Você está na página 1de 2

RECORTE DE CASO – SUPERVISÃO

Dados iniciais: Paciente C., homem, 50 anos, traz como queixa principal questões
relacionadas ao trabalho e que tem trazido repercussões a sua vida pessoal. Relata se
sentir paralisado, impossibilitado de seguir/fazer coisas do dia-a-dia e/ou de plano de
vida, “tal qual uma engrenagem que parou de funcionar”. Nunca passou por qualquer
experiência de análise ou tratamento psicoterápico e, juntamente com o início no
tratamento pela clínica escola, começou um trabalho de “coaching” com uma
profissional a qual também tem amizade. Iniciou os atendimentos aqui há cerca de 2
meses.

Sessão dia 14/08 (faltou em 21/08 – justificativa: “trabalho até tarde a semana toda”)
Como de costume subi até a recepção para chamá-lo, e ele estava esperando.
Terapeuta: Boa noite C., vamos lá?
Paciente: Boa noite André, vamos!
Ele me cumprimenta com um aperto de mão e então descemos à sala de
atendimento da clínica escola.
T: Gostaria de te fazer um uma sugestão hoje e te convidar a experimentar o
divã.
P: Pode ser... Vamos tentar. (Então o paciente se deita e começa a falar)
P: Essa semana foi bem difícil, senti muito medo. Tive muitas coisas
relacionadas ao trabalho, um monte de problema para resolver e não sei se consegui
dar conta de tudo. Fico com medo do que pode acontecer, porque estamos num
momento crítico do país... Político... Econômico... E tenho medo que as coisas voltem
a ficar difíceis como no passado. Não foi fácil mesmo... Na verdade estou pensando
em deixar o coach para outro momento, pensando em desistir por enquanto.
T: E por que te ocorre esse pensamento?
P: Na última sessão (sexta) mexemos com muitas coisas difíceis. Tenho a
impressão de que as questões que aparecem lá mexem muito comigo. E eu não estou
dando conta, são muitas mudanças. Das coisas que temos conversado aqui, mais
essas coisas do trabalho.
T: Muitas coisas? Me fale um pouco do que tem vivenciado no coach.
P: Por exemplo, ela me dá um monte de atividades, exercícios e leitura, e eu
não consigo fazer, sabe? Não consigo me organizar para iniciar. Estou com um livro
há algum tempo e não consigo pegar para ler.
T: Te falta tempo?
P: Não! Não é falta de tempo é falta de vontade... Fico desanimado para fazer.
Até tenho tempo para ler, consigo organizar meus horários, mas não estou
conseguindo.
T: Tem ideia do que possa estar te desmotivando?
P: Como assim?
T: Você diz que tem tempo livre, e tem investido tempo em busca de melhorias
para sua vida, seus projetos. O que sente que está te impedindo de seguir? Te passa
algum pensamento?
P: É como te falei, tem mexido com muitas coisas ao mesmo tempo. As
questões sobre meu passado que temos discutido aqui, minha relação com meu pai...
e principalmente a dificuldade de estar na posição que estou.
T: E em qual posição você está?
P: De empresário. Estou acostumado com aquela vida de funcionário público,
afinal, foram 24 anos nessa forma de trabalho. Se eu trabalhasse muito ou pouco, de
qualquer maneira eu teria dinheiro no fim do mês. Mas hoje não, preciso trabalhar
muito para conseguir um sustento para minha família. E se não for atrás não vou
conseguir sobreviver.
T: E será que estar na condição de funcionário público te traria satisfação?
P: Penso que não! Ter uma empresa sempre foi meu sonho. E me sinto
realizado, apesar de querer mais, fazer o bem para as pessoas, sabe? Não ter uma
empresa apenas para fazer dinheiro, mas pensar em ajudar as pessoas a resolverem
determinado problema. Então sinto que a vida de funcionário público me limitaria,
cumprir horários, ter chefe, ficar acomodado... Eu não quero isso para mim...
T: Exatamente! Essas são escolhas da vida... Toda escolha gera ônus e bônus.
Certamente escolhendo essa vida de empresário você não terá os benefícios da vida
de funcionário público, nem os mesmos problemas. Terá sim outros problemas. E é
necessário que se tenha esse entendimento na medida em que você escolhe seguir
um caminho.
P: É verdade... (silêncio)
T: E certamente você se sente realizado com sua escolha, afinal você está indo
na direção do seu desejo, do seu sonho.
P: Com certeza! Prefiro muito mais nessa condição que estou... fazendo meus
horários e construindo minha empresa. E é isso que tenho experimentado no coach,
mudando meus paradigmas, encontrando novos desafios... Porque assim, sinto que
minha empresa deu um up grade, mas eu não consegui evoluir junto. Deixei de ser
uma MEI para uma ME, ou seja, mudaram os impostos, o risco aumentou... essas
coisa entende?
T: Bem C., embora me pareça meio contraditório você pensar que sua empresa
cresceu e você não, já que você é a empresa...
P: Isso é verdade... (risada).
T: Você tem conseguido evoluir, mesmo na condição de empresário, afinal
você só passou para uma ME pois a demanda de trabalho aumentou, o faturamento
aumentou o que significa que os dividendos também aumentaram. E para isso, o
coach vem no sentido de te ajudar nesse crescimento, te dando as perspectivas e o
conhecimento empresarial que você precisa. Então por que o desejo de desistir?
P: Você tem toda razão... Mas por que não consigo crescer junto ao coach?
T: Essa é uma boa pergunta... No começo da sessão você trouxe muito a
palavra medo. O medo de arriscar, o medo de perder, o medo de fracassar. Me parece
que, junto com esse medo de errar vem o desejo de acertar muito, ser perfeito. E esse
sentimento de perfeição te faz paralisar e não te permite se quer iniciar, como as
leituras do livro por exemplo.
P: NOSSA, agora você bateu!!! (profundo silêncio... sua expressão muda, fica
muito pensativo) Isso mesmo, faz muito sentido agora... (mantem-se pensativo)
T: Estamos encerrando nossa sessão C... Vá com essa reflexão hoje, pense
nessas questões e nas relativas ao coach, tendo em mente o que você quer para
você.
P: Sim sem dúvidas... muitas questões para refletir... muito obrigado!
T: Tenha uma boa semana e até segunda que vem.
P: Obrigado. Até!

Você também pode gostar