundido o conhecimento desenvolvido através do memorial digital. O
referente projeto foi contemplado pela premiação Aldir Blanc Bahia, Prêmio Fundação Pedro
Calmon, na categoria Memória, pela Fundação Pedro Calmon – FPC, entidade vinculada à
Secretaria de Cultura do Estado da Bahia – SECULT/BA.

Palavras-chave: História de Pirajá; História Pública; Ensino de História; Memorial.

1. Introdução
Os estudos relacionados as freguesias suburbanas de Salvador, vêm emergindo na
historiografia Baiana a curtos passos, revelando a necessidade de novas pesquisas e a sua difusão
para além do campo acadêmico. Atualmente é disseminado pela historiografia tradicional a falta
de protagonismo das ditas freguesias em relação as freguesias urbanas de Salvador. Essa
problemática reflete sobre o ensino de história da Bahia, porque além dos escassos trabalhos
acadêmicos produzidos, não se tem algo que dissemine esse conhecimento fazendo com que
chegue a sala de aula, onde há a necessidade de aproximar o aluno da sua própria história.

1
Licenciado em História pela Universidade Católica do Salvador (UCSal). Contemplado pela Premiação Aldir Blanc
Bahia, Prêmio Fundação Pedro Calmon, Categoria Memória SECULT/FPC-BA. E-mail: sena.rodrigo07@gmail.com.
No caso de Pirajá, a história amplamente divulgada sobre a localidade contempla somente
o período das guerras da independência da Bahia, deixando lacunas primordiais como a presença
indígena na localidade, o pós-Independência e principalmente sua formação anterior as guerras de
independência. O presente trabalho visa justamente preencher essa lacuna, como também difundir
esse conhecimento com uma proposta de construção de um memorial digital sobre a história do
Bairro de Pirajá no Período Colonial. Para a construção da proposta se faz necessário compreender
um pouco sobre a história de Pirajá e o seu protagonismo nos primórdios da história do Brasil
colonial, além de discutir sobre o que se tem demarcado na contemporaneidade sobre o ensino de
história do bairro de Pirajá, como também do subúrbio de Salvador, e por fim apresentar o que se
entende por memorial digital, as suas potencialidades para o ensino de história e a construção do
design cognitivo do referido memorial.

2. Pirajá: a história da relíquia do heroísmo baiano


A história de Pirajá remonta os primórdios do Brasil Colonial. A localidade foi doada, por
meio de sesmaria, ao colono João de Velosa, engenheiro e dono de engenhos de açúcar na Ilha da
madeira, pelo capitão donatário Francisco Pereira Coutinho por volta de 1542.
No período em que o primeiro sesmeiro esteve nas terras de Pirajá, foi possível a edificação
de um dos primeiros engenhos da Bahia, entretanto, tudo indica que este não chegou a produzir
açúcar, pois o referido engenho foi queimado pelos indígenas, forçando a fuga dos colonos para
Porto Seguro (AZEVEDO, 1969). Com o fim das capitanias hereditárias, e a volta do sesmeiro
João de Velosa a Ilha da Madeira, a localidade foi novamente povoada por portugueses com a nova
estruturação administrativa – o governo geral – que ao realizar incursões de reconhecimento das
terras, perceberam na localidade de Pirajá e de todo o atual subúrbio de Salvador, um potencial
para plantação de cana de açúcar e construção de novos engenhos (OTT, 1996). Algum tempo
depois, já no governo de Duarte da Costa, chega de terras lusitanas, por meio de carta régia do ano
de 1555, a autorização para efetivação da construção de um engenho à custa da fazenda real, o
engenho El-rei em Pirajá, ou engenho Pirajá. Este engenho vai se tornar o primeiro do Brasil a
possuir um caráter público, onde os portugueses que produziam em Pirajá e fazendas próximas
pudessem beneficiar a cana plantada. O término da sua construção é relatado por carta no governo
de Mem de Sá no ano de 1570.2
Para o estabelecimento e ocupação dos portugueses nas partes do Recôncavo da Bahia no
início do governo geral, vai ocorrer o que Pinho (1982, p.42) chamou de: “as conquistas ou
dominação do gentio”. Essas guerras ocorreram a mando de Tomé de Souza, ao redor da cidade
nas localidades de Pirajá, Rio Vermelho e Itapuã e executadas por D. Álvaro da Costa. Após o
enfrentamento luso contra os indígenas, ocorreu a construção e fundação do aldeamento São João
Evangelista no ano de 1558, localizada às margens do rio Pirajá e possuindo no ano de 1564
aproximadamente 14 aldeamentos ao seu redor, totalizando 1100 almas. O referido aldeamento
demonstra a presença dos religiosos da Companhia de Jesus nas terras de Pirajá. (BRESCIANI,
2000)
Em meio aos conflitos e ajustes entre nativos e o projeto colonizador, o segundo sesmeiro
a ocupar a localidade foi o Simão da Gama e Andrade, navegador português que chegou na Bahia
com sua mulher e filhos no galeão São João, segunda armada de mantimentos enviados pelo rei
D. João III no ano de 1550. Segundo a carta de confirmação de sesmaria de 21 de julho de 1570,
as terras localizadas entre a ponta do rio Pirajá até as fronteiras das terras de Paripe, e para o sertão
uma légua, além da ilha dos frades, foram dadas de sesmaria para o dito navegador por Thomé de
Souza, no tempo do seu governo.
A igreja do engenho público de Pirajá, citada por Gabriel Soares de Souza em seu Tratado
Descritivo do Brasil, vai se tornar a primeira igreja matriz da freguesia. Como esclarece Schwartz
(1998), os engenhos do Recôncavo e suas capelas surgem muito antes do estabelecimento das vilas
e paróquias, por isso as igrejas dos primeiros engenhos do Recôncavo se tornaram a matriz da
freguesia da localidade. Esta mesma igreja se encontrava em péssimas condições no ano de 1757
e, por conta disso, foi edificada uma nova matriz datada da segunda metade do século XVIII, no
local onde está situada a atual Igreja de São Bartolomeu no Bairro de Pirajá. Acredita-se que o
primeiro padre a administrar os sacramentos na igreja primitiva foi o Padre Vicente Rodrigues.
(MATTOS, 1987) A data da criação da Freguesia de São Bartolomeu de Pirajá é uma incógnita

2
BIBLIOTECA NACIONAL. Documentos relativos a Mem de Sá, Governador Geral do Brasil. IN: Annaes da
Bibliotheca Nacional do Rio de Janeiro. V 27. Rio de Janeiro: Officina Typographica da Bibliotheca Nacional, 1906.
pela escassez de documentos sobre a localidade no período de estudo. Schwartz (1998) apresenta
que foi fundada em 1578 juntamente com a freguesia de Paripe e Purificação.
Também é descrito pelo mesmo memorialista a importância que a localidade de Pirajá
possuía neste período para o abastecimento da cidade, em virtude da abundância de peixes e
mariscos, ao qual formavam grupos de pescadores que sobrevivem desta atividade. A abundância
de peixes vai justifica o nome do rio e do local, pois, segundo a etimologia tupi a palavra Pirajá
significa “o que está repleto de peixes” (NAVARRO, 2013).
Além da atividade de pesca presente no rio Pirajá, uma atividade comum no período de
estudo na localidade era a pesca de baleias, onde no período de chegada das mesmas a Bahia de
Todos os Santos, os moradores e donos de engenho se mobilizaram para a dita atividade com o
objetivo de extração do óleo para a iluminação pública da cidade e iluminação dos engenhos, além
da carne servir de alimento para os escravizados (OTT, 1996).
No século XVIII, em uma descrição da freguesia de São Bartolomeu de Pirajá feita pelo
vigário Francisco Baptista da Silva, atendendo ao pedido do Marquez de Pombal no ano de 1757,
fica evidenciado o crescimento e o desenvolvimento, ao longo dos anos, alcançado pela freguesia.
Além de descrever as localidades habitadas e os povoados dentro da área da freguesia, que tinha
como centro o atual bairro de Pirajá, um dado importante é que o vigário não pontua em sua
descrição a existência de engenhos da localidade.

[...] Não tem em si lugares povoados mais que sinco logarejos com meya duzia
de fogos cada hum que sam: Bananeyras, Crux de Pirajá 3, [...] Fragoso, [...]
Itabaranha4, Praya Grande [...], Sam Caetano, Ilha de Lucas Pinto, sitio de Maria
Thereza, sitio de Manoel Germano, sitio do Capitão Manoel dos Santos Dias, sitio
da freguesia de Ilha de Joam de Souza, S. Joam Passage, sitio do Capitão Mór
José Pires, S. Braz, Nossa Senhora da Escada, Campos de Lamarão, Jaquaira,
Quiaya, S. Braz velho, Cachoeira, Cangurungu, Guiga, Estrada Geral do Sertam
para a cidade5, Terra Nova, sitio da Conceição, Pedras Pretas 6, Buraco do Tatú7,

3
Lugar onde está edificada a atual igreja de Pirajá.
4
Ler-se “Itacaranha”
5
Atual Estrada de Campinas, foi a primeira Estrada que ligava o recôncavo a cidade, antes da construção da BR-324.
6
Segundo a oralidade, trata-se de parte da localidade do atual bairro de Castelo Branco.
7
Localidade onde havia instalado um quilombo, de mesmo nome, durante o século XVIII e delimita-se da região entre
o atual bairro de Campinas de Pirajá e a vila de Santo Amaro de Ipitanga, região entre o atual bairro de Itapoá e o
município de Lauro de Freitas.
Mangueiras, Terras de S. Bento, Pituassu, Barreyras, Cajazeiras, Dendezeiro,
Campina, Camorogippe [...]. Tem 900 pessoas de comunham. 8

É importante destacar que muitas destas localidades descritas foram inicialmente fazendas e com
as mudanças de configuração espacial da cidade, estas localidades passaram a dar nome aos bairros
de Salvador como os atuais bairros de São Caetano, Itacaranha, Praia Grande, Escada, Pituaçu,
Cajazeiras e Campinas de Pirajá, dentre outros situados em outras áreas.
Esse registro evidencia um pouco do tamanho que alcançou a freguesia no século XIX,
onde o seu território limitava-se entre a Freguesia de Santo Antônio Além do Carmo (região do
atual centro de Salvador), mais próximo a Freguesia de Nossa Senhora do Ó de Paripe, chegando
até a atual cidade de Lauro de Freitas. Ao todo são registrados aproximadamente 32 sítios
povoados. Apesar da ausência de engenhos nessas duas fontes oficiais, outros tipos de fontes
apresentam engenhos na localidade no mesmo período, como por exemplo no livro de notas9 que
demonstram a existência de três engenhos na localidade: o Engenho Conceição, um Engenho
localizado no Largo do Tanque e o Engenho Pedra Preta.
A localidade foi também palco de diversos embates como os ocorridos durante a invasão
holandesa na Bahia, também durante a guerra de independência do Brasil na Bahia, que mobilizou
todos os moradores das localidades suburbanas, por se tratar um ponto estratégico, tanto de defesa,
quanto de ataque, além da possibilidade de fuga de alguns Malês por Pirajá evidenciado por Reis10,
mas esses temas bastantes explorados pela historiografia baiana não faz parte do nosso enfoque.

3. A contemporaneidade e o ensino de história em locais suburbanos


A historiografia Baiana até a contemporaneidade sempre privilegiou os estudos de história
relacionados ao centro da cidade, mais precisamente a região da antiga cidade de Salvador do
século XIX, que estão elencadas como as freguesias urbanas de Salvador. As localidades
suburbanas da cidade começaram a se formar como suburbanas ao que tudo indica a partir do
século XIX, quando algumas freguesias pertencentes ao recôncavo baiano, passam a fazer parte

8
BIBLIOTECA NACIONAL. Inventário dos documentos relativos ao Brasil existentes no Archivo de Marinha e
ultramar organizado por Eduardo de Castro e Almeida. IN: Annaes da Bibliotheca Nacional do Rio de Janeiro. V31.
Rio de Janeiro: Officinas Graphicas da Biblioteca Nacional, 1913.
9
Livros de Notas APB 296, 277, 246.
10
REIS, João José. Rebelião escrava no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.
da municipalidade de Salvador, estas freguesias são: São Bartolomeu de Pirajá, Nossa Senhora do Ó
de Paripe, São Miguel de Cotegipe, Nossa Senhora da Piedade em Matoim, Nossa Senhora da Encarnação
do Passé, São Pedro no Sauípe da Torre, O Senhor do Bonfim da Mata de São João, Santa Vera Cruz de
Itaparica, Santo Amaro em Itaparica e Nossa Senhora do Santo Amaro de Ipitanga. Algumas dessas
freguesias hoje formam bairros suburbanos da cidade como Pirajá e Paripe, e outras passam a
formar núcleos populacionais maiores, e por consequência formando cidades da região
metropolitana como Simões Filho, Candeias e Mata de São João.
Os estudos relacionados relacionados a essas freguesias atualmente são bastante pontuais,
e trata basicamente sobre acontecimentos dentro dessas localidades sem trabalhar aspectos de sua
formação. No caso de Pirajá, a localidade toma espaço na historiografia hegemônica no processo
de independência da Bahia em 1823, quando acontecimentos decisivos para o desfecho da guerra
são travados aqui.
Contudo, através da pesquisa histórica realizada, percebe-se a contribuição que os lugares
suburbanos de Salvador tem a oferecer a historiografia e ao entendimento de uma história de
Salvador mais deslocada do centro. Desde o processo de ocupação portuguesa no processo de
capitanias hereditárias, o subúrbio da cidade foram das regiões primeiramente ocupadas pelos
colonos portugueses. Com o estabelecimento do governo geral, novamente essas localidades
voltam a ser ocupadas e povoadas, com foco na produção de açúcar.
No caso particular de Pirajá, o nosso objeto de estudo, onde foi construído um engenho
Público, ou engenho pirajá, que foi o primeiro implementado as custas da coroa portuguesa, que
subsidiou toda a obra, sendo assim um dos primeiros investimentos feitos pela mesma para o
estabelecimento da produção de açúcar na Bahia, nos primórdios do Brasil Colonial.
Andrée Mansuy Diniz Silva, organizador do livro Cultura e Opulência no Brasil 11, acredita
que o termo “engenho real” atribuído ao engenho de Pirajá por Antonil, teria surgido por conta da
construção do engenho real de Pirajá, por ser um engenho construído a mando da coroa e com o
que tinha mais de atual para a produção da época, fazendo assim que os particulares baseassem a
construção de outros engenhos a semelhança desse de Pirajá. Ou seja, o termo real altamente
cunhado por diversos engenhos na Bahia, teria derivado da construção do engenho de Pirajá.

11
ANTONIL, André João. Cultura e opulência do Brasil por suas drogas e minas: introdução e notas por Andrée
Mansuy Diniz Silva. São Paulo: EDUSP, 2007.
Todo o exposto demonstra a importância que a difusão desse conhecimento sobre a história
de Pirajá tem a enriquecer a história da Bahia, que a curtos passos vem reconhecendo a importância
das localidades suburbanas da cidade para a formação da cidade e isso é estimulado pelos
pesquisadores, historiadores e professores que adentram a sala de aula nas comunidades e
encontram nos conteúdos presentes no currículo, uma história mais ligada a países europeus e,
quando história do Brasil, um enfoque maior nas atuais áreas de produção, bastante geral, sem dar
ótica e negligenciando a história mais próxima dos estudantes e moradores dos bairros suburbanos.
É nessa perspectiva e problematização que se forma e idealiza o Memorial Digital do bairro de
Pirajá.

4. Memorial Digital e Potencialidades para o Ensino de história


O conceito de memorial segundo Axt (2012), deriva do Inglês Norte–americano, e significa
um patrimônio de pedra e cal, em um espaço público, que tem por objetivo relembrar ou recordar
feitos, marcos ou personalidades históricas. O autor cita exemplos de memoriais presentes no
Brasil com esse conceito como o memorial JK em Brasília e o Monumento aos soldados mortos
da revolução comunista de 1935 no Rio de Janeiro. Sendo assim os memoriais, são espaços de
memória, utilizados para identificar e combater desaquecimento, imortalizar um acontecimento,
dar forma ao imaterial. No Brasil esse conceito vai além, atrelando ao conceito norte-americano
uma forma de prestar serviço à comunidade:
Ao invocar o memorial, porém, modificamos o conceito, agregando ao lugar de
memória, mais ou menos estático a prestação de serviços à comunidade e
desenvolvendo no seu seio um fórum de reflexão sobre a instituição trabalhada,
ancorado no ferramental teórico e metodológico da pesquisa histórica. (AXT,
2012, p.65)

Esse é o conceito de memorial que traremos para o referido projeto, algo que venha a prestar de
fato um serviço à comunidade, trazendo o lugar de memória em meio digital, onde todos podem
ter acesso a qualquer hora e em qualquer lugar.
Com isso posto e toda a discussão anterior, o design cognitivo do memorial virtual visa
justamente na construção de um material, que trará uma solução na construção de um material
didático digital. O memorial após construído se constituirá em um aplicativo para dispositivos
móveis, construído com elementos visuais e textuais, que trará não apenas um conteúdo
metodológico para a sala de aula, mais sim um momento de conhecimento e reflexão onde os
estudantes e moradores da localidade possam adentrar nesse história egressa e dialogar
questionamentos sobre a situação atual do bairro. Essa proposta contempla o que se espera de uma
pesquisa em História Pública, que tem como definição, segundo Florez (apud MARTINS, 2017,
p. 111):
A história que é vista, escutada, lida e interpretada por um público amplo é a
história pública. Os Historiadores nesse campo, ampliam seus métodos da história
acadêmica ao explorar fontes e formas de apresentação não convencional não
tradicionais, reformular perguntas, e no processo, cria uma prática histórica em
particular... A história pública é também que pertence ao público. Ao fazer ênfase
no contexto público da investigação, a história pública forma historiadores para
transformar sua investigação e desta maneira alcançar audiência mais além da
academia.

Tomando como base os princípios expostos o memorial digital possuirá a seguinte


organização:12
1. Objetivos: O memorial digital tem como objetivo criar um ambiente de memória, reflexão, como
também um ambiente educacional de aprendizagem formal e não formal, que aliará a pesquisa
histórica clássica ao ensino de história; um espaço que permita a difusão, valorização e a
preservação da história de Pirajá e das regiões suburbanas da cidade de Salvador, que são
marginalizadas e negligenciadas pela a história clássica e hegemonia; aliado a criação do fórum,
espaço de discussão do conhecimento entre estudantes, professores, pesquisadores e moradores,
que poderão compartilhar sua vivência, contribuindo para saber histórico sobre a localidade.
2. Disposição de Informações: as informações do memorial digital serão organizadas tendo a
localidade de Pirajá no Período Colonial como foco, sendo colocados elementos textuais advindos
da pesquisa histórica realizada, como também elementos visuais para demonstrar aspectos
importantes da localidade no período.
3. Contextualização: o contexto proposto será o contexto de Salvador no período inicial da
colonização portuguesa no momento histórico proposto (século XVI), que contribuirá para o
processo de imersão do visitante do memorial em Pirajá, no início de sua formação.
4. Colaboração e Interatividade: O fórum aliado ao aplicativo, será o espaço de interação e
colaboração do memorial digital de Pirajá. O fórum será aberto para o público que acessou o

12
Esquema adaptado de MARTINS (2017)
memorial e tem dúvidas, contribuições, sugestões e feedback relacionado ao projeto. O espaço
também poderá ser utilizado para realização de atividades relacionadas ao memorial, contendo
ainda uma aba para perguntas que serão respondidas diretamente pelo pesquisador. A criação
segue um conceito de que o questionamento próprio , pode ser também um espaço de
aprendizagem.
5. Validação: a validação do conteúdo será realizada pelo pesquisador através da pesquisa histórica
em documentos históricos e referência bibliográfica sobre o tema proposto; ocorrerá também
discussão em momentos de reunião nos grupos de pesquisa Relações de poder, dinâmica social em
Salvador e seus subúrbios no século XIX e no Grupo de História da Igreja no Brasil, realizados na
Universidade Católica do Salvador - UCSal, que contribuirão para às discussões do
desenvolvimento do projeto.
6. Soluções Pedagógicas: Orientação sobre como o memorial digital pode ser utilizado nos
contextos de educação formal e não formal; Disponibilização de material externo ao memorial,
que se relaciona ao conteúdo trazido no mesmo, que se constituirá em atividades de fixação,
questionários de associação do memorial de Pirajá ao tempo presente e atividades de pesquisa
tanto internas, quanto externas a sala de aula ou ao ambiente de ensino não formal.
7. Sobre as soluções técnicas, o memorial digital trará:
- Mídias: Textos, imagens e fórum de discussão.
- Mobilidade: A proposta do memorial é que todo o texto inserido tenha a opção de ser
também ouvido, inserindo nesse contexto visitantes com algum tipo de mobilidade.
- Meio de Socialização: Redes Sociais e parcerias institucionais.
Essa organização reuniu toda a proposta para a aplicação do memorial. Demonstrando que
o mesmo poderá ser utilizado em diversos contextos e para diversos públicos. No meio de ensino
formal, o professor de História que leciona no bairro de Pirajá e bairros próximos, poderá utilizá-
lo para situar os alunos sobre o processo de colonização portuguesa na Bahia, interligando com a
cultura afro-brasileira e indigena, as relações de poder presentes na localidade e a produção de
açúcar que teve a localidade de Pirajá um modelo único.

5. Considerações Finais
A presente proposta deriva de questionamento que o próprio pesquisador faz sobre a
história do bairro ao qual reside desde que nasceu. Reconhecer a história do local ao qual está
inserido é também reconhecer a sua própria história. As discussões relacionadas a esse tema, como
fica evidente, tem um caráter além de construtivo, no que se diz respeito ao conhecimento, mas
também tem um caráter humano e reparador, e visa prestar um serviço, preencher uma lacuna, que
a muitos anos vem sendo marginalizada na história tradicional. Na Sala de aula é perceptível que
os estudantes visualizam a história como algo distante, não se sentindo sujeitos de sua própria
história. Esse memorial visa justamente isso, aproximar o estudante e qualquer outro visitante de
parte da sua história.
Esse estudo possui outras tantas aplicações para além da sala de aula, como seu modelo
pode ser aplicado a diversas localidades suburbanas de Salvador que também anceiam em ter sua
história e memória preservadas.

Referências

AXT, Gunter. A função social de um memorial: a experiência com memória e história no


Ministério Público. Métis: história & cultura. Caxias do Sul, v. 12, n. 24, p. 64-89, jul./dez. 2012.
AZEVEDO, Thales de. Povoamento da cidade do Salvador. 1. ed. Salvador: Itapuã, 1969.
BARICKMAN, Bert J. Um contraponto baiano: açúcar, fumo, mandioca e escravidão no
Recôncavo, 1780-1860. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.
MARTINS. Luciana Conceição de Almeida. História Pública do quilombo do Cabula:
representações de resistências em museu virtual 3D aplicada à mobilização do turismo de base
comunitária. 311f. il. 2017. Tese (Doutorado) – Faculdade de Educação, Universidade Federal da
Bahia, Salvador, 2017.
MATTOS, Waldemar. Pirajá: Relíquia do heroísmo Baiano. Salvador: UFBA/Centro de Estudos
Baianos, 1987.
NAVARRO, Eduardo de Almeida. Dicionário de tupi antigo: a língua indígena clássica do Brasil.
São Paulo. Global. 2013.
OTT, Carlos. Povoamento do Recôncavo Pelos Engenhos (1536-1888). v. 1. Salvador: Bigraf,
1996.
PINHO, Wanderley. História de um engenho do recôncavo. 2.ed. São Paulo: Ed. Nacional, 1982.
SCHWARTZ, Stuart B. Segredos Internos: engenhos e escravos na sociedade colonial, 1550-
1835. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.

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