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Este livro é para aqueles que gostariam não apenas de ler, mas
também de apreciar o livro de Daniel. Se você deseja saber a
respeito de todas as teorias enfadonhas que os estudiosos
inventaram, terá de procurá-las em outro lugar. Se quiser provas de
que o livro de Daniel foi escrito no século VI a.C., e não no século II
a.C., como muitos escritores atuais afirmam, seu ponto de partida
deve ser a obra de E. J. Young, A Commentary on Daniel. Este livro
não examina tais assuntos. Seu alvo é muito mais direto. É
estimulá-lo a ler Daniel pelo valor do próprio livro e ver que sua
mensagem é para o nosso tempo.
Daniel é basicamente um livro muito fácil de entender. Seus
primeiros seis capítulos são narrativos. Após estes, há seis capítulos
repletos de símbolos aparentemente misteriosos, sobre os quais
tem havido grande controvérsia, mas que, de fato, não são tão
difíceis. O livro inteiro é bastante prático – especialmente para
crentes que se encontram solitários, mesmo estando entre colegas
de escola, ou de trabalho, ou entre seus familiares e amigos.
Que o Deus de Daniel nos abençoe, enquanto perscrutamos sua
santa Palavra!
Stuart Olyott
1 | Montando o Cenário
O PANORAMA HISTÓRICO
Abraão, o homem escolhido por Deus, se tornou uma família, e a
família, uma nação. Finalmente, a nação desceu ao Egito, onde
permaneceu por quatrocentos anos.
Depois, saiu. Você já ouviu a respeito das pragas do Egito, da
Páscoa e da travessia do Mar Vermelho. Por quarenta anos, a
nação, guiada por Moisés, vagou no deserto, onde recebeu a lei de
Deus e as instruções acerca do tabernáculo, dos sacrifícios e do
sacerdócio. Quando as peregrinações no deserto terminaram, os
israelitas entraram na terra prometida, sob a liderança de Josué; e,
antes de sua morte, a terra foi conquistada, em grande parte, e
dividida entre as doze tribos.
Isto foi seguido pela época dos juízes, homens a quem Deus
levantou para livrar a nação de sucessivos conquistadores. Veio,
então, o período dos reis. O primeiro foi Saul, seguido por Davi,
Salomão e Roboão. Todos estes governaram sobre um reino unido,
formado por doze tribos.
Logo após o início do reinado de Roboão, a nação se dividiu em
duas. Ao norte ficou o reino de Israel (ou Efraim), e ao sul, o reino
de Judá. O reino do norte compunha-se de dez tribos, e sua capital
era Samaria. O do sul era constituído por duas tribos; sua capital era
Jerusalém. No início, os dois reinos eram inimigos. A isto, seguiu-se
um período de amizade, mas tornaram-se inimigos novamente.
Houve várias dinastias no norte, porém nenhum monarca temente
a Deus se assentou no trono. Finalmente, Deus castigou o reino do
norte, tendo antes condenado sua apostasia, várias vezes, por
intermédio de seus profetas. Os exércitos da poderosa Assíria
vieram do norte e, em 722 a.C., Samaria caiu. As dez tribos de
Israel foram levadas em cativeiro e, com o tempo, perderam sua
identidade como povo de Deus.
O reino do sul permaneceu por mais cem anos. Todos os seus
reis pertenceram a uma mesma dinastia; eram descendentes de
Davi. A vida da nação foi de crescente apostasia. Todavia, alguns
reis foram tementes a Deus, e houve diversos períodos de grande
despertamento espiritual. Em 609 a.C., Jeoaquim subiu ao trono.
Seu governo nada fez para deter a idolatria e a imoralidade
prevalecentes; pelo contrário, aumentou-as. Os profetas advertiram
que, se não houvesse arrependimento, haveria julgamento, mas
seus avisos não foram atendidos.
De além do horizonte, em 605 a.C., veio Nabucodonosor. Durante
os vinte e três anos seguintes, em quatro estágios sucessivos, ele
transportou quase todo o povo de Judá para a Babilônia. Às
margens dos rios da Babilônia, os judeus se assentavam e
choravam, quando se lembravam de Sião, e perguntavam como
haveriam de entoar o cântico do Senhor em terra estranha (Sl 137.1,
4).
O povo não quis ouvir as advertências de Deus e estava agora à
mercê de seus inimigos. No entanto, dentro da nação apóstata
existia um pequeno grupo de pessoas que se mantinham fiéis a
Deus, como os profetas haviam predito. Este minúsculo
remanescente fiel existiu também durante os 70 anos do cativeiro,
amando a Deus e vivendo para agradá-Lo, mesmo na longínqua
Babilônia. É verdade que a nação, como um todo, eliminou a
idolatria de seu meio. Mas o amoroso relacionamento com Jeová foi
uma experiência que poucos desfrutaram. Após o exílio, o
remanescente se tornou cada vez menor, havendo ocasião em que
consistia apenas de Zacarias e Isabel, Maria e José, Simeão e Ana
e alguns pastores. Ninguém mais, na Judéia, estava pronto para
receber o Descendente prometido de Abraão. Ninguém mais
reconheceu a Luz que viera para iluminar os gentios; ninguém
reconheceu a Glória do povo de Deus, Israel.
Nos dias do cativeiro, este remanescente era representado por
Daniel, Hananias, Misael e Azarias (Dn 1.6). Apenas quatro luzes, e
mais algumas, brilhavam na escuridão espiritual daqueles dias.
Somente algumas pessoas permaneciam fiéis a Deus. Numa época
em que ninguém mais se importava, Deus e sua Palavra
continuavam a ter importância para este pequeno grupo.
Deus não se interessa muito por números, mas insiste em que
nunca ficará sem testemunhas. A verdadeira religião continua
ininterrupta no mundo, mas raramente seus seguidores são muitos.
Na Babilônia, Deus se contentou em ter seu verdadeiro Israel
reduzido a um pequeníssimo grupo de pessoas. Os primeiros seis
capítulos de Daniel nos contam como este remanescente minúsculo
permaneceu fiel a Deus em um ambiente hostil.
A PRINCIPAL LIÇÃO
A sentença anterior nos traz à principal lição deste livro. Daniel
nos revela como podemos permanecer fiéis a Deus em um
ambiente hostil. Mostra-nos como viver para Deus, quando tudo
está contra nós. De suas páginas, aprendemos como entoar o hino
do Senhor em uma terra estranha. Daniel e seus três companheiros
conseguiram; nós também podemos.
É possível uma pessoa viver para Deus quando as circunstâncias
lhe são totalmente contrárias. Noé, Abraão, Moisés e Davi foram
homens tementes a Deus, mas a Palavra de Deus registra que cada
um deles, em determinada ocasião, cometeu uma falta grave. Cada
um deles tem pelo menos uma mácula em seu caráter, e alguns
deles mais do que uma. A Bíblia não esconde os erros de seus
principais personagens, nem pretende apresentá-los melhores do
que realmente foram. Porém, o próprio livro não registra qualquer
mancha no caráter de Daniel. Espiritualidade e integridade de
caráter não exigem condições ideais para se desenvolverem. Não
são plantas que se desenvolvem sob a proteção da estufa, mas
crescem melhor quando expostas à neve, ao vento, ao granizo, à
seca e ao sol escaldante.
Pense nisto! Um garoto de catorze anos (era esta sua idade) foi
tirado de sua casa, família e amigos e forçado a marchar até uma
terra estranha. Ali, foi submetido a uma forma de instrução poderosa
e sutil, sobre a qual receberemos algumas informações. Anos mais
tarde, foi cercado por inimigos invejosos, que conspiraram contra
sua vida. Em tempo algum, Daniel esteve livre da tentação de
buscar a prosperidade material e pessoal às custas de afastar-se de
Deus. Esteve rodeado pelo mal, na juventude, na maturidade e na
velhice. Quase não há tentação conhecida que ele não tenha
enfrentado. Entretanto, as Escrituras não registram uma única
mancha em seu caráter! Ele propôs em seu coração que agradaria a
Deus e nunca se apartou desse propósito. É possível, sim, vivermos
para Deus em um mundo hostil. A verdadeira santidade pode
desenvolver-se e florescer diante de condições não-ideais.
Pouquíssimos de nós enfrentamos as dificuldades que Daniel
enfrentou. Ao pensar em dificuldades, normalmente nos lembramos
apenas das nossas. Convencemo-nos de que todos os demais têm
vida fácil e que faríamos mais progresso espiritual se estivéssemos
em alguma outra situação. O operário pensa que a secretária tem
maior facilidade para viver a vida cristã; a secretária está
convencida de que a vida cristã é mais fácil para a dona de casa. A
dona de casa acha que o estudante encontra poucas dificuldades
para desenvolver sua vida cristã; o estudante anseia pelo dia em
que enfrentará o desafio comparativamente mais fácil do trabalho na
fábrica. E o ciclo continua. Cada um de nós imagina que ninguém
tem dificuldades tão grandes quanto as nossas. Justificamos nosso
padrão de vida cristã medíocre apontando para as circunstâncias
em que nos encontramos. O livro de Daniel nos denuncia
completamente. Prova que a verdadeira espiritualidade nunca
dependeu de circunstâncias fáceis.
Qual era o segredo de Daniel?
É simples. Antes de interpretar o sonho de Nabucodonosor, o que
Daniel fez? Orou (2.17-19). O que ele estava fazendo quando houve
a conspiração que resultou em ser lançado na cova dos leões?
Estava orando (6.10). Qual o assunto do capítulo 9? Daniel em
oração. Era um homem de oração. Uma adequada vida de oração é
uma parte do segredo de permanecer fiel a Deus em um mundo
hostil.
A outra parte do segredo é bem simples. No capítulo 9,
encontramos Daniel examinando e entendendo os “livros” (v. 2).
Quais livros? Os livros proféticos do Antigo Testamento, os que
haviam sido escritos até aquela data. Nos versículos 11 e 13, vemos
Daniel se referindo à “lei de Moisés”. Daniel lia e conhecia a Bíblia.
É fácil definir seu segredo, mas nem sempre é fácil praticá-lo. Ele
permaneceu firme servindo a Deus em um mundo hostil porque lia
sua Bíblia e orava!
A prática dessas verdades simples precisa ser enfatizada hoje.
Pensa-se, muitas vezes, que o segredo da vida cristã está em uma
nova e excepcional experiência com Deus. Palavras diferentes são
usadas por diversas pessoas, mas a idéia é, em geral, muito
semelhante. É ensinado que uma nova experiência com Deus me
conduzirá a um nível mais elevado do que aquele em que vivo
agora. Se apenas eu tiver essa nova experiência, jamais serei o
mesmo. Todas as minhas forças devem ser dedicadas à procura
dessa vida mais elevada, e não devo descansar até que essa nova
experiência seja minha.
Daniel teve maravilhosas experiências com o Senhor, mas não as
procurou. Ele buscava a Deus pela excelência de Deus, e não pelo
que Deus poderia fazer por ele. Daniel gostava de estar com o
Senhor, discernindo sua vontade, por meio da Palavra, e de ter
comunhão com Ele em oração. Enfatizamos novamente: seu
segredo era simples demais para não ser percebido – lia a Bíblia e
orava.
Este foi também o segredo dos primeiros mártires cristãos, dos
perseguidos durante a Reforma, dos zelosos evangelistas e de seus
sucessores. Foi o segredo dos grandes missionários pioneiros que
viveram no século passado. Estavam convictos de que “o povo que
conhece ao seu Deus se tornará forte e ativo” (11.32). Como Daniel,
viviam em dois mundos e, freqüentemente, contemplavam aquele
mundo que interfere nos afazeres deste. Tornaram-se amigos de
Deus e muito amados (10.19) nos céus. Este era seu segredo!
Sabendo isto, estudemos agora o livro de Daniel e aprendamos
como permanecer firmes.
A Caminho da Babilônia
LEIA DANIEL 1
O RESULTADO
O resultado imediato da ação corajosa e espiritual destes jovens
é registrado nos versículos 17 a 21. Eles colocaram Deus acima de
todas as outras considerações. Por sua vez, Ele os honrou e
despertou em suas vidas dons que nem imaginavam possuir.
Isto acontece freqüentemente. Anos atrás, conheci um homem
que era totalmente analfabeto. Não podia ler sequer uma palavra.
Quando o Senhor o salvou, concluiu que poderia andar melhor com
Deus se pudesse ler a sua Palavra. Com considerável perseverança
e grande esforço pessoal, aprendeu a ler. Fazendo isso, descobriu
(para seu deslumbramento) que tinha uma inteligência bem
aguçada. Tornou-se um leitor ávido e conseguiu um emprego como
carteiro. Em anos recentes, tornou-se um pastor. Desde sua
infância, todos lhe diziam que nada realizaria. Quando colocou a
Deus em primeiro lugar e decidiu agradá-Lo, descobriu subitamente
que tinha dons que nem ele nem ninguém havia imaginado possuir.
Foi exatamente isso que aconteceu com Daniel, Hananias, Misael
e Azarias. Puseram Deus em primeiro lugar e se aplicaram nos
estudos. Foram abençoados com sabedoria.
Já aconteceu algo semelhante em sua própria experiência? Você
viu alguma coisa que precisava ser feita e, somente por causa do
Senhor, começou a realizá-la. Fazendo isso, descobriu que possuía
dons, os quais desconhecia inteiramente. Percebeu, por exemplo,
que tinha uma propensão para administrar ou que poderia liderar
facilmente os jovens. Os dons vieram à tona em sua vida apenas
porque você colocou Deus em primeiro lugar; e, freqüentemente, a
descoberta desses dons ajudaram-no a aprimorar-se em seu próprio
trabalho. Esta experiência não é, de modo algum, diferente da que é
descrita em Daniel l. Daniel tinha outro dom que se destacará neste
livro, e a primeira menção dele ocorre no versículo 17.
Assim, finalmente, o curso de três anos terminou. Era hora dos
exames finais. Como nas universidades britânicas em dias
passados, esses exames não eram escritos, e sim orais. Os
estudantes apresentaram-se ao rei, que examinou, pessoalmente,
cada um e deu seu parecer. Sua avaliação de Daniel, Hananias,
Misael e Azarias é preservada para nós nos versículos 19 e 20.
Eram melhores que todos os outros estudantes. Porém, isso não é
tudo. Mostraram-se mais cultos do que os graduados que já haviam
concluído seus estudos e agora ocupavam posições de liderança no
império. De fato, dez vezes mais sábios! Como resultado, cada um
dos quatro foi colocado em um cargo alto, no qual poderia usar sua
influência para Deus. O Senhor poderia confiar-lhes tal posição, pois
haviam demonstrado que, diante de qualquer circunstância, mesmo
em perigo de vida, Lhe seriam fiéis. Daniel permaneceria nesta
posição por 70 anos (v. 21).
Muitos crentes anseiam por posições mais altas, onde podem ter
mais influência espiritual. Professores querem ser diretores,
balconistas querem tornar-se gerentes, sócios de sindicato esperam
tornar-se representantes de classe. “Se eu apenas estivesse
naquele cargo”, pensam eles, “que influência poderia exercer para o
Senhor!”
Se não vivermos para Deus agora, nenhum de nós poderá fazer
com que uma posição mais elevada se torne valiosa para Ele. Se
não estamos dispostos a permanecer firmes e comprometidos com
Ele em coisas pequenas, como o faremos nas grandes? É possível
ser fiel no muito, sem primeiro ter sido fiel no pouco? Se não
podemos resistir a tentações comparativamente pequenas, o que
faremos quando elas forem intensificadas?
O ensino central deste capítulo pode ser resumido em uma frase:
“Aos que me honram, honrarei” (1 Sm 2.30).
3 | O Sonho de Nabucodonosor
LEIA DANIEL 2
LEIA DANIEL 3
Se você sorriu quando leu o texto que fala sobre “os sátrapas, os
prefeitos, os governadores, os juízes, os tesoureiros, os
magistrados, os conselheiros e todos os oficiais das províncias”, é
porque deveria mesmo. Isso é também verdade acerca do texto da
“trombeta, do pífaro, da harpa, da cítara, do saltério, da gaita de
foles e de toda sorte de música”. Daniel 3 zomba da pompa e da
cerimônia de idolatria pagã nele registradas. É escarnecedor.
Os capítulos anteriores nos contaram como um pequeno grupo
de pessoas manteve-se fiel a Deus em um ambiente hostil. Entre os
judeus, agora castigados por sua idolatria, havia apenas um número
reduzido de pessoas cujo coração era fiel a Deus. Tentados a
transigir, recusaram-se a fazê-lo. Estando aparentemente a ponto de
serem aniquilados, Deus os preservou miraculosamente. O capítulo
que consideramos agora registra um outro livramento maravilhoso e,
novamente, nos assegura que os poucos que permaneceram fiéis a
Deus foram objetos de seu cuidado especial. O estudo deste
capítulo oferece enorme encorajamento e algumas importantes
lições práticas para cada crente que não está em harmonia com os
padrões e os valores do mundo ao seu redor.
Um dos mistérios deste capítulo é a ausência de Daniel. Ninguém
sabe o motivo desta ausência, embora, naturalmente, já tenha
havido muita especulação. Onde ele estava e o que fazia nesta
ocasião não é revelado. Os seus três amigos são ressaltados neste
capítulo. Sadraque, Mesaque e Abede-Nego já haviam sido
mencionados algumas vezes no livro, mas Daniel fora sempre o
mais proeminente. Seus três amigos foram obscurecidos por ele e
colocados em segundo plano. Agora, os veremos em suas
circunstâncias pessoais.
O capítulo 3 é um relato simples de como três homens
desafiaram corajosamente o mais poderoso homem no mundo, para
não desagradarem a Deus. Agradar a Deus era mais importante
para eles do que preservarem sua própria vida. O exemplo destes
jovens nos mostra a essência da fidelidade a Deus. O capítulo
também registra como Deus interveio e sustentou-lhes a fé.
O principal ensino deste capítulo não é o livramento miraculoso.
Não temos dificuldades em acreditar em milagres, temos?
Reconhecemos que Deus é todo-poderoso e cremos que Ele
ressuscitou a seu Filho dentre os mortos, por isso, os milagres não
são mais problemas para nós. O poderoso livramento registrado
neste capítulo enche nosso coração de louvor a Deus, mas não é o
assunto mais importante que devemos observar.
O principal ensino, neste capítulo, é que três crentes jovens são
tentados a praticar o mal e recusam-se a fazê-lo. Estão dispostos a
não trilhar o mesmo caminho que todos os demais, ainda que isto
signifique morte horrível. “Transigir” não é uma palavra do
vocabulário deles. O pecado é pecado, e eles não o cometerão,
embora corram perigo. Não tolerarão o pecado, nem lhe darão
ouvidos. Devemos atentar a essa atitude, pois nos ensina, uma vez
mais, como o testemunho de Deus se mantém vivo em um mundo
pagão. Se desejamos ser fiéis a Deus em um ambiente hostil, nós
mesmos precisamos seguir o exemplo de Sadraque, Mesaque e
Abede-Nego.
Este capítulo traz à nossa mente a antiga indagação: “O que
acontece quando uma força irresistível encontra um objeto
irremovível?” Porém, neste caso há três objetos irremovíveis!
Veremos primeiro a força, depois, os objetos. Finalmente, veremos o
que aconteceu quando os dois se confrontaram.
A FORÇA IRRESISTÍVEL
A força irresistível é o rei Nabucodonosor. E, se verificarmos os
versículos 1 a 7, ficará evidente por que lhe damos este nome. A
narrativa se inicia com o rei erigindo uma imagem. Não sabemos
precisamente quando ele fez isso; e o texto não nos informa. Talvez
logo após Daniel tê-lo descrito como “a cabeça de ouro”. Essa
descrição pode tê-lo enchido de orgulho, e, por isso, ele seguiu o
sonho de uma imensa estátua, edificando uma imagem de verdade.
Era comum entre os potentados babilônios e sírios construir
imagens em sua própria honra; o que Nabucodonosor fez não era
considerado particularmente inusitado. A imagem era, quase
certamente, uma representação dele mesmo. Também é certo que
ele estava pensando não somente em sua própria honra, mas
também na honra dos deuses aos quais prestava adoração.
O custo de fabricação da imagem deve ter sido exorbitante.
Folheada a ouro, erguia-se sobre um pedestal e tinha mais de trinta
metros de altura, mas sua largura era apenas dois metros e setenta
centímetros. Estas proporções são um tanto grotescas, mas são
típicas das estátuas da Babilônia. Não devemos concluir que
Nabucodonosor fosse alto demais e pateticamente magro! Esta
imagem imensa e desproporcional foi erguida no campo de Dura.
A palavra aramaica aqui traduzida por “campo” se refere a uma
área plana entre montanhas. A imagem foi erguida em uma espécie
de arena natural. Ao seu redor havia uma grande área bastante
plana, com montanhas de cada lado. Provavelmente seria visível a
dezenas de quilômetros, especialmente quando seu revestimento
dourado brilhasse ao sol.
Quando a imagem ficou pronta, houve uma cerimônia de
dedicação, em harmonia com o costume babilônio. Isso é relatado
nos versículos 2 e 3. Oficiais importantes vieram dos lugares mais
remotos do império babilônio; seus diversos escalões são
apresentados. Talvez ninguém, no mundo inteiro, participara de uma
celebração como aquela. A multidão era imensa, e todo o
espetáculo seria infinitamente mais esplêndido do que a mais
extravagante coroação. Era uma imagem erguida pelo poderoso
imperador de Babilônia, em honra a ele e a seus deuses; e, de
todos os seus territórios, muitos vieram para contemplá-la.
No versículo 4, temos uma afirmação apenas indicativa. À frente
desta multidão sem precedentes, “o arauto apregoava em alta voz”.
Que voz ele devia ter! Para a multidão silenciosa, ele transmite um
decreto, em nome do rei. Ninguém está isento de suas exigências.
Diferentes povos, nações e línguas encontram-se presentes, de
todas as partes do império babilônio. O que é ordenado se aplica a
todos.
Uma orquestra também está presente à cerimônia, cujos
instrumentos são listados nos versículos 5, 7, 10 e 15. “Toda sorte
de música” é uma expressão persa, indicando que a orquestra
continha alguns instrumentos persas. Isso não é surpreendente,
visto que a Pérsia era um país vizinho. A “trombeta” e o “pífaro”
eram semíticos e sugerem que alguns dos músicos eram judeus
exilados. A “harpa”, a “cítara” e o “saltério” eram instrumentos
gregos. A Babilônia comerciava com a Grécia havia mais de um
século e, evidentemente, também acrescentara a música grega às
suas próprias tradições. O arauto proclamava que, quando a
orquestra tocasse, todos, quem quer que fosse ou onde quer que
estivesse, deveriam prostrar-se em terra e adorar a imagem recém-
erigida.
Se o versículo 6 nos traz perplexidade e nos parece irracional, há
algo que devemos lembrar. Essa estátua grotesca havia sido
erguida em honra do rei e seus deuses. Deixar de curvar-se a ela
poderia ser interpretado somente como um ato de infidelidade. Era
insubmissão à palavra do rei; era traição. Esse tipo de
comportamento mau poderia ser recompensado somente com a
morte horrível na fornalha de fogo ardente.
Curvar-se ao ídolo não era problema para a grande maioria das
pessoas no império babilônio, embora procedessem de nações
conquistadas. Precisavam apenas raciocinar: “É óbvio que os
deuses de Babilônia são mais fortes do que os nossos, pois, do
contrário, não teríamos sido derrotados. Podemos ao menos
reconhecer isso”.
Até para os judeus exilados, prostrar-se ao ídolo não era
problema. Por gerações, haviam desobedecido a Deus e se
envolvido em idolatria. As palavras severas dos profetas que
condenavam essa prática haviam sido ignoradas deliberada e
continuamente. Não teriam escrúpulos de consciência sobre o
prostrarem-se ante a imagem de ouro. A idolatria estava arraigada
no coração deles. Por que condenarem-se à morte certa por se
recusarem a fazer algo que haviam feito por muitos anos?
A
submissão de todos ao edito do rei era esperada, pois ninguém
desejaria ser oprimido ou prejudicado por ele. Ninguém, exceto o
remanescente fiel a Deus. A evidência de que eles permaneciam
fiéis a Deus estava no fato que de modo algum se envolveriam no
culto a deuses falsos. O primeiro mandamento era de suprema
importância para eles. Nada consideravam mais importante do que
amar o Senhor, seu Deus, com todo o seu coração, alma, mente e
forças. Haviam recusado comer alimentos oferecidos aos ídolos e,
portanto, certamente não se prostrariam diante de uma imagem.
Todos os outros poderiam submeter-se ao decreto do rei, mas não
eles. Há um Poder mais alto que devia ser obedecido. Somente eles
seriam diferentes, não-conformistas. O pecado é pecado e não pode
ser cometido, ainda que não
praticá-lo implique em morte certa em uma fornalha ardente.
Quando todos se curvassem, eles permaneceriam de pé!
Durante vinte séculos, os regimes totalitários disseram aos
cristãos que estes deveriam conformar-se com suas exigências
ímpias ou morreriam. Nunca isto foi tão verdadeiro quanto no século
atual. Em muitos países do mundo, o povo de Deus sofre
perseguições. Definham na prisão, são restringidos às tarefas mais
insignificantes da sociedade, suportam a dor de perderem seus
filhos, gritam sob tortura e morrem horrivelmente. Enfrentam tudo
isso para não se conformarem com as exigências das autoridades
que lhes ordenam abandonar sua fé e a dar-lhes o primeiro lugar em
suas vidas, o qual deve ser dado somente a Deus.
Muitos dos cristãos vivem sob tais regimes. Mas as palavras de
Samuel Rutherford permanecem verdadeiras: “Você não conseguirá
entrar sorrateiramente no céu, acompanhado de Cristo, sem
conflitos e uma cruz”. Pessoas ao nosso redor nos pressionam para
que nos unamos a elas em seus pecados. Insistem repetidamente:
“Todos o fazem, por que não você? Por que ser diferente? Vamos,
apenas esta vez; só esta vez”.
Jovens cristãos são instados a se embriagar com seus amigos ou
a perder sua virgindade antes do casamento. São tentados a mentir,
a roubar, a ler livros impróprios e a ver programas de televisão e
filmes indecentes. A profanação do Dia do Senhor, o desperdício de
dinheiro, o mau uso do tempo, os jogos de azar, a aquisição
desonesta de riquezas e muitos outros pecados e indecências são
exaltados como virtudes. A coisa “legal” é ficar sob luzes piscantes e
“curtir” músicas maliciosas.
O mundo tem sua própria fornalha ardente à espera daqueles que
não se conformam com a adoração de seus ídolos. É a fornalha de
ser desprezado, ridicularizado, escarnecido, repudiado e ignorado.
Aqueles que temem a Deus e mantêm vidas puras são
considerados “quadrados” e indiferentes, sendo excluídos da vida e
dos interesses dos outros ao seu redor. Para muitos jovens crentes,
a pressão parece irresistível. Sentem-se forçados a uma escolha.
Ou se identificam e vivem como todos os demais, ou assumem uma
postura firme e perdem tudo.
Esta foi a escolha apresentada a Sadraque, Mesaque e Abede-
Nego!
O QUE ACONTECEU
O resultado foi que os três crentes não-conformistas foram
lançados na fornalha ardente. Porém, ali receberam livramento.
Devemos notar que receberam livramento no fogo e não do fogo.
A intensidade da fúria de Nabucodonosor alterou até mesmo a
sua aparência (v. 19). Em seu furor, ordenou que a fornalha fosse
aquecida sete vezes mais do que o normal. Quando os santos se
recusam a pecar, não há limites para a fúria dos ímpios. Aqueles
que dizem estar preparados para entrar na fornalha, por amor ao
Senhor, devem ser alertados de que a fornalha pode ser
consideravelmente mais quente do que podem imaginar.
Com base no versículo 20, é óbvio que Nabucodonosor esperava
oposição à sua ordem para executar os três rebeldes, pois colocou
essa tarefa nas mãos dos homens mais fortes de seu exército. Os
versículos 21 a 23 nos mostram aqueles homens carregando os três
jovens, atados em suas roupas palacianas, ao topo da fornalha.
A fornalha era como um grande caldeirão. Na parte lateral, ao
fundo, havia uma porta através da qual se colocava a lenha. Mas a
parte de cima era aberta. O remanescente fiel a Deus foi conduzido
a essa parte superior. A fornalha estava tão quente que os auxiliares
de Nabucodonosor, que carregavam os jovens, foram mortos pelo
intenso calor; mas não antes de lançarem para dentro Sadraque,
Mesaque e Abede-Nego. Os que olhavam para a abertura cheia de
fumaça, viram-nos caindo através das chamas até o fundo da
fornalha. Estavam atados e indefesos; e o fogo, que já matara os de
fora, os mataria também. Com certeza, seria o fim do povo de Deus.
É tolice dizer isso!
Nunca acontecerá o fim do povo de Deus! O remanescente fiel
nunca desaparecerá. Seu número pode ser pequeno, porém jamais
deixará de existir. Nunca!
O livro de Apocalipse indica que este mundo verá o fim da igreja
cristã como uma instituição organizada. O tempo virá quando as
pessoas procurarão igrejas no sentido em que sempre as viram,
mas não as encontrarão. Contudo, isso não significa que a igreja
cristã acabará. O povo de Deus estará aqui na terra até o momento
da vinda de nosso Senhor.
Considere a Albânia. Não se encontra lá qualquer sinal visível da
igreja cristã. Não há indicação visível de que a igreja cristã tenha
exercido qualquer influência naquela nação. Nenhum livro, em
qualquer biblioteca, traz o nome de Deus, a não ser com desprezo,
e não há nem uma cruz em qualquer cemitério. Apesar disso, há
muitos que crêem e amam a Cristo naquele país. Os esforços para
erradicá-los falharam. O remanescente de Deus nunca poderá ser
destruído.
Nabucodonosor e seus cortesãos certamente esperavam ouvir
alguns gritos e ver três corpos explodirem nas chamas. Isso,
pensavam eles, seria o fim do caso. Não haveria mais rebeldes.
Todos os habitantes da Babilônia seriam pessoas dispostas a
curvarem-se à imagem de Nabucodonosor.
Mas, como todos os ímpios que já maquinaram contra o povo de
Deus, Nabucodonosor viu o que não desejava. Viu algo que o levou
a saltar de seu trono, para averiguar com seus conselheiros!
“Quantos homens foram lançados na fornalha?”
“Três.”
“Em que condição?”
“Atados.”
“Eu, porém, vejo quatro homens soltos, que andam passeando
dentro do fogo, sem nenhum dano; e o aspecto do quarto é
semelhante a um filho dos deuses” (v. 25).
Sem dúvida, Nabucodonosor descreveu a quarta pessoa nos
termos permitidos por sua própria capacidade religiosa. Ele o
chamou de “um filho dos deuses”. Não há dúvida, porém, de que a
quarta pessoa era o Filho de Deus.
A Bíblia ensina claramente que o Filho de Deus muitas vezes
apareceu na terra, em forma humana, antes que vivesse entre nós,
em carne humana. Freqüentemente, nessas teofanias anteriores à
encarnação, Ele é descrito como o “anjo do Senhor” ou “o Anjo” (Gn
48.16). Portanto, não ficamos surpresos ao ouvir a referência a Ele
como “seu anjo” (v. 28). O Senhor Jesus andou entre as chamas
juntamente com Sadraque, Mesaque e Abede-Nego! Uma
promessa, dada ao Israel de Deus pelos lábios de Isaías, não muito
tempo antes, mostrou-se verdadeira nesta ocasião: “Quando
passares pelas águas, eu serei contigo; quando pelos rios, eles não
te submergirão; quando passares pelo fogo, não te queimarás, nem
a chama arderá em ti” (Is 43.2).
Se os três houvessem obedecido a Nabucodonosor, jamais
teriam desfrutado do privilégio de andar com Cristo entre as chamas
da fornalha. Sua comunhão com Deus teria sido quebrada e
estariam atados para sempre, não com cordas e correntes, mas
com um profundo sentimento de fracasso, desapontamento e
inutilidade.
Em vez disso, tiveram o privilégio de andar com a segunda
pessoa da Trindade, o Filho de Deus, seis séculos antes que Ele
nascesse como homem. Ao rejeitarem o pecado, tiveram uma
experiência de comunhão com o Senhor Jesus Cristo, uma
experiência quase sem igual nas páginas do Antigo Testamento.
Quem imaginaria que isso seria possível neste mundo? Se
houvessem tentado salvar sua vida, eles a teriam perdido
verdadeiramente. E a vida lhes seria uma existência sem sentido e
sem comunhão. Mas, dispondo-se a perder sua vida, encontraram-
na. Ninguém perde por recusar-se a pecar, apesar de tudo que seja
dito em contrário. Nunca antes haviam tido a experiência de serem
livres do fogo. O livramento no fogo é a estratégia de Deus.
Deus consola extraordinariamente aqueles seus filhos que se
recusam a desonrá-Lo. Que influência poderiam esses três jovens
ter exercido sobre os ímpios, se tivessem se prostrado como todos
os demais? Nenhuma! Mas eis agora os ímpios a contemplá-los,
boquiabertos e admirados, por meio da abertura lateral da fornalha.
Eram testemunhas de que os jovens insubmissos caminharam com
Cristo, entre as chamas, e estavam inteiramente ilesos. Pelo que
sabemos, ninguém se converteu naquele dia. Mas receberam uma
impressão a respeito de Deus que, durante toda a sua vida, jamais
esqueceriam.
Ao final daquele dia inesquecível, todos conversavam sobre o
Deus de Sadraque, Mesaque e Abede-Nego. Não houve mais
qualquer menção da horrenda imagem! A pedido de
Nabucodonosor, os três saíram da fornalha, sem terem sequer um
fio de cabelo chamuscado! Nem suas roupas foram afetadas, nem
cheiro de fumaça havia neles!
Que Deus! Seus servos completamente ilesos! Que grande Deus!
Nabucodonosor não se convertera ainda, mas os eventos do dia
foram demais para ele. Uma vez mais, ele é levado a um
reconhecimento público sobre Deus.
Ao escrever estas páginas, encontro-me num escritório em
Liverpool, na Inglaterra. No passado, houve dias em que até mesmo
os não-convertidos desta nação tinham certo reconhecimento sobre
Deus. De modo geral, os homens e as mulheres não possuíam a fé
salvadora, mas, apesar disso, Deus era reconhecido em toda a vida
da nação. Dezenas de milhares de pessoas, inclusive as não-
convertidas, iam regularmente aos locais de culto, davam graças
pelas refeições e guardavam o Dia do Senhor. Recusavam-se a
usar linguagem imprópria, a mentir e a se embriagarem. Opunham-
se àqueles que tentavam destruir a vida familiar, ou jogavam, ou se
envolviam em qualquer forma de desonestidade. Isso acontecia não
por serem homens e mulheres salvos, mas porque haviam sido
feitas em sua consciência fortes impressões a respeito de Deus. A
moralidade da nação estava muito ligada ao senso que o povo tinha
sobre Deus.
Nosso país não é mais assim e está, de fato, se afastando dessa
posição a cada minuto. O declínio se iniciou quando a igreja
começou a ceder. Quanto mais buscava estar “na onda” e “levar
vantagem em tudo”, menor influência exercia sobre o povo no
sentido de aproximá-lo de Deus. Ao começarem a enfraquecer sua
mensagem, por não pregarem algo que fosse ofensivo, como o
inferno e os milagres, as igrejas perderam seu poder.
É somente quando o povo de Deus responde “Não!” àquilo que O
desagrada, não importando quão ofensivo isso seja para os outros,
que eles causam poderosa impressão sobre os ímpios.
Veja o que Nabucodonosor foi levado a reconhecer. No versículo
28, vemos que ele reconheceu quem é Deus. Compreendeu que
Deus tem servos, que havia enviado seu anjo e que era mais
poderoso do que ele próprio, embora fosse o mais poderoso homem
no mundo. Reconheceu que Deus é maior do que qualquer outro
deus e digno de ser louvado. Não chegou a reconhecer que Deus é
o único Deus, nem chegou à fé em Cristo. Todavia, certas verdades
foram indelevelmente gravadas em seu coração.
Sua reação foi editar um decreto (v. 29). Não há como justificar ou
aprovar o que ele ordenou. Devemos lembrar que ele ainda era um
homem não-convertido; e, através dos tempos, procurar trazer
outras pessoas a algum tipo de fé pelo poder da espada tem sido
uma das características de tais homens. Essa não é a maneira de
pessoas chegarem à fé. Somente homens de fé têm o
discernimento espiritual para compreender essa verdade.
Nabucodonosor não possuía tal discernimento. Portanto, ordenou
que qualquer pessoa que falasse mal do Deus de Sadraque,
Mesaque e Abede-Nego fosse cortada em pedaços e sua casa,
reduzida a monturo. Discordamos inteiramente deste decreto, mas
salientamos o fato que ele havia recebido uma poderosa influência a
respeito de Deus. Os piedosos foram maravilhosamente
preservados pelo gracioso poder de Deus, e o testemunho de Deus
permaneceu naquele império pagão.
A continuação do verdadeiro testemunho de Deus neste mundo
depende de uma única palavra. De igual modo, todo o poder do
povo do Senhor para ser uma testemunha eficiente para com os que
estão ao seu redor pode ser arruinado por uma única palavra.
Esta palavra é “sim”. Quando os incrédulos sugerem o pecado e
aqueles que cultuam a Deus concordam em praticá-lo, estes se
tornam como todos os demais. Assim, perdem todo o seu poder
para fazer qualquer bem ou preservar a verdade.
Quando as tentações são enfrentadas com um firme “Não!”, a
situação é totalmente diferente. Para começar, uma fornalha ardente
é certa. Ou ficamos fora da fornalha, com Nabucodonosor, ou dentro
dela, com Cristo. Não há meio termo. Mas o lugar de calor
irresistível é também o lugar de comunhão intensa com o Salvador.
Aqueles que andam por entre as chamas também gozam a certeza
de que estão fazendo uma marca indelével a respeito de Deus na
consciência dos não-convertidos.
Não há fornalha ardente que consiga destruir o povo de Deus. Na
verdade, tais fornalhas acabam se tornando o meio que Deus usa
para preservar seu remanescente fiel e manter viva a sua verdade
no mundo.
5 | A Vez de nabucodonosor
LEIA DANIEL 4
LEIA DANIEL 5
BELSAZAR
“Belsazar” quer dizer “Bel proteja o rei”; é, evidentemente, um
nome pagão. No passado, muitos céticos asseveraram que esta
história era ficção, pois Belsazar nunca existira. Mas os documentos
cuneiformes do Oriente Médio os silenciaram. Não há mais qualquer
dúvida a respeito da historicidade de Belsazar. Como sempre
acontece, a Bíblia estava certa, e os críticos, errados.
Daniel 5 chama Belsazar de “rei”, mas ele não era o único rei.
Naquele tempo, Nabonidus era o rei da Babilônia, e Belsazar era
seu co-regente. Este possuía todos os direitos, prerrogativas e
majestade do rei, exceto em um aspecto. Nas inscrições oficiais do
império, Nabonidus era sempre chamado “o rei”, e Belsazar recebia
um título menor que designava alguém que substituía o rei. Quanto
aos assuntos diários do império, ele governava juntamente com
Nabonidus; ambos tiveram um relacionamento harmonioso. Se
houvesse diferença de opinião entre eles, Nabonidus teria a palavra
final. Todavia, não sabemos de qualquer ocorrência neste sentido.
Governavam juntos o vasto império babilônio.
Como Nabonidus, Belsazar era filho de Nabucodonosor. Mas é
possível que tenha sido filho (ou filho adotivo) de Nabonidus e que a
palavra “pai”, neste capítulo, tenha a idéia de “antepassado” ou
“avô”.
Isto significa que Belsazar vivera, como menino e rapaz, durante
os eventos relatados nos primeiros quatro capítulos de Daniel.
Belsazar testemunhou o fato de que Nabucodonosor descobrira que
quatro jovens eram extraordinários e eram também adoradores de
Jeová. Provavelmente ele ouviu a interpretação de Daniel, dada por
Deus, sobre o horroroso sonho de seu pai. Talvez participou da
admiração manifestada por terem Sadraque, Mesaque e Abede-
Nego andado com o Filho de Deus, entre as chamas da fornalha.
Deve ter visto seu pai (ou avô) tornar-se como um animal e tinha
conhecimento de como Nabucodonosor passara seus últimos dias
na terra gozando de uma fé pessoal no Deus vivo.
Belsazar crescera praticamente ao lado de Daniel e seus três
companheiros. Estes tinham apenas 14 anos quando foram
exilados; a diferença de idade entre eles não deve ter sido muito
grande. Talvez tenha ouvido Daniel orar ou pregar. Certamente o viu
permanecer firme por amor a Deus.
Neste capítulo, nos deparamos com um homem que, desde seus
primeiros anos de vida, havia presenciado um testemunho vivo do
verdadeiro Deus. Nunca devemos pensar que, na Babilônia,
Nabucodonosor foi a única pessoa exposta à verdade de Deus;
Belsazar teve a mesma experiência. Como seu pai, teve a
oportunidade de acertar sua vida com Deus. O Salvador havia
batido no coração de Belsazar por meio dos eventos que ele
testemunhara. Foi um homem que viu Deus lidando de modo
pessoal com alguém próximo a ele. Sabia o que era a conversão,
pois contemplara seu próprio pai tornar-se um servo de Jeová. O
verdadeiro Deus fora louvado e adorado no palácio que agora ele
ocupava, como rei.
Este homem agora dá uma festa para mil de seus dignitários!
Chegamos ao ponto em que a paciência de Deus para com
Belsazar está-se esgotando. Em vez de submeter-se a Deus,
Belsazar continua a resistir-Lhe. Permanece inquebrantável, e o dia
do acerto de contas está chegando. Sem que Belsazar saiba, mais
um passo no caminho da incredulidade o fará ultrapassar aquela
linha invisível. Dará somente mais um passo para longe de Deus, e
Deus apresentará a sua conta. Mais um ato de desprezo à pessoa
de Deus fará que Ele declare: “Basta!” O dia de oportunidade para
Belsazar se arrepender está terminando rapidamente. Não podemos
ir até aonde desejamos em nosso pecado; e a história de Belsazar
nos mostra isso. Mais um pecado, e será o fim de Belsazar!
A ocasião para o seu último pecado foi um grande banquete. Tais
eventos eram muito comuns na antiga Babilônia. Um grande
dignitário convidava outras personalidades a se reunirem a ele
unicamente com o propósito de se embriagarem. Era uma ocasião
para cânticos espalhafatosos e lascivos e para um comportamento
desenfreado. A noite terminava com os hóspedes sendo ajudados a
chegarem em suas casas, para, no dia seguinte, se orgulharem de
que haviam “se divertido”.
Os efeitos da embriaguês são bem conhecidos, e a Palavra de
Deus alerta freqüentemente contra ela. À medida que Belsazar fica
sob o efeito da bebida, despoja-se de toda a decência e decoro.
Convida a multidão de farristas a que se juntem a ele na profanação
dos utensílios que seu pai trouxera do templo de Jeová, quando
conquistou Jerusalém. Embriagam-se usando os utensílios que
haviam sido consagrados ao louvor do único Deus. Enquanto fazem
isso, canções são entoadas em louvor aos ídolos babilônios. A cena
é de desprezo ao Deus do céu, o Deus a respeito de quem Belsazar
ouvira desde a meninice, e de rejeição ao testemunho que lhe fora
apresentado durante toda a vida. O rei coloca os utensílios de ouro
nas mãos de seus hóspedes e lidera a orgia; escarnecem do
sagrado e exaltam o profano. “Beberam o vinho e deram louvores
aos deuses de ouro, de prata, de bronze, de ferro, de madeira e de
pedra” (v. 4).
A RAINHA
O terceiro personagem a aparecer na narrativa é a rainha (vv. 10-
12), que não é uma das mulheres de Belsazar, pois estas já
estavam na festa, como nos revelam os versículos 2 e 3. Quem,
então, é esta rainha? Possivelmente, a esposa de Nabonidus. Ela
possui o direito de entrar livremente na sala do banquete real, sem o
protocolo exigido de outros. Seu marido é o primeiro no reino, e
Belsazar, o segundo. Isso explica porque ele prometeu o terceiro
lugar no reino a quem pudesse interpretar a escrita na parede.
A rainha não esquecera aquilo que Belsazar havia esquecido.
Nos versículos 10 a 12, emprega um vocabulário pagão que lhe
devia ser peculiar. Porém, reconhece que Daniel tem uma sabedoria
sobrenatural. Era necessário apenas chamá-lo, e a interpretação
das palavras seria conhecida, pois ele possuía o dom de decifrar
enigmas e de interpretar sentenças difíceis.
Se Deus quisesse, poderia ter usado outra maneira para dar a
interpretação a Belsazar. Poderia, por exemplo, ter enviado os
dedos sinistros uma segunda vez, para escrever o significado da
primeira mensagem. Mas esse não é o método divino. Deus não
despreza o instrumento humano. Sua mensagem será apresentada
pelo seu servo. Lábios humanos trarão a mensagem ao rei. Deus
envolverá o remanescente nessa tarefa, não por ter necessidade de
fazer isso, mas porque seu método permanente é utilizar homens e
mulheres fiéis como seus cooperadores. Não prosseguirá sem eles.
É assim que Deus mantém viva, neste mundo, a sua verdade. A
chegada de Daniel nos traz o personagem que ocupa a maior parte
deste capítulo (vv. 13-29).
DANIEL
As perguntas dirigidas a Daniel, no versículo 13, confirmam que
Belsazar já sabia bastante a respeito dele. Isso ressalta o fato que
sua ignorância quanto aos caminhos de Deus era voluntária.
Belsazar fora exposto às coisas sagradas desde a meninice e,
quando se tornou rei, preferiu não ter Daniel na corte. Não queria,
em seu palácio, um profeta de Jeová. A última pessoa que desejava
como seu conselheiro e confidente era o mensageiro escolhido de
Deus. Quão diferentes seriam os acontecimentos, se Belsazar
tivesse Daniel no palácio desde o início do seu reinado!
De qualquer modo, Daniel se encontra agora diante dele. Nos
versículos 14 a 16, vemos Belsazar explicando a situação ao profeta
e prometendo recompensá-lo, se interpretasse o que estava escrito
na parede. Não precisamos de muita imaginação para visualizar a
cena, enquanto Daniel considera a sua resposta. Mil dos grandes de
Belsazar estão quietos, aterrorizados. Aqueles que há pouco
zombavam do Deus vivo estão calados, pálidos e perplexos,
aguardando com grande expectativa a resposta do homem de Deus.
Em suas palavras iniciais, Daniel informa sua rejeição aos
presentes do rei (v. 17). Diferentemente dos astrólogos e sábios ao
seu redor, ele não dava interpretações tendo em vista o ganho
pessoal. Não procurava recompensas ou favores. Não fazia isso por
dinheiro. Estas palavras devem ter causado impressão naquelas
pessoas, como ainda o fazem quando os servos de Deus mostram
não estar interessados nas honras do mundo. É claro que, apesar
das conseqüências, Daniel proclamaria a verdade. Não aceitaria
suborno para dizer o que as pessoas desejavam ouvir. Tampouco se
deixaria aliciar, a fim de evitar o que seria ofensivo àquele povo. A
interpretação seria verdadeira.
Daniel prosseguiu, falando sobre o pai de Belsazar: “Ó rei! Deus,
o Altíssimo, deu a Nabucodonosor, teu pai, o reino e grandeza,
glória e majestade” (v. 18).
Belsazar era somente um co-regente. O império já não era mais
como antes. Em sua história, nunca houvera outro maior que
Nabucodonosor, mas ele devia ao Deus altíssimo tudo que possuía.
Deus é maior que Nabucodonosor! Nabucodonosor era responsável
para com Deus pelo exercício de seu poder. E veja o que Deus lhe
fez! Daniel recorda a Belsazar como Deus humilhou seu pai: “Até
que conheceu que Deus, o Altíssimo, tem domínio sobre o reino dos
homens e a quem quer constitui sobre ele” (v. 21).
É como se Daniel estivesse dizendo: “Tu, Belsazar, agiste como
se fosses a maior pessoa que já existiu. Porém, teu pai foi maior do
que tu, e Deus é maior do que ele! Foi Deus quem lhe deu tudo que
ele possuía. Há um Deus altíssimo, e, embora sejas, na terra, o
homem a quem todos prestam contas, tu mesmo és responsável
perante Deus. Ele te deu tudo o que tens e pode tomá-lo facilmente.
Isso se aplica até mesmo ao teu entendimento”.
“Sabias disso, Belsazar. Sabias como Deus humilhou a teu pai,
até que ele se tornou um suplicante, mas não seguiste o seu
exemplo. Agiste como um homem independente e sem
responsabilidades. Foste ainda mais longe. Desafiaste o Deus do
céu. Vê a quem adoraste: aos deuses de prata, de ouro, de bronze,
de ferro, de madeira e de pedra, que não vêem, não ouvem, nem
sabem”.
“Vê, Belsazar, a quem desprezaste. Deus, em cuja mão está a
tua vida e todos os teus caminhos, a ele não glorificaste (v. 23). Por
isso, os dedos vieram e inscreveram na parede. Era uma
mensagem enviada por Deus!”
Belsazar foi condenado por seu orgulho. O orgulho, na Bíblia, é a
ausência de humilhação. Uma pessoa orgulhosa é aquela que não
se humilha perante Deus. Diante de seus colegas, pode não parecer
orgulhosa. Pode mostrar-se humilde entre seus vizinhos, e sua
família pode não perceber seu orgulho. Todavia, um coração que
não louva e adora a Deus é um coração orgulhoso. Este orgulho
caracteriza todos os homens e mulheres que seguem o caminho
que conduz ao inferno. Belsazar foi um grande pecador, mas esse
não é o assunto em questão. Sua culpa estava no fato de não
querer nada com o Deus vivo e verdadeiro. Não O buscou, como
uma criança, nem permitiu que Ele governasse sua vida.
Permaneceu nesta situação até que chegou a zombar do Altíssimo.
Neste ponto, cruzou a linha invisível. Dizemos outra vez: ninguém
precisa escolher um caminho especial para ir ao inferno; necessita
apenas permanecer, por tempo suficiente, no caminho em que está.
O versículo 25 preserva para nós o conteúdo da escrita na
parede. Consistia de três termos diferentes, um dos quais foi escrito
duas vezes. MENE, MENE quer dizer “contado, contado”. Após
estes, TEQUEL, que significa “pesado”, seguido da palavra
PARSIM.
“PARSIM” é o plural de PERES com a palavra “e” à sua frente.
Por isso, a nós, que não conhecemos aramaico, parece que a
interpretação difere das palavras escritas. Ao repassar cada palavra,
Daniel pronunciou-as em sua forma singular e não na forma em que
foram inscritas na parede.
A escritura na parede dizia: “Contado, contado, pesado e
dividido”. Isso era tudo que Deus tinha para comunicar ao arrogante
Belsazar, mas a amplitude total do significado seria explicada pelo
íntegro Daniel.
“MENE significa ‘contado’, porque os teus dias estão contados,
rei Belsazar! Deus decidiu trazer ao fim o teu reino ímpio. Teu
período de governo terminou. Durante todos estes anos, Deus tem
pesado o teu domínio; agora, é tempo de findá-lo. Ele está dizendo:
‘Basta!’; o teu reino acabou. Deus o acabou!” (v. 26).
“TEQUEL significa ‘pesado’.. Belsazar, Deus pesou cada ato de
tua vida. Ele tomou nota das oportunidades em que, na tua
meninice, rejeitaste vir a Ele. Anotou todos os convites que
desprezaste, convites que tinham o propósito de tornar-te um súdito
dEle. Os dedos enviados por Deus escreveram na parede o teu
epitáfio. Sem dúvida, enquanto o faziam, tua vida passada flamejava
em tua mente. Teus pecados ocultos e conhecidos, tuas horas
desperdiçadas, tua crueldade, teu orgulho, tuas desordens e
bebedeiras, tua rejeição às coisas santas e tua resistência ao que é
espiritual – Deus pesou tudo. Colocou tudo em sua balança.
Considerou tua vida do começo ao fim; ela não alcançou, não
satisfez o padrão exigido por Deus” (v. 27).
Quando as pessoas escarnecem do Altíssimo, Ele não ignora
isso. Visto que Deus não age imediatamente, os ímpios concluem
que ele não agirá de maneira alguma. Contudo, Ele pesa em sua
balança toda zombaria e afronta. Nada é esquecido. Ele registra
todos os convites para vir a Cristo que foram rejeitados. Anota cada
desprezo à sua ordem de arrependimento. Todos que não valorizam
à fé evangélica, que zombam das coisas santas e, especialmente,
aqueles que rejeitam a ternura de seu Criador têm suas ações
gravadas no céu. Deus registra tudo.
“A vida cristã não é para mim”, dizem alguns. “O custo é muito
grande”, afirmam outros. “Não quero ser diferente. Todos pensarão
que sou uma pessoa esquisita. Os crentes são fanáticos. Por que eu
deveria ser um extremista?” O Deus sempre presente ouve e lembra
esses e todos os demais comentários. Por fim, Ele não os aceitará
mais, e a escrita aparecerá na parede. Os dias de frivolidades
terminarão. Chegará o dia da condenação.
“PERES quer dizer ‘dividido’. Teu reino será dividido e destruído.
Isso acontecerá pelo poder dos medos e persas. O reino será
tomado de ti, Belsazar, e será dado a outro” (v. 28).
E não foi somente aquele reino que Belsazar perdeu. Ele perdeu
também o reino de Deus. Nosso Senhor Jesus Cristo fez uma
acusação semelhante aos judeus. Disse-lhes que haviam rejeitado
os profetas, apedrejando-os e matando-os. Finalmente, rejeitaram o
filho de Deus. A resposta de Deus foi tomar a vinha de suas mãos e
dá-la a outros (Mt 21.33-43).
Paulo repetiu esta mesma verdade. Quando os judeus rejeitaram
a mensagem do evangelho, ele os advertiu de que Deus tomaria
seus privilégios e os daria aos gentios (At 13.44-50). Algo
semelhante acontece quando uma pessoa rejeita constante e
obstinadamente o evangelho. Por fim, Deus lhe diz: “Visto que você
rejeita tão obstinadamente a única mensagem que pode salvá-lo, eu
o julgarei retirando-o de você. Ainda que você busque o
arrependimento e o busque com lágrimas, não será capaz de achá-
lo” (cf. Hb 12.17).
A linha invisível foi ultrapassada, não há mais retorno. Tudo está
acabado para quem a ultrapassou. Não há mais oportunidade para
alcançar misericórdia. Tudo que agora está reservado para essa
pessoa é “certa expectação horrível de juízo e fogo vingador” (Hb
10.27).
DARIO
Embora Daniel tenha recusado recompensas terrenas, estas lhe
foram dadas, porque Belsazar reconheceu ter ouvido a verdade (v.
29). Mas tudo isso é efêmero. E este capítulo solene termina
introduzindo-nos um quinto personagem – Dario (vv. 30-31).
Durante aquela noite em que Daniel profetizou, os exércitos de
Nabonidus lutaram contra os medos e persas que ameaçavam as
fronteiras de Babilônia. Mas Ciro, o persa, agiu rapidamente.
Desviou o curso do rio Eufrates e o transpôs. Pela manhã, os
exércitos dos medos e persas haviam invadido e conquistado a
Babilônia. Belsazar era um cadáver no palácio e ouvia a
condenação do Criador que ele tão afrontosamente havia
desprezado e de quem zombara na noite anterior. A profecia de
Daniel se cumpriu, e Deus demonstrou, mais uma vez, que é o
verdadeiro Governador da história deste mundo. A cabeça de ouro
deu lugar ao peito e braços de prata. Dario, com sessenta e dois
anos, ascendeu ao trono.
Não sabemos quando Deus dirá a alguém: “Mais um pecado, e
será o último. Então, a escrita na parede se aplicará a ti. Eu te
chamarei à eternidade, enquanto todos no céu se unirão a mim,
dizendo: ‘Louco, esta noite te pedirão a tua alma’” (Lc 12.20).
“Buscai o S enquanto se pode achar, invocai-o enquanto
está perto. Deixe o perverso o seu caminho, o iníquo, os seus
pensamentos; converta-se ao S , que se compadecerá dele, e
volte-se para o nosso Deus, porque é rico em perdoar” (Is 55.6-7).
7 | Na cova dos leões
LEIA DANIEL 6
APOCALÍPTICO
Isto se deve ao fato que a segunda parte do livro de Daniel é bem
diferente da primeira. A diferença mais óbvia é a mudança de estilo.
Os primeiros seis capítulos foram narrativos e históricos e, portanto,
fáceis de considerar. Os próximos seis capítulos são principalmente
apocalípticos.
O que é isso? É um tipo singular de literatura judaica, da qual os
seis últimos capítulos de Daniel são o exemplo mais antigo. Grande
quantidade dessa literatura foi produzida pelos judeus entre 200
a.C. e 100 d.C. Esses livros não foram divinamente inspirados e,
portanto, não se encontram em nossa Bíblia. Mas há passagens
apocalípticas em diversos dos profetas; bons exemplos são Isaías
24 a 27, Joel e Zacarias 9 a 14. Os exemplos do Novo Testamento
são o discurso de nosso Senhor no monte das Oliveiras (Mateus 24)
e, de modo especial, o livro de Apocalipse.
A maior parte da literatura apocalíptica foi escrita para encorajar
os fiéis em tempos de perseguição. Seus principais temas são
sempre os mesmos: o crescimento do mal, o cuidado de Deus por
seu povo e a segurança de que o mal não prevalecerá. A única
coisa de duração eterna é o reino de Deus.
Todos os escritos apocalípticos afirmam ser revelações de Deus,
dadas de modo extraordinário, em geral por meio de visões e
sonhos. Foi assim que surgiram os primeiros textos apocalípticos. E
não nos surpreende o fato de que essa afirmação seja atribuída
também aos livros não-inspirados. Todos, em maior ou menor grau,
são baseados nos admiráveis capítulos que estudaremos agora.
A característica mais notável da literatura apocalíptica é seu
simbolismo. Em Daniel 7 a 12, o futuro curso da História será
delineado pelo profeta, por meio de números, animais e chifres. A
linguagem é misteriosa. De fato, às vezes é quase grotesca. Mas,
quando tentados a pensar que é desnecessariamente extravagante,
devemos apenas lembrar que sua linguagem é simples e modesta,
se a compararmos com os falsos apocalipses de anos posteriores.
Nestes, a linguagem é quase ininteligível, e os autores anônimos
utilizaram todos os tipos de animais em suas supostas visões. A
Palavra de Deus está livre desses extremos fantasiosos.
A literatura apocalíptica é a História escrita sob o disfarce de
profecia. Naturalmente, no caso de textos apocalípticos das
Escrituras, a História é genuinamente profética. Os eventos foram
registrados antes de acontecer. Os escritos apocalípticos que não
se encontram na Bíblia são diferentes. Os eventos já haviam
acontecido quando os autores escreveram; estes apenas
registraram o passado. Então anexaram o nome de um autor que
havia morrido há muito tempo e se esforçaram para que tal escrito
fosse aceito como profecia genuína. Mas ninguém era enganado por
muito tempo. Os únicos escritos apocalípticos que não foram
posteriormente demonstrados como falsos são os que estão nas
páginas da Bíblia. Isso é mais uma demonstração de que a Palavra
de Deus tem origem celestial, sendo inteiramente distinta das meras
invenções humanas.
Chegamos, então, aos capítulos que profetizam tribulações
futuras aos fiéis. Eles sempre viverão em um mundo hostil e
perseguidor, mas não precisam desanimar. Deus é o Senhor da
História. Todos os eventos estão consumando firmemente os seus
propósitos. No tempo oportuno, Ele aniquilará o domínio do mal e
estabelecerá o seu reino eterno.
PROPÓSITO
Com isso em mente, o propósito geral dos capítulos 7 a 12 já
deve estar claro para nós. Pessoas que permanecem firmes,
sozinhas, por amor a Deus, necessitam de encorajamento. Não é
suficiente que saibam como permanecer firmes; também precisam
saber por que vale a pena manter essa atitude. Isso fica claro
quando o crente é informado sobre o futuro da história mundial e
adquire alguma compreensão do desenrolar do plano de Deus na
História.
Afinal de contas, os capítulos que estudaremos tiveram um efeito
maravilhoso sobre o próprio Daniel. Por exemplo, no capítulo 5
vemo-lo completamente sozinho na corte blasfema de Belsazar,
profetizando tanto a morte iminente do rei como a tomada imediata
do império babilônio pelos medos e persas. Quem pode imaginar a
coragem necessária para anunciar tais coisas? Onde Daniel obteve
forças para fazê-lo? Por que ele julgou que deveria dizer a verdade,
embora isso significasse perder a própria vida?
Compreenderemos a resposta quando tivermos lido os capítulos
7 e 8. O capítulo 7 registra um sonho; o capítulo 8, uma visão. O
sonho profetizava a ascensão e a queda dos impérios apresentados
no sonho de Nabucodonosor (capítulo 2). Daniel chegou à
compreensão de que a história humana é dirigida por uma corte
celestial, que decreta que somente o reino do Senhor Jesus Cristo
permanecerá eternamente. A visão que seguiu o sonho se referia a
um futuro imediato. Enfatizava que o império medo-persa, o qual
estava próximo, daria lugar ao império grego; deste se levantaria um
terrível perseguidor do povo de Deus, mas Deus o aniquilaria, no
auge de sua influência.
Daniel viu tudo isso antes mesmo de entrar no palácio de
Belsazar naquela noite sinistra. Por duas vezes, Daniel fora
lembrado de que todos os eventos na história humana servem
apenas para cumprir os propósitos divinos. Deus decretara que ao
império babilônio seguir-se-ia o medo-persa. Por que, então, ter
receio de revelar esse fato a Belsazar? Por duas vezes, Daniel
havia sido lembrado de que o mal jamais poderá vencer. Por que,
então, temer resistir-lhe? As visões dos capítulos 7 e 8 lhe
mostraram que vale a pena permanecer firme por amor a Deus.
As revelações dadas no capítulo 9 produziram o mesmo
resultado. Foram dadas pelo anjo Gabriel, no primeiro ano do
reinado de Dario, numa ocasião em que Daniel orava. Seria a
oração do capítulo 9 uma das que Daniel proferiu durante as
provações registradas no capítulo 6? De qualquer modo, esse
capítulo nos revela algo a respeito do conteúdo das orações do
profeta, trazendo mais informação sobre por que suas janelas eram
abertas em direção a Jerusalém.
Como resultado das revelações trazidas pelo anjo, Daniel se
tornou plenamente informado de que os judeus retornariam à
Palestina, reconstruiriam Jerusalém e testemunhariam a chegada do
Messias. Havia um futuro para o povo de Deus. Deveria ele
envergonhar-se de pertencer a esse povo? Não deveria, antes,
deixar evidente que estava do lado de Deus, ainda que significasse
perder a própria vida? O mal não tem futuro; então, por que capitular
diante dele?
Havia também uma outra consideração. A experiência de Daniel
no capítulo 9 mostrou-lhe que Deus responde à oração, às vezes
até por meio de visitações angelicais. Se uma oração pode ser
ouvida em um quarto de dormir, por que não em uma cova de
leões? Não poderia um anjo vir com a mesma facilidade à cova dos
leões? Foi precisamente o que aconteceu.
E sobre os capítulos 10 a 12? Eles constituem uma única visão,
recebida quando Daniel já tinha pelo menos oitenta e seis anos.
Podemos ver como os escritos dos capítulos 7 a 9 o ajudaram
quando, sozinho, teve de permanecer firme. Porém, qual foi o efeito
prático dessa última visão? Veio no tempo em que o profeta se
aproximava do final de sua vida.
Muitos crentes idosos e maduros são, às vezes, perseguidos por
dúvidas. O diabo não deixa de nos tentar somente porque nos
tornamos idosos! É possível que o piedoso Daniel tenha passado
por essa experiência? Será que ele indagou a si mesmo se valera a
pena viver toda a sua vida como um “homem diferente”? Teria
desperdiçado seu tempo permanecendo firme, sozinho? Não teria
sido melhor comprometer-se com o pecado?
Embora, em sua mente, Daniel tivesse concebido tais
pensamentos, a visão final, registrada nos capítulos 10 a 12, os
teriam dissipado rapidamente. Nesta, ele viu não apenas alguns dos
anjos santos, mas o próprio Filho de Deus. Viu também, com nova
ênfase, que a história humana é governada por Deus até o seu final.
A visão continha uma profecia detalhada da história do império
grego e, muito especialmente, da carreira ímpia de Antíoco Epifânio.
Daniel sabia que após sua morte o povo de Deus enfrentaria
indescritível perseguição, não apenas de Antíoco, mas também do
Anticristo, durante os últimos eventos da história do mundo.
Igualmente, Daniel percebeu que o princípio de Deus é destruir o
mal quando ele está no auge. O mal vencerá muitas batalhas,
porém jamais ganhará a guerra, jamais triunfará. Deus é Deus e não
pode ser derrotado. Somente aqueles que têm sido fiéis a Ele
experimentarão uma ressurreição gloriosa e um descanso eterno.
Sendo isso verdade, como poderia Daniel sentir qualquer
remorso por haver trilhado um caminho tão solitário, por tão longo
tempo?
O efeito das visões finais em Daniel tem sido o mesmo para
incontáveis leitores desde aquela época. Vez após vez, muitos
homens e mulheres têm testemunhado que dos primeiros seis
capítulos aprenderam como permanecer firmes por amor a Deus,
mas foi através dos seis capítulos seguintes que aprenderam o
motivo para ser fiel. Um antigo exemplo dessa motivação
encontramos nos judeus fiéis, perseguidos durante o reinado de
Antíoco Epifânio (175–164 a.C.). Durante os anos mais difíceis da
perseguição, o livro de Daniel foi o principal conforto deles; centenas
de cópias secretas foram produzidas e amplamente distribuídas.
Não há dúvidas de que o encorajamento oferecido pelo livro de
Daniel foi a principal razão por que tantos deles não se renderam ao
poder do mal. Como poderiam? Com base nestas visões proféticas,
sabiam que, assim como todo o mal, Antíoco estava condenado.
Muitas gerações se passaram desde então, mas em todo o
mundo os crentes ainda têm de permanecer firmes por amor a
Deus. Talvez você esteja sozinho e precise permanecer fiel em
casa, na escola, na universidade ou no trabalho. Se você se
encontra nesta circunstância, é provável que perguntas surjam com
freqüência em sua mente. Muitas vezes você poderá perguntar:
“Onde vai terminar tudo isto? Todos ao meu redor parecem viver
como se Deus, Cristo e a Bíblia não existissem e como se não
houvesse morte ou julgamento. Quando acabará tudo isto?”
Ocasionalmente, chegamos a dizer: há alguma razão para
continuar? Aqui estou eu, procurando viver de modo fiel a Deus,
porém tudo o que consigo são maus tratos. Em cada esquina,
parece haver uma fornalha ardente ou uma cova de leões. Não
importa o que faça ou quão bem eu viva, minha vida parece ser de
constante tribulação. Há razão para continuar firme, como uma
minoria perseguida?
Graças a Deus, vale a pena continuar! Os próximos seis capítulos
nos convencerão disto e nos mostrarão o motivo. Este é o seu
propósito.
CONTEÚDO E INTERPRETAÇÕES
Devemos ter aprendido, da seção anterior, que estes seis
capítulos finais não se apresentam como seis assuntos diferentes a
serem considerados, e sim como três assuntos.
Os capítulos 7 e 8 são dois aspectos do primeiro assunto. O
capítulo 7 é a visão de quatro grandes animais que se levantam do
mar. Os primeiros três são facilmente reconhecidos como um leão,
um urso e um leopardo. Mas o quarto é indescritível e tem dez
chifres. No entanto, logo é esquecido, e a narrativa focaliza-se em
um décimo primeiro chifre, que surge depois dos outros e destrói
alguns deles. Este não é o único foco do capítulo. Em sua visão,
Daniel também contempla a corte celestial que governa a história,
assegurando-lhe que ninguém, exceto Aquele cuja aparência era
“como o Filho do Homem”, governará para sempre.
O que significa tudo isso? Felizmente, o livro de Daniel é auto-
interpretativo e jamais nos deixa na ignorância quanto ao significado
do que está relatando, embora muitos detalhes não sejam claros.
Neste caso, há um paralelo óbvio entre as quatro partes da imagem
do sonho de Nabucodonosor (capítulo 2) e os quatro animais que
sucedem um ao outro (capítulo 7). Ambos ocupam o espaço de
tempo entre o império babilônio e o estabelecimento do reino de
Cristo; os outros impérios situam-se entre esses dois marcos. Não
achamos o capítulo 2 difícil de entender, e o capítulo 7 não é mais
complexo do que ele, exceto quanto aos dez chifres e ao décimo
primeiro, que são características novas.
O outro aspecto desse primeiro assunto é o capítulo 8. Este é
uma visão sobre um carneiro com dois chifres (identificado
especificamente como a Medo-Pérsia), derrotado por um bode do
Ocidente (identificado especificamente como a Grécia). A visão não
vai além do império grego, parando e se concentrando em um
“chifre pequeno”, que surge do bode. Esse “chifre pequeno”, do
capítulo 8, não deve ser confundido com o do capítulo anterior, pois
não emerge do quarto império, e sim de uma divisão do terceiro.
Veremos que se refere a Antíoco Epifânio e verificaremos por que a
mesma terminologia é aplicada tanto a ele quanto à figura
profetizada no capítulo 7.
Nosso segundo assunto é o capítulo 9. Veremos ali que,
enquanto Daniel examinava as Escrituras, descobriu na profecia de
Jeremias que o exílio babilônio duraria 70 anos e calculou que o
tempo estava quase esgotado. Portanto, começou a suplicar a
misericórdia de Deus para os judeus, tendo em vista o seu retorno à
Palestina. Antes de findar sua oração, recebeu a visita do anjo
Gabriel, assegurando-lhe que os judeus realmente voltariam,
reconstruiriam Jerusalém e, no tempo oportuno, testemunhariam a
vinda do Messias.
Para os eventos profetizados, Gabriel forneceu um calendário de
“setenta semanas”. Através dos anos, tem havido considerável
desacordo quanto ao que Gabriel queria realmente dizer, e os
últimos quatro versículos do capítulo 9 são corretamente vistos
como os mais difíceis de todo o livro. Isso tem levado algumas
pessoas a manterem-se afastadas desse capítulo, tornando-se
relutantes em estudar qualquer parte dele. Não adotaremos tal
atitude, mas teremos cuidado de não sugerir que temos solucionado
todos os problemas apresentados por aqueles versículos.
Isso nos traz ao nosso terceiro e último assunto, os capítulos 10 a
12. Estes contêm uma longa visão que Daniel recebeu quando já
idoso. O capítulo 10 introduz a visão, relatando-nos as
circunstâncias em que foi dada. Aprenderemos que essa revelação
final veio do próprio Senhor Jesus Cristo! O velho profeta tinha de
ser sobrenaturalmente fortalecido para recebê-la.
Inicialmente, a visão coincide em parte com a do capítulo 8.
Explica que o império grego sucederia ao da Pérsia. A profecia se
torna mais e mais detalhada à medida em que prossegue. Traça a
ascensão e queda de Alexandre, o Grande, e o relacionamento
entre as duas divisões ocidentais, que surgiram após sua morte. E,
novamente, nossos olhos são levados a focalizar a carreira de
Antíoco Epifânio e as atrocidades que ele cometeria contra o povo
de Deus. Mas, prosseguindo no estudo, logo nos deparamos com
alguém semelhante a ele, um arquiinimigo do povo de Deus, que, no
final dos tempos, ocupará o centro da história mundial. Por fim,
chegamos a compreender plenamente por que tanto Antíoco como
esse novo personagem podem ser mencionados ao mesmo tempo.
Um prefigura o outro, e, como vimos nos capítulos 7 e 8, ambos
podem ser descritos como o “chifre pequeno”.
Mas não concluímos o livro aterrorizados com o poder do mal.
Somos assegurados de que seu poder será finalmente aniquilado, e
aqueles que têm sido fiéis a Deus experimentarão, com certeza,
uma bem-aventurada ressurreição e a glória eterna. As últimas
palavras são uma exortação a Daniel, para que ele continue em seu
viver espiritual. Teremos entendido suficientemente bem os
capítulos proféticos se nos trouxerem à mesma conclusão prática.
9 | A visão dos quatro animais
LEIA DANIEL 7
A INTERPRETAÇÃO
A visão deixou Daniel perturbado (v. 15). Tornou-o ansioso.
Então, ele se voltou a um dos atendentes celestiais e lhe pediu a
explicação (v. 16).
Foi-lhe dito claramente que os quatro animais representavam
quatro impérios ou “reis” e que as únicas pessoas que
experimentariam um reino eterno seriam o povo de Deus (vv. 17-
18).
Obviamente, a profecia não está se referindo a um reino terreno,
porque nenhum reino terreno poderia ser descrito como eterno.
Podemos esquecer a idéia de um milênio terreno. O reino eterno
que Daniel viu é o reino de Deus, que se estabelece em nosso
coração quando cremos no evangelho, cuja consumação
gozaremos eternamente, em glória.
Os versículos 19 a 22, deixam evidente que Daniel manifestou
interesse especial pelo quarto animal. Somos informados de um
detalhe adicional: o animal tinha garras de bronze. Contudo, o chifre
pequeno ainda era o maior interesse. Um detalhe adicional é dado a
respeito dele: tornou-se mais forte do que qualquer dos dez chifres
que o precederam (v. 20). Seu poder era inigualável. Esse chifre
representa o indivíduo que, como nenhum outro, se opõe ao povo
de Deus e pratica o mal como ninguém jamais o fez antes dele. Usa
seu poder de tal modo, que o povo de Deus não prevalece diante
dele. Seus dias parecem ser de triunfo final do mal sobre tudo que é
bom e santo (v. 21). As coisas parecerão assim, até que seja
aniquilado pelo Ancião de dias, que finalmente acolherá seu povo
em um reino seguro e eterno.
A interpretação descreve o poder dos romanos, mais poderosos
em suas conquistas do que quaisquer outros antes deles (v. 23).
Enfatizamos novamente que desse animal procedeu a multiplicidade
de reinos. É importante notar isso, porque freqüentemente ouve-se
falar sobre a possibilidade de um império romano restaurado; e
citam Daniel 7 como base para essa idéia. Neste capítulo, não há a
menor sugestão de que o império romano será restaurado. De fato,
esta profecia parece ensinar o oposto. Roma dará lugar a dez
reinos, que, por sua vez, serão eventualmente sucedidos pelo chifre
pequeno, com toda sua agressão e presunção (v. 24). Ele abaterá
três dos reis anteriores, mas não temos indício de como ou quando
isso acontecerá, nem precisamente o que significa. Mais uma vez,
expressamos nossa dúvida quanto a tomar o número três em
sentido literal.
Toda a história prossegue para o surgimento do chifre pequeno, o
tempo de sua blasfêmia e de sua perseguição ao povo de Deus (v.
25). Será tão arrogante que mudará os tempos e épocas ordenados
pelo próprio Deus. Serão dias terríveis, dias em que o povo de Deus
estará em suas mãos!
Por quanto tempo ele exercerá seu poder? O final do versículo 25
responde: “Por um tempo, dois tempos e metade dum tempo”.
Quanto tempo isto significa? Mais uma vez peço que discorde, se
desejar, mas a interpretação que segue me parece razoável, e creio
ser correta. Esse indivíduo terrível entrará em cena e, por um
tempo, perseguirá o povo de Deus e realizará seus maus desígnios.
Quando esse tempo terminar, ele agirá assim pelo dobro desse
tempo. Então, parecerá que continuará por duas vezes esse tempo,
dando a impressão de que ficará aqui para sempre e jamais haverá
fim para o mal irrestrito de seu reino. No entanto, em vez disso, seu
período de governo será um tempo, tempos e meio tempo! Deus o
destruirá imediatamente, enquanto ele e seu poder para o mal
estiverem no auge. Isso será admirável! Maravilhoso!
Essa interpretação é melhor do que entender o enigma da
expressão “tempos” no sentido de três e meio! Quem quiser
discorde neste ponto. No entanto, quaisquer que sejam os detalhes
de sua interpretação, o ensino central do versículo 25 permanece
imutável. Chegará o dia em que o tempo do anticristo acabará! Ele
não permanecerá para sempre, não importa quão permanente
possa parecer. Haverá um final.
E quem realizará este final? O versículo 26 nos informa. O
tribunal do céu removerá o anticristo e todo o seu poder. O mal pode
afigurar-se onipotente, mas é uma ilusão. O poder absoluto pertence
somente a Deus; portanto, o aniquilamento do mal é uma certeza.
“Depois, se assentará o tribunal para lhe tirar o domínio, para o
destruir e o consumir até ao fim” (v. 26).
O mal é removido da terra por meio de uma palavra, uma palavra
de Deus! A culminação da História não será o triunfo do mal, e sim o
triunfo do povo de Deus (v. 27). Aqueles que foram oprimidos por
essa pessoa má não serão mais a cauda, e sim a cabeça; não serão
mais atribulados e estarão eternamente seguros, em um reino
eterno de justiça. Está chegando o dia em que não mais veremos,
ao nosso redor, os ímpios, os perversos e todos os poderes
malignos!
Esta foi a visão recebida por Daniel e sua interpretação.
Perturbou-o! Encheu-o de inquietação, tanto exterior como
interiormente (v. 28). Era uma verdade terrível, no amplo sentido da
palavra. O bondoso profeta guardou-a em seu coração, tornando-a
parte de seu arsenal. Devemos fazer o mesmo.
LEIA DANIEL 8
LEIA DANIEL 9
LEIA DANIEL 10
ALGUMAS LIÇÕES
Em primeiro lugar, um capítulo como este deve renovar e
fortalecer nossa confiança na Bíblia.
Como já expliquei antes, meu propósito em escrever este livro é
encorajar as pessoas a estudar o livro de Daniel por si mesmas.
Não faz parte de minhas intenções apresentar evidências que
favoreçam minha firme convicção de que Daniel foi escrito no século
VI a.C. O livro de Daniel é uma unidade; e não há evidência de que
qualquer parte dele tenha sido escrita em alguma outra ocasião. Há
evidências abundantes, internas e externas, de ter sido escrito no
século VI a.C. Essas evidências são explicadas nos livros dos
professores Robert Dick Wilson e E. J. Young. Os que têm acesso a
estas obras em inglês obteriam muito proveito estudando
detalhadamente o assunto. Deve-se notar que os argumentos deles
foram muitas vezes ignorados, mas nunca refutados.
O livro de Daniel é uma peça literária fantástica em que a História
foi escrita antes de se realizar! Não pode haver outra explicação
além desta: sua origem é sobrenatural. Não admira que nosso
Senhor Jesus Cristo tenha dito a respeito do Antigo Testamento em
geral e, portanto, do livro de Daniel: “A tua palavra é a verdade” (Jo
17.17).
A Bíblia não é somente um livro que contém verdades ou um livro
verdadeiro; é a própria verdade. A grande maioria dos homens e
mulheres ao nosso redor não sabem em que crer ou para onde se
voltar em suas crenças. Estão clamando por uma palavra segura.
Querem algo que reconheçam, com certeza, ser a verdade.
Podemos dizer-lhes, com segurança, que confiem na Bíblia. A
Palavra de Deus é a verdade. É infalível. É inerrante.
Pense em um amigo que sempre lhe fala a verdade. Você tem
certeza disso, pois em toda ocasião em que as palavras dele foram
confrontadas, demonstraram ser verdadeiras. Você não crerá neste
amigo quando ele lhe falar sobre coisas que você não pode
comprovar?
Isso também acontece com a Escritura. Em todas as áreas em
que pode ser comprovada, verifica-se que ela fala a verdade. Os
versículos que acabamos de estudar são uma dessas áreas. Vimos
o que foi profetizado e percebemos claramente que os eventos da
história subseqüente conferem exatamente com as profecias feitas.
Em cada ponto, ela foi verdadeira.
Sendo assim, por que deveria eu não crer na Bíblia, quando ela
me fala a respeito de outros assuntos? Fala com igual certeza sobre
Deus. Revela-me o que devo crer a respeito dEle e o que Ele requer
de mim. Também fala-me sobre o homem – de onde veio, porque
está aqui e qual a verdadeira natureza do seu problema. De igual
modo, fala sobre estes assuntos tão difíceis: como ganhar a vida
eterna, como viver minha vida pessoal, como deve ser minha vida
em família, minhas responsabilidades como cidadão e um vasto
número de outros assuntos importantes. É profundamente
tranqüilizador saber que o Livro que fala de todos estes assuntos é
inteiramente confiável. Tudo que preciso saber para esta vida está
contido em um Livro que é a “verdade verdadeira” – usando a
expressão do Dr. Francis Schaeffer.
Que loucura é ignorar ou negligenciar este livro! É uma loucura
ainda maior não crer nele ou duvidar dele! Neste mundo, há um livro
verdadeiro – verdadeiro porque vem de Deus!
É hora de pararmos de tentar justificar as declarações da Bíblia.
É tempo de acabarmos com a timidez quanto a sermos evangélicos,
quando nos estamos entre aqueles que duvidam das Escrituras,
argumentam contra elas e escarnecem abertamente daqueles que
as amam e crêem nelas. Cremos que a Bíblia é aquilo que afirma
ser – a Palavra de Deus. Esta convicção é renovada e fortalecida
quando lemos um capítulo tão admirável como Daniel 11. Algo é
gravado em nosso coração pelo Espírito Santo: a certeza de que
abrimos o Livro da verdade!
Nossa segunda lição do capítulo 11 pode ser resumida no antigo
ditado: “Deus é o Senhor da História”.
Como poderia o Senhor haver dado a Daniel uma detalhada visão
do futuro, se o futuro estivesse fora do controle do Senhor?
Imagine o que aquelas pessoas que tinham este capítulo de
Daniel em suas mãos devem ter pensado, quando viram os
diferentes monarcas ptolomaicos e selêucidas surgindo e
desaparecendo do modo exato como havia sido profetizado. Teriam
dito: “Tudo está acontecendo como Deus falou”. Teriam a plena
convicção de que Deus estava controlando tudo e que seus
propósitos estavam sendo cumpridos. O que fora profetizado se
realizara. Teriam concluído que as coisas profetizadas e ainda não-
acontecidas haveriam de acontecer com certeza.
Tudo que ocorre na História ocorre porque está escrito no livro de
Deus. Neste caso, um período particular da história foi revelado a
Daniel e escrito em seu livro. E, ainda que não tivesse sido escrito,
não alteraria o fato de que estava escrito nos planos de Deus. A
História não é sem sentido ou propósito, como alguns historiadores
modernos têm declarado. Tudo que acontece está consumando os
decretos de Deus. E, apesar disso, Ele não é, de modo algum, o
autor do pecado. Deus não o admite nem por um momento. Não
compreendemos isso, mas é um fato que permanece. Veremos
todas essas coisas com mais clareza quando estivermos na
eternidade, pois veremos a História do mundo com uma perspectiva
melhor.
Há imenso conforto nesta verdade. Ao observarmos o mundo de
hoje, vemos as forças do mal trabalhando por toda parte –
espreitando, ameaçando, perseguindo e oprimindo. Mas essas
forças, até essas forças, estão realizando os propósitos eternos de
Deus. Não estão fazendo nada diferente daquilo que faziam os
grandes impérios do mundo mencionados no livro de Daniel.
Aprendemos que esses impérios estavam nas mãos de Deus. Isso
não é menos verdade quanto às forças do mal nos dias de hoje. A
História não está fora de controle, e a sua consumação não é uma
questão duvidosa. Todas as coisas estão se movendo em direção
ao triunfo final de nosso Senhor Jesus Cristo e ao castigo final e
eterno dos ímpios.
Há uma terceira e última lição a aprendermos. Deus continua
sendo Deus, embora não O vejamos em parte alguma.
Vimos o Senhor Jesus Cristo anunciando o futuro ao profeta
Daniel. E, quando examinamos a visão histórica que o Senhor lhe
deu, observamos que não há qualquer menção à pessoa de Deus.
Há um verdadeiro catálogo de guerras, alianças, casamentos,
batalhas e uma quantidade admirável de reis surgindo e
desaparecendo. O homem ocupa todo o cenário. Freqüentemente,
temos a impressão de que os acontecimentos são controlados pelo
homem mais forte de sua respectiva época. Deus não é mencionado
em parte alguma. Aparentemente, é como se a História não tivesse
qualquer relação com Deus.
É o próprio Senhor quem está anunciando todos essas coisas!
Isso serve para enfatizar a lição que acabamos de aprender. Deus é
o Senhor da História. Esse fato continua sendo verdadeiro, ainda
que não haja evidência de que Deus está trabalhando.
Pense no período histórico mencionado nesta seção. Exércitos
cruzavam a Palestina. A atenção do mundo estava voltada para os
selêucidas ou para os ptolomaicos; os judeus simplesmente não
existiam no mundo político.
Impérios surgiam e desapareciam, mas os judeus eram
considerados sem valor algum. Eram o único povo no mundo que
tinha a verdade sobre o Deus vivo e, apesar disso, foram totalmente
esquecidos. Para o mundo, eram insignificantes. Experimentavam
bastante tribulação, perplexidade e perseguição. Seu coração se
enchia freqüentemente de temor. Nos livros de História daquela
época, o Deus deles não podia ser visto em lugar algum.
No entanto, mesmo naquela época, os eventos se consumavam
exatamente como o Salvador havia profetizado, e seus propósitos,
tanto para os judeus em particular como para o mundo em geral, se
realizavam. Nada acontecia, em lugar algum, sem que tivesse sido
previamente escrito em seu livro. Isso continuou sendo verdade, até
quando parecia que Ele estava completamente ausente do seu
mundo. Ele é o Senhor de toda a História. Quando não pode ser
visto, Ele está governando os assuntos do mundo, da mesma
maneira.
Ao concluir este capítulo, posso perguntar se você crê realmente
nisso?
Vivemos em dias de apostasia. Os homens se levantam em nome
de Cristo e proclamam nada mais do que uma forma de humanismo
temperado com coisas espirituais. Têm o nome de cristãos, mas não
são governados por nenhuma convicção realmente espiritual, nem
caracterizados por reverência ou submissão à palavra de Deus. A
cada dia, a igreja visível se afasta cada vez mais de seus
fundamentos apostólicos.
Como resultado imediato desta infidelidade múltipla houve, e
continua havendo, um declínio moral em todos os níveis de nossa
sociedade. Além disso, vivemos à sombra de um terror nuclear;
presenciamos mudanças diárias na política nacional e internacional
e lemos a respeito da confusão econômica universal. Enfrentamos a
possibilidade cada vez maior de sermos assaltados em nossas ruas
e roubados em nossas próprias casas. Esperamos alguma
diminuição na onda de perversidade, mas aguardamos em vão.
Quase não há uma voz proeminente em favor da verdade, em
qualquer lugar. Ficamos mais e mais acostumados com o triste fato
de que todo o inferno pode ser solto a qualquer momento.
Diante desta situação, você pode crer na verdade que este
capítulo deixa tão evidente: Deus continua sendo Deus, embora não
O vejamos em parte alguma.
ANTÍOCO EPIFÂNIO
v. 21 – No capítulo anterior, aprendemos que Antíoco, o Grande,
foi sucedido por Seleuco Filopator, que desapareceu
misteriosamente pouco depois de assumir o trono. O monarca
seguinte, no reino do norte, também chamava-se Antíoco. Deu a si
mesmo o nome “Epifânio” (“Ilustre”), mas foi uma pessoa de caráter
tão extraordinário que seus contemporâneos se referiam a ele como
“Epimanes” (“Louco”)!
Uma lista de adjetivos curta pode, em poucas palavras, resumir o
caráter de Antíoco. Era astuto, poderoso, cruel, tolo, ganancioso e
imoral. Acima de todas essas coisas, era um homem de paixões
violentas. Este era o novo rei “ao qual não tinham dado a dignidade
real”. Por não estar na linhagem de sucessão ao trono, Antíoco não
recebeu as dignidades reais. Sua ascensão ao trono se deu por
meio de intriga e adulação, como este versículo profetizou
acertadamente.
UM PRINCÍPIO IMPORTANTE
Temos estudado o capítulo 11 somente até o versículo 35. Do
versículo 36 em diante, acontece algo estranho. O texto parece
continuar descrevendo Antíoco Epifânio. Entretanto, passa a dizer
coisas que de modo algum podem ser aplicadas a ele!
Até o versículo 35, o capítulo foi historicamente perfeito. Detalhe
após detalhe foi profetizado com empolgante exatidão. A partir do
versículo 36, não há uma aparente mudança de assunto. Parece
ainda estar falando sobre o infame Antíoco Epifânio.
Todavia, muitos dos detalhes não se ajustam nem podem se ajustar
à sua história. Quando chegamos ao início do capítulo 12, que é
uma continuação da mesma visão, vemos que está se referindo ao
fim do mundo! Há menção da ressurreição e dos destinos de vida e
de desgraça eterna.
Que faremos de tudo isso? É como se o profeta, ao falar sobre
Antíoco Epifânio, estivesse vendo por meio dele e o enxergasse
como um tipo ou protótipo de alguém, semelhante a ele, que surgirá
no futuro.
Isto não deve surpreender-nos muito. Devemos lembrar que no
capítulo 7 Daniel viu “um chifre pequeno”. Aquele “chifre pequeno”
era um personagem ímpio que aparecerá no final do mundo e fará o
povo de Deus sofrer como nunca antes sofreram.
No capítulo 8, observamos que Antíoco Epifânio, a respeito de
quem estivemos lendo, também foi descrito como “um chifre
pequeno”. Dois indivíduos diferentes receberam a mesma descrição
em dois capítulos consecutivos do mesmo livro. Um foi uma pessoa
que já viveu e morreu. O outro ainda virá. Notamos também que
ambos receberam a mesma descrição porque, em certo sentido, são
realmente os mesmos.
Aprendemos que o anticristo final será precedido por muitos
anticristos. A história está cheia de pessoas proeminentes que se
dispuseram e procuraram destruir o povo de Deus. São os
antecessores do anticristo final. Quando um deles surge na História,
é quase impossível saber se é apenas mais um anticristo ou se é o
anticristo. Ao ser perseguida odiosamente, você pode imaginar que
seu opressor é o anticristo; somente depois que os eventos
subseqüentes lhe provam o contrário, você percebe seu erro. No
momento da perseguição, não há vergonha em achar que o
perseguidor pode ser aquele indivíduo terrível e final cuja vinda
anuncia as últimas horas da história da raça humana. É claro que,
para um homem ou uma mulher de Deus, dois indivíduos distintos
podem, de fato, parecer como se fossem o mesmo!
Se este é um fato da experiência cristã, não devemos ficar
surpresos em descobrir que é, também, um fato da experiência
profética. Ao contemplar o futuro, o profeta bem pode ter visto dois
indivíduos distintos como um só, e sua profecia poderia se dirigir,
naturalmente, de um para o outro. Muitos dos profetas não somente
fizeram isso em relação a personalidades futuras, mas também em
relação a eventos futuros. A história subseqüente demonstrou que
os dois conjuntos de eventos eram distintos, mas, ao profetizá-los,
embora dando indícios de suas diferenças, o profeta falou de ambos
como sendo um só. Se não pudermos assimilar essa característica
da profecia, nosso conhecimento a respeito dela será sempre
limitado.
É precisamente isto que notamos em Daniel 11. O Senhor faz
com que Daniel veja, por meio de Antíoco Epifânio, a pessoa a
quem este prefigura – o homem do pecado. A partir do versículo 36,
Daniel ainda está, de certo modo, falando sobre Antíoco. Mas, com
certeza, está falando mais a respeito do anticristo, pois aqui se
dizem coisas que não podem, de maneira alguma, ser aplicadas a
Antíoco. Com isso bem evidente em nossa mente, continuaremos
agora nosso estudo, partindo do versículo 36.
O HOMEM DO PECADO
v. 36 – O versículo 36 nos fala de um rei que agirá segundo a sua
própria vontade. A figura é de um homem que chega ao poder,
prospera, cresce em poder e, então, fala contra todos os deuses. É
verdade que Antíoco Epifânio aceitou ser chamado de divindade,
mas nunca se engrandeceu sobre todos os deuses, pois durante
sua vida manteve alguma forma de religião. Falou contra o Deus
dos deuses, mas nunca contra toda religião. Este versículo deve se
cumprir naquele que “se opõe e se levanta contra tudo que se
chama Deus ou é objeto de culto” (2 Ts 2.4).
Tendo compreendido que o capítulo se refere agora,
principalmente, a uma pessoa que está além de Antíoco Epifânio,
nossa interpretação de cada frase é afetada. Grande parte da
profecia do Antigo Testamento usa a linguagem literal, mas, como
mostra a interpretação dos apóstolos, esse tipo de linguagem não
deve ser forçado. Ao anunciarem eventos escatológicos, os profetas
utilizavam a única linguagem que conheciam. Mas essa linguagem
era limitada demais para descrever apropriadamente os eventos
proféticos a que se referiam. Por conseguinte, a linguagem literal
deles precisa receber um significado mais pleno e mais
esclarecedor do que as palavras permitem por si mesmas.
LEIA DANIEL 12
O FIM DO MUNDO
Os primeiros quatro versículos do nosso capítulo fazem parte
daquela mesma visão e continuam a revelar o que acontecerá
naqueles últimos dias.
Começam assegurando-nos que até mesmo aquela época
sombria da história do mundo, com todos os seus horrores para o
povo de Deus, será cercada, em todos os eventos, pelos anjos de
Deus! Como em qualquer outra ocasião, a História não estará fora
de controle. Os céus continuarão a segurar as rédeas dos
acontecimentos na terra. No próprio tempo em que haverá aflição
tal, como nenhuma nação jamais experimentou, o arcanjo Miguel se
levantará para proteger o povo de Deus, ficando ao seu lado e
livrando-o (v. 1).
A Bíblia é clara em revelar que, naquele tempo, todas as hostes
malignas terão liberdade de agir contra a igreja de Jesus Cristo. Mas
não é só isso. “Naquele tempo, será salvo o teu povo, todo aquele
que for achado inscrito no livro”.
Os nomes do povo de Deus estão inscritos em um livro. Jesus se
referiu a este livro ao dizer: “Alegrai-vos, não porque os espíritos se
vos submetem, e sim porque o vosso nome está arrolado nos céus”
(Lc 10.20). O apóstolo João se referiu a este mesmo livro, quando
escreveu sobre o último julgamento: “E, se alguém não foi achado
inscrito no Livro da Vida, esse foi lançado para dentro do lago de
fogo” (Ap 20.15).
Há um livro que contém os nomes de pessoas inscritos nele. São
os nomes daqueles a quem Deus amou eternamente e por quem
deu o seu Filho. São as ovelhas por quem o pastor morreu, aqueles
que o seu Espírito chamou para crerem e serem salvos. É este
povo, cujos nomes estão registrados no céu, que desfrutará o
glorioso livramento mencionado em Daniel 12.1.
Ao chegarmos ao fim do mundo, nada mais haverá que realmente
nos preocupe, exceto que os nossos nomes estejam naquele livro.
Não daremos mais importância à nossa reputação e realizações
entre os homens e mulheres. Nossas posses terão sido todas
destruídas na grande tribulação. Somente nossa aceitação por Deus
nos importará.
O dia do aniquilamento do anticristo (11.45) será também o dia
em que nosso Senhor descerá do céu, com uma palavra de ordem,
a voz do arcanjo e o som da trombeta de Deus (1 Ts 4.16). Naquela
ocasião, os eventos descritos no versículo 2 se realizarão: “Muitos
dos que dormem no pó da terra ressuscitarão, uns para a vida
eterna, e outros para vergonha e horror eterno”.
O último dia será o dia da ressurreição. Ser livre da morte física
não é garantido aos cristãos perseguidos, mas o livramento do
poder da morte é uma certeza. Não devemos ficar confusos pelo
uso da palavra “muitos” neste versículo. É uma maneira hebraica de
chamar atenção à grandeza dos números envolvidos, pois na
verdade significa “todos”. Mas o fato de que todos ressurgirão não
significa que todos gozarão o mesmo destino na ressurreição. O dia
da ressurreição será também um dia de divisão. Em sua glória, o
Rei separará os membros da raça humana uns dos outros, como um
pastor separa dos cabritos as ovelhas (Mt 25.32). Todos os túmulos
entregarão os seus mortos (Jo 5.28-29). Onde quer que tenham sido
colocados, os mortos serão chamados ao grande julgamento (Ap
20.13). À palavra de Cristo, cada membro da raça humana passará
a um de dois destinos: “Uns para a vida eterna, e outros para
vergonha e horror eterno”.
A Bíblia tem muito a nos ensinar sobre o castigo eterno dos
ímpios, mas a ênfase deste capítulo está na recompensa que
desfrutarão os crentes fiéis (v. 3). Isso ocorre porque o livro de
Daniel foi escrito, primariamente, tendo esses crentes em mente.
Mas, quem são precisamente os “sábios” referidos no versículo 3?
Quem são os que “a muitos conduzirem à justiça”?
Para compreender isso, precisamos retornar a Daniel 11.33, onde
somos informados de que nos dias mais severos da opressão de
Antíoco Epifânio havia aqueles que circulavam entre o povo,
instruindo-os na verdade de Deus. Não apenas continuaram crendo,
mas também tudo fizeram ao seu alcance para propagar a verdade,
embora perseguidos, aprisionados, torturados e assassinados.
Durante as indescritíveis perseguições da apostasia final, haverá
outras pessoas “sábias” que conduzirão muitos à justiça. Apesar do
que lhes possa sobrevir, continuarão crendo e levarão avante a obra
de Deus. Quando todo o inferno estiver agindo livremente, não
desistirão. Valerá a pena? Eles e todos os demais que fizeram
coisas semelhantes em dias anteriores não perderão sua
recompensa eterna. Os sofrimentos do tempo presente não poderão
ser comparados à glória com que se deleitarão. Dias de
recompensa divina e resplendor eterno os aguardam. Por manterem
a luz brilhando na hora mais escura, “resplandecerão como o fulgor
do firmamento”, “como as estrelas, sempre e eternamente”.
Avaliado pela lógica humana, o trabalho deles será considerado
tolice. Essa é a estimativa que o mundo incrédulo sempre faz da
propagação da mensagem do evangelho. Portanto, isso será muito
mais verdadeiro quando chegarem os dias de trevas intensas.
Quando todos os inimigos deles forem envergonhados e
sentenciados ao desprezo eterno, será demonstrado quão sábios
foram esses pregadores da justiça. A recompensa deles não será
passageira. Será eterna, eterna:
O FINAL DO LIVRO
A longa revelação concedida a Daniel, à margem do rio Tigre,
termina no versículo 4. Do versículo 5 em diante, encontramos outra
cena, que finaliza o livro.
Evidentemente, o Senhor Jesus Cristo permaneceu com Daniel
durante todo o tempo em que lhe revelava o futuro. Mas, agora, Ele
está acompanhado por dois outros visitantes celestiais, um de cada
lado do rio (v. 5).
O Senhor não está em nenhuma das margens, mas sobre as
águas do rio (v. 6). Será que, ao andar sobre as águas, na época
dos evangelhos, Jesus tencionava chamar atenção para esta
passagem e identificar-se como Aquele que falou com Daniel?
Enquanto Daniel olha, escuta um dos anjos recém-chegados
perguntar a seu Senhor: “Quando se cumprirão estas maravilhas?”
O anjo está perguntando quando se cumprirão os eventos
profetizados a respeito do fim do mundo.
“O homem vestido de linho”, que é nosso Senhor pré-encarnado,
responde levantando ambas as mãos (v. 7). Levantar uma das
mãos, no Antigo Testamento, era sinal de um juramento solene.
Levantar ambas as mãos significava que o juramento é
excepcionalmente solene. Nosso Senhor responde à pergunta
levantando ambas as mãos e jurando “por aquele que vive
eternamente”.
Qual foi a resposta? “Que isso seria depois de um tempo, dois
tempos e metade de um tempo” (v. 7).
Esta é exatamente a mesma informação, agora em hebraico,
dada em aramaico em Daniel 7.25. Ali, foi anunciado sobre a vinda
do anticristo: “Proferirá palavras contra o Altíssimo, magoará os
santos do Altíssimo e cuidará em mudar os tempos e a lei; e os
santos lhe serão entregues nas mãos, por um tempo, dois tempos e
metade de um tempo”.
Que significa isto? Nós o interpretaremos como fizemos antes. O
texto bíblico não diz: “Um ano, dois anos e metade de um ano”. Fala
de “tempos”. O anticristo dominará o mundo por um tempo. Ao
parecer que ele já permaneceu por tanto tempo quanto lhe era
possível, continuará dominando o mundo pelo dobro daquele tempo.
Então, parecerá como se ele fosse permanecer pelo dobro desse
tempo, como se fosse ficar para sempre.
Exatamente neste ponto, o anticristo será abatido, no auge de
seu poder e no ápice de sua influência. Até então, terá quase
destruído o povo de Deus. “E, quando se acabar a destruição do
poder do povo santo, estas coisas todas se cumprirão” (v. 7).
Se entendo corretamente Apocalipse 11 e sua narrativa sobre as
duas testemunhas, virão os dias em que a igreja de Cristo será
totalmente arruinada pelo poder do mal. Chegaremos ao momento,
na História, em que parecerá que a escuridão obteve realmente a
vitória e que o anticristo permanecerá para sempre. Parecerá que a
igreja foi inteiramente aniquilada, pois não haverá mais qualquer
sinal dela.
Já dissemos isso antes. E reafirmamos: nesta hora o anticristo
será aniquilado, de uma vez por todas e para sempre.
Por isso, não devemos desesperar ao constatar o aumento da
impiedade. O mal não será destruído quando estiver em baixa, mas
em seu auge!
Daniel ouviu todas estas coisas, mas não as compreendeu (v. 8).
“Então, eu disse: Meu senhor, qual será o fim destas coisas?”
Isto não é apenas um eco da pergunta feita pelo anjo no versículo
6, pois, ao indagar sobre o “fim”, Daniel usa um termo hebraico
diferente. Ouvindo a respeito dos dias maus que virão, Daniel pede
informação sobre os estágios finais daquele período. Os dias maus,
aqui descritos, estão reservados para o fim do mundo. Qual será a
evidência de que esses dias de trevas estão chegando à sua
consumação?
“Não pergunte mais nada, Daniel” – é a resposta divina. “Deixe de
lado este assunto. Não indague mais, ‘porque estas palavras estão
encerradas e seladas até ao tempo do fim’” (v. 9).
Em outras palavras, o que foi revelado está reservado para os
dias a respeito dos quais a profecia fala. Não é necessário que
Daniel entenda completamente tudo que foi dito, pois nem tudo tinha
aplicação imediata para ele e seu tempo. Mas, quando estas
profecias precisarem ser entendidas, elas o serão.
Esta resposta ilustra a natureza prática das Escrituras. A Bíblia
não nos foi dada para satisfazer nossa curiosidade, e sim para
trazer-nos à fé, sustentar-nos na fé e conduzir-nos mais plenamente
à estatura de Cristo. O objetivo das Escrituras é santificar-nos e
transformar nossa vida. Responder as nossas especulações nunca
fez parte do propósito das Escrituras.
Devemos compreender que alguns dos ensinos da Bíblia
relacionados aos últimos dias não serão entendidos até que
estejamos nos últimos dias. Por essa razão, tanto é imprudente
como perigoso elaborar calendários detalhados quantos aos
eventos futuros. O sentido de algumas partes da Palavra de Deus
não se tornará óbvio para nós enquanto não amanhecerem os dias
sobre os quais elas falam.
Acho este ensino muito confortante, especialmente ao considerar
os versículos 11 e 12 deste capítulo. Você logo percebe que não
posso dizer-lhe o que significam. Não tenho sequer um indício. Mas
creio que os entenderemos suficientemente quando precisarmos.
Antes de quaisquer considerações sobre estes dois versículos,
observemos as palavras de nosso Senhor no versículo 10. O que
significam? São uma profecia a respeito de perseguições vindouras.
Pessoas serão purificadas, embranquecidas e provadas. A igreja de
Cristo sofrerá um processo de purificação. Nesta ocasião, o que foi
revelado será entendido. Os ímpios continuarão em sua
perversidade e não compreenderão, pois não têm discernimento
espiritual. Mas os sábios entenderão. O que Daniel não pôde
compreender naquele momento da revelação – o que não podemos
entender após séculos de estudo – os sábios entenderão, quando
chegar a hora.
Quando estes terríveis dias vierem sobre a igreja de Cristo, quão
alegres ficarão os crentes daqueles dias, por conhecerem o capítulo
12 de Daniel! O que os sustentará naquela ocasião em que todo o
inferno estiver agindo livremente? A Bíblia! As simples e velhas
páginas da Palavra de Deus! As palavras que nenhum de nós tem
entendido até agora serão para eles uma fonte de bênção, conforto
e fortalecimento. Quão alegres ficarão pelo fato de que jamais
abandonaram a Palavra de Deus por causa de outras coisas!
Do modo como está escrito, ninguém até agora, em qualquer
lugar, tem sido capaz de entender o versículo 11. Todas as
tentativas para fazê-lo têm falhado. Este versículo fala de “mil
duzentos e noventa dias”. E, ao referir-se ao anticristo vindouro,
nosso Senhor usa uma linguagem que é mais adequada a Antíoco
Epifânio.
Considerando trinta dias como um mês, mil duzentos e noventa
dias são iguais a três anos e sete meses. Não tenho idéia do que
isso significa. Não me envergonho disso, pois acredito que você
também não o entende! Mas estou certo disso: apesar do que nos
sobrevenha, estamos nas mãos de Deus. Nenhuma perseguição
virá sobre a igreja de Cristo sem a determinação divina. Deus pôs
um limite àqueles dias, que não continuarão por mais tempo do que
o limite estabelecido por Ele. Portanto, embora eu não compreenda
o que significam mil duzentos e noventa dias, creio, sim, que
entendo o âmago e a intenção do versículo. Qualquer que seja a
perseguição que venha sobre o povo de Deus, se prolongará por um
tempo definido, e, ao passar esse tempo definido, a perseguição
cessará!
Mantenham-se firmes, diz o versículo 12. Mantenham-se firmes!
Não desistam! Até que passem mil trezentos e trinta e cinco dias.
Mantenham-se firmes por mais quarenta e cinco dias!
Também não sei o que isso significa. Mas estou certo disto:
quando a igreja cristã entrar no período de sua pior e última
perseguição, aqueles dias não durarão para sempre. Poderão durar
muito tempo, mas há limites estabelecidos por Deus para eles.
Finalmente, a perseguição alcançará uma intensidade fortíssima e
acabará.
Devemos permanecer firmes durante os períodos de
perseguição, visto que a igreja cristã jamais entrou em um túnel sem
fim. Muitas vezes, o túnel pode ter sido mais escuro e mais longo do
que alguém ousou imaginar, mas os que, apesar das
conseqüências, permaneceram firmes em sua fé saíram, de novo,
para a luz do sol. No caso da perseguição final, a luz será a da
exaltação do Salvador, no fim do mundo.
Paulo escreve a respeito deste assunto em 2 Timóteo 3. É um
capítulo sobre os “últimos dias”, uma expressão sempre usada nas
Escrituras para denotar o período entre a primeira e a segunda
vinda de Cristo. Paulo nos revela que nestes últimos dias
“sobrevirão tempos difíceis” (v. 1). A palavra grega usada aqui
significa que ele estava se referindo a épocas da História nas quais
haverá grande deflagração do mal. O período entre as duas vindas
de Cristo será caracterizado por ondas e desencadeamento de
maldade.
Em seguida, Paulo nos diz que os homens ímpios daqueles dias
maus “não irão avante” (v. 9). Para cada período de iniqüidade
desenfreada, há um final já decretado. Cada túnel tem um fim. Isso
também é verdade a respeito do último túnel. Quando vivenciamos
uma grande demonstração de forças do mal, não temos meios para
saber se esta é apenas uma das muitas ondas de perversidade ou
se é a apostasia final. Mas não precisamos saber. Seja lá o que for,
terá um fim. Nosso dever se resume nas palavras do Senhor Jesus
Cristo: “Aquele... que perseverar até o fim, esse será salvo” (Mt
24.13).
A exortação de permanecer firme por mais um pouco é seguida
pelo último versículo deste grande livro: “Tu, porém, segue o teu
caminho até ao fim”.
Não devemos imaginar a figura de um pai dizendo a seu filho: “Vá
brincar, agora”. Estas não são palavras de despedida. Este versículo
não significa: “Daniel, agora vá, pois já terminei de lhe dar a
revelação”. Antes, significa: “Daniel, prossiga em sua vida espiritual
como já está fazendo”.
Até o velho profeta precisava ser exortado a perseverar! Mas é
avisado: “Pois descansarás e, ao fim dos dias, te levantarás para
receber a tua herança”.
Daniel, que fora tão fiel durante muitos anos, deve prosseguir em
sua vida espiritual até à morte. Pouco depois, descansará no
túmulo, mas isso não será o fim para ele. Após este descanso,
receberá a sua recompensa. A herança que lhe está reservada será
finalmente dele, e Daniel entrará no gozo da sua herança.
Sem dúvida, este crente do Antigo Testamento não viu as coisas
tão claramente como nós, que nos beneficiamos da revelação da
Nova Aliança. Mas, para ele, como devem ter sido encorajadoras
estas palavras! O Senhor não permitiu que Daniel partisse desta
vida mortal sem a certeza de uma recompensa vindoura. Que
consolação para ele, que, durante sua vida, amou primeiramente
seu Senhor e ousou permanecer firme, embora sozinho! Ninguém
que vive piedosamente escapa de perseguição e tribulações nesta
vida. O ambiente é sempre hostil. Mas isto é igualmente certo:
ninguém que vive segundo a vontade de Deus perde as
recompensas do céu.