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Irene Benjamim Mazive

SISTEMA CONSTITUCIONAL MOÇAMBICANO

Análise comparativa dos modelos constitucionais de 1975, 1990 e 2004

Licenciatura em Ciências Policiais

1° Ano

ACIPOL

Maputo

2022
Irene Benjamim Mazive

SISTEMA CONSTITUCIONAL MOÇAMBICANO

Análise comparativa dos modelos constitucionais de 1975, 1990 e 2004

Trabalho a ser entregue na cadeira


de Direito Constitucional para
efeitos de avaliação

Docente:

ACIPOL

Maputo

2022
ÍNDICE
INTRODUÇÃO ........................................................................................................................... 4
1. Objectivos ......................................................................................................................... 4
1.1. Objectivo geral .......................................................................................................... 4
1.2. Objectivos específicos ............................................................................................... 4
2. Metodologia ...................................................................................................................... 4
ANÁLISE COMPARATIVA DAS CONSTITUIÇÕES DE 1975, 1990 E 2004. ................... 5
Conceito de Constituição .......................................................................................................... 5
CONSTITUIÇÃO DE 1975 ...................................................................................................... 5
CONSTITUIÇÃO DE 1990 ...................................................................................................... 6
CONSTITUIҪÃO DE 2004 ...................................................................................................... 8
CONCLUSÃO ........................................................................................................................... 11
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................... 12
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INTRODUÇÃO
O presente trabalho enquadra-se no âmbito das matérias ministradas na cadeira do
Direito Constitucional, cujo tema é sistema constitucional moçambicano, onde será feita
a abordagem analítica comparativa minuciosa das constituições de Moçambique de
1975, 1990 e 2004 respectivamente, realçando as suas semelhanças e diferenças.

1. Objectivos
1.1. Objectivo geral
 Analisar e compreender as vicissitudes patentes nas constituições de 1975, 1990
e 2004, respectivamente.
1.2. Objectivos específicos
 Conceituar o termo Constituição;
 Descrever os modelos constitucionais supracitados;
 Estabelecer diferenças e semelhanças entre os modelos constitucionais.

2. Metodologia
Para a execução do presente trabalho, recorreu-se ao método de consulta documental,
que consistiu essencialmente leitura e interpretação das vicissitudes ocorridas nas
Constituições de 1975, 1990 e 2004.
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ANÁLISE COMPARATIVA DAS CONSTITUIÇÕES DE 1975, 1990 E 2004.

O estudo sobre as vicissitudes constitucionais, requer de antemão entender o sentido ou


significado do termo constituição. Assim sendo, em primeira instância vamos abordar
de forma muito rápida e concisa sobre o conceito de constituição.

Conceito de Constituição
Etimologicamente o termo constituição é oriundo do latim “constitutio”, que significa
«condição definida, acto de estabelecer, regulamentação, ordem». Em sentido técnico
jurídico, o termo constituição pode ser utilizado, definido em sentido geral ou em
sentido restrito.

Sentido Geral – constituição significa a própria organização do estado, abrange


instituições políticas e jurídicas que o formam e lhe caracterizam a estrutura.

Sentido Restrito – significa lei fundamental do Estado, que é o conjunto de normas


jurídicas geralmente reunidos em um código que descrimina os órgãos do poder
político, delimita-lhes competências, declara a sua forma, proclama e assegura os
direitos e deveres dos cidadãos, ou seja, conjunto de princípios, regras, ideias, projectos
que informam e mostram a organização e o funcionamento do Estado.

CONSTITUIÇÃO DE 1975

Esta foi a primeira constituição de Moçambique independente, aprovada por aclamação


pelo Comité Central da Frente de Libertação de Moçambique, liderado pelo Presidente
Samora Moisés Machel, a 20 de Junho de 1975, tendo entrado em vigor a partir das 00H
de 25 de Junho do mesmo ano. Esta constituição está organizada em V Títulos, VI
Capítulos e 73 Artigos.

Esta constituição tem como um dos objectivos fundamentais, erradicar a exploração do


homem pelo homem, ou seja, eliminar qualquer tipo de opressão influenciada pelo
colonialismo e imperialismo. Nessa ordem de ideia, ficou preconizado nesta
constituição, o seguinte:

 O estado moçambicano é uma república popular baseada em princípios de


democracia popular, onde o poder pertence aos operários e camponeses, unidos e
dirigidos pela Frelimo;
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 Sistema político monopartidário – A Frelimo, que outrora fora movimento de


libertação, passou ao estatuto de partido único do Estado, sendo a única força
política responsável pela administração pública, definindo as políticas orientadoras e
supervisionando as acções dos órgãos estatais, a fim de garantir a conformidade da
política do estado com os interesses do povo. Destacar que não era admitida a
constituição de outras forças políticas opositoras, ou seja, o Estado era a Frelimo.
 Constituíam órgãos do estado: Assembleia Popular – órgão supremo, dirigido pelo
presidente da República; O Presidente da República – Chefe do estado e
presidente da Frelimo; A Comissão Permanente da Assembleia Popular e; O
Conselho de Ministros – ministros e vices ministros.
 Laicidade – A República Popular de Moçambique é um Estado laico, nela existindo
uma separação absoluta entre o Estado e as instituições religiosas.
 Direito ao voto – Todos os cidadãos da República Popular de Moçambique, maiores
de 18 anos, têm o direito de votar e ser eleitos, com excepção dos legalmente
privados deste direito, no entanto esse direito era exclusivo, pois o voto que se faz
referência, é no âmbito dos comités da Frelimo ou na Assembleia popular, na era
um direito extensivo a todo povo, era um voto somente para as elites
governamentais;
 Quanto ao sistema financeiro, tinha-se uma economia centralmente planificada,
caracterizada pela intervenção estatal em todos aspectos inerentes a economia do
país. Neste âmbito o estado implementa o sistema financeiro socialista. Outrossim, a
agricultura era a base económica do estado, tendo a indústria como factor
dinamizador. O trabalho é considerado como dever e direito de todos os cidadãos.
 O Estado reconhece e garante a propriedade pessoal. À propriedade privada está
ligada a certas obrigações. A propriedade privada não pode ser usada em detrimento
dos interesses fixados na Constituição. O rendimento e a propriedade privada estão
sujeitos a impostos progressivos, fixados segundo critérios de justiça social.
 Reconhecimento das liberdades fundamentais dos cidadãos, reforçando-se a questão
dos direitos iguais independentemente do género;

CONSTITUIÇÃO DE 1990

Esta é a segunda constituição de Moçambique, que emerge como fruto das negociações
entre o governo da Frelimo e a Renamo para o alcance dos Acordos de Paz no âmbito
da guerra civil dos 16 anos. A constituição anterior (1975) conheceu mudanças
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profundas para conceber este novo modelo que foi aprovado a 02 de Novembro de
1990, tendo entrado em vigor no dia 30 do mesmo mês e ano. Desta vez a magna lei
contempla, VI Títulos, III Secções, X Capítulos e 206 Artigos. Esta constituição traz
consigo grandes transformações na esfera política, económica assim como jurídica, a
destacar:

 Moçambique passa a ser apenas uma República em vez de república popular, por
isso designa-se simplesmente República de Moçambique, nesse âmbito a assembleia
popular passar a ser designada Assembleia da República, que não é mais dirigida
pelo chefe do estado, mas sim passa a ter um Presidente da Assembleia da
República eleito pelos deputados;
 A Assembleia da República passa a contemplar o mínimo de duzentos e máximo de
duzentos e cinquenta deputados, oriundos dos diversos partidos que chegam ao
parlamento por meio do sufrágio, com mandato de cinco anos. Diferentemente da
constituição anterior que preconizava o mínimo de duzentos e máximo de duzentos
e dez representantes da magna casa, sendo apenas quadros da Frelimo, incluindo
ministros e seus vices, governadores provinciais entre outros;
 Implementação de ideias mais sólidas Estado de Direito Democrático,
consequentemente adopta-se modelos da democracia representativa e da democracia
e participativa, destacando a separação e interdependência dos poderes e o
pluralismo de ideias – reconhecimento do papel dos partidos políticos;
 Adopção do sistema multipartidário na arena política, não mais a Frelimo o único
partido com aptidão para a função directiva do Estado. A Frelimo assume um papel
histórico na consumação da independência;
 O sufrágio universal passa a ser abrangente e inclusivo, ou seja todo cidadão com
idade legalmente aceite poderia participar do escrutínio. Razão pela qual em 1994
realizaram-se as primeiras eleições gerais no país. Diferentemente do postulado na
Constituição de 1975, onde era reconhecido o direito ao voto ao povo mas não havia
condições para seu exercício;
 No que tange à economia, o Estado deixa de lado o sistema de economia
centralmente planificada, caracterizada pela intervenção plena do Estado, adoptada
uma economia mais liberal, no entanto, este assume a função reguladora e
controladora (previsão de mecanismos da economia de mercado e pluralismo de
sectores de propriedade);
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 Ainda nesta esfera económica, adopta-se políticas de livre concorrência, propriedade


privada, e livre mercado, sem interferência directa do estado, a não para questões
regulamentares;
 Reforço a questão dos direitos, liberdades e garantias individuais, aumentando o seu
âmbito e mecanismos de responsabilização;
 Outrossim são introduzidos, o direito à liberdade de expressão e direito à liberdade
de imprensa, bem como o direito à informação;
 Várias mudanças ocorrem na organização do Estado, sendo que os órgãos do Estado
passam a ter uma melhor definição de funções e competências de cada órgão, a
forma como são eleitos ou nomeados. Igualmente vale destacar que surge a
denominação de Órgãos da Soberania designadamente: Presidente da República, a
Assembleia da República, o Conselho de Ministros, os Tribunais e o Conselho
Constitucional;
 No que tange ao ordenamento jurídico, são acrescidos ao Tribunal Supremo vários
tribunais para atender os conflitos socais de acordo com as suas especificidades, por
exemplo: Tribunais judiciais; O Tribunal Administrativo; Os tribunais militares; Os
tribunais aduaneiros; Os tribunais fiscais; Os tribunais marítimos e; Os tribunais do
trabalho;
 Elevação de nível de preocupação pela garantia da constitucionalidade e da
legalidade e consequente criação do Conselho Constitucional;

É importante realçar que esta Constituição passou por três revisões pontuais,
discriminadamente: Duas no ano 1992 e a outra em 1996. A revisão de 1996 teve mais
destaque porque houve a implantação de princípios e disposições sobre o poder local,
visando deste modo a descentralização do poder através da criação de órgãos locais com
competências e poderes de decisão.

CONSTITUIҪÃO DE 2004
Este modelo constitucional foi aprovado no dia 16 de Novembro de 2004, tendo entrado
em vigor de imediato no dia da validação e proclamação dos resultados das eleições
gerais daquele ano. Esta Constituição começa por inovar positivamente logo o aspecto
formal, dando nova ordem de sequência aos assuntos expostos e tratando em cada artigo
um assunto concreto e antecedido de um título que facilita a sua localização, muito
melhor do que os modelos anteriores. O corpo textual está organizado em XVII Títulos,
XXXV Capítulos (no total), III Secções e 306 Artigos.
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Este modelo não entra em contaste com Constituição da República de Moçambique de


1990, mas sim, traz princípios e disposições que visam reforçar e solidificar o regime de
Estado de Direito Democrático, mediante a melhoria de especificações e
aprofundamento da matéria já existente. Nessa senda, ocorre a implantação de novas
figuras, princípios e direitos. Um aspecto muito importante de distinção desta
constituição das anteriores é o ‘’consenso’ no âmbito da sua aprovação, uma vez que
esta nasce do debate da Assembleia da República representada por diferentes partidos
políticos (o que não se verificou nas anteriores).

Quanto ao âmago desta constituição, verifica-se o reforço das directrizes e princípios já


predefinidos para o Estado moçambicano, no entanto, de forma mais explícita pode se
mencionar os seguintes aspectos:

 No I capítulo do título I, referente aos princípios fundamentais, destaca-se para além


da maior ênfase quanto a descrição de Moçambique como Estado de Direito
Democrático e de justiça social, a referência constitucional sobre o reconhecimento
do pluralismo jurídico, o incentivo no uso das línguas veiculares da sociedade.
Outrossim, é contemplado o termo de Estado Unitário que respeita na sua
organização os princípios da autonomia das autarquias locais;
 Quanto á nacionalidade, destaca-se o facto do homem estrangeiro poder adquirir
nacionalidade moçambicana pelo casamento, antes só permitindo para a mulher
estrangeira;
 Os direitos e deveres fundamentais dos cidadãos para além de serem reforçados
ganham maior abrangência. Pode-se citar exemplo de alguns direitos/deveres antes
sem tratamento constitucional: direito dos portadores de deficiência, os deveres para
com o semelhante e para com a comunidade, os direitos da criança, as restrições no
uso da informática, o direito de acção popular, o direito dos consumidores;
 Para além do pluralismo jurídico, a importância da autoridade tradicional na
sociedade moçambicana passa a ter reconhecimento constitucional. Salientar que a
terceira idade, os portadores de deficiência, o ambiente e a qualidade de vida como
novos temas contemplados nesta constituição;
 O capítulo VI do título IV que se dedica ao tratamento do sistema financeiro e fiscal
em Moçambique, um tema que antes não tinha observação constitucional;
 Ocorre a criação de um novo órgão político, o Conselho de Estado e um novo órgão
de representação democrática – As Assembleias Provinciais. As garantias dos
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cidadãos no que concerne a actuação da Administração Pública são reforçadas com


o advento da figura do Provedor da Justiça. Nasce igualmente o Conselho Superior
da Magistratura Judicial Administrativa. A Administração Pública e os princípios
que norteiam o seu funcionamento também passam a gozar de tratamento
constitucional, assim como a Polícia da República Moçambique e o Ministério
Publico;
 O tratamento dado as disposições inerentes aos tribunais no título IX da
Constituição da República de Moçambique é mais pormenorizado. Merece destaque
o tratamento mais aprofundado que é dispensado as disposições do Tribunal
Administrativo, sendo que na CRM de 1990 ocupava apenas 2 artigos;
 O I capítulo do título XV se ocupa por matérias relacionadas às garantias
constitucionais em caso de Estado de Sítio ou de Emergência. No capítulo seguinte,
estabelece-se novos parâmetros para o acto de revisão constitucional, onde são
impostos novos limites materiais, devendo as leis de revisão constitucional respeitar:
a independência, a soberania e a unidade do Estado; a forma republicana de
Governo; a separação entre as confissões religiosas e o Estado; os direitos,
liberdades e garantias fundamentais. A restrição temporal é de 5 anos após a última
revisão, salvo deliberação extraordinária de 75% dos deputados da Assembleia da
República. E limites circunstanciais, onde se destaca que na vigência do estado de
sítio ou do estado de emergência não pode ser aprovada qualquer alteração da
Constituição.
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CONCLUSÃO

Chegado ao fim do trabalho, conclui-se que após a conquista da Independência


Nacional e proclamada a 25 de Junho de 1975, houve necessidade de se organizar e
regulamentar o funcionamento do Estado independente, por isso foi aprovada a primeira
constituição moçambicana a 20 de Junho do mesmo ano. Esta devolveu ao povo
moçambicano os direitos e as liberdades fundamentais, no entanto, o estado estava
totalmente nas mãos da Frente de Libertação de Moçambique, como única entidade
reguladora estatal, sem possibilidade de pluralismo político ou de ideias, em suma era
uma constituição muito exclusiva a FRELIMO. Um ano depois da independência
desencadeou-se uma guerra civil que durou 16 anos e, no amito das negociações para o
seu término entre o governo da Frelimo e Renamo, nasce a Constituição de 1990 que
introduziu o Estado de Direito Democrático, alicerçado na separação e interdependência
dos poderes e no pluralismo, lançando os parâmetros estruturais da modernização,
contribuindo de forma decisiva para a instauração de um clima democrático que levou o
país à realização das primeiras eleições multipartidárias. Em 2004, foi aprovada uma
nova Constituição que reafirma, desenvolve e aprofunda os princípios fundamentais do
Estado moçambicano, consagra o carácter soberano do Estado de Direito Democrático,
baseado no pluralismo de expressão, organização partidária e no respeito e garantia dos
direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos. Igualmente são criados novas figuras
que compõem o estado de ordem política, económica e jurídica. Este último modelo é
mais organizado do que os anteriores, no que tange ao corpo textual e traz conteúdos
mais profundos relativamente à organização e regulamentação estatal, procurando-se
com isto os aspectos positivos trazidos com a estabilidade e solidificação dos princípios
e instituições criadas.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

MOÇAMBIQUE. Constituição da República (1975). Constituição da República de

Moçambique. Maputo, Imprensa Nacional de Moçambique E. P, 1975.

MOÇAMBIQUE. Constituição da República (1990). Constituição da República de

Moçambique. Maputo, Imprensa Nacional de Moçambique E. P, 1990

MOÇAMBIQUE. Constituição da República (2004). Constituição da República de

Moçambique. Maputo, Imprensa Nacional de Moçambique E. P, 2004

SENGULANE, Hipólito. História Das Instituições do Poder Político em Moçambique.


1ª Edição, Maputo, Alcance Editores, 2015.

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