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8 A Doenga, a Satide e a Terapia Um estudo sistematico implica tema central ¢, nessa implicagao, progressivamente o delineia. Neste caso, a concepcio antropolégica de Jacob Lévy Moreno completou-se com mais uma de suas contribuigdes, oconceito de papel, E facil observar que o retrato humano-psicolégico delineado por Moreno, é prédigo em tragos de otimismo ¢ visio posi- tiva da vida. Sua caricatura seria uma humanidade gigante — pela espontaneidade criativa — ¢ com infinitos bracos estendidos pata os outros demiurgos — sua dimensio relacional. Este homem-genio mi reniano € sem davida o homem real, lutando aqui ¢ agora com a debt lidade do status nascendi ¢ sua clementaridade; é, em detetminados momentos, 0 homem doente. A deficiéncia humana que depois da experiéncia clinica de cada dia, 0 Moreno terapeuta acrescenta ao homem-génio do Moreno mistico, completa, humaniza, ¢ fundamenta seu conceito antropolégico superior proceso do adoecer afeta as fungdes essenciais da personali- dade, de forma auténoma. Na antropologia moreniana, a espontanei- dade adoece em suas fungées de adequacio ¢ de criagdo. E também a dimensao relacional do individuo pode adoecer, envolvendo assim o grupo ¢ a tangibilidade, e ocasionando a patologia do papel Para que a exposicao sobre a terapia seja completa, impde-se fazer um apanhado das técnicas terapéuticas; sendo 0 nosso propésito exclusivamente doutrinal ¢ nao técnico terapéutico, estas consideragoes se limitario unicamente a busca de sua raiz. Quer dizer: nfo expore- mos como se desenvolve o psicodrama, que elementos intervém, como comeca, prossegue ¢ termina uma sess4o psicodramatica. Também, nao falaremos de como se aplica um teste sociométrico ¢ como se ela- boram os seus resultados. Isto € apenas a mecinica que materializa a tazao substancial ¢ curativa de determinadas técnicas terapéuticas. Suposto que o adoecer esti necessariamente em relacio com a concepgio da pessoa — e também porque estamos arrematando nosso estudo — torna-se indispensavel, neste capitulo, a repetigdo de concei- tos ja expostos, agora porém, considerados unicamente sob seu aspecto patol6gico ¢ sob seu aspecto terapéutico. 229 1. A doenga psiquica Doenca da espontaneidade enquanto adequacio. Se vamos estudar o adoecer psicolégico da espontaneidade em seu aspecto de adequaco, temos que recorter de passagem, ao con- ceito operacional da espontaneidade ¢ ao que implica ¢ exclui esta qualidade da acomodaci0. Nao esquecamos, em principio, o equili- brio moreniano entre aceitagdo € progresso, que justamente torna o homem psiquicamente sio ¢ adaptado a cultura e @ sociedade em que vive. Aceitagao de certas normas sociais de convivéncia, pois o patolé- gico € 0 ‘‘desvio das normas culturais ¢ das leis sociais””. E progresso, como meta a ser alcancada. Quando Moreno se refere ao adoecer psiquico atribui uma impor- tancia tao radical a adequagio a realidade, que nos sentimos inclinados a unificar sob este aspecto, toda a sua concepcao de falta de satide psiquica. Quer dizer: em certos momentos chegamos a pensar que todo adoecer seria um separar-se da realidade, um abandonar as nor- mas da s6cio-cultura a que pertencemos: Por “‘patol6gico”’ no entendemos nada de absoluto. Do ponto de vista do universo, nao hé ‘“‘patologia’” alguma; ela s6 existe do ponto de vista das ciéncias humanas. Com este termo se faz alusio aos desvios das normas culturais © das leis sociais ou ao vazio psiquico que de varias maneiras prejudicam o status sociométrico dos individuos' Assim, dizemos que para Moreno, a primeira forma de adoecer, € devida 3 uma espontancidade inadequada. Uma das formas do adoccer da espontaneidade por falta de ade- quacao € a fantasia, que induz o individuo a viver fora da realidade Moreno, assim como outros autores, especialmente os psicanalistas que estenderam sua anilise dos sonhos aos sonhos acordados, atribui um cardter patoldgico a este sonhar: “Deve conceder-se que esta verda- deira vida criadora nao se confunde com o caprichoso devaneio diurno que freqiientemente € um sintoma patol6gico."”? Ainda baseado em que a fantasia € um estado patol6gico da espontaneidade, por falta de adequaco ao real, Moreno afirma que a sua aparico na evolucio psiquica do individuo (realidade-fantasia) traz junto um possivel perigo para a espontaneidade: A ctianga comega a desenvolver dois caminhos emocionais em seu uni- verso, Estes caminhos podem correr independentemente, sem encon- trar-se nunca. A ctianga viverd entdo, em duas dimensdes a0 mesmo tempo, uma real ¢ a outra irreal, sem ser perturbada por esta divisio. 230 Ou pode acontecer que as duas sendas, A ¢ B, de quando em quando tendam a reunit-se, a restabelecet o stafus original. Estas tentativas podem ocasionar colisOes entre as duas, produzir obstrugdes ¢ levar 0 fluxo da espontaneidade a inércia. E isto o que realmente acontece a pessoa humana. Enquanto vive, 0 homem procura soldar essa brecha original ¢ porque, em principio, nao o consegue, a personalidade huma- na, até em seus exemplates mais integrados, apresenta um tragico aspecto de velativa imperfeigdo. Existe uma luta constante dentro do individuo que trata de manter o equilibrio entre estes dois caminhos diferentes, pelos quais sua espontaneidade tenta fluir.’ Outra forma de manifestagio patol6gica da espontancidade, que também se refere explicitamente a nao adequacao da resposta, é a manifestacio instintiva. Diziamos que a concepgao vulgar da esponta- neidade nos sugere uma conduta sem freio, incontrolada, sem refe- réncia 4 qualquer norma. Esta nogao parecia referendada pela secular doutrina de Rousseau. Sem divida, Moreno se opde a esta concepgio, pois a espontaneidade deve ser realista, isto €, adequada a certas nor- mas convencionais de conduta: ‘A conduta desordenada e os arran- ques emocionais que derivam da acao impulsiva estao longe de ser desiderato na operacio da espontaneidade e pertencem ao dominio da patologia da espontaneidade.’" Ao sublinhar esta adequacio 4 realidade ¢ as normas sécio-cultu- rais, Moteno nao corte o risco de set tachado de imobilista ou tradi- cionalista inveterado porque é demais conhecida a sua preocupacio de Progresso constante e de busca de liberdade que permita ao individuo desenvolver suas potencialidades de génio. Quem nos acompanhou nesta exposicio, sabe que Moreno € progressista, evolucionista ¢ as vezes até revoluciondrio. Para ele a realidade € musdvel e, se a esponta- neidade deve ser adequacao a realidade, também deve ser dinamica, pois se se desajusta dessa realidade, adoece. Quando Moreno fala de doencas concretas da espontaneidade, por certo se refere a este tipo de inadaptacdo. Por isto Bischof pode afirmar, sem que ele o corrija, que ““2 conservacdo da notmalidade exige set-se suficientemente esponta- neo para criar uma conduta adequada as inevitaveis mudangas da vida. © neurético € o psicético ndo conseguem se ajustar, por sua conduta estercotipada e nao ctiativa’”> Podemos tomar esta frase de Bischof como programitica, pois resume perfeitamente algumas idéias de Moreno: que a normalidade psiquica esta em funcio da adequacio a realidade mutivel ¢, se nao se consegue esta adequacio, a ansiedade aparece como evidente sintoma do adoecer psiquico: A ansiedade € funglo da espontaneidade. .. Quando diminui a esponta neidade, aumenta a ansiedade; quando ha perda total da espontanei- 231 dade, a ansiedade alcanca o seu maximo de intensidade convertendo-se em derrota ou panico... De fato, existe ansiedade quando falta esponta- neidade: a ansiedade nao € a primeira a aparecer, conduzindo apés si 20 debilitamento da espontaneidade’ Diriamos — ¢ jé € classico em psicologia — que o neurético domi- nado pelo estado de ansiedade, realiza um sem numero de atos sem sentido, comeca muitas tarefas ¢ as abandona, tornando-se inclusive uma pessoa extremamente instével. Em terminologia moreniana, dirfa- mos que est4 empregando inadequadamente sua espontaneidade. Isto lhe provoca uma sensacio interna de constante insatisfagio — contra- ria & sensagao de plenitude ¢ seguranca pessoal — que o leva a estados depressivos e improdutivos, fazendo-o sentir-se pessoalmente incémo- do e tornando-o desagradavel para os que integram seu étomo social. E a tradicional definigao do neurdtico, ja proposta por Schneider. Moreno explica a psicose, tiltimo grau da enfermidade psiquica, como uma regressdo as primeiras etapas infantis, a0 perder-se a trilha da adaptagio & situagio ambiente ¢ evolutiva. Concretamente, € voltat-se 4 etapa de identidade em que se tem plena seguranga, pois 0 mundo nio sendo distinto de si mesmo, nao aparece como ameacador. A doenga da espontaneidade criadora A forca criativa da espontancidade também adocce. O mal nao se limita a inadequacio a realidade; a ‘“forca’’ ou o ‘“catalisador”” que promove o desenvolvimento evolutivo ¢ perfectivo do mundo e a posta em ato da genialidade improvisadora do homem, também é suscepti- vel de patologia. Tudo o que no homem ou no mundo, impeca esta evolucio renovadora e criativa, € causa de adoccimento psiquico. De modo geral jé sabemos que 0 inimigo da espontaneidade criadora é 0 4 pronto””, o acabado (conserva cultural). Moreno mantém até o fim de seus dias, a luta obsessiva © as vezes utdpica contra esses residuos culturais, A vida esta abarrorada de normas, costumes, hébitos, meca- nismos que, por um lado tornam mais cémoda a existéncia ¢ por outro, atentam contra a vida genuina, contra a espontaneidade ctiadora, Quando se produz um sufoco da espontaneidade, surge uma neurose: Quando a situagdo presente ndo é francamente abordada, quando apenas incompletamente vivida, podem aparecer ‘'produtos residuais"” da espontaneidade em ato, que detém o progresso da aprendizagem. Estes produtos residuais, podem scr causados por diversos estimulos, 232 como pot exemplo, as influéncias ou press6es sofridas no proprio curso da ago. Amitide se deve a estes restos de agdo o que se costuma chamar, frustragio do sujeito. Este pode entao comportar-se de trés maneiras diferentes. Em primeito lugar, pode deixar que os residuos se acumulem © tornem instdvel ¢ insuportavel a sua vida imediata; tornando-se um doente mental; em segundo lugar pode servir-se deles como de clichés para construir esterestipos mentais ¢ modelos culturais falsos” Dissolver estes residuos ¢ comportar-se de maneira espontanea € ctiadora, € a terceita postura; consistiria em apoiar-se nestas consetvas ¢ dar uma tesposta original. Estes restos culturais que ameacam a espon- taneidade esto encarnados no seu mundo familiar, nas imagens do pai e da mae com quem tentou identificar-se e que podem esgotar sua enetgia psiquica, impedindo-lhe a auto-realizacao ¢ causando-lhe a doenga No decorrer de sua enfermidade dedicou grande quantidade de energia s imagens oniricas de seu pai, de sua mie, de sua mulher ¢ de seus filhos, como também a determinadas imagens que, dentro de si, tém existéncia propria: suas fantasias ¢ alucinagdes. Nelas gastou grande parte de sua espontaneidade, de sua forca e de sua produtividade. Despojaram-lhe de sua riqueza; tornou-se pobre, fraco ¢ doente®. Moreno atribui grande parte do adoecimento da espontaneidade ctiadora ao sistema educativo, que faz memorizat porém esquece a relacao com a vida. Ao sistematizar sua teoria da aprendizagem vimos a importancia de unificar 0 contetido aprendido ¢ 0 vivido. Durante os importantes anos da infancia ¢ da adolescéncia, 0 individuo se move em dois mundos tao distantes e tao diferentes em sua estrutur que unca se associam. Muitas perturbacdes emocionais da personal dade em desenvolvimento, slo o resultado imediato das perplexidades e incongruéncias do nosso sistema educacional?. A doenga da tele-relagao A doenga na dimensio relacional do eu levanta o problema do adoecer do grupo, ligado a debilitacao do fator tele, ¢ também coloca © problema de uma terapia igualmente grupal. Impée-se distinguir entre a doenga do grupo enquanto tal e a doenga do individuo, no grupo. O adoecer do grupo como “‘sujeito’’ apresenta duas variantes: a primeira, enquanto grupo sociométrico € a outra, enquanto grupo 233 transferencial. Nesta dimensao transferencial 0 individuo, como mem- bro do grupo, pode adoecer em seu aspecto tendencial, isto €, quando € isolado, ou no aspecto cognitivo, se ignora sua posigio dentro do grupo. O grupo sociométrico se integra pela livre escolha afetiva miitua dos membros que 0 compéem. Este grupo difere profundamente do grupo formal ¢ imposto. Como a estrutura psicolégica € diferente, torna-se facil compreender que entre as duas estruturas, a formal ¢ a sociométrica, devam surgir conflitos: ‘‘os conflitos € as tensdes no grupo ofiginario aumentam em proporcio direta da diferenga socio- dinamica entre a estrutura oficial ¢ a sociométrica’’°. Conseqiientemente, é facil deduzir a tiltima etapa a que Moreno chega, em seu raciocinio baseado na experiéncia: quanto mais uma autoridade externa se empenhe em impor uma estrutura formal a um grupo sociométrico, mais aumentara 0 conflito. Os conflitos que podem existir no grupo nao se reduzem a que esteja ou nao democraticamente constituido. Inclusive, um grupo formado sociometricamente, também pode ser um grupo doente. Isto acontece quando o “‘cimento"’ que une os seus membros, formando a estrutura grupal, nao é a relacdo-télica mas a transferéncia: Todo grupo patol6gico € predominantemente um grupo transferencial. O excesso de transferéncia rebaixa a coesio do grupo e altera a sua esta- bilidade. Um grupo nao pode viver s6 de transferéncia. E preciso que nele se formem estrucuras télicas para garantir sua integracio construtiva e sua unidade"™ ‘Também o grupo em que predominam os isolados € um grupo doente, porque quando numa sociomatriz dominam os mutuamente nfo relacionados, € sinal de que existe falta de coesao: ‘Nos grupos pa- tol6gicos o nameto de isolados € mais alto que nos grupos normais ¢ nos grupos formados ao acaso; ¢ 0 niimero de pares ¢ também menor.’ Estas escolhas mtituas se devem ao aspecto tendencial da relacao télica, que em seu aspecto cognitivo € exainada através do teste de percepcao sociométtica; se o aspecto cognitivo do fator tele € deficien- fe, nos mostra que o individu, embora podendo ser objeto de muitas escolhas, se ignora sua posicao dentro do grupo, € um enfermo socio- metricamente falando. Também o € individualmente, porque carece de adaptacio a rcalidade: Até certo ponto todos és percebemos com exatidio, se as cortentes de simpatia ou antipatia que fluem em nossa diresio, tendem a aumentar ou diminuir; assim acontece, pelo menos tratando-se de individuos normais. Quando a capacidade de percepcio intuitiva enfraquece, 0 individuo softe sob o influxo de percepsdes falsas alteradas. Os obser- 234 vadores clinicos suspeitam, sempre que estes transtornos sao especial- mente caracteristicos, de individuos doentes emocionais, tais como os paranbicos € os esquizofrénicos'*. Patologia do ‘‘papel’’ ‘Finalmente, chegamos a patologia da tiltima caracteristica da estructura da personalidade, segundo Moreno: o papel ou o aspecto tangivel ¢ experimentivel do eu ¢ da personalidade. O papel adoece fundamentalmente por duas raz6es: ou porque a sociedade nos impée a aceitacho de fungdes vitais que ndo desejamos cumprir, criando um estado de permanente frustracio, ou porque desempenhamos o papel que escolhemos, porém no como o desejariamos desempenhar: Exige-se de cada um de n6s, que viva segundo o seu papel oficial na vida; um professor deve atuar como professor; um aluno como aluno etc... Porém cada individuo sonha assumir muito mais papéis do que Ihe sao permitidos desempenhar; ou pelo menos, deve limitar-se ao seu papel, desempenhando as suas variantes. No decorrer de seu desen- volvimento, cada individuo € solicitado por muitos papéis que desejaria traduzir em atos e a pressio ativa exercida por esta pluralidade de papéis secretos sobre o papel manifesto ¢ oficial, € o que freqiientemente origi- na o sentimento de ansiedade"* E freqiiente, em Moreno, esta idéia de opressio ‘‘oficial’’ que a sociedade exerce sobre o individuo, com relagao ao desempenho de seu papel. Um exemplo de que o individuo adoece por nao desempenhar os papéis que desejaria, devido as circunstancias impositivas externas, 0 encontra no fracasso de muitos casamentos. O conflito se estabelece ao nivel da imposicao de papéis: Nas citcunstncias otdinérias, nao obstante, é possivel que, pata ajustar- se as exigencias oficiais relativas ao matriménio c igualmente as exigén- cias de uma atitude leal, reaunciem de fato a viver certos papéis que foram capazes de realizar no passado; ou, podem inclusive proibir-se a si mesmos, o desenvolvimento de novos papéis, temendo que o conjuge nao seja capaz de aceité-los ou satisfazé-los. Isto produz_ com freqién- cia, um conflito tipico na estrutura de papéis dos cénjuges... Com 0 cempo vai-se formando uma brecha emssua telaglo... Dois dos papéis de seu étomo cultural nao satisfeitos, aparecem como um branco desco- berto para qualquer outra mulher que seja capaz de satisfazé-los melhor que sua mulher’, 235 Em suas afirmagoes sobre o papel patolégico, devido as circuns- tancias externas que o impde, Moreno chega a dizer que uma pessoa adquire um papel patolégico porque os demais espera (expectativa do papel) que o desempenhe de uma maneira patol6gica. Esta se refe- rindo a opiniao, hoje comum em psicologia social, de que o homem se comporta como pensa que os demais esperam dele. Cria ou criam-lhe um papel patolégico assim como cria ou criam-lhe um papel simpatico ou de pessoa equilibrada A origem da doenga remonta aquela primeira e reciproca adogao de papéis, com o primeiro ego-auxiliar — a mae. Quando o calor do contato mae ¢ filho nao existe, da-se a deformacao patolégica do papel, j&em sua origem: A substituigao do ego-auxiliar, a mae, por um objeto auxiliar, a mama- deira, nao deixa de ter sérias conseqiiéncias, pelo menos em certo petio- do, durante 0 qual se estabelecem os fundamentos emocionais da apren- dizagem. A mamadeira induz muitas mies a reduzirem ao minimo, a sua presenga no ato da nutricéo € a acrescentarem um artificio que pres- siona a mamadeira, automaticamente, na boca da crianga, até que seu apetite esteja satisfeito™®. Em circunstincias semelhantes pode-se encontrar uma mae cujo ndimero de filhos exceda ao campo de sua expansividade afetiva, no lhe permitindo achegar-se 2 cada um. Estas linhas de Muchielli nos podem servir como resumo final, sobre a importancia que o papel tem, para Moreno, com relacio a cura ¢ a0 adoecimento psiquicos: Aprender ou voltar a aprender a assumir os papéis necessérios, ser capaz de trocar de papel pata fazer frente as exigencias de uma situagio dada, é sindnimo de ajustamento da petsonalidade social e, segundo Moreno, de abertura ¢ de afirmacio da personalidade. Desse ponto de vista, nossa personalidade € o conjunto de papéis que podemos representar, assim como a atitude para assumir o papel adaptado a situacio atual ¢ a sua circunstncia, Daf se deduz a grande importincia que Moreno di ao sociodrama, como valor terapéutico, buscando 0 florescimento da espontaneidade ¢ o desaparecimento dos ““papéis crénicos”’ que fazem das pessoas uns ‘tinadaptados'”!? Esséncia da doenca psiquica Esgotamos a etiologia do adoecer psiquico através de cada um dos varios aspectos que Moreno considera integrantes da petsonalidade 237 humana. Porém a esséncia do adoecer € Ginica; em altima instancia, para ele o adoecer humano, é o adoecer da espontaneidade: ‘Uma grande parte da socio ¢ da psicopatologia humana, pode set atribuida a um insuficiente desenvolvimento da espontaneidade.’’ Também outros criticos chegaram a esta conclusio: ‘Moreno actedita que o homem €, por natureza espontaneo e criador ¢ adoece quando nao pode utilizar esses dons naturais.””®* Esta afirmacio to sintética exige set comprovada ¢ até ja o estara se tudo o que dissemos do adoccer dos gtupos ¢ do papel, for realmente um adoecer por inadequacao ou por falta de criatividade, devida a opressao externa. Um dos casos de adoecimento do grupo teria sua otigem no con- flito entre 0 grupo sociométrico ¢ 0 grupo oficial. O grupo sociomé- ttico se alicerca na espontaneidade ¢ livre atragao mitua dos indivi- duos. Em contraposicao, 0 grupo oficial seria um grupo imposto pela autoridade constituida. Nao é dificil traduzir o conflito entre consti- tuigio oficial e sociométrica, em termos de conflito entre conserva cul- tural e espontaneidade. ‘A segunda maneira de adoecimento do grupo, consiste na carén- cia do fator tele ¢ na superabundancia da transferéncia. Dizer que um grupo adoece por excesso de transferéncia, € 0 mesmo que afirmar sua doenga a partir da caréncia de respostas espontaneas adequadas. Falamos dos individuos cujo status sociométrico dentro do grupo, €0 de isolado, ¢ fizemos especial alusio aos que, sem serem isolados, acteditam sé-lo. A estes Gltimos poderiamos definir como individuos que dao resposta espontinea inadequada por nao perceberem em que linhas de atracdo ou rejeigio se encontram. Uma falsa percepcao da situagao sociométrica € uma inadequacio 4 realidade. Ainda mais facil € demonstrat que o pape/ adoece por caréncia de espontaneidade. O homem nao pode adotar espontaneamente os papéis que desejaria, porque uma sociedade organizada em conservas culturais, o impede; trata-se, portanto, de um adoecer da espontanei- dade criadora. 2. A saitde psiquica A satide da espontancidade. ‘Apés 0 diagnéstico, vem a fase curativa ou terapéutica, por meios adequados. Numa exposico torna-se impossivel separar os fins ¢ 05 meios terapéuticos. Ajustando-nos pois estritamente a0 processo tripartido que nos haviamos proposto: adoecer — curar — terapia. E 238 para nfo cometermos 0 desatino de levantarmos hipéteses quando ja existe afirmag6es, comecamos com algumas palavras de Moreno que concentram todo o problema terapéutico: ‘‘O objeto deste livro € introduzir métodos que mais aproximem a psicoterapia da vida real." Estas palavras se completam com o programa psicoterapéutico que citamos em seguida Ao estarmos possuidos por um determinado ideal de comportamento social normal, nos sentimos inclinados a confirmar ‘‘a terapia realista’’, como tinica solucio. Nossa idéia de cura do paciente, consiste no seu retorno as condigées somaticas ¢ psiquicas que o dominavam antes do adoecer. Confiamos pouco numa auténtica "‘transformagio” da perso- nalidade.... Nosso objetivo habitual € que o paciente seja aprovado no “‘exame da realidade’’, liberado de suas fantasias ¢ decepsdes ¢ reinte- grado na realidade; isto €, & norma cultura, A espontancidade criadora adoece porque as conservas sio tio poderosas que sufocam a criatividade potencial do sujeito, etradicando sua conduta flexivel. Tudo o que Moreno afirma com relacao & satide da espontaneidade, nesta segunda acepcio, podemos sintetizar em trés palavras — flexibilidade, poder e criatividade —. Quet dizet que, embora usando as conservas culturais, pelo dominio das mesmas, 0 sujeito deve manter flexibilidade de conduta e adotar uma atitude idéntica a que manteve o iniciador das referidas conservas: 0 objetivo dos métodos terapéuticos deve ser proporcionar aos pacientes uma variedade de situacdes operativas flexiveis, capazes de tefletit 0 carater ‘‘multidimensional’’ da vida’. Moreno diz explicitamente que nao se trata de ser criativo a cada momento: o que € realmente patol6gico é ter a sensacao de estrangula- mento, proprio da conduta neur6tica. Estas palavras evocam aquela forma de espontancidade dramética que nao cria nada de novo, porque embora utilizando 0 que lhe € oferecido pelo meio cultural em que vive, 0 individuo o assimila como proprio e no como imposicao alheia. Curando a espontaneidade criadora, 0 individuo recupera o senti- mento de poder que havia perdido quando as conservas dominavam sua conduta ¢ quando agia resignado e impotentemente submetido: O sujeito se sente frustrado, por exemplo, no papel de pai ou em qual- quer outro papel de sua vida real e desfruta da sensacio de dominio € realizacdo, através do psicodrama, que the confere uma satisfacio sim- bolica’*, Ao que parece, pata Moreno, certo tipo de doenga resulta de que pessoas ou imposigdes externas a0 sujeito, Ihe tenham subtraido sua 239 pela anilise sociométrica, Consideramos esse julgamento, além de a-cientifico, pouco justo, E nao questionamos absolutamente a finali- dade dos estudos sociométricos: Sem diivida, se tais leis existiram (as leis que regem o desenvolvimento da sociedade humana em seu conjunto) puderam ser descobertas, disto resulta, logicamente, que o homem deverd adaptar-se a elas € que as técnicas terapéuticas deverio ser elaboradas em conseqiténcia® E de fato, Moreno tendo descoberto uma zona de conflitos entre © espontineo, 0 sociométrico ¢ 0 oficial, vai criar técnicas de psicote- tapia de grupo em que se dé primordial importancia as manifestagdes espontineas dos individuos participantes: Atuar livre ¢ sem inibigdes. O atuar sem inibigdes no € proibido aos membros dos grupos, como na psicandlise, mas ao contratio, eles podem conduzir-se em toda liberdade. Pés-se em evidéncia que ha uma espécie de “‘atuar terapéutico”’ provocado pela propria atmosfera do grupo, em oposicio as formas de atuar irtacionais e perturbadoras”. Digamos finalmente: a sociometria, tem a finalidade terapéu- tica, de encaixar cada membro em seu lugar, para que assim, o grupo harménico possa atualizar todas as suas potencialidades. Inclusive, um grupo democratico nao € necessariamente sao, em seu aspecto psiquico, e pode adoecer por falta de coesao. E precisa- mente o fator tele que explica a satide € a coesio do grupo; € por isso, logicamente a terapia grupal se propde a incrementar a inter-relagdo: ‘todo grupo tem uma detetminada coesio: a tarefa do psicoterapeuta. consiste em conduzir 0 grupo doente, de um nivel inferior a um nivel superior de coesio”. © problema da satide grupal por saturagZo de isolados ¢ inadap- tados, preocupa a Moreno. Poderia parecer a principio, que a melhor solucdo para o grupo seria a etradicacdo de tais pessoas, seguindo as leis darwinianas da selec natural. Todavia, impée-se procurar que elas também encontrem um grupo sociométrico que possibilite sua adap- taco. ‘‘O problema nio consiste simplesmente em encarat a alterna- tiva da supressio do inadaptado ou a sobrevivéncia do adaptado, mas em promover a sobrevivéncia de uma personalidade flexivel ¢ esponti- nea: a personalidade do criador.’’*! A primeira tentativa de adaptacdo deve realizar-se no proprio grupo a que pertence 0 sujeito isolado explorando-se outros critérios possiveis, para descobrir em qual deles se encontra par ou o triangulo em que se pode integtar: ‘toda proposta de terapia de grupo deve-se levar em consideracao a possibilidade de que, recortendo a outros crité- rios, 08 nao eleitos possam encontrar pares € suas escolhas’”” 241 A satide do desempenho de papéts A cura do desempenho de papéis se identifica com a cura da espontaneidade criadora. Através da representacdo dos papéis, no psicodrama criador, o individuo doente adquite 0 dominio e 0 poder de recriagdo de sua petsonalidade que enquanto fator tangivel, se identifica com o papel. No caso de papéis nao vividos, o importante € que a situaco concreta da vida permita viver aqueles papéis mais amplos, que incluem outros secundarios: No caso do senhor T, um pape! no realizado (0 poeta) se ligou a um Papel afim (0 aventuteiro). Logo estes papéis se combinaram ¢ provo- caram a aparigio de outro papel nao realizado mais profundo, o pai. A cadeia de papéis, poeta-aventureiro-pai, provocada pela senorita S, por sua ver reavivou no senhor T, seu papel de amante. Demonstrou-se em outro trabalho, que quanto mais inclusivo € 0 processo de aquecimento para um papel — quanto mais amplo € o tertitério que esse aqueci- mento abarca numa personalidade especifica — mais esse papel se torna satisfat6rio ¢ mais intensamente inspira o desenvolvimento da iniciativa ¢ da espontaneidade em toda a situacio vital do sujeito’. Ao expor 0 adoecimento dos papéis, fizemos referéncia a que um estado neurético pode ser produzido por imposigio propria, ou por imposicao dos demais, dada a sua caracteristica de expectagdo. Nestes casos a terapia consiste em fazer 0 paciente compreender que cle mesmo se impés o papel neurético ou que os outros o fizeram assumi-lo, Portanto, da mesma forma que o assumiu, podera aban- doni-lo: Tao logo o paciente se deu conta de que o papel neurético nfo ‘'ven"’, mas € produzido por ele e que mediante simples exercicios espontineos, pode interromper seu progresso a qualquer momento, seu estado come- ou a melhorar Em todos os niveis da personalidade, individual ¢ relacional, a cura se produz pela consecusao de estados espontaneos. Este é 0 resul- tado definitivo, ao nivel terapéutico, segundo Jacob Lévy Moreno. Os processos psicoterapéuticos necessitam da espontaneidade para serem verdadeiramente curativos. A técnica da associacio livre, por exemplo, necesita da espontaneidade, embora se limite exclusivamente a forma verbal. Porém aqui 0 eficaz nao sao as associagdes de palavras mas a espontaneidade que opera nas associagdes. O volume das associagées verbais sera tanto maior ¢ de maior sentido quanto mais espontinea for sua producio, Este principio é aplicavel a todos os métodos que contti- buem para a cura psiquica”® 242 terminismo. Como se concretiza essa criatividade espontinea? Moreno responde que através da acdo espontnea ¢ ctiadora. Podemos conceber 0 axis de sua teoria nessas trés palavras inse- pariveis: criatividade — espontancidade — agao. A importincia da acto, paralelamente & criatividade e a espontaneidade, € com freqiién- cia refetida por Moreno que, paraftascando Goethe, no Fausto, diz: “No principio era a acio"”. E abre sua nova introducao ao Psicodiama, com estas palavras: A outta foi a rebelido do ator sufocado, contra a palavra. O “'psico- drama”’ constituiu 0 segundo passo além da psicanilise. No comeco foi a existéncia. No comeco foi o ato’ Em outra passagem paralela, nas primeiras paginas da Psicote- rapia de grupo ¢ psicodrama, tepete que ‘‘no principio foi a acio"’ Eta o psicodrama o segundo passo mais além de Freud”. Jé nestas Primeiras frases em que vemos Moreno defrontar-se com o tema da acéo, encontramos um interjogo, uma simultaneidade entre este con- ceito € o psicodrama. Interjogo que se vai manter em toda a sua obra: O psicodrama pés de lado o diva psicanalitico, conduziu a técnicas céni- cas, gtacas as quais a acdo pode desenvolver-se até seu término ¢ per- mitiu elaborar uma teoria da acio** Essa teoria da aco penetra em seu sistema a tal ponto que, em dado momento, o autodenomina, ‘‘atismo'' ou “‘acionismo"': Existiu 0 condutismo, depois a psicanilise... ¢ agora a que denominei atismo ou acionismo (métodos de aco, técnicas de aio, teste de acio € investigacdo sobre a ago). Com o psicodrama € 0 sociodrama, que sio os seus melhores intérpretes”. Se compreendermos a ligacdo inseparavel que existe entre criati- vidade — espontaneidade — ago, poderemos perfeitamente admitit que Moreno chame a sua teoria de atismo ou de acionismo, o que con- firma o que ele disse ao tratar da espontaneidade. Se além disso, nos lembrarmos das manifestagdes da espontaneidade e suas provas, de como as motivagées sociométricas se faziam patentes no cenatio, ¢ nos lembrarmos também do 4tomo social estudado sob o aspecto da adaptacio mitua daqueles que o integram, nos daremos conta de que tealmente, em Moreno, tudo passa pela agéo espontanea. O psico- drama e a ago que 0 suporta podem perfeitamente definir sua teoria; por isso, denominé-la atismo ou acionismo nada contradiz do quanto foi exposto. Podemos agora nos adentrar na tao repetida definigio do psico- drama, proposta por Moreno: a busca da verdade pela acao. A verdade 244 O psicodrama coloca paciente num cenétio, no qual pode exteriorizar seus problemas com a ajuda de alguns atores terapéuticos. E tanto um método de diagnéstico como de tratamento. Um de seus tragos caracte- risticos € que a tepresentacio de papéis se inclui organicamente no pro- cesso de tratamento, Pode-se adaptar a todo tipo de problema, pessoal ou de grupo, de criancas ou de adultos. Pode-se aplicar a todos os niveis de idade. Mediante 0 seu uso podemos nos aproximar tanto da solusio de problemas infantis, quanto dos mais profundos conflitos psiquicos. © psicodrama € a sociedade humana em miniatura, 0 ambiente mais simples possivel para o estudo metédico de sua estrutura psicol6gica Mediante técnicas como a do eu-auxiliar, da improvisacio espontanea, da auto-apresentacio, do soliléquio, da interpolacio de resisténcias, se revelam novas dimensdes da mente, ¢ 0 que € mais importante, estas dimensbes podem ser exploradas em condigdes experimentais'?. Estas palavras sto definidoras do aprofundamento do psicodrama no psiquismo humano. Moreno defende o aspecto compreensivo do psicodrama ¢ dos métodos de aco, por haver constatado que todas as teorias psicol6gicas neles encontram um ‘‘refrendo superatorio’’ e que todos os métodos terapéuticos também esto compreendidos e superados no psicodrama. A prova desta compreensividade da ago psicodramitica exige apenas uma enumeracio. Seguindo o método expositivo enumerativo, comesamos pelas terapias psicol6gicas verbais. Nao hi davida de que se passarmos uma vista panordmica nas técnicas terapéuticas existentes, veremos que estas se reduzem 2 comunicagdo verbal entre terapeuta ¢ paciente, salvo ratas excegdes, entre as quais a de Ferenczi. E nd esquecamos que as técnicas terapéuticas de aco, a laborterapia, por exemplo, tém sua origem nas técnicas morenianas de ac4o, embora comumente isto nao seja levado em conta. Queremos dizer que a terapia verbal esté compreendida na terapia de acdo. Estas afirmasées surgem de uma teoria geral de Moreno, segundo a qual a palavra nao € mais que um aspecto da acio e, além disso, a palavra brota da comunicacao gesti- cular que na evolucdo ontogenética, a precede. Em segundo lugar, o psicodrama € tanto um método de terapia individual como de grupo, 0 que jé foi suficientemente provado ¢ que nos leva a seguinte deducio: se o psicodrama integra todo tipo de terapia, seu efeito terapéutico ou catartico ha de ser também universal. E Moreno assim se expressa: Posto que € proprio de toda atividade humana, implicar, em algum Brau, numa catatse, ter-se-ia que determinar em que consiste a catarse... se hi uma fonte de catarse superior a outra e se existe algum elemento comum a todas as formas de catarse. Dai o meu propésito de definir 2 catarse de tal mancita que todo influxo manifestamente capaz de pro- 246 duzir um efeito putificador, possa ser considerado como parte de um principio Gnico. Descobri esse principio comum que provoca 2 catatse, nna espontaneidade criadora, que, em razfo de sua universalidade ¢ de sua natureza priméria, inchui todas as outras expresses cunhadas (psi- quico, somatico, consciente, inconsciente etc.). Nesta corrente geral de ado, desembocam todos os pequenos afluentes das catarses particu- lates! Criatividade, liberdade, espontaneidade, existincia e realidade so as condigdes que o psicodrama oferece ao paciente e que Ihe confe- rem valor terapéutico, Nele ¢ dele se extrai toda a tcoria psicologica moreniana, ou pata sermos mais exatos, nele suas idéias chegam & pfatica. A psicoterapia de grupo Referindo-nos as causas pelas quais a psicoterapia de grupo é eficaz ¢ cura psicologicamente, apenas resumiremos, com Moreno: porque conduz a uma interacZo esponténea em que cada um dos parti- cipantes tem o mesmo status ¢ porque se situa em circunstancias simi- lares as de uma prova da realidade. No momento em que Moreno tenta sintetizar as contribuigdes essenciais da psicoterapia de grupo a psicoterapia individual, faz uma lista de principios que resumiremos a seguir, pois a citac4o textual seria morosa: 1) principio da interazao terapéutica: um individuo é agente terapéutico do outro; um grupo € agente terapéutico do outro; 2) prin- cipio da espontaneidade: da livre producio de grupos, da participacao espontinea, sem impedimentos, de todos os membros do grupo; 3) outta transformacao essencial da sessao individual consiste no candter dinamico e imediato da interacdo, que no grupo, apresenta todas as qualidades de wma prova da realidade. O paciente se vé confrontado com pessoas ¢ situacées reais, ¢ ndo s6 com as suas, mas também com as de outros individuos; 4) o grupo terapéutico necessita de maior liberdade ¢ espontaneidade por parte de seus membros, do que um grupo comum. A composicio do grupo deve ser terapeuticamente mais favorvel que a tealidade ¢ a igualdade de status de todos os membros do grupo, é exigéncia absolutamente necesséria. A interacio espontnea, vivida, presente, de igual para igual, € a esséncia da eficacia dos grupos; ¢ nos damos conta de que os conceitos fundamentais da teoria moreniana, voltam a repetir-se na psicoterapia grupal, chegando sempre a que a espontaneidade na agio € a esséncia de sua terapéutica. 247 Expondo as bases terapéuticas da sociometria, Moreno termina: Hoje podemos formular com muito maior seguranca o fundamento te6tico de todos os tipos de psicoterapia de grupo. Sio trés as linhas fundamentais comuns: 1) o principio do “‘encontro’’ € a base de todas as formas de psicoterapia de grupo; 2) a “‘estrutura interativa’”” comum 20s individuos determina sua posicdo reciproca varidvel ¢ sua solidarie- dade, que se manifesta em miiltiplas tensbes psiquicas; 3) as vivencias comuns do “‘consciente’” ¢ do ‘‘inconsciente comun: 43, E define os agentes da terapia grupal incidindo nessas poucas idéias que substanciam todo o seu pensar € sua agio: “‘Os agentes: sto as forcas atuantes que constituem o fundamento da terapia, por exem- plo, a criatividade, a espontaneidade, a tele, as figuras autoritarias etc.’", A vaguidade € a falta de delimitagao de conceitos se salvam, se projetarmos, como pano de fundo, tudo 0 que sabemos do fator tele como esséncia da coesdo do grupo. A psicoterapia grupal nao excede suas bases te6ricas. A sociometria Embora accitemos que a sociometria tenha um valor fundamen- talmente investigador, resistimos negar-lhe sua finalidade terapéutica. O fato de constituir uma sociedade democritica, €, em si mesmo, cura- tivo. Talvez sua maior consecusao no campo da terapia, tanto no ponto de vista pessoal como de grupo, seja proporcionar-lhe um fundamento objetivo. Essa intenggo terapéutica se torna evidente, no livro Wb0 Shall Survive, eminentemente sociométrico, Além da analise quanti- tativa de matrizes sociométricas ¢ sociogramas, nos surpreende o capi- tulo que se intitula: ‘‘Sociometria de la reconstrucci6n’”, que Moreno assim comeca: ‘A coletividade inteira, seus grupos de coabitagao, de trabalho ou de estudo, foi submetida a andlises sociométricas, em intervalos regulares de aproximadamente quatto semanas. Gragas a esta anilise, nos foi pos- sivel determinar quais eram os métodos mais fecundos: a) tratamento individual; b) psicoterapia de grupo; c) desempenho e aprendizagem de papéis; d) reconstrucao sociométrica. O conhecimento da estrutura da coletividade ¢ da posigao ocupada por cada individuo, decidiu sobre a eleicao do método"” 248 Sintese do valor terapéutico da sociometria, como cleigao espon- tinea que constituiria uma sociedade democratica em que cada um encontratia 0 companheiro © 0 grupo que suavizasse suas tensdes, muito de acordo pois, com as tiltimas correntes s6cio-culturais da psica- nilise. E como instramento cientifico que detecta a enfermidade do individuo no grupo ou do grupo em sua totalidade, indicando-nos, além do mais, como acabamos de ver, 0 método adequado de trata- mento, 249

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