PROJETO DE PESQUISA
Nome do estudante:
Disciplina:
2 – INTRODUÇÃO (O tópico deve ter 1pg. Nele, você deve apresentar o contexto
do seu tema, como ele chamou sua atenção, como ele vem se apresentando na
vida social, como ele vem ganhando relevância dentro do contexto específico
onde ele se insere)
Neste tópico você deve dizer concretamente o que vai estudar: posts de redes
sociais, episódios de série, reportágens, estratégias empresariais, etc.
Maior nome do Hip Hop brasileiro, os Racionais MC’s são o objeto de estudo desta
proposta de pesquisa, especialmente no que se refere à sociabilidade engendrada pelo seu
rap. O movimento Hip Hop chegou ao Brasil nos 1980, originalmente na região
metropolitana de São Paulo. Especialmente praticado por office-boys, o Hip Hop apareceu
como expressão de um movimento cultural juvenil (WELLER, 2011), caracterizado como
manifestação estético-política (SILVA, 1998), que serviu de ponto de encontro para jovens
das diversas regiões periféricas.
Os Racionais MC’s são filhos diretos deste processo cultural. Lançam seu primeiro
trabalho em 1990 e chegam aos 25 anos de carreira consolidados como o maior grupo de
rap do Brasil. Sucesso de público e crítica, o grupo de São Paulo fez seu nome no hip hop
nacional tendo como atributo marcante o contorno político das suas letras. Mano Brown,
DJ KL Jay, Edi Rock e Ice Blue construíram uma estética musical de impacto, que serviu de
alicerce para a produção de um discurso poético e político pouco cordial, de crítica ao
racismo, e que fez a crônica do cotidiano nas favelas brasileiras do final do século XX e
início do XXI. Articulada a esse discurso, nasceu a uma poesia que afirmou a autoestima
dos jovens da periferia urbana do Brasil contemporâneo. Assim, os Racionais foram
pioneiros e criaram um rap poderoso, de estilo próprio, conjugando referências da música
negra americana a elementos do samba-rock, da MPB e da música negra pop brasileira dos
anos 70.
Este discurso passou por transformações ao longo dos 25 anos de carreira que
podem ser representadas por 3 fases distintas. A primeira relaciona-se a um processo de
descoberta intelectual e conscientização política, que produziu uma visão militante a
respeito da realidade, e fez nascer os primeiros raps do grupo - mais engajado em sentido
estrito e de tom professoral. Na segunda fase, o trabalho musical dos Racionais mudou seu
lugar de fala e passou a falar da periferia como um todo, com uma intenção menos didática
e moralizante. A faceta cronística do rap entrou em jogo aqui para conjugar os problemas
individuais do rapper narrador aos problemas sociais que ele enfrenta no dia a dia. Com
esta alquimia, o grupo deu origem a um projeto estético e ético para a vida na periferia
cativando multidões de jovens e transformando a cena do rap nacional e de boa parte da
juventude brasileira, que a partir de então teria outras referências discursivas para pensar
sua própria realidade e agir sobre ela. Já a terceira fase do discurso racial dos Racionais
não abandona o tema da violência policial ou a promoção de uma ética de vida, mas repõe
sua ênfase na questão do consumo.
4 – JUSTIFICATIVA (2 pgs):
Aqui você deve demonstrar porque seu tema tem relevância dentro da
Comunicacao Social e porque ele merece ser estudado. Quais os impactos dele
na vida das pessoas? Por que investir energia em estudar isso? Pq seu tema é
importante?
O presente projeto tem como objeto o rap dos Racionais MC’s compreendido como
uma manifestação cultural revestida por uma profunda dimensão política e ética capaz de
produzir um estar-junto na contemporaneidade. Seu propósito específico é investigar qual
o discurso propagado pelos Racionais. Essa abordagem discursiva é homogênea ao longo
da carreira do grupo? Quais foram os elementos do discurso sobre a vida do jovem da
periferia brasileira que tanto fascinou os fãs dos Racionais e deu ao grupo o enorme
sucesso e prestígio de que ele desfruta?
Segundo Maffesoli (1995), é a imagem que nos apresenta ao mundo, nos gestos, nas
cores, nas roupas e em todos os símbolos que administramos cotidianamente. Cabendo,
então, como pesquisadores, compreendê-la. Este é o sentido do procedimento de coleta e
análise de dados proposto para esta pesquisa. Proceder uma abordagem do discurso dos
Racionais que acredite que as imagens, a partir de uma razão estética, cumprem o papel
de religar a vida em sociedade e de dinamizar o estar-junto, atuando, assim, como cultura.
A sócio-semiótica de Eric Landowski também nos será de bom uso para uma
análise que não oponha cognição à sensação, e que observe a obra de arte através de uma
semiótica que busca ser mais sensível. Uma abordagem etnográfica nos shows dos
Racionais também será empreendida com o objetivo de compreender a dinâmica viva do
estar-junto ocasionado pela música do grupo, assim como entrevistas semi-estruturadas
com os membros do grupo e atores relevantes para a trajetória e a produção do discurso
poético dos Racionais MC’s.
E como este ideal comunitário pode ser articulado ao sentido político tão presente
no rap dos Racionais? Antes de tudo, é necessário notar que houve o que Maffesoli chama
de uma “transfiguração do político” manifesta no cansaço em relação ao político pensado
como ideal democrático pautado no individualismo moderno em que o social é visto como
resultado racional, funcional ou contratual da associação de indivíduos autônomos
(FERNANDES, 2009). Vivemos um momento de crise de representação destes meta-
relatos. Por isso, testemunhamos o que Fernandes (2009) chama de um processo de
redistribuição e reacomodação dos poderes – antes centrados e bem definidos nas
instituições modernas.
A questão crucial, então, é utilizar este referencial teórico para investigar como o
rap dos Racionais engendra um estar-junto a partir da construção de um discurso ético
para o jovem das periferias do Brasil contemporâneo. Estes jovens participam do
“mistério” desta música. O ideal comunitário contido nela sugere “solidariedade e
generosidade” (MAFFESOLI, 1995) para esta socialidade de base. Ancorado num discurso
sobre a forma de levar a vida cotidiana da maneira mais digna possível.
A esta altura, desenha-se um outro ponto chave para a reflexão proposta por este
projeto de pesquisa. Do ponto de vista teórico, concordamos com a noção de Fernandes
(2009) segundo a qual este tipo de identificação (tribal) fundada na emoção acaba
desempenhando uma função ética no plano social. Para desenvolver esta ideia, de que o
elan comunitário engendrado pela música dos Racionais passa por uma proposição ética a
respeito de como levar a vida de forma ativa frente às adversidades apresentadas pela
cidade de São Paulo, mobilizaremos o instrumental teórico utilizado por Takeuti (2010) a
partir do pensamento de Deleuze e Guattari (1980).
Nossa proposta teórica é a de que o rap dos Racionais produz um outro devir outro
musical e postural, em que o público que ouve seus discursos é instado a uma participação
estética e vivencial. Neste sentido, a arte dos Racionais carregaria em si uma proposta
micropolítica para a vida no cotidiano da pobreza. A saber: uma alternativa tanto em
relação a entrada no crime como em relação ao trabalho precarizado, ou seja, nem a
violência, nem a resignação. Tratar-se-ia, portanto, da invenção, através da estética
musical, de uma ética na sobrevida, que extrapola o
simples querer sobreviver. (TAKEUTI, 2010). Aqui, a ideia de resistência está para além
da política institucionalizada e configura-se como “vias de saída” para a limitada condição
de jovens da periferia. Este registro teórico nos oferece a possibilidade de pensar uma
potência inventiva do político que propõe uma nova postura de vida face aos problemas
vivenciados em contextos de adversidade. Desta maneira, a arte popular dos Racionais
sugeriria novas posturas subjetivas para o enfrentamento das dificuldades cotidianas,
sugerindo o que Guatarri (1981) chama de novas modalidades de organização da
subjetividade.
8 - BIBLIOGRAFIA PRELIMINAR.
DELEUZE, Gilles y Félix Guattari, 1995 [1980], Mil Platôs: capitalismo e esquizofrenia,
Vol. 1, Rio de Janeiro, 34.
OLIVEIRA, Leandro Silva; SEGRETO, Marcelo; CABRAL, Nara Lya Simões Caetano. Vozes
periféricas: expansão, imersão e diálogo na obra dos Racionais MC’s. Revista do Instituto
de Estudos Brasileiros, 56, 2013, p. 101-126.
ROSE, Tricia. Black noise: Rap music and black culture in contemporary america.
Connecticut: Wesleyan University Press, 1994
SILVA, José Carlos Gomes. Rap na cidade de São Paulo: música, etnicidade e experiência
urbana. 1998. (Doutorado em Ciências Sociais) - Instituto de Filosofia e Ciências
Humanas, Universidade Estadual de Campinas.1998
TAKEUTI, Norma Missae. Refazendo a margem pela arte e política. Nómadas, v.32, 2010,
p. 13- 26.
YÚDICE, George. A conveniência da cultura: usos da cultura na era global. Ed. UFMG,
2006.
WELLER, Wivian. Minha voz é tudo o que eu tenho: manifestações juvenis em Berlim e
São Paulo. Ed. EDUFMG, 2011.