Para lá dos limites impostos por estes critérios, só haveria lugar para a não – ciência
(teologia, filosofia metafísica, senso comum), incapaz de oferecer algo de pratico e de eficaz
para o progresso humano. Cedo, porem, se percebeu que o mundo humano era muito mais do
que aquilo que se podia conter dentro dos apertados critérios de análise do paradigma
positivista, hipotético-dedutivo; e se percebeu, igualmente, que o próprio fenómeno
educativo, entre muitos fenómenos humanos, não cabia nesses critérios, a não ser por um
processo simplificador, incapaz de traduzir a realidade na sua totalidade.
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Estamos, assim, diante de dois paradigmas em oposição1. Segundo Bogdan e Biklen (1994), e
remetendo já para o campo da investigação em educação; “ um paradigma consiste num
conjunto de asserções, conceitos ou proposições logicamente relacionados e que orientam o
pensamento e a investigação. (…) seja ou não explicita, toda a investigacao se baseia numa
orientacao teórica. Os bons investigadores estão conscientes dos seus fundamentos teóricos,
servindo-se deles para recolher, e analisar os dados” (p. 52).
1
Deve-se a Thomas Kuhn, na obra A Estrutura da Revolucoes Cientificas (2009), com primeira edicacao em
1962, o sublinhar da importância dos paradigmas na investigacao cientifica.
Os paradigmas são algo que membros das comunidades cientificas ‘compartilham’; “um paradigma governa,
em primeira instancia, não uma matéria de estudo, mas antes um grupo de profissionais” (Kuhn, 2009, p. 242).
Talvez fosse preferível falar de ‘paradigmas de investigacao’ (Lakatos, 1999; Shulman, 1989), devido à
ambiguidade do termo paradigma assinalada pelo próprio Kuhn (19890. Segundo Shulman (1989, p. 10), o
conceito de ‘paradigma’ é mais operacional para “descobrir os géneros de indagacao que se encontram no
estudo de um fenómeno”, e, também. Porque remete mais paa o tipo de questionamento que é feito na
investigacao.
Outra alternativa é a de falar em ‘escolas de pensamento’, porque como diz Meksenas (2008, p. 66), ‘os
iniciados em métodos distintos pensam de modo diverso os fenómenos, fatos, objetos e interacoes que
integram a realidade. Tais escolas são sistemas de pensamento. Cada escola articula-se por um conjunto de
pressupostos contidos em uma teoria, acessados por um método do conhecimento e aceitos por uma
comunidade de cientistas com base na capacidade de persuasão dos seus lideres e acerca das possibilidades
contidas no modelo teórico em questão”.
A esta definicao falta, no entanto, acrescentar a dimensão coletiva de um paradigma, que já
estava presente na definicao avançada por Kuhn (1989; 2009). Com efeito, há a assinalar que
a investigacao se faz no interior de comunidades que partilham o mesmo discurso destinado a
manter e desenvolver idênticos padrões de pesquisa, orientando os investigadores no modo
como devem questionar a realidade a estudar, como formular hipóteses, como procurar
métodos adequados ao objeto e ao objectivo da investigacao, estabelecendo a que ‘regimes de
verdade’ e creterios de cientificidade se devem submeter (Bridges, 2006; Shulman, 1989;
Popkewitz, 1984), e orientando no modo como cada membro da comunidade cientifica pode
reconhecer, valorizar e integrar na sua própria investigacao o conjunto da investigacao dos
pares e vice-versa. Sendo assim, um paradigma é uma espécie de tradicao que permite que
um grupo de investigadores chegue a acordo acerca da natureza do universo a estudar, da
validade das questões e colocar e da legitimidade das técnicas a empregar na investigacao
(Jacob, 1987).
Pagina 29.
Perante estes dois paradigmas estamos, pois, frente a ‘regimes de verdade’ e critérios de
cientificidade diferentes, com tudo o que isso mesmo acarreta (conceito de ciência, métodos
adequados ao objeto e ao objectivo da investigacao, procedimentos interpretativos e, ainda, o
modo como cada membro da comunidade cientifica pode reconhecer, valorizar e integrar, na
sua própria investigacao, o conjunto da investigacao dos pares e vice-versa).
2
Este paradigma aparece também na literatura designado por: positivista, racionalista, empírico-racionalista,
condtivista, laboratorial, experimental, etc.
3
É designado por paradigm fenomenologico, interpretativo, hermenêutico, naturalista, normativo-naturalista,
etc.
Na esteira de diversa literatura (Denzin e Lincoln, 2003, Cohen et al., 2006), as grandes
diferenças entre estas duas orientações investigativas devem ser vistas em torno de três
principais aspectos;
Voltaremos a estes aspectos no ponto seguinte. Antes disso colocamos de novo o problema
da própria ciência: o que é ciência?
Admitamos (tendo em conta todo o debate realizado, pelo menos desde os finais do século
XIX, em torno da possibilidade, construcao e
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Esta definicao aponta, portanto, para uma concecao aberta de ciência, admitindo alguma
diversidade de teorias cientificas (no tipo de provas e de existências a que se submetem),
diversidade que depende, sobretudo, da natureza (subjectiva ou não) da realidade estudada;
fomenta a complementaridade das grandes orientacoes tradicionais do fazer-ciencia: explicar
(paradigma hipotético-dedutivo) ou interpretar (paradigmas fenomenológicos e
hermenêuticos); assinala, ainda, o papel instrumental das teorias enquanto fontes (concetuais
e metodológicas) de questionamento da realidade. É uma concecao adequada à compreensão
cientifica dos fenómenos humanos caracterizáveis pela presença de determinismos externos e
objectivos, e por toda uma esfera subjectiva onde impera o “sentido”, a “interpretacao” e a
“decisão pessoal” que os sujeitos dão à vida e às circunstâncias que a rodeiam. Fenómenos
humanos marcados por uma enorme complexidade interna e externa, o que é patente no caso
do fenómeno educativo que, sendo ao mesmo tempo individual, quotidiano e concreto, é,
também, global, continuo, ideal! (Amado, 2011).
Um olhar de síntese sobre os dois tópicos anteriores leva-nos a concluir que as ciências da
educacao encontram o seu núcleo aglutinador e chave da sua identidade na construcao e
partilha de um conceito de educacao, mobilizador de reflexão, investigacao e praticas
destinadas à realizacao progressiva desse mesmo conceito. O esforço de racionalizacao do
fenómeno
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Educativo torna-se indispensável para o podermos colocar como central, ponto de partida e
de chegada. Alfa e Ómega da investigacao em educacao e próprio das ciências da educacao –
conferindo desse modo, o carácter especifico, identitário, a esta investigacao e a estas
ciências; conferindo-lhes, ainda, a sua alta dignidade e ate a sua radicalidade relativamente às
‘outras’ ciências (Amado & Boavida, 2005).
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Se tornou hegemónica dai em diante, mas não sem a oposicao de todos quantos, também
desde o século XIX (Dilthey, 1833-1911), consideravam que a especificidade e a
complexidade dos fenómenos humanos não se pide abranger por mera explicacao causal, mas
exige uma compreensão mais amla que integre a cultura e a historia da sociedade, a
linguagem, os fins indidual e coletivamente assumidos, etc.
Desse modo, neste capitulo daremos atencao a dois paradigmas de investigacao, que apesar
de radicalmente diferentes na concecoes de ser humano, de sociedade e de ciência, mantem
em comum uma ideia da verdade como representacao do ‘mundo’ (ainda que por tal
entendam coisas diferente); msntem, ainda, em comum a preocupacao e o exercício de
verificar a ‘validade’ do conhecimento que na sua base se produz.
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4
“Uma explanacao acerca do modo como funcionam ou se desenrolam determinados aspectos do
mundo, baseada em conceitos chave, principios e noutras hipoteses” (Lodico e tal., 2006, p. 5).
- Ontologia – a realidade social e humana é vista, à semelhança do mundo físico, como uma
realidade exterior à consciência dos indivíduos, dependente de variáveis externas, e, como tal,
objectiva, descritível, baseada em padrões gerais e previsivel.
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1.2.3. O paradigma sócio-crítico e apos a modernidade
Pagina 50
Et al., 2004). Nessa medida, critica-se a investigação realizada na base dos dois paradigmas
anteriormente descritos, como sendo analises produzidas sob um ponto de vista liberal,
historicamente descontextualizadas, e ao serviço das politicas dominantes nas sociedades que
as produzem, preocupando-se apenas com o conhecimento técnico ou hermenêutico e
esquecendo o critério da aplicação do conhecimento, no sentido da mudança do que esta
errado na sociedade (Cohen e tal., 2006, p. 28).
O ponto de partida para esta nova concessão do que são e do que devem ser as ciências
sociais constitui no retorno à obra e pensamento de Karl Marx. Nesta perspectiva, uma das
teses mais significativas e emblemáticas defendidas por Marx é a de que “ate agora, os
filósofos limitaram-se a interpretar o mundo de maneiras diferentes; o que importa, porém, é
transformá-lo” (Marx, 1971, p. 168).
Sintetizando a posição central da Escola de Frankfurt, afirma Tar (1977, p. 151), “a ideia de
uma verdade cientifica não se deve separar de uma sociedade verdadeira. A procura e enseio
por uma vida verdadeira é a tarefa de uma Teoria dialetica da Sociedade”.
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A realidade social é, pois, configurada pelos valores políticos, culturais, étnicos, de género,
etc.
Por outro lado, a investigação, mormente em ciências humanas, será sempre mediada pelos
valores do investigador e do investigado, em interacção e intercomunicação; o objectivo da
investigação é a transformação da sociedade, de modo a alcançar-se a verdadeira autonomia
da humanidade. Deste modo, os critérios de avaliação da qualidade de uma investigação
resumem-se a três principais (Guba e lincoln, 1994):
-grau em que proporciona um estimulo para a acção, isto é, para a transformação da estrutura
existente.
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No campo da educação, a investigação não pode, sob pena de se perder a sua própria
especificidade, “contentar-se com explicar as interpretações dos profissionais, mas deve estar
também preparada criticamente para as avaliar e indicar explicações alternativas que, em
certo sentido, sejam melhores” (Boavida e Amado, 2008, p. 223).
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Politico. Para os teóricos críticos, a objectividade não é necessariamente uma componente
desejável da investigacao; esta tem como finalidade ultima a transformação social e a
autonomia dos sujeitos.
- a opressão possui muitas faces e todas elas devem ser estudadas e desafiadas;
- as principais praticas de investigacao são geralmente, ainda que de forma involuntária, parte
da opressão;
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Claro que as objeccoes contrapostas pelos opositores a esta perspectiva (critica) não
esmorecem. E a mais forte é a de que a admissão da impossiblidade de evitar e contornar o
obstacul ideológico leva a cair nu, relativismo e num ceticismo que não será apenas
epistemológico, mas, ainda, politico e ético.
Neste período reconhece-se que qualquer “olhar é sempre filtrado através das lentes da
linguagem, género, classe social, raça e etnicidade. Não há uma observação objectiva, apenas
observações situadas socialmente nos mundos de e entre o observador e o observado (Denzin
& Lincoln, 2003, p. 31).
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Inclui-se nesta linha a investigacao feminista que tem, entre os seus principais objectivos, o
de alertar e combater a discriminacao(patente, por exemplo, na violência de género, na
assimetria de podere, etc.) contra as mulheres na sociedade, que tem tido na propria
investigacao social tradicional um instrumento, e, ainda, o de solidificar uma posicao de
simetria e igualidade de direitos das mulheres relativamente aos homens.
A investigacao antirracista tem, também, aqui o seu lugar, apresentando como objectivo
“compreender a opressão social e de que modod ela ajuda a construir e constranger
indentidade (raça, género, classe, sexualidade), tanto interna como externamente, atraves de
processos de inclusão e de exclusão “ (Johal & Dei, 2008, p. 10).
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Faz se, alias, apelo a métodos de investigação colaborativa (collaborative approach), que um
dos passos desta investigação é o reconhecimento mútuo das diferentes posições
institucionais dos investigadores e dos investigados, e das relativas posições de saber/poder
que cada um ocupa. Estas posições acabam por exigir diferentes aspectos a ter em conta: uma
forte relação e interdependência entre a teoria e a pratica, a intersubjectividade como critério
fundamental de validação, ênfase no processo de investigação mais do que no produto final e,
múltiplas vozes na analise e no relato das descobertas (o que remete para os processos de
escrita).
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Pois, a partir do principio da falsificabilidade, pode dizer-se que a objectividade se afirma
atraves de uma espécie de testabilidade intersubjectiva, de modo que ela “não tem apenas
dimensões lógicas e praticas, mas também tem dimensões individuais e sociais” (Stokes,
2000, p. 13).
Pense-se nas consequências destas novas realidade e novas visões, tanto no campo
epistemológico, como no campo educativo. No epistemológico podemos falar da necessidade
de uma nova racionalidade: a racionalidade complexa, capaz de dar conta das
transformações, incertezas e contradicoes inerente à realidade em geral e aos diferentes
aspectos que ela pretendamos estudar.
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Morin (1995, pp. 106-109) apresenta três macroprincipios que constituem a estrutura
essencial do paradigma da complexidade e que a seguir se sintetizam:
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Portanto uma ideia em rutura com a ideia linear de causa e efeito. Portanto, esta recursividade
permite que os efeitos ou produtos de um processo se tornem produtos e causas
simultaneamente.
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Pagina 69
COUTINHO, C. (2006), Aspectos metodológicos da investigação em tecnologia educativa
em Portugal (1985-2000), Univ. do Minho. Disponível em:
http://repositorium.sdum.uminho.pt/bitstream/1822/6497/1/Clara%20Coutinho%20AFIRSE
%202006.pdf
https://books.google.co.mz/books?
id=OnaMCwAAQBAJ&pg=PA29&lpg=PA29&dq=paradigmas+de+investigacao&source=bl
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dissemos na alínea anterior que o paradigma fenomenológico-interpretativo se coloca em
relacao ao paradigma hipotético-dedutivo numa posicao diametralmente oposta, considerando
diversos aspectos; é o que passamos a axplicar recorrendo às mesmas alíneas do tópico
anterior.
Pagina 42
Collado, F. C. e Lucio, P. B.