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Educação Física

Consciência corporal

Terezinha Petrucia da Nóbrega


Consciência corporal
Terezinha Petrucia da Nóbrega

Educação Física

Consciência corporal

Natal – RN, 2015


Governo Federal
Presidenta da República
Dilma Vana Rousseff
Vice-Presidente da República
Michel Miguel Elias Temer Lulia
Ministro da Educação
Renato Janine Ribeiro

Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN


Reitora
Ângela Maria Paiva Cruz
Vice-Reitora
Maria de Fátima Freire Melo Ximenes

Secretaria de Educação a Distância (SEDIS)


Secretária de Educação a Distância Secretária Adjunta de Educação a Distância
Maria Carmem Freire Diógenes Rêgo Ione Rodrigues Diniz Morais

FICHA TÉCNICA
COORDENAÇÃO DE PRODUÇÃO DE MATERIAIS DIDÁTICOS
Marcos Aurélio Felipe

COORDENAÇÃO DE REVISÃO
Maria da Penha Casado Alves

COORDENAÇÃO DE DESIGN GRÁFICO


Ivana Lima

GESTÃO DO PROCESSO DE REVISÃO


Rosilene Alves de Paiva EDITORAÇÃO DE MATERIAIS Revisão de estrutura e linguagem Revisão tipográfica
Alessandro de Oliveira Paula Camila Maria Gomes Leticia Torres
GESTÃO DO PROCESSO Amanda de Lima Cabral
DE DESIGN GRÁFICO Amanda Duarte Revisão de língua portuguesa Pré-impressão
Dickson de Oliveira Tavares Anderson Gomes do Nascimento Bruna Rafaelle de Jesus Lopes José Agripino de Oliveira Neto
Carolina Aires Mayer Orlando Brandão Meza Ucella
PROJETO GRÁFICO Carolina Costa de Oliveira Emanuelle Pereira de Lima Diniz IMAGENS UTILIZADAS
Ivana Lima Heloisa Fernandes Ferreira Nunes Fabiola Barreto Gonçalves Acervo da UFRN
José Agripino de Oliveira Neto Lisane Mariádne Melo de Paiva www.depositphotos.com
REVISÃO DE MATERIAIS Leticia Torres Priscilla Xavier de Macedo www.morguefile.com
Ailson Alexandre Câmara de Medeiros Luciana Melo de Lacerda www.sxc.hu
Andreia Maria Braz da Silva Mauricio da Silva Oliveira Junior Revisão de normas da ABNT Encyclopædia Britannica, Inc.
Camila Maria Gomes Cristiane Severo da Silva
Cristiane Severo da Silva Edneide da Silva Marques
Cristinara Ferreira dos Santos Verônica Pinheiro da Silva
Edneide da Silva Marques
Emanuelle Pereira de Lima Diniz Diagramação
Eugenio Tavares Borges José Agripino de Oliveira Neto
Fabiola Barreto Gonçalves
Julianny de Lima Dantas Simião Criação e edição de imagens
Margareth Pereira Dias Amanda Duarte
Orlando Brandão Meza Ucella
Priscilla Xavier de Macedo
Verônica Pinheiro da Silva

Catalogação da Publicação na Fonte. Bibliotecária Verônica Pinheiro da Silva CRB-15/692.

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aos parâmetros do projeto gráfico. © Copyright 2005. Todos os direitos reservados a Editora da Universidade Federal do Rio Grande do Norte – EDUFRN.
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Sumário

Apresentação institucional 5

Apresentação da disciplina 7

Aula 1 Consciência corporal e atitude fenomenológica 9

Aula 2 A percepção do corpo na antiginástica 29

Aula 3 A percepção do corpo na Eutonia 47

Aula 4 A percepção do movimento nos exercícios de Feldenkrais 63

Aula 5 O toque e o contato humano 81

Aula 6 A percepção do corpo na bioenergética e na biodança 97

Aula 7 Práticas corporais orientais e a consciência corporal 115

Aula 8 O Método Dança-Educação Física (MDEF) 133

Aula 9 Corpo, sexualidade e afetividade na formação do ser humano 149

Aula 10 O conhecimento do corpo nas aulas de Educação Física 167

Perfil da autora 183


Apresentação institucional

A
Secretaria de Educação a Distância – SEDIS da Universidade Federal do Rio
Grande do Norte – UFRN, desde 2005, vem atuando como fomentadora, no
âmbito local, das Políticas Nacionais de Educação a Distância em parceira
com a Secretaria de Educação a Distância – SEED, o Ministério da Educação –
MEC e a Universidade Aberta do Brasil – UAB/CAPES. Duas linhas de atuação
têm caracterizado o esforço em EaD desta instituição: a primeira está voltada
para a Formação Continuada de Professores do Ensino Básico, sendo imple-
mentados cursos de licenciatura e pós-graduação lato e stricto sensu; a segunda
volta-se para a Formação de Gestores Públicos, através da oferta de bacharelados
e especializações em Administração Pública e Administração Pública Municipal.
Para dar suporte à oferta dos cursos de EaD, a SEDIS tem disponibilizado
um conjunto de meios didáticos e pedagógicos, dentre os quais se destacam os
materiais impressos que são elaborados por disciplinas, utilizando linguagem e
projeto gráfico para atender às necessidades de um aluno que aprende a distân-
cia. O conteúdo é elaborado por profissionais qualificados e que têm experiên-
cia relevante na área, com o apoio de uma equipe multidisciplinar. O material
impresso é a referência primária para o aluno, sendo indicadas outras mídias,
como videoaulas, livros, textos, filmes, videoconferências, materiais digitais e
interativos e webconferências, que possibilitam ampliar os conteúdos e a inte-
ração entre os sujeitos do processo de aprendizagem.
Assim, a UFRN através da SEDIS se integra ao grupo de instituições que
assumiram o desafio de contribuir com a formação desse “capital” humano
e incorporou a EaD como modalidade capaz de superar as barreiras espaciais
e políticas que tornaram cada vez mais seleto o acesso à graduação e à pós-
graduação no Brasil. No Rio Grande do Norte, a UFRN está presente em polos
presenciais de apoio localizados nas mais diferentes regiões, ofertando cursos
de graduação, aperfeiçoamento, especialização e mestrado, interiorizando
e tornando o Ensino Superior uma realidade que contribui para diminuir as
diferenças regionais e transformar o conhecimento em uma possibilidade concreta
para o desenvolvimento local.
Nesse sentido, este material que você recebe é resultado de um investimento
intelectual e econômico assumido por diversas instituições que se comprometeram
com a Educação e com a reversão da seletividade do espaço quanto ao acesso
e ao consumo do saber E REFLETE O COMPROMISSO DA SEDIS/UFRN COM
A EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA como modalidade estratégica para a melhoria dos
indicadores educacionais no RN e no Brasil.

Secretaria de Educação a Distância


SEDIS/UFRN

5
Apresentação da disciplina
Caro(a) aluno(a), na Aula 1 desta disciplina, estudaremos a abordagem feno-
menológica da corporeidade que dá sustentação teórica às aulas práticas da
disciplina e ao conteúdo apresentado. Na Aula 2, você terá acesso ao conhecimento
da antiginástica e aos princípios teóricos e metodológicos dessa técnica corporal
de sensibilização.
Na Aula 3, você poderá compreender a eutonia e a busca do equilíbrio do tônus
muscular em atividades de ritmo e expressão corporal.
Na Aula 4, abordaremos a técnica de Feldenkarias em toda sua riqueza de
experiências da motricidade humana.
Na Aula 5, discutiremos as noções de tato e contato, como também a massa-
gem tal como uma técnica de relaxamento e, sobretudo, de interação e afetividade
na relação com o outro.
Na Aula 6, aprofundaremos essa perspectiva do contato humano por meio
das experiências da bioenergética e da biodança.
Na Aula 7, faremos uma viagem ao oriente e à experiência filosófica e cor-
pórea do tai chi chuan, você irá descobrir uma nova maneira de perceber seu
corpo na relação com a natureza e com o mundo.
Na Aula 8, você entrará em contato com o Método Dança-Educação Física
(MDEF), precursor da consciência corporal na educação física.
Nas Aulas 9 e 10, você poderá compreender aspectos do corpo relacionados
ao corpo, à sexualidade e ao conhecimento da educação física em vários níveis
da educação básica. Nesse percurso, espera-se que você possa descobrir e encon-
trar horizontes para acessar o conhecimento sobre o corpo nas aulas da nossa
disciplina. Isto é, descobrir seu corpo, sua motricidade e sensibilidade como
formas de se expressar, de ser e de estar no mundo de forma criativa, em toda sua
plenitude. Espera-se, ainda, que você possa ser sensível aos conhecimentos dessa
disciplina que articulam princípios teóricos e metodológicos, teoria e prática, mas,
sobretudo, objetivamos despertar cada um de vocês para a responsabilidade, a
consciência corporal e profissional de ser professor(a) de educação física na arte
de cuidar do corpo e da vida.

7
Consciência corporal e
atitude fenomenológica

Aula

1
Apresentação

O
que significa estar consciente? Somos conscientes de tudo o que se passa
ao nosso redor? Somos conscientes de nossa realidade corpórea? Nesta
aula, vamos introduzir o tema da consciência corporal.
O significado do termo consciência ultrapassa o uso comum de estarmos
cientes dos próprios estados, percepções, ideias, sentimentos e vontades. O sig-
nificado também ultrapassa o sentido usual quando se diz que alguém está
consciente se não está dormindo, desmaiado ou afastado de suas ações, como
ocorre em estado de coma ou transe, por exemplo.
Nesta aula, vamos apresentar o sentido filosófico do termo consciência que
remete a uma noção em que o aspecto ético-moral (a possibilidade de autojulgar-se)
tem conexão com o aspecto teórico (possibilidade de conhecer-se). Desse modo,
sentir, pensar e agir são dimensões de um mesmo fenômeno. Por essa razão, não
é incomum observarmos as atitudes do cotidiano e nos questionarmos: agimos
com conhecimento? Somos capazes de conhecer tudo? Quais os fenômenos
que abrangem a nossa vida psíquica? Essas são algumas das questões a serem
abordadas nesta aula.
Vamos relacionar a noção de consciência com o conhecimento do corpo.
Para tanto, iremos considerar a atitude fenomenológica, as noções de corporeidade
e motricidade como base para as dimensões metodológicas das práticas corporais
que iremos abordar nas demais aulas da disciplina Consciência Corporal.

Objetivos

Analisar as concepções de consciência ao longo


1 da história do conhecimento.

Relacionar a consciência corporal com a atitude


2 fenomenológica.

11
Breve história da noção de consciência

D
o ponto de vista científico e filosófico, podemos dizer que a consciência
remete ao sujeito, tendo como centro a atividade reflexiva. Porém, o reco-
nhecimento de uma realidade interior privilegiada só existe nas filosofias
que assumem como tema a oposição entre interioridade e exterioridade, ou seja,
nas filosofias dualistas que distinguem corpo e alma, sujeito e objeto.
A elaboração decisiva da noção de consciência é dada pelo filósofo da
antiguidade grega Plotino, como sendo um retorno para a interioridade ou uma
reflexão sobre si mesmo. Mas, só com Descartes, filósofo francês do século XVII,
a noção é esclarecida e quase que universalmente aceita na filosofia ocidental,
com sua famosa frase: cogito ergo sum, que é compreendida como sendo a
autoevidência existencial do pensamento (ABBAGNANO, 1998).
Observe que a construção do conceito de consciência percorre um longo ca-
minho da antiguidade época moderna. E, hoje, o que podemos dizer da noção de
consciência? Entre os séculos XIX e XX também ocorreram mudanças na perspectiva
da compreensão da consciência e nas relações entre corpo e alma, sujeito
cognoscente, alienação e inconsciente, fenômenos relacionados diretamente com
a compreensão contemporânea da consciência. Nesta aula, vamos percorrer esse
caminho de forma panorâmica para perceber essa construção conceitual e seus
desdobramentos teóricos e práticos.
Como ponto de partida, vamos voltar à antiguidade grega e começar
nossa caminhada na busca por compreender e ampliar nossa compreensão
de consciência e sua história no pensamento ocidental. Vamos começar com
Platão, filósofo grego, que viveu entre os séculos 427-348 a.C. em Atenas, e que
viajou também pelo Oriente. Sua filosofia é marcada, portanto, por reminiscências
da cultura oriental.
Platão escrevia sob a forma de diálogos. Em um de seus diálogos, o “Fédon”,
ele reflete sobre as relações corpo e alma. Desde já, esclarecemos que o sentido de
alma na antiguidade não tinha uma conotação cristã, como percebemos hoje. A
alma relacionava-se com o intelecto. Para Platão, só ao intelecto é dado conhecer
essas ideias, por ser ele também incorpóreo. Por sua vez, o corpo seria um obstáculo
à realização do ideal de bem e de verdade a que a alma aspira. Vejamos o que
nos diz o próprio filósofo:

Durante todo o tempo em que tivermos o corpo, e nossa alma estiver misturada
com essa coisa má, jamais possuiremos completamente o objeto de nossos
desejos! Ora, este objeto é, como dizíamos, a verdade. Não somente mil e
uma confusões nos são efetivamente suscitadas pelo corpo quando clamam
as necessidades da vida mas ainda somos acometidos pelas doenças, e
eis-nos às voltas com novos entraves em nossa caça ao verdadeiro real. O
corpo de tal modo nos inunda de amores, paixões, temores, imaginações
de toda a sorte, enfim, uma infinidade de bagatelas, que por seu intermédio
(sim, verdadeiramente é o que se diz) não recebemos na verdade nenhum
pensamento sensato; não, nem uma vez sequer! (PLATÃO, 2011, p. 55).

Aula 1 Consciência corporal 13


Nesse sentido, a alma humana, antes de prender-se ao cárcere corpóreo, teria
contemplado as ideias eternas. Encarnada, perde a possibilidade de contato direto
com os arquétipos incorpóreos. No entanto, por ser imortal, a alma conserva o
conhecimento adquirido no mundo das ideias. Com o passar das gerações, há um
esquecimento das ideias; nesse caso, como se daria o processo de conhecimento
no mundo sensível? Para Platão, aprender é recordar, ou seja, diante das cópias
presentes no mundo material, a alma recupera gradativamente o conhecimento.
Em “A República”, diálogo em que discute o projeto de uma cidade ideal, Platão
(1990) admite a contribuição do corpo, com base na ginástica, na educação
dos cidadãos, visando proporcionar o equilíbrio entre as duas faces da alma: a
corajosa e a filosófica, como se pode notar na citação a seguir.

Para estas duas faces da alma, a corajosa e a filosófica, ao que parece,


eu diria, que a divindade concedeu aos homens duas artes, a música e a
ginástica, não para a alma e o corpo, a não ser marginalmente, mas para
aquelas faces, a fim de que se harmonizem uma com a outra, retesando-se
ou afrouxando-se até onde lhes convier (PLATÃO, 1990, p. 151).

Apesar dessa referência ao corpo no projeto educativo de “A República”, cons-


tatamos que o corpo é um mero instrumento para o aperfeiçoamento da alma.
Seguindo na filosofia antiga, podemos perceber que em Aristóteles (384-322 a.C.),
discípulo de Platão, o dualismo corpo e alma será amenizado, visto que no seu
pensamento não ocorre a cisão entre o mundo da matéria e o mundo das ideias.
Embora, de acordo com Aristóteles, a matéria permaneça inferior. Para ele, o
mundo, apesar de único, apresenta-se como uma hierarquia cujos membros
mais elevados são substâncias imateriais. Nesse caso, no homem, o mais bem
organizado de todos os seres, existe uma forma que não se serve de nenhum
órgão corporal e que pode sobreviver ao corpo, a saber, o intelecto.
É interessante ressaltar que, em sua teoria do conhecimento, Aristóteles não
admitiu as ideias inatas de Platão. Para ele, elas são adquiridas a partir da
percepção dos objetos do mundo externo. Sendo assim, tudo o que o espírito
conhece passa pelos sentidos do corpo. Apesar de reconhecer que o homem
é um composto substancial unificado (matéria-forma) e de reconhecer o papel
dos sentidos no conhecimento, o homem aristotélico é, em essência, um ser
contemplativo, pois o intelecto humano sobrevive após a morte para reintegrar
o intelecto universal, ordenador do mundo.
Segundo Aristóteles, as essências estão nas próprias coisas, na realidade em
que vivemos e nos homens que as buscam e que as conhecem a partir das
sensações. Entretanto, é o intelecto que organiza o conhecimento, caracterizando
o homem como um ser que se diferencia dos outros seres pela intelecção e não
pela sua corporeidade.
Nessa perspectiva, convém registrar que há, na cultura grega da antiguidade,
outras formas de compreensão do corpo, além da que está presente na metafísica
de Platão e Aristóteles. Na mitologia, nas artes, nos encontros esportivos, o

14 Aula 1 Consciência corporal


povo grego cultua o corpo, não havendo, no seu viver cotidiano, a separação
entre sensibilidade e racionalidade. Para Jaeger (1989), a força física distinguia
o homem, fazendo-o ser o melhor dos homens, o herói grego. Nesse sentido, os
gregos consideram o corpo como a síntese de sua humanidade, devendo, pois,
ser cultivado para que o homem possa se realizar plenamente.

O ateniense daqueles tempos sentia-se mais no seu meio no ginásio do que


entre as quatro paredes de sua casa, onde dormia e comia. Era ali, sob a
transparência do céu da Grécia, que diariamente se reuniam novos e velhos
para se dedicarem ao cultivo do corpo (JAEGER, 1989, p. 362).

No ginásio, e não apenas na Ágora, discutiam-se questões políticas e morais, Ágora


denotando a integração da prática do exercício físico, da ginástica – palavra de Significa o espaço público no
qual os gregos discutiam os
origem grega que se refere à arte de exercitar o corpo nu – ao modo de vida da
assuntos da Pólis, a cidade grega.
Pólis grega. O homem grego vê no culto ao corpo um sentido de totalidade e de
elevação de sua humanidade. No entanto, o que passou para a tradição filosófica
foi o dualismo platônico-aristotélico.
Por sua vez, as ideias de Platão e de Aristóteles serão incorporadas pelo pen-
samento, respectivamente, de Santo Agostinho e de São Tomás de Aquino, dentro
da perspectiva cristã. Na Idade Média, o corpo vai ser visto pelos filósofos-teólogos
como símbolo do pecado. Para esses pensadores cristãos, o homem deveria
desligar-se de tudo que o prendesse à sua existência terrena, pois só assim
poderia realizar a sua verdadeira essência, espiritual e ultraterrena.
Além disso, com a transição da sociedade feudal para a sociedade capita-
lista mercantil ocorreram grandes transformações também no plano filosófico,
destacando-se a supremacia da razão no conhecimento da natureza, das leis
que a regem. A Filosofia Moderna muda então o seu centro de investigação,
não se preocupando mais com a busca das essências, no sentido que se tinha
considerado na antiguidade e no período medieval, mas sim com a busca pelo
conhecimento certo, evidente e seguro.
De acordo com Nóbrega (2009), duas orientações filosóficas expressam essa
tendência do pensamento moderno: o Racionalismo Empirista ou Empirismo,
centrado no objeto de conhecimento e o Racionalismo Idealista ou Racionalismo,
centrado no sujeito do conhecimento. Gostaríamos de chamar a atenção para
a maneira como se processa o conhecimento nessas orientações, destacando o
conceito de impressão sensível no Racionalismo, no Empirismo e no Criticismo
Kantiano, o último como sendo uma tentativa de síntese entre os dois primeiros.
Para o Racionalismo, que terá em Descartes o seu maior representante, a
impressão sensível era uma ilusão dos sentidos e não poderia conduzir ao
conhecimento verdadeiro. A verdade só poderia ser conhecida, a priori, indepen-
dentemente de qualquer dado da experiência sensorial, a partir de uma intuição
puramente intelectual. No Empirismo, assumido por Bacon, Locke, Berkeley e
Hume, a impressão sensível refere-se às qualidades apresentadas pelos objetos
exteriores, fora do sujeito. Nesse sentido, todo conhecimento seria, a posteriori,
vinculado à experiência e organizado pelo hábito (NÓBREGA, 2009).

Aula 1 Consciência corporal 15


No século XVIII, o Criticismo Kantiano representou a tentativa de sintetizar
as orientações do Racionalismo e do Empirismo, unindo os dados da razão à
experiência sensível. De acordo com Kant, as impressões sensoriais são pontos
caóticos que devem ser ordenadas por categorias lógicas, a priori, espaço e tempo.
A partir dessa organização teríamos a intuição, a imagem sensível que, enviada
ao entendimento, possibilitaria o conhecimento do fenômeno (NÓBREGA, 2009).
Desse modo, percebemos que o sensível está posto na filosofia moderna, mas
assume, em relação ao conhecimento, um papel inferior ou acessório. O processo
de racionalização chega ao corpo através do desenvolvimento da ciência médica.
Conforme citado por Nóbrega (2005, p. 602), o filósofo Rosseau, em sua obra "O
Emílio", um tratado sobre a educação publicado em 1762, trata da educação a partir
do conhecimento do corpo. Não se baseia na distinção clássica das faculdades:
“sensibilidade, moral, inteligência, mas na necessidade de uma educação diferen-
ciada de acordo com as idades (da natureza, da força, da sabedoria)”. O filósofo:

[...] faz uma crítica à medicina curativa e enaltece a higiene, considerando-a


como a parte útil da medicina. Nessa perspectiva, a educação do corpo visa
civilizar as paixões, os desejos e necessidade do corpo através dos exercícios
físicos. O corpo e o movimento, apesar de valorizados nos processos edu-
cativos, ainda são considerados como elementos acessórios na formação do
ser humano (NÓBREGA, 2005, p. 602).

Para Nóbrega (2009), no século XIX, o idealismo alemão exaltará a subjetivi-


dade. Em Hegel, o corpo e o espírito cooperam para a humanização do homem
por meio do trabalho, mas o princípio da natureza humana é o espírito. Hegel
afastou seu pensamento do homem em sua concretude, ou melhor, reduziu esta
a apenas um momento da história do espírito.
Nessa perspectiva, o elemento da concretude passa a ser marcante no
pensamento de Marx: o homem como uma categoria histórica. Segundo esse
autor, o corpo do homem, do trabalhador, não é apenas um corpo alienado mas
é um corpo deformado pela mecanização e condição precária à realização dos
movimentos do trabalho. Nesse espírito do racionalismo moderno serão cons-
truídos os métodos ginásticos, visando, de um modo geral, adaptar o corpo às
necessidades da emergente sociedade industrial, promover hábitos saudáveis e
controlar as energias corporais para o aprendizado intelectual.
De acordo com Nóbrega (2009), ao refletirmos sobre o olhar dos filósofos sobre
o corpo e destacar o caráter predominantemente dualista do pensamento filosófico
ocidental, é preciso deixar claro que a filosofia desses grandes pensadores não se
reduz a esse aspecto e precisa ser contextualizada no espaço-tempo apropriado.
Nesse caso, o termo grego Sophia, que significa sabedoria, apresenta uma
dimensão que é, ao mesmo tempo, teórica, prática e intuitiva. Ademais, as ideias
filosóficas contribuíram significativamente com as mudanças ocorridas em toda a
humanidade, na ciência, na técnica, na concepção de natureza, na teoria política, na
teologia, na educação e na estética. Como conhecimento que interroga a si mesmo,
a racionalidade filosófica, ou seja, o poder da razão também foi questionado.

16 Aula 1 Consciência corporal


Ainda no século XIX, vamos encontrar no pensamento de Nietzsche uma crítica
à tradição dualista e uma revalorização do corpo na compreensão do homem.
No seu pensamento, a existência do homem só tem sentido naquilo que lhe seria
mais humano, seu próprio corpo. A partir do corpo, o homem pode agir e agindo
pode conseguir sua realização como homem. A tarefa mais importante a ser rea-
lizada pelo homem, a transmutação dos valores decadentes (relacionados com a
fraqueza), só poderá ser empreendida pelo corpo e compreendida pelos sentidos.
De acordo com Nietzsche (1994), enquanto a alma for compreendida pela
metafísica ocidental como meio para chegar ao mundo suprassensível, o corpo
está vinculado a terra, sendo por isso mesmo desprezado. Porém, essa tentativa
de escapar ao corpo é um grande erro, uma vez que ele se faz presente em todos
os atos humanos, é a vida em sua plenitude, em toda a sua força. Desprezar o
corpo é, portanto, negar a vida e o próprio ser.
Ao valorizar o corpo, Nietzsche não despreza a consciência, visto que esta
pertence integralmente ao corpo, porém o devir dos processos corporais não pode
ser traduzido em palavras, conceitos, processos racionais simplificadores. Ao
corpo atribui-se uma inteligibilidade pautada no domínio sensível. O pensamento
teórico da humanidade (filosofia e ciência) vai pautar-se pela racionalidade, ne-
gando o corpo. Para Nietzsche (1994), esse pensamento é expressão da fraqueza,
negação da parte instintiva do homem, negação da vida, gerando um conheci-
mento afastado da realidade existencial, sem sentido para o homem.
Desse modo, Nietzsche parece reencontrar o sentido para a vida na arte.
Nesta, razão e instintos, ou seja, os deuses gregos Apolo e Dioniso, estão em
tensão, havendo um predomínio do saber dionisíaco, na medida em que afirma
um sentimento de unidade. Essa unidade tem sua expressão no corpo humano.
Um corpo cuja ação é significativa, portadora de simbolismo, afirmação da força,
da humanidade do homem.
No século XX, vamos encontrar no pensamento de Merleau-Ponty uma pers-
pectiva ontológica e epistemológica do corpo, sendo a partir do corpo que o sujeito
humano situa-se no mundo que conhece. A contribuição de Merleau-Ponty coloca-se
no sentido do reconhecimento da complexidade do corpo e do movimento como
elementos existenciais. Ao interpretar a obra de Merleau-Ponty (1994), temos
que o corpo não é objeto, nem ideia, é expressão singular da existência do ser
humano que se move. O corpo é sexualidade, é linguagem, é movimento, é obra
de arte. Devido a sua contribuição para o conhecimento do corpo na educação
física, mais adiante dar-se-á destaque a essa abordagem (NÓBREGA, 2009).
Quanto à consciência, de certo modo, essa temática esteve fora dos círculos
filosóficos ou foi apenas relacionada com a linguagem. No entanto, os estudos
do aparelho cerebral e das ciências cognitivas trazem-na de volta à cena, em
pesquisas, congressos, publicações etc. A redescoberta da consciência como
tema de investigação da filosofia, psicologia, ciências cognitivas e neurociência
apresenta questões amplas e sem respostas conclusivas.
De acordo com Nóbrega (2010), no campo da biologia e das ciências cognitivas,
a consciência é um fenômeno biológico natural que não se enquadra apropriadamente
em nenhuma das categorias tradicionais do mental e do físico. A relação linear

Aula 1 Consciência corporal 17


de causalidade não é suficiente para explicar a interioridade da consciência,
tampouco pode ser plenamente desconsiderada. Nesse sentido, em termos de
filosofia da mente, encontram-se as seguintes possibilidades de abordagem: o
modelo funcionalista e o modelo conexionista.
Para o funcionalismo, a consciência é um tipo de "software", uma máquina
virtual em nosso cérebro, este, por sua vez, seria o "hardware". Essa concepção
encontra expressão já bastante divulgada na metáfora do cérebro computador,
proposta inicialmente por Von Neumann. Além das limitações formalistas do
processamento simbólico, outra limitação importante da abordagem funcionalista
refere-se à questão da localização das funções cerebrais em um mapa cortical
mais ou menos rígido.
O conexionismo, por sua vez, aborda a mente com base nas redes neurais,
em uma tentativa de romper a barreira das regras lógicas. Em vez de estruturas
básicas localizáveis, o que há são padrões aprendidos e regularidades. Nesse
caso, a rede neural é um conjunto de neurônios artificiais que parte da conexão
sináptica, disparando potenciais de ação (VARELA et al., 1996).
No campo das ciências cognitivas, o biólogo Francisco Varela apresenta a
abordagem da auto-organização, na qual propriedades emergentes são geradas
no processo recursivo organismo-entorno. Nessa perspectiva, a enação, ou seja,
a capacidade de aprendizagem por meio da interpretação, compreendida como
percepção dos acontecimentos, é responsável pela cognição. Essa abordagem
aproxima-se dos estudos fenomenológicos da percepção, especialmente das
reflexões de Merleau-Ponty (VARELA et al., 1996).
Essas breves considerações sobre a abordagem da consciência na história
do conhecimento apresentam uma visão panorâmica, uma contextualização do
campo dos estudos sobre a temática. Elas são modos de compreender, isto é,
modelos teóricos que buscam respostas para a complexa relação mente-cérebro-
-consciência e podem contribuir para situar o leitor no tema da consciência.
Há ainda outros aspectos fundamentais para os estudos da consciência, a
saber: o inconsciente e a ideologia. Esses aspectos mostram-nos limites para a
consciência e ampliam as questões relativas à vida psíquica e à vida social.
Quanto à consciência, o criador da psicanálise Sigmund Freud escreveu que,
no transcorrer da modernidade, os humanos foram feridos três vezes e que
essas feridas atingiram nosso narcisismo, ou seja, a imagem que tínhamos de
nós mesmos como seres conscientes e racionais. Que feridas foram essas? Chauí
(2009) nos responde:

A primeira foi a que nos infringiu Copérnico, ao provar que a Terra não
estava no centro do Universo e que os homens não eram o centro do mundo.
A segunda foi causada por Darwin, ao provar que os homens descendem de
um primata, que são apenas um elo na evolução das espécies e não seres
especiais criados por Deus para dominar a natureza. A terceira foi causada
pelo próprio Freud com a psicanálise, ao mostrar que a consciência é a
menor parte e a mais fraca de nossa vida psíquica (CHAUÍ, 2009, p. 168).

18 Aula 1 Consciência corporal


Que interessante é essa visão, você concorda? Ela nos desloca do centro do
conhecimento e da atividade racional para abrir o EU a outros universos. Isso se deu
a partir de Freud, que era psiquiatra, e usava, de início, a hipnose nos tratamentos
com doenças mentais. Depois, começou a usar um novo procedimento – a técnica de
livre associação – que permite falar tudo o que nos vem à cabeça. Com esse proce-
dimento ele descobriu, por meio das reações, dos sonhos narrados, das lembranças
da infância que a vida consciente é determinada por uma vida inconsciente.
Para Freud (2011), a vida psíquica é constituída por três instâncias: o ego, o
superego e o id. Este último refere-se ao inconsciente, que está ligado aos desejos,
instintos, pulsões e prazer. Trata-se de uma energia que vem dos instintos e
relaciona-se com a natureza sexual. Nesse caso, a nossa consciência tem uma
dupla tarefa: recalcar e satisfazer o id (inconsciente) e o que vemos. Não se trata
de uma tarefa simples e, por isso, muitas vezes causa angústia.
Lidamos com esse fenômeno de várias maneiras, por vezes, desenvolvendo
neuroses e psicoses que são sintomas. Fazemos uso também da sublimação, ou
seja, buscamos satisfazer nossos desejos indiretamente, como uma espécie de
compensação. Desse modo, as obras de arte, o conhecimento, o trabalho, por
exemplo, podem ser formas de sublimação, que nos aliviam da angústia de existir
entre desejos, necessidades e vontades que nem sempre podem ser completamente
satisfeitas (FREUD, 2011).
A esse respeito, concordamos com Chauí (2009) quando afirma que nossa
consciência é frágil, mas é ela que decide e aceita correr o risco da angústia
e dos possíveis sintomas que essa fragilidade pode desencadear ou decifrar o
inconsciente buscando a elaboração de nossos desejos e formas de sublimação.
Ainda de acordo com Chauí (2009), além das feridas narcísicas apontadas por
Freud, temos de acrescentar mais uma, a saber: a que nos foi apresentada por
Marx com a noção de ideologia e que se aplica mais prioritariamente à vida social.
Com o estudo da ideologia, Marx abrange o modo como se formam as religiões
e a forma como os seres humanos têm a necessidade de explicar a origem e a
finalidade do mundo. Ao buscar essa explicação, o homem projeta para fora de si
um ser superior e dotado de qualidades que julgam serem as melhores, como a
inteligência, a liberdade, a justiça, a beleza. Pouco a pouco, os homens esquecem
que foram eles mesmos que inventaram essas qualidades e passam a acreditar em
um ser superior. Desse modo, “quando os homens não se reconhecem num outro
que eles mesmos criaram, eles se alienam” (CHAUÍ, 2009, p. 171).
Marx não se interessou apenas pela alienação religiosa, mas também pela
alienação social. Interessou-se ainda em compreender as causas pelas quais os
homens ignoram quem são os criadores da sociedade, da politica, da cultura e
os agentes da história.
De acordo com Chauí (2009), há três formas de alienação, quais sejam:
alienação social, econômica e intelectual. A primeira relaciona-se mais diretamente
com a vida política; a segunda diz respeito às relações de produção que se dão
no trabalho; e a terceira refere-se à divisão entre trabalho intelectual (ideias) e
trabalho material (mercadorias). Essa alienação opera uma inversão na realidade

Aula 1 Consciência corporal 19


e nos faz ver as coisas de modo distorcido. Assim como ocorre com o inconscien-
te, é preciso compreender os aspectos históricos que levam à alienação social,
econômica e intelectual para depois buscar superá-las, erguendo o véu e tirando
a máscara, tentando a emancipação dos explorados, a superação de preconceitos
e das injustiças sociais.
Percebemos, assim, que a noção de consciência é complementada pelas noções
de inconsciente e de ideologia nas quais o pensamento, o conhecimento e a existên-
cia se realizam. A seguir vamos abordar essa temática, relacionando-a diretamente
com o campo da educação física, particularmente com a abordagem fenomenológica
da consciência corporal. Antes disso, caro(a) aluno(a), propomos algumas leituras
complementares e atividades para ampliar e consolidar a sua aprendizagem.

Leituras complementares

MOREIRA, A. R. de L. Algumas considerações sobre a consciência na perspec-


tiva fenomenológica de Merleau-Ponty. Estudos de Psicologia, Natal, v. 2, n.
2, p. 399-405, 2007. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/epsic/v2n2/
a12v02n2.pdf>. Acesso em: 21 abr. 2014.
O artigo apresenta um panorama da visão de consciência na filosofia ocidental.

FREUD, S. O mal-estar na civilização. São Paulo: Companhia das Letras, 2011.


O livro apresenta a noção de inconsciente formulada por Freud e suas
relações com a cultura e a vida social. Reflete sobre a infelicidade e a angústia
como fenômenos psíquicos e sociais. Trata-se de um clássico sobre o tema, que
permite ampliar nossa compreensão de consciência.

20 Aula 1 Consciência corporal


JORNADA da Alma. Direção de Roberto Faenza. França, Reino Unido, Itália,
2002. 1 DVD (1h 30min.).
Sua apreciação permite compreender as relações entre a noção de consciência
e inconsciente, bem como as relações com o corpo e com a psique humana.

Sinopse: Em 1905, Sabina (Emilia Fox), uma jovem russa de 19 anos que sofre
de histeria, recebe tratamento em um hospital psiquiátrico de Zurique, na Suíça.
Seu médico, o jovem Carl Gustav Jung (Ian Glen), aproveita o caso para aplicar
pela primeira vez as teorias do mestre Sigmund Freud. A cura de Sabina vem
acompanhada de um relacionamento amoroso com Jung. Após alguns anos, ela
volta à Rússia, tornando-se também psicanalista e montando a primeira creche
que usa noções de psicanálise para crianças. Décadas após sua morte, ela tem sua
trajetória resgatada por dois pesquisadores.

Disponível em: http://www.baixarfilmesdublados.net/baixar-filme-jornada-da-


-alma-legendado/>. Acesso em: 2 maio 2014 ou em <https://www.youtube.com/
watch?v=_1XJIFKxGJ4&list=PLA723A287AB473620>. Acesso em: 2 maio 2014.

Atividade 1

A partir da leitura da aula, responda às seguintes questões:

Caracterize a compreensão de consciência nas filosofias an-


1 tiga e medieval, no pensamento moderno e contemporâneo.

Somos conscientes de tudo o que se passa ao nosso redor?


2 Qual o papel do inconsciente e da ideologia nas nossas vidas?

Aula 1 Consciência corporal 21


A percepção do corpo próprio
e do corpo do outro
Neste momento da aula, iremos relacionar a consciência corporal com a
atitude fenomenológica apresentada a fim de demonstrar a importância dessa
abordagem para a compreensão do conhecimento do corpo em vários domínios,
em particular na educação física. Vamos começar mencionando o criador da feno-
menologia, o alemão Edmundo Husserl. No início do século XX, Husserl apre-
senta uma rigorosa crítica ao Positivismo e à distinção extrema entre objetividade
e subjetividade, ciência e filosofia. Para Husserl, a tarefa da fenomenologia não
consiste em explicar o mundo, enquanto relação de causalidade do tipo estímulo-
-resposta, mas compreender seu sentido, ou seja, o que as coisas significam para
o ser humano nas relações que estabelece com o seu mundo-vida, com a cultura,
com os outros homens (NÓBREGA, 2009).
Diferentemente da perspectiva cartesiana em que a experiência do ser no
mundo é substituída pela significação do mundo – pois as essências estão no
cogito (pensamento) –, para a perspectiva fenomenológica, as essências encon-
tram-se na existência. Desse modo, o ser humano é compreendido a partir das
experiências vividas. Trata-se de uma posição inovadora frente ao conhecimento,
cujo alcance irá colocar o corpo humano e sua subjetividade em evidência.
Para a fenomenologia, a consciência não constitui o mundo, este já está aí,
mas ela se dirige ao mundo para apreendê-lo. O pensamento de Husserl será
retomado por Merleau-Ponty, outro filósofo contemporâneo que irá dar ao corpo
um lugar de destaque. De acordo com Merleau-Ponty (1994), faz-se necessário
reconhecer a própria consciência como projeto do mundo, destinada a um mundo
que ela não alcança nem possui; mas em direção ao qual ela não cessa de se
dirigir. Nesse contexto, a tarefa da filosofia seria reaprender a ver o mundo, tarefa
sempre inacabada (NÓBREGA, 2010).
Para a fenomenologia, a consciência inscreve-se no corpo e na motricidade. De
acordo com Nóbrega (2010), o corpo do qual falamos na fenomenologia não se
resume ao universo mecânico da extensão, pois se trata do corpo vivo, sexuado,
que deseja, que sofre, que sorri e que fala. Não se trata do corpo-físico, massa
imaterial ou inerte, mas o corpo vivo dotado de uma intencionalidade original
(que se dirige para o mundo), isto é, de motricidade (movimento intencional do
ser no mundo), a qual me permite lançar no mundo e apreender seu sentido.
O corpo, por sua vez, é a nossa síntese com o mundo. Um exemplo significativo
para compreender a síntese do corpo está na relação do corpo com o mundo dos
objetos. O uso da bengala, por exemplo, faz com que o mundo dos objetos táteis
não comece na epiderme da mão, mas na extremidade da bengala. Sobre essa
relação do corpo com a bengala, Merleau-Ponty afirma que as pressões da mão
não são dados à maneira empirista, haja vista que a bengala é uma extensão da
síntese corporal. Numa visão clássica, essa relação corpo-bengala é explicada
pelo esquema estímulo-resposta.

22 Aula 1 Consciência corporal


Na análise intelectualista, separa-se o signo (objeto bengala) da significação
(função de apoiar). Na perspectiva fenomenológica, a bengala foi incluída no
esquema corporal, faz parte da estrutura perceptiva. Desse modo, o conteúdo
sensível, ou seja, a forma da bengala já é dotada de sentido. Portanto, a bengala
está incluída na estrutura perceptiva, na relação de comunicação entre o sujeito e o
mundo. Assim, mover-me apoiado na bengala, altera, corrige, molda e ultrapassa
a minha relação com o mundo, o modo como me relaciono com os outros e com
o espaço arquitetônico. Nesse sentido, a gestualidade prolonga-se em hábito
perceptivo, provocando mudança no modo de andar, um uso diferente do corpo,
escrevendo outro modo de ser e de existir.
De acordo com Merleau-Ponty (1994), na base de toda a compreensão da
realidade está o sentir, essa realidade pré-objetiva que temos de descobrir em
nós mesmos, a partir do nosso mundo-vida, da nossa corporeidade. A concepção
fenomenológica de corpo supera a tradição cartesiana do corpo-máquina e do
conhecimento da realidade pautado na lógica racionalista que opõe corpo e
mente, sujeito e objeto do conhecimento, entrelaçando ambos.
O corpo realiza a existência, põe o sujeito em situação, diferenciando-se dos
objetos exteriores, inclusive pela sua espacialidade diferenciada: “O contorno de
meu corpo é uma fronteira que as relações de espaço ordinárias não transpõem”
(MERLEAU-PONTY, 1994, p. 143). Isso ocorre porque as partes do corpo rela-
cionam-se de um modo original, envolvem-se umas nas outras, constituindo-se
uma unidade indivisível. O corpo não está no espaço como um objeto; ele desenha
o espaço, garantindo uma conformação original de acordo com a situação. Nesse
ponto, o conceito de esquema corporal é esclarecedor: “O esquema corporal não é
nem o simples decalque nem mesmo a consciência global das partes existentes do
corpo, e porque ele as integra ativamente em razão de seu valor para os projetos
do organismo” (MERLEAU-PONTY, 1994, p. 145).
Segundo Nóbrega (2009), Merleau-Ponty faz uma nova leitura do conceito de
esquema corporal advindo da neurologia clássica para além do reconhecimento
das partes do corpo, definindo-o como uma propriedade do organismo que
garante a sua integração ativa enquanto unidade que põe o sujeito em situação,
ou seja, em relação com o mundo. Essa nova leitura permite contextualizar o
conceito de esquema corporal também no âmbito filosófico. Nesse sentido, o
esquema corporal é a maneira de exprimir que o corpo está no mundo, não como
coisa, objeto ou ideia, mas como presença viva e em constante movimento. Essa
presença corporal no espaço e no tempo marca a singularidade da existência do
sujeito e o horizonte de seus projetos.
Ademais, o uso que o ser humano faz de seu corpo ultrapassa o nível biológico,
o nível dos instintos, ele cria um mundo simbólico, de significações. O ser humano
não está aprisionado, como os animais, nos limites de suas condições naturais,
ele as amplia, variando os pontos de vista, reconhecendo numa mesmo fenômeno
diferentes perspectivas. Dessa forma, realizar um movimento não seria simples-
mente utilizar o equipamento anatômico mas aprender as coisas do mundo de
forma original, fornecendo uma resposta adequada à nova situação.

Aula 1 Consciência corporal 23


Nessa perspectiva, se o movimento não possui essa significação, ou mesmo
se isso não é despertado, o movimento deixa de expressar a originalidade do
sujeito e o corpo passa à condição de objeto, de coisa. Ademais, realizar um
movimento é realizar projetos de nossa existência. Quando jogo, canto ou danço,
não estou apenas colocando em funcionamento o meu equipamento anatômico
e fisiológico, estou vivendo, simultaneamente, o mundo cultural que conformou
esse jogo, esse canto, essa dança e todos os meus projetos existenciais neles
representados (SEBASTIÃO; NÓBREGA, 2009).
Quanto à consciência corporal, tem sido tematizada na educação física brasi-
leira a partir dos estudos da psicomotricidade e das chamadas “técnicas alterna-
tiva” (CLARO, 1995). Nesse contexto, busca-se contrapor-se ao aspecto dualista
presente na educação física tradicional. Para tanto, várias técnicas fundamentam
essa proposta de resgate da sensibilidade, entre elas: a antiginástica; a eutonia; o
método Feldenkrais; a bioenergética; o Método Dança-Educação Física e outras,
inclusive as técnicas orientais (Yoga, Do-In, Tai Chi Chuan). Essas técnicas surgem
a partir do trabalho com terapia, com exceção do Método Dança-Educação Física,
que as utiliza adaptando-as ao processo educacional, e das técnicas orientais que
compõem o referencial filosófico-religioso daquela cultura.
Na perspectiva fenomenológica, a corporeidade é compreendida como a condição
essencial do ser humano, sua presença corporal no mundo, um corpo vivo que cria
linguagem e se expressa pelo movimento, com diferentes sentidos e significados.
Nesse sentido, a consciência corporal é a percepção que o ser humano possui de sua
realidade existencial como corpo em movimento, como corporeidade.
A corporeidade é a matriz a partir da qual as expressões corporais estruturadas
pelo homem ao longo da história estariam fundamentadas, como exemplo, temos:
os jogos, as danças, os esportes, as lutas. Essas expressões são temporais, históricas,
vivas e significantes, portanto, mutáveis, o que pode oferecer possibilidades de
reagir aos condicionantes da ideologia do mercado e ao viés mecanicista de corpo
banalizado pela sociedade de consumo.
Nesse cenário, essa leitura do corpo nada mais é do que um processo de cons-
cientização, da leitura das vozes do corpo. Lucidamente, Santin (1987) alerta-nos
sobre a delicada tarefa educativa da educação física, que é interpretar a linguagem
da corporeidade, as necessidades, os desejos, as emoções que compõem o seu
quadro linguístico e que se expressa nos movimentos.
Além disso, o resgate da sensibilidade faz-se urgente dentro de uma sociedade
racionalizadora como forma de ampliar a percepção do sujeito frente às investidas
do poder dominante. Para Foucault (1992), o poder institucional investe no corpo
como forma de controle-estimulação. Assim, a ginástica, os exercícios físicos, o
desenvolvimento muscular, a nudez, o belo corpo são exaltados para atender às
necessidades da sociedade capitalista.

24 Aula 1 Consciência corporal


Essa emergência do corpo revela muito mais uma sutil repressão, uma forma
refinada de controle, que a sua libertação e afirmação como síntese humana. O
discurso que se elabora do corpo é um discurso de corpo liberado, solto, antidis-
ciplinar. Porém, a sociedade é disciplinar em relação ao corpo. Desse modo, ora o
nosso corpo é aprisionado, ora é liberado. Convivemos com ele todos os momentos
de nossas vidas e ainda não compreendemos sua linguagem. Ele nos fala, mas não
ouvimos, não compreendemos. Aprisionados à tradição dualista, não nos perce-
bemos como seres corporais. A esse respeito, Assmann complementa:

Não é verdade que, num sentido muito real, temos imensa dificuldade em
ser nosso corpo, porque já nos inculcaram, de mil maneiras, que temos
tal ou qual corpo? Ou seja, mais do que da sua verdade e real substância,
nossos corpos são corpos que nos disseram que temos, corpos inculcados
e ensinados, feitos de linguagens, símbolos e imagens. As culturas, as
ideologias, as organizações sempre inventam um corpo humano adequado
e conforme (ASSMANN, 1994, p. 72).

Esse processo de conscientização apresenta-se como um desafio para os


profissionais da educação física, refletindo acerca dos valores que permeiam a
concepção de corpo, que deixa de ser objeto e passa a ser sujeito do movimento.
Quanto aos profissionais dessa área, têm muito a contribuir com a educação,
socializando novos conceitos de corpo, tomando como ponto de partida suas dife-
rentes expressões em movimento que, historicamente, já fazem parte do seu acervo
e outras que possam vir a incorporar-se. Para isso, esses profissionais precisam
considerar também que o movimento deve despertar no sujeito a percepção de si
mesmo como ser corporal em relação aos outros e ao mundo, além de considerar
também a sensibilidade como atribuidora de significado às ações humanas.
São justamente esses os aspectos que devem ser pensados nas práticas peda-
gógicas da educação física, em outras palavras, esses profissionais devem atentar
para fazer uma releitura do seu acervo de movimentos, de forma que o jogo, a
dança, a ginástica, o esporte possam expressar e comunicar a complexidade do
ser humano que se movimenta.

Leitura complementar

BOLSANELLO, D. Educação somática: o corpo enquanto experiência. Motriz,


Rio Claro, v. 11, n. 2, p. 99-106, maio/ago. 2005. Disponível em: <http://www.
rc.unesp.br/ib/efisica/motriz/11n2/11n2_08DBB.pdf>. Acesso em: 2 maio 2014.
O artigo aborda a compreensão de corpo como experiência baseando-se na
fenomenologia de Merleau-Ponty e em práticas corporais que contribuem para
a educação somática e a consciência corporal.

Aula 1 Consciência corporal 25


Atividade 2

Temos ou somos um corpo? Caracterize a abordagem fenomeno-


lógica da consciência corporal descrevendo as noções principais, tais
como: a corporeidade e o esquema corporal. Apresente as possíveis
relações entre a abordagem fenomenológica do corpo e da consci-
ência corporal na educação física. Participe de um fórum virtual
discutindo essa questão.

Resumo

Nesta aula, apresentamos um panorama da noção de consciência no


pensamento ocidental e suas relações com o corpo. Tratamos também
da abordagem fenomenológica da consciência e da corporeidade como
fundamentação teórica para as aulas teórico-práticas da disciplina de
consciência corporal na educação física. de uma introdução

Autoavaliação
Como você percebe seu corpo? Em uma folha de papel ofício, tamanho
A4, faça o desenho de uma figura humana. Pode usar lápis grafite colorir seu
desenho se preferir. Na aula seguinte, vamos fazer a leitura desse desenho
e estabelecer relações com a percepção de si, o esquema corporal e a relação
com o mundo e com o outro. Entregue seu desenho ao tutor de seu polo.

26 Aula 1 Consciência corporal


Referências
ABBAGNANO, N. Dicionário de filosofia. 2. ed. Tradução de Alfredo Bosi. São
Paulo: Martins Fontes, 1998.

ASSMANN, H. Paradigmas educacionais e corporeidade. 2. ed. Piracicaba,


SP: Unimep, 1994.

CLARO, E. Método dança-educação física: uma reflexão sobre consciência


corporal e profissional. São Paulo: Robe, 1995.

CHAUI, M. Convite à filosofia. São Paulo: Ática, 2009.

FOUCAULT, M. Microfísica do poder. 10. ed. Rio de Janeiro: Graal, 1992.

FREUD, S. O mal estar na civilização. São Paulo: Companhia das Letras, 2011.

JAEGER, W. Paidéia: a formação do homem grego. 2. ed. São Paulo: Martins


Fontes, 1989.

MERLEAU-PONTY, M. Fenomenologia da percepção. São Paulo: Martins


Fontes, 1994.

NIETZSCHE, F. Assim falou zaratustra: um livro para todos e para ninguém.


7. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1994.

NÓBREGA, T. P da. Qual o lugar do corpo na educação? Notas sobre


conhecimento, processos cognitivos e currículo. Revista educação e
sociedade, Campinas, v. 26, n. 91, p. 599-615, maio/ago. 2005.

______. Corporeidade e educação física: do corpo objeto ao corpo sujeito. 3.


ed. Natal: Editora da UFRN, 2009.

______. Uma fenomenologia do corpo. São Paulo: Livraria da Física, 2010.

NÓBREGA, T. P. da; SEBASTIÃO, M. L. Corpo e movimento: reflexões sobre


a gestualidade em Tempos Modernos. 2009. Disponível em: <http://www.
efdeportes.com/efd165/corpo-e-movimento-a-gestualidade-em-tempos-
modernos.htm>. Acesso em: 24 jul. 2014.

PLATÃO. Fédon. Belém: EDUFPA, 2011.

______. A república. 6. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1990.

Aula 1 Consciência corporal 27


ROSSEAU, J-J. O Emílio ou da educação. São Paulo: Martins Fontes, 1995.

SANTIN, S. Educação física: uma abordagem filosófica da corporeidade. Ijuí:


Unijuí, 1987.

VARELA, F. et al. Embodied mind: cognitive science and human experience.


London: The MIT Press, 1996.

Anotações

28 Aula 1 Consciência corporal


A percepção do corpo
na antiginástica

Aula

2
Apresentação

C
aro(a) aluno(a), onde você estiver há uma casa com seu nome. Você é o
único proprietário nessa casa que abriga suas mais recônditas memórias.
Você sabe do que estou falando? Você sabe que casa é essa? Esta, caro(a)
aluno(a), é o seu corpo. Você a conhece bem? Você habita verdadeiramente essa
casa ou faz tempo que perdeu as chaves?
Nesta aula, através da técnica da antiginástica, você vai percorrer esse
ambiente, tocar suas paredes, sentir sua estrutura, habitá-lo inteiramente. Você
vai conhecer a trajetória histórica e os princípios teóricos e metodológicos da
antiginástica, bem como realizar alguns exercícios práticos.
Nunca é tarde demais para você liberar-se de dores, rigidez muscular, ten-
sões e descobrir possibilidades inéditas do seu corpo. Preparado(a)? Vamos
começar nosso caminho de autoconhecimento e de consciência corporal. Bem-
-vindo(a) a sua casa, bem-vindo(a) a seu corpo!

Objetivos

Identificar os princípios teóricos e metodológicos


1 da antiginástica.

2 Reconhecer os exercícios da técnica de antiginástica.

31
31
“Seu corpo, essa casa onde você não mora”

É
com essa frase arrebatadora que a criadora da antiginástica abre seu livro.
Essa é uma técnica corporal criada pela fisioterapeuta francesa Thèrése
Betherat, nos anos de 1970. No livro “O corpo tem suas razões”, Bertherat
e Bernstein (1987) afirma que “nosso corpo somos nós. Somos o que parecemos
ser. Nosso modo de parecer é nosso modo de ser” (BERTHERAT; BERNSTEIN,
1987, p. 13). Essa afirmação coaduna com a perspectiva fenomenológica da
corporeidade estudada na aula anterior de nossa disciplina (Aula 1), concorda?
No entanto, muitas vezes, confundimos o visível com o superficial com a apa-
rência do corpo e seus padrões de beleza, por exemplo.
Nesse contexto, temos um corpo, como podemos possuir uma coisa, uma
casa, mas sem habitá-la. A proposta dessa técnica é habitar o corpo que somos.
Mas, como faremos isso? Por meio de nossas sensações, das percepções sutis do
nosso corpo, buscando as razões do nosso próprio corpo, conhecendo sua linguagem
sensível. O principal objetivo do trabalho é a consciência do próprio corpo, é
buscar ter acesso ao ser inteiro, superando os dualismos corpo e alma, psíquico
e físico. Nessa perspectiva, a compreensão de corpo afina-se profundamente
com a noção de corporeidade propostas por Merleau-Ponty (1994), em que se
busca a escuta do corpo e de sua sensibilidade. Nesse sentindo, compreende-se
que os movimentos nascem dentro do corpo e estão relacionados às experiências
vividas pelos sujeitos.
Bertherat e Bernstein (1987) chamam esses movimentos de preliminares,
ou seja, exercícios que preparam o corpo e todo o ser para viver plenamente. Na
segunda parte de nossa aula, vamos abordar esses exercícios de percepção do
corpo. Por enquanto, atemos aos aspectos teóricos dessa técnica.
A construção teórica e metodológica da antiginástica baseou-se fortemente
na experiência vivida de sua criadora, em seu próprio corpo e no corpo das
pessoas com as quais ela trabalhou. Thèrése sentia-se entediada e buscava uma
atividade que lhe propiciasse prazer. Em sua busca, encontrou a senhora Suze
L e sua aula de “ginástica”. A princípio resistiu, pois não gostava de ginástica.
Mas, ao descobrir os movimentos sutis propostos pela senhora Suze, usando
simples bolinhas de tênis, algo lhe chamou a atenção: “Que espécie de ginástica
é essa que se preocupa com meu conforto?” (BERTHERAT; BERNSTEIN, 1987,
p. 24). A tranquilidade dos exercícios provocava a tranquilidade dos alunos, o
relaxamento, o bem-estar e a descoberta de novas sensações corporais.
“Na sala sem espelhos, era ela quem nos mostrava a imagem do que poderíamos
ser” (BERTHERAT; BERNSTEIN, 1987, p. 31). Não se compreendia o corpo como
uma máquina defeituosa, mas como sujeito de suas ações.
Com a morte de seu marido, a fisioterapeuta sentiu-se bastante oprimida e
queria dar um novo rumo a sua vida. Foi então que teve acesso ao trabalho de
Ehrenfried. Nele, o corpo era considerado como matéria flexível, perfectível. Essa
foi a primeira referência teórica para a construção da antiginástica.

Aula 2 Consciência corporal 33


Outra referência é a teoria proposta por William Reich e a noção de couraça
muscular. “Toda rigidez muscular contém a história e a significação de sua
origem. Quando ela é dissolvida, não só a energia é liberada, mas também traz
Recalque à memória a própria situação infantil em que o recalque se deu” (BERTHERAT;
Ao analisar a teoria freudiana BERNSTEIN, 1987, p. 67).
da sexualidade, Merleau-Ponty
William Reich desenvolveu a ideia de couraça muscular para expressar esse
(1994) afirma que o recalque
refere-se a uma barreira recalque, anteriormente estudado por Freud. Segundo Reich (apud BERTHERAT;
em nossa vida profissional, BERNSTEIN, 1987), entravamos a livre circulação da energia que passa no nosso
amorosa e, como tal, exige corpo ao criamos as couraças musculares, zonas rígidas que nos encerram em
um emprego de energia para
anéis ou em cintas, como vemos na Figura 1, em diferentes níveis do corpo, em
removê-lo. O recalque pode
causar angústia e sofrimento. especial na região dos olhos, da boca, da nuca, dos ombros, do diafragma e do
ventre, do quadril e do sexo. Esses bloqueios podem provocar doenças, mal-estar
e toda uma série de distúrbios psíquicos e emocionais.

Figura 1 – As cintas do controle da pulsão.


Fonte: Keleman (1992, p. 69).

De acordo com Keleman (1992), o corpo é a sede da experiência e esta o trans-


forma em uma estratégia da pulsão vital, a qual serve de resposta ao estresse, à dor
e às tensões. Em geral, aprendemos que o corpo é composto de cabeça, tronco e
membros. Mas, o fato é que o corpo é bem mais completo que essa simples divisão
anatômica. Ele contém nossa história pessoal e coletiva, abriga nossas emoções,
nossos desejos e nossas dores. Entrar em contato com esse universo é um caminho
de autoconhecimento que exige coragem e disponibilidade.
Segundo Bertherat e Bernstein (1987), no Ocidente, consideramos a cabeça como
lugar soberano do corpo. No entanto, não prestamos atenção às nossas costas ou
aos nossos pés, por exemplo. Sempre nos referimos à parte superior do corpo como
sendo a mais elevada, relacionada à nossa inteligência ou à emoções socialmente
valorizadas, como o amor. A parte inferior do corpo, em geral, está associada às
nossas “sensações baixas”, aos nossos instintos, à nossa animalidade. “Lembro-me
dos conselhos de um professor de etiqueta que dizia que se durante um jantar sen-
tíssemos cólicas ou dores de barriga, levantássemos da mesa segurando a cabeça,
como se estivéssemos com enxaqueca” (BERTHERAT; BERNSTEIN, 1987, p. 72).

34 Aula 2 Consciência corporal


Na antiginástica, os pés são valorizados por meio de uma técnica chamada
de reflexologia. De acordo com Bertherat e Bernstein (1987), na reflexologia
compreende-se que os órgãos do corpo projetam-se na planta dos pés. Na Figura
2, você pode perceber o mapa com as representações dos órgãos projetados.

Figura 2 – Mapa da reflexologia.


Fonte: Bertherat e Bernstein (1987, p. 156-157).

Um dos exercícios consiste em massagear a planta dos pés com as mãos ou


utilizando bolinhas de tênis. Essas micromassagens podem aliviar dores, tensões
por meio do relaxamento. De acordo com a medicina chinesa, esses pontos corres-
pondem aos meridianos por meio dos quais a energia vital circula. Ao massagear os
pés, produzimos uma circulação da energia vital, como ocorre com a acupuntura,
por exemplo. A parte interna do pé corresponde à coluna vertebral. Seguindo o
sentido céfalo-caudal (da cabeça aos pés), passamos pela região cervical, torácica,
lombar e cóccix, produzindo alívio de tensões advindas de nossa postura bípede.
Outra referência fundamental da antiginástica é o método Mézières, o qual se
contrapõe aos métodos tradicionais da fisioterapia, em especial, ao uso de panó-
plias corretoras como coletes, goteiras de gesso, sobretudo, por considerar o corpo
em sua totalidade. A questão central está em alongar a musculatura posterior do
corpo. “Encolhidos os músculos posteriores repuxam os ossos sobre os quais estão
inseridos e, com o tempo, fazem com que as superfícies articulares não reajam
mais com a exata precisão necessária” (BERTHERAT; BERNSTEIN, 1987, p. 123).
Esse método busca o respeito pelo corpo humano, a vontade de fazer com que
o outro descubra suas possibilidades corporais e de movimento. Nessa direção a
antiginástica contribui para a percepção e a consciência do corpo. Desse modo,
“é o estado do corpo que, a priori, determina a riqueza das experiências vividas”
(BERTHERAT; BERNSTEIN, 1987, p. 107).

Aula 2 Consciência corporal 35


Essas são as principais referências conceituais dessa técnica corporal. Propo-
nho agora uma leitura complementar e uma atividade para que você amplie e
consolide sua aprendizagem. Na segunda parte da aula, abordaremos aspectos
metodológicos da antiginástica e a percepção do corpo.

Leituras complementares

BERTHERAT, T.; BERNSTEIN, C. O corpo tem suas razões: antiginástica e cons-


ciência de si. 21. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2010.
O livro apresenta os aspectos teóricos e metodológicos da antiginástica, com
a descrição de exercícios preliminares. A leitura permite ampliar a fundamentação
teórica dessa área.

EHRENFRIED, L. Da educação do corpo ao equilíbrio do espírito. São Paulo:


Summus, 1991.
O livro apresenta o corpo para além do dualismo corpo e alma. Apresenta
também um método que influenciou outros relacionados à consciência corporal,
entre eles a antiginástica.

Atividade 1

Com base na leitura do texto, responda às questões:

1 Qual a compreensão do corpo na técnica da antiginástica?

Quais os principais aspectos da fundamentação teórica da


2 antiginástica?

Compartilhe suas respostas na plataforma virtual do curso.

36 Aula 2 Consciência corporal


Aspectos metodológicos da antiginástica
Agora que você já conhece os aspectos conceituais da antiginástica, vamos
apresentar o método, com destaque para os exercícios preliminares. Bertherat
e Bernstein (1987) descreve os preliminares como sendo um caminho para a con-
quista da consciência do corpo. A primeira e principal orientação é a de não se
preocupar em “acertar” os movimentos. O mais importante é perceber o corpo,
o ritmo interno e tentar dissolver as tensões.
O primeiro exercício é a percepção do corpo em contato com o chão. Deitado em
decúbito dorsal, deixar o silêncio instalar-se e percorrer o seu corpo, percebendo
as partes que tocam o chão: cabeça, costas, quadril, pernas, pés.
O segundo exercício proposto por Bertherat e Bernstein (1987) é o trabalho
sobre o pé. Apoiar o pé sobre uma bola de tênis e pressionar a parte anterior, o
meio do pé e a parte posterior. Massagear um lado e antes de trabalhar o outro
pé, perceber a diferença entre o lado trabalhado e o que ainda não foi massa-
geado. Normalmente, o lado massageado está mais vibrante, mais alongado. Esse
exercício produz um relaxamento e um alongamento sutil da cadeia muscular
posterior, harmonizando a coluna vertebral.
Outro preliminar bastante eficaz consiste em massagear a região lombar.
Para isso, deita-se em decúbito dorsal com joelhos flexionados, pés abertos na
largura do ombro. Em seguida, coloca-se a bolinha de tênis na região lombar e
eleva-se o quadril, retorna pressionando a bolinha. Repete-se algumas vezes até
sentir o alongamento, a soltura dessa região. Delicadamente, retira-se a bola,
estendem-se ambas as pernas, percebendo a diferença entre o lado massageado
e o outro. Repete-se o exercício para o outro lado.
Esses são alguns dos preliminares propostos por Bertherat e Bernstein (1987) e que
caracterizam a antiginástica como uma técnica voltada para a consciência corporal.
De acordo com Bertherat (2014), com a antiginástica:

A musculatura se libera, se flexibiliza, se fortalece. As dores nas costas, na


nuca, nos ombros desaparecem. A energia sexual se libera; a respiração; a
digestão, a circulação melhora. O corpo reencontra harmonia, equilíbrio e
autonomia, e os benefícios nele se inscrevem de forma duradoura. Respeitando
totalmente o corpo, os movimentos propostos pela antiginástica® são realmente
poderosos. Eficazes. Desde os primeiros dias, obtêm-se resultados. Porém,
é preciso várias semanas, muitas vezes vários meses, para que a mudança
se instale (BERTHERAT, 2014, p. 1).

O ponto central dessa técnica é o equilíbrio entre as cadeias musculares


posteriores e anteriores do corpo. Sentir-se achatado, esmagado pela musculatura,
em particular na região lombar, não corresponde ao equilíbrio funcional do nosso
corpo. Liberar essa musculatura amplia a um só tempo nossa elasticidade, a
sensação de bem-estar e a percepção geral do nosso corpo e de nós mesmos.

Aula 2 Consciência corporal 37


Bertherat (2014, p. 6) descreve os benefícios da antiginástica, a saber:

� Bem-estar físico e psíquico.


� Vitalidade, mobilidade, resgate de flexibilidade, maior amplitude articular

para as pessoas que sofrem de reumatismo.
� Sensação de unidade, de solidez, confiança em si mesmo resgatada.
� Reequilíbrio entre a frente e trás, lado direito e lado esquerdo.
� Efeito de relaxamento, de um corpo solto que respira.
� Método rejuvenescedor.
� Alternativa a certas intervenções cirúrgicas (alux valgum, operação para

síndrome do túnel do carpo).
� Desaparecimento de dores dorsais e cervicais.
� Diminuição do estresse, das tensões ligadas ao trabalho, aos esportes,

às atividades cotidianas.
� D
esenvolvimento da motricidade, da coordenação da orientação, per-
cepções sensoriais mais apuradas.
� E
xcelente acompanhamento para a gravidez. Os profissionais organizam
sessões específicas para mulheres grávidas.

Como todo trabalho de consciência corporal, a antiginástica é um processo em


que se faz necessária a dedicação, a vontade e a disponibilidade para aprender
algo novo, para se abrir ao campo das sensações, da percepção dos movimentos,
ampliando nossa capacidade de concentração e nosso equilíbrio. Embora seja um
método criado por uma fisioterapeuta, os exercícios preliminares podem ser feitos
em aulas de educação física, com o objetivo de consciência corporal (CLARO, 1995).
Em nossa experiência profissional, temos utilizado a antiginástica em aulas
de educação física escolar, na formação de professores e na preparação corporal
de bailarinos e de atores, sem restrições quanto à idade ou à experiência corporal
atlética. Como em todo trabalho corporal, indica-se, por vezes, a complementação
entre as atividades e, caso necessário, acompanhamento médico, fisioterapêutico
ou psicológico. Cabe ao profissional conhecer o grupo e os objetivos do trabalho,
adaptando o método às necessidades de seus alunos.
A seguir, descrevemos uma sessão de antiginástica que foi realizada com os
alunos da disciplina de Consciência Corporal, no Departamento de educação física
da UFRN. Desse modo, você poderá perceber os aspectos práticos da Antiginástica.
Essa aula pode ser feita com pessoas de qualquer idade e mesmo gestantes. Para
pessoas idosas, alguns exercícios podem ser feitos sentadas em uma cadeira, como,
por exemplo, a massagem na planta dos pés.

1) Nível de alongamento da cadeia muscular posterior: de pé, pés paralelos e


separados na largura do ombro. Pernas estendidas, flexionar o tronco. Perceber
a tensão na musculatura posterior, a posição das mãos e a distância em relação
aos pés. Massagear as partes do corpo em que sente mais tensão (lombar, pes-
coço, pernas). Respirem profundamente e tentem aliviar essa tensão. Flexionar
a perna direita, depois a esquerda. Há diferença de tensão entre as pernas?

38 Aula 2 Consciência corporal


2) Deitados em decúbito dorsal, vamos fazer a leitura corporal (Figura 3). Quais
as partes do corpo que estão em contato com o chão? Vamos perceber esse
contato. Começamos com os pés, calcanhares. Como é esse apoio dos calca-
nhares? Percebam se há diferença entre o lado direito e o esquerdo do corpo.
E as pernas, parte posterior das pernas, sintam esse contato com o chão. E
os joelhos? Como estão posicionados? Apontam para cima, para o lado? E as
coxas, parte posterior da coxa? E o quadril, ponto de ligação entre a metade
inferior e superior do corpo, como você sente o quadril, glúteos? Passamos
para as costas, começando com a lombar, a lombar toca o chão? Respirem e
tentem aproximar a região lombar do chão. Muito bem! Dobrem os joelhos,
pés no chão, percebam o contato das costas. Elevação do quadril (ponte),
retificar a curvatura da coluna vertebral. Voltem a estender as pernas e sintam
os ombros, braços, mãos. Agora é a cabeça, sintam o peso da cabeça. E os
maxilares, estão cerrados? Tentem soltá-los, colocando a ponta da língua no
céu da boca. Relaxem. Virem o pescoço delicadamente para um lado e para
o outro. Procurem perceber a imagem do seu corpo no chão dos pés à cabeça
e da cabeça aos pés.

Figura 3 – Leitura corporal.


Fonte: Autoria Própria (2014).

3) Deitados, pernas dobradas. Nessa posição, colocar a bolinha na região lombar


e no trapézio. Fazer a ponte e, depois, rolar os braços para frente e para trás.

4) Vamos ficar de pé e massagear os pés com a bolinha de tênis. Um lado de


cada vez. Antes de passar para o outro pé, perceber a musculatura do lado
massageado (Figura 4).

Aula 2 Consciência corporal 39


Figura 4 – Massagem na planta dos pés.
Fonte: Autoria Própria (2014).

5) Massagem dois a dois com a bolinha de tênis (Figura 5).

Figura 5 – Massagear as costas do colega.


Fonte: Autoria Própria (2014).

6) Para finalizar, repetir a leitura corporal. Indagar como se sentem. Escutar as im-
pressões dos alunos sobre suas sensações, seu estado geral, entre outros aspectos.

7) Desenho da figura humana (Figura 6): pedir para desenhar a figura humana em
uma folha de papel ofício (tamanho A4), usando lápis grafite ou caneta. Pode-se
fazer isso na primeira aula e repetir no final de algumas aulas. Assim, é possível
comparar o desenho feito antes e depois, comparando se houve uma ampliação
da percepção do corpo expressa pelos desenhos e pela fala dos alunos.

40 Aula 2 Consciência corporal


Figura 6 – Desenho da figura humana feito por uma aluna da
disciplina Consciência Corporal do curso de Educação Física da
UFRN, no início e no final do semestre letivo de 2013.2.
Fonte: Autoria Própria (2014).

No desenho da figura humana (Figura 6), você pode observar aspectos relacio-
nados ao esquema corporal, tais como a espacialidade. Dobre a folha de papel em
quatro partes e perceba em que parte do papel a figura está situada. O desenho está
bem distribuído no espaço ou figura em apenas um quadrante da folha? As partes
e proporções do corpo são adequadas ou são apenas garatujas infantis (rabiscos)?
O corpo está nu ou vestido? Podemos fazer a leitura do desenho com os alunos,
percebendo esses e outros aspectos relacionados à percepção do corpo.
No desenho seguinte (Figura 7), nota-se que a primeira imagem retrata um corpo
masculino. O mesmo,que se modifica na segunda imagem. A referida aluna tornou-
-se mais expressiva ao longo da disciplina. Outros aspectos do desenho não foram
analisados por nós, mas isso poderia ser feito por outros profissionais e em outros con-
textos que não o da formação profissional, em sessões de psicoterapia, por exemplo.

Figura 7 – Desenho da figura humana feita por uma aluna


no início e no final da disciplina Consciência Corporal.
Fonte: Autoria Própria (2014).

Aula 2 Consciência corporal 41


Nas Figuras 6 e 7, podemos perceber desenhos produzidos por alunos da
disciplina Consciência Corporal do curso de Educação Física da UFRN, ao
iniciarmos a disciplina no primeiro semestre de 2013 e quatro meses depois. É
visível a elaboração do esquema corporal e os aspectos expressivos, o que indica
a ampliação da percepção do corpo para esses alunos por meio da antiginástica
e de outras técnicas que iremos abordar ao longo de nossa disciplina.
Merleau-Ponty (2006) apresenta várias interpretações do desenho da figura
humana, em particular aquele realizado por crianças. Trata-se de uma boa
referência para aprofundar esse índice do conhecimento do corpo. O autor destaca
os aspectos relacionados ao esquema corporal, ao desenvolvimento emocional
e psicanalítico. Nesse último caso, pode-se fazer uma leitura dos aspectos
ligados aos desejos, aos bloqueios emocionais ou recalques e ainda as couraças
musculares, entre outros aspectos. Voltaremos a essa questão da representação
do desenho, os modelos e as imagens corporais em nossa próxima aula sobre a
percepção do corpo na eutonia.

Leituras complementares

BERTHERAT, M. A Antiginástica. 2014. Disponível em: <http://www.


antigymnastique.com/media/ui/img/presse/pdf/Em-pleno-corpo.pdf>. Acesso
em: 5 maio 2014.
Apresenta os objetivos e benefícios da antiginástica, bem como descreve uma
sessão com essa técnica. Relata ainda experiências com gestante e com bebês.

Vídeo sobre Antiginástica. Disponível em: <http://tnh1.ne10.uol.com.br/video/


feito-pra-voce/2014/02/18/108195/antiginastica-exercicios-sem-suor>. Acesso
em: 5 maio 2014.
O vídeo mostra os princípios teóricos e metodológicos da antiginástica.

GAIARSA, J. A. Couraça muscular do caráter: William reich. São Paulo: Ágora, 1984.
O livro apresenta os fundamentos da teoria de William Reich sobre o corpo
e as couraças musculares. Pode contribuir na relação entre o corpo e os aspectos
psicológicos do comportamento humano.

42 Aula 2 Consciência corporal


Atividade 2

Em grupo, faça uma pesquisa em sua cidade ou região, ou na


internet a respeito da antiginástica. Procure locais e profissionais
(psicólogos, fisioterapeutas, professores de educação física, bai-
larinos, atletas) que conheçam essa técnica e faça uma entrevista.
Indague sobre os aspectos teóricos, a percepção do corpo, os aspectos
metodológicos da técnica e os benefícios da prática. Em seguida,
prepare (em grupo) um relatório contendo o estudo da realidade e
apresente seu trabalho ao tutor. Pode incluir fotos e vídeos.

Resumo

Nesta aula, abordamos aspectos teóricos e metodológicos da


antiginástica criada pela francesa Thérèse Bertherat e vimos que
os exercícios preliminares visam produzir a liberação das cadeias
musculares, melhorar o alongamento, ampliar a percepção de si
mesmo e produzir relaxamento e bem-estar.

Aula 2 Consciência corporal 43


Autoavaliação
Como você percebe seu corpo? Experimente um ou mais dos exercícios
preliminares da antiginástica descritos na aula e relate como foi a percepção do
seu corpo ao realizá-los. Poste sua autoavaliação na plataforma Moodle.

Referências
BERTHERAT, T.; BERNSTEIN, C. O corpo tem suas razões: antiginástica e
consciência de si. São Paulo: Martins Fontes, 1987.

BERTHERAT, M. A Antiginástica. 2014. Disponível em: <http://www.


antigymnastique.com/media/ui/img/presse/pdf/Em-pleno-corpo.pdf>.
Acesso em: 5 maio 2014.

CLARO, E. Método dança-educação física: uma reflexão sobre consciência


corporal e profissional. São Paulo: Robe, 1995.

KELEMAN, S. Anatomia emocional. São Paulo: Summus, 1992.

MERLEAU-PONTY, M. Fenomenologia da percepção. São Paulo: Martins


Fontes, 1994.

______. Psicologia e pedagogia da criança. São Paulo: Martins Fontes, 2006.

Anotações

44 Aula 2 Consciência corporal


Anotações

Aula 2 Consciência corporal 45


Anotações

46 Aula 2 Consciência corporal


A percepção do
corpo na Eutonia

Aula

3
Apresentação

C
aro(a) aluno(a), nesta aula, vamos conhecer a eutonia. A palavra eutonia
expressa a ideia de uma tonicidade equilibrada e harmoniosa. A etimologia
da palavra vem do grego Eu = bom, justo, harmonioso enquanto tonos =
tônus, tensão. Essa técnica foi criada pela alemã Gerda Alexander com objetivo
de melhorar a consciência corporal, ou seja, aprimorando a percepção do espaço
corporal, da respiração, de posições de controle, do tato e do contato.
A técnica é utilizada em processos pedagógicos e também em processos tera-
pêuticos. No caso da Educação Física a eutonia é usada em aulas de consciência
corporal, ampliando-se o conhecimento do corpo, dos espaços corporais, a
motricidade, o ritmo e a expressão.
No primeiro momento da aula, vamos apresentar a trajetória histórica e
os princípios teóricos da eutonia e, na segunda parte da aula, vamos conhecer
aspectos metodológicos e práticos dessa técnica que tem sido aplicada em contextos
educativos e clínicos diversos, seja com crianças, jovens, adultos ou idosos.
Com os exercícios de eutonia, podemos perceber o nosso corpo de forma
ampla, criativa, expressiva, trabalhando-se as sensações do movimento, a
respiração, o tônus muscular e sua flexibilidade, a expressão corporal e rítmica.
Preparados(as)? Vamos começar!

Objetivos

Identificar os princípios teóricos e metodológicos


1 da eutonia.

2 Reconhecer os exercícios da técnica da eutonia.

49
Conhecendo a eutonia

A
criadora da eutonia foi a alemã Gerda Alexander (1908-2008). Ela cresceu
no período entre as duas Grandes Guerras e viu nascerem inúmeras práticas
corporais como a ginástica rítmica, a dança moderna e a eurritmia de
Dalcroze que a influenciaram significativamente.
De acordo com Huberty (2013), do ponto de vista teórico, a eutonia tem
como base a psicologia de Jung e o conceito de individuação; Wallon e o
desenvolvimento psicomotor da criança e a fenomenologia de Merleau-Ponty
com sua noção de corpo e de movimento. Essas são as principais referências
fundamentais a compreensão de corpo, de ser humano e de educação aplicada
em clínicas e em espaços pedagógicos.
A eutonia apresenta uma compreensão de corpo fundada na fenomenologia de
Merleau-Ponty na qual o corpo e seu movimento ocupa um lugar de destaque. Merleau-Ponty
De acordo com Alexander (1983), o corpo não é a máquina que funciona bem Caro aluno(a), a respeito da
compreensão fenomenológica
ou mal, também não é o lado perecível do ser humano que contrasta com sua
do corpo sugere-se que releia a
alma imortal. Corpo e alma vivificam-se mutuamente, formando uma unidade. primeira aula da disciplina de
Ao atuar sobre o tônus muscular os exercícios de eutonia mobilizam também consciência corporal. Você pode
nossa psique, o interior e o exterior de nosso corpo se comunicam. Na fenomenologia também voltar ao livro didático
da disciplina Aspectos Sociofi-
e na eutonia o corpo é fonte de saber. De acordo com Dascal (2008), muitas de
losóficos da Educação Física e
nossas percepções são ainda influenciadas pela separação entre corpo e alma, reler a Aula 3 (corporeidades).
corpo e mente, razão e emoção. Mas na linha filosófica iniciada por Merleau-
-Ponty e sua filosofia do corpo, a eutonia procura propiciar o encontro com nossa
realidade corporal, ampliando a percepção do esquema corporal, da consciência
dos espaços corporais e das possibilidades de nossa motricidade na prática.
A eutonia aprofunda nosso estado de presença corporal por meio da ênfase
nas sensações e na sensibilidade. O trabalho de contato com objetos como bolas de
tênis, bambus, balões de encher e o trabalho de contato corporal com os colegas
estimula a cooperação e a afetividade. Pensando nisso, Dascal (2008) apresenta
a influência do tônus muscular sobre as emoções.

A tonicidade repercute no ser humano como um todo. A vida afetiva, os


estados emocionais alteram o tônus e a maneira como é distribuído no
corpo. Por exemplo, a tristeza está associada à sensação de garganta
comprimida e um esterno sensível. O medo está relacionado à sensação de
frio no estômago e músculos abdominais contraídos (DASCAL, 2008, p. 68).

Diversos estudos apontam para esse fato de que as sensações e as emoções se


fixam em algum músculo, como, por exemplo, os de Lowen (1982) e de Keleman
(1992). Logo, na eutonia essa relação entre emoções e tonicidade apresenta-se
como um princípio a ser trabalhado nas práticas corporais do método.
De acordo com Dascal (2008), a eutonia busca a observação do corpo por
meio da experiência corporal de cada sujeito que vivencia o movimento. “Essa
experimentação constante e rigorosa do próprio corpo aguça a sensibilidade

Aula 3 Consciência Corporal 51


proprioceptiva, desenvolve um estado de presença autêntica de si e em relação
às pessoas, às coisas e ao mundo” (DASCAL, 2008, p. 51).
O bom tônus significa, portanto, a tensão adequada à ação que se está
realizando, seja quando jogamos, dançamos, atravessamos a rua ou dirigimos
nosso carro. Assim, nas práticas de eutonia busca-se regularizar esse tônus de
acordo com as necessidades de cada um, ajudando também no relaxamento,
por exemplo.
Sendo assim, o relaxamento é fundamental para o equilíbrio e a saúde do ser
humano. O repouso, a passividade, o relaxamento são regeneradores dos tecidos
cansados e gastos pela ação do tempo, pelo cansaço e pelo estresse muitas vezes
causado pela jornada cotidiana. Por isso, os exercícios em dupla, os jogos, o con-
tato com o colega, os exercícios de alongamento e de concentração contribuem
significativamente para o relaxamento eutônico (BRIEGHEL-MULLER, 1998).
Do ponto de vista teórico-prático, a eutonia organiza-se conforme quatro
princípios fundamentais, a saber:

�„ conscientização superficial e profunda da pele;

�„ conscientização do volume do espaço interno;

�„ conscientização dos ossos;

�„ contato consciente.

Por meio do contato com a nossa pele começamos a conhecer nosso corpo,
sua comunicação interna e externa. Outra forma de aguçar esse conhecimento
é por meio de exercícios corporais, de massagem, do contato com objetos e
Posteriores com tecidos diferentes que agucem a nossa sensibilidade. Em aulas posteriores,
Refiro-me a Aula 5 sobre o toque vamos abordar com mais profundidade esse tema, a importância da pele e do
e o contato humano.
contato para o desenvolvimento do ser humano.
No trabalho de conscientização dos espaços internos como as cavidades do
corpo, músculos profundos, proprioceptores, ossos, busca-se a percepção das
estruturas corporais. A realização de desenhos, esculturas permitem atingir esse
objetivo e conhecer o volume dos espaços do corpo. Uma das atividades a ser
solicitada aos alunos pode ser, por exemplo, o desenho de um esqueleto humano.
Essa atividade mobiliza a percepção de nossa estrutura óssea.
Portanto, o contato consciente envolve as posições de controle que consiste
basicamente em exercícios de alongamento nos quais a atenção é dirigida para a
observação de nossa postura, do jogo de forças gravitacionais e antigravitacionais a
que o corpo está submetido na postura ereta. Os exercícios de contato também envol-
vem a expressão e o contato com o outro (em duplas ou em grupos) em movimentos.
Por fim, cabe registrar que o movimento eutônico considera a intencionalidade
de nossa motricidade, ou seja, as sensações, os sentidos e significados que nosso
corpo em movimento desperta e mobiliza. Não se trata de um movimento
mecânico, mas intencional.

52 Aula 3 Consciência Corporal


Essas são as noções gerais que permitem que você comece sua aprendizagem
na eutonia. Antes de passarmos à segunda parte de nossa aula com os exercícios
práticos, sugerimos que faça as leituras complementares e a atividade para
consolidação de seu conhecimento.

Leituras complementares

ALEXANDER, Gerda. Eutonia: um caminho para a percepção corporal. São Paulo:


Martins Fontes, 1983.
O livro apresenta os aspectos teóricos e aplicações práticas da eutonia na
visão de sua criadora, Gerda Alexander. Trata-se de uma referência fundamental
para o conhecimento da eutonia e, consequentemente, para formação profissional.

Site da Sociedade Brasileira de Eutonia. Disponível em: <http://www.eutonia.


org.br/>. Acesso em: 9 maio 2014.
Nesse site, você encontra artigos, bibliografia e eventos sobre a eutonia.

Atividade 1

Com base na leitura do texto, responda às questões:

1 Qual a compreensão do corpo na técnica da eutonia?

Quais os principais aspectos da fundamentação teórica


2
da eutonia?

Compartilhe suas respostas na plataforma virtual.

Aula 3 Consciência Corporal 53


Uma aula de Eutonia
Nessa segunda parte de nosso texto, descrevemos uma aula de eutonia a
partir da qual você poderá conhecer alguns exercícios práticos e o trabalho de
percepção do corpo com essa técnica. Conforme Alexander (1983), outro
elemento importante da eutonia é a educação dos sentidos, sobretudo o olhar e
o escutar. Esse trabalho é efetivado por meio da realização de trabalhos rítmicos,
da dança, da música e outros.
Os aspectos metodológicos dessa técnica podem ser resumidos nos tópicos
seguintes:

�„ orientação verbal para que o sujeito percorra cada parte do corpo (leitura
corporal);

�„ toques de diferentes tipos, visando despertar a consciência de zonas somáticas;

�„ comparação entre as sensações das partes trabalhadas e as das ainda não


trabalhadas;

�„ observação de estruturas ósseas externas por meio de modelos e/ou desenhos;

�„ utilização de posições de controle cuja finalidade é perceber a tonicidade;

�„ exercícios de ritmo, de expressão corporal e de criatividade como a dança, a


ginástica rítmica e a improvisação;

�„ expressão dos sujeitos sobre o trabalho e sobre a percepção do corpo.

Do ponto de vista metodológico, um dos principais enfoques da eutonia é


a consciência do espaço corporal, a qual se relaciona à sensopercepção cujos
Propriocepção elementos são a propriocepção e a educação dos sentidos. Na eutonia, a pro-
O sentido da propriocepção priocepção é trabalhada por meio dos contatos, da motricidade, das sensações de
está associado aos receptores
peso e de localização das partes do corpo no espaço. Outros aspectos essenciais
musculares que existem em
nosso corpo e que nos dão a são a respiração e o contato (ALEXANDER, 1983).
sensação de peso, de espaço, de A respiração também é fundamental, pois permite que sejam eliminadas as
postura e de força necessária ao fixações do tônus muscular (oxigenação dos tecidos), mas ela deve ser natural.
uso de nossa musculatura.
O tato permite a experimentação do corpo em vários níveis, formas, temperatura e
pressão. Já o contato permite a consciência do espaço que nos rodeia, a relação
com os objetos, com os seres humanos etc. Na eutonia, valorizam-se as atividades
de contato que permitam o dinamismo corporal do grupo.
A educação dos sentidos relaciona-se diretamente aos exercícios de expressão
e criação que constituem a técnica da eutonia como os encontrados na dança, na
improvisação e na ginástica rítmica, por exemplo, mas que se encontram também
na pintura, na escultura, na música, no teatro e que podem ser trabalhados em
uma aula de eutonia.

54 Aula 3 Consciência Corporal


Como exemplo de aplicação prática, apresentaremos a seguir alguns momen-
tos e o encadeamento de uma sequência pedagógica em uma aula de eutonia.

1) Leitura corporal (a mesma descrita na Aula 2 com a antiginástica).

2) Espreguiçamentos do corpo de forma livre, de modo a relaxar o corpo e


mobilizar delicadamente as articulações. Após deitar no chão, espreguiçar o
corpo todo como mostra a Figura 1.

Figura 1 – Espreguiçamentos.
Fonte: Autoria Própria (2014).

3) Exercício de Proprioceção da Coluna Vertebral. Depois de deitar sobre


os bambus, fazer exercícios de mobilização articular e muscular (Figura 2).
Logo, os bambus devem ser colocados ao longo da coluna, pressionando a
musculatura paravertebral. Fazer sempre em um dos lados do corpo, retirar
os bambus e sentir a diferença entre o lado trabalhado e o outro. Repetir,
estimulando o outro lado do corpo.

Figura 2 – Exercícios de propriocepção utilizando bambus.


Fonte: Autoria Própria (2014).

Aula 3 Consciência Corporal 55


4) Massagear o corpo com os bambus, caminhar sobre os bambus, estimulan-
do a propriocepção e o relaxamento muscular (Figuras 3 e 4).

Figura 3 – Massagem com bambus.


Fonte: Autoria Própria (2014).

Figura 4 – Paminhar sobre os bambus propriocepção e equilíbrio).


Fonte: Autoria Própria (2014).

5) Posições de controle: são posturas de alongamento que se referem às sequências


de movimentos criados por Alexander (1983) e permitem perceber, por meio das
sensações, os pontos de tensão no corpo, buscando relaxá-las com os alonga-
mentos. Por isso, devem ser feitos de maneira lenta, percebendo-se o corpo e seu
estado tônico. Nas Figuras de 5 a 8 você pode perceber algumas dessas posturas.

56 Aula 3 Consciência Corporal


Figura 5 – Posições de controle: de joelhos, fazer a
torção do tronco para um lado e depois para o outro,
com braços estendidos.
Fonte: Autoria Própria (2014).

Figura 6 – Posições de controle: pernas para cima,


somente com o apoio das vértebras torácicas no chão.
Fonte: Autoria Própria (2014).

Figura 7 – Posições de controle: sentados com pernas


flexionadas, fazer a flexão do tronco, braços abertos.
Fonte: Autoria Própria (2014).

Aula 3 Consciência Corporal 57


Figura 8 – Posições de controle: Sentados em quarta
posição, ou seja, com uma perna flexionada a frente e a
outra para trás, fazer a torção do tronco, braços abertos,
palmas das mãos para cima.
Fonte: Autoria Própria (2014).

6) Exercícios de ritmo, expressão e criação artística: baseados na ginástica


rítmica e na dança moderna (Figuras 8 a 10), esses exercícios permitem à
expressão corporal e à criação artística. Nesta aula, usamos o diálogo tônico.
Em duplas, apoiar as mãos sobre os balões e movimentar os braços. Sugere-se
ficar de olhos fechados e seguir o ritmo musical, em geral uma música lenta
(Figura 8 e 9). Depois, estando de pé e deslocando-se pela sala, fizemos o
mesmo exercício ainda com os olhos fechados e seguindo o ritmo lento e/ou
moderado da música (Figura 10). Nesta aula, realizamos ainda a atividade
de criação de esculturas do corpo humano usando argila. Cada um deveria
esculpir um corpo humano de olhos fechados, segundo as sensações vividas
na aula (Figura 11).

Figura 9 – Diálogo tônico em duplas, manipular o


balão ao ritmo da música e olhos fechados.
Fonte: Autoria Própria (2014).

58 Aula 3 Consciência Corporal


Figura 10 – Diálogo tônico em duplas, deslocando-se
pela sala de olhos fechados e dançando com os balões.
Fonte: Autoria Própria (2014).

Figura 11 – Escultura do corpo


humano feita com argila.
Fonte: Autoria Própria (2014).

Essa última atividade de criação da escultura do corpo humano se apresenta


como uma possibilidade de síntese do trabalho realizado na aula. Em seguida,
cada um percorreu a sala, apreciando os trabalhos dos colegas e fizemos um
comentário geral de todo o processo, enfocando a percepção do corpo na eutonia
e as relações com a consciência corporal.
A aula de eutonia deve ser realizada de forma a estimular a concentração
dos alunos, o estado de presença em cada exercício. Assim, o uso da música é
fundamental para criar uma atmosfera de relaxamento, de criação ou de estímulo
ao grupo e às atividades a serem desenvolvidas, bem como a noção de ritmo
interno e externo.
Ao final de cada sessão é importante que o grupo converse sobre o trabalho
realizado e as percepções experimentadas na aula. Como em todo processo de
consciência corporal é necessário dedicação, disponibilidade, abertura para experi-
mentar coisas novas e aguçar a sensibilidade.

Aula 3 Consciência Corporal 59


Em alguns casos, os alunos podem relatar dor ao deitarem sobre os bambus
ou mesmo ao realizarem algumas posições de controle (alongamentos). A dor
pode revelar tensões musculares causadas por estresse, sedentarismo ou por
lesões. É importante que o professor conheça os alunos e seu estado geral para
apresentar as atividades e aproveitarem bem a aula de eutonia. De modo geral,
esses exercícios são suaves e não apresentam contraindicações, em todo caso, o
aluno deve se sentir bem, confortável e seguro ao realizar a prática.

Leituras complementares

CAMPOS, M. (Org.). Eutonia: experiência clínica e pedagógica. São Paulo: Za-


godoni, 2013.
Trata-se de uma coletânea com artigos variados sobre aspectos teóricos e
práticos da eutonia, aplicações clínicas e pedagógicas.

Vídeo sobre Eutonia. Disponível no site https://www.youtube.com/


watch?v=heKUl70BUDg. Acesso em 9 maio 2014.
Trata-se de uma matéria jornalística que mostra princípios metodológicos
e benefícios da Eutonia.

Atividade 2

Em grupos, faça uma pesquisa em sua cidade ou região ou na


internet a respeito da eutonia. Procure locais e profissionais (psicó-
logos, fisioterapeutas, professores de educação física, pedagogos,
bailarinos, atletas etc) que conheçam essa técnica e faça uma
entrevista. Indague sobre os aspectos teóricos, a percepção do corpo,
aspectos metodológicos da técnica e os benefícios da prática.
Preparem um relatório contendo o estudo da realidade e apresente
seu trabalho ao tutor. Seu trabalho pode incluir fotos e vídeos.

60 Aula 3 Consciência Corporal


Resumo

Nesta aula, abordamos aspectos teóricos e metodológicos da


Eutonia criada pela alemã Gerda Alexander. Assim, vimos que a
técnica busca a regularização do nosso tônus muscular, a percepção
profunda dos nossos espaços corporais, do nosso ritmo interno e
externo. Explora ainda o contato com o outro e com as emoções.

Autoavaliação
Desenhe um esqueleto humano. Esse desenho vai contribuir para o estudo
da eutonia e a percepção das consciências interna do corpo e de sua estrutura
óssea. Poste seu desenho na plataforma Moodle.

Referências
ALEXANDER, Gerda. Eutonia: um caminho para a percepção corporal. São
Paulo: Martins Fontes, 1983.

BRIEGHEL-MULLER, G. Eutonia e relaxamento. São Paulo: Summus, 1998.

DASCAL, M. Eutonia: o saber do corpo. São Paulo: Senac, 2008.

HUBERTY, J-M. A Eutonia de Gerda Alexander: das fontes europeias à sua


divulgação na América Latina. In: CAMPOS, M. (Org.). Eutonia: experiência
clínica e pedagógica. São Paulo: Zagodoni, 2013. p. 21-45.

KELEMAN, S. Anatomia emocional. São Paulo: Summus, 1992.

LOWEN, A. Bioenergética. São Paulo: Summus, 1982.

Aula 3 Consciência Corporal 61


Anotações

62 Aula 3 Consciência Corporal


A percepção do movimento
nos exercícios de Feldenkrais

Aula

4
Apresentação

O
lá! Você está acompanhando bem nossas aulas de consciência corporal?
Tem percebido mudanças em sua postura, respiração, em seus movimentos?
Como você se sente em relação ao seu corpo? Nesta aula, iremos apre-
sentar aspectos teóricos e práticos do método Feldenkrais.
Assim, o método tem como ponto central a melhora da autoimagem por
meio da realização de exercícios sutis que coordenam movimento e respiração,
devendo ser feitos lentamente. Desse modo, apresentamos a compreensão de
consciência pelo movimento que identifica os princípios teóricos e metodoló-
gicos da técnica de Feldenkrais, bem como descrevemos uma aula com alguns
exercícios que permitirão o reconhecimento de lições básicas.
O método Feldenkrais integra hoje o campo da educação somática e vem se
tornando cada vez mais utilizado em aulas de dança, educação física em clínicas
de psicoterapia corporal e fisioterapia.

Objetivos

Identificar os princípios teóricos e metodológicos


1 da técnica de Feldenkrais.

2 Reconhecer os exercícios da técnica de Feldenkrais.

65
Consciência pelo movimento
“Consciência pelo movimento” é nome do principal livro de Mosche Feldenkrais
(1904-1984), no qual ele apresenta os fundamentos teóricos e as lições da técnica
que ele criou e que leva seu nome – Feldenkrais. De acordo com informações
da Associação Feldenkrais do Brasil, podemos dizer que se trata de um método
altamente engenhoso para aprender mais sobre si mesmo. Esse utiliza as
percepções que o movimento do corpo no espaço traz à consciência para tornar
mais eficientes e econômicos os movimentos que integram o dia a dia como
andar, descansar, levantar, alcançar. Segundo o site da Associação Feldenkrais
do Brasil ([2014], [documento online, não paginado]): “as descobertas feitas
a partir dessas ações revelam habilidades que estavam escondidas por trás de
esforços mal direcionados. Uma vez descobertas essas habilidades podem ser
desenvolvidas e integradas no dia a dia”.
Portanto, o principal aspecto do método Feldenkrais é a autoimagem. Para
Feldenkrais (1977), a autoimagem consiste de quatro componentes que estão
envolvidos em toda a ação: movimento, sensação, sentimento e pensamento. A
autoimagem é dinâmica, muda de ação para ação, sendo formada ao longo da vida.
Podemos ampliar a fundamentação teórica da noção de autoimagem por meio
dos estudos de Schilder (1999) a respeito da imagem do corpo. O autor apresenta as
bases fisiológicas, psíquicas e sociais da imagem corporal. Nesse contexto, tem-se
que cada nova postura ou movimento é registrado no esquema plástico de nossa
atividade cortical. “Qualquer coisa que participe do movimento consciente de
nossos corpos é acrescentada ao modelo de nós mesmos” (SCHILDER, 1999, p. 9).
Logo, o nosso movimento é composto por sensações, memórias que confi-
guram a imagem corporal. Essa imagem desempenha um papel fundamental
no conhecimento do nosso corpo e de seu movimento. A superfície externa do
corpo, a pele, os orifícios, os músculos colaboram com essa imagem do corpo.
Schilder (1999) apresenta também importantes reflexões sobre a estrutura
libidinal da imagem corporal. Com base nos estudos do psicanalista alemão
Sigmund Freud, a libido pertence ao nosso corpo, estando relacionada ao princípio
do prazer. Ao se observar uma criança, por exemplo, podemos perceber como
ela brinca com seu corpo, olhando as mãos, agarrando objetos, mordendo os
dedos. Essas ações são importantes na construção da imagem corporal da criança
e futuramente em sua autoimagem psíquica. O autor completa seu estudo sobre
a imagem corporal ressaltando os aspectos sociais que a envolvem. Para ele, a
imagem corporal ultrapassa os limites do corpo. Uma bengala, um chapéu, as
roupas tornam-se parte da imagem corporal.
Compreendemos que a pesquisa de Schilder (1999) complementa e amplia
a discussão da autoimagem encontrada no método Feldenkrais, abrindo outras
possibilidades de abordagem dessa técnica.
Segundo Feldenkrais (1977), a habilidade em realizar movimentos é um fator
que contribui para a valorização da autoimagem e a educação dos indivíduos.
Na perspectiva desse autor, o movimento é a base da consciência.

Aula 4 Consciência corporal 67


A maior parte do que vai dentro de nós, permanece embotado ou escondido
de nós, até que atinge os músculos. Sabemos o que está acontecendo dentro
de nós, logo que os músculos da face, coração ou aparelho respiratório se
organizam em padrões, conhecidos por nós como medo, ansiedade, riso ou
qualquer outro sentimento (FELDENKRAIS, 1977, p. 56).

A consciência pelo movimento contribui para a nossa expressão e nossas


ações, coordenando ação e intenção, essa é a compreensão chave no método
Feldenkrais. Aqui também podemos ampliar a compreensão do movimento com
a abordagem fenomenológica da motricidade. Para Merleau-Ponty (1994), a
motricidade refere-se à intencionalidade do movimento, mobilizando sensações,
sentimentos relacionados à experiência do corpo no mundo. Desse modo, faz-se
necessário despertar as sensações do movimento e organizá-las de modo a
configurar nossa imagem corporal.
Perceber as sensações provenientes dos movimentos traz um gradual avanço
em nossa capacidade de movimentação, dando maior precisão, graça, economia
de esforço e fluência. Esse aspecto contribui para a melhora de nossa postura,
de nossa respiração, um uso adequado de nossa força muscular e maiores
possibilidades articulares. Além do mais, a fluência do movimento contribui
para nossas expressões emocionais e sociais.
A partir de sua experiência como atleta de judô e seu conhecimento em
neurociência, Feldenkrais (1977) elabora uma série de lições práticas em que
cada movimento é singular e deve ser repetido várias vezes, de forma lenta e
gradual. Assim, os exercícios têm como principais objetivos a melhora da
percepção, da mobilidade do corpo e da autoimagem.

Saiba Mais

Informativo Nº 1 / 2001
Associação Feldenkrais do Brasil

O método Feldenkrais é um sistema de


educação somática. Seu criador foi o israelense
Moshe Feldenkrais (1904-1984). Muitos brasileiros
que nos anos 70 se interessavam pelo estudo e
pela prática de sequências de movimento para
favorecer o desenvolvimento humano tiveram
contato com o trabalho que Moshe Feldenkrais vinha realizando em
Israel, nos Estados Unidos e na Europa.

68 Aula 4 Consciência corporal


O método Feldenkrais tornou-se mais conhecido com a edição do
livro Consciência pelo Movimento, publicado pela Summus Editorial
em 1977. A partir de meados dos anos 80, alguns brasileiros passaram
a integrar os grupos de formação no método Feldenkrais no Canadá e
nos Estados Unidos.
Esse pequeno grupo vem, desde então, estudando e aperfeiçoando
seu conhecimento nesse método por meio de cursos e seminários
fora do Brasil. Esses profissionais, além de abraçarem esse método
como principal instrumento de trabalho, introduzem seus princípios
em universidades, centros de estudo e de difusão do conhecimento
nos quais são ou foram professores: Departamento de Artes Corporais
da UNICAMP, Faculdade de Psicologia da PUC-SP, Instituto Sedes
Sapientiae-SP, Laboratório de Estudos da Personalidade da Faculdade
de Psicologia da USP, SESC e Associação Moy Yat Ving Tsun.
Esses profissionais, reunidos na Associação Feldenkrais do Brasil, têm
por objetivo difundir esse sistema de conhecimento e de desenvolvi-
mento humano por meio de vivências e cursos. Nossa meta é, no
futuro próximo, realizar um curso de Formação no Método Feldenkrais.
Logo, a formação no método Feldenkrais é intensa. Ela está dirigida
a pessoas de diferentes áreas de interesse. É uma experiência e um
conhecimento importante para aqueles que querem continuar a explorar
novas formas de abordar o desenvolvimento humano, utilizando a cons-
ciência e as sensações de movimento como instrumento de observação
e aprendizagem. O trabalho com o método Feldenkrais favorece os pro-
cessos de aprendizagem orgânica, contribuindo para o aperfeiçoamento
de capacidades tanto físicas quanto psicológicas. Em síntese, aprende-se
a aprender por intermédio do movimento.
Assim, para os profissionais que se interessam pelo trabalho com o
corpo e o movimento, a filosofia, a metodologia e as quase mil sequências
de movimento criadas por Moshe Feldenkrais podem trazer contribuições
altamente significativas. Dessa forma, o método Feldenkrais pode
auxiliar na criação de soluções no campo da saúde, facilitando os
processos de recuperação física e emocional.
No campo da arte, o método Feldenkrais pode dar grande contribuição
na formação de músicos, de atores e de dançarinos. Nessas profissões,
um conhecimento sensível e consciente da organização dos movimentos
no espaço pode ser um dos caminhos para a boa performance.
Na educação física, nos esportes e nas práticas corporais o Método
Feldenkrais pode favorecer o refinamento das ações físicas. Com
certeza, uma formação no método Feldenkrais contribui para a des-
coberta de novas formas de fomentar o desenvolvimento humano,
seja seguindo exclusivamente seus princípios e práticas ou integrando-os
a outras metodologias.

Aula 4 Consciência corporal 69


No sentido de tornar o método mais familiar aos brasileiros, a
Associação Feldenkrais do Brasil está iniciando uma série de cursos
e palestras com especialistas brasileiros e estrangeiros ligados à Fede-
ração Internacional. Há 40 anos, o método Feldenkrais é difundido na
Europa, Estados Unidos, Austrália e Japão. Nosso intuito é dar início
a uma comunidade brasileira interessada no conhecimento, formação
e desenvolvimento das múltiplas possibilidades de prática, estudo e
criação deixados por Moshe Feldenkrais.
Fonte: Adaptado de <http://www.feldenkrais.org.br/textos/index.html>. Acesso em: 9 maio 2014.

O método Feldenkrais integra o campo da educação somática, como podemos


observar com a citação a seguir:

A Educação Somática objetiva a manutenção e recuperação da saúde,


através da aplicação de técnicas precisas cujo eixo central é o movimento
do corpo. Cada método de Educação Somática tem suas técnicas pedagógicas
próprias. Porém, o conjunto dos métodos de Educação Somática baseia suas
intervenções pedagógicas em valores que se contrapõem a uma visão
puramente mecânica do corpo. Os métodos de Educação Somática partilham
o princípio de que o corpo é um organismo vivo indivisível e indissociável da
consciência. Para os professores de Educação Somática, o corpo carrega em
si o meio onde vive, bem como emoções, pensamentos, valores socioculturais,
políticos e espirituais. Dentro dessa ótica, o corpo não é uma matéria inerte habi-
tada por uma consciência: o corpo é ele mesmo um dos estados de consciência
do ser humano (MOVIMENTO, 2010, [documento online, não paginado]).

De acordo com Keleman (1994), a realidade somática reconhece a plasticidade


do corpo, sua capacidade de se mover e de se modificar. Assim, quando nos perce-
bemos como seres humanos aspectos físicos, orgânicos, sentimentos, pensamentos,
desejos se conectam. Por vezes em nossa vida acumulamos tensões que prejudicam
esse fluxo somático, por isso a necessidade das experiências de movimento que
possam desbloquear a energia do corpo e ampliar nossa experiência.
Com essas referências você pode ter uma visão introdutória do método de
Feldenkrais, sua relação com a consciência do movimento e de autoimagem.
Na segunda parte de nossa aula você poderá conhecer alguns desses exercícios.
Antes, sugerimos uma consulta aos documentos da Associação Feldenkrais no
Brasil e ainda um vídeo sobre educação somática, a partir deles você poderá
ampliar seus conhecimentos sobre esse assunto.

70 Aula 4 Consciência corporal


Leituras complementares

ASSOCIAÇÃO FELDENKRAIS NO BRASIL. Disponível em: <http://www.fel-


denkrais.org.br/>. Acesso em: 9 maio 2014.
No endereço eletrônico você encontra informações sobre a técnica Fel-
denkrais e uma sugestão bibliográfica que irão ajudar na compreensão teórica e
prática da consciência pelo movimento.

V í d e o d e e d u c a ç ã o s o m á t i c a . < h t t p s : / / w w w. y o u t u b e. c o m /
watch?v=EOuVB_7BSW8>. Acesso em 9 maio 2014.
Trata-se de um vídeo elaborado por Debora Bolsanelo, uma das divulgadoras
da educação somática no Brasil, sobre a educação somática, seu método e seus
benefícios. Aborda um circuito de movimentos com vistas à consciência corporal.

Atividade 1

Com base no que discutimos até agora, responda as questões:

1 Qual a compreensão do corpo na técnica Feldenkrais?

Quais os principais aspectos da fundamentação teórica


2 da técnica Feldenkrais? Compartilhe suas respostas na
Plataforma virtual.

Algumas lições de Feldenkrais


Caro(a) aluno(a), nessa parte da aula vamos apresentar aspectos metodoló-
gicos e alguns exercícios de Feldekrais (1977). Esse autor chama os exercícios
de sua técnica de lições. Essas foram criadas para expandir os limites do movi-
mento, ampliando a capacidade articular e para que se sinta o que está sendo
realizado. Segundo o autor “os movimentos foram feitos para que se possa
reduzir os esforços no movimento” (FELDENKRAIS, 1977, p. 83). Desse modo,
pode-se conquistar um equilíbrio e graciosidade nos gestos, eliminando-se os
esforços supérfluos.
Para cada ação, a respiração deve acompanhar o ritmo respiratório, de modo
tranquilo e relaxado. Os exercícios devem ser feitos delicadamente, em um ritmo
lento que permita a concentração e a percepção do fluxo do movimento. Na

Aula 4 Consciência corporal 71


apresentação da edição brasileira do livro de Feldenkrais, o psicólogo José
Angelo Gaiarsa diz que esses exercícios assemelham-se a ioga. É preciso agir
com sensibilidade, pois sentir é o que conduz o fluxo nessa técnica.
Cada gesto deve buscar a percepção do corpo e a fluência, sem quebras
bruscas. É importante coordenar o movimento e a respiração, de modo lento e
gradual. O conforto e a tranquilidade são requisitos básicos, mesmo quando o
ritmo do exercício é mais lento ou exige um pouco mais de força muscular. Agora
que você já tem essas orientações das lições de Feldenkrais, vamos apresentar
o exemplo de uma aula prática.

1) Como em outras técnicas podemos começar com a leitura corporal, obser-


vando o estado geral do corpo e o contato com o chão, buscando a tranqui-
lidade, a concentração e o relaxamento. Logo, é importante conectar-se com
a respiração, reparando o seu fluxo na parte do tórax e na região abdominal.
Podemos apoiar as mãos no tórax e no abdome para perceber esse fluxo
respiratório (Figura 1).

Figura 1 – Respiração.
Fonte: Autoria Própria (2014).

2) Em seguida, vamos fazer um exercício de respiração, combinado com a ele-


vação do quadril (ponte). Inspira-se e eleva-se o quadril, espira-se e volta à
posição inicial, mobilizando a coluna, vértebra por vertebra (Figura 2). Nesse
exercício, podemos também associar movimentos do quadril. Imagine um
relógio cujos pontos correspondem às 12h, 3h, 6h e 9h. No sentindo horário e
anti-horário, devemos movimentar o quadril, seguindo os ponteiros do relógio.

72 Aula 4 Consciência corporal


Figura 2 – O relógio Imaginário.
Fonte: Autoria Própria (2014).

3) Após a mobilização da coluna vertebral, podemos experimentar movimentos


de balanço do corpo, virando-se delicadamente de um lado para outro, perce-
bendo a coluna, os braços e as pernas dobradas. Esse movimento de balanço
do tronco pode ser feito ajoelhado e de pé (Figura 3). Esses movimentos
mobilizam a coluna e a respiração de modo coordenado.

Figura 3 – Movimentos de balanço de joelhos.


Fonte: Autoria Própria (2014).

4) O movimento dos olhos organiza o corpo. De pé, realize torções do corpo,


acompanhando o movimento com o olhar (Figura 3). É importante perceber
as conexões do corpo e o fluxo do movimento. Esse exercício ajuda no
equilíbrio também.

Aula 4 Consciência corporal 73


Figura 4 – Torções do tronco.
Fonte: Autoria Própria (2014).

5) Balançando de pé: deixe seu corpo balançar para frente, para trás, para os
lados. Preste atenção nos pontos de apoio para que você possa se manter de
pé. Lentamente, desenhe círculos com o corpo (Figura 5).

Figura 5 – Balançando de pé.


Fonte: Autoria Própria (2014).

6) Agache como se fosse pegar um objeto, mobilizando a musculatura posterior


e mantendo a coluna organizada ao deslocar o peso do corpo (Figura 6).
Repete-se de 5 a 6 vezes cada movimento, lentamente.

74 Aula 4 Consciência corporal


Figura 6 – Agachar para pegar um objeto.
Fonte: Autoria Própria (2014).

7) Nestes exercícios de alongamento, usamos uma faixa elástica para ampliar o


movimento. Deve-se repetir algumas vezes. Podemos fazer o mesmo exercício
sentado, com uma das pernas flexionadas (Figura 7).

Figura 7 – Alongamentos da musculatura posterior.


Fonte: Autoria Própria (2014).

Nas Figuras 8 a 9, você pode visualizar um exercício de massagem com os


bambus manipulados na região cervical, em seguida, a massagem, sem o bambu,
passa a ser feita nas pernas e tronco do colega também usados no método
Feldenkrais, com objetivos de alongamento e relaxamento.

Aula 4 Consciência corporal 75


Figura 8 – Massagem.
Fonte: Autoria Própria (2014).

Figura 9 – Manipulação das articulações.


Fonte: Autoria Própria (2014).

Figura 10 – Tração da região cervical.


Fonte: Autoria Própria (2014).

76 Aula 4 Consciência corporal


Esses são alguns exemplos de exercícios que compõem a técnica de consciência
pelo movimento de Feldenkrais e que pode ser experimentada em aulas
de Educação Física com crianças, jovens, adultos, idosos com objetivos de
alongamento, relaxamento e consciência corporal. Muitas vezes sentimos muita
tensão e dor na região lombar, em razão da nossa postura bípede, por isso a
importância das massagens e da tração da região cervical como mostramos nos
exercícios anteriores.
De acordo com Claro (1995) e também com base em nossa experiência
profissional, percebemos que essa técnica contribui significativamente para a mo-
bilização da coluna vertebral e o alongamento. Sendo assim, ela aporta o bem-estar,
o conforto e a leveza ao nosso corpo e ao nosso movimento, bem como uma
percepção mais aprofundada de nossa postura e ações corporais.

Leituras complementares

FELDENKRAIS, M. Consciência pelo movimento. São Paulo: Summus, 1977.


O livro aborda o método Feldenkrais, dividindo-o em duas partes. Na pri-
meira parte, intitulada “entendendo enquanto se faz”, está a fundamentação
teórica e a noção de autoimagem. Na segunda parte do livro, intitulada “fazer
para compreender”, encontram-se a descrição de doze lições elaboradas pelo
autor com o objetivo de ampliar a consciência pelo movimento.

BOLSANELLO, D. P. A educação somática e os conceitos de descondicionamento


gestual, autenticidade somática e tecnologia interna. Revista Motrivivência,
Ano XXIII, n. 36, p. 306-322, jun. 2011. Disponível em: <https://periodicos.ufsc.
br/index.php/motrivivencia/article/view/2175-8042.2011v23n36p306/19656>.
Acesso em: 22 jul. 2014.
O artigo apresenta elementos da educação somática, situando as técnicas
corporais que a integram, incluindo o método Feldenkrais. A leitura do artigo
sugerido pode contribuir para a ampliação do seu conhecimento.

Aula 4 Consciência corporal 77


Atividade 2

Em grupos, faça uma pesquisa em sua cidade ou região ou na


internet a respeito do método Feldenkrais. Procure locais e profissionais
(psicólogos, fisioterapeutas, professores de educação física, pedagogos,
bailarinos, atletas) que conheçam essa técnica e faça uma entrevista.
Indague sobre os aspectos teóricos, a percepção do corpo, aspectos
metodológicos da técnica e os benefícios da prática. Por fim, preparem
um relatório contendo o estudo da realidade e apresente seu trabalho
ao tutor. Pode incluir fotos e vídeos.

Resumo

Nesta aula, apresentamos uma introdução ao método Feldenkrais,


com destaque para as noções de consciência corporal por meio do
movimento e da autoimagem. Apresentamos aspectos metodológicos
da técnica e um exemplo de aula.

Autoavaliação
Como você percebe seu corpo com os exercícios de Feldenkrais? Participe
de um fórum virtual, organizado pelo tutor da disciplina, descrevendo sua
experiência prática com esses exercícios sugeridos em nossa aula.

78 Aula 4 Consciência corporal


Referências
ASSOCIAÇÃO FELDENKRAIS DO BRASIL. O que é o Método Feldenkrais® de
Educação Somática? [2014]. Disponível em: <http://www.feldenkrais.org.br/
metodo/index.html>. Acesso em: 22 jul. 2014.

CLARO, E. Método dança-educação física: uma reflexão sobre consciência


corporal e profissional. São Paulo: Robe, 1995.

FELDENKRAIS, M. Consciência pelo movimento. São Paulo: Summus, 1977.

KELEMAN, S. Realidade somática. São Paulo: Summus, 1994.

MERLEAU-PONTY, M. Fenomenologia da percepção. São Paulo: Martins


Fontes, 1994.

MOVIMENTO. Educação somática. 2010. Disponível em: <http://


poeticasdocorpo.wordpress.com/2010/08/09/educacao-somatica/>. Acesso
em: 22 jul. 2014.

SCHILDER, P. A imagem do corpo: as energias construtivas da psique. São


Paulo: Martins Fontes, 1999.

Anotações

Aula 4 Consciência corporal 79


Anotações

80 Aula 4 Consciência corporal


O toque e o contato humano

Aula

5
Apresentação

O
lá! Seguramente, você já deve ter ouvido ou pronunciado expressões
como “dar um toque”, “toque pessoal”, “toque delicado” ou, ainda, ter
se referido às pessoas dizendo que elas têm “um toque mágico” ou que
são “casca grossa”. Essas expressões e referências têm em sua base o sistema
tátil e a pele como órgão de contato e experiência. Nossa intenção é apresentar
mais uma possibilidade de expressão e comunicação do corpo, cuja sintonia
encontra-se em movimentos simples feitos através de nossas mãos e pele, dos
contatos corporais e da experiência sensível. Você irá perceber como a experiência
tátil e os contatos corporais são fundamentais para o desenvolvimento humano.
Na segunda parte da aula, iremos trabalhar com a massagem como uma
prática corporal capaz de promover o contato, a linguagem tátil, o relaxamento
e a consciência do corpo. Há milhares de anos, a massagem é utilizada por
diferentes povos para trazer alívio, conforto, aliviar dores, entre outros aspectos
ligados à saúde, ao bem-estar, ao afeto e à consciência do corpo.
Então, preparado(a)? Mãos à obra!

Objetivos

Analisar teorias de comportamento e desenvol-


1 vimento humano e relacioná-las aos estudos do
corpo e do movimento humano.

Identificar os princípios teóricos e metodológicos


2 de técnicas de massagem.

83
Uma questão de pele
Caro(a) aluno(a), começamos nossa aula tratando da pele como órgão da
experiência afetiva, bem como relacionando a experiência tátil com as noções
de comportamento, aprendizagem e desenvolvimento humano. Para tanto, nos
aproximamos da Etologia, ciência criada nos anos 1970 e que tem como enfoque
central o estudo do comportamento animal, de suas funções fisiológicas, psíquicas,
sociais e afetivas, incluindo os seres humanos.
Nesse contexto, destacamos para nossa aula sobre o toque e o contato humano
os estudos de Montagu (1988) e de Cyrulnik (1999). Os dois pesquisadores
estudam a pele e suas implicações profundas para o desenvolvimento humano,
destacando aspectos fisiológicos do tocar, as relações entre pele e sexo, tato e
idade, cultura e contato.
O corpo todo é coberto de pele e na evolução dos sentidos o tato foi o primeiro
a surgir, dando origem aos nossos olhos, ouvidos, nariz e boca. Esses últimos,
sede dos demais sentidos: visão, audição, olfato e paladar, respectivamente. O
tato é, portanto, a matriz de todos os sentidos. De acordo com Montagu (1988),
tanto a pele quanto o sistema nervoso originam-se da mais externa das três
camadas de células embrionárias, a ectoderme. Essa, por sua vez, irá se diferenciar
em cabelo, dentes e nos órgãos dos sentidos já mencionados.
A pele é compreendida como o mais extenso órgão do nosso corpo, permitindo
que o organismo aprenda o que é o seu ambiente interno e externo, renovando-se
constantemente, como é possível observar na citação que segue:

Durante toda a vida, este prodigioso tecido, a pele, encontra-se num estado
de contínua renovação através da atividade das células de suas camadas
profundas. A cada quatro horas, aproximadamente, a pele forma duas novas
camadas de células. As células da pele e das vísceras podem aparentemente
dividirem-se centenas e milhares de vezes durante a vida de uma pessoa
(MONTAGU, 1988, p. 23).

Montagu (1988) destaca ainda a projeção em nossa pele, sobretudo no rosto


e nas mãos, como se fora uma tela, da gama variada de experiências de vida,
emoções, pesares e juventude. O crescimento e desenvolvimento da pele prosse-
guem vida a fora, assim o desenvolvimento de nossa sensibilidade depende do
tipo de estimulação recebida. Resulta desse aspecto, a necessidade do tocar e do
contato para as aprendizagens sobre crescimento e experiências.
A parte da pele que se encontra mais diretamente exposta ao meio ambiente é
a epiderme, caracterizada por ser a camada mais superficial daquela e por abrigar
o sistema tátil. As terminações nervosas livres que aí se encontram, tais como os
corpúsculos de Meissner, são responsáveis pelo tato. Montagu (1988) nos apresenta
várias funções da pele: base dos receptores sensoriais; fonte organizadora de infor-
mações; mediadora de sensações; barreira entre o organismo e o meio externo; fonte
imunológica; regulação da pressão e da circulação sanguínea; órgão reparador e
regenerativo; reguladora de temperatura; metabolismo de gordura; sintetizadora de

Aula 5 Consciência Corporal 85


compostos importantes, como a vitamina D, entre outras funções. Além dessas fun-
ções físicas e biológicas, a pele influencia o comportamento por meio da variedade de
toques, da relação com a nossa sensibilidade, da nossa aprendizagem afetiva e social.
Montagu (1988) apresenta vários estudos etológicos que enfatizam a dimensão
tátil para o crescimento e desenvolvimento em várias espécies animais. Um desses
estudos de caso, que evidencia a necessidade de contato, é bastante conhecido.
O autor baseia-se nas pesquisas feitas pelo psicólogo norte-americano Harry
Harlow (1905-1981) ao estudar o comportamento de macacos e a importância
do contato entre a mãe macaca e seu filhote no que diz respeito ao vínculo. O
experimento ficou conhecido no campo científico como a “experiência da mãe
substituta”, veja a sua descrição:

Em nosso experimento inicial, havia duas mães: uma mãe de pano e a outra
de arame. Elas foram colocadas em cubículos diferentes ligados à gaiola em
que estavam os bebês. Para quatro macacos recém-nascidos, a mãe de pano
dava leite e a de arame não. Para os outros quatros, a condição de lactação
foi invertida. Nos dois casos, os macaquinhos recebiam toda a ração de leite
através da mãe substituta [...]. Durante os primeiros quatorzes dias de vida,
a gaiola dos macacos foi revestida com um dispositivo para aquecimento
envolvido em uma fralda no chão da gaiola. Os bebês sempre tiveram liber-
dade para sair de perto do dispositivo e entrarem em contato com uma das
duas mães [...]. Os dados tornam óbvio que o contato reconfortante é uma
variável de importância crucial no desenvolvimento das respostas afetivas
[...]. Com o avanço da idade e diante da oportunidade de aprendizagem, os
que eram alimentados pela mãe de arame mostraram uma responsividade
cada vez menor em relação a ela e uma responsividade maior para a mãe
que não aleitava - a de pano (HARLOW apud MONTAGU, 1988, p. 53).

Nesse experimento, nota-se que a experiência do contato reconfortante com


a mãe de pano, quente e macia, é crucial para a vida afetiva. Os bebês preferiam
o carinho da mãe de arame ao alimento. No caso da mãe humana, esse vínculo
é muito mais emblemático conforme mostram os estudos de Montagu (1988) e
Cyrulnik (1999).
Esse último, por sua vez, mostra como o ser humano impregna os alimentos
de afetividade, de símbolos, de civilização e de relatos variados. Quando os
organismos se tornam mais complexos, como ocorre na espécie humana, os
lugares do corpo especializam-se e se concentram, principalmente, em torno do
rosto. O etólogo russo também cita os estudos de Harlow com a observação de
macacos e seu comportamento.

86 Aula 5 Consciência Corporal


Foi fácil observar que os pequenos macacos se orientavam, regulamente,
para a simulação em feltro que não dava de comer e se contentavam em
saltar sobre a simulação em arame para se alimentarem. Em caso de stress,
nunca se tranquilizavam contra a simulação em arame nutritiva, mas, pelo
contrário, contra a simulação em feltro (CYRULNIK, 1999, p. 36).

Esse famoso experimento exemplifica os fortes laços entre a pele, o contato,


o afeto e o amor entre os seres vivos. De acordo com Cyrulnik (1999) esse
experimento foi estendido para outras dezenas de observações e interpretações
psicanalíticas sobre o afeto e comportamento humano, destacando-se a noção
de vínculo entre o bebê e a figura materna afetiva e protetora.
A questão do aprendizado da linguagem também é influenciada pelo cuidado
terno e amoroso. O contato das mãos, o olhar e a voz são imprescindíveis para
o comportamento humano e sua experiência. Os movimentos exploratórios de
uma criança serão a base de seu movimento, de sua aprendizagem de leitura e de
compreensão do mundo, além do aprendizado social. De acordo com Montagu
(1988), a modalidade de aprendizagem é efetuada através dos órgãos dos sentidos
e do contato corporal entre os seres humanos em todas as idades.
Os estudos sobre a percepção, realizados por Merleau-Ponty (1994), também
corroboram com essa perspectiva da aprendizagem que corre por meio do corpo e
de sua sensibilidade. Aprender a ver, a tocar, a ouvir é também uma aprendizagem
do mundo social e cultural que nos rodeia.
Nessa mesma direção, Lidell e Thomas (2000) afirmam que toque significa conta-
to, a relação com o que está além do nosso exterior. Para muitos animais, em especial,
para os humanos, o toque é de importância vital. De todos os sentidos, o toque é o
primeiro a se desenvolver e por meio do qual começamos a conhecer o mundo. O
tato é também um sentido de proximidade, de intimidade e de trocas afetivas.
De acordo com Andrieu (2008), a expressão corporal do tocar apresenta-se
como um modo de liberação e de descoberta de si. Ela instala-se no sentimento
do corpo, na consciência de si e dos outros. O autor chama a atenção para o fato
de que no contato social há uma série de regras, hábitos, assim como valores
construídos em cada cultura quanto ao tocar e ser tocado. Por isso, distância e
proximidade são reguladas por regras sociais e culturais que por vezes limitam
o espaço pessoal e o espaço social, exigindo respeito moral, hierarquia e outros
critérios instituídos socialmente.
As referências aqui citadas nos dão uma dimensão do significado da pele, do
tocar e do contato para a vida humana e para a experiência vivida. Experiência
que se intensifica nas relações corporais e no sentido afetivo de partilhar os espaços
sociais e habitar um mundo. A partir dessa fundamentação teórica, propomos
uma experiência corporal, tendo a massagem como prática corporal que permite
ampliar a linguagem tátil e a aprendizagem afetiva, aspectos importantes para
a consciência corporal.

Aula 5 Consciência Corporal 87


Saiba Mais

No endereço eletrônico a seguir, você pode observar a experiência


das mães substitutas: <http://psicologiaexperimental.blogs.sapo.
pt/1627.html>. Acesso em: 12 maio 2014.

Leitura complementar

MONTAGU, A. Tocar: o significado humano da pele. São Paulo: Summus, 1988.


O livro apresenta diversos experimentos científicos que corroboram a tese
do autor da importância vital da pele, do tocar e do contato para o desenvolvi-
mento, crescimento e aprendizagem em várias espécies, em particular no caso
do ser humano.

Atividade 1

Realize um seminário em grupo do livro “Tocar: o significado


humano da pele”, de Ashley Montagu. O seminário será apresentado
no polo. Sugere-se a organização da turma em grupos, sendo que cada
grupo se encarregará da apresentação de um ou dois capítulos. Além
do resumo do capítulo, cada grupo deve apresentar a relação do tema
com a consciência corporal e uma atividade vivencial para ilustrar a
temática (filme, vivência).

88 Aula 5 Consciência Corporal


A massagem como linguagem tátil
Montagu (1988) nos mostra a importância do toque e do contato para a expe-
riência humana e para as relações afetivas e sociais. Nesse sentido, a massagem
pode ser uma prática significativa para a linguagem tátil e para a educação do
corpo em várias áreas profissionais. “O homem elefante”, filme da década de
1980, cujo argumento foi desenvolvido com base nas pesquisas de Montagu
(1988), mostra a importância do contato para o desenvolvimento humano em
suas múltiplas dimensões.

Saiba Mais

O filme “O homem elefante” (David Lynch, EUA, 1980), baseado


em estudos feitos pelo etólogo Asheley Montagu, conta a história real
de Joseph Merrick, um caso grave de neurofibromatose múltipla, uma
doença dermatológica que causa deformações na pele. O filme mostra
a importância do contato para o desenvolvimento psíquico, afetivo e
social do ser humano.
Está disponível no endereço eletrônico: <http://megafilmeshd.
net/o-homem-elefante/>. Acesso em: 12 maio 2014.

Nas práticas educativas, destaca-se a experiência da relação com o seu cor-


po e com o corpo do outro como uma possibilidade de autoconhecimento, de
socialização e de subjetivação. De acordo com Marzano (2007), a massagem é
um complemento do gesto espontâneo da carícia, como também uma prática
imemorial, inseparável da história geral do tocar e das relações humanas. Nas
fronteiras do esporte, da medicina e mesmo do erotismo, a massagem inscreve-se
em diversas culturas como uma prática sistematizada.
De acordo com Lidell e Thomas (2000), há várias técnicas de massagem,
como a reflexologia (massagem na planta dos pés) – ver aula de antiginástica,
Aula 2 de nossa disciplina. E ainda, o shiatsu (massagem oriental), a shantala
(massagem indiana para bebês), entre outras. O shiatsu é um sistema japonês
de tratamento corporal, aplicado com os dedos das mãos, os polegares, os coto-
velos, os joelhos ou os pés. O shiatsu envolve os pontos de pressão para atingir
os meridianos, que são pontos de energia vital na cultura oriental.

Aula 5 Consciência Corporal 89


Saiba Mais

Vídeo com a técnica de Shiatsu. No vídeo, você pode observar as


manipulações e os pontos estimulados. Disponível no endereço eletrô-
nico: <https://www.youtube.com/watch?v=aQ6BjXaVVQk>. Acesso
em: 12 maio 2014.

A Shantala (Figura 1) é uma arte tradicional indiana de massagem para bebês.


De acordo com Leboyer (1995), a técnica é feita com a criança deitada no colo da
mãe, sendo completada pelo banho. Massageia-se o peito delicadamente, o ventre,
afastando as mãos (uma dirige-se para cima e a outra para baixo), faz-se movimen-
tos sutis nos membros (braços e pernas), por fim a criança é colocada em decúbito
ventral para massagear as costas. Massageia-se, ainda, o rosto e os cabelos.

Figura 1 – Shantala.
Fonte: Leboyer (1995). Adaptado por Amanda Duarte/SEDIS-UFRN.

A massagem, seja qual for a técnica aplicada, contribui para a estimulação


tátil, para o relaxamento e para a nossa experiência afetiva. De acordo com
Lidell e Thomas (2000), a massagem pode ser um meio para compensarmos o
volume implacável das pressões da vida profissional e doméstica. Para muitos
de nós, a rigidez e a dor são um modo de vida ao qual nos habituamos. Com a
prática da massagem percebemos nossas tensões, possibilitando com que essa
experiência possa ajudar no relaxamento, bem como propiciar uma viagem de
autodescoberta, revelando o prazer de se sentir relaxado, respirar tranquilamente
e se movimentar com mais liberdade.

90 Aula 5 Consciência Corporal


O toque é uma linguagem que usamos também para comunicar nossos senti-
mentos de forma instintiva e íntima. Abraçando, consolando ou afagando, nossas
mãos podem transmitir carinho, amizade, proteção e cuidado com o outro.
Nesta aula, apresentamos uma massagem básica, também denominada de
massagem ocidental. Essa massagem é realizada por meio dos seguintes toques:

�„ deslizamento: trata-se de um movimento introdutório realizado com a palma


da mão aberta ao longo da pele, cujo efeito é relaxante;

�„ fricção: pequenos círculos realizados com os polegares, com pressão média,


ao longo da coluna, cujo efeito está em quebrar depósitos de aderências,
desbloquear acúmulo de toxinas;

�„ amassamentos: há vários tipos desde o pinçamento e o rolamento, até a


compressão óssea;

�„ percussão: tamborilamento com as pontas dos dedos, cujo efeito é estimulante.

Vamos fazer nas costas!

Nas fotografias que se seguem, você pode visualizar alguns momentos de


uma aula prática de massagem, com destaque para o contato inicial entre os
parceiros como forma de sensibilização e disponibilidade para o contato, como
vemos na Figura 2. Em dupla, sentados, as pessoas se dão as mãos, com os olhos
fechados, para sentir a pele do colega, a temperatura, a textura.

Figura 2 – Sensibilização por meio do contato entre as mãos.


Fonte: Autoria própria.

Aula 5 Consciência Corporal 91


Na Figura 3, temos um momento em que podemos visualizar a massagem no
rosto como forma de relaxamento.

Figura 3 – Massagem no rosto.


Fonte: Autoria própria.

Figura 4 – Massagem nas costas.


Fonte: Autoria própria.

92 Aula 5 Consciência Corporal


Na Figura 4, observamos um momento da aula em que se massageiam as
costas do colega. Nessa massagem, começamos com o deslizamento, depois
fizemos a fricção ao longo da musculatura paravertebral e finalizamos com o
amassamento e a massagem nos pés (Figura 5).

Figura 5 – Massagem na planta dos pés.


Fonte: Autoria própria.

A prática da massagem também é intuitiva, contudo, para efeitos didáticos, vamos


fazer a seguinte sequência: iniciaremos com uma massagem no couro cabeludo e na
face (nesse momento, quem está recebendo a massagem posiciona-se em decúbito
dorsal). Em seguida, na posição decúbito ventral, faremos um deslizamento nas
costas, membros superiores e inferiores; fricção nas costas, ao longo da coluna;
amassamentos nas costas, membros superiores e inferiores, incluindo os pés;
finalizaremos com um deslizamento nas costas ou em outra parte do corpo.
Cumpre frisar algumas recomendações para a prática, tais como: sensibilidade,
cuidado, boa energia, firmeza e suavidade nas mãos conforme a textura da pele,
dos músculos e condizente com as disposições corporais do outro. Dar e receber
são atitudes profundamente éticas e para que a massagem seja uma experiência
educativa, precisamos experimentar o toque com uma atenção adequada, aguçando
a percepção, respirando adequadamente, atentando para as posturas corporais
e para os sinais do corpo, em vez de movimentos mecânicos ou bruscos. Quem
faz: é importante mover-se livremente, transmitir segurança e conforto. Quem
recebe: não se dispersar, respirar tranquilamente, avisar se o toque for incômodo.
Com essas orientações você pode conduzir uma experiência de relaxamento
e de consciência corporal por meio da massagem, do contato e da linguagem
tátil. Experimente!

Aula 5 Consciência Corporal 93


Leituras complementares

LIDELL, L.; THOMAS, S. O novo livro da massagem. São Paulo: Manole, 2000.
O livro apresenta-se como um guia de técnicas orientais e ocidentais de
massagem.

Vídeo sobre Massagem relaxante. Disponível no endereço eletrônico:<https://


www.youtube.com/watch?v=Zpdl85WRhuI>.
No vídeo, você poderá observar uma experiência de massagem, enfocando
os toques e o movimento das mãos.

Atividade 2

Escolha uma forma de massagem (reflexologia, shiatsu, relaxante,


shantala) e descreva os princípios, toque e manobras que a
caracterizam. Produza um texto de 3 a 4 páginas e entregue ao tutor
de seu polo.

Resumo

Nesta aula, apresentamos referências teóricas sobre a pele e o


sentido do tato, bem como descrevemos uma experiência da massagem
como linguagem tátil.

Autoavaliação
Você já experimentou uma sessão de massagem? Caso ainda não tenha
experimentado, procure conhecer uma das técnicas e relate sua experiência.
Participe de um fórum virtual coordenado pelo tutor.

94 Aula 5 Consciência Corporal


Referências
ANDRIEU, B. Toucher: se soigner para le corps. Paris: Les belles lettres, 2008.

CYRULNIK, B. Do sexto sentido: o homem e o encantamento do mundo.


Lisboa: Instituto Piaget, 1999.

LEBOYER, F. Shantala: uma arte tradicional para bebês. São Paulo: Ground,
1995.

LIDELL, L.; THOMAS, S. O novo livro da massagem. São Paulo: Manole, 2000.

MARZANO, M. Dictionnaire du corps. Paris: PUF, 2007.

MERLEAU-PONTY, M. Fenomenologia da percepção. São Paulo: Martins


Fontes, 1994.

MONTAGU, A. Tocar: o significado humano da pele. São Paulo: Summus, 1988.

Anotações

Aula 5 Consciência Corporal 95


Anotações

96 Aula 5 Consciência Corporal


A percepção do corpo na
bioenergética e na biodança

Aula

6
Apresentação

C
omo estão seus sentimentos? Como seu corpo reage à sua atitude emocional?
Como você se sente nesse momento? Sente-se bem, com disposição, energia,
vitalidade ou precisa de ânimo? Por vezes, sentimos nosso corpo pleno de
energia, de vitalidade, de vibrações. Mas, nem sempre é assim. Às vezes, nós
nos sentimos tristes, sem forças, sem vontade, sem rumo.
Essa oscilação entre prazer e dor parece fazer parte do nosso equilíbrio vital.
Mas, para nos mantermos vivos, estarmos de bem com a vida, felizes, é preciso
fazer vibrar o nosso corpo e as nossas emoções. Desse modo, podemos nos sentir
plenos de energia, inteiros, vibrantes, em equilíbrio e prontos para criar a nossa
vida. Essa é a proposta da bioenergética e da biodança, duas técnicas que podem
contribuir para o autoconhecimento e a formação em consciência corporal.
Bioenergética e biodança são técnicas de trabalho diferentes, mas que
apresentam a mesma conexão com o corpo e com o movimento. São usadas
em contextos terapêuticos e clínicos, mas podem ser adaptadas para a educação
física, mudando-se o enfoque e os objetivos a serem alcançados. Nesta aula,
iremos tematizar os aspectos introdutórios, teóricos e metodológicos de ambas,
que podem ser aplicados em contextos educativos, com vistas à consciência
corporal e à expressão do corpo por meio do movimento.

Objetivo

Identificar os princípios teóricos e metodológicos


1 da bioenergética e da biodança.

99
O corpo em movimento na
bioenergética e na biodança

A
bioenergética foi criada por Alexander Lowen – a partir dos trabalhos de
Wilhem Reich –, o qual é atleta, professor de educação física e doutor em
medicina. Lowen morreu aos 96 anos de idade e praticou a bioenergética
por mais de sessenta anos. Quanto à bioenergética, busca integrar o corpo e o
espírito, razão e emoção em nossas atitudes, forma de pensar, sentir e agir. Para o
criador da bioenergética, “a vida contemporânea encoraja nossas cisões, enfatizando
a cabeça, o intelecto, as realizações materiais. A profundidade da divisão entre
mente e corpo na vida contemporânea é insana” (LOWEN, 2007, p. 18).
Na Figura 1, você pode observar o gráfico de como Lowen e Lowen (1985)
entendem a Bioenergética, destacando-se a relação entre corpo, mente e
processos energético.

Figura 1 – Processos energéticos.


Fonte: Lowen e Lowen (1985).

Em relação ao conceito de bioenergética, funda-se no fato de que o nosso


corpo em todas as atividades utiliza a energia “[...] das batidas do coração aos
movimentos peristálticos dos intestinos, ao caminhar, falar, trabalhar e no sexo”
(LOWEN, 1982, p. 43). Contudo, o nosso corpo não funciona como uma má-
quina puramente energética, essas atividades mencionadas por Lowen (1982;
2007) expressam, como afirma o autor, expressões do nosso ser, de nossa vida,
de nossa existência e do modo como lidamos com nossos sentimentos, desejos
e emoções. Nesse sentido, Lowen afirma:

Aula 6 Consciência Corporal 101


A vida emocional de um indivíduo depende da motilidade do seu corpo, que
por sua vez é uma função do fluxo de excitação através dele. Os distúrbios
nesse fluxo ocorrem em forma de bloqueios, que se manifestam em áreas
onde a motilidade do corpo é reduzida. Nessas áreas podemos apalpar e sentir
com nossos dedos a espasticidade da musculatura. Desse modo, os termos
‘bloqueio’, ‘insensibilidade’ e ‘tensão muscular crônica’ se referem ao mesmo
fenômeno [...] desde que o corpo é um sistema energético, está em constante
interação energética com seu meio ambiente [...]. Todos nós somos sensíveis
às forças ou energias que nos rodeiam, mas o seu impacto não é o mesmo para
todas as pessoas. Uma pessoa que está altamente carregada é mais resistente às
influências negativas, tornando-se, ao mesmo tempo, uma influência positiva
para outras pessoas, especialmente quando o fluxo de excitação em seu corpo
é livre e pleno. O contato com tais indivíduos nos causa prazer e podemos
sentir isso intuitivamente (LOWEN, 1982, p. 47).

Somos, portanto, o nosso corpo. “Se você é seu corpo e seu corpo é você, ele
poderá expressar quem você é. É a sua forma de estar no mundo. Quanto mais vivo
for o seu corpo, mas vivamente você estará no mundo” (LOWEN, 1982, p. 47). Essa
afirmação de Lowen corrobora a perspectiva fenomenológica por nós estudada nessa
disciplina no que se refere à compreensão de corpo e existência (ver Aula 1).
Nessa perspectiva, as nossas atitudes corporais expressam quem somos, por
isso a importância de cuidados com o corpo como encontramos nas técnicas
corporais de consciência corporal, incluindo a bioenergética, pois nos ajudam no
autoconhecimento, no equilíbrio e na expressão do corpo e do fluxo de movimento.
Desse modo, se a pessoa está bloqueada na sua habilidade de expressar sensações
e sentimentos, estará amortecendo seu corpo e reduzindo sua vitalidade. Na terapia
bioenergética, a pessoa é levada a entrar em contato consigo mesma através do seu
corpo, por meio de uma série de exercícios criada por Lowen e Lowen (1985) para
desbloquear as tensões e liberar o fluxo de movimento do corpo.
De acordo com Boadella (1992), os padrões de tensão corporal podem ser vistos
como a história congelada de uma pessoa. Assim, é preciso mobilizar o corpo: o
rosto, a nuca, a cintura, as pernas, os braços, libertando-os de tensões crônicas.

Quando as principais tensões do corpo são superadas por massagens especiais


e movimentos posturais, trazendo à tona a expressões fundamentais do corpo,
o paciente sente seu corpo de uma nova maneira. Ele avaliará o mundo e a
si próprio de forma diferente (BOADELLA, 1992, p. 22).

No caso da educação física, podemos perceber o estado do corpo e da


vitalidade de um aluno observando seus gestos, suas tensões musculares, suas
atitudes em sala de aula. Podemos ainda propiciar exercícios de alongamento,
de relaxamento, de expressão corporal que nos ajudem a nos conectar com o
corpo, a respiração, os movimentos.

102 Aula 6 Consciência Corporal


Ao promover essa escuta sensível do corpo, estamos ajudando na consciência
corporal e na vitalidade de nossos alunos no contexto de nossa sala de aula. É
importante frisar que a abordagem dos exercícios de bioenergética na educação
física não tem a finalidade de psicoterapia, mas de educação do corpo, sensibilização
e consciência corporal (CLARO, 1995). Nesse sentido, vamos descrever alguns
exercícios de bioenergética que utilizamos em nossas aulas de consciência corporal,
com vista a ampliar a percepção do corpo, sua sensibilidade e sua expressão.
Deitado, começamos respirar com tranquilidade e perceber o fluxo de ar que
percorre nosso corpo, comunicando o tronco, o abdômen, a parte superior e
inferior do corpo (Figura 2). Sinta seu corpo relaxado e uma onda respiratória
que move sua pelve, seu abdômen, seu tórax, seu corpo como um todo.
Nessa perspectiva, Lowen e Lowen (1985) propõem os movimentos respiratórios
como ondas. A onda inspiratória começa na pele e flui até a boca. À medida que
vai subindo esse fluxo alarga e expande o corpo, liberando várias tensões que
acumulamos no dia a dia e ao longo de nossa vida.
A boa respiração é essencial para nosso corpo, nosso fluxo de movimentos,
visto que por meio dela obtemos o oxigênio necessário ao metabolismo e isso
assegura a energia de que precisamos. A respiração é uma ação do corpo todo,
todos os músculos estão envolvidos, em especial, o diafragma que se contrai
e relaxa permitindo a expansão dos pulmões. Além disso, o movimento do
diafragma conecta-se com os intercostais, o peito, as regiões abdominal e pélvica,
conectando a parte superior e inferior de nosso corpo.

Figura 2 – Respiração.
Fonte: Foto de Paula Nunes e Maria Lúcia Sebastião.

Já na Figura 3, temos um exercício chamado de grounding, um exercício Grounding


básico de vibração de todo o corpo. De pé, com os pés separados e ligeiramente Trata-se de uma expressão que
indica que a pessoa está em
voltados pra dentro, inclina-se o tronco à frente tocando o chão com os dedos
contato com o chão, a pessoa
das mãos. Para isso, não deve haver peso nas mãos, o peso do corpo deve re- sabe onde está e quem é, ela tem
pousar sobre os pés. Deixe a cabeça solta. Permaneça nessa posição por cerca de o seu lugar e é alguém (LOWEN;
um minuto e observe sua respiração e a atividade de vibração em suas pernas. LOWEN, 1985).

Aula 6 Consciência Corporal 103


“Num sentido mais amplo, o grounding representa o contato do indivíduo com
a realidade básica de sua existência” (LOWEN; LOWEN, 1985, p. 23).

Figura 3 – Grounding.
Fonte: Foto de Paula Nunes e Maria Lúcia Sebastião.

Na Figura 4, temos uma variação do exercício, sendo feito deitado com as


pernas no ar, o que amplifica a vibração.

Figura 4 – Grounding deitado no chão.


Fonte: Foto de Paula Nunes e Maria Lúcia Sebastião.

Na Figura 5, você pode observar um exercício de movimentação do quadril,


desenhando círculos para um lado e depois para o outro. Em nossa sociedade é
comum associar os movimentos pélvicos com o ato sexual. Por vezes, esses exer-
cícios provocam risos nos alunos, certa vergonha em reconhecer a própria sexuali-
dade. Em bioenergética, acredita-se que as sensações e os sentimentos podem ser
conscientemente contidos ou expressos. A ansiedade, a culpa ou a insegurança em
sua sexualidade pode minar a sua capacidade de estar com outro. Esses exercícios
de quadril contribuem para liberar tensões dessa região e para sua expressividade.

104 Aula 6 Consciência Corporal


Figura 5 – Movimentação dos quadris.
Fonte: Foto de Paula Nunes e Maria Lúcia Sebastião.

Na Figura 6, temos um exercício de espernear. Esse exercício permite que seu


corpo ganhe mais liberdade nos membros inferiores. Repita-o várias vezes com uma
perna e depois com a outra. A repetição trará resistência e coordenação. Também
pode ser feito deitado, pernas para cima, alternando-se a perna direita e a esquerda.

Figura 6 – Exercício de espernear.


Fonte: Foto de Paula Nunes e Maria Lúcia Sebastião.

De acordo com Keleman (1994), no exercício de espernear, o corpo todo se


envolve. Você pode perceber a ação rítmica entre as pernas, nádegas, pelve,
tronco, cabeça, braços. Essa posição faz com que a energia circule e faça vibrar
seu corpo.
Nas Figuras 7 a 10, mostramos exercícios de alongamento que ajudam a am-
pliar a respiração, no relaxamento e na conexão corpo e movimento.

Aula 6 Consciência Corporal 105


Figura 7 – Alongamento da musculatura posterior.
Fonte: Foto de Paula Nunes e Maria Lúcia Sebastião.

Figura 8 – Conexão cinturas escapular e pélvica.


Fonte: Foto de Paula Nunes e Maria Lúcia Sebastião.

Figura 9 – Flexão completa do tronco.


Fonte: Foto de Paula Nunes e Maria Lúcia Sebastião.

106 Aula 6 Consciência Corporal


Figura 10 – Espreguiçamentos.
Fonte: Foto de Paula Nunes e Maria Lúcia Sebastião.

Nas Figuras 11 a 13, mostramos alguns exercícios de contato. Uma das carac-
terísticas de nossa vitalidade é a qualidade de estar em contato com o que pode
ser apreendido pela percepção e ficar atento ao que está acontecendo com você
e ao seu redor. Entrar em contato com o seu corpo e com o do outro por meio
de alongamentos (Figuras 6 a 9) ou em exercícios de massagem que liberam as
tensões nos ombros e na região cervical (Figura 10) ou que envolvam a entrega e
confiança no parceiro (Figuras 11 e 12) relaxam a coluna e ampliam a consciência
corporal e a nossa vitalidade.

Figura 11 – Massagem no pescoço.


Fonte: Foto de Paula Nunes e Maria Lúcia Sebastião.

Aula 6 Consciência Corporal 107


Figura 12 – Extensão do tronco com apoio.
Fonte: Foto de Paula Nunes e Maria Lúcia Sebastião.

Figura 13 – Força, equilíbrio, confiança.


Fonte: Foto de Paula Nunes e Maria Lúcia Sebastião.

Esses são apenas alguns exemplos de exercícios introdutórios de bioener-


gética que podemos trabalhar em aulas de consciência corporal, buscando o
relaxamento, o bem-estar, o contato consigo mesmo e com o outro. Os exercícios
devem ser feitos em clima de tranquilidade, com ou sem música, estimulando-se
a confiança, a segurança e a afetividade no grupo.
Na segunda parte de nossa aula, exploramos a biodança e sua relação com
o corpo, o movimento e as nossas emoções e sensações. De acordo com Toro
(2002), a biodança provém de uma meditação sobre a vida. Assim, a dança tem
como uma de suas funções a expressão e a celebração do corpo e da vida. Danças
antigas, danças circulares, danças sagradas podem ser incluídas em aulas de
biodança, bem como exercícios de expressão corporal.
Na disciplina de Consciência corporal, usamos elementos da biodança, em
especial, a relação entre corpo, música e movimento como possibilidade expres-
siva. De acordo com Toro (2002), a música na biodança deve ser coerente com
o objetivo a ser atingido, sendo estimuladora da expressão corporal. A música
também desperta nossa memória, sentimentos e emoções. O ritmo é fundamental
para a harmonia do corpo e de seu movimento.

108 Aula 6 Consciência Corporal


Nas figuras a seguir (Figuras 14 a 17) você pode perceber alguns exercícios
práticos com a biodança. Nos primeiros exercícios (Figura 14), trabalhamos a
soltura do quadril e dos ombros, estimulando a percepção da postura, do espaço,
do ritmo e da sensualidade.

Figura 14 – Soltura de quadril.


Fonte: Foto de Paula Nunes e Maria Lúcia Sebastião.

Figura 15 – Soltura de ombros.


Fonte: Foto de Paula Nunes e Maria Lúcia Sebastião.

Nas Figuras 16 a 18, trabalhamos com um lençol. Ao ritmo de uma clássica


(Bach) cada um deveria criar sua própria dança. O lençol foi usado como material
expressivo e também para criar uma atmosfera íntima e pessoal. A dança seria
interna e não para ser vista por outros. Em um segundo momento, eles criaram
movimentos usando o lençol. A aula terminou com um relaxamento.

Aula 6 Consciência Corporal 109


Figura 16 – Dança íntima.
Fonte: Foto de Paula Nunes e Maria Lúcia Sebastião.

Figura 17 – Criação de movimentos.


Fonte: Foto de Paula Nunes e Maria Lúcia Sebastião.

Figura 18 – Relaxamento.
Fonte: Foto de Paula Nunes e Maria Lúcia Sebastião.

110 Aula 6 Consciência Corporal


Muitos outros exercícios de dança, de improvisação e criação de movimentos
podem ser feitos. Os exercícios de biodança aqui descritos complementam o
trabalho feito anteriormente com a bionergética, no sentido de trabalhar a
expressividade do grupo e a criação de movimentos com música, estimulando
também a criatividade e a imaginação.

Leituras complementares

LOWEN, A.; LOWEN, L. Exercícios de bioenergética: o caminho para uma saúde


vibrante. São Paulo: Summus, 1985.
O livro contém a descrição de exercícios de bioenergética organizados por
Alexander Lowen e sua esposa Leslie Lowen. O foco é na função do corpo e de
seus processos energéticos relacionados com as emoções, o autoconhecimento
e a saúde.

LOWEN, A. Uma vida para o corpo. São Paulo: Summus, 2007.


Trata-se da autobiografia de Alexander Lowen, criador da Bioenergética.
No livro, você encontra a história pessoal e profissional de Lowen, sua ligação
com Reich e o desenvolvimento da bioenergética em vários lugares do mundo.

Atividade 1

Com base na leitura do texto, responda as seguintes questões:

1 O que caracteriza a bioenergética?

2 Qual a compreensão de corpo na bioenergética?

Descreva alguns aspectos metodológicos da bioenergéti-


3 ca e da biodança que podem ser aplicados em aulas de
consciência corporal.

Participe de um fórum virtual organizado pelo tutor e com-


partilhe seus pensamentos e sua compreensão sobre bioenergéti-
ca, consciência corporal e educação física.

Aula 6 Consciência Corporal 111


Resumo

Nesta aula, enfocamos o corpo em movimento na Bioenergética e


na Biodança. Apresentamos elementos teóricos e metodológicos que
as caracterizam, em particular, nas aulas de consciência corporal.

Autoavaliação
Responda às questões seguintes:

Qual a sua qualidade pessoal mais marcante (alegria, tristeza, indife-


1 rença, raiva, indignação, amargura)?

2 Como você lida com essa emoção?

3 Como você intensifica ou desintensifica essa emoção?

Como você permite o brotar de outra emoção, diferente dessa sua


4 qualidade pessoal mais marcante?

Após responder as questões, procure fazer a relação com a aula de bioe-


nergética e biodança. Elabore um texto com as respostas e entregue ao tutor.

112 Aula 6 Consciência Corporal


Referências
BOADELLA, D. Correntes da vida: uma introdução à biossíntese. São Paulo:
Summus, 1992.

CLARO, E. Método Dança-educação Física. São Paulo: Robe, 1995.

KELEMAN, S. Realidade somática: experiência corporal e verdade emocional.


São Paulo: Summus, 1994.

LOWEN, A. Bioenergética. São Paulo: Summus, 1982.

______. Uma vida para o corpo. São Paulo: Summus, 2007.

LOWEN, A.; LOWEN, L. Exercícios de bioenergética: o caminho para uma


saúde vibrante. São Paulo: Summus, 1985.

TORO, R. Biodanza. São Paulo: Editora Olavo Brás; Escola Paulista de


Biodanza, 2002.

Anotações

Aula 6 Consciência Corporal 113


Anotações

114 Aula 6 Consciência Corporal


Práticas corporais orientais e
a consciência corporal

Aula

7
Apresentação

A
sabedoria oriental é milenar e diversa, sendo composta por muitas filosofias
e religiões, tais como o confucionismo, o taoísmo e o budismo. Trata-se
de um universo amplo que não seria possível abordar em uma única aula.
Nesse sentido, vamos enfocar alguns princípios filosóficos do zen-budismo e sua
relação com a experiência do tai chi chuan como prática meditativa.
Você irá perceber, nesta aula, a ligação entre conceitos, símbolos, valores,
usos e costumes da vida cotidiana que caracterizam a sabedoria oriental, com
destaque para a consciência corporal.

Objetivos

1 Analisar princípios da filosofia oriental.

2 Relacionar práticas orientais e consciência corporal.

117
Noções de filosofia oriental

A
ssim como na filosofia ocidental, os filósofos do Oriente, também chamados
de sábios, discorrem acerca de princípios éticos que buscam orientar a
vida cotidiana. Uma das diferenças fundamentais é que no Oriente, a
experiência religiosa não se separa da filosofia (ZIMMER, 1986).
O budismo, por exemplo, comporta tanto uma mensagem filosófica quanto
religiosa. Em nossa aula, atemo-nos à perspectiva filosófica do budismo, rela-
cionando-o à experiência de autoconhecimento e consciência corporal através
de práticas como o tai chi chuan e a meditação.
De acordo com Zimmer (1986), o budismo foi criado na Índia, mas difundiu-se
em várias regiões da Ásia. Os monges budistas contam que o príncipe Guatama
Sidarta deixou o palácio e o reino de seu pai para conhecer o mundo e alcançar
a iluminação. Absorto na experiência da meditação permaneceu imóvel e
intocável, durante quarenta e nove noites, vivenciando a beatitude do despertar.
Compreendeu então que a experiência estava além da palavra e toda tentativa de
falar a esse respeito seria vã. Mas, persuadido por Brahmã, o senhor do universo,
Buda passou a ensinar o seu caminho para a iluminação.
Seguindo o caminho da medicina indiana, Buda apresentou um diagnóstico
a respeito da problemática humana. O âmago de sua doutrina é formado por
quatro fundamentos que constituem “Quatro nobres verdades”, a saber:

„„ Toda vida é dolorosa.

„„ A causa do sofrimento é o desejo ignorante.

„„ A dor pode ser eliminada.

„„ Deve-se percorrer o caminho.

De acordo com Zimmer (1996), o caminho compreende: reta concepção,


reto pensamento, retas palavras, reta conduta, reto meio de vida, reto esforço,
reta atenção e reta meditação. Esse caminho é chamado de caminho do meio,
pois evita extremos. Na doutrina budista, esse caminho é representado pela
Barca (Yâna), veículo que nos conduz para lidar com o sofrimento e atingir a
iluminação ou a consciência, a paz, a serenidade e o autoconhecimento. Nessa
barca, cruzamos o caminho da vida, desde a margem da experiência cotidiana
até a longínqua margem da experiência transcendental que é a libertação da
escravidão e do sofrimento.
Ao fazer essa travessia nos ligamos ao rio, às margens, à própria barca, mas
depois, precisamos deixar tudo isso para trás, pois será uma carga inútil. A longa
peregrinação rumo à perfeição exige a renúncia, o exercício, a disciplina, o
desapego, o esvaziamento. Essa imagem da barca é ilustrativa do pensamento
budista, do caminho e da atitude diante da vida.

Aula 7 Consciência Corporal 119


Como já afirmamos no início de nossa aula, o budismo se desenvolveu em
várias regiões do Oriente. De acordo com Herrigel (2006), no Japão o budismo
assume a forma do estilo zen, chamado de budismo Dhyana ou simplesmente
zen, baseado na experiência mística ou intuitiva que busca harmonizar o cons-
Inconsciente ciente com o inconsciente. Essa experiência nos permite o aperfeiçoamento
Sugere-se rever a Aula 1 da espiritual na própria vida cotidiana. Assim, “o Zen é a consciência cotidiana, que
nossa disciplina para retomar as
não é outra coisa senão dormir quando se tem sono e comer quando se tem fome”
noções de consciência e incons-
ciente na filosofia ocidental. (HERRIGEL, 2006, p. 11). Assim, por meio de nossa atenção, de nossa percepção,
podemos atingir o aperfeiçoamento por meio de exercícios de meditação, por
exemplo, ou por meio de outras artes orientais, como a cerimônia do chá, a arte
do arco e flecha ou o tai chi chuan que veremos na segunda parte de nossa aula.
Esse caminho, o caminho do meio, exige a liberação de si mesmo, ou seja,
deixar para trás tudo o que tem e o que é. Esse caminho é o caminho do vazio,
do desapego, ao se conscientizar que tudo é fluido e se transforma. Trata-se de
um saber que advém da experiência e da atenção dedicada aos exercícios da vida
cotidiana e, especialmente, originada da meditação. Para liberar-se de si mesmo,
é preciso então perder o eu, no sentido do pensamento ocidental, do sujeito cons-
ciente ou reflexivo e entregar-se à comunhão corpo e alma, de modo indissociável.

Para perdermos o eu, é necessário cortarmos todas as amarras, sejam quais


forem, para que a alma, submergida em si mesma, recupere todo o poder da sua
indizível origem. Não conseguiremos fechar a porta dos sentidos através de uma
simples reclusão, mas de uma disposição de ceder sem resistência. Para con-
seguirmos instintivamente essa atitude não-ativa, a alma precisa de um apoio
íntimo, que é o ato de respirar. Ele deve ser executado conscientemente. Tanto a
inspiração como a expiração precisa ser praticada em separado e com atenção.
Quanto mais intensa a concentração na respiração, mais rapidamente desapa-
recem os estímulos exteriores, pois eles se confundem com vagos murmúrios
a que prestamos cada vez menos atenção, até que deixam de nos perturbar,
como o ruído das ondas quebrando-se na praia (HERRIGEL, 2006, p. 45-46).

Na citação, podemos perceber aspectos práticos da meditação e sua importância


na busca da concentração, tranquilidade, relaxamento e serenidade para lidar
com os acontecimentos em nossa vida de forma pacífica, tranquila e com sabedoria.
Respirar, aquietar a mente, relaxar o corpo. Assim, com o treino, a prática da
meditação, podemos controlar nossa ansiedade e atingir a serenidade.
No estado de meditação, nada se pensa, deseja, aspira ou espera-se. Esse
estado é fundamentalmente livre da intenção do eu. Quem consegue libertar-se
nesse exercício, com o passar do tempo, internaliza esse estado de tranquilidade
para outros momentos de sua vida.
Huard e Wong (1990) destacam como o Oriente dedicou-se aos cuidados e
técnicas do corpo como modo de alcançar a iluminação espiritual, rompendo com
o dualismo corpo e alma comum no Ocidente. Essa atitude é influenciada pela
filosofia oriental do budismo, do confucionismo e do taoísmo. De acordo com
esses autores, a China desenvolveu a medicina preventiva como arte de prolongar

120 Aula 7 Consciência Corporal


a vida. A concepção de yin e yang foi integrada também pelo confucionismo e
pelo taoísmo como o equilíbrio dos contrários. Na Figura 1, você pode visualizar
o símbolo do tao que significa que tudo na natureza espelha o seu contrário.
Assim, na escuridão há um ponto de luz, na claridade um ponto negro. Essas
energias contrárias e complementares correspondem ao yin e ao yang.

Figura 1 – Tao.

De acordo com Liao (2010), o yin representa o feminino, a lentidão, o recolhi-


mento. O yang simboliza o masculino, a velocidade, a ação. Mas, ambos se comple-
mentam. Essas forças encontram-se ao mesmo tempo na natureza e em nosso ser.
Nesse conjunto de práticas que integram a medicina oriental e a chinesa,
em particular, encontra-se o tai chi chuan, como veremos na segunda parte de
nossa aula, como experiência prática de contato com as técnicas de consciência
corporal oriundas do Oriente cujo principal objetivo é desenvolver a energia
interna, equilibrando o yin e o yang.

Leituras complementares

HERRIGEL, E. A arte cavalheiresca do arqueiro zen. São Paulo: Pensamento, 2006.


O livro apresenta os princípios do zen-budismo através do relato da expe-
riência do professor de filosofia Herrigel e sua experiência de aprendizagem do
arco e flecha.

Filme O pequeno Buda (direção de Bernardo bertolucci, 1993). Disponível no ende-


reço eletrônico <http://pt.fulltv.tv/little-buddha.html>. Acesso em: 20 maio 2014.
O filme conta a história de um garoto americano que é a reencarnação de
uma lama (divindade espiritual máxima no budismo). Na apreciação do filme,
você poderá compreender princípios filosóficos e religiosos do budismo.

Aula 7 Consciência Corporal 121


Atividade 1

Com base na leitura desta aula, responda às questões:

1 Qual a compreensão de consciência na filosofia oriental?

2 Qual a importância da meditação para a filosofia oriental?

Compartilhe suas respostas na plataforma virtual.

Tai chi chuan


O tai chi chuan é um estilo interno de arte marcial, ou seja, enfatiza o uso da
energia em lugar da força física. Nessa arte, a força de defesa e ataque origina-se
no corpo relaxado e que não se contraí antes do confronto. A força e a energia
só explodem no momento exato do contato, e, para isso, faz-se necessária a
disciplina para o relaxamento e para o desprendimento. Em nossa abordagem,
vamos utilizar o estilo zen do tai chi, com vistas ao relaxamento, à meditação,
ao autoconhecimento e à consciência corporal.
No tai chi, a noção de eixo é fundamento. No eixo, o praticante tem seus
pés firmes na terra e sua cabeça suportando o céu. Na movimentação, as duas
extremidades se estendem, uma para cima e a outra para baixo, fazendo com
que a energia circule. Para tanto, a postura é observada de forma que o topo da
cabeça seja erguido em direção ao céu; os pés devem estar bem plantados no
chão; ombros relaxados; cotovelos abaixados; tórax relaxado; sentados como se
estivéssemos montados a cavalo, ou seja, com o quadril encaixado; alinhamento
do joelho com a ponta dos pés.
Outro aspecto a ser observado é a respiração, que deve ser a mais natural
possível, devendo haver união entre o movimento e a respiração. Geralmente, na
expansão, expiramos e, no recolhimento, inspiramos. É necessário relaxarmos,
termos a respiração natural, para sentirmos o movimento do chi. A respiração
deve ser longa e profunda. Devemos sentir a inspiração ir até a parte da bexiga.
Devemos sentir a fluidez do chi, ou seja, da energia interna, na expiração.
O tai chi chuan requer no praticante o “estado do vazio”. Trata-se de um
estado de pura consciência (percepção). É o que permite que tudo se manifeste.
Também chamado de kun, o vazio corresponde ao equilíbrio, significa a existência.
Percebemos tudo, sem nos apegarmos a coisa alguma. Não existe conceito ou
valor que nos prenda, estamos transparentes, libertos.

122 Aula 7 Consciência Corporal


Na prática do tai chi, o espaço não é apenas algo que permite a existência
das formas, mas é também um estado de espírito. O corpo precisa do espaço
para se movimentar, a energia precisa do espaço para fluir e a psique precisa do
espaço para obter a liberdade. A roda ou o círculo simboliza a forma, o corpo,
os acontecimentos, o mundo.
Os movimentos do tai chi chuan baseiam-se no movimento dos opostos
yin-yang. O corpo em ação (yang) deve trazer de si a quietude (yin). Os
movimentos devem ser suaves (yin), devem conter, porém, em abundância, as
energias no interior (yang). O movimento rápido (yang) tem a potencialidade
do lento (yin) e o movimento lento (yin) tem a potencialidade de rápido (yang).
Os movimentos yang são circulares, os movimentos yin indicam a direção, as
diagonais, os ângulos. A união yin-yang gera força e movimento, forma o ciclo
e é responsável pela transformação.
Embora possa ser praticado em qualquer hora do dia, recomenda-se que a prática
seja feita pela manhã. Toda manhã, o sol traz para todos os seres o primeiro raio
(yang) que nasce após o profundo repouso (yin). Nesse momento, todos os seres têm
seu organismo despertado. É o melhor momento para iniciarmos a prática do tai chi.
Na prática, os movimentos yang sempre se completam com a serenidade (yin). O
trabalho energético (yang) jamais se separa da concentração e conscientização (yin).
Os princípios yin (feminino) e yang (masculino) relacionam-se intencionalmente,
produzindo força interior, serenidade e longevidade. O caminho do tai chi chuan é
o tao, o caminho do meio, ponto em que se encontra o equilíbrio dos opostos.
O tai chi possui uma forma que corresponde a uma série de movimentos,
compondo uma espécie de coreografia, como descrevemos a seguir.

Descrição dos exercícios da forma do tai chi chuan

1) Movimento da folha.

2) Segurar a bola à direita/esquerda.

3) Alisar a crina do cavalo para esquerda e para a direita.

4) O grou abre as asas.

5) Escovar o joelho e empurrar.

6) Tocar o alaúde.

7) Recuar e empurrar/ recolher e expandir.

8) Acompanhar a cauda do pássaro para esquerda e para direita.

9) Chicote simples.

Aula 7 Consciência Corporal 123


10) Mover as mãos como nuvens.

11) Chicote simples.

12) Preparar para chutar.

13) Chutar com a perna direita.

14) Proteger.

15) Chutar com a perna esquerda.

16) A serpente rasteja para esquerda.

17) Galo dourado sobre uma perna (apoio na esquerda e joelho direito elevado).

18) A serpente rasteja para direita.

19) Galo dourado sobre uma perna (apoio na direita e joelho esquerdo elevado).

20) Empurrar a laçadeira para direita e para esquerda.

21) Agulha no fundo do mar.

22) Preparar para dar um soco, socar com a direita, limpar as mãos.

23) Recolher.

24) Postura do vazio.

Esses exercícios devem ser feitos observando-se a postura, a respiração e


a fluência dos movimentos. Da Figura 2 à 6, você pode visualizar alguns deles.
Como em toda prática, exige-se a concentração, a disponibilidade, a dedicação para
assimilar os movimentos e a incorporação das sequências de exercícios (forma).
Em geral, em uma aula de tai chi chuan, começa-se com exercícios de alongamen-
to para preparar o corpo, ampliar a percepção e o fluxo de respiração. Em seguida,
fazemos o chi kung a forma do tai chi chuan (como veremos a seguir) e, depois, a
meditação. Começamos a experimentar os movimentos individualmente, ainda sem
a preocupação com a sequência completa dos 24 movimentos. Observamos o eixo,
a postura, a respiração, a transferência de peso entre as pernas que permite fluir no
espaço e a mudança de direção. Os movimentos são circulares, lentos e feitos de
forma serena. Após realizar alguns movimentos do tai chi, procuramos fazer a forma
do tai chi e finalizamos a aula com a meditação zen-budista, cujo foco é esvaziar a
mente de todo pensamento.

124 Aula 7 Consciência Corporal


Recomenda-se que a aula seja feita ao ar livre, mas caso não haja essa possi-
bilidade a experiência pode ser feita em uma sala fechada, com ou sem uso da
música. Caso use música, dar preferência a uma música suave, instrumental.

Figura 2 – Movimento de segurar a bola da


direita para a esquerda.
Fonte: Fotografia de Maria Lúcia Sebastião e Paula Nunes.

Figura 3 – Movimento de alisar a crina do cavalo.


Fonte: Fotografia de Maria Lúcia Sebastião e Paula Nunes.

Figura 4 – Movimento da folha.


Fonte: Fotografia de Maria Lúcia Sebastião e Paula Nunes.

Aula 7 Consciência Corporal 125


Figura 5 – Mover as mãos como nuvens.
Fonte: Fotografia de Maria Lúcia Sebastião e Paula Nunes.

Figura 6 – Exercício de meditação.


Fonte: Fotografia de Maria Lúcia Sebastião e Paula Nunes.

No contexto do tai chi chuan também podemos conhecer o chi kung, o qual é
a arte de desenvolver a energia para a saúde, a força interior, o desenvolvimento
da mente e a satisfação espiritual. É o resultado de milhares de anos de experi-
ência do homem no desenvolvimento do uso da energia, relacionando a energia
cósmica e as funções vitais. Os antigos mestres desenvolveram a arte da energia
para curar doenças, promover a saúde e a longevidade, melhorar as habilidades
de luta, expandir a mente, alcançar níveis diferentes de consciência e atingir a
espiritualidade. Os registros mostram que a partir de 2700 a.C. o chi kung tinha
se tornado um aspecto importante da medicina chinesa (KIT, 1997). De acordo
com Kit (1997), os objetivos do chi kung são:

„„ Relaxar e fortalecer músculos e articulações.

„„ Aumentar a agilidade e a flexibilidade.

„„ Treinar certas habilidades ou forças.

126 Aula 7 Consciência Corporal


„„ Usar determinados exercícios para curar ou prevenir doenças específicas
(respiratórias, osteomusculares, circulatórias).

„„ Usar o conjunto dos exercícios para um desenvolvimento global e harmônico


do corpo.

Kit (1997) também aponta que o principal objetivo da técnica é induzir o


fluxo de chi, permitindo algumas sensações, vejamos.

„„ Sentir a corrente de chi dentro do corpo.

„„ Desfrutar da corrente de meditação.

„„ Eliminar obstruções nos meridianos.

„„ Harmonizar o fluxo de energia.

„„ Equilibrar níveis de energia no corpo.

A seguir, você verá como os princípios da prática do chi kung podem ser
resumidos.

„„ Concentrar-se no centro de gravidade do corpo, situado no abdômen, a fim


de atingir um melhor equilíbrio.

„„ Respiração abdominal, movimentos suaves e circulares.

„„ Captar a energia cósmica e armazená-la no campo de energia abdominal


para uso posterior.

„„ Criar uma pérola de energia para ser irradiada centrifugamente por todas as
partes do corpo, ou para circular por ele num pequeno fluxo de chi universal.

„„ Fundir a energia com a mente para conseguir uma unidade de corpo e espírito.

De acordo com Huang (1979), o tai chi é o princípio mais sutil do taoísmo, é o
agir sem constranger, ou seja, sem impedir o movimento do outro, mover-se de
acordo com o fluxo da natureza. Por meio dessa prática meditativa, podemos cul-
tivar a nossa energia interna e buscar o equilíbrio yin-yang, a paz e a serenidade.
Com esta aula, esperamos que você possa ter assimilado noções introdutórias
da filosofia oriental que é fundamental à experiência prática do tai chi, como
uma das possibilidades de exercício com a intenção de ampliar a percepção do
corpo e a consciência corporal em sua formação profissional e pessoal.

Aula 7 Consciência Corporal 127


Saiba Mais

Meridianos: as passagens do fluxo de energia


Quando William Harvey publicou seu livro Movement of the heart
(“Movimentos do coração”), em 1628, descrevendo a circulação san-
guínea, os cientistas da área médica do Ocidente prontamente sau-
daram como sendo uma importante descoberta. No Oriente, mais de
2.500 anos antes, a circulação sanguínea já era conhecida pelos chi-
neses. O Nei Jing ou Inner Classic of Medicine continha informações
precisas sobre a complexa rede de circulação de energia.
A energia vital flui pelo nosso corpo através de passagens chamadas
de meridianos. Há 12 pares de meridianos principais fluindo em circu-
lação contínua através dos órgãos: pulmões, intestino grosso, estômago,
baço, pâncreas, coração, intestino delgado, bexiga, rins, pericárdio, triplo
aquecedor (cavidades internas do tórax, estômago e região abdominal),
vesícula biliar e fígado. Ao longo dos meridianos, há pontos nos quais
a energia vital se concentra e por estes ainda é possível ter acesso
externamente para se manipular o fluxo interno de energia. Esses pontos
são conhecidos como pontos de acupuntura, pontos de energia ou
pontos vitais. Eles são usados pelos mestres de kung fu para machucar
os adversários, adotando o dian xue ou técnica do toque mortal, já pelos
acupunturistas, massagistas e mestres de chi kung, eles são usados no
seu sistema de cura e autoconhecimento (KIT, 1997).

Leituras complementares

<https://www.youtube.com/watch?v=hou57TxCvCo>. Acesso em: 19 maio 2014.


Nesse link, você pode visualizar um vídeo com a forma do tai chi chuan. Obser-
ve o eixo da coluna vertebral, a postura, a circularidade e o fluxo dos movimentos.

A arte de viver (Direção de Ang Lee, 1992). Disponível no endereço eletrônico


<https://pt.fulltv.tv/tu-shou.html>. Acesso em: 20 maio 2014.
O filme conta a história de um professor de tai chi chuan que vem morar
no Ocidente. Você irá perceber os princípios do tai chi chuan na vida cotidiana,
bem como as diferenças culturais entre o Oriente e o Ocidente.

128 Aula 7 Consciência Corporal


Atividade 2

Em grupos, faça uma pesquisa em sua cidade ou região ou na


internet a respeito do tai chi chuan. Procure locais e profissionais,
mestres de artes marciais que conheçam essa técnica e faça uma
entrevista. Indague sobre os aspectos teóricos, a percepção do corpo, os
aspectos metodológicos da técnica e os benefícios da prática. Preparem
um relatório, de 5 a 8 páginas, contendo o estudo da realidade e, em seguida,
apresente seu trabalho ao tutor. Podem incluir fotos e vídeos.

Resumo

Nesta aula, apresentamos noções básicas da filosofia oriental e sua


percepção de corpo e alma, bem como a experiência do tai chi chuan
e da meditação como formas de atingir o bem-estar, a serenidade e a
consciência corporal.

Autoavaliação
Realize o exercício prático da meditação zen-budista descrito nesta aula.
Sente-se em uma posição confortável, com as costas bem eretas. Se for descon-
fortável, busque um apoio para suas costas. Mantenha os olhos fechados e em
profundo silêncio, inspire e expire. Não pense, concentre-se em sua respiração.
Percebe o fluxo de sua respiração, o ar que entra e sai de seu corpo. Sons,
pensamentos, sentimentos, são passageiros, não se apegue a nada. Mantenha
o foco na respiração, buscando aquietar seu corpo e sua mente. Permaneça
nessa atitude por um tempo e depois observe como se sente. Participe do
fórum virtual, compartilhando sua experiência.

Aula 7 Consciência Corporal 129


Referências
HERRIGEL, E. A arte cavalheiresca do arqueiro zen. São Paulo:
Pensamento, 2006.

HUANG, A. C-L. Expansão e recolhimento: a essência do T’ai Chi. São Paulo:


Summus, 1979.

HUARD, P.; WONG, L. Cuidados e técnicas do corpo na China, no Japão e


na Índia. São Paulo: Summus, 1990.

KIT, W. K. Chi Kung para a saúde e a vitalidade. São Paulo: Pensamento, 1997.

LIAO, W. Clássicos do T’ai Chi. São Paulo: Pensamento, 2010.

YU, C. W. Qi Gong: antiga arte marcial interna. São Paulo: Editora On Line, 2010.

ZIMMER, H. Filosofias da Índia. São Paulo: Palas Athena, 1986.

Anotações

130 Aula 7 Consciência Corporal


Anotações

Aula 7 Consciência Corporal 131


Anotações

132 Aula 7 Consciência Corporal


O Método Dança-
Educação Física (MDEF)

Aula

8
Apresentação

N
esta aula, você vai conhecer o Método Dança-Educação Física, também
conhecido pela sigla MDEF, criado pelo professor de Educação Física e
bailarino Edson Claro, na década de 1980. O MDEF alia o conhecimento
científico e pedagógico ao ensino da dança. Um dos pontos mais relevantes do
método é sua relação com a consciência corporal. Logo, é preciso conhecer e
respeitar o corpo, seus limites e possibilidades para dançar, esse é o princípio
básico do MDEF.
No MDEF, você pode perceber a articulação de várias outras práticas corporais
estudas nesta disciplina de Consciência Corporal, tais como a antingiástica, a
eutonia, a biodança, a bioenergética, entre outras. Recomenda-se retornar às
aulas anteriores como forma de sistematizar e consolidar sua aprendizagem e
ampliar seu conhecimento sobre a consciência corporal.
Coragem, era assim que Edson Claro, a cada aula, a cada encontro ou
dificuldade, nos encorajava na descoberta do corpo, da profissão e da vida. Co-
ragem! Essa palavra nos dava força para perceber nosso potencial e transformar
as dificuldades encontradas, transformando vidas, experiências e conhecimentos
com muita emoção. Coragem! Vamos começar nossa aula.

Objetivos

Reconhecer o conteúdo dança como elemento


1 para a consciência corporal nas aulas de Edu-
cação Física.

2 Relacionar corpo, dança e expressão no MDEF.

135
Conceito e trajetória histórica do MDEF

O
MDEF foi criado a partir da experiência vivida pelo professor e bailarino
Edson Claro com o esporte, a educação física, a dança e técnicas de
consciência corporal como a eutonia e a antiginástica. Logo, a ênfase
do MDEF encontra-se na ligação entre a dança e a educação física enquanto
processo de educação.
Nota-se que o método tem um enfoque multidisciplinar, dialogando diversas
áreas de conhecimento como fisiologia, antropologia, psicologia no campo teórico
e disciplinas práticas como o ballet clássico, a dança moderna, técnicas de alon-
gamento e de relaxamento, entre outras. Assim, um dos horizontes do MDEF
diz respeito à formação profissional de modo a desenvolver o senso crítico e o
aprofundamento de conhecimentos teóricos e práticos.
Claro (1995) defende que a formação profissional em áreas como a dança e
a educação física deve ser feita de forma a articular formação teórico-prática,
enfatizando-se a vivências em seu próprio corpo. O autor expõe ainda sua
trajetória como atleta e como bailarino, apontando aspectos positivos e negativos
dessa formação em relação ao corpo.
A importância do seu encontro com a dança criativa, Claro (1995) também des-
taca, pois foi a primeira vez que ouvia falar em consciência corporal. O autor conta
que nessa prática seu corpo foi colocado em xeque por meio de processos de alon-
gamento que mostravam de forma clara os limites e possibilidades de seu corpo.
Essa experiência aproxima-se do encontro com a dança relatado por Fux
(1983). A autora diz que a dança sempre foi para ela uma forma de expressão
pessoal e um vínculo com a vida. Esse vínculo com a experiência vivida
apresenta-se no MDEF como um dos pressupostos fundamentais a partir dos
quais a consciência corporal e a aprendizagem da dança acontecem.
Além da dança criativa, o autor destaca o seu encontro com a eutonia de
Gerda Alexander, estudada em nossa disciplina (ver Aula 3). A eutonia engloba
experiências de expressão corporal e de sensopercepção por meio da imagem
corporal. Portanto, a percepção do corpo na eutonia apresentou-se a Claro (1995)
como um dos pilares para a construção do MDEF.
A técnica de Feldenkrais (ver Aula 4) também foi considerada na elaboração do
MDEF, ressaltando-se aspectos tais como a sutileza de movimentos, a percepção das
alavancas ósteo-articulares e o alongamento muscular. Logo, a antiginástica e outras
técnicas de percepção do corpo também compõem o MDEF, assim como a biodança.
Claro (1995) explicita a contribuição do seu método para a educação física e
para a consciência corporal da seguinte forma: “A contribuição da aplicação do
método dança-educação física é aliar o estudo ortodoxo da anatomia com áreas
alternativas denominadas eutonia e sensopercepção” (CLARO, 1995, p. 63).
De acordo com o autor, dança e educação física podem estar comprometidas
com a performance e o rendimento, mas é preciso uma base formativa. Nesse
contexto, o MDEF se apresenta como um método de educação, manutenção e
profilaxia ao enfatizar a sutileza do corpo e de seus gestos, buscando-se a consci-
ência corporal na compreensão do corpo e na experimentação de várias técnicas.

Aula 8 Consciência Corporal 137


Na construção teórica do MDEF, Claro (1995) apresenta diversos argumentos
científicos relacionados a aspectos neurológicos e antropológicos do desenvol-
vimento humano. Um dos aspectos destacados pelo autor, em particular para
a consciência corporal, é a bipedia. Dessa forma, o pé é a nossa base, a ligação
com o real, a ligação com as coisas concretas. A mão remete ao nosso passado,
nosso meio de comunicação com o mundo. Assim, pé e mão, por exemplo, são
partes do nosso corpo que comunicam sentidos e significados diretamente
relacionados aos processos de consciência corporal. Por isso, várias técnicas
utilizam o pé ou a mão como centro de suas intervenções, como é o caso da
reflexologia (ver Aula 2) e da massagem (ver Aula 5).
Outro aspecto fundamental é a postura, não apenas do ponto de vista
biomecânico e cinesiológico, mas também relacionada aos nossos sentimentos
e emoções. Claro (1995) sintetiza vários argumentos sobre a postura e o desen-
volvimento afetivo do ser humano. A forma como andamos, ficamos de pé, nos
sentamos e nos movimentamos, por exemplo, expressa não apenas aspectos
biomecânicos, mas também afetivos.
Assim, Claro (1995) destaca a importância da teoria reichiana – criada pro
William Reich – a respeito das couraças musculares, as tensões musculares que
quando se tornam crônicas podem causar distúrbios musculares e psicológicos
importantes, como é o caso da angústia e depressão, por exemplo. Nesse contexto,
aspectos das técnicas da biodança e da bioenergética são utilizados como estra-
tégias de consciência corporal no MDEF.
As técnicas orientais também compõem as estratégias de fundamentação
teórico-prática do MDEF. Claro (1995) apresenta os princípios do Yin e do Yang
como sensações energéticas de contração e de expansão que compõem a medi-
cina ocidental, a acupuntura e o tai chi chuan. Assim, torna-se importante equi-
librar as energias Yin e Yang por meio de métodos de relaxamento, respiração e
meditação adequados.
O MDEF tem sido utilizado em muitos contextos de formação profissional
e artística. Claro (1994), ao defender sua tese de doutorado apresenta vários
desdobramentos do MDEF, inclusive a criação de um curso de Pós-Graduação
Lato-Sensu em Dança-Educação Física, na Universidade de São Caetano do Sul,
São Paulo, cuja primeira turma, foi concluída em 1991. Nessa tese, o autor retoma
e aprofunda considerações históricas sobre a relação dança e Educação Física,
refletindo sobre a formação profissional na área e as contribuições do ensino da
dança nesse contexto.
Outro desdobramento do MDEF pode ser encontrado em Silva (2006). Esse
apresenta um estudo amplo que demonstra diversos aspectos da experiência com
o MDEF no campo da arte da dança, inclusive com pessoas com necessidades
especiais (PNEs). Logo, ao relatar sua experiência com o Grupo de Dança Roda
Viva, Silva (2006) remete-se à experiência com o MDEF, a saber:

138 Aula 8 Consciência Corporal


As metas para os diversos projetos conquistados fundamentam-se, prioritaria-
mente, na execução de oficinas e apresentações artísticas para a rede pública de
ensino e associações de apoio às PNEs. Nestas sempre privilegiaram o caráter
pedagógico e o de conscientização na prevenção de acidentes e de procedi-
mentos frente a situações que envolvam PNEs, bem como o estímulo e o gosto
pela arte da dança. As oficinas, com um caráter teórico-prático, fundamentado
prioritariamente no Método Dança-Educação Física (CLARO, 1995) e nas técni-
cas de contato improvisação e dança (clássica, moderna), constituem-se numa
forma de poderem entrar em contato direto com os alunos deficientes ou não.
Nestes encontros também são mostrados vídeos sobre as deficiências (e suas
especificidades), bem como discussões sobre a temática deficiência e inclusão e
as apresentações artísticas de caráter artístico-pedagógico (SILVA, 2006, p. 36).

Em relação à expressão corporal que compõe o ensino da dança na educação


física, Haselbach (1989) considera a técnica da improvisação, na qual se enfatiza a
sensibilização do corpo, a percepção da postura, a motricidade e as formas básicas
de movimento conforme proposta por Laban em sua coreologia. Isto é, o estudo
da coreografia na dança, a orientação espacial (espaço pessoal e geral ou espaço
cênico), a percepção do tempo e suas diferenças a variação de formas básicas de
movimento ou ações, a elaboração de um repertório de material de improvisação,
o uso de objetos, figurinos, músicas, literatura, o trabalho individual e em grupos.
Em nossa experiência como professora de educação Física, o MDEF tem sido
uma estratégia recorrente para o ensino da dança e da consciência corporal, tanto
em seus pressupostos teóricos quando em suas estratégias metodológicas. Por
isso, enfatizamos aqui que a dança não é uma mera atividade ou exercício físico
capaz de melhorar o nível de aptidão dos indivíduos.

Primeiramente é preciso considerar que pensar a dança como um mero


exercício físico é no mínimo submetê-la aos objetivos de uma concepção
de Educação Física que tem excluído a história e o sentido das práticas
corporais como produções da cultura (PORPINO, 2005, p. 2).

Como possibilidade de ensino da dança na Educação Física, uma referência


significativa é apresentada por Claro (1995). Desse modo, o autor propõe um
método para o ensino da dança com base na consciência corporal, realizando
exercícios práticos de leitura corporal, exercícios no chão que permitem a
percepção do tronco, exercícios de deslocamento plenos de ritmo e desenhos
coreográficos. Esses são exercícios que permitem uma estrutura para o corpo
que dança e que podem contribuir com o aprendizado do corpo, da percepção
e de sensações para o corpo dançante.
Nesta primeira parte de nossa aula apresentamos uma síntese dos pressupostos
teóricos do MDEF. Em seguida, iremos apresentar uma aula com o MDEF, na
qual você irá perceber as estratégias metodológicas desta prática de consciência
corporal e de ensino da dança.

Aula 8 Consciência Corporal 139


Leitura complementar

CLARO, E. Método dança-educação física: uma reflexão sobre consciência


corporal e profissional. São Paulo: Robe, 1995.
O livro apresenta as estratégias teóricas e metodológicas do MDEF, além de
muitas ilustrações que ampliam os conceitos elaborados na construção do método
e uma rica bibliografia relacionada ao estudo do corpo e da consciência corporal.

Atividade 1

A partir da leitura da aula, até o momento, elabore um argumento


que relacione o MDEF à consciência corporal. Participe de um fórum
virtual, abordando essa temática.

Princípios metodológicos do MDEF


Agora que você já conhece os principais aspectos teóricos do MDEF, em especial
aqueles relacionados à consciência corporal, vamos descrever as estratégias
práticas de uma aula com essa técnica. De acordo com Claro (1995), em uma aula
do MDEF recomenda-se perceber a postura do corpo, buscando-se uma sensação
de conforto ao realizar as posturas e movimentos, bem como uma ampliação da
respiração abdominal.
A aula começa com um diagnóstico anatômico do movimento realizado por
meio da leitura corporal. Deitado, em decúbito dorsal, de preferência de olhos
fechados e respirando-se tranquilamente começa-se a perceber as partes do corpo
que tem ou não contato com o chão (exercício de propriocepção como se observa
na Figura 1). De acordo com Claro (1995), em resposta às leis da maturação
neurológica próprias ao ser humano, a leitura dos pontos de contato com o chão
deve ser proposta no sentido céfalo-caudal e próximo-distal (da cabeça para os
pés e do tronco para as mãos).

140 Aula 8 Consciência Corporal


Figura 1 – Exercício de leitura corporal.
Fonte: Autoria Própria (2014).

Essa atividade realizada no início da aula ajuda também na concentração e no


relaxamento que pode melhorar o desenvolvimento na aula. O mesmo trabalho pode
ser feito ao final, como estratégia de observação de como o aluno(a) se sente antes
e depois, facilitando também a percepção de si mesmo e do trabalho desenvolvido.
Logo, uma das lições marcantes do MDEF diz respeito à atenção e ao cuidado com
o corpo ao se passar da postura deitada para a sentada. Dessa forma, Claro (1995)
recomenda que sejam utilizadas as alavancas dos membros superiores, ao invés de se
tensionar os músculos lombares. Para tanto, sugere-se ficar de lado, apoiar os braços
e mãos e erguer o tronco com a força dessas alavancas dos membros superiores.
Na posição sentada, ainda como parte da preparação do corpo para a aula,
estimula-se o contato consigo mesmo por meio da automassagem em todo corpo,
proporcionando a percepção do nível de tensão muscular, juntamente com a
sensação agradável de relaxamento.
Feito esses exercícios preparatórios, começa-se o “chão do MDEF”, com exercícios
de contração e expansão do tronco advindos da técnica de dança moderna. Em
seguida, no chão do MDEF, são trabalhadas qualidades físicas específicas como
alongamento, flexibilidade e fortalecimento muscular. Nas Figuras 2 e 3, você pode
observar dois desses exercícios de alongamento propostos no MDEF.

Figura 2 – Exercício de alongamento da


musculatura posterior.
Fonte: Autoria Própria (2014).

Aula 8 Consciência Corporal 141


Figura 3 – Alongamento do tronco com
pernas em abdução.
Fonte: Autoria Própria (2014).

Após o chão, trabalha-se o centro do MDEF, com o desenvolvimento de quali-


dades físicas específicas tais como o equilíbrio estático e dinâmico, a coordenação
e a soltura muscular. Nas Figuras de 4 a 6, você pode observar alguns desses
exercícios específicos tais como os pliés (flexão de pernas), o elevé (equilíbrio) e
caminhas ao ritmo da música para soltura e descontração do corpo.

Figura 4 – Plié.
Fonte: Autoria Própria (2014).

Figura 5 – Elevé.
Fonte: Autoria Própria (2014).

142 Aula 8 Consciência Corporal


Figura 6 – Soltura.
Fonte: Autoria Própria (2014).

No centro do Método, trabalham-se ainda deslocamentos com a realização


de battements (chutes com as pernas) e giros, como você pode observar nas
Figuras 7 e 8. Nota-se que o centro do MDEF apropria-se de muitos movimentos
oriundos da dança clássica, da dança moderna e também do jazz.

Figura 7 – Deslocamento com battements.


Fonte: Autoria Própria (2014).

Aula 8 Consciência Corporal 143


Figura 8 – Estudo do giro.
Fonte: Autoria Própria (2014).

Após os deslocamentos, geralmente feitos no espaço diagonal da sala, propõe-


-se o desenho coreográfico como um princípio educativo e artístico de importante
motivação na dança. Desse modo, no desenho coreográfico proposto pelo MDEF
alia-se a criação do professor e a do aluno, assim incentiva-se também a criação
de movimentos dançantes pelos alunos e não apenas pelo professor.
Essas são apenas algumas estratégias práticas que compõem o MDEF, sendo
propostas de acordo com os objetivos da aula, necessidades do grupo, entre
outros aspectos. Pode-se ampliar as estratégias respeitando-se a estrutura do
MDEF e seus exercícios de preparação do corpo, o chão do MDEF, o estudo do
movimento e das qualidades físicas, o deslocamento no espaço e o estudo do
giro e a iniciação a processos coreográficos.
Portanto, o corpo, a música, a alegria de se movimentar são partes integrantes
do MDEF. Com essa prática percebemos muitas transformações em nosso corpo, em
nossas percepções, emoções e conhecimentos. Claro (1995) apresenta também
uma série de depoimentos de profissionais de várias áreas que tiveram acesso
ao MDEF em suas vidas. Assim, em todos eles é possível perceber que a consci-
ência corporal é um aspecto citado e que foi capaz de ampliar a percepção e as
experiências dos diversos grupos destacados na trajetória profissional de Edson
Claro e do seu MDEF.
Portanto, o MDEF pode contribuir para transformar a relação com o corpo
na formação de professores de Educação Física, motivados e engajados com a
consciência corporal. É somente por meio da experiência vivida que os conceitos
fazem sentidos para nós, sentidos carregados do afeto que nos faz humanos,
com limites e possibilidades.

144 Aula 8 Consciência Corporal


Leituras complementares

Solo (Coreografia Edson Claro, 1998). Disponível em: <https://www.youtube.


com/watch?v=1JRwlor-XmA>. Acesso em: 27 maio 2014.

Petrus (Coreografia Edson Claro, 2012). Disponível em: <https://www.


youtube.com/watch?v=sk8ZHOsZrdU>. Acesso em: 27 maio 2014.

Sugerimos a apreciação de alguns vídeos de dança, coreografados por Edson


Claro, ao longo de sua trajetória de vida. Ele que amava a dança como forma de
autoconhecimento, de arte e de celebração da vida.

Atividade 2

Em grupos, faça uma pesquisa em sua cidade, região ou na in-


ternet a respeito do ensino da dança e sua relação com a consciên-
cia corporal. Procure locais e profissionais que conheçam o MDEF
e faça uma entrevista. Assim, indague sobre os aspectos teóricos,
a percepção do corpo, aspectos metodológicos da técnica e os
benefícios da prática. Por fim, preparem um relatório contendo o
estudo da realidade e apresente seu trabalho ao tutor. Pode incluir
fotos e vídeos.

Resumo

Nesta aula, apresentamos os pressupostos teóricos e práticos do


Método Dança-Educação Física e suas relações com a consciência
corporal. A partir dos pressupostos teóricos e metodológicos
apresentados, pode-se ter uma visão ampla das relações entre corpo,
dança e educação física.

Aula 8 Consciência Corporal 145


Autoavaliação
No MDEF, Claro (1995) apresenta um questionário para reflexão sobre a
consciência corporal e a formação profissional. Por isso, adaptamos algumas
dessas questões como forma de autoavaliação. Você deve respondê-las e entregar
o material ao tutor da disciplina.

1 O que é conscientização corporal?

2 O que é conscientização profissional?

3 Há relação entre as duas perguntas anteriores?

Cite três livros, que você já leu, relacionados à educação física, com o
4 título, o ano da obra e o nome do autor.

Cite um filme, um espetáculo de dança, de teatro, música, jogo que


5 você viu (sem ser pela televisão), com data e local.

6 Tem hábito de estudar? Como?

Com que tipo de atividade física você equilibra sua manutenção


7 corporal e qual é a regularidade dessa atividade?

8 O que acha da profissão “Professor de Educação Física”?

O que tem feito para melhorar a si mesmo e a categoria (como profis-


9 sional ou estudante)?

Trace um paralelo do que você pensava sobre educação física antes,


10 durante a universidade e do que pensa na atualidade.

146 Aula 8 Consciência Corporal


Referências
CLARO, E. Método dança-educação física: uma reflexão sobre consciência
corporal e profissional. São Paulo: Robe, 1995.

_____. Considerações sobre um curso de pós-graduação latu sensu em


Dança-Educação Física. 1994. 150f. Tese (Doutorado em Psicologia) –
Programa de Pós-Graduação em Psicologia, Universidade de São Paulo, São
Paulo, 1994.

FUX, M. Dança, experiência de vida. São Paulo: Summus, 1983.

HASELBACH, B. Dança, improvisação e movimento: expressão corporal na


Educação Física. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1989.

PORPINO, K. O. Interfaces entre arte e educação física: reflexões sobre o corpo e a


dança no cenário educativo. In: ENCONTRO NACIONAL DE ENSINO DE ARTES E
EDUCAÇÃO FÍSICA, 2., 2005, Natal. Anais... Natal: UFRN, 2005. p. 1-7.

SILVA, E. M. Para além da dança: o caso Roda viva. 2006. 98f. Dissertação
(Mestrado em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação,
Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2006.

Anotações

Aula 8 Consciência Corporal 147


Anotações

148 Aula 8 Consciência Corporal


Corpo, sexualidade e
afetividade na formação do
ser humano

Aula

9
Apresentação

O
lá! Nesta aula, vamos abordar o tema das relações entre corpo, afetividade
e sexualidade. Tal temática faz parte dos conteúdos transversais da educação
básica, sendo um conteúdo que atravessa a nossa vida desde a mais tenra
infância e, como tal, merece ser abordado na formação em Educação Física.
Os laços afetivos nos constituem como seres de desejo. Tais laços vão sendo
tecidos ao longo da nossa história íntima e pessoal, mas também são recortados
pelos aspectos históricos e sociais. Nesta aula, destacamos os estudos do filósofo
francês Michel Foucault sobre a temática, a teoria da sexualidade freudiana e a
compreensão fenomenológica do afeto.
Trata-se de uma temática importante para a formação de professores de
educação Física que lidam diretamente com as questões da corporeidade.
Você também terá a oportunidade de retomar conteúdos teóricos e práticos
já trabalhados na disciplina de consciência corporal, em especial nas aulas sobre
o tocar e o contato humano e sobre a bioenergética e a biossíntese (Aulas 5 e 6,
respectivamente). Sugerimos, ainda, atividades e leituras complementares como
forma de ampliar seus conhecimentos sobre o assunto.

Objetivos

Analisar aspectos históricos e culturais da


1 relação entre corpo e sexualidade.

Analisar aspectos da afetividade e sua relação


2 com a corporeidade.

151
Uma breve história da sexualidade

O
filósofo francês Michel Foucault nos apresenta uma história da sexualidade
cuja leitura nos permite compreender como, ao longo de nossa sociedade
ocidental, diversas instituições (medicina, família, igreja, escola) foram
construindo discursos sobre a sexualidade (FOUCAULT, 1985; 1998; 1999).
De acordo com Foucault (1979), até meados do século XVI, a Igreja controlou
a sexualidade de maneira bastante frouxa com a obrigação do sacramento da
confissão anual. Mas, a partir do Concílio de Trento, em meados do século XVII,
assistiu-se a propagação de uma série de procedimentos novos, técnicas de autoe-
xame, de direção da consciência, de um movimento de controle e punição do sexo.
Para Foucault (1979; 1999), é possível perceber uma hipótese repressiva
caracterizada pela restrição e pelo controle dos discursos sobre o sexo, bem
como a institucionalização dos discursos. Nesse sentido, somos herdeiros de
uma moral baseada na família conjugal, cujo casal legítimo e procriador dita a
lei e dá lugar a uma série de sexualidades ilegítimas.
Esse dispositivo que constitui a sexualidade é formulado por uma espécie
de scientia sexualis, ou seja, uma ciência sexual, cuja pretensão é, entre outras
coisas, falar do sexo de forma neutra. Uma ciência subordinada aos imperativos
de uma moral médica normalizadora. Uma ciência defasada da própria fisiologia
do século XIX, por considerar a sexualidade apenas do ponto de vista da repro-
dução (FOUCAULT, 1979; 1999).
De acordo com Foucault (1999), o dispositivo da sexualidade é responsável
também pela administração do sexo. Tal administração ocorre basicamente por uma
teoria da degenerescência cuja matriz explicativa encontra-se na hereditariedade
carregada de doenças diversas. Assim, deve-se evitar a promiscuidade e o sexo deve
restringir-se ao casal, de preferência pertencentes à mesma classe social. Desse modo,
busca-se assegurar o capital patológico da espécie, garantido pela hereditariedade,
que ditava regras para os casamentos e as alianças de sangue.
A burguesia converteu o sangue azul em um organismo são e em uma
sexualidade sadia e opôs resistências para reconhecer um corpo e um sexo nas
classes que explorava ao mesmo tempo em que construía para si uma cultura
do corpo com diferentes cuidados, entre eles os métodos ginásticos e a educa-
ção física (FOUCAULT, 1979). Nas classes populares, dados os muitos conflitos
no espaço urbano, tais como a coabitação, proximidade, contaminação, epide-
mias, prostituição, doenças venéreas, a higiene exerceu um controle rigoroso
dos corpos. Urgências econômicas advindas do processo de industrialização e
a necessidade de mão de obra estável e competente também contribuíram para
o controle da população. Esses aspectos históricos e sociais nos ajudam a com-
preender como o nosso corpo é atravessado por questões sociais e culturais das
mais diversas naturezas, tais como as médicas, religiosas e econômicas.
De acordo com Foucault (1979), o biopoder, ou seja, o investimento sobre o
corpo vivo, sua valorização e gestão de suas forças, apresenta-se como uma das
estratégias políticas de controle social. O filósofo nos apresenta uma reflexão

Aula 9 Consciência Corporal 153


sobre o modo como esse controle opera a partir de duas noções fundamentais: o
corpo máquina e o corpo-espécie. No século XVII, o corpo foi comparado a uma
máquina, cujo dispositivo disciplinar assegurava a disciplina do corpo (adestra-
mento, docilidade, utilidade) possível através das disciplinas anátomo-políticas do
corpo, em especial a medicina e a higiene. Mas esse controle vai assumindo outras
formas e o corpo-máquina, cujo controle era exercido diretamente no corpo dos
indivíduos (soldados, escolares, criminosos, trabalhadores da fábrica), vai se am-
pliando, a partir do século XVIII, para o corpo-espécie, ou seja, o corpo como suporte
de processos biológicos (nascimento, longevidade, mortalidade, níveis de saúde).
Na formação do capitalismo, a pressão biológica sobre o histórico foi se
afrouxando (controle de epidemias, fome, morte), com isso há uma normalização
médica da vida por meio da administração do corpo e do sexo. Para problematizar
essa normalização do sexo, Foucault retoma a compreensão dessa temática na
antiguidade greco-romana, na qual se cultivou não uma sexualidade tal como a
compreendemos hoje, mas uma ars erótica, uma arte erótica.
Na Grécia, a verdade e o sexo se ligavam na forma da pedagogia, pela
transmissão corpo a corpo de um saber precioso. O sexo servia como suporte
às iniciações do conhecimento. De acordo com Foucault (1998), é na confissão
que se liga a verdade e o sexo, pela expressão obrigatória e exaustiva de um
segredo individual.
As sexualidades múltiplas, as que aparecem com as idades, as que se fixam
nos gostos e práticas, as que investem difusamente no relacionamento, as que
habitam os espaços definidos, são produtos da interferência de um tipo de poder
sobre o corpo e sobre o prazer. A arte erótica não desapareceu completamente da
civilização ocidental, podendo ser encontrada na multiplicação e intensificação
dos prazeres ligados à produção da verdade sobre o sexo, nos livros, consultas
e exames, narrativas, fantasias, entre outros fragmentos errantes da ars erotica.
Cabe esclarecer que compreendemos o cultivo do corpo na esteira das artes do
exercício, cuja natureza requer um bom regime somático, um regime completo
da alma e do corpo. Não se trata de instaurar uma luta da alma contra o corpo,
ao modo dualista da questão, mas sim de conduzir o corpo segundo uma lei que
é a do próprio corpo.
Esse regime discutido por Foucault (1985), em relação aos prazeres sexuais,
aplica-se também ao regime das práticas corporais, ao exercício do corpo e da
alma em que a produção de um estilo de vida excitado, no sentido lúdico e
contemplativo do termo, possa ultrapassar a gestão disciplinadora da vida.
Essa breve história da sexualidade, baseada nos estudos filosóficos de Michel
Foucault, especialista no tema, nos permite compreender diferentes sentidos que
ligam o corpo e a sexualidade, assim como nos faz perceber o corpo como espaço
ao mesmo tempo íntimo e social.
De acordo com Brasil (2000), a sexualidade tem grande importância no
desenvolvimento e na vida psíquica das pessoas, pois, além da sua potencialidade
reprodutiva, relaciona-se com a busca do prazer, necessidade fundamental das
pessoas. Sobre a sexualidade, temos que esta:

154 Aula 9 Consciência Corporal


[...] manifesta-se desde o momento do nascimento até a morte, de formas
diferentes a cada etapa do desenvolvimento humano, sendo construída ao
longo da vida. Além disso, encontra-se necessariamente marcada pela história,
cultura, ciência, assim como pelos afetos e sentimentos, expressando-se
então com singularidade em cada sujeito. Indissociavelmente ligado a valores,
o estudo da sexualidade reúne contribuições de diversas áreas, como
Educação, Psicologia, Antropologia, História, Sociologia, Biologia, Medicina
e outras. Se, por um lado, sexo é expressão biológica que define um conjunto
de características anatômicas e funcionais (genitais e extragenitais), a
sexualidade, entendida de forma bem mais ampla, é expressão cultural.
Cada sociedade desenvolve regras que se constituem em parâmetros funda-
mentais para o comportamento sexual das pessoas (BRASIL, 2000, p. 295).

Antes de continuar a discussão sobre a sexualidade, sugerimos a leitura do


mito de Eros e Psique, como possibilidade de ampliar o horizonte de compreensão
dessa temática, considerando-se a relação entre o corpo e a alma, tema fundamental
da consciência corporal.

Saiba Mais

O mito de Eros e Psique


“Vênus (Afrodite), enciumada com a beleza de Psique, chama seu
filho alado Eros (Cupido) e pede a ele que castigue a bela mortal,
fazendo-a apaixonar-se por um ser inferior. Eros preparou-se para
obedecer às ordens maternas e encheu dois vasos de âmbar, cada um
com água das duas fontes do Jardim de Vênus, uma de água doce e
outra de água amarga. Derramou sobre Psique algumas gotas da fonte
de água amarga, mas distraído, tocou-a com a ponta de sua flecha. Ao
contato, Psique acordou e abriu os olhos diante de Eros, ele próprio
invisível. Perturbado com imensa beleza, o deus do amor feriu-se com
sua própria flecha. Encantado, derramou as gotas balsâmicas sobre os
cabelos da jovem, apaixonando-se perdidamente por Psique.
Daí em diante, Psique permanecerá sozinha. Irritada com uma beleza
estéril, pois não conseguia despertar o amor de nenhum homem. O
pai de Psique consulta o oráculo de Apolo e é advertido que a virgem
não se destina a nenhum mortal. Seu futuro marido a espera em uma
montanha, mas se trata de um monstro a que nem os deuses, nem os
homens podem resistir.
A jovem decide enfrentar seu destino e vai até a montanha. O gentil
Zéfiro a conduz suavemente até o vale florido. Cansada da viagem,
adormece na relva e, ao despertar, caminha pelo bosque até o Palácio

Aula 9 Consciência Corporal 155


de Vênus. Enquanto admirava o palácio, uma voz se faz ouvir: Soberana
dama, que vês é teu. Psique ainda não vira o marido que lhe estava
destinado, mas suas visitas eram repletas de amor e inspiraram nela
uma paixão semelhante. Pisque insistia em vê-lo, mas ele se negava:
Por que queres me ver? Podes duvidar do meu amor? Tens algum desejo
não satisfeito? Se me vires, talvez fosses temer-me, talvez adorar-me,
mas a única coisa que te peço é que me ames. Prefiro que me ames
como igual a que me adores como um deus.
Psique diz que sente saudades da família e o marido permite que
as irmãs possam visitá-la no palácio. Zéfiro conduz as duas irmãs de
Psique. Ambas fizeram inúmeras perguntas e encheram o coração da
jovem de sombras e desconfianças: os habitantes deste vale dizem que
teu marido é uma terrível serpente, que te nutre a fim de devorar-te.
Aconselharam-na a matar o monstro e assim recuperar a liberdade.
Psique resistiu aos conselhos o quanto pôde, mas certo dia, quando
o marido adormeceu, levantou-se e com uma lâmpada enxergou não
um monstro, mas o mais belo e encantador dos deuses, com madeixas
louras caindo sobre o pescoço cor de neve e as faces róseas, um par
de asas nos ombros, brancas e brilhantes como as flores da primavera.
Ao baixar a lâmpada, uma gota de óleo caiu no ombro do deus que,
assustado, abriu os olhos e enxergou psique. Tola Psique, é assim que
retribui o meu amor? Não lhe imponho outro castigo a não ser deixar-te
para sempre. O amor não pode conviver com a desconfiança.
O palácio desapareceu e Psique começou a vagar sem repouso, nem
alimento, à procura de Eros. Estava decretado o doloroso itinerário de
Psique. Vênus não aceita o amor de Eros e Psique e ainda mais brava,
envia Mercúrio, o mensageiro dos deuses, para buscar a jovem. Vênus
despe-lhe as vestes, arranca-lhe os cabelos e espanca-lhe. Em seguida,
impôs-lhe quatro célebres tarefas: Separar uma grande quantidade de
grãos, de naturezas variadas, por espécie; trazer-lhe flocos de lã de
ouro que cobriam o dorso de ovelhas ferozes; trazer-lhe em um vaso
de cristal água de uma fonte guardada por dois dragões e, a mais difícil:
trazer-lhe uma caixa contendo o creme da beleza imortal. Psique
consegue realizar as tarefas, exceto a última. Em busca da beleza
imortal, não resistiu e abriu a caixa. No mesmo instante, um sono
profundo apoderou-se da jovem que dormiu profundamente.
Eros, já curado do ferimento, vai até psique e recoloca cuidadosa-
mente na caixa o sono letárgico encomendado por Vênus a Perséfone.
Desse modo, Eros ajuda psique a completar sua tarefa. Para garantir
sua união com Psique, o jovem deus pede a Zeus que interceda pelos
amantes e assim o senhor do Olimpo ordenou a Hermes que convocasse
todos os deuses para uma assembleia. A união de Eros e Psique foi
aprovada por todos os imortais. Tão logo, a jovem chegou à mansão

156 Aula 9 Consciência Corporal


dos deuses, Zeus lhe deu uma taça de ambrósia, a bebida da imortalidade.
Com muito néctar, música, dança, rosas e bálsamos, sob as bênçãos de
Afrodite, Eros e Psique se reuniram para sempre. Dessa união nasceu
logo uma menina, que, na língua dos mortais, se chama Volúpia, quer
dizer, o prazer e a bem-aventurança”.
EROS – o amor personificado significa o desejo incoercível dos sentidos.
PSIQUE – a alma personificada significa o princípio vital.
Com esse mito podemos compreender as relações entre o corpo e
alma, o sexo e o amor.
Fonte: BRANDÃO, J. S. Mitologia grega. Petrópolis: Vozes, 2001.

Leitura complementar

KINSEY – Vamos falar de sexo. Direção de Bill Condon. EUA, 2004. Disponível
em <http://www.filmesonlinegratis.net/assistir-kinsey-vamos-falar-de-sexo-
dublado-online.html>. Acesso em: 7 jun. 2014.
O filme conta a história de Alfred Kinsey sobre o comportamento sexual
masculino. Com base em critérios científicos reducionistas, o sexo é explicado
como simples estado corporal. O corpo é visto como objeto sem relações com a
intencionalidade, com a subjetividade. Por isso a importância de compreender os
aspectos históricos dessa questão, como podemos perceber na leitura de Michel
Foucault ou no mito de Eros e Psique. Aprecie o filme e reflita sobre essas questões.

Atividade 1

A partir da leitura do texto, responda as questões a seguir:

1 Como se constitui a hipótese repressiva da sexualidade?

2 Como se dá o controle da sexualidade por meio do corpo?

Participe de um fórum virtual debatendo com os colegas e com


o tutor essas questões.

Aula 9 Consciência Corporal 157


O corpo dos afetos
Caro(a) aluno(a), você deve lembrar-se das aulas sobre o tocar e o contato
humano e sobre a bioenergética e a biossíntese (Aulas 5 e 6) nas quais aborda-
mos questões relacionadas ao corpo, a afetividade e a sexualidade. Sugiro que
você retome essas aulas para consolidar sua aprendizagem e abrir horizontes de
conhecimento em sua formação antes de prosseguirmos com nosso conteúdo.
Nestas aulas, você irá acompanhar conceitos, métodos e técnicas que permitem
sensibilizar o ser humano para a questão da afetividade, do sentir, do tocar, do
contato humano.
Então, agora que você já está sensibilizado com a nossa temática, vamos
trazer uma abordagem significativa para nosso estudo, a abordagem freudiana.
Você já deve ter escutado a frase “Freud explica”. Essa frase tão banal contém uma
teoria que explica a constituição do psiquismo humano a partir do inconsciente
e também da relação com a sexualidade.
Essa teoria criada pelo médico neurologista, criador da Psicanalise Sigmund
Freud (1856-1939), investiga as profundas relações entre o Eu (nosso sentimento
de nós mesmos) e o Id (entidade psíquica inconsciente), sendo responsável pelo
modo como gerimos nossa vida de relações, percepções, afetos, pensamentos,
atitudes (FREUD, 2011).
De acordo com Freud (2011), como seres de desejo buscamos satisfazer nossas
carências, nossas necessidades. Tal aspecto de nossa conduta por vezes pode
gerar frustração e sofrimento. Assim, com a Psicanálise, buscamos compreender
as causas desse sofrimento e as técnicas de sublimação que irão nos aliviar do
sofrimento causado pela frustração cada vez que o mundo ou as pessoas que
amamos, que desejamos, nos dizem não. De acordo com a diversidade de
experiências, podemos então nos dedicar a carreira, a vida amorosa, a família,
a fruição de obras de arte, por exemplo, como formas de sublimar nosso desejo,
nossa carência, nossa necessidade de amor e de reconhecimento afetivo e social.
Um aspecto fundamental da teoria freudiana diz respeito às fases da sexualidade
humana. De acordo com Freud (1997), as fases podem ser assim enumeradas:
Fase oral – 0 a 2 anos (boca, o seio materno, objetos)
Fase anal – 2 a 3 anos (reter e expelir fezes)
Fase fálica – 3 a 7 anos (interesse pelo corpo, micção)
Fase de latência – 5 a 10 anos (ternura)
Fase genital – após os 0 anos (libido, órgãos sexuais, prazer)
Essas fases não são estanques e referem-se mais a situações e atitudes em
que o corpo é preenchido de sentidos afetivos. A fase oral, por exemplo, não se
fixa na boca, mas reintegra-se a relação com o outro, uma relação de cuidado
materno que pode ser satisfeita pelo seio da mãe, da figura cuidadora ou de um
objeto de substituição, como uma mamadeira por exemplo. Nessa relação, o
olhar possui um sentido expressivo e liga afetivamente esses dois seres humanos
que desempenham o papel de filho e de mãe.

158 Aula 9 Consciência Corporal


De acordo com Merleau-Ponty (1994), o corpo faz as coisas existirem para
nós, assim, a experiência erótica, relacionada ao prazer, encontra na relação
com o corpo próprio e com o corpo dos outros sentidos de ternura, atenção,
amizade ou amor. Merleau-Ponty (1994) recorre à teoria freudiana para dizer que
a sexualidade não é um automatismo ou uma relação consciente, sendo preciso
reintegrá-la no conjunto das experiências afetivas e existenciais.
Muitos adultos apresentam dificuldade de comunicação de linguagem ou
mesmo incapacidade de falar (afasia), distúrbios relacionados ao ato de comer
ou compulsões como fumar, por exemplo, que podem ser sintomas de recalques
ocorridos nessa fase da experiência vivida. Mas a relação entre atos e sintomas
não é linear e a explicação psicanalítica nunca é definitiva, são apenas pistas
para tentarmos compreender a profunda relação entre o nosso eu consciente e
o inconsciente tal como formulado por Freud.
Merleau-Ponty (2006) também recorre aos trabalhos de Wallon sobre a
percepção do corpo na criança. Essa percepção inicia-se com a boca, trata-se de
um corpo bucal, não havendo diferenciação entre exteroceptividade, ou seja,
sensações provindas do meio externo e a interoceptividade, as sensações
internas. A percepção do outrem começa a se estabelecer ainda muito cedo, por
volta dos três meses, quando o recém-nascido começa a escutar a voz humana
que provoca sorrisos, gritos ou mesmo o choro. Os primeiros olhares começam
a se surgir ao fixar alguns objetos e outros olhares. Somente após os seis meses
a criança transfere para si a percepção do outro. O crescimento prossegue e essa
percepção vai se complexificando com o reconhecimento da imagem especular
de outra pessoa (fase do espelho).
De acordo com Merleau-Ponty (2006) esses dados advindos da psicanalise
nos ajudam a fazer uma análise concreta dos outros ou de si mesmo, ampliando
nossa compreensão das relações entre corpo, sexualidade e afetividade no campo
da consciência corporal.
De acordo com Brasil (2000), a discussão sobre a inclusão da temática da
sexualidade no currículo das escolas de ensino fundamental e médio vem se
intensificando desde a década de 1970, provavelmente em função das mudanças
comportamentais dos jovens dos anos 1960, dos movimentos feministas e de grupos
que pregavam o controle da natalidade. Com diferentes enfoques e ênfases, há
registros de discussões e de trabalhos em escolas desde a década de 1920. A
retomada contemporânea dessa questão deu-se juntamente com os movimentos
sociais que se propunham, com a abertura política, repensar o papel da escola e
dos conteúdos por ela trabalhados. Mesmo assim não foram muitas as iniciativas
tanto na rede pública como na rede privada de ensino.
Dada a importância da temática, essa vem sendo abordada como conteúdo
da educação básica a partir de meados dos anos 1980. Nesse sentido, Brasil
(2000) destaca que:

Aula 9 Consciência Corporal 159


A partir de meados dos anos 80, a demanda por trabalhos na área da sexuali-
dade nas escolas aumentou em virtude da preocupação dos educadores com o
grande crescimento da incidência de gravidez indesejada entre as adolescentes
e com o risco da infecção pelo HIV (vírus da Aids1) entre os jovens. Antes,
acreditava-se que as famílias apresentavam resistência à abordagem dessas
questões no âmbito escolar, mas atualmente sabe-se que os pais reivindicam
a orientação sexual nas escolas, pois reconhecem não só a sua importância
para crianças e jovens, como também a dificuldade de falar abertamente
sobre o assunto em casa. Uma pesquisa do Instituto Data Folha, realizada
em dez capitais brasileiras e divulgada em junho de 1993, constatou que
86% das pessoas ouvidas eram favoráveis à inclusão de Orientação Sexual
nos currículos escolares. As manifestações da sexualidade afloram em todas
as faixas etárias. Ignorar, ocultar ou reprimir são respostas habituais dadas
por profissionais da escola, baseados na ideia de que a sexualidade é assunto
para ser lidado apenas pela família (BRASIL, 2000, p. 291).

De acordo com Louro, Neckel e Goellner (2003), o corpo tem sido objeto da
mais meticulosa atenção, não apenas nas escolas, mas em muitas instituições
que se ocuparam de vigiar, controlar, modelar, corrigir, construir o corpo de
meninos e meninas, jovens, homens e mulheres. Nesse processo, as dimensões
de gênero e de sexualidade usualmente se tornam alvo de atenção privilegiada.
Publicidade, cinema, televisão, revistas, agências de modelos, academias de
ginástica, campanhas religiosas ou de saúde constituem-se como pedagogias
culturais e se voltam diretamente para os corpos dos sujeitos.
Nesse campo das pedagogias culturais, cabe problematizar os padrões de
gênero, beleza relacionados ao corpo e a seus afetos. No contexto da consciência
corporal, sugerimos algumas estratégias para lidar com essas questões como
técnicas de sensibilização corporal. O cinema também pode ser um aliado nesse
processo de apreciação e percepção da realidade.
Dias (2013) faz uma apreciação do filme Billy Elliot, dirigido por Stephen
Dalry, no ano 2000. No filme Billy Elliot, a luta e a dança, representadas pelo
boxe e pelo balé, são técnicas de corpo construídas socialmente, que educam os
sujeitos a partir de determinadas formas de usos do corpo e também de representações
sociais. Billy prefere a dança ao boxe. O autor destaca cenas do filme que proble-
matizam a construção essencialista do gênero masculino e feminino relacionado
às atitudes, padrões corporais e desejos.
Nessa discussão entre gênero e sexualidade, Fraga (2000) apresenta um estudo
significativo no cotidiano de uma escola. O autor acompanhou aulas de educação
física, observando essas questões que dizem respeito ao processo de educação
e de configuração de um modo de ser. Os adolescentes observados, bem como
os professores, apresentam estereótipos de gênero em relação as atividades
desenvolvidas, como o futebol e a dança, nas relações entre meninos e meninas
e outros enunciados que dizem respeito a uma certa moralidade marcada no
corpo de alunos e professores.

160 Aula 9 Consciência Corporal


Além do gênero, outra questão que podemos relacionar ao corpo, à sexualidade
e à dimensão dos afetos diz respeito à ética. Marzano-Parisolli (2004) discute as
reações entre corpo, sexualidade e ética com destaque para a questão do desejo e
da intencionalidade. Para a autora, a sexualidade pode revelar melhor do que em
outras experiências a relação estreita entre corpo e ética. O desejo, a excitação
sexual e o prazer são estados corporais altamente complexos que adquirem uma
significação intencional que nem sempre é o mesmo para todos.
De acordo com a autora, “é a nossa carícia que exprime nossa abertura e
nossa disponibilidade para dar o nosso corpo a outra pessoa, assim como é a
expressão corporal de outra pessoa que exprime sua abertura e disponibilidade”
(MARZANO-PARISOLI, 2004, p. 111). Um pouco como exprime o poeta Carlos
Drummond de Andrade, em Quadrilha: “João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili que não amava ninguém
[...]”. O amor, o desejo precisa ser vivido a dois, compartilhado.
De acordo com Marzano-Parisoli (2004), quando a questão da intencionalidade
não é observada, o corpo vira um corpo-instrumento e a pessoa perde sua
autonomia, sua subjetividade. Considerar o corpo-sujeito é considerar a relação
entre desejo e amor, entre o corpo que temos e o corpo que somos, aliando a
excitação com a intenção, com a vontade de estar com alguém, de partilhar a
intimidade do corpo e de suas sensações eróticas. Quando amamos alguém e a
desejamos, desejamos também seu corpo. Mas, em uma relação afetiva e ética,
o desejo não pode estar dissociado da motivação, da intencionalidade, do
consentimento de ambos na relação.
Esses são alguns aspectos da relação entre corpo, sexualidade e afetividade
que podem contribuir para a consciência corporal na formação dos professores
de Educação Física.

Aula 9 Consciência Corporal 161


Leituras complementares

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Fundamental. Parâ-


metros Curriculares Nacionais: orientação sexual. Brasília: MEC/SEF, 2000.
Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/orientacao.pdf>.
Acesso em: 7 jun. 2014.
Trata-se de um documento de referência para a educação básica com orientações
didáticas para a abordagem do tema da sexualidade na escola.

BILLY Elliot. Direção de Stephen Dalry. Reino Unido,1999. Disponível em:


<http://www.adorocinema.com/filmes/filme-11295/>. Acesso em: 7 jun. 2014.
“Billy Elliot (Jamie Bell) [é] um garoto de 11 anos que vive numa pequena
cidade da Inglaterra, onde o principal meio de sustento são as minas da cidade.
Obrigado pelo pai a treinar boxe, Billy fica fascinado com a magia do balé, ao
qual tem contato através de aulas de dança clássica que são realizadas na mesma
academia onde pratica boxe. Incentivado pela professora de balé (Julie Walters),
que vê em Billy um talento nato para a dança, ele resolve então pendurar as
luvas de boxe e se dedicar de corpo e alma à dança, mesmo tendo que enfrentar
a contrariedade de seu irmão e seu pai [quanto à] sua nova atividade”.

Atividade 2

Em grupos, faça uma pesquisa sobre temas relacionados à se-


xualidade que podem ser abordados nas aulas de Educação Física.
Escolha um desses temas (gravidez, aborto, doenças sexualmente
transmissíveis, pornografia, perversões, amor, gênero etc.) e ela-
bore um plano de aula relacionando-o com a consciência corporal.
Você pode escolher práticas corporais já abordadas na disciplina
de consciência corporal ou em outras disciplinas de sua formação,
filmes, textos ou músicas para a elaboração deste plano de aula.
Ele deve conter uma apresentação da temática, especificação da
turma, a idade dos alunos, o espaço físico e o material a ser utili-
zado. Deve conter necessariamente os objetivos, os conteúdos, a
metodologia. Avaliação e referências bibliográficas.

162 Aula 9 Consciência Corporal


Resumo

Nesta aula, abordamos aspectos históricos e sociais da sexualidade


com base nos estudos de Michel Foucault. Apresentamos, ainda,
aspectos da teoria psicanalítica da sexualidade e aspectos pedagógicos
relacionados ao corpo, à educação e às questões de gênero. Esses
aspectos contribuem para ampliar a compreensão de consciência
corporal nas aulas de Educação Física.

Autoavaliação
Você possui algum tabu ou preconceito em relação à sexualidade? Reflita
sobre o tema e participe de um debate organizado pelo tutor de seu polo. Para
expressar seu ponto de vista, você pode lançar mão de algumas estratégias, tais
como um desenho, produzir um pequeno vídeo, escolher uma música, entre
outras possibilidades.

Referências
BRANDÃO, J. S. Mitologia grega. Petrópolis: Vozes, 2001.

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Fundamental.


Parâmetros Curriculares Nacionais: orientação sexual. Brasília: MEC/SEF,
2000. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/orientacao.
pdf>. Acesso em: 7 jun. 2014.

DIAS, J.C.N.S. Do corpo como expressão: reflexões a partir do filme Billy Elliot.
In: DIAS, J.; TERRA, J.; BITTENCOURT, J. Intacta retina: corpo em movimento,
cinema e sociedade. Maceió: Editora da UFAL, 2013. p. 91-102. v. 2.

FOUCAULT, M. Microfísica do poder. Rio de Janeiro: Graal, 1979.

______. História da sexualidade: a vontade de saber. 13. ed. Rio de janeiro:


Graal, 1999. v. 1.

______. História da sexualidade: o uso dos prazeres. Rio de Janeiro: Graal,


1998. v. 2.

______. História da sexualidade: o cuidado de si. Rio de Janeiro: Graal, 1985. v. 3.

Aula 9 Consciência Corporal 163


FRAGA, A. Corpo, identidade e bom-mocismo: cotidiano de uma
adolescência bem comportada. Belo Horizonte: Autêntica, 2000.

FREUD, S. O mal-estar na civilização. São Paulo: Companhia das Letras, 2001.

______. Três ensaios sobre a sexualidade. São Paulo: Imago, 1997.

LOURO, G.; NECKEL, J; GOELLNER, S. (Org.). Corpo, gênero e sexualidade:


um debate contemporâneo na educação. Petrópolis: Vozes, 2003.

MARZANO-PARISOLLI, M. Pensar o corpo. Petrópolis: Vozes, 2004.

MERLEAU-PONTY, M. Fenomenologia da percepção. São Paulo: Martins


Fontes, 1994.

______. Psicologia e pedagogia da criança. São Paulo: Martins fontes, 2006.

Anotações

164 Aula 9 Consciência Corporal


Anotações

Aula 9 Consciência Corporal 165


Anotações

166 Aula 9 Consciência Corporal


O conhecimento do corpo nas
aulas de Educação Física

Aula

10
Apresentação

C
aro(a) aluno(a), chegamos à nossa última aula. Espero que você tenha
apreciado o conteúdo de nossa disciplina, os textos, atividades, leituras
complementares. Ao longo da disciplina, falamos de eutonia, antiginástica,
Feldenkrais, bioenergética, Método Dança-Educação Física – MDEF, técnicas
que têm como principal objetivo despertar, sensibilizar, ampliar a percepção do
corpo e do movimento, contribuindo para o autoconhecimento, o bem-estar, a
relação afetiva com o outro.
Você deve ter percebido o quanto a experiência vivida é importante nesse
processo de consciência corporal, com a possibilidade de conhecer coisas novas, de
sentir o corpo de forma lenta, gradual, percebendo as sensações dos movimentos,
como nos sentimos ao respirar, ao tocar e sermos tocados. Esses são princípios
básicos de todas as técnicas vistas e cujo potencial educativo pode ser explorado
nas aulas de educação física.

Objetivo

Reconhecer o conteúdo conhecimento do corpo


1 na cultura de movimento e na educação física.

169
Educação física e o conhecimento do corpo

E
m sua trajetória histórica, a educação física ocupou-se do corpo e do
movimento humano, em particular, por meio dos métodos ginásticos e dos
esportes. Nesse contexto consideravelmente longo, perpassando o século
XIX e mais da metade do século XX o corpo anátomo-fisiológico prevaleceu em
detrimento das questões históricas e sociais (SOARES, 2013).
Uma das abordagens que aparece como crítica ao modelo teórico do esporte e
das ciências naturais e que merece uma análise atenta, inclusive pela sua difusão
não somente na França mas em vários países como o Brasil, refere-se à psicomo-
tricidade e suas aplicações à educação física escolar. Os temas trabalhados no
domínio psicomotor envolvem, principalmente, o esquema corporal, a organização
espacial, o equilíbrio, a motricidade, bem como o trabalho de expressão corporal.
De fato, a psicomotricidade trouxe o corpo sujeito para a educação física a
partir dos anos 1960, na França, e dos anos 1980, no Brasil, notadamente a partir
dos estudos de Jean Le Boulch.
Le Boulch (1983) esclarece que após vinte anos no campo da educação física,
ele se conscientizou de que o contexto da educação física oficial não lhe permitiria
desenvolver suas concepções e, sobretudo, aplicá-las ao contexto escolar. “A partir
dessa data, deliberadamente, pratiquei a psicocinética” (LE BOULCH, 1983, p.
42). Ele se refere ao contexto das instruções oficiais na França, nesse período,
cujo enfoque preconizava o esporte, não havendo espaço em sua pesquisa para
uma teoria geral do movimento, tendo seus prolongamentos em diversos domí-
nios, quais sejam: escolarização, prática esportiva, mundo do trabalho, lazer,
reeducação, cinesioterapia.
Qual a situação em 1987? Questiona Le Boulch (1987). Nos últimos anos,
vimos o rápido desenvolvimento do que chamamos “técnicas de corpo”. Nesse
cenário, a escola é necessariamente influenciada por esse fenômeno contemporâneo,
na medida em que sobre o plano institucional ela deve preparar a criança para
as práticas sociais de seu tempo. Conforme esse autor, a educação física tem,
de fato, sofrido uma mutação e à ginástica generalista de outrora se substitui o
ensino por meio de um catálogo, uma espécie de manual no qual se determinam
as atividades físicas e esportivas a serem aplicadas nas aulas. O risco é de se
considerar a aprendizagem das “condutas motoras” como um objetivo em si com
vistas à socialização para tornar o sujeito apto a se confrontar com os problemas
da vida atual, tanto no trabalho quanto no lazer.
A crítica de Le Boulch (1978) é lúcida e contribui para novas abordagens
em educação física em diferentes países como o Brasil, a Argentina, a França e
Portugal. No entanto, precisa-se avançar no que diz respeito aos estudos do corpo.
O corpo, tal como compreendido por Merleau-Ponty, não se deixa aprisionar pelo
racionalismo científico. Para esse filósofo, se o corpo pode ser comparado a um
objeto, não seria ao objeto científico, mas antes à obra de arte, em sua natureza
aberta, inacabada, expressiva (MERLEAU-PONTY, 1994; 1992).

Aula 10 Consciência Cultural 171


Le Camus (1986) afirma que, ao longo dos anos 1980, indaga-se a originalidade
e a validade de pedagogias e terapias de mediação corporal, em geral, qualificadas
como “psicomotoras”. O autor apresenta uma ampla descrição e discussão a
respeito do corpo em práticas dessa natureza, cuja ênfase encontra-se no corpo
sutil, na crítica ao dualismo mente e corpo e nas relações entre a motricidade, a
inteligência humana e o caráter. Nesse sentido, destaca-se a forte influência da
fenomenologia e, em particular, da abordagem psicológica da Gestalt, com ênfase
no conceito de esquema corporal, na análise do movimento, na concepção das
condutas motoras.
O tema do corpo também é apresentado à educação física por meio de outros
enfoques que não se reduzem ao racionalismo científico ou pedagógico, quando
dirigimos o olhar para a dança e para os trabalhos de expressão corporal, de
eutonia e antiginástica, do método Feldenkrais, que configuram o campo da
educação somática (BOLSANELLO, 2013).
A eutonia, criada por Gerda Alexander, propõe uma abordagem do corpo
diferente da tradição encontrada na educação física esportiva, por meio da cons-
ciência corporal, do desenvolvimento do esquema corporal, um desenvolvimento
da sensibilidade e da motricidade (ALEXANDER, 1980). Segundo a autora, após
a segunda guerra, o movimento da dança moderna, notadamente com Mary
Wigman e Rudolf Von Laban, aporta um sentido novo para o corpo, ligado às
emoções e à consciência do movimento. “A eutonia permite um desbloqueio das
tensões profundas que a Educação Física Esportiva tradicional reforça; tensões no
sentido atribuído por Reich da couraça muscular, mesmo se a eutonia apresenta
uma demarcação totalmente diferente da bioenergia” (ALEXANDER, 1980, p. 6).
Thérèse Bertherat, por sua vez, esclarece o percurso de seu trabalho corporal
e a criação da antiginástica, reconhecendo que essa terminologia causou-lhe
problemas e, de certo modo, dificultou sua aproximação com a educação física.
A autora esclarece a diferença do trabalho corporal entre esses domínios,
sobretudo no que diz respeito ao desejo dos alunos, uma vez que as pessoas
que procuram a antiginástica têm o desejo de conhecer o corpo, de melhorar sua
postura, o que não necessariamente ocorre com os alunos de educação física na
escola (BERTHERAT, 1983).
Bertherat (1983) toma por base o método Mézières, cujo enfoque é o alonga-
mento da cadeia muscular posterior, de modo global. Esse método opõe-se aos
modelos clássicos que, em vez de alongar essa musculatura, buscam fortalecê-la.
Nessa abordagem corporal, a observação do corpo é condição primeira.
Para Bertherat (1983), é preciso começar pelo corpo e não pelo esporte. Nessa
abordagem, assim como na eutonia, a consciência do corpo é condição básica
para a aprendizagem de técnicas corporais como a dança ou o esporte. Nesse
cenário, a consciência corporal é compreendida como uma abordagem do corpo
capaz de superar os aspectos mecanicistas da educação física dita tradicional,
quais sejam: os do esporte competitivo e os da ginástica tradicional.
A expressão corporal também se apresenta como um horizonte de práticas e
investigações para professores de educação física. De acordo com Pujad-Renaud
(1984), o essencial no trabalho de expressão corporal é reinvestir o corpo de certa

172 Aula 10 Consciência Cultural


sensibilidade, de fazer circular os afetos, certas passagens energéticas. Não se
trata “jamais de dizer ‘exprima-se’, nem em um curso de dança nem em sessões
de expressão corporal” (PUJAD-RENAUD, 1984, p. 6).
Com base na fenomenologia de Merleau-Ponty, cujos cursos acompanhou no
Collège de France, Pujad-Renaud (1984) visa superar a abordagem positivista do
corpo. A esse respeito, ele acrescenta:

Eu compreendo que seja difícil a estudantes ou professores de Educação Física


renunciar, em certa medida, a essa certeza do corpo objetivo, anatômico. O
corpo não se reduz ao que vemos, ele traduz uma realidade subjacente. Há
que se buscar além do visível (PUJAD-RENAUD, 1984, p. 11).

A partir de outro enfoque teórico e em período anterior, Brohm (1983)


partilha dessa mesma compreensão e crítica quanto a certa objetivação do corpo
na educação física. Ele diz ser a favor de todos os novos métodos e técnicas
corporais como a eutonia, a relaxação, a expressão corporal. Para o autor, o
conhecimento de técnicas de respiração, por exemplo, parece ser mais importante
que o resultado esportivo em si.

Eu proponho introduzir o que chamo de “corpoanálise”, ou seja, a análise


das implicações físicas e institucionais (por que nos tornamos professores de
ginástica, por que preferimos tal esporte, análise das relações com o corpo,
do “transfer” e do “contre-transfer” etc.). Parece-me decisivo dominar as
relações corporais que podemos estabelecer com os alunos que são também
relações de dominação ou de desejo (BROHM, 1983, p. 41).

Essas referências apresentam uma perspectiva do conhecimento do corpo


para além dos aspectos anatômicos ou biomecânicos. De acordo com Gleyse
(1995), a partir dos anos 1960, o discurso da psicomotricidade ou da psicocinética
no campo da educação física submeteu o corpo ao psiquismo, haja vista a
hierarquização deste desde a enunciação do termo, bem como no que se refere
aos aportes teóricos utilizados, não se rompendo com o dualismo tradicional
entre o corpo e a mente.
Quanto à motricidade, será um vetor dessa lógica “psicologizante” em uma
pedagogia corporal da inteligência ao enfatizar temas como: consciência do próprio
corpo, equilíbrio, coordenação global e específica; controle da respiração; organi-
zação do esquema corporal; orientação espacial; adaptação ao mundo externo. O
autor interroga-se sobre as razões da mudança de um corpo considerado máquina
energética, influenciado pelas orientações da medicina para a ideia de um corpo
que pensa e sente, conforme elaborações e teses da psicologia.
Certamente, o processo de racionalização do corpo mudou de objeto e de forma.
Outras apreciações críticas também podem ser consideradas nesse contexto, como,
por exemplo: a apropriação instrumental da fenomenologia de Merleau-Ponty como
base teórica da psicocinética, da psicomotricidade, da eutonia, da antiginástica

Aula 10 Consciência Cultural 173


ou da expressão corporal, o que não exclui a contribuição dessas abordagens
para a educação física, notadamente em seu aspecto metodológico. Do ponto de
vista filosófico, algumas observações podem contribuir para ampliar o processo
de compreensão do corpo e das práticas corporais cuja referência esteja afinada
com a atitude fenomenológica, em particular, com aquela de Merleau-Ponty.
Uma leitura mais atenta da obra desse filósofo indica que, já na “Fenomeno-
logia da percepção”, Merleau-Ponty (1994) apresenta movimentos da consciência
perceptiva para a experimentação do corpo no mundo, por exemplo, ao abordar
o esquema corporal, a linguagem ou a sexualidade.
A percepção para Merleau-Ponty (1992) não é uma tomada de “consciência“
de um sujeito que constitui o mundo por representação, um sujeito espiritual (ser
puro), mas é experimentação de um sujeito encarnado, sujeito que é corpo, visí-
vel e invisível para si próprio (presença e ausência de si), um corpo imbricado no
mundo, um corpo que se move. Segundo esse filósofo, a percepção nos dá acesso
à própria coisa e não a uma representação. Isso é possível por conta da sinergia,
na qual não ocorre síntese, mas metamorfose. Desse modo, o esquema corporal,
para Merleau-Ponty, não consiste apenas em um ajuste postural, mas em um estilo
de exercer a existência, o que implica também contradições, tensões, paradoxos.
As abordagens identificadas com a eutonia, a antiginástica e a expressão corporal,
mesmo apoiando-se em passagens da fenomenologia de Merleau-Ponty, limitam-se
à compreensão “psicológica” ou a uma consciência capaz de representar o corpo.
Certamente, as possíveis lacunas na apropriação filosófica da fenomenologia de
Merleau-Ponty não inviabilizam a contribuição das técnicas corporais identificadas
no campo da eutonia, da antiginástica ou da expressão corporal. Como se trata
de abordagens atuais e significativas no campo da educação física, talvez seja
necessário acrescentar a essas análises novas questões.
Ademais, não há uma idealidade fora do corpo e de seu movimento. De
acordo com Merleau-Ponty (1992), a idealidade cultural, aquela das ciências, por
exemplo, brota e se espalha nas articulações do corpo, nos contornos das coisas
sensíveis e do mundo. Desse modo, a filosofia apresenta-se como interrogação
dessa idealidade. Tal princípio pode contribuir para a abordagem dos estudos
do corpo na educação física, ampliando-se o campo de debate e de proposições
teóricas e práticas.
Quanto ao nosso curso, ao longo desta disciplina você teve acesso a referências
teóricas e metodológicas de diversas técnicas como a antiginástica, a autonia,
o método Feldenkrais, a massagem ocidental, o tai chi chuan, o Método Dança-
-Educação Física – MDEF. Essas são algumas possibilidades de abordagem do
conhecimento do corpo na educação física que você pode adequar à sua realidade
profissional, seja na escola seja em outros espaços profissionais.
Na antiginástica, a massagem com as bolinhas de tênis libera tensões, con-
tribuindo para o alongamento da cadeia muscular posterior, a leitura do corpo e
a percepção de si mesmo. Na aula de eutonia, apresentamos possibilidades de
se conhecer os espaços corporais, as relações expressivas do corpo no espaço e
com o ritmo, ampliando a percepção do tônus e a educação dos sentidos.

174 Aula 10 Consciência Cultural


No método Feldenkrais, conhecemos as bases da consciência pelo movimento
com base na imagem corporal e na realização de movimentos suaves. As lições
práticas de Feldenkrais contribuem para a percepção e mobilização de nossa
coluna vertebral, a integração entre o quadril, o tronco, os membros superiores
e inferiores, ampliando o fluxo do movimento e a leveza do nosso corpo.
Com a técnica da massagem podemos entrar em contato com nossa pele,
sua textura, temperatura, ampliando também o contato afetivo com o mundo.
Na bioenergética e na biodança, os exercícios trazem à tona nossas emoções,
os sentimentos, a vitalidade e a vibração do nosso corpo e do seu movimento.
Já em relação às práticas orientais, como a meditação e o Tai chi chuan,
põem-nos em contato com a filosofia yin yang, o equilíbrio entre os opostos, o
caminho do meio, a paz e a serenidade.
Além disso, Bolsanello (2011) apresenta algumas das características comuns
aos métodos de educação somática no tocante a como o professor aborda o
movimento do corpo de seus alunos no contexto das aulas, a saber:

1. A diminuição do ritmo: o professor propõe que o aluno faça os movimentos


de forma mais lenta do que habitualmente ele faz a fim que possa perceber
as estruturas musculoesqueléticas implicadas quando executa o movimento.
2. A respiração como suporte do movimento: o professor não dita um ritmo
respiratório para a execução do movimento, mas pede ao aluno que use seu
próprio ritmo respiratório como suporte do movimento.
3. A interpretação da diretriz verbal: o professor não demonstra os movi-
mentos ao aluno para que ele não se torne um modelo. O aluno é levado a
interpretar as orientações segundo a percepção que tem de seu corpo, seus
limites e potencial.
4. A autopesquisa do movimento: as comandas não dirigem o aluno à mera
execução de uma sequência de movimentos, nem a um aperfeiçoamento
dessa sequência. Trata-se de incitar o aluno a explorar, através do movimento,
conexões entre partes do corpo aparentemente desconexas.
5. A automassagem: através do uso de objetos auxiliares (bolas, bastões
etc.), o aluno é levado a massagear-se e a reativar o sistema proprioceptivo.
6. A busca do esforço justo: o professor pede ao aluno que procure o ônus
ótimo para realização do movimento proposto a fim de que o aluno comece a
distinguir as variações do tônus muscular e comece a integrar a capacidade a
regular seu tônus de acordo com a situação e com o objetivo da tarefa a ser feita.
7. O alongamento fino e preciso: uma parte dos movimentos propostos visa
ao alongamento de músculos da postura e tendões.
8. O aumento do vocabulário gestual: muitos dos movimentos propostos são
movimentos que não são usados no cotidiano. Esses movimentos muitas
vezes causam estranheza no aluno, porém, têm por objetivo a gradual des-
construção de padrões motores inconscientes nocivos à estrutura psicofísica
do indivíduo. Por outro lado, os movimentos inusitados e lúdicos formam
novas conexões neuronais e o estabelecimento padrões motores mais eficazes.

Aula 10 Consciência Cultural 175


9. Aprendizagem “leiga”: diferentemente da Yoga e do Tai Chi, cujas práticas
são fundamentadas nos Vedas e no Taoísmo, filosofias espirituais da Índia
e da China, os métodos de Educação Somática não estão associados a um
sistema de crenças religiosas ou filosóficas (BOLSANELLO, 2011, p. 308).

Essas são referências importantes para o trabalho de consciência corporal


na educação física que você pode ampliar com outras experiências corporais e
de movimento cuja ênfase esteja na sensibilidade do corpo. Faz-se necessário
refletir também a respeito de questões sociais, culturais e éticas que atravessam
cotidianamente o nosso corpo, como as questões do culto ao corpo, dos padrões
estéticos, das questões da sexualidade, do gênero, entre outras.
Essas questões também compõem os conteúdos do conhecimento do corpo e
da consciência corporal. Para compreender o sentido da corporeidade, ou seja,
da nossa condição corporal, os indicadores orgânicos expressos nos conceitos
científicos da anatomia e da fisiologia precisam ser complementados com as
experiências vividas pelos sujeitos, suas condições de vida, seus hábitos, seus
valores, sua cultura, seus sonhos, seus desejos, suas dores e prazeres.
A corporeidade expressa a nossa condição corporal, nossa relação com o mundo
por meio dos nossos gestos, da nossa forma de andar, de se movimentar, das
nossas atitudes, do nosso tom de voz, das nossas posturas corporais, das formas
de se alimentar, de vestir e de despir, das formas de se enfeitar, de sorrir e de
chorar, das formas de trabalhar e das formas de descansar, das formas de amar
e de demonstrar afeto. Precisamos pensar sobre o modo como os professores
de educação física lidam com as informações sobre o corpo que aparecem na
mídia, na publicidade, nos noticiários, nas revistas e nos espaços destinados a
cultuar o corpo na sociedade contemporânea, como as academias de ginásticas,
os clubes, as praias, entre outros lugares nos quais há uma exposição do corpo
e das habilidades corporais.
O culto ao corpo pode ser compreendido como um tipo de relação dos
indivíduos com seus corpos, uma relação que tem como preocupação básica o
modelamento do corpo, a fim de aproximá-lo do padrão de beleza estabelecido.
Diante das regras do culto ao corpo, como reagir? Há de se diferenciar os inves-
timentos da indústria do bem-estar, muitas vezes identificadas com as questões
do corpo, da saúde e da qualidade de vida. Não existe uma forma perfeita, cada
pessoa apresenta certa composição corporal e mais, uma subjetividade que a faz
diferente, portanto, é preciso também conviver com as diferenças.
Lembremos aqui do dispositivo disciplinar apresentado por Foucault (1979).
Esse dispositivo aperfeiçoa-se, mas não desaparece completamente das instituições
sociais. Para Foucault (1979), o domínio, a consciência do corpo só pôde ser
adquirida pelo investimento do corpo pelo poder, assim:

176 Aula 10 Consciência Cultural


A ginástica, os exercícios, o desenvolvimento muscular, a nudez, a exaltação
do belo corpo... tudo isto conduz ao desejo do seu próprio corpo através de
um trabalho insistente, obstinado, meticuloso, que o poder exerceu sobre
o corpo das crianças, dos soldados, sobre o corpo sadio. Mas, a partir do
momento em que o poder produziu esse efeito, como consequência direta
de suas conquistas, emerge inevitavelmente a reivindicação de seu próprio
corpo contra o poder, a saúde contra a economia, o prazer contra as normas
morais da sexualidade, do casamento, do pudor. E, assim o que tornava
forte o poder passa a ser aquilo por que ele é atacado... O poder penetrou
no corpo, encontra-se exposto no próprio corpo... Lembrem-se do pânico
das instituições do corpo social (médicos, políticos) com a ideia da união
livre ou do aborto... Na realidade, a impressão de que o poder vacila é falsa,
porque ele pode recuar, se deslocar, investir em outros lugares... E a batalha
continua (FOUCAULT, 1979, p. 146).

O poder não age somente por meio da hipótese repressiva, com a restrição e
o controle dos comportamentos. Esse dispositivo do poder também não age por
via única, sendo bastante visível na sexualidade, pois, ao mesmo tempo que se
buscou controlá-la se produziu a intensificação dos desejos de cada um por seu
próprio corpo. Assim, temos um novo investimento sobre o corpo que não tem
mais a forma do controle-repressão, mas do controle estimulação: “Fique nu, mas
seja magro, bonito, bronzeado. A cada movimento de um dos dois adversários
corresponde o movimento do outro” (FOUCAULT, 1979, p. 147). Não escapamos
inteiramente ao dispositivo disciplinar, ao controle de nossas atividades, horários,
gestos e pensamentos. No entanto, nós resistimos ao poder e podemos criar
estratégias de resistência, entre elas, o despertar da percepção do corpo, da
imagem corporal, das contradições sociais que atravessam nossa corporeidade.
Ao longo de nossas aulas, você deve ter percebido que jamais o corpo mereceu
tanto cuidado como hoje, para isso, fazendo uso de vários discursos, técnicas,
teorias, práticas que envolvem as relações com a alma, a beleza, a política e
também com a saúde. Percebe-se que a fragilidade do corpo, sua vulnerabilidade
à doença e sua impotência diante do envelhecimento torna-se cada vez menos
tolerada em nossa sociedade. Essas são algumas questões que fazem parte também
do cenário da consciência corporal.
A esse respeito, sugerimos que retome as Aulas 4 e 5 da disciplina “Aspectos
sociofilosóficos da educação física”, nas quais abordamos a temática da política
do corpo e da saúde, respectivamente. Essas reflexões ajudam a compreender a
consciência corporal não apenas com algo que diz respeito ao indivíduo mas ainda
à sociedade em geral. Com essas reflexões, você poderá perceber as articulações
entre o corpo dos indivíduos e o corpo social, entre normas e responsabilidades
individuais e a política sanitária e moral, bem como o lugar que a educação física
ocupa nesse projeto sanitário de promoção da saúde e do culto ao corpo na socie-
dade contemporânea, além das possibilidades de questionar os padrões vigentes.

Aula 10 Consciência Cultural 177


Saiba Mais

O conhecimento do corpo nos PCN Educação Física


Este bloco diz respeito aos conhecimentos e conquistas individuais
que subsidiam as práticas corporais expressas nos outros dois blocos e
dão recursos para o indivíduo gerenciar sua atividade corporal de forma
autônoma. O corpo é compreendido como um organismo integrado e
não como um amontoado de “partes” e “aparelhos”, como um corpo
vivo, que interage com o meio físico e cultural, que sente dor, prazer,
alegria, medo etc.
Para se conhecer o corpo abordam-se os conhecimentos anatômicos,
fisiológicos, biomecânicos e bioquímicos que capacitam a análise crítica
dos programas de atividade física e o estabelecimento de critérios para
julgamento, escolha e realização que regulem as próprias atividades
corporais saudáveis, seja no trabalho seja no lazer. De modo geral,
esses conhecimentos são tratados de maneira simplificada, abordando-se
apenas os conhecimentos básicos. No ciclo final da escolaridade obriga-
tória, podem ser ampliados e aprofundados.
É importante ressaltar que os conteúdos deste bloco estão contex-
tualizados nas atividades corporais desenvolvidas. Os conhecimentos
de anatomia referem-se principalmente à estrutura muscular e óssea e
são abordados sob o enfoque da percepção do próprio corpo, sentindo
e compreendendo, por exemplo, os ossos e os músculos envolvidos nos
diferentes movimentos e posições, em situações de relaxamento e tensão.
Quanto aos conhecimentos de fisiologia, são aqueles básicos para
compreender as alterações que ocorrem durante as atividades físicas
(frequência cardíaca, queima de calorias, perda de água e sais minerais)
e aqueles que ocorrem em longo prazo (melhora da condição cardior-
respiratória, aumento da massa muscular, da força e da flexibilidade e
diminuição de tecido adiposo). Nessa perspectiva, a bioquímica abordará
conteúdos que subsidiam a fisiologia: alguns processos metabólicos
de produção de energia, eliminação e reposição de nutrientes básicos.
Já os conhecimentos de biomecânica, estão relacionados com a
anatomia e contemplam, principalmente, a adequação dos hábitos
posturais, como, por exemplo, levantar um peso e equilibrar objetos.
Esses conteúdos são abordados principalmente a partir da percepção
do próprio corpo, isto é, o aluno deverá, por meio de suas sensações,
analisar e compreender as alterações que ocorrem em seu corpo durante
e depois de fazer atividades. Para tanto, poderão ser feitas análises sobre
alterações em curto, médio ou longo prazos. Também, sob a ótica da

178 Aula 10 Consciência Cultural


percepção do próprio corpo, os alunos poderão analisar seus movimentos
no tempo e no espaço: como são seus deslocamentos, qual é a veloci-
dade de seus movimentos etc.
Em relação às habilidades motoras, deverão ser aprendidas durante
toda a escolaridade, do ponto de vista prático, e deverão sempre estar
contextualizadas nos conteúdos dos outros blocos. Do ponto de vista
teórico, podem ser observadas e apreciadas principalmente dentro dos
esportes, jogos, lutas e danças. Também fazem parte desse bloco os
conhecimentos sobre os hábitos posturais e atitudes corporais.
A ênfase desse item está na relação entre as possibilidades e as
necessidades biomecânicas e a construção sociocultural da atitude
corporal, dos gestos, da postura. Por que, por exemplo, os orientais
sentam-se no chão, com as costas eretas? Por que as lavadeiras de um
determinado lugar lavam a roupa de uma maneira? Por que muitas
pessoas do interior sentam-se de cócoras? Observar, analisar, compre-
ender essas atitudes corporais são atividades que podem ser desen-
volvidas juntamente com projetos de História, Geografia e Pluralida-
de Cultural. Além da análise dos diferentes hábitos, pode-se incluir a
questão da postura dos alunos em classe: as posturas mais adequadas
para fazer determinadas tarefas, para diferentes situações e por quê.
Fonte: BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais:
educação física. Brasília: MEC/SEF, 1997. Disponível em: <portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro07.pdf>.
Acesso em: 8 jun. 2014.

Leitura complementar

BOLSANELLO, D. (Org.). Em pleno corpo: educação somática, movimento e


saúde. 2. ed. Curitiba: Juruá, 2013.
O livro apresenta uma variedade de métodos e técnicas corporais que com-
põe o campo da educação somática, sua relação com o corpo em processos
educativos, artísticos e terapêuticos, consistindo em uma boa leitura para que
profissionais de educação física ampliem seu conhecimento sobre o assunto.

Aula 10 Consciência Cultural 179


Atividade 1

Como o corpo tem sido abordado na educação física? A partir


da leitura feita até o momento, formule uma proposição para essa
questão e participe de um fórum virtual organizado pelo tutor.

Resumo

Nesta aula, abordamos o conhecimento do corpo na educação


física, retomando aspectos históricos dessa questão e aspectos teóricos
e metodológicos das práticas corporais apresentadas ao longo da
disciplina consciência corporal.

Autoavaliação
Elabore um plano de aula com o conteúdo Conhecimento do Corpo,
escolhendo uma ou mais prática corporal como a antiginástica, a eutonia, o
método Feldenkrais, entre outros conteúdos abordados ao longo da disciplina
de consciência corporal. O plano deve conter uma apresentação da temática,
especificar a turma, a idade dos alunos, o espaço físico e o material a ser
utilizado. Deve também conter necessariamente os objetivos, os conteúdos, a
metodologia, avaliação e referências bibliográficas.

Referências
ALEXANDER, G. Eutonia. Revue EPS, Paris, n. 162, École Normale
Supérieure, 1980.

BERTHERAT, T. L’anty-gym. Revue EPS, Paris, n. 182, École Normale


Supérieure, 1983.

BOLSANELLO, D. (Org.). Em pleno corpo: educação somática, movimento e


saúde. 2. ed. Curitiba: Juruá, 2013.

180 Aula 10 Consciência Cultural


BOLSANELLO, D. A educação somática e os conceitos de descondicionamento
gestual, autenticidade somática e tecnologia interna. Revista Motrivivência,
ano XXIII, n. 36, p. 306-3022, jun. 2011.

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Fundamental.


Parâmetros curriculares nacionais: educação física. Brasília: MEC/SEF, 1997.
Disponível em: <portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro07.pdf>. Acesso
em: 8 jun. 2014.

BROHM, J-M. Entretien. Revue EPS, Paris, n. 181, École Normale


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FOUCAULT, M. Microfísica do poder. Rio de Janeiro: Graal, 1979.

GLEYSE, Jacques. Archéologie de l’ éducation physique au XXe siècle en


France. Paris: PUF, 1995.

LE BOULCH, J. Vers une science du mouvement humain: introduction à la


psychocinétique. Paris: Les éditions ESF, 1978.

LE BOULCH, J. Entretien avec Le Boulch. Revue EPS, Paris, n. 183, École


Normale Supérieure, 1983.

LE BOULCH, J. La science du mouvement humain appliquée au


développement de la personne. Revue EPS, Paris, n. 204, École Normale
Supérieure, 1987.

LE CAMUS, J. O corpo em discussão: da reeducação psicomotora as terapias


de mediação corporal. Porto Alegre: Artes Médicas, 1986.

MERLEAU-PONTY, M. Fenomenologia da percepção. São Paulo: Martins


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MERLEAU-PONTY, M. O visivel e o invisivel. São Paulo: Perspectiva, 1992.

PUJAD-RENAUD, C. Entretien avec Claude Pujade-Renaud. Revue EPS, Paris,


n. 190, École Normale Supérieure, 1984.

SOARES, C. L. Imagens da educação no corpo. 4. ed. Campinas: Autores


Associados, 2013.

Aula 10 Consciência Cultural 181


Anotações

182 Aula 10 Consciência Cultural


Perfil da autora

Terezinha Petrucia da Nóbrega possui graduação


em Educação Física (1989) e em Filosofia (1995)
pela Universidade Federal do Rio Grande do
Norte; mestrado em Educação pela Universidade
Federal do Rio Grande do Norte (1995) e doutorado
na mesma área pela Universidade Metodista de Piracicaba (1999).
Realizou estágio Pós-Doutoral na Université de Montpelllier – França
(2009). Foi professora convidada da Université de Montpellier, Institut
de Formation de Maîtres – França (2011). Atualmente, é associado III da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte, atuando nos Programas de
Pós-Graduação em Educação e em Educação Física. É coordenadora do
Grupo de Pesquisa Estesia e do Laboratório VER (Visibilidades do Corpo
e da Cultura de Movimento) na mesma instituição.

Perfil da autora 183


Anotações

184
Esta edição foi produzida em março de 2014 no Rio Grande do Norte, pela Secretaria
de Educação a Distância da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (SEDIS/UFRN),
utilizando-se ITC Slimbach Std para corpo do texto e Univers LT Std para títulos e subtítulos,
sobre papel offset 90 g/m2.

SEDIS Secretaria de Educação a Distância – UFRN | CampusUniversitário

Praça Cívica | Natal/RN | CEP 59.078-970 | sedis@sedis.ufrn.br | www.sedis.ufrn.br

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