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CFW, IPB Congonhas 31/07/2022.

Lição 4
III. Do Decreto Eterno de Deus

Para memorizar: BCW 7 “Os decretos de Deus são o seu eterno propósito, segundo o conselho da sua vontade, pela
qual, para a sua própria glória, ele predestinou tudo o que acontece”. Atos 2.23 “sendo este entregue pelo determinado
desígnio e presciência de Deus, vós o matastes, crucificando-o por mãos de iníquos”.

Introdução:
Até aqui aprendemos que da Palavra procede todo conhecimento seguro e infalível que
se possa ter de Deus, da sua vontade a ser obedecida e meio para a salvação dos homens.
Aprendemos que Deus é pessoal, que tem um nome, e que ele é o único Deus verdadeiro e ao
mesmo tempo é coexiste em três pessoas distintas. Ele é uno e trino, ele é Triuno. Assim, nós
aprendemos sobre a pessoa de Deus. A partir de agora vamos aprender um pouco sobre sua
obra, e o primeiro aspecto da obra divina que precisa brilhar em nossa alma e mente é o eterno
decreto de Deus. Essa é uma doutrina difícil, que excede toda a nossa capacidade intelectual,
que exige do crente a mais completa confiança na revelação da Palavra e o total abandono de
tentar entender racionalmente o Deus infinito. Há mistérios em Deus os quais ele não quis nos
revelar, por isso, precisamos orar por humildade para reconhecermos nossa insignificância
diante da grandeza incompreensível de Deus, por fé, para crermos que é verdadeiro aquilo que
a Palavra nos ensina sobre Deus e contentamento para estarmos satisfeitos por não sabermos
as coisas que Deus reservou para sua exclusiva glória.

Hoje aprendemos sobre os decretos de Deus em 3 partes: 1) Os decretos são eternos e


imutáveis; 2) Soberania de Deus e a responsabilidade humana; 3) A eleição e a predestinação.

I. Desde toda a eternidade, Deus, pelo muito sábio e santo conselho da sua própria
vontade, ordenou livre e inalteravelmente tudo quanto acontece, porém de modo que
nem Deus é o autor do pecado, nem violentada é a vontade da criatura, nem é tirada a
liberdade ou contingência das causas secundárias, antes estabelecidas.

1 – Decretos eternos e imutáveis

Sempre que formos discutir um assunto controverso, a primeira coisa a se fazer é


definir termos. Por isso, vamos começar definindo o que é o decreto de Deus. Para isso,
vamos fazer uso da resposta 7 do BCW.
“Os decretos de Deus 1) são o seu eterno propósito, 2) segundo o conselho da sua vontade, pela qual, 3)
para a sua própria glória, 4) ele predestinou tudo o que acontece”.

a) Soberano
Essa definição nos diz 4 coisas muito importantes sobre a doutrina do eterno decreto
de Deus: Os decretos de Deus são: 1) seu eterno propósito (Ef 3.11); 2) segundo o conselho
da sua vontade (Ef 1.11); 3) para sua própria glória (Ap 4.11); 4) ele predestinou tudo o que
acontece (Is 46.10). Vamos ver como essas verdades nos são ensinadas nas Escrituras. Vamos
começar olhando para o Salmo 33.10-11 para entendermos o que é o conselho de Deus.
“O Senhor frustra os desígnios das nações e anula os intentos dos povos. O conselho do Senhor dura para
sempre; os desígnios do seu coração, por todas as gerações”.

Notem comigo está colocando em gritante contraste o conselho e planos dos homens,
dos povos, com o conselho e planos de Deus. Os desígnios dos homens se frustram, mas o
conselho de Deus dura para sempre. Mas o que significa a palavra “conselho” nos salmos?
Efésios 1.11, que faz alusão ao eterno plano de Deus de salvar seus eleitos através de Jesus
Cristo nos ajuda a entender o significado da palavra “conselho”.
“Nele, digo, no qual fomos herança, predestinados segundo o propósito daquele que faz todas as coisas
conforme o conselho da sua vontade”.

A palavra “conselho” significa desejo, uma proposta da vontade, um plano de ação.


Deus decretou todas as coisas conforme o desejo, segundo a proposta e o plano da sua própria
vontade. Mas o salmo 33 que ainda nos ensina outra coisa importante: O decreto de Deus é
soberano, controlando os planos dos homens: “O Senhor frustra os desígnios das nações e anula os intentos

dos povos”. Mas o plano de Deus, esse não pode ser frustrado por ninguém, porque ele “dura para

sempre”.

b) Eterno
Mas quando foi que Deus “pelo muito sábio e santo conselho da sua própria vontade,
ordenou livre e inalteravelmente tudo quanto acontece”? O profeta Isaias, em 46.10, nos
responde dizendo que foi desde a antiguidade passada
“que desde o princípio anuncio o que há de acontecer e desde a antiguidade, as coisas que ainda não
sucederam; que digo: o meu conselho permanecerá de pé, farei toda a minha vontade”.

Essa é uma linguagem poética que significa: Desde a eternidade. Por isso nossa
confissão começa este capítulo dizendo que “Desde toda a eternidade, Deus, pelo muito sábio
e santo conselho da sua própria vontade, ordenou livre e inalteravelmente tudo quanto
acontece”. Sendo assim, desde a eternidade passada, antes da fundação do mundo, antes dos
tempos eternos, Deus, de forma livre, segundo o conselho, o plano, o desejo da sua própria
vontade, decretou inalteradamente tudo o que aconteceu, que acontece e que acontecerá.

c) Imutáveis
Se o decreto de Deus é eterno e Deus é imutável, será que o plano de Deus, o que ele
planejou antes da fundação do mundo, pode ser mudado? A resposta é não! O decreto de
Deus não pode jamais ser mudado. Tudo o que ele decretou antes de criar todas as coisas, irão
acontecer exatamente como ele planejou. Basta lembrar de Isaias 46.10: “desde o princípio anuncio o
que há de acontecer e desde a antiguidade, as coisas que ainda não sucederam; que digo: o meu conselho permanecerá de

pé, farei toda a minha vontade”. Vamos olhar para Hb 6.13, 16-18 que nos mostra que por causa do seu
nome, Deus não pode mudar jamais seus decretos
13 Pois, quando Deus fez a promessa a Abraão, visto que não tinha ninguém superior por quem jurar,
jurou por si mesmo... 16 Pois os homens juram pelo que lhes é superior, e o juramento, servindo de
garantia, para eles, é o fim de toda contenda. 17 Por isso, Deus, quando quis mostrar mais firmemente aos
herdeiros da promessa a imutabilidade do seu propósito, se interpôs com juramento, 18 para que,
mediante duas coisas imutáveis, nas quais é impossível que Deus minta, forte alento tenhamos nós que já
corremos para o refúgio, a fim de lançar mão da esperança proposta”.

Olhem para os versos 17,18. O plano de Deus não pode mudar. Esses dois versos nos
ensinam que a promessa de Deus é segura. Quando as pessoas querem garantir que sua
palavra vale alguma coisa eles costumam dizer: “Eu juto por minha mãe”. Isso porque aquela
pessoa considera a mãe algo sagrado e de valor insubstituível. Porém, Deus é o ser mais
precioso em todo o universo, por isso mesmo ele exige que nós o amemos mais do que a
nossa própria família. E por ser o supra valioso, por não existir nada de valor mais elevado do
que ele mesmo, ele jurou por si mesmo. Aquele que não pode mentir, jurou por seu próprio
nome.
O amor de seu marido, esposa e filhos podem falhar, as promessas dos homens mais
fiéis podem cair, contudo, a promessa de Deus, seus desígnios e seu eterno decreto de salvar a
todos quanto elegeu, permanece fiel para sempre. Aquele que começou a boa obra da salvação
mediante a fé em Cristo irá terminar o que que começou. Na Palavra Dele você pode confiar.
d) O aparente arrependimento de Deus

Mas se o plano de Deus não muda simplesmente porque o próprio Deus não muda,
então, como explicar passagens como Gn 6.6 “então, se arrependeu o Senhor de ter feito o homem na terra, e

isso lhe pesou o coração” e 1Sm 15.11, “arrependo-me de haver constituído Saul rei, porquanto deixou de me seguir e não
executou as minhas palavras”? Para entendermos esses textos, precisamos ter em mente alguns dos
princípios do estudo da Bíblia que já aprendemos na lição 2. Precisamos entender o contexto
próximo, precisamos examinar textos difíceis à luz do que a Bíblia diz em outros lugares, e,
principalmente, precisamos nos lembrar de que a Bíblia nunca se contradiz. Por isso, se a
Bíblia está nos dizendo que o plano de Deus não muda, e se o próprio Deus em Ml 3.6 afiram
dizendo: “eu, o Senhor, não mudo”, então, já podemos adiantar que é errada qualquer interpretação
dos textos acima que afirme que Deus mudou de ideia e estabeleceu um novo plano diferente
do original. Se fosse assim, Deus não seria confiável. Vamos ler 1Sm 15.10, 28-29para
entendermos o contexto imediato.
10 Então, veio a palavra do Senhor a Samuel, dizendo: 11Arrependo-me de haver constituído Saul rei,
porquanto deixou de me seguir e não executou as minhas palavras. Então, Samuel se contristou e toda a
noite clamou ao Senhor .

Mas logo em seguida nos lemos:


28 O Senhor rasgou, hoje, de ti o reino de Israel e o deu ao teu próximo, que é melhor do que tu. 29
Também a Glória de Israel não mente, nem se arrepende, porquanto não é homem, para que se arrependa.

Esse trecho é sobre uma mensagem de Deus para Saul através de Samuel. O texto
começa com as palavras divinas: “Eu me arrependo”, de ter feito Saul rei de Israel. E porque esse
aparente arrependimento? Porque Saul “deixou de me seguir e não executou as minhas palavras”.
Essas palavras, em se tratando de Deus, são fortes... vocês não acham? Para nós
humanos, arrependimento implica convicção de erro e mudança de vontade, de propósito, de
algo ruim para algo melhor. Mas o que significa Deus dizer “Eu me arrependo”? Deus pode mudar
de opinião? Deus é ignorante quanto ao futuro? Ele não sabia que Saul pecaria? Deus é como
nós, em cometer erros honestos e, às vezes, olha para suas decisões passadas e diz: “Puxa,
queria poder voltar e fazer isso diferente”? Parece que o nosso Deus comete erros e é forçado
a mudar de curso, não é verdade? Mas essa não pode ser a interpretação correta deste texto
porque o próprio autor inspirado nos explicou nos versículos 28 e 29 dizendo: “O Senhor rasgou,
hoje, de ti o reino de Israel e o deu ao teu próximo, que é melhor do que tu. 29 Também a Glória de Israel não mente, nem se

arrepende, porquanto não é homem, para que se arrependa”. Perceba que Deus não mudou a plano de
estabelecer um rei sobre Israel. Seu decreto permanece o mesmo.
O que está acontecendo aqui é o mesmo que acontece quando um pai ou uma mãe
conversa com o filho de 3 anos para explicar algo importante. Eles falam de modo que os
filhos possam entender. Aqui Deus usa um termo que faz sentido para nós: “arrependimento”.
Nosso Deus é pessoal e relacional, e, por isso, se comunica conosco de forma que possamos
compreender. Mas isso não significa que Deus era ignorante quanto ao pecado de Saul ou que
tenha sido pego de surpresa por sua rebelião. Como John Piper salienta, Deus é bem capaz de
lamentar uma situação que ele já sabia de antemão e que ele próprio fez acontecer. Portanto, o
modo correto de entender 1Sm 15:11 é considerar que Deus está falando como se fosse um
homem. Isso é o que a teologia chama de antropomorfismo, quando Deus assumi
características humanas para se revelar a nós.
“Entristeço-me por Saul ter pecado; ele não está mais apto para governar meu povo; é hora de levantar o

outro rei que eu já havia escolhido” porque “Eu nunca mudo de ideia”.
Há um sentido, que da nossa perspectiva, Deus muda seus desígnios para permanecer
pessoal e relacional, mas isso não significa que ele mesmo já não tenha decreto até mesmo
essas mudanças. Mas há um sentido que Deus não muda jamais seu plano e sua natureza.
Da mesma forma devemos entender Gn 6.6 “então, se arrependeu o Senhor de ter feito o homem na

terra, e isso lhe pesou no coração” . O autor, inspirado pelo Espírito Santo, usa palavras para nos
ensinar algo sobre Deus: A corrupção do pecado é algo tão maligno aos olhos de Deus que,
para entendermos em termos humanos, Deus diz que se ele pudesse mudar, preferia não ter
criado o ser humano. Contudo, Deus não comete erros em seu decreto, porque ele procede do
conselho da sua própria vontade, que é boa, perfeita e agradável.
Recapitulando: Assim terminamos nossa primeira parte da lição: O decreto de Deus é
soberano; Ele ordenou, desde a eternidade passada, livre e inalteradamente tudo o que
acontece, segundo o sábio e santo conselho da sua própria vontade. Deus jamais se arrepende
do que decretou, porque ele não muda, não mente e não é homem imperfeito para que se
arrenda, contudo, de modo condescendente, Deus revela-se de forma que possamos
compreender a dor e tristeza de seu coração por causa do pecado. Agora vamos nossa segunda
parte da lição

2 – A soberania de Deus e a responsabilidade humana

E é justamente por isso que nossa confissão declara que “ordenou livre e
inalteravelmente tudo quanto acontece, porém de modo que nem Deus é o autor do pecado,
nem violentada é a vontade da criatura”.

II. Ainda que Deus sabe tudo quanto pode ou há de acontecer em todas as circunstâncias
imagináveis, ele não decreta coisa alguma por havê-la previsto como futura, ou como
coisa que havia de acontecer em tais e tais condições.

Deus decretou todas as coisas

a) As coisas grandes, as pequenas, os aparentes acidentes e até mesmo o mal


Quando olhamos para Atos 4.28-29 “porque verdadeiramente se ajuntaram nesta cidade contra o teu santo
Servo Jesus, ao qual ungiste... Herodes e Pôncio Pilatos, com gentios e gente de Israel, para fazerem tudo o que a tua mão e o

teu propósito predeterminaram”, nos descobrimos que Deus decretou as cosias grandes que
acontecem no universo, como por exemplo, que os homens se ajuntassem para fazer mal a
Jesus Cristo, seu Filho, o Deus encarnado. Mas quando olhamos para Mt 10.29 “Não se vendem dois

pardais por um asse? E nenhum deles cairá por terra sem o consentimento de vosso Pai” , descobrimos que até as
coisas aparentemente insignificantes foram determinadas por Deus. Mas não só as coisas
grandes e as pequenas, Deus também decretou os aparentes acidentes da vida como, por
exemplo, a morte de Acabe em 1Rs 22.1-40, quando na guerra, “um homem entesou o arco e, atirando ao

acaso, feriu o rei de Israel” , que morreu em batalha, como profetizara o profeta Micaías. E para
nosso assombro, como nos ensina Isaías 45.5-7
“Eu sou o Senhor, e não há outro; além de mim não há Deus... 6 até ao nascente do sol e até ao poente,
que além de mim não há outro; eu sou o Senhor, e não há outro. 7 Eu formo a luz e crio as trevas; faço a
paz e crio o mal; eu, o Senhor, faço todas estas coisas”.

Até o mal, como juízo divino por causa do pecado, foi decretado por Deus. E até as
nossas escolhas estão decretas por Deus, conforme vemos em Pv 16.9 “O coração do homem traça o seu
caminho, mas o Senhor lhe dirige os passos” e Pv 21.1 “Como ribeiros de água assim é o coração do rei nas mãos do

Senhor, este, segundo o seu querer o inclina”.

b) Mas o homem é responsável


Mas essa doutrina bíblia levante uma pergunta óbvia e espinhosa: Se Deus decretou
todas as coisas, as grandes e pequenas, os acidentes, o mal como castigo pelo pecado e até os
planos de nosso coração, o homem ainda é responsável por seus pensamentos e atos diante de
Deus? A Bíblia nos ensina que sim.
Vejamos o caso de Judas, o Iscariotes, como ilustração. Em Atos 1.16 lemos o seguinte:
“Irmãos, convinha que se cumprisse a Escritura que o Espírito Santo proferiu anteriormente por boca de Davi, acerca de

Judas, que foi o guia daqueles que prenderam Jesus” . Segundo o apóstolo Pedro, que falava infalivelmente
da parte do Espírito Santo, a profecia sobre alguém que trairia o Messias deveria ser cumprida
em Judas. Contudo, em Lc 22.22, a respeito de Judas que o trairia, Jesus disse: “ mas ai daquele por
intermédio de quem está sendo traído” , isso porque em Jo 13.27, Jesus nos mostra que Judas agiu livre
e deliberadamente ao traí-lo. Por isso Cristo lhe disse: “O que pretende fazer, faze-o depressa”. Embora
estivesse profetizado, e Judas só pudesse fazer o que Deus havia decretado, a Bíblia trata Judas como
o único responsável e culpado pelo que fez.
Em At 2:23 temos um texto clássico sobre essa doutrina bíblia – “sendo este entregue pelo

determinado desígnio e presciência de Deus, vós o matastes, crucificando-o por mãos de iníquos” . Quem determinou
que Jesus fosse morto? Deus determinou! Mas quem a Bíblia diz que matou o Filho de Deus?
Nós... os homens! Tanto é verdade, que os judeus após ouvir as palavras de Pedro disseram: “o

que podemos fazer diante de nossa culpa”. E a resposta foi: “Se arrependam”, pois vocês sã culpados.
Esse parece militar contra toda razão humana, mas não é irracional, ela simplesmente
está além da nossa compreensão. Essa doutrina provoca indignação em muitos crentes, porque
eles simplesmente se recusam a crer naquilo que as Escrituras ensinam. Eles querem um Deus
que caiba em sua finita compreensão humana. Mas isso não é novidade. Já nos dias de Paulo
haviam pessoas iradas contra essa doutrina, como eu mesmo um dia a odiava.
Em Rm 9.17-20, depois de declarar que Deus levantou Faraó e lhe endureceu o coração
para não deixar sair os israelitas do Egito para o castigar por essa dureza de coração, Paulo
trava um diálogo imaginário contra todos os que se opõem a essa doutrina dizendo: “Tu, porém,

me dirás: De que se queixa ele ainda? Pois quem jamais resistiu à sua vontade?” E no v. 20 o apóstolo diz algo
que deve humilhar nossa pretensa arrogância de nos declararmos juízes sobre Deus. “Quem és tu,
ó homem, para discutires com Deus?! Porventura, pode o objeto perguntar a quem o fez: Por que me fizeste assim? Ou não
tem o oleiro direito sobre a massa, para do mesmo barro fazer um vaso para honra e outro, para desonra?”

Diante disso, pasmos, nós podemos até dizer sem receio: “Senhor, eu não entendo”,
contudo, se cremos que a Palavra de Deus é a infalível revelação celeste, jamais podemos
dizer “eu não creio”. Esses textos deixam expressamente claro que a responsabilidade
humana é uma doutrina Bíblica, como também mostra inexoravelmente que Deus decretou
tudo o que deveriam fazer. Tanto a responsabilidade humana por suas ações como o
soberano decreto de Deus a respeito destas ações são duas verdades bíblicas que não se
excluem. Contudo, que essa não é uma realidade fácil de aceitar. Por isso concordamos com
Steven Lawson quando diz: “a Bíblia não é difícil de entender, ela é difícil de engolir”.
O que temos na doutrina dos eternos decretos de Deus é uma aparente contradição e
não uma contradição de fato. Temos dois princípios: soberania divina e responsabilidade
humana, postos lado a lado na Bíblia, que aparentemente são irreconciliáveis, porém, ambos
são inegáveis. Ambos repousam em sólidos princípios bíblicos. Aceitamos que cada um deve
ser reconhecido como verdadeiro se tomado isoladamente, mas, ainda assim, para nós é um
mistério como eles se conciliam um com o outro.
Recapitulando: Deus decretou todas as coisas, as grandes e pequenas, os supostos
acidentes, o mal como castigo pelo pecado e até nossas atitudes, contudo, a Bíblia nos diz que
somos totalmente responsáveis por tudo o que fazemos. A infinitude de Deus não pode se
acomodar nos limites de nossa mente finita. Se Deus não quis explicar-nos aquilo que é claro
em sua mente infinita, devemos humildemente falar como Paulo: “Ó profundidade da riqueza, tanto da
sabedoria como do conhecimento de Deus! Quão insondáveis são os seus juízos, e quão inescrutáveis, os seus caminhos”

(Rm 11:33). Ou, talvez, como John Newton, compositor do hino maravilhosa graça: “Atribuirei
todas as aparentes incoerências da Bíblia à minha própria ignorância”.
Passemos agora a terceira parte de nosso estudo do capítulo 3 da CFW: Do Decreto
Eterno de Deus.

3 – A predestinação e a eleição
Vejamos o que nos diz nossa Confissão sobre essa doutrina:

III. Pelo decreto de Deus e para manifestação da sua glória, alguns homens e alguns anjos são
predestinados para a vida eterna e outros preordenados para a morte eterna.
IV. Esses homens e esses anjos, assim predestinados e preordenados, são particular e
imutavelmente designados; o seu número é tão certo e definido, que não pode ser nem
aumentado nem diminuído.
V. Segundo o seu eterno e imutável propósito e segundo o santo conselho e beneplácito da sua
vontade, Deus antes que fosse o mundo criado, escolheu em Cristo para a glória eterna os
homens que são predestinados para a vida; para o louvor da sua gloriosa graça, ele os escolheu
de sua mera e livre graça e amor, e não por previsão de fé, ou de boas obras e perseverança
nelas, ou de qualquer outra coisa na criatura que a isso o movesse, como condição ou causa.

a) Todo crente crê na predestinação e na eleição

A primeira coisa a ser dita aqui é que todo verdadeiro crente em Cristo, seja calvinista
ou arminiano, reformado ou pentecostal, crê nas doutrinas da predestinação e da eleição. SE
alguém disser que não crê nestas doutrinas, ele não é sequer crente, porque ela não crê no que
está escrito e ensinado nas Escrituras. O que acontece é que cada grupo entende de forma
diferente essas doutrinas. Nós cremos que “Deus antes que fosse o mundo criado, escolheu
em Cristo... os homens que são predestinados para a vida; para o louvor da sua gloriosa
graça, ele os escolheu de sua mera e livre graça e amor, e não por previsão de fé, ou de boas
obras e perseverança nelas”. Já os verdadeiros arminianos creem que Deus elegeu e
predestinou os homens que serão salvos com base em ter previsto que eles se arrependeriam e
creriam em Cristo. A falha deles está em reconhecer que até os planos de nossos corações e
cada uma de nossas escolhas, inclusive o arrependimento e a fé, estão inclusas no eterno
decreto de Deus. Só cremos porque Deus nos elegeu para crermos. Fomo eleitos para crer...
não nos tornamos eleitos porque cremos. Além disso, nossos irmãos arminianos creem que a
eleição não é de indivíduos, mas uma eleição corporativa. Segundo eles, Deus elegeu a igreja
e não indivíduos. Por outro lado, nós cremos “Pelo decreto de Deus e para manifestação da
sua glória, alguns homens e alguns anjos são predestinados para a vida eterna e outros
preordenados para a morte eterna”.
Predestinação é sim o decreto divino de ter elegido de forma abrangente que um grupo
dentre os seres morais, homens e anjos, serão salvos da ira vindoura, por outro lado, a eleição
aquele ato de Deus que, em cristo, antes da fundação do mundo, escolheu cada indivíduo que
seria salva, “não por previsão de fé, ou de boas obras e perseverança nelas”. Deixe-me
provar pelas Escrituras que
b) Escolheu individualmente os que serão salvos
Em Atos 13:48 lemos: “Ouvindo isso, os gentios alegraram-se e bendisseram a palavra do Senhor, e creram

todos os que haviam sido designados para a vida eterna” . Segundo esse texto, quem creu? “Todos... designados

para a vida eterna”. E por que eles creram? porque “haviam sido designados para a vida eterna” . Creram
porque foram designados para a fé.
Mas talvez você pergunte: Quem os designou? Para que? Quando foram designados?
E por que foram designados? Paulo nos dá as respostas em Efésios 1:4-5, dizendo Deus “nos

escolheu (designou, elegeu) nele (Jesus Cristo) antes da fundação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis perante

ele; e em amor nos predestinou para ele, para a adoção de filhos, por meio de Cristo, segundo o beneplácito da sua vontade”.

Sendo assim, quem elegeu e predestinou? Deus! Para quê? Para a salvação “ser santos e
irrepreensíveis”. Quando? “antes da fundação do mundo”. E por quê? Porque Deus livre e
soberanamente quis eleger alguns para a vida eterna “segundo o beneplácito (autoridade, querer,
agrado) da sua vontade”.

Isso deixa claro que os eleitos foram predestinados para a vida eterna antes da
fundação do mundo. Antes de você e eu sermos criados, antes de Jesus realizar a obra
redentora, Deus já havia escolhido os que seriam salvos.
Paulo deixa isso ainda mais claro em Romanos 8:29,30, acrescentando o fato de que os
eleitos já estão infalivelmente salvos. Ali lemos que “Porquanto aos que de antemão conheceu, também os
predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos. E aos que
predestinou, a esses também chamou; e aos que chamou, a esses também justificou; e aos que justificou, a esses também

glorificou”. Aqui Paulo diz que os que Deus anteriormente conheceu, provavelmente se
referindo à eternidade passada, antes da fundação do mundo, foram predestinados,
eficazmente chamados, justificados e glorificados. Porém, na ordo salutis (ordem da
salvação), a glorificação só acontecerá na volta de Cristo, contudo, o apóstolo está afirmando
que os eleitos já estão glorificados diante da face de Deus. Antes mesmo do fim dos tempos Deus
já sabe quem são os que estarão entre os salvos . E porque ele sabe? Porque ele mesmo, de
antemão, antes da fundação do mundo, escolheu os que ele iria salvar e decretou a eterna
salvação destes, de modo que Deus pode dizer no presente quem são os que estão entre os
salvos no fim dos tempos.
Além disso, como explicar o fato de que dentre tantos que ouvem o evangelho,
somente alguns creem em algo que é tão maravilhoso, que oferece perdão e vitória sobre a
morte? Esse é um problema sério que Paulo procura explicar em Romanos capítulos 9 a 11.
Será que o problema está em Deus ou no evangelho de Cristo? Não! Paulo diz: “... não pensemos

que a palavra de Deus tenha falhado”. Se a palavra não falhou, então qual é a resposta para a
incredulidade deles? Paulo responde “porque nem todos os de Israel são de fato israelitas” (Rm 9:6) . A
incredulidade de alguns deve ser explicada pela doutrina da eleição.
E talvez você esteja pensado: “Mas isso é justo?” Engraçado você pensar isso. Paulo
previu que muitos perguntariam isso e respondeu com outra pergunta: (Rm 9.15-16): “que diremos,

pois? Há injustiça da parte de Deus? De modo nenhum!” Deus pode dizer: “Terei misericórdia de que me aprouver ter

misericórdia e compadecer-me-ei de quem me aprouver ter compaixão” . Ou será que nos atreveremos a dizer a
Deus ele não pode ter misericórdia de quem ele quiser e que não pode condenar quem ele
quiser? Afinal, “não depende de quem quer ou de quem corre, mas de usar Deus a sua misericórdia” .

Concluindo:
A doutrina do eterno decreto de Deus é notavelmente clara em toda a Escritura. Ela
nos ensina que, antes da fundação do mundo, Deus, segundo o conselho da sua vontade,
decretou, “livre e inalteradamente, tudo o que acontece”, os eventos grande e pequenos, os
supostos acidentes, o mal como castigo pelo pecado, nossas ações, o que inclui o pecado,
porém, ele o fez de uma maneira misteriosa, de forma que “nem Deus é o autor do pecado,
nem violentada é a vontade da criatura”. Contudo, como vimos, o homem jamais poderá
culpar Deus por seus atos pecaminosos, porque de uma maneira maravilhosa demais para
entendermos, apesar de Deus já haver decretado até nossas escolhas, nós as fazemos
livremente, porque “Deus não pode ser tentado pelo mal e ele mesmo a ninguém tenta” (Tg 1.13) .
Também vimos como as Escrituras clara e abundantemente ensinam a doutrina da
eleição, por isso, ninguém herdará os céus sem que tenha sido designado por Deus para a
salvação. Contudo, todo aquele que for condenado, o será por causa do seu próprio pecado, da
sua arbitraria incredulidade e obstinada rejeição ao evangelho de Cristo.
Diante de difíceis doutrinas bíblicas como estas, devemos seguir o exemplo do
apostolo Paulo, que apesar de ter sido elevado ao terceiro céu, ainda assim se via incapaz de
compreender toda a plenitude de Deus, e, por isso bradou:
Ó profundidade da riqueza, tanto da sabedoria como do conhecimento de Deus! Quão insondáveis são os
seus juízos, e quão inescrutáveis, os seus caminhos! Quem, pois, conheceu a mente do Senhor? [...]

E após reconhecer o mistério divino e a sua própria limitação, Paulo conclui dizendo:
A Ele, pois, a glória eternamente. Amém! (Rm 11:33,34,36)

Aplicação:
1 – Nós não precisamos entender tudo, mas somos ordenados a crer em tudo o que a
Palavra diz: Meus irmãos, há em Deus mistérios que ele reservou para a sua exclusiva glória,
por isso, não devemos ter a pretensão de entender tudo sobre Deus. Nunca, nem na eternidade,
nunca saberemos tudo sobre Deus, simplesmente porque ele é infinito, e nós, criaturas, temos
nossos limites. Porém, se podemos honestamente dizer: “eu não entendo”, por outro lado
devemos crer em todo o conselho de Deus revelado em sua Palavra. Se eu não compreender o
que é mistérioso, ainda sim serei salvo e recebei glorias no por vir por ter crido além do que
posso entender, mas eu por não entender eu não crer nas Escrituras, eu não serei salvo, porque
é por meio da fé na Palavra de Deus escrita na Bíblia que o homem recebe a vida eterna. Por
isso, mesmo que você não entenda, não rejeite o que a Bíblia ensina claramente.
1 – Ela traz grande conforto e segurança: Quando Paulo diz que “todas as coisas

cooperam para o bem daqueles que amam a Deus, que foram chamados segundo os seus propósitos” , ele está
ensinando que tudo neste mundo está sob o soberano governo de Cristo, que está a direita do
Pai, usando tudo, a vida e a morte, a saúde e a doença, a pobreza e riqueza, para o eterno bem
da alma daqueles a quem ele, antes da fundação do mundo, escolheu para serem para Deus,
filhos santos e irrepreensíveis. Calvino explica essa segurança cristã da seguinte forma: “A
despeito de toda a fraqueza da carne, os eleitos, não obstante, não correm esse risco, porque
não estão firmados em sua própria capacidade, mas estão fundados em Deus” (Pastorais p.
239). A Salvação dos eleitos está fundada nos imutáveis e fiéis decretos de Deus, o que ele
começou na eternidade passada, ele terminará até que Cristo venha. Depender da fidelidade de
Deus e não da minha, traz segurança e conforto.
3 – A eleição nos foi dada para nos habilitar a servir: A eleição é para a salvação,
mas é igualmente para o serviço dos santos no reino de Deus. Os membros da igreja de Cristo
são feitura de Deus, “criados em Cristo para as boas obras” (Ef 2:10) . Cristo se entregou por nós, redimiu-
nos de toda iniquidade e purificou para si mesmo um “povo exclusivamente seu, zeloso de boas obras” (Tt

2:14). Deus não nos elegeu para sermos filhos inúteis, obesos espirituais ou infrutíferos em o
seu reino. Isso significa que se você está enxertado em Cristo, Ele é a videira e você o ramo, e
todo o que nele está produz fruto. Por tanto, a eleição nos garante uma vida frutífera diante de
Deus em nossa família, na igreja e na sociedade em que vivemos. Por isso, arregace as
mangas e disponhas suas mãos para servir nesta congregação, pois nós carecemos de
trabalhadores para esta vinha e Deus já mandou você para trabalhar nesta seara.

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