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"CULTURA POPULAR":

revisitando um conceito
historiográfico

Roger Chartier

mais difícil de ser pensada que a dos


1.
mundos "exóticos".
Ass umindo o risco de simplificar ao
cultura popular é uma calegoria extcerno, é possível red1lzir as inúmer.lS
erudita. Por que enunciar, no ro­ definições dacultuca popular. dois gran­
meço de uma conferência, .00 abrupta des modelos de descrição e intecpccm­
proposição? Ela pretende somente re­ ção. O primeiro, no intuito de abolir toda
lembrar que os debates em tomo da forma de emocenlCismo culrural, conce­
própria definição de cultura popular fo­ be cultura popuJac como um sis tema
a
ram (e são) tc:\Y.ldos a propósito de um simbólico coerente e aUlônomo, que
conceito que quer delimitar, cacaoecizar funciona segundo uma lógica abSOIUL�­
e nomC:Jr prátiCls que nunca são desig­ mente alheia e irccduúveJ il da culruca
nadas pelos seus atores como pectcn cen­ le lrada. O segundo, preocupado em Icrn­
do il "culruca popular". Prodllzido como bcac a exislência das relações de domina­
uma calegoria erudim destinada a ru­ ção que organizam o mundo social, per­
cunscreveJ' e descre>er produções e con­ cebe a cuhura popuJac em suas depen­
dutas siruadas foca da culwca erudita, o dências e cacên cias em relação à culrura
conceilO de culwca popuL11" tem lC3d ••zi. dos dominantes. Temos, então, de um
do, nas suas múltiplas e conlrndilÓrias lado, uma cultura popular que constitui
acepções, as relações m:lIJtidas peJos in­ um mundo à pane, encerrado em si mes­
leCtu aisocidenl;tls
(e, enue eles, osscho­ mo, independente, c, de outro, uma cul­
lars) com uma .llcridade cultural ainda ruca popular inteiramente definida pela

NoJo: Esu� ICJJO foi apresc:nlado DO semin:icio Popular Culttlre, Df! Interdlsclpllnary Conlercnce. re31iZ2do
00 "bsnchuscus Wlilllle ofTechnology de. 16 a 17 de oUlubro de 1992
A lt'adução é de Aone-N:uie Mia0 Olivein.

ESllfdol HlslÓt'kos, Ilio deJanciro, voI. 8, D° 16, 1995, p. 179-192.


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sua distância da legitimid'lde cultural da Como historiador, pode·se acrescefi­


qual ela é privada. tar que o contraste entre estas duas pers­
Estes dois moddos de inteligibilidade, pectivas - a que enf"iZ3 a autonomia
portadores de estratégias de pesquisa, de simbólica da L"Ulrura popular e a que
estilos de descrição e de propostas IeÓri­ insiste na sua dependência da culrura
ClS completamente opostas, atravessa­
dominante - tem servido de hase para
ram todas as disciplinas que pesquisam a todos os modelos cronológioos que opõ­
cultura popular, seja a história, a antro­ em uma suposta idade de ouro da culrura
pologia ou a sociologia. Recentemente, popular, onde esta aparece como matri­
Jean-Claude Passeron mostrou os peri­ cial e independente, a épocas onde vigo­
gos metodológicos de ambos: "Da mes­ ram censura e coação, quando ela é des­
ma forma que as cegueiras sociológicas qualificada e desmantelada.
do relativismo cultural, quando apliCldo Não é possível aceitar sem numa:5 a
às culruras popubres, encorajam opopu­ periodização dássica que >ê na primeira
lIsmo, para quem o sentido das práticas metade do século XVII um momento de
populares cumpre-se integralmente na corte m:úor, de contraste muito forte entre
felicidade monádica da auto-suficiência uma idade de ouro, onde a cultura popu­
simbólica, assim também a teoria da legi­ lar teria sido viva, livre, profusa, e urna
timidade cultural corre sempre O risco époCl regida pela disciplina edesial e es­
( ... ] de levar ao legitún {smo , que, sob a taral, onde ela teria sido reprimida e sub­
fonna extrema do m/serab//lsmo, niio fiz jugada Este esquenta p31eceu pertinente
seniio descontar, com um ar compungi­ quando se tratava de dar conta da trajelÓ­
do, as diferenças como se fossem carên­ ria cultural da Europa ocidenraI: após
cias, ou as alterid�des como se fossem 1600 ou 1650, as ações conjugadas dos
Un) menos.ser. J.. ESL�dos absolutistas, centralizado res e
uniHcadores, e das Igrejas das Reformas
A oposição se fiz termo a termo: a protestante e Cltólica, repN'SSivas e acuI­
celebração de uma cultura popular em tur.1l1tes, teriam abafudo ou recJado a
sua majestade se inverte em uma descri­ exuberância in"enLiw. de lima antiga cuJ..
ção "em negativo"; o reconhecimento da rum do povo. Ao impor disciplinas inéditas
igual dignidade de todos os universos
e novas submissões, ao inculcar novos
simbólicos dá lugar à lembranÇ1 das Im­
modelos de comportamento, os Estados e
placiveis hierarquias do mundo social. as Igrejas leriam destruído eOl S"35 raízes
Pode-se acompanharJean-Claude Pas­ e seus antigos equilíbrios um modo tradi­
seron quando de noL� que, mesmo sen­ cional de ver e de viver o mundo.
do lógica e metodologicamen te contradi­ liA cultura popular, tanao rural como
tórias, estas definições da cultura popu­ urbana, sofreu um eclipse quase total na
lar não são por isso fundadoras de um época do Rej.SoI. Sua coerência interna
princípio cômodo de classificação das desapareceu definitivamente. Nunca
pesquisas e dos pesqui,sadores: "a oscila­ mais poderia constiwir um sistema de
ção entre as duas formas de descrever sobrevida, uma filosofia da existência",'
uma cultura popular pode ser observada escreve Robert Muchcmbled, descreven­
numa mesma obra, num mesmo aUlOr', do a "repress5.o da cultura popular" na
e a fronteira entre amb:Is "atravessa si­ FranÇ1 dos séculos XVII e XVID. De forma
nuosamente toda descrição das culturas O\!lis sutil, Peaer Bude assim descreve OS
populares, dividindo-a quase sempre em dois movimentos que desenraiZ3r:lm a
movimentos alternativos de interpreta­ culrura popular tradicional: de um bdo,
çio".2 o esforço sistemático das elites, e particu-
"QJLTUll POP\J..Jr 181

larmente dos cleros protestan te e alÓÜ- "acu1 ruração": Ué preciso indagar se a


00, "para mudar as atitudes e valOles do suspeição Cf""-"COte que pesou sobre as
(csto da população" e i'para suprimir, ou práticas folclóricas do cOIpO (a dança,
ao menos purificar, vários dementos da por exemplo), a pefSOl)ali>ação cada .ez
cultura popular tradicional"; de outro. o maior da pastoral. com o uso cada ;;ez
abandono, pelas dasses superiores, de maIs generali>ado do saCIamen to da pe­
uma cullura até en rão comum a IOdos. O nitência 1 ...1, a instituição, no sécul o XV,
resultado é claro: "Em 1500. a cultura de uma educação religiosa para as crian­
popular era a cultura de IOdo mundo; ças (ver GelSon), não contribuiram con­
uma segunda cultura para os insuuídos juntunente para interiorizar o sentido de
e a única cultura para os demais. Por volla p<:'jjdo e para 'culpab ili>ar' IOdos aque­
de 1800, contudo, em muiaas panes da les homens, para mascarar aos seus olhos
Europa, o dero, a nobl<111, os romenian· a 'aculturação' de que eram vitimas, con­
1eS, os homens de oficio - e suas mulhe­ vencendo-os da imoralidade da sua pró­
res -haviam abandonado a cultura popu­ pria cultura. ,.6
lar, da qual estavam agora separados, Semelhan te rcvertério parece ler
como nunt;a_anleS, por p�fndas dife­ ocorrido na França (e em outros lugares
renças de VISaO de mundo. da Europa) durante os cinco decênios
Existem várias razões para só se reto-­ que separam a guelT:l de 1870 da de
mar com muita prudência esta pericx1i7!1· 1914. Considera-se que, naquda fasc, as
ção e este dbgnóstico que concluem pda culturas tradicionais, amponl'sas ou p0-
desqualificação da cultura popular ou pulares, s:úram do isolamento, e ponan­
pelo seu desaparecimento. Em primeiro to se desenraizaram. em proveito de uma
lugar, está daro que o esquema que cultura nacional e republiana? Outra
opõe, em tomo de um momen to<have transformação radicaI situa-se antes e de­
(1600 ou 1650), o esplendor e a miséria pois do surgimento de uma cultura de
da cultura da maioria, reitera para a itbde massa: supõe-se que os novos instru­

moderna um contraste que outros hislO­ mentos da núdia lenham destruído uma
rodores es tlbe.leceram para outros tem­ cultura antiga, oral e comunilária, festiva
pos. É o que ocolle. por exemplo, com e folclória, que era, ao mesmo tempo,
o anleS e O depois de 1200, quando a criadora, plural e livre. O destino hislO­
imposição de uma ordem aeológia, cien­ riográfico da cultura popular é portanto
tifia e filosófia isola a cultura erudita ser sempre .bafuda, remlcada, arrasada,
das tradições folclóricas, censurando as e, ao mesmo tempo, sempre renascer das
práticas dornvante tidas como supersti­ cinzas. Isto indica, sem dúvida, que o
ciosas ou heterodoxas, e constituindo v erdadeiro problema não é tanto datar
como objeto posto à distância, sedutor seu desaparecimento, supostamente ir­

ou teuúvel, a cultura dos humlldes. Se remediável, e sim ronsiderar, para cada


Jacques Le Golf reconhece anleS de 1200 época, como se elaboram as relações
o " ar§cimento de uma wltura popular compleos entre formas impostas, mais
leiga que vai aproveitar o espaço criado, ou menos constrangedoras e imperati­
nos séculos XI e XI1, pela cultura da vas, e identidades aGrmadas, mais ou me·

aristocracia leiga, da mesma lOda im­ nos desenvolvidas ou reprimidas.


pregnada do único sistema cultural então Daí dccolle mais uma razão para não
disponível fora do sis tema cleriml, preci­ se 01g"0i23r toda a descrição das culturas
samente o das tradições folclóricas",' se­ do Antigo Regime a partir do corte iden­
gundo Jean-CIaude Schmin, o século X111 tificado no século xvn. pois a força com
inaugura a époa de uma verdadeira a qual os moddos culturais impõem sen-
182 IITUOOI HISTÓ�(O\ -1995/16

tido não anula o espaço próprio da sua los etc. "Por toda parte, na sociedade da
recepção, que pode ser resistente, ma· segunda metade do século XIX, a cultura
treira ou rebelde. A descrição das nonnas americana eslava passando por um pl&'
e das disciplinas, dos textoS ou das pala­ cesso de fragmentação [ ... ) . Ele se mani­
vras com os quais a cultura reformada festava no declinio relativo de uma cultu­
(ou contra-reformada) e absolutista pre­ ra pública compartilhada que, na segun­
IeIldia submeter os povos não significa da metade do século XIX, se estilhaçou
que estes foram real, lOtai e universal­ numa série de culturas especificas que
mente submetidos. É preciso, ao contrá­ cada vez tinham menos a ver umas com
rio, postubr que existe um espaço entre as outraS. Os le3lJ"OS, os museus, os audi­
a norma e o vivido, entre a injunção e a tórios, que antes abrigavam um público
prática, entre o sentido visado e o sentido misturado que consumia uma mistura
produzido, um espaço onde podem insi­ eclética de cultura expressiva, estavam
nuar-se reformulações e deturpações. cada vez mais filtrando sua clientela e
Nem a cultura de rn."1.SS3 do nosso tempo, seus progrnrnas, de maneira que carla vez
nem a cultura imposta pelos antigos p0- menos se podia encontrar públicos que
deres foram capazes de redllzir as identi· atravessasm se o espectro social e econô­
dades singulares ou as práticas enraiza­ mico consumindo uma cultura expressi­
das que lhes resis.bm. O que mudou, va que unisse elementos hibridos do que
evidentemente, foi a maneira peb qual hoje chamaríamos de cultura erucliaa e
essas identidades puderam se enunciar e cultura poPular'.s Uma dupb evolução
se afirmar, fa-rendo uso inclusive dos pró­ leva da "cultura pública compartilhada"
prios meios destinados a aniquilá-ruo Re­ à "cultura bifurcada": de um bdo, um
conhecer eSL'l mumção incontesláve1 não p=sso de retraimento e de subtração
significa romper as continuidades cultu­ que atribui às práticas culturais um valor
rais que atravessam OS três séculos da distintivo tanto mais forte quanto menos
icL-ule moderna, nem tampouco decidir elas são compartilh adas; de Outro lado,
que, após o corte da metade do século um processo de desquaIifição e de exclu­
xvn, não há mais lugar para gestos e s50 que lança para fora da cultura consa­
pensamentos diferentes daqueles que os grada e canônica as obras, os objetos, as
homens da Igreja, os servidores do Esta­ fonnas daí em di:ulte relegadas ao diver­
do ou as elites letracL"lS prelelldiarn incul­
timento popular.
car em todos.
Este modelo de compreensão impres­
siona pela sua homologia com aquele
proposlO para descrever a trajetória cul­
2. turai das socieebdes ocidentais entre os
séculos XVI e xvrn. Também nessa épo­
AcreclilO que Lawrence W. Levine m­ ca, já nessa época, uma bifurcação cultu­
loca questões da mesma ordem ao desen­ ral, originada no retraimento das elites e
volver a tese da "cultural bifurcatkm" no içoIamenlO da cultura populor, teria
para caracteri:mr a trajetória cultural ocasionado a destruição de uma base
americana no século XIX. Esta tese se ancestral comum - a cultura "bakh tinia­
baseia num contraste cronológico maior, na" da praça pública, folclórica, festiva,
que opõe um tempo antigo - caracteriza­ carnavalesca. Nos dois casos, as mesmas
do pela partilha, pela mistura e pela exu­ questões podem ser colocadas. Será que
beráncia cultural - a um tempo moderno a cultura compartilh ada, dada como pri­
- caracterizado pela separação entre os meira, era t50 homogênea como parece?
públicos, os espaços, os gêneros, os esti- E quando ocone a separação, será que a
"GJLTIJl.\ IIlPUUr 183

fronteira entre cultura legítima e cultura prendimento e na absoluta liberdade de


desqualillCld. era tão marcada e estan­ criação são fatos diretamenIe ligados à
que como ap:lH:nta? Para a América do rejeição das servidões da "lileratura in­
século XIX, David D. Hall responde ne­ dustrial" e das preferências populares
gativamenle às duas perguntaS. Segundo que garan tem seu sucesso: uAs relações
ele, de um Lwo, a "cultura pública com­ que os escntores e os artlSW man tem
.
. -

pacti1hada" do início do século XIX não com o mercado, cuja sanção anônima
era isenta de exclusões, clivagens inter­ pode criar entre eles disparidades seUl
nas e concorrências externas; de outro precedenteS, contrwuem, sem dúvida,
lado, a "mercadorização" dos bens sim­ para orientar a representação ambivalen­
b6Ucos aparentemente mais es lr.lO.bos te que eles têm do 'grande público', ao
ao mercado e • captura pela cultura c0- mesmo lempo fuscin anle e desplczí.eI,
merciai de massa dos signos e valores da no qual eles confundem o 'burguês', ...b­
legitimidade cultural preservaram um jugado pelas precupaçôes vulgares dos
forte inlercimbio entre cultura letrada e negócios, co 'povo', entregue ao embru­
9 to
cultura popular. tecimento das atividades produtivas."
Ou tra questão é • da articulação cr0-
nológica entre as duas II:ljet6rias, a euro­
péia e a ameriCln•. Devemos supor que 3.
a cultura americana percolle, com um Ou
dois séculos de atraso, o caminho das Durante muito lempo, a concepção
sociedades do Antigo Regime da Europ. clássica e dominaole da cultura popular
Ocidental? Ou, ao contrário, devemos teVe por base, na Europa e, talvez, nos
considcr.lr que as evoluções culturais da Est ados-Unidos, três idéias: que a cultura
segunda meL..de do século XIX, que le­ popul"lr podia ser definida por contrasle
VJ.m as elites a desprezar uma cultura com o que ela não era, a saber, a cuhura
popular identificada com uma cultura letrada e domina0 Ie; que era possível
industrial, são idênticas no conjunto de caracterÍZlr como "popular" O público
um mundo ocidental unificado pelas mi­ de certas produçôes culturais; que as
grações transatl.'intiClS? expressôe s culturais podem ser tidas
da, um f Orle laço entre, de um lado, a como sociaImenle puras e, algumas de­
reivindicação de uma cultura "pura" (ou las, como intrinsecamenle popu1ares.
purificl(b), distanciada dos gostos vulga­ Foram estes três postulados que funda­
res, subtraída às leis da produção econô­ mentaram os trabalhos clássicos reaJi2:!­
mica, sustentada por uma cumplicidade dos na França (e em outros lugares) so­
estética entre os criadores e o público por bre a "lileratura popular", assimilada ao
eles escolhido e, dc outro lado, as con­ repertório da "/ittéralure de colporltv
quistaS d.. cultur.l comerci.l
l , ge",· e sobre a "religião popular", isto é,
pela empresa capiL1lista e destinada à o conjunto d"lS cren ças e dos gestos con­
maiori.'l. Como o mostrOu rccenlCmente siderados próprios da religiosidade da
Pierre Bourdleu, a constituição na FranÇl maJor!.'l.
• •

da segunda meL..de do século XIX de um Mas ficou claro agora que estas afirnu­
campo Iiter:irio definido como um mun­ ções devem ser postas em dúvida. A "li­
do à parle e a definição de uma posição teratura popubr" e a "religião popular"
estética fund
..da na autonomia, no des- não são tão radicalmenle diferentes da

• Nome d:&do ls obr.u popuJ:uc:s difundidas por veodedores 2.Ulbulanle5 do século XVI ao XIX. �u
eQu i�eDlc DO Brasj;J seria a lilcr.uun de cordel.
184 E\T� HISTÓRKIK - 199\/11

literatura da elite ou da religião do clero, ou pelos grupos que se arrogam o direito


que impõem seus repen6rios e modelos. de exercer um controle exclusim sobre
Elas sãO compartilhadas por meios sa­ elesl1
ciais diferentes, e não apenas pelos meios FJa se afasla, também, do sentido que
populares. Elas são, ao mesmo tempo, a hermenêutica dá à apropriação, quan­
aculturadas e acultucuues, do a represen ta como o momento em
É portanto inútil querer ideo tifocar a que a "aplicação" de uma configuração
cuhura popular a partir da distrib"içío narratiVol particular à situação do sujeilO
suposra!\len te específica de certos objetos transforma, pela interpretação, a com­
ou modelos culturais. O que importa, de preensão que este tenl de si mesmo e do
fato, tanto quanto sua repaniçio, scmpre mundo, transformando assim, também,
mais comple.. do que parece, é sua apro­ sua experiência fenomenológica tida
12
priação pelos grupos ou indhiduos. Não como universal.
se pode mais aceirar am,i<'aIlKllte uma A apropriação tal como a entendemos
sociolngja da distribuição que supõe im­ visa a elaboração de uma história social
plicitunente que à hierarquia das dass<• dos usos e das interpretações, relacjona­
ou grupos coneSjlOnde uma hierarquia dos às suas determin ações funcl:Jmentais
paralela das produções e dos hábitos cul­ e inscritos nas prátõcas espeáficas que os
turais. Em toda sociedade, as formas de constroem Prestar, assim, atenção às
apropriação dos textos, dos códigos, dos condições e aos processos que muito
modelos comparti1bados são tão ou mais concrelamente são portadores das ope­
geradoras de distinção queas pr:íricas pró­ rações de produção de sentido, significa
prias de cada grupo social. reconhecer, em oposição à anliga histó­
O "popular" não está con lido till con­ ria intelectual, que nem a idéi."\S nem as
juntos de elementos que hastaria idenU­ interpretações são desencarnad."\S, e que,
flcar, repenoriar e descrc:>er. Ele qualifi­ con lrariamente ao que colocam os pen­
ca, antes de mais nada, um tipo de rela­ samentos universa1izan tes, as categorias
ção, um modo de utilizar objetos ou dadas como in varian tes, sejam elas fen�
normas que circulam na socied1de, mas menológicas ou filosóficas, devem ser
que são iecebidos, compreendidos e ma­ pensadas em função da descontinuidade
nipulados de diversas maneir.ls. Tal cons­ das· trajetórias históricas.
tat:lção desloca necessariamente o tr:Iba­ Se permite romper com uma defini­
Ibo do historiador, já que o obriga a ção ilusória da cultura popuL-tr, a noção
caracteÚz;u, não conjuntos culturais da· de apropriação, Ulilizada como instru·
dos como "populares" em si, mas as mo­ menlO de conhecimento, pode lamhém
dalidades diferenciacl:Js peL-ts quais eles reintroclllzir urna nova ilusão: a que leva.
são apropriados. a considerar o leque das práticas cultu­
É por isso que esta noção parece cen­ rais como um sistema neutro de difelen­
tr.lI para toda história cultural - com a ças, como um conjunto de práticas diver­
condição, tal.ex, de ser reformulada. EsJa S!lS, porém eq,livaientes. Adotar tal pers­

reformulação, que enfuin a pluralidade pectiVol significaria esquecer que tanto os


dos usos e dos entendimentos, se afasla, bens simbólicos como as práticas cultu­
de saída, do senlido dado ao conceito por rais continuam sendo objeto de lutlS
Michel FoucauJt quando coloca "a apro­ sociais onde estão em jogo sua dassifica­
priação social dos di,scursos" como um ção, sua hierarquização, sua conS!lgração
dos mais importantes procedimentos (ou, ao contrário, sua desqualificação).
por meio dos quais OS discursos são do­ Compreender a "cultura popular" sig­
minados e confiscados pelas instituições niflC'l, então, siruat neste espaço de en-
"(lJLTW fOPlllr 185

flentlmentos as relações que unem dois a leitura Aparentemente passi va e su�


conjuntos de dispositims: de um lado, os missa, a leitura é, na realidade, e à sua
mecanismos da dominação simbó lica, maneira, inicntiw e abdora. Falando da
cujo objetim é tomar aceitáveis, pelos sociC"dade contemporânea, Michel de
próprios dominados, as reprcsen raçãoes Certeau sublinha magroilicamente este
e os modos de consumo que, pw:jsa­ paradoxo: "A leitura (da imagem ou do
mente, qualifl('3m (ou antes desqu alif .. 1C<1O) parcce consLirulr o ponto m:!ximo
caro) sua culrura como inferior e ilegíti­ da passividade que supostamente carac­
ma, e, deoutro lado, as lógicas específ)cas teriza o consumidor, instituído em
em funcionamento nos usos e nos mo­ tJOyeUr (troglodita ou Itinerante) numa
dos de apropriação do que é imposto. 'sociedade do espetáculo'. Na realidade,
A distinção estabelecida por Michel de a atividade de leirura apresenta, ao con­
Ceneau entre estratégias e táticas consti-- trário, todos OS traÇOS de uma produção
rut• um recu rso preaoso para se pensar silendosa: é uma deriva ao longo das

esta tensio (e evitar a oscilação entre as páginas, uma metamorfose do lC<1O pelo
abordagens que insistem no caráter de­ olho viajante, uma improvisação e uma
pendente da culrura popular e aquelas espera de signilicações ind.tzidas a panir
que exaltam sua autonomia). As estraté­ de algumas palavras, um prolongamento
gias supõem a existéncia de lugares e de espaços escritos, uma daoça efêmera
instituições, prodllum objetos, normas ( ... J. (O IcirorJ insinua as manh as do
e m<Xldos, acumulam e Clp Ílalizam. &i prazer e de uma .capropriação no texto
táticas, desprovidas de lugar próprio e de do outro: invade a propriedade alheia,
domínio do tempo, são "m<Xlos de f:17er" transpona-se para ela, toma-se nela plu­
ou, melhor dito, de ufazer com". ,,
ral como os barulhos do corpo. 14
As formas "popuL"\tcS" da culrura, des­ Esla imagem do leitor, invadindo uma
de as práticas do quotidiano até às formas terra que não lhe pertence, evidencia
de consumo cultural, podem ser pensa­ uma qucslão fun,bment:J.I para todo tra­
das como tálicas produtoras de sentido, balho de hislÓria ou de sociologia culru­
embora de um sentido possivelmente raI: a da variação, em função dos tempos
es tranho àquele visado pelos produlO­ e dos lugares, dos gupos sociais e das
res: liA uma produção rncio nalizada, ex· "/nIerprettve communltles", das condi­
pansionista e centraliZlda, baculhentl e ções de possibilidade, das modalidades e
espetacular, corresponde uma outra dos efeitos dessa invasão. Na Inglatetla
produção, chamada 'consumo'. Ela é ma­ dos anOS 50, segundo a descrição de
lrCira e dispersa, mas se insinua em todos Richard Hoggart, a lcirura (ou a escuta)
OS lugares, silendosa e quase invisível, popular dos jornais de grande tiragem,
pois não se manifesta através de produ­ das canções, dos anúndos publidtários,
tos próprios e sim através de modos de das fotonovelas, dos horóscopos, se ca­
usar os produtos imposlOS pela ordem raclerizava por uma atenção "obliqua"
- . ' 13
econorruca donunante. ou distr.úda por uma "a,ks:ío entre·
..

" ",

co nada de eclipses" que levava a crer ou


a descrer, a aderir � verdade do que se lia
4. (ou ouvia) sem que jamais desaparecesse
a desconOança, a dúvida sobre sua auten­
Este tipo de modelo de inte1lgibilida­ Liddade.15 A noção de atenção "obliqua"
de permite transformar profundamente permite assim entender como a culrura
a compreensão que se tem de uma práti­ da maioria fuz para manter à dislftncia, ou
ca ao mesmo tempo exemplar e central: então para se apropriar, inscrevendo ne-
186 mulXK HI\TO�(OS -199\/16

les sua própria coerência, dos modelos Se "ainda existem no processo de co­
que os poderes ou os grupos domina0 teS municação de massas oprllJnidades para
lhe impõem pela autoridade ou pelo os indivíduos resistirem, aI lerarem e se
merC:ldo. Esla perspec1ÍY.l con trabalança reaproprbrem de bens destinados, em
valiosamenle aquelas que acentuam, de outras esferas, a ser comprados por
uma forma por dem.1is exclusiva, os dis-­ eIes ,,17 . . ,-
, temos que adffi.1l.J.r que, afiorl�
positivos discursivos e institucionais que, ri, semelhanteS possibiliclades eram ofe­
numa dada sociedade, visam a disciplinar recidas aos leitores das sociedades do
os corpos e as práticas ou a modelar as Antigo Regime, num tempo em que a
condulaS e os pensamentos. A mídia mo­ inlIuência dos modelos transmitidos
derna não impõe, como se acreditou pelo material impresso era menor (a não
ap ressadamente, um condicionamento ser em situações peculbre s) que 00 nos­
homogeneizan te, destruidor de uma so século xx. Devemos, pois, recusar
identidade popular, que seria preciso toda abordagem que considere o reper­
buscar no mundo que perdemos. A von­ !Ório das I/llératures de co/por/age como
tade de inculcação de modelos culturais expressão da "mentalid'lde" ou da "visão
nunca anula o espaço próprio da sua de mundo" dos seus supostos leitores
recepção, do seu uso e da sua inaerprela- pop ulares. Tal l�ção, comum nos traba­
-
lhos sobre aBib/lo/beque 8leue francesa,
çao.
É com uma conslalação semelhanle os cbapbooks ing)ese� ou os p/Iegos de
que Janice A. Radway condui seu minu­ cordel castelhanos e calalães, não é mais
cioso estudo sobre a aproprbção, por ad missível por várbs razões: porque os
uma deae rmin ada "/n/erprellve comlllU­ textos publicados em livros ou folhelOs
n//y" (no caso, uma comunid,de de lei­ pertencem a gêneros, épocas e tradições
toras), de um gênero maior do "mas/Y múhipbs e fragmenladas; porque exisle,
marke/pub/tsbing", ou seja, os "roman­ freqüentemente, uma disL'incia (crono­
ces": "MefC'!1dorias como textos lheMOS lógica e social) considerável entre o con­
texto da sua produção e os da sua recep­
prodll7jdos em massa são selecionadas,
compradas, construídas e usadas por ção ao longo dos séculos; porque há

pessoas reais com necessidades, desejos, sempre um espaço entre o que o texto
propõe e o que o leitor faz dele. A proY.l
inlenções e estratégias interprelativas
disso são os textos que, num dado me>
pré-exisleOteS. Ao readmítirmos esses in­
mento de sua existência impressa, entra­
divíduos ativos e suas atividades criativas
ram para o repertório da Blb/Io/beque
e construtivas no cen tro de nosso esforço
81eue. De origem letrada, perlencendo a
inlerprelativo, evilamos nos cegar diante
gêneros muito diversos, eles consegui­
do fato de que a prática esscncialmenle
ram atingir, graças à sua noY.l forma im­
humana de crbr sentido pressegue mes­
pressa (a das edições baratlS) e ao seu
mo num mundo cresc entemente domi·
modo de distribuição (a venda ambulan­
nado pebs coiS:Js e pelo consumo. Lem­
te), públicos muito diferenaes daqueles
brando assim o car:íler interativo de ati­
que garantiram seu sucesso inicial, reves­
vidades como a leitura ( . ( aumenlarnOS
. .

tindo-se assim de significações baslante


nossos chances de resolver ou de articu­
afasL,das do objetivo inicial.
br a diferença entre a imposição repres­
siY.l de uma ideologia e as práticas de Para analisar a relação entre os textos
oposição que, embora lirrúladas em seu da I/ltérature de colportage e o mundo
alcance e efeito, pelo menos dispuIam ou social das sociedades do Antigo Regime
contesL,m o contrale das fo rmas ideoló­ s,io pr ..."Cisos dois tipos complemenL"CS
gicas. 16 ..
de procedimentos. O primeiro deles, in-
187

""rtendo o sentido das causalidwes ba­ mtlnces publicados nos p/iegos Clstelha­
bitualmente reconhecidas, sugere que se nos. Mas na sua recepção (evidentemen­
leia a "literatura popuLu" como um re­ te mais dificil de ser dec ifrada pelo histo­
pertóriode modelos de comportamento, riador), estes conjuntos de te>.1Os eram
como um conjunto de representações úeqüentemente apreendidos e manipu­
que siio igualmente normas imitáveis (e lados pelos seus leitores "populares"
possi\'elmente imiLwas). O segundo fo­ scm o menor respeito pelas intenções
cali"" a pluralidade e a mobilidade das que direcionaram sua produção e distri­
significações que públicos diferenlCS atri­ buição. Ora os leitores transpunham
buem ao mesmo texto . Mais do que uma para o registro do im.�ginário o que lhes
suposta adequação entre o repertório da era dado no registro utilitário, ora, inver­
IittératUre de rolportage e a "mentalida­ samente, tomavam como descrições do
de popular", que corre O risco de ser cc:l1 as ficções que lhes eram proposL�.
apenas uma tautologia (já que o sucesso As coletâneas de modelos epistolares da
da "literatura popular" costuma ser ex­ Blbllotbeque Bleue, todos oriundas da
plicado pela sua bomologia com uma literatura cortesã do início do século xvn
mentalidade que é na ""rdade deduzida e reedj'adas para um público maior no
da temática livresca), o que importa é periodo compreendido entre a meL�de
uma bistória social das formas pelas quais do século xvn e o início do XIX, ilustram
as diferentes comunidades de leitores o primeiro caso: já que não tinham ne­
que succs.sivamente se apoderam desses nhuma utilidade para leitores que nunca
texto s os usam e compreendem. Nume­ se encontravam na situac;:ío de ter que
rosas e complexas são as mediações entre usar os modelos que lhes eram propos­
t",,:tos que se tornam "steady sellers" tos, elas provavelcmente eram lidas
graças às edições de rolportage e os in­ como bislÓri.� fictícias, oferecidas sob a
vestimentos de sentido de que s50 objeto forma de esboços rudimentares d� no­
em diferentes situações bislÓricas e para vel:'as epislObres,18 No mesmo acervo, os
diferentes leitores. textos que compõem O repertório da
É preciso portanto reconhecer uma literatura picaresca apresenL�m uma si·
. -
tensao unpoctanle entre as Ullençoes, tuação inversa: brincando com as con­
. .

explicitas ou implícitas, que leY.lm a pro­ venções e com as referencias carn avales­
por um texto a leitores numerosos e as cas, parodísticas e burleSCls, foram, pos­
formas de recepção deste texto, que se sivelmente, compreendidos como uma
estendem, úcqüentemente, a registros descrição verdadeira da realidade inquie­
completamente diferenteS. Na Europa tante e estranha dos L'IIsos mendigos e
dos séculos XVI a XVIII, os impressos verdadeiros vagabundos.19
destinados ao público "popular" tinham Diferenlemcnte d'lS IcilOrdS de rOlnan·
uma ampla gama de intenções, que ma­ ces de Smilhton que responderam à pcr­
nifestaVJ.m diversas vonLadcs: cris1ianiz:l­ gunL� deJ:U1icc A. Radway, ou dos leitores
dora, com os textos de devoção da Con­ e leitoras de New Soulh Wales en trevista­
tra-Reforma que en traram para o reper­ dos por Martyo Lyons e Lucy Taksa,20 os
tório da Blbl/lbeque BIeue francesa; re­ da Blb/iatbeque BIeue e d� outras "litera­
fo rmad ora, com os alman aques do D/u­ turas de ro/portage" européias (a n50 ser
mln/smo italian o ou da Volksaufliirung com raras exceções) não disseram nada
alemã; didática, com os impressos de uso acerca das SIlas lei lUr'aS - ou, pelo menos,
escolar ou os livros de prática; parodisti­ não disseram nada que tenha sido conser­
ca, com todos os lexlOS da tradiçdo pica­ vado pelo bitoriador. Caracterizar, em sua
resca ou burlesca; poética, com os TO- diferença, uma prática popuLu dos lC>.1OS
183 IllIIIOS IUSTÓRlCOS -1195/11

e dos livros não é, portan lO, coisa flol A oralidade ocupa um lugar essencial. De­
oper:lçio supõe a Uli1i:z;u;iio criúca de fon­ signa, de um lado, a possÍ>cl sub missão
tes que não podem se,. majs que repre­ dos JeXIOS impressos aos procedimen lOS
selllaçóes da leitura: rep'rsen l3çóes ico­ peculiares da "performance" oral No caso
n�ror""s de situações de leitur:l e dos da França.. a Jeinua eu. MlZ alra, nas teu·
objetos lidos pelo maior núm ero de leito­ niões noturnas em mlla da 1areira, dos
iCS;21 repn=scn taçôes nOilualÍY.lS das prá· JeXIOS difundidos pela littbature de coI-
ticas de leitura e de escrila conticbs em só nranv11 te é ateStMb antes da
narraçócs, maD11ais, calendários ou alma· segunda me.adc: do século XIX. Mas a
naquesdestinados ao iuCiCado "popular"; dedwtaçio destes JeXIOS o que implica­
-

represen 1:lÇÕCS implíd'a5 das rompelên­ va que fossem ronheddos de coe e iesti­

das e das exp<."<lativas dos leilOles nIChOS ruídos por ..nra pala"", viva, livre da leilura
habilidosos, mis como transparecem da do texIO e próxima da recitação dos coo tos
o� o malerial das edições de aof, - era wna das mais imponan tesformas de
portage; repiCSeJllaÇÕ<:s das suas pró­ ttansmifi.los, e uma dasfontes das varian­
prias leilUtaS por leilOres plebeus ou cam­ tes que mod ifnm a sua \'t:rsãn imprcssa
poneses prodl'zem textos auto­ de umaediçio popularpara outra. Mas de
ou quando wna aulOridade outro lado ocnlleu, tunbérn, o in....CiSO: a
(por (,empl o eclesiástica ou inquisilOriaI) circuIaçio do iepenório impresso "ão
os ob� a IndiCJr os livros que leram - e dejxoOJ de ter efeiros sobre as trailiçõcs
a dizer o que acharam e emender:un.24 orais, que foram profuodaIllCnte ron tlmi­
Ficn te a esses h ""os ea CSS3S imagens, que nadas e transfonmllbs (rumo o mostra o
eU'mplo dos COlUOS de fuda) pelas versões
põem CiD cena as Icil1J.(aS popllla.es, �
indispensável uma p re,,·allçio. Quaisquer letrados e erudilaS das narrativas tradicio­
que sejam, essas lepresentações nunca nais, f3isromoforam maàçamente difun­
didas pela /Iltérature de ao/portage .2 S
mantêm uma reL-.çiio imedi:ua e ttanspa­
lente com as pcátiClS que permitem ver. AlCibuir a CltegOrla de "popular" a
Todas remelCm às moo:dicbdes espeáfi­ modos de ler, e oão a classes de textos,
C\S da sua:produçiio, e, ponanlO, às inten­ é, ao mesmo tempo, essencial e arrisCl­
ções e interesses que levaram :\ sua eJabo. do. Após o esrudo exemplar de Cario
r:lç'io, aos gêneros onde se inscre>em e Ginzburg, tem sido muilO grande a fen­
aos destinatários visados. Reconslruir as taçio de caraeteriZIt a leirura popular a
regras e os limites que COO'<lnd1ffi as pd­ partir da de Mcooccbio - ou seja, romo
tic3sda replCseutação learada, ou pop'alar , uma leitura descootinuaque desm..mbra
do pop1daré, pocconseqüêntil, umapre­ os tCXlOS, descoo "<lualº'" as palavras e
condiçio necessária para decifrar roerela­ as �,Iimi1a-se i li teralidade do sen ti­
mente o Iaço fOrle, polém sutil, que une do.2 Este tipo de diagnóstico enrontrou
essas tepiCSCil tações e as prá'ÍCls sociais confirmação 03 análise das eslCUruras -

ao mesmo tempo textuais e matemis


que ronstiruem seu objelO.Mantida esta -

prudência, as lei turas populares oas socie­ dos impressos destinados ao grande pú­
dades do Ar. ligo Regime podem ser rom­ blico, cuja organi2ação em seqüências
preendidos a partir das grandes oposições breves e desconjuotadas, encerradas em
morfológiCls que comandomas formas de si mesmas, repetitivas, parece adequar·se
\iansmissio i dos texIDS - por exemplo, a uma leitura picorada, sem men16ria,
entre a leirura em voz alta e a leirura
susfenlada por frngmeolOS do texto.
saenciosa, ou entre a leilui3 e a decI:una­ Esla COOSlalaçio é seUl dúvida perti­
ç'io. Este último contraSte tem uma perti­ nente, mas deve ser matizada Será que
nência para sociedades onde a as pdtiCls de leirui3 que ela considera
189

como especificamen te pop ulares, enrai­ a ""lidade como constituída pela pro.
zadas numa antiga cultura oral e campo­ pria linguagem, independentemente de
nesa, são (elas e outraS modalidades) toda referên cia objetiva. ]ohn E. Toews
diferentes das que, na mesma época, ca­ fez um resumo doro desta posição radi­
racterizam a leitura dos letrados? Os dois cai que, a partir da constatação de que "a
objetos emblemáticos da leitura erudita linguagem é pensada como um sist<111.0
nO Ren ascimento - a roda de livros, que autocontido de 'signos' cujos significa­
permite man ter vários livros abenos ao dos s.'io determinados por S1!3S reIações
mesmo tempo e, em conseqüência. coo· uns com os outros, muito mais do que
fron LV e extr.úr os trechos tidos como por suas relações com algum objeto ou
essen ciais, e o caderno de lu �res c0-
sujeito 'transcendental' ou extt3Aingüís­
muns, que reúne em suas rubricas cita·
tico", postula que "a criação do sentido é
ções. exemplos, sentenças e experiências
impessoal e opera 'pelas costas' dos
- L1.IDbém f3Z-t:m supor e inferir uma
usuários da linguagem, cujas ações lin­
leitura que recorta, fragmenta, descon­
güístiCls podem apenas exemplificar as
textualiza, e que investe de uma absoluta
regras e os procedimen lOS das lingua­
aUlOridade o sentido literal do textO.27 A
gens �e eles habitam, mas não contro­
idcn tillcação dos traços morfológicos
que organizam as práticas é, por conse­ lam",
guinte, uma condiçío necess.ária, porém Contra essas formulações rac!iClis,
nio suficiente, para designar adequada­ acredito ser preciso relembrar que não é
men te as diferenças culturais. As formas lícito restringir as prátiClS constitutivas
populares das prátiClS nunca se desen­ do mundo social à lógica que govema a
volvem num universo simbólico separa­ produção dos discursos. Afirmar que a
do e especifico; sua diferença é sempre realidade só é acesslvel através dos dis­
construída através das medL1ÇÕes e das cursos que querem o�nizá-la, submetê­
dependêncL1S que as unem aos modelos la, ou represen tá-Ia (e, para o historiador,
e às normas dominantes. discursos que são sempre textos escri·
lOS) , não significa postular a identidwe
entre a lógica logocêntrica e hermenêu­
5. tica que comanda a produção desses dis­
cursos e a t6gica prática, o "sentidp prá­
tico" que regula as condutas cuja trama
Na conjuntura intelectual atual, dois
define as identidades e as relações s0-
obstáculos ameaçam a abordagem que
ciais. Toda análise cultural deve levar em
estamos defendendo aqui e que define as
configurações culturais ("populares" ou conta esta illedutibilidade da experiên­
não) a partir das práticas e, conseQÜente­ cia ao discurso, resguardando-se de um
mente, dos modos de aproprL�ção que uso incontroIado da categoria de texto,
llies são peculiares. O primeiro é consti­ indevidamente apUcada a práticas (ordi­
tuído pelo "lingulst/c tum" ou o "semlo­ nárias ou rituais) cujas táticas e p rocedi­
t/c cballenge" proposto à critica textual e mentos não são, em nada, scmelhan tes
às ciências sociais. São conhecidos seus às estratégias produtoras dos discursos.
três fundamen tos: considerar a lingua­ Man ter esta distinção é essencial, como
gem como um sistema fechado de signos assinala Bourdieu, para que se evite "pos­
cujas relações prodll:rem sentido aulO­ tular como principio da prát.ica dos agen­
m:uic:Jmente; considerar esta construção tes a teoria que se deve construir para dar
da signifiClção como isenta de qu.'Ilquer conta dela" ou, ainda, projetar "nas prá­
intenção ou controle subjetivos; pensar tiClS o que é função das práticas (não
190 ISTUOOI HllTÓRKo\ - 1991nl
-

para os alOres mas) para alguém uc as meiro lugar, por aquilo a que renuncia,

estuda como algo a ser decifrado". 9 enquanto os dominados sempre se con­
Por outro lado, o objclO fundamental frontam com aquilo que lhcs é recusado
de uma história ou de uma sociologia pelos dominantes - qualquer seja sua
cultural compreen dida como uma história atitude depois: resignação, nega �to, con­
da construção da slgnillcaçío reside na testação, imiL,ção ou recalquc".
tens:io que aIticula as cap acicbdes in"",­ Iw nos afustafmos do implícito espon­
tivas doo; indivíduoo; ou das comunidades tâneo que babita o conceito de cultura
com os constranguncntos, as no rmas e as popuhr somos leY.ldos dc volta à nossa

convenções que limitam - m:ljs ou menos pergunta inici.-.J: como articular (e não SÓ
poderosamente segundo sua posiçío nas utili:cJf de fonna altemad,) esses dois
relações de dominaçío - o que lhes é lícilO modelos de in teligíbilidadc da cultura
pensar, enunci.v, fazer. Esta COnSI:lt'lÇão popuhr que são, de um lado, a descrição
vale para uma história das obras letradas, dos mecanismos que ICY.lm os domina­
pois elas se inscrevem sempre no campo dos a interiorizar sua própria ilcgilimida­
dos possíveis que as IOmam pensáveis. de cultural e, de outro lado, o reconhcci­
Vale para uma história d"lS pr:íticas que mcn 10 d"lS expressões pelas quais uma
são, clas L,mbém, in""'çõcs de sentido cultura dominad.. "consegue organiz ar,
limiIadas pelas múltipL"lS dcterminaçõcs Inuma) coerência simbólica cujo princi­
(sociais, religiosas, institucionais etc.) que pio lhe é próprio, as expcriências da sua
definem, para Clda comunkbcle, os com· condição,,�l A resposta nio é fácil e he­
port:lmenlOs legítimos e as norm."lS incor­ sita entre duas alternativas: operar uma
poradas. Ao caráter aUIOm.ítico e impcs­ trj.,gem entre as priticas rmis submcti­
sool da produçío de sentido L-.J como das à dominação e aqucL"lS quc usam de
poo;rula o "Iingu/sllc tum", é preciso opor astúcia com ela ou a gn
i oram; ou, então,
outra pcrspectiY.l que enEuQe as diferen­ considerar que cada prática ou discurso
ças, as liberdades cultural c soci.-.Jmente "popular" podc ser objeto dc duas an,Ui­
detcnn.inadas, que os " interstícios ineren ­ ses que mosu-cm, alternadamente, sua
tes aos si<tem."lS gerais de normas lou as autonomia e sua hetcronoml.'l. O cami�
contradições e:xistentcscntre elesl derom nho é cstreito, dificil, instável nL"lS acredi-
10 que seja, hojc em dia, o único possível.
par� 00; alOres". 30
Uma segunda dificuladade reside nas
definições implíci�LS de uma calCgoria
como a de "cultura popular". Qucira-se Notas
ou não, esta calCgoria leY.l a perceber a
cultura que ela designa como L10 aulÔno­
1. Oaude Grignon e Jcan-Claude I':!ss.,.
m., quanlO as culturas longínquas e como
ron, Le SQIXlnI el lepoplJafre. Mlsérabilisme
siruad, simetricamcnte em rel,ção à cul­
el popu/lsme en 5OCiologle el el/ lilléralure
rura dominante, letrada, elítisL', com a
(P:uis. G:illinurd / Le Scuil, liaUles ElUdcs,
qual fonna um par. preciso dissipar
É 1989), p.36. A tr.lduÇio espanhola inti,ula·se
eSSls duas ilusõcs complementares. De Lo ai/lo y lo popli/ar. Miserabillsmo e popu­
um lado, as culturas populares estão lismo en 5OCiologla y ,m IIleraJura (I3arcelo­
sempre inscritas numa ordem de legíti­ na. l.:l5 Edicionc:s de la I�queta, 1992).

midade cultural que lhes impõe uma rep­ 2. lbid., p. 37.


resen tação da sua própria dependência.
3. Robcrt Muchcmblcd, Cli//urepopli/alre
De outro, a relação de dominação, sim­ oi ai/lure des él/tes dans la France moderne
bólica ou não, nunca é simétrica: "Uma (.We-X\IIIle �des) Essal (P:uis, Rammarion,
culrura dominante não se define, em pri- 1978), p. 341. No prefácio de uma reedição
"OJLTUlA POPUlAR" 191

do seu livro (paris, flammarion, 1991), o au­ 14. Ibid., p. XIlX.


tor matiza fortemente seu ponto de vist!.
15. Ricbard H� The uses of liIeracy.
4. Peter Burkc, /'opular cW/ure in early aspecls of warking-c/ass life wl/b speckJ ref
modem Europe (London, Mawice Temple erence lo publicallons anti enlerlalnmenls
Smilh LId, 1968, reed., New York, Barper and (London, Cbauo and Windus, 1957). Ver,
Row, 1978), p. 207-208 e 270. Há traduo;iio 1..3.rIlbém. a tradução frances::a deste li ....o
.. e a
brasileira, A adlura papwar naldat/e Moder· apresentaçio de Je:J.n�laude Passeron, La
na: Europa, 1500-1800 (São P-"ulo, Campa· cWlure du pauvre. ElUde SUT le slyle de vie
oh;;' d!lS Letras, 1989). des dasses papldaires en Anglelerre (Paris,
5. Jacques Le GoO", "CuILure ccdési!lStique Les EdiLions de Minui� 1970).
el cuJture folldorique au Moyen-Age: San t i 16. Janice A. Radway, Readú'8 lhe roman­
Mareei de Paris et le dragon" (1970), em ce. Women, palrlarcby antipopuku /ileral u­
Jacques Le GoO", /'oIU Im auJre Moyen-�. re (Qlapcl HilJ, The UniversiLy ofNorlh ea,."
Temps, travaü el cWlllre en Ocddel7l: 18 li"" Prcss, 1984), p. 221-222 .
..
",Is (p-.uis, Gallimard, 1977), p. 236-279 17. lbid., p.17.
(dução p. 276). Há tradução portuguesa,
Para wn novo concel/o de ldat/e Média: le,,,, 18. Roger Charticr, "Ocs 'scaét:tircs' pour
pa, trabalho e aJllIra no Ocid",le (üsboo, le pcuple? Les modCles épisLolaircs de l'An­
Esumpa, 1979). den Régirne entre littérature de cour el livre
de colporlage", em La cofTespondallce. les
6.Jean-Oaude Schmi lt, "'Religion populai­
usages de la lel/re au)(])(e si,de (obra dirigi­
re' l ure folkloriquc", AmulIes Es.. C ,
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and culture in early modero Castile", Pasl and
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nhia dos Letr.lS, 1987).
27. Ii", Jardine e Anthony Grafton, "'SIU­
dicd for acuon': how Gabriel Harvey read bis (Recebido para pllblicação em
li,,)''', Pasl anti Pres.,.I, 129, nov 1990, p. agoslo de 1994)
30-78; Ano BIair, "Humanist melhod n i natu­
ral philosophy. ule eommon plaee book",
journa/ of lhe fllslory of/deas, vaI. 53, nO 4, -
Roger Cbartler é diretor de esOldos na
-

oUl-dcz 1992, p. 541-551. EeoIe dc:s Hautes Eludes en Scienees SociaIes.

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