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ANTROPOLÓGICOS E DA SAÚDE
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Olá!
Ao final desta aula, o aluno será capaz de:
Toda ciência possui um conjunto de termos, ideias e expressões que permitem compreender seus principais
enunciados.
Várias ciências podem compartilhar um mesmo termo, mas, de maneira geral, cada disciplina costuma ter uma
forma própria para empregá-lo em suas organizações teóricas. Assim é com as ciências sociais, com as ciências
A clarificação dos conceitos de uma ciência permite que se compreenda boa parte de seus achados e explicações.
Os conceitos devem ser definidos de forma simples e clara, a fim de facilitar a compreensão e aplicação.
Vejamos, então, que conceitos são fundamentais para que possamos entender algumas das principais discussões
em ciências sociais.
Sem dúvida, a maioria dos conceitos você já ouviu falar, e mesmo se utiliza deles em seu dia a dia. Mas, como
Vamos apresentar alguns dos conceitos fundamentais da sociologia e da antropologia e procurar “descobri-los”
no mundo real.
Se estamos falando de ciências sociais e, como vimos, as disciplinas que a compõem (sociologia, antropologia e
ciência política) têm como ponto de partida as sociedades humanas, nada mais natural que comecemos pelo
conceito de sociedade.
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- Um conjunto de indivíduos organizados. A característica de organização é fundamental para que se defina o
Primeira definição: A primeira definição diz que sociedade é um conjunto organizado de indivíduos.
Será individuo sinônimo de pessoa? Não! Indivíduo é qualquer representante de uma dada espécie viva.
O dicionário Houaiss Eletrônico apresenta como uma das acepções possíveis para indivíduo “organismo único,
distinguível dos demais do grupo”. Será que esta definição nos permite pensar em sociedades não humanas? A
Segunda definição: A segunda definição fala de conjunto ou rede de instituições sociais. Se a primeira definição
não se refere exclusivamente ao mundo humano, a segunda tem características exclusivamente humanas.
De qualquer forma, o que nos interessa no momento é pensar as sociedades humanas e a sociologia humana
(poderíamos pensar em uma sociologia animal também). Então, podemos dizer que sociedade (humana) é um
É a partir da definição de sociedade que as ciências sociais constituem seus demais conceitos. A sociologia, assim,
será a ciência que estuda a estrutura das sociedades, ou dos homens organizados em grupo.
Mas se a sociedade é formada por instituições sociais, o que vêm a ser estas instituições?
Definir instituição social não é simples. Na verdade, trata-se de um conceito dos mais abstratos, que remete a um
conjunto de regras e valores padronizados, reconhecidos e adotados por uma sociedade. Assim, instituição social
é ideia, lei, regra. E é através das organizações sociais que as instituições sociais se expressam.
Para ilustrar o conceito, vamos tomar o ambiente acadêmico. A instituição que sustenta a Universidade é a
educação. Na nossa sociedade, esta instituição possui uma série de princípios, valores etc., que serão executados
pelas organizações que compõem o sistema educacional (por exemplo, o Ministério da Educação) e pelos
diversos estabelecimentos e grupos que difundem os valores institucionais (universidades, escolas e outros
Portanto, as instituições podem ser consideradas como a “alma” da sociedade, assim como as organizações e os
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• Grupo social
isto é, numa situação na qual cada membro leva em consideração a existência dos demais membros do
grupo e em que o objetivo de suas ações é, na maior parte das vezes, dirigido aos outros” (COSTA, 2005,
p. 394).
Vemos que a definição de grupo social permite pensar em outros grupos além do humano. Entretanto, a
capacidade que o homem tem de ter consciência de pertencimento a um grupo faz com que se diferencie
• Socialização
Processo pelo qual o indivíduo assimila os valores, as normas e as experiências sociais de um grupo ou
de uma sociedade” (COSTA, 2005, p. 405). Como um processo de aprendizagem, através da socialização,
nos tornamos efetivamente humanos, à medida que aprendemos como nos relacionar com os demais
Divide-se em socialização primária, onde a transmissão dos valores e da cultura é feita pela família; e
em socialização secundária, onde a transmissão é assumida por outros grupos, como a escola e os
grupos de referência.
menino e uma menina agem de forma distinta, isto não acontece em função de seus hormônios, mas é
• Normas sociais
“São mecanismos que asseguram a regularidade da vida social e a existência de suas instituições...”
(COSTA, 2005, p. 402). As normas sociais são aprendidas (introjetadas) pelos indivíduos ao longo de seu
processo de socialização. Não é possível a existência de uma sociedade sem normas sociais. A ausência
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Para que as normas sociais possam ser introjetadas e a socialização ocorra, é necessária certa “pressão”
da sociedade sobre os indivíduos. Esta pressão é exercida por diversos dispositivos sociais e resume-se
É importante notar que a coerção social não é, a princípio, algo ruim ou negativo, como poderíamos
pensar, mas a possibilidade de existência e manutenção da sociedade. Através dos vários sistemas
coercitivos, a sociedade se mantém coesa, isto é, unida e funcionando adequadamente. Já pensou se cada
indivíduo resolvesse fazer o que bem lhe viesse à cabeça, sem qualquer regulação ou controle externo
(ou interno)?
• Papel social
"Conjunto de normas, direitos, deveres e expectativas que envolvem uma pessoa no desempenho de uma
função junto a um grupo ou dentro de uma instituição” (COSTA, 2005, p. 403). Assim, através dos papéis
sociais, que podem ser atribuídos, ou seja, designados aos indivíduos independentemente de sua escolha
(filho, por exemplo) ou conquistados (escolhido ou decidido pelo indivíduo), nos localizamos e
Na aprendizagem e exercício dos diversos papéis sociais que desempenhamos na sociedade, vamos
construindo e desenvolvendo valores. Organizando o sentido das ações humanas, os valores “são os
juízos e as avaliações que os indivíduos desenvolvem por si mesmos e em grupos e que lhes permitem
julgar, escolher e orientar seu comportamento. [...] Os valores sociais se traduzem na conduta humana
por preferências, gostos e atitudes pelos quais os agentes sociais manifestam uma apreciação da
realidade. São elementos dos mais importantes no processo de socialização pelo qual um indivíduo é
2 Conceitos de cultura
É na dinâmica da vida social que vamos aprendendo a ser humanos, no sentido pleno do termo. Pelo contato com
cultura dá conta deste “conjunto de significados partilhados por um grupo” (COSTA, 2005, p. 391).
Inicialmente concebida de forma mais concreta, cultura relaciona-se a hábitos, costumes e formas de vida que
diferenciam um grupo de outro. Também pode referir-se às produções materiais como ferramentas, técnicas,
alimentos etc.
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Hoje, pensa-se que a cultura como “um conjunto de interpretações da realidade” (Clifford Geertz apud COSTA,
2005, p. 391). De tudo isto, devemos ter claro que a cultura é fruto do pensamento humano e que todos os
grupos humanos são produtores de cultura, nenhuma sendo melhor ou superior a outra.
O etnógrafo Edward Tylor (1832-1917) define cultura como “(...) todo complexo que inclui conhecimentos,
crenças, arte, moral, leis, costumes ou qualquer outra capacidade ou hábitos adquiridos pelo homem como
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3 Etnocentrismo, Evolucionismo cultural (darwinismo
social) e Relativismo cultural
• Etnocentrismo
Quando entramos em contato com grupos ou pessoas diferentes de nós, tendemos a avaliá-los de acordo
com nossa perspectiva cultural. Assim, o etnocentrismo pode ser definido como uma “visão de mundo na
qual o centro de tudo é o próprio grupo a que o indivíduo pertence; tomando-o por base, são
escalonados e avaliados todos os outros grupos” (SUMMER, 1906, p. 13, apud Dicionário de Ciências
No etnocentrismo, temos a identificação pelo indivíduo com a cultura do seu grupo e a suposição de que
os padrões por ele exibidos são os melhores e os mais corretos. Embora possa ser entendido com uma
atitude “natural” dos sujeitos no processo de relacionamento com o outro, pelo menos em uma primeira
aproximação, traz consequências negativas importantes, quando não permitem que o outro seja
positivamente reconhecido.
Que importância esse conceito adquire na vida real e, especialmente na área da saúde? Já pensou nas
consequências de não considerar positivas as diferenças sociais e culturais? Lembra-se das definições de
• Evolucionismo cultural
concepção típica do século XIX, o evolucionismo cultural, também chamado de darwinismo social,
utiliza-se da lógica das ciências naturais, particularmente da biologia, para fazer entender a diversidade
social e cultural. Como entender as evidentes diferenças entre sociedades e culturas espalhadas pelo
mundo?
Inspirado nos achados de Darwin sobre a evolução das espécies, o darwinismo social procurou
Mas, como afirma Costa (2005, p. 67), “A transposição de conceitos físicos e biológicos pra o estudo das
sociedades e do comportamento humano promoveu desvios interpretativos graves, que acabaram por
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emprestar uma garantia de cientificismo a ações guiadas por preconceito e interesses particulares. Um
desses desvios ocorreu com a aplicação do conceito de espécie em Darwin para o estudo das diferentes
sociedades e etnias”.
A lógica evolucionista (cultural) supõe que existam grupos humanos mais evoluídos, social e
culturalmente, que outros, “justificando” a intervenção nas culturas e sociedades julgadas inferiores.
Desde muito sabemos que não existem culturas superiores ou inferiores. Cada grupo humano apresenta
padrões que lhes são próprios e que estão em função de sua história e interesses.
• Relativismo cultural
O relativismo cultural “designa a ideia de que qualquer parte do comportamento deve ser julgada
primeiramente em relação ao lugar por ela ocupado na estrutura da cultura em que ocorre e em termos
do sistema de valor específico daquela cultura. Encerra, deste modo, um princípio de contextualismo”
procura compreender os eventos socioculturais presentes nos diversos grupos e sociedades a partir do
próprio grupo.
Dito de outra maneira, um olhar relativista permite que se compreenda a realidade social de um grupo
“como se fosse” alguém do próprio grupo. Ao nos colocarmos no lugar do outro, buscamos ver o mundo
Esse descentramento que devemos fazer permite que a diferença (social, cultural, étnica, de gênero etc.)
não seja valorada negativamente. Ao contrário, podemos reconhecer, apesar das diferenças, que o outro
Sendo parte das produções sociais, as ideias de saúde e doença devem ser compreendidas a partir dos
significados próprios que cada grupo lhes atribui. O que isto quer dizer? Que saúde e doença não estão apenas
referidas a uma dimensão orgânica ou fisiológica. Mais do que isso, estão intimamente relacionadas com a forma
Podemos ver com clareza que o que é considerado doença (ou sinal de saúde) em uma sociedade, pode não ser
em outra.
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Uma criança gordinha pode representar, para um grupo, sinal de bons cuidados e boa nutrição, ao passo que,
Outro exemplo poderá esclarecer melhor este pensamento: até muito pouco tempo atrás, o que hoje é chamado
de “síndrome de tensão pré-menstrual” (TPM) não era reconhecido como disfunção ou doença.
As mulheres que tinham seu humor alterado no período que antecedia a menstruação eram vistas como
“nervosinhas”, e suas queixas sobre sintomas somáticos e psicológicos avaliados como “frescura”.
Em dado momento, por conta de um novo olhar sobre este evento, o que não passava de simples queixa
injustificada passa a ser considerado motivo de atenção em saúde, justificando, por exemplo, dispensa médica.
Temos aqui não apenas uma questão de compreensão dos processos orgânicos, mas uma forma de significação
Apesar de se admitir hoje a TPM como um evento de saúde, ainda é considerada em diversos grupos nada mais
do que “frescura”. Este raciocínio serve para praticamente todos os eventos em saúde. Pense nisso.
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Faça um exercício de reflexão e busque exemplos que demonstrem a relatividade da compreensão dos processos
4 Natureza e cultura
Nosso estudo até agora permite que se chegue a uma importante conclusão: não existe uma oposição entre
Natureza e cultura. Os determinantes orgânicos, inatos ou hereditários não são os únicos a organizar o
relacionam com os elementos sociais e culturais, dando significação e sentido às experiências humanas.
Sobre uma primeira natureza – orgânica, fisiológica – o homem constrói uma segunda natureza, que é social e
cultural.
Esta pergunta, que ouvimos com frequência, subentende que existem pessoas que não têm cultura. Ou – o que é
mais ou menos a mesma coisa – considera que algumas pessoas possuem conhecimentos que são
reconhecidamente marcas da cultura e outras cujos conhecimentos que possuem não são considerados cultura.
Como vimos anteriormente, cultura é tudo que se produz socialmente, material e imaterial, fruto do exercício do
convívio social e do pensamento humano. Podemos classificar as produções culturais em eruditas ou populares,
por exemplo, mas isto não implica em valoração, isto é, não significa que uma seja melhor do que a outra ou que
Escolarização ou conhecimento acadêmico é uma forma possível de produção cultural, o que não exclui outras
formas de conhecimento. Dona Maria, mesmo sem ter participado um dia sequer das aulas em uma escola,
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CONCLUSÃO
Nesta aula, você:
• Aprendeu o significado de alguns dos principais conceitos em sociologia e antropologia;
• Reconheceu nos eventos sociais os enunciados conceituais das ciências sociais;
• Compreendeu a relação complementar entre natureza e cultura.
Referências
COSTA, Cristina. Conceitos básicos de sociologia. In:______. Sociologia: uma introdução ao estudo da sociedade. 3.
LARAIA, Roque de Barros. Cultura: um conceito antropológico. 16. ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003.
Acesso em: 23 abr. 2006. Artigo publicado no Jornal da Embratel, Rio de Janeiro, 1981.
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