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Domingo de Ramos

Sugestões para a homilia


Serenidade de Jesus e atitude dos discípulos.
Este ano, a leitura da entrada em Jerusalém e da Paixão é tirada do Evangelho de S. Lucas.
Ramos e Paixão: dois momentos da mesma realidade: Jesus é o Messias sofredor de que
fala a primeira leitura. Jesus é o servo obediente até à morte de cruz, como escreveu S.
Paulo. Jesus entra em Jerusalém não como um rei revestido de poder político-militar, mas
como o rei messiânico, montado num jumentinho, como anunciara o profeta (Zacarias 9, 9).
Vem em nome do Senhor, para salvar a humanidade.
S. Lucas narra que só a multidão dos discípulos aclamava alegremente a Jesus, por causa de
«todos os milagres que tinham visto». Em contrapartida, os fariseus pedem: «Mestre,
repreende os teus discípulos!» É curioso como Jesus responde: «Se eles se calarem,
clamarão as pedras!» De facto, juntamente com os discípulos, também a criação vai dar
testemunho. A terra vai estremecer, o sol vai perder a sua luz e o dia vai transformar-se em
noite: «as trevas cobriram toda a terra, porque o sol se tinha eclipsado». Jesus é Senhor de
todo o universo e a sua Redenção beneficiará todas as criaturas. «Ao nome de Jesus todos
se ajoelhem no Céu, na terra e nos abismos».
Jesus Cristo é o Senhor! Esta afirmação testemunha a sua divindade. Porque é de condição
divina, tem pleno conhecimento da sua missão salvífica. Anunciara de antemão a sua morte
em Jerusalém: «Devo seguir o meu caminho, porque não se admite que um profeta morra
fora de Jerusalém» (Luc 13, 33).
A leitura da Paixão começa com Jesus sentado à mesa, afirmando que deseja
«ardentemente comer aquela Páscoa» com os seus discípulos. Tinha chegado a sua hora.
Jesus sabia que era a última refeição. Esta Última Ceia com os discípulos revela-nos uma
profunda paz. Jesus vive interiormente a sua morte. Oferece àqueles que ama o alimento
do seu Corpo, que vai ser entregue e do seu Sangue que vai ser derramado. Jesus vive
conscientemente a sua morte. Livremente oferece o seu corpo como alimento de vida
eterna. Dá graças. Aponta-nos o sentido da sua morte: Oferece a sua vida pelos homens.
«Amou-nos até ao fim». Realiza o querer divino, cumpre a vontade de seu eterno Pai: «Pai
se é possível afasta de mim este cálice. Todavia, não se faça a minha vontade, mas a tua».
Antes de expirar, reza tranquila e cheia de confiança filial: «Pai, em vossa mãos entrego o
meu espírito». Que morte tão serena, tão cheia de paz, numa íntima conversa com Deus
Pai! Perdoando aos que O matam, desculpando-os! Depois, oferecendo o Paraíso a todos,
mesmo a um malfeitor! É o triunfo completo do Amor divino! A morte de Jesus é o início do
reino de Deus. «Estou no meio de vós como quem serve. Preparo para vós um reino.
Comereis e bebereis à minha mesa, no meu reino.» (Luc 22, 27-30)
A Eucaristia é o memorial da paixão e morte de Jesus. As nossas missas são o
prolongamento do amor misericordioso do Coração de Jesus: «Fazei isto em memória de
mim!» Durante a Paixão, S. Lucas mostra-nos quatro vezes Jesus em oração. Numa dessas
vezes reza por S. Pedro, a quem perdoa o seu futuro pecado. Isto quer dizer que também
perdoou os nossos, pois a sua morte foi para nos salvar. Jesus está sempre em união com
Seu eterno Pai. É outro exemplo divino para nós. No meio dos sofrimentos da vida, temos
sempre o recurso à oração donde brota toda a paz e toda força sobre-humana. A oração é a
porta pela qual Deus envia os seus Anjos para nos confortar. Na bíblia, a presença angélica
exprime a presença de Deus.
A Eucaristia faz-nos viver todo este mistério pascal. É o mistério central da nossa fé:
Anunciamos Senhor a vossa morte, proclamamos a vossa ressurreição, vinde, Senhor Jesus.

Fala o Santo Padre


«Reconhecê-l’O como Rei significa: aceitá-l’O como Aquele que nos indica o caminho.»
Na procissão do Domingo de Ramos associamo-nos à multidão dos discípulos que, em festa
jubilosa, acompanham o Senhor na sua entrada em Jerusalém. Como eles louvamos o
Senhor em coro por todos os prodígios que vimos. Sim, também nós vimos e ainda vemos
os prodígios de Cristo: como Ele leva homens e mulheres a renunciar aos confortos da
própria vida e a colocar-se totalmente ao serviço dos que sofrem; como Ele dá coragem a
homens e mulheres de se oporem à violência e à mentira, para dar lugar no mundo à
verdade; como Ele, no segredo, induz homens e mulheres a fazer o bem ao próximo, a
suscitar a reconciliação onde havia o ódio, a criar a paz onde reinava a inimizade.
A procissão é antes de tudo um testemunho jubiloso que prestamos a Jesus Cristo, no qual
se tornou visível para nós o Rosto de Deus e graças ao qual o coração de Deus está aberto a
todos nós. No Evangelho de Lucas a narração do início do cortejo nas proximidades de
Jerusalém é composta em parte literalmente segundo o modelo do rito da coroação com o
qual, segundo o Primeiro Livro dos Reis, Salomão foi revestido como herdeiro da realeza de
David (cf.1 Rs 1, 33-35). Assim a procissão dos Ramos é também uma procissão de Cristo
Rei: nós professamos a realeza de Jesus Cristo, reconhecemos Jesus como o Filho de David,
o verdadeiro Salomão o Rei da paz e da justiça. Reconhecê-l’O como Rei significa: aceitá-l’O
como Aquele que nos indica o caminho, no qual temos confiança e que seguimos. Significa
aceitar dia após dia a sua palavra como critério válido para a nossa vida. Significa ver n’Ele a
autoridade à qual nos submetemos. Submetemo-nos a Ele, porque a sua autoridade é a
autoridade da verdade.
A procissão dos Ramos é como aquela vez para os discípulos antes de tudo expressão de
alegria, porque podemos conhecer Jesus, porque Ele nos concede ser seus amigos e porque
nos deu a chave da vida. Esta alegria, que está no início, é contudo também expressão do
nosso «sim» a Jesus e da nossa disponibilidade a ir com Ele aonde quer que nos leve. A
exortação que estava hoje no início da nossa liturgia interpreta portanto justamente a
procissão também como representação simbólica do que chamamos «seguimento de
Cristo»: «Pedimos a graça de o seguir», dissemos. A expressão «seguimento de Cristo» é
uma descrição de toda a existência cristã em geral. Em que consiste? O que significa
concretamente «seguir Cristo?».
No início, com os primeiros discípulos, o sentido era muito simples e imediato: significava
que estas pessoas tinham decidido abandonar a sua profissão, os seus negócios, toda a sua
vida para andar com Jesus. Significava empreender uma nova profissão: a de discípulos. O
conteúdo fundamental desta profissão era andar com o mestre, confiar-se totalmente à sua
guia. Assim, o seguimento era uma coisa exterior e, ao mesmo tempo, muito interior. O
aspecto exterior era o caminhar atrás de Jesus nas suas peregrinações através da Palestina;
o interior era a nova orientação da existência, que já não tinha o seu ponto de referência
nos negócios, na profissão que dava de que viver, na vontade pessoal, mas que se
abandonava totalmente à vontade do Outro. Estar à sua disposição já se tinha tornado a
razão de vida. A que renúncia do que era próprio isto obrigasse, que dissuasão de si
mesmos, podemos reconhecê-lo de modo bastante claro em algumas cenas dos
Evangelhos.
Mas evidencia-se com isto o que significa para nós o seguimento e qual é a sua verdadeira
essência para nós: trata-se de uma mudança interior da existência. Exige que eu deixe de
me fechar no meu eu, considerando a minha auto-realização a razão principal da minha
vida. Exige que eu me dedique livremente a Outro pela verdade, pelo amor, por Deus que,
em Jesus Cristo, me precede e me indica o caminho. Trata-se da decisão fundamental de
não considerar a utilidade e o lucro, a carreira e o sucesso como finalidade última da minha
vida, mas de reconhecer ao contrário como critérios autênticos a verdade e o amor. Trata-
se de escolher entre viver só para mim mesmo ou doar-me pela coisa maior. E
consideremos bem que verdade e amor não são valores abstractos; em Jesus Cristo eles
tornaram-se pessoa. Ao segui-l’O entro ao serviço da verdade e do amor. Perdendo-me
reencontro-me. […]
Papa Bento XVI, Praça de São Pedro, Domingo, 1 de Abril de 2007

Quinta-feira – Ceia do Senhor


Sugestões para a homilia
Dia do amor fraterno
Instituição da Eucaristia
Instituição do Sacerdócio
A Quinta-feira Santa, primeiro dia do Tríduo Pascal, marca uma celebração capital dentro
de todo o ano litúrgico, celebração solene e grandiosa emoldurada no contexto dramático
da proximidade da paixão e morte do Senhor. É o dia cume da despedida e do amor
extremo feito serviço humilde e generoso. Muitas são as facetas que se entrecruzam num
dia como este. Vejamos as principais:

Dia do amor fraterno


Hoje ressoa na comunidade o mandamento novo, mandamento do amor, do amor «como
eu vos tenho amado». «Amei-vos até o fim», até fazer-me servo e escravo num tipo de
serviço considerado humilhante e próprio dos escravos (lavar os pés). «Eu dei-vos o
exemplo». «Vós também deveis lavar os pés uns dos outros.» Trata-se de uma proclamação
do mandamento do amor feita não com palavras mas com um sinal prático, o serviço. Amar
é servir. Ama quem serve. Obras são amores.

Instituição da Eucaristia
Para o evangelista São João, a instituição da Eucaristia está ligada estreitamente ao lava-
pés. A Eucaristia expressa e constitui o sacramento do amor de uma maneira visível, assim
como o lava-pés. Jesus parte e reparte o pão e o vinho, e diz: «Fazei isto em minha
memória», ou seja: para recordar-me fazei isto; ou também: partir e repartir a própria
existência será a forma de seguimento que melhor testemunha e faz memória de mim.
Celebrar a Eucaristia, fracção do pão, será sempre muito mais que ouvir a Missa: «Cada vez
que comemos deste pão… anunciamos a morte do Senhor até que Ele venha.»

Instituição do Sacerdócio
A Igreja recorda que ao instituir a Eucaristia, Cristo também institui o sacerdócio da Nova
Aliança. Diz o Santo Padre: «O sacerdote é o homem que guiado pela fé tem acesso aos
bens que constituem a herança da Redenção realizada pelo Jesus Cristo que o escolheu
para ser o administrador da riqueza da Palavra e dos Sacramentos», e cuja qualidade
fundamental é como ensina S. Paulo a fidelidade (cf. 1 Cor 4, 2). O padre dá a Cristo a sua
própria humanidade que dela se serve como instrumento de salvação, e «esta doação –
admirabile commercium – torna-o um outro eu.» Este é o cerne da vocação sacerdotal. O
padre é um expropriado de si próprio que na renúncia a tudo por Cristo descobre que a sua
personalidade se realiza plenamente por este caminho, a via da entrega total e do amor
sem limites.
Olhando para Maria, a verdadeira discípula de Cristo que amava a Deus acima de todas as
coisas e ao próximo como a si mesma, e seguindo os passos de São Paulo que fez tudo para
todos (cf. 1 Cor 9, 22), procuremos praticar «com todo o nosso coração e com toda as
nossas forças», o mandamento novo para edificarmos, quanto antes, a «civilização do
amor».
Na homilia comentam-se os grandes mistérios que neste dia se comemoram: a instituição
da sagrada Eucaristia e do sacramento da Ordem e o mandato do Senhor sobre a caridade.
Lava-pés
Fala o Santo Padre
«Deus desce até à extrema baixeza da nossa queda:
Ajoelha-se diante de nós e lava os nossos pés sujos, para que possamos ser admitidos à Sua
mesa.»
«Ele, que amara os seus que estavam no mundo, levou o seu amor por eles até ao
extremo» (Jo 13, 1): Deus ama a sua criatura, o homem; ama-o também na sua queda e não
o abandona a si mesmo. Ele ama até ao fim. Vai até ao fim com o seu amor, até ao
extremo: desce da sua glória divina. Depõe as vestes da sua glória divina e reveste-se com
as do servo. Desce até à extrema baixeza da nossa queda. Ajoelha-se diante de nós e
presta-nos o serviço do servo; lava os nossos pés sujos, para que possamos ser admitidos à
mesa de Deus, para que nos tornemos dignos de nos sentarmos à sua mesa o que, por nós
mesmos, nunca podemos nem devemos fazer.

Deus não é um Deus distante, demasiado distante e grande para se ocupar das nossas
insignificâncias. Porque Ele é grande, pode interessar-se também pelas coisas pequenas.
Porque Ele é grande, a alma do homem, o mesmo homem criado para o amor eterno, não é
uma coisa pequena, mas grande e digna do seu amor. A santidade de Deus não é só um
poder incandescente, diante do qual nós nos devemos retirar aterrorizados; é poder de
amor e por isso é poder que purifica e restabelece.
Deus desce e torna-se escravo, lava-nos os pés para que possamos estar na sua mesa.
Exprime-se nisto todo o mistério de Jesus Cristo. Nisto se torna visível o que significa
redenção. O banho no qual nos lava é o seu amor pronto para enfrentar a morte. Só o amor
tem aquela força purificadora que nos tira a nossa impureza e nos eleva às alturas de Deus.
O banho que nos purifica é Ele mesmo que se doa totalmente a nós até às profundidades
do seu sofrimento e da sua morte. Ele é continuamente este amor que nos lava; nos
sacramentos da purificação o baptismo e o sacramento da penitência, Ele está
continuamente ajoelhado diante dos nossos pés e presta-nos o serviço do servo, o serviço
da purificação, torna-nos capazes de Deus. O seu amor é inexaurível, vai verdadeiramente
até ao fim.
«Vós estais limpos, mas não todos», diz o Senhor (Jo 13, 10). Nesta frase revela-se o grande
dom da purificação que Ele nos faz, porque deseja estar à mesa juntamente connosco,
deseja tornar-se o nosso alimento. «Mas não todos» existe o obscuro mistério da recusa,
que com a vicissitude de Judas nos torna presentes e, precisamente na Quinta-Feira Santa,
no dia em que Jesus faz a oferenda de Si, nos deve fazer reflectir. O amor do Senhor não
conhece limites, mas o homem pode pôr-lhe um limite.
«Vós estais limpos, mas não todos»: o que é que torna o homem impuro? É a recusa do
amor, o não querer ser amado, o não amar. É a soberba que julga não precisar de
purificação alguma, que se fecha à bondade salvífica de Deus. É a soberba que não quer
confessar nem reconhecer que precisamos de purificação. Em Judas vemos a natureza
desta recusa ainda mais claramente. Ele avalia Jesus segundo as categorias do poder e do
sucesso: para ele só o poder e o sucesso são realidades, o amor não conta. E ele é ávido: o
dinheiro é mais importante do que a comunhão com Jesus, mais importante do que Deus e
o seu amor. E assim torna-se também mentiroso, ambíguo e vira as costas à verdade; quem
vive na mentira perde o sentido da verdade suprema, de Deus. Desta forma ele endurece-
se, torna-se incapaz da conversão, da volta confiante do filho pródigo, e deita fora a vida
destruída.
«Vós estais limpos, mas não todos». Hoje, o Senhor admoesta-nos perante aquela auto-
suficiência que põe um limite ao seu amor ilimitado. Convida-nos a imitar a sua humildade,
a confiar-nos a ela, a deixar-nos «contagiar» por ela. Convida-nos por muito desorientados
que nos possamos sentir a voltar para casa e a permitir que a sua bondade purificadora nos
reanime e nos faça entrar na comunhão da mesa com Ele, com o próprio Deus.
Acrescentamos uma última palavra deste inexaurível texto evangélico: «dei-vos exemplo…»
(Jo 13, 15); «também vós vos deveis lavar os pés uns aos outros» (Jo 13, 14). Em que
consiste «lavar os pés uns aos outros»? Que significa concretamente? Eis que, qualquer
obra de bondade pelo outro especialmente por quem sofre e por quantos são pouco
estimados é um serviço de lava-pés. Para isto nos chama o Senhor: descer, aprender a
humildade e a coragem da bondade e também a disponibilidade de aceitar a recusa e
contudo confiar na bondade e perseverar nela. Mas existe ainda uma dimensão mais
profunda. O Senhor limpa-nos da nossa indignidade com a força purificadora da sua
bondade. Lavar os pés uns aos outros significa sobretudo perdoar-nos incansavelmente uns
aos outros, recomeçar sempre de novo juntos, mesmo que possa parecer inútil. Significa
purificar-nos uns aos outros suportando-nos mutuamente e aceitando ser suportados pelos
outros; purificar-nos uns aos outros doando-nos reciprocamente a força santificadora da
Palavra de Deus e introduzindo-nos no Sacramento do amor divino.
O Senhor purifica-nos e, por isso, ousamos aceder à sua mesa. Peçamos-lhe que conceda a
todos nós a graça de podermos ser, um dia e para sempre, hóspedes do eterno banquete
nupcial.
Amém!
Papa Bento XVI, Basílica de São João de Latrão, 13 de Abril de 2006

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