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CULTURA E JUVENTUDE DENTRO DO AMBIENTE ESCOLAR

Aluno:João Paulo de Lima

SOBRE A ETNOGRAFIA NO AMBIENTE ESCOLAR

Por meio da práxis da pesquisa etnográfica, bem como por meio do aporte oferecido pela
autora Cláudia Fonseca, pode-se perceber como a etnografia tem como caracteristicas de
método a valorização da narrativa, o uso do diário de campo, a observação participativa, a
inserção no meio, a naturalização de sua presença nos locais de pesquisa, o esforço de
compreender o ponto de vista do outro, a sua relação com a vida, bem como perceber a sua
visão do seu mundo.
Sendo Fonseca praticante experiente da etnografia, influenciada pelos princípios da
pesquisa de campo de Malinowski e inserida no contexto da pesquisa, a autora chama a
atenção e faz refletir sobre o quanto deve-se estar atento ao que rodeia os pesquisadores e
o quanto é difícil se despir de conceitos e pré-conceitos. Não é por acaso que Malinowski
insiste na necessidade da inserção do pesquisador no ambiente de pesquisa de maneira
concreta, afim de que os membros daquele espaço social sintam-se tão à vontade na sua
presença que deixem de perceber o pesquisador como elemento externo, estranho ao meio,
e vejam-no com naturalidade.
Antropóloga por formação e convicção, Fonseca (1999, p. 58 e 59) nutre uma estreita
relação com o método etnográfico. Acredita ser este um método que, além de ser um
instrumento importante para a compreensão intelectual de nosso mundo, também pode ter
uma utilidade prática. Para ela, “a etnografia é calcada em uma ciência, por excelência, do
concreto” e tem como start do método a interação entre o pesquisador e o objeto de estudo.
Afirma, ainda, que este método “[...] requer do pesquisador boa dose de paciência (para
registrar coisas aparentemente inúteis) e coragem para construir modelos […] equilibrados
a partir de fragmentos da vida social minada de contradições e ambivalências” (FONSECA,
2004, p.07).
A análise reflete o olhar detalhado, criterioso, da autora sobre os fatos, um olhar para além
dos nexos e relações que se estabelecem, um olhar que possibilita descobrir os fenômenos
embutidos em fatos aparentemente corriqueiros ou comuns, um olhar que leva em
consideração a corporalidade das informações através dos gestos, expressões que por
vezes falam muito mais que as palavras. Um olhar que só consegue ter aquele que observa
de forma participante, que imerge no mundo do objeto de estudo sem perder de vista a
intencionalidade científica. O olhar etnográfico, cuidadoso, que busca evitar equívoco do
reducionismo da etnografia a um método que se fecha em técnicas e orientações centradas
no individual e desprezam a análise social. Neste sentido, Fonseca, “indo além das falas,
apostando na observação das práticas sociais, (fez uma) abordagem (que) apoia-se menos
na linguagem normativa dos ritos do que na lógica informal da vida cotidiana inscrita no
fluxo de comportamentos” (2004, p.07), sem perder de vista os princípios científicos
delineados por Malinowski. Assim, a etnografia se justifica como método no próprio ato da
práxis etnográfica, abrindo caminho para se estabelecer como método antropológico dentro
do campo das ciências sociais.

TEMA DA PESQUISA

Diante das visitas à escola Estadual Prof. José Fernandes Machado e observando a
sociabilidade entre os estudantes e os membros da comunidade escolar, esse estudo tem
como tema de pesquisa a questão da cultura no ambiente escolar, pensando como os
membros da comunidade escolar manifestam das mais diversas maneiras as suas culturas,
hábitos, saberes, modos de ser e de pensar. Por meio da linguagem, das vestimentas,
cortes de cabelo, gostos musicais etc. foi possível perceber uma interessante variedade de
expressões culturais na escola, passando tanto pelos alunos, quanto pelos próprios
funcionários da escola, durante o dia-a-dia escolar. Sendo a cultura um dos campos
principais da antropologia, acreditamos que pode haver uma interessante abordagem
antropológica das mais diversas manifestações da cultura, em seu sentido amplo, dentro do
ambiente escolar. A cultura é um meio de expressar diversidade, tendo também por
consequência um significado político, pois é por meio da cultura que podemos encontrar e
reconhecer o outro, sendo um meio para resolver rivalidades políticas. Além disso, a
discussão da cultura permite pensar os choques culturais, mais presentes do que nunca na
nossa sociedade contemporânea, a partir da questão do que é cultura, tendo em vista que o
significado de cultura é algo que está em jogo na nossa sociedade, tendo as mais diversas
consequências políticas, sociais, econômicas, e, tendo em vista o espaço escolar, também
tem consequências educacionais, fundamentais para pensar o papel transformador que o
professor pode ter dentro da escola, na perspectiva de uma educação transformadora.
A escola é muito mais do que um espaço de ensino, e além disso, muitas vezes, na
perspectiva dos jovens, a função principal da escola nem é o aprender, mas sim a troca de
experiências, de vivências e porque não a troca cultural, sendo então a escola um espaço
em que a juventude forja a sua própria subjetividade, seus gostos e hábitos, sendo um
espaço definidor da cultura e também dos valores que serão carregados por esses jovens
durante a vida toda, o que só faz o papel do professor ser ainda mais fundamental,
pensando de forma criativa e não engessada de contemplar as diversas subjetividades que
se apresentam na escola.
Sendo a sociedade permeada por uma série de contradições, e estando a escola dentro do
seio da sociedade, não deixa a escola de expressar as diversas contradições da sociedade.
Os alunos e toda a comunidade escolar trazem essas contradições para o pátio da escola e
para a sala de aula, conferindo um caráter político às ações dos sujeitos, que estão em
constante busca por espaços de representação, bem como a busca por legitimação de seus
discursos, e inclusive de imposição desses discursos, numa estratégia de controle de poder.
E, sendo uma escola um dos espaços que muitas vezes está a serviço de condicionar a
juventude para aceitar os valores e a ideologia dominante das classes dominantes, bem
como é por exemplo a igreja, os jornais, a televisão e uma série de mecanismos de
transmissão da ideologia dominante da sociedade civil burguesa, cabe pensar a
necessidade de se enfrentar e se romper com esses paradigmas, no sentido de construir
uma educação libertadora, feita pelos explorados e oprimidos, e não por exploradores e
opressores. Assim, pensar a cultura é pensar quais são os caminhos pelos quais a própria
juventude, por meio dos seus próprios signos, hábitos e gestos, podem se auto-determinar,
construindo sua própria subjetividade para além das amarras da ideologia burguesa, por
exemplo rompendo a perspectiva mercadológica de cultura, bem como as amarras do
conservadorismo, que buscam o controle dos corpos da juventude, tentando impor padrões
e normas de gênero, sexualidade estéticos, religiosos e morais.
A pesquisa também tem como fim pensar formas de intervenção do professor na escola e
na sala de aula levando em consideração a diversidade de culturas que se encontra neste
meio. Como fazer com que os estudantes pensem não apenas a sua cultura, mas também a
cultura dos outros alunos e membros da escola? Como os alunos podem, por meio das
diferenças, se verem uns nos outros? Essas são algumas das questões que norteiam essa
pesquisa.
Em meio a uma sociedade permeada por discursos e paradigmas, tendo consequências
sociais e políticas, como se vem vendo no Brasil dos últimos anos, essa pesquisa busca
pensar a práxis educativa que reflita essas diversas narrativas e visões de mundo, que
muitas vezes se colocam em meio a uma disputa de espaços e poderes, de dominação,
numa relação que tem muitas consequências quando se pensa que a sociedade é dividida
por classes sociais, e permeada por questões de raça, gênero, sexualidade, entre outros.
Como podemos pensar as diferentes ideologias dentro da escola? Como pensar o conceito
de alienação no ambiente escolar? Como pensar os diferentes gostos culturais dos
membros da comunidade escolar, como modos de se vestir, cortes de cabelo, músicas,
gírias, tribos urbanas etc.? Esses são alguns dos aspectos gerais que essa pesquisa busca
refletir.

SOBRE O PROCESSO DA PESQUISA


Um dos significados originais de cultura é “lavoura” ou “cultivo agrícola”, o cultivo do que
cresce naturalmente. Assim, a cultura se separa do natural, sendo a transformação humana
da natureza e da vida. Se cultura significa cultivo, um cuidar, que é ativo, daquilo que cresce
naturalmente, o termo sugere uma dialética entre o artificial e o natural, entre o que fazemos
do mundo e o que o mundo nos faz. É uma noção “realista”, no sentido epistemológico, já
que implica a existência de uma natureza ou matéria-prima além de nós; mas tem também
uma dimensão “construtivista”, já que essa matéria-prima precisa ser elaborada numa forma
humanamente significativa.
Se cultura originalmente significa lavoura, cultivo agrícola, ela sugere tanto regulação como
crescimento espontâneo. O cultural é o que podemos mudar, mas o material a ser alterado
tem sua própria existência autônoma, a qual então lhe empresta algo da recalcitrância da
natureza. Mas cultura também é uma questão de seguir regras, e isso também envolve uma
interação entre o regulado e o não-regulado. E a cultura, muitas vezes, tem a peculiaridade
de não ter regras para aplicar regras. Sem esse caráter ilimitado e aberto, as regras não
seriam regras. Regras, como culturas, não são nem puramente aleatórias nem rígidamente
determinadas - o que quer dizer que ambas envolvem a idéia de liberdade.
A antropologia, em um momento da sua história, marcou o ponto em que o Ocidente
começava a converter outras sociedades em legítimos objetos de estudo, mas um
verdadeiro sinal de crise política nessa sociedade ocidental é quando essa sociedade sente
a necessidade fazer isso consigo mesma, pois existem “selvagens” também dentro da
sociedade ocidental, criaturas enigmáticas, semi-inteligiveis, guiadas por paixões ferozes e
dadas a comportamento rebelde; e também esses precisarão tornar-se objetos de
conhecimento disciplinado. O positivismo, a primeira escola autoconscientemente
“científica” da sociologia, revela as leis evolucionistas pelas quais a sociedade industrial
está se tornando inexoravelmente mais corporativa, leis que um proletariado indisciplinado
precisa reconhecer como não mais violáveis do que forças que movem as ondas. Um pouco
mais tarde, será parte da tarefa da antropologia conspirar contra a ilusão criada pelo
Ocidente da ideia do ‘outro’ como “selvagem”, “primitivo” ou “estranho”, congelando
conceitualmente esse outro na sua alteridade humana, mesmo enquanto destruía suas
formações sociais e os liquidava fisicamente.
Mas, a antropologia foi além e descobriu nessas culturas “primitivas” uma crítica da
racionalidade ocidental. Os hábitos de pensamento concretos e sensíveis dessas culturas
apresentavam códigos inconscientes com um grande rigor. Foi assim que a antropologia
estrutural de Claude Lévi-Strauss pôde apresentar tais “primitivos” tanto como
confortavelmente similares como exoticamente diferentes de nós “ocidentais”. Se eles, por
exemplo, pensavam em termos de Terra e Lula, faziam de forma tão complexa do que a
Física Nuclear para nós ocidentais. Tradição e modernidade, poderiam ser comparadas e
vistas como similares, sendo um projeto do estruturalismo e do modernismo. O “moderno”
se encontrava como “arcaico”, chegando inclusive a se perder de vista o que é moderno e o
que é arcaico, regenerando a própria contemporaneidade, tendo em vista a complexa
decadência que a civilização chegou, com suas guerras, fomes, misérias, conflitos etc. A
antropologia, dessa maneira, conseguiu descobrir no passado uma imagem do futuro. É
dando continuidade a esse projeto, que não deixa de ser político, que esse trabalho se
propõe a se manter. Agora prosseguiremos na descrição das visitas nas escolas.
Na primeira abordagem à escola entrei em contato com a professora Daisy, de sociologia
da Escola Estadual Prof. José Fernandes Machado (o “machadão). A professora é uma
mulher branca, de cerca de 30 anos, e estava vestida de camisa vermelha, calça jeans e
salto alto.No momento anterior a nossa conversa ela estava fazendo um debate em uma
sala de aula, e fiquei esperando sua presença na sala dos professores. A sala é mal
iluminada, tem pisos de porcelana, com uma mesa retangular grande no meio. Na sala
também se encontra um armário, uma mesa com café e água, bem como uma geladeira. Na
parede está pregado os horários das aulas. Depois de esperar alguns minutos, a
professora me atendeu e sentou na minha frente. A professora me contou alguns dos
dilemas da escola, e também algumas de suas peculiaridades, como por exemplo o fato de
que a escola tem uma mata de reserva ambiental, de onde aparecem diversos animais,
como sapos, aos quais ela relatou que alguns alunos chegaram a matar, e também o
aparecimento de uma cobra coral, que foi morta pelos funcionários da escola. A professora
parecia achar esse fato bastante pitoresco e inusitado, o que também de certa forma
também me chamou a atenção, porém a comunidade escolar não parece deixar que esses
acontecimentos sejam um empecilho para o funcionamento da rotina escolar. Eu inclusive
tive a oportunidade de ver uma aluna reagindo assustada a um sapo que pulava próximo a
cantina da escola, mas outros alunos e funcionários próximos ao sapo não estavam
assustados e pareciam naturalizar o fato.
Além disso, a professora também contou de alguns “problemas políticos” aos quais a escola
vem passando, com um diretor se demitindo, porém não deu detalhes. Ainda será preciso
averiguar mais detalhadamente quais são esses “problemas”, conhecendo a visão de outras
pessoas da escola, tentando saber se é algum problema ideológico, se é algum problema
com hábitos dos alunos, como indisciplina, desrespeito com as regras da escola, se é algum
problema de conflitos de interesses etc. A professora também disse que os membros da
escola denunciam uns aos outros, e que por isso é preciso ter muito cuidado com o que se
diz dentro da escola. Acredito que, tendo em vista um histórico geral de perseguição aos
professores devido às suas convicções políticas e ideológicas, como é o caso do
movimento “Escola sem Partido”, é possível que esses conflitos políticos e denúncias
possam girar em torno dessa situação.
Também disse que a escola está “caindo aos pedaços”, em relação à infraestrutura da
escola, ao qual ainda não tive oportunidade de conhecer completamente, mas pude
perceber que a arquitetura da escola é antiga, aparentando ser bem velha, com paredes de
concreto com infiltrações, rachaduras no teto, janelas de madeira e portas gastas. Mas a
professora disse que dentro das salas de aula a estrutura é mais moderna, contando com
projetores e laboratórios, o que é um contraste com a estrutura geral da escola.
Outro dilema peculiar da escola é que muitos estudantes vem passando por dificuldades em
se locomover para a escola, pois um dos ônibus escolares está com o pneu furado, o que
dificulta que muitos alunos moradores da Vila de Ponta Negra se locomovem para a escola,
tendo em vista que grande parte dos alunos são moradores desse bairro. Diante disso, os
professores têm sido orientados a adiar trabalhos e provas. Essa questão é importante de
ser analisada nas próximas visitas, pois talvez os conflitos políticos também girem em torno
dessa questão, tendo em vista que o próprio diretor disse que iria chamar a imprensa caso
esse problema não fosse resolvido. Além disso, é preciso levar em conta que os alunos
ficaram dois anos tendo aulas remotas, e que muitos não conseguiram absorver os
conhecimentos, o que coloca para os professores o desafio de ensinar agora em um ano o
que um aluno não aprendeu em dois anos, demonstrando a precariedade do ensino.
A professora disse que queria ter feito o curso de Ciências Sociais com a mentalidade que
tem hoje em dia, porque na época, segundo ela, tinha a “mente fechada”, pois era, segundo
suas palavras, uma fundamentalista religiosa evangélica, que inclusive tinha os hábitos de
vestimenta dos fiéis evangélicos. Em relação a esse detalhe, pude reparar que a professora
tinha uma tatuagem no braço direito, o que pode representar uma certa ruptura com os
modos de comportamento de um fundamentalista evangélico.
A professora também relatou os seus desafios para elaborar uma aula e conseguir captar a
atenção dos alunos, que muitas vezes se demonstram apáticos, e por isso colocou os
desafios de fazer aulas lúdicas, criativas. Ela colocou questões como “como lidar com um
aluno que te confronta na sala de aula?”, no sentido de que a depender, o professor pode
acabar sendo visto como “sem moral” pelos alunos, por não conseguir lidar com esse aluno.
Vejo que, apenas fazendo essa primeira visita breve à escola, pude perceber como o
problema da precariedade e sucateamento do ensino público no Brasil é um problema
crônico e generalizado, que coloca para nós que pensamos a educação grandes desafios
para refletir como transformar a escola.
Na segunda abordagem à Escola Estadual Prof. José Fernandes Machado cheguei ao local
às 13hrs e fiquei sentado em uma mesinha no pátio da escola, onde alguns alunos que
ainda não tinham entrado na aula fizeram uma rodinha em uma parte de terra do pátio e
começaram a jogar bola e a conversar. Foi um interessante momento de percepção da
sociabilidade dos adolescentes, que começaram a interagir entre si mesmos em um tom de
deboche e brincadeira, num momento de descontração, antes de irem para a sala de aula.
Alguns estudantes que não estavam jogando, mas que ficavam observando a brincadeira
sentados nos banquinhos, ficavam provocando os que jogavam, falando que do jeito que
um dos meninos chutava a bola, ele iria acabar quebrando a câmera de segurança da
escola. “Você é ruim demais!”, disse um outro menino a outro que jogava bola. Houve um
momento em que os estudantes ficaram receosos com algum outro adolescente que
parecia estar gravando e tirando fotos do grupo em questão, o que lhes pareceu suspeito,
mas que depois o adolescente se aproximou e começou a fazer parte do grupo. Outro
elemento que pude observar foi a forma de se vestir de alguns alunos. Um deles usava a
camisa do Flamengo, e começou a dançar em frente aos jovens que estavam sentados, em
um tom descontraído. Outro menino usava uma corrente de ouro no pescoço, boné de aba
reta e uma pochete. Uma outra menina usava a camisa da seleção brasileira. Esses
elementos são interessantes para ver como esses jovens vêem a escola como espaço de
expressão de sua subjetividade, de sua personalidade e seus gostos, mostrando que a
escola é muito mais do que um espaço de ensino, mas também de vida social e cultural.
Outro elemento observado foram elementos da vida privada e cotidiana dos alunos, e como
eles conversam entre si sobre os mais variados assuntos, mostrando que a escola também
é um espaço de construção da intersubjetividade e dos afetos dos estudantes. Um garoto
sentado conversava com os outros sobre o boato de “estar namorando e nem saber disso”,
em referência a uma relação que estava tendo com uma menina, e que se criou um rumor
de que os dois estariam namorando. Além disso, uma garota afirmou que estava com
“vontade de fumar”, o que chama atenção, devido os jovens serem menores de idade, e que
nos leva a refletir sobre os desejos da juventude, o que levou aquela jovem a querer fumar,
se o desejo de fumar é também algo social e não apenas de consumo, e também como
podemos pensar por exemplo a relação da juventude com o consumo de drogas, o que isso
pode ter a ver com o desejo da juventude de usar drogas para preencher um anseio, um
vazio de existência, tendo em vista que a fase da juventude é um momento em que os
jovens buscam experimentar várias experiências diferentes, aproveitar a vida à flor da pele,
entre outras questões existenciais e morais.
Além disso, tive a oportunidade de observar que o pátio apresentava mesas gastas com o
tempo, rachadas, havendo partes que o apoio da mesa já não existia mais, havendo apenas
os banquinhos, e essa área era dentro de uma região de terra e areia, com quase nenhuma
grama ou plantas, algumas ervas daninhas e uma árvore. No fundo da escola há uma
quadra poliesportiva abandonada, com as cestas de basquete quebradas, sem gols e
parcialmente rodeada por um matagal. Também há um campo de futebol de areia, que se
encontra distante das salas de aula. Tanto a quadra quanto o campo se encontram nas
proximidades de uma zona florestal, e devem estar próximas a áreas onde aparecem
muitos animais e insetos, pois como já foi observado no primeiro diário, é algo comum no
cotidiano da escola o aparecimento de sapos e inclusive de cobras. Quando eu estava
andando pelos fundos da escola, me deparei com um guarda que vigiava essa área, o que
foi uma situação um pouco estranha, que me fez pensar o porque aquele guarda vigiava
uma área que não havia nada o que ser vigiado, e imaginei que ele estava ali para impedir
que algum aluno fosse para os fundos fazer alguma coisa.
Depois que os alunos foram para as salas de aula, o pátio ficou esvaziado, com dois alunos
dormindo sentados nos bancos das cantinas, enquanto um funcionário sozinho varria e
limpava a mesma. Ao mesmo tempo, as trabalhadoras da cozinha estavam trabalhando,
cozinhando e limpando a cozinhar, enquanto escutavam o rádio, que tocava algumas
músicas evangélicas e de louvor, o que também é interessante de observar, para vermos
que para além da expressão das subjetividades dos alunos, também vemos a subjetividade
dos trabalhadores e outros membros da comunidade escolar, mostrando como a escola é
de fato um caldeirão cultural, em que diferentes subjetividades e diferentes vivências se
combinam.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A cultura não é unicamente aquilo de que vivemos. Ela também é, em grande medida,
aquilo para o que vivemos. Afeto, relacionamento, memória, parentesco, lugar, comunidade,
satisfação emocional, prazer intelectual, um sentido de significado último.
A cultura tornou-se uma preocupação vital da idade moderna por toda uma série de razões.
Houve a emergência, pela primeira vez, de uma cultura de massa comercialmente
organizada. A cultura de massa não foi apenas uma afronta à “alta cultura”, mas também
influenciou toda a base moral da vida social. Mudanças na natureza do capitalismo
empurraram a cultura para o primeiro plano por meio de uma estetização disseminada da
vida social. Enquanto isso, o mundo drasticamente reduzido do capitalismo transnacional
colocou, de forma cada vez mais eclética, diversos modos de vida juntos, tornando os
indivíduos conscientes de suas identidades culturais de maneira nova.
Em face desse florescimento cultural, vale refletir que os problemas básicos com que nos
defrontamos no novo milênio - guerra, fome, pobreza, doenças, endividamento, drogas,
poluição ambiental, o desenraizamento de povos - não são em absoluto especialmente
“culturais”. Eles não são basicamente uma questão de valores, simbolismo, linguagem,
tradição, pertinência de identidade, e muito menos uma questão das artes. No novo milênio,
a humanidade encara quase os mesmos tipos de problemas materiais de sempre, com
alguns poucos novos de acréscimo. Como quaisquer outras questões materiais, esses
assuntos têm um lado cultural; são associados a crenças e identidades, e cada vez mais
emaranhados em sistemas doutrinários. Mas eles são problemas culturais somente num
sentido que arrisca estender o termo a ponto de perder totalmente seu significado.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

FONSECA, Claudia. Quando cada caso NÃO é um caso: pesquisa etnográfica e educação.
Rev. Bras. Educ. [online]. 1999, n.10, pp. 58-78.

EAGLETON, Terry. A ideia de cultura. Editora Unesp. 2005.

ROTEIRO DE ENTREVISTA

Durante a pesquisa foram entrevistadas duas pessoas, uma professora de Sociologia e um


aluno do terceiro ano do Ensino Médio. Por questões de privacidade, os nomes dos
entrevistados serão preservados. As perguntas foram as seguintes:
1)Para você, o que é cultura?
2)Como você vê a cultura dentro do ambiente escolar?
3)Você acha que existem culturas 'superiores' em relação a outras?
4)Por que meios você acha que as pessoas mais acessam a cultura?
5)Você acha que o acesso à cultura também depende das condições materiais das
pessoas?
6)Você acha que no Brasil e no mundo existe o respeito às diferentes culturas?
7)Como você acha que pode ser resolvido os conflitos culturais?
A professora respondeu a primeira pergunta dizendo que para ela cultura é uma série de
expressões de valores, símbolos, tradições, modos de vida, que vão se passando de
geração em geração, e que na sociologia é visto como mais um objeto de estudo, tendo em
vista ser uma relação social, que se expressa em diversos âmbitos da sociedade. Sobre a
segunda pergunta a professora respondeu que na escola cada pessoa tem uma cultura
diferente, como por exemplo professores com diferentes religiões, gostos musicais etc.
assim como os alunos, que vêm de diferentes tradições em suas famílias. Sobre a terceira
pergunta a professora respondeu dizendo que acredita que não existem culturas superiores,
que esta é uma visão das elites e dos setores conservadores, muitas vezes influenciado por
uma visão eurocêntrica, que vê a cultura popular como inferior, justificando historicamente o
tratamento violento dado a povos que não seguem a visão ocidental. Sobre a quarta
pergunta a professora disse que nos últimos tempos a juventude acessa mais a cultura por
meio da internet e pelas redes sociais, dizendo que muitos dos alunos utilizam o YouTube e
o Spotify para ouvir música, em detrimento de outras formas de acesso à cultura e lazer,
como teatro, cinema, televisão, revistas e livros, o que também é consequência destas
últimas formas em parte se tornarem de mais difícil acesso por questões econômicas. Sobre
a quinta pergunta a professora fortaleceu o que disse em resposta à quarta pergunta,
dizendo que muitos dos estudantes das escolas públicas são filhos de trabalhadores, e que
nem sempre conseguem ter acesso a cinema, livros e outras formas de cultura, que muitas
vezes não são feitas para esse público de classe média baixa ou mais pobre, ao mesmo
tempo que devido aos altos custos são economicamente menos acessíveis. Na sexta
pergunta a professora disse que no Brasil de hoje o respeito às diferentes culturas é um
assunto delicado, com muito preconceito e conservadorismo, como por exemplo o
desrespeito às religiões de matriz africana, mas também aos LGBTQIA+, além das diversas
identidades dos povos negros, indígenas, imigrantes. Na sétima pergunta a professora
respondeu que para ela a saída é a mobilização da população contra esses conflitos, bem
como a melhoria nas condições de educação, pois por exemplo a condição do professor é
muito precária, com salários baixos, sobrecarga de trabalho e muitas outras dificuldades
dentro e fora da sala de aula.
Já o aluno entrevistado respondeu a primeira pergunta dizendo que cultura para ele são
coisas como “religião, música, filmes, cinema, teatro, pintura”. Na segunda pergunta ele
respondeu dizendo que na escola cada pessoa tem seu gosto, com gente gostando de k-
pop, de futebol, de funk, de anime etc. Na terceira pergunta o aluno respondeu que não,
que acha que cada pessoa tem o seu gosto, mas que “uma cultura é ruim quando tenta
impedir a liberdade do outro”. Na quarta pergunta o aluno disse que as pessoas acessam
mais a cultura por meio da internet, falando que seus amigos escutam música e assistem
séries pela internet, como Spotify, YouTube, Netflix etc. Na quinta pergunta ele falou que
“com certeza quem tem mais dinheiro pode ter mais acesso às coisas”, no sentido de poder
ter mais acesso à shows, ao cinema, às redes de streaming etc. Nas sétima pergunta ele
falou que “hoje em dia existe muito preconceito com a cultura dos outros”, citando por
exemplo o preconceito com o funk, como “coisa de favelado”, ou com pessoas que gostam
de k-pop ou mangá, que “às vezes sofrem bullying”. Na sétima pergunta ele falou que acha
que deveriam “ter mais debates sobre esses temas na escola”, e que a melhoria no acesso
à educação iria contribuir na maior conscientização das pessoas, para elas terem mais
respeito às diferenças.

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