Você está na página 1de 22

. .

'

l •
~!/..~•,
1:~t
\~ ' ,
-~-'"~~..,.

.. L.I·'
: '\
' .
TEOLOGIA
SISTEMÁTICA

M IL L A R D J . E R IC K S O N

TRADUÇÃO
R O B IN SO N M A LK O M
ES
V A LD EM A R K R O K ER
T IA G O A B D A LL A T E
IX E IR A N ET O

o
VlDA NOVA
11

PARTE 10

A SALVAÇÃO
42. Concepçõ es de salvação
43. O antecede nte da salvação: predestinação

44. O início da salvação: aspectos subjetivos

45. O início da salvação: aspectos objetivos

46. A continuid ade da salvação

47. A conclusão da salvação


48. Os meios e o alcance da salvação
42
Concepções de salvação

r
Ao concluir o estudo deste capítulo, você deverá
1. Identificar e explicar os detalhes em que as
Objetivos do capítulo
estar apto a:
várias concepções sobre salva-
ção divergem.
salvação diferentes.
2. Identificar e descrever cinco concepções de
3. Estabelecer semelhanças e diferenças entr
e cinco concepções de salvação
ências bíblicas.
distintas e avaliar qual delas explica melhor as evid

Resumo do capítulo

nvolvido ao longo de muitos


Diferentes concepções de salvação têm se dese
cinco concepções de salvação
anos, enfatizando vários de seus aspectos. Há
uma nova ordem social e eco-
proeminentes: a teologia da libertação enfatiza
ança na perspectiva individual
nômica; a teologia existencialista destaca a mud
salvação quando as pessoas se
a respeito da vida; a teologia secular crê que há
lemas; o catolicismo romano
afastam da religião para resolver os próprios prob
salvação tradicional; a posição
contemporâneo ampliou muito sua concepção de
de mudança total do indivíduo,
evangélica afirma que a salvação é um processo
ção, rumo à glorificação.
cujo desenvolvimento se dá por meio da santifica

1 • Por que há tantos detalhes em que as concepções


Perguntas para estudo

de salvação divergem entre si?


pela teologia da libertação?
• Quais partes das Escrituras têm sido enfatizadas
Por quê?
A salva -
1
864
çilo
. H
• Qual é a distinção feita po r e ide gg er en tre exi stê nci a aut ênt ica e ex-
is-
tência inautêntica? ff com o é O rel aci on am en to de De
• De acordo com Bo nho e er, us corn
o
mundo secular? . dou em relação à salvação?
osição católica mu
• Co mo ª P . _ él'
• Segundo a pos1çao evang ic a' O que está env olv ido na salvação?

[
Estru~ura d o ca ~
1
Detalhes em que as conce pções de salvação div erg em ent re s1
A dimensão do tempo
Natureza e locus da necessidade
o meio da salvação
A direção do processo da salvação
A extensão da salvação
Os objetos da salvação
Concepções atuais de salvação
Teologias da libertação
Teologia existencialista
Teologia secular
Teologia católico-romana contemporâne
a
Teologia evangélica

A salvação é a aplicação da obra de Cri


sto à vida dos seres humanos. Consequen
mente, a doutrina da salvação tem apelo te-
e relevância especiais, visto que se relacion
às necessidades mais básicas da pessoa. a
Isso é particularmente evidente para os
compreendem o ensinamento bíblico sob que
re o pecado. Aliás, em virtude da primazia
dessa necessidade na vida do indivíduo,
recentemente alguns teólogos têm analisad
primeiro a salvação, para depois se voltar o
à pessoa e à obra de Cristo. 1 Embora
abordagem tenha um valor apologético essa
evidente na pregação, ela encontra limitaç
como estrutura para a teologia, pois presum ões
e que o ser humano é o melhor juiz de se~
problema, e pode até levar à situação em
que o mundo determina os termos nos qua
seu diálogo com a igreja é conduzido. is
O Sl·gni'ficadO d al
a P avra "sa1vaçao
- " pode , io
. para pes
1 rr d · ,
parecer obv soas f:ami·11·arizadas
com eª· 10 avia, mesmo em circ .
ulos cristãos há concepções muito . .r
al - b due rentes sobre
0
que ª s vaçao a range. ntes de exa
A '
minar mos as principais, sera, utl
, ·1 0 bse rvar
Concepções de salvação
865
b evemente os diversos detalhes em que el d"
r ál" d d" i: as tvergem. Isso nos fornecerá as categorias
úteis para an ise as 11erentes perspectivas.

DETAL~ES EM QUE AS CONCEPÇÕES DE


SALVAÇAO DIVERGEM ENTRE SI
A dimensão do tempo
A salvação é compreendida de forma variada: como um único evento no início da vida
cristã, um processo contínuo durante toda a vida cristã ou um evento futuro. Alguns
cristãos consideram a salvação basicamente completa no início da vida cristã. Eles tendem
a dizer: "Fomos salvos". Outros definem a salvação como um processo-"estarnos sendo
salvos". Ainda outros pensam nela como algo a ser recebido no futuro - "seremos salvos".
É possível combinar duas ou mesmo três perspectivas. Nesse caso, os aspectos distintos
da salvação (e.g., justificação, santificação, glorificação) são compreendidos como se
ocorressem em momentos diferentes.
Precisamos também determinar o tipo de tempo que isso envolve. Na língua grega,
em especial, o verbo empregado pode retratar uma ação como pontilear ou durativa, ou
pode não se referir especificamente ao tipo de tempo envolvido. Por isso, a salvação e
seus aspectos constituintes podem ser concebidos de diversas maneiras:

1. Uma série de pontos:

2. Uma série de processos descontínuos:

3. Uma série de processos sobrepostos:

,
4. Um processo único continuo com co mponentes distinguíveis:

1 1 1 1 1

Natureza e /ocus da necessidade . .


. , tureza e ao /ocus da necessidade que preCisa
U ma segunda quest ão esta, re1acionada a na d fi . ~ ' ·a humana básica é considerada
_ d . • al a e cienci
ser resolvida. Na concepçao tra icwn '. _ d ontade de Deus, o pecado resulta
. - d D Como v101açao a v "d
Vertical: uma separaçao e eus. , . ação do relacionamento rompi o
d cessana a restaur ' .
em inimizade com ele, tornan ne
,
° _
ncepçao evange c
'li a de salvação. Ela é caractenzada
entre Deus e a criatura. Essa eª co ,, " "liação" e "adoção". Uma segunda
" _ ,, " erdão , reconci . .
por expressões como conversao , P . . bl ma humano sep honzontal. Isso
. nncipa1 pro e
concepção é a que acredita que O P d . t mento com outras pessoas, ou uma
. dividual e aJUS a
pode significar uma dificuldad e m
866 Asah.,
1
aç~0
. na sociedade em geral. A salvaçã
d tal de harmonia . o env l
necessidade fun amen , . h ana a cura de relac10namentos pe . 0 \te a
ras na espec1e um ' , ssoa1s
eliminação das ruptu . ,, i.- al" esse processo no mvel dos desajustes . d' .e So-
. 1 c1onal ioc iza . -
ciais. A "teolog1a re ª As teologias da hbertaçao se preo in iv1dllais
d pos pequenos. cuparn
e dos problemas e gru conômicas, raciais e de gênero, e com f: com
. d"ferentes e1asses e O ato d
os conflitos entre 1 turada dessa forma, de modo a negar a ea
. d todo estar estru . . urna
soe1eda e como um . - d ssidades básicas da vida. Finalmente o Parte
. b a prov1sao e nece ' probl
de seus mem ros b, , ebido como sendo interior. O indivíduo é ema
humano principal tam em e cone . 1 . i.- • • • contarni-
. d ser erradicados - cu pa, in1enondad e e inse
nado por sentimentos que evem . - " " d gurança
"Ajustamento", "autocompreensão", "autoaceitaç ao e aumento a autoestima" sã~
palavras-chave dessa perspectiva.

O meio da salvação
A questão de como a salvação é obtida ou transmitid~ t~mbém é ex~remamente im-
portante. Algumas concepções consideram a transmissao da salvaçao praticamente
um processo físico. Isso se aplica a certos sistemas sacramenta listas que creem que
a salvação ou a graça é obtida através de um elemento material. Por exemplo, no
catolicismo romano tradicional, acredita-se que a graça é de fato transmitida e rece-
bida ao se ingerir o pão da eucaristia. Mesmo que o valor do sacramento dependa,
em certa medida, da atitude ou condição interior do comungant e, a graça é recebida
primordialm ente por um ato físico exterior. Outros pensam que a salvação é trans-
mitida mediante ação moral. Neste caso, a salvação é produzida pela mudança do
estado das coisas. Essa ideia de salvação é encontrada no movimento do evangelho
social e nas teologias da libertação. A abordagem à mudança proposta por algumas
dessas ideologias é, às vezes, de natureza secular, envolvendo , por exemplo, o uso de
meios políticos comuns. As teologias evangélicas representam um terceiro conceito:a
salvação é mediada pela fé. A fé se apropria da obra realizada por Cristo. O receptor
é, em certo sentido, passivo nesse processo ( essas questões serão analisadas de maneir.i
mais abrangente e detalhada no cap. 48).

A direção do processo da salvação


Mais uma consideração é a direção do processo da salvação. Será que, ao salvar indi1~í-
duos, Deus trabalha efetu d 10
, .
a sociedade e, assim mud 0
°
an uma transformaç ão pessoal que prossegue ern direç , e
d d ;> O sera qll
e1e atua pela muda
'
d
ª mun ° o qual os redimidos fazem parte. u
rrutur,
as
i.- st
nça as e ruturas de nossa sociedade e então, usa essas es
trans10rmadas para mudar as pesso . ,
.
O movimento do evangelh as que a constituem~ oes·
. al · . , . d ,culo 2
tava convicto d o soei do final do século 19 e m1cio o se hu[llªºª
e que o problema h fu reza
P ervertida m b" umano ndamental não era uma natu . d'"íduos,
' as um am 1ente · 1
q ue são corro ·a 1 ~ocia mau. Portanto, em vez de tentar curar
mp1 os pe a soc1ed d d
1n 1•
às so.ii
levam d0
enfermidades Pod ,
·
.
enamos dize
ª e, evemos alterar as condições que opºº
r que os eiensores do evangelho social estavarn pr
d !':
concepç ões de salvação
867
. . l De
tipo de ministé rio de saúde pública espiritua
urn essa perspectiva se
ssernelhava à concepç ão do behavio rism d que· a p certa forma,
lid d • . .
a . o e e md1v1du al é pouco
ais que um conJunt o de padrões de co ersona a
rn mportam ento d · d
que a pessoa vive. etermm a os pelo ambient e em
A abordag em oposta é defendi da por aque1es segmento d · · ·
·zarn a convers ão. Os males da . d d s o cnstiarn smo que en-
f:at1 soc1e a e resultam d 0 f: d
· dºvíduos maus. Somen te à medºd . ato e ela ser compos ta por
10 1 1 a que esses md·1v1'duos 10rem
r transfor mados haverá
qualquer esperan ça re al d d' 'd
e mudanç a na socied ad e. I n 1v1 uos transformados finalme nte
_ • d d -
mudarao a soc1e a e, nao soment e porque O t Od O e, composto de suas partes mas também
. . 'd
orque md1v1 uos transfo rmados sobrena tura1mente tem a motivação para trabalha r
A • '

P _
pela transfor maçao de toda a socieda de.

A extensão da salvaç ão
A_ e~e~são da s~va~ã o ~ debatid a entre os que nela pensam como algo que se aplica
a md1v1duos, e nao a socieda de. A pergunt a é: quem ou quantos membro s da espécie
humana serão salvos? A posição particul arista entende a salvação como baseada nas
respostas individ uais à graça de Deus. Ela afirma que nem todos respond erão afir-
mativam ente a Deus; consequ enteme nte, alguns se perderão e outros serão salvos. A
posição univers alista, por outro lado, argume nta que Deus restaurará o relacion amento
de todos os seres humano s com ele, para o qual foram original mente criados. Há dois
tipos de posição univers alista. Uma pessoa pode ser universalista sendo um particul arista
otimista. Isso signific a que ela pode defende r a posição de que é necessário aceitar a Jesus
Cristo pessoal mente para ser salvo e que todo indivídu o tomará tal decisão. Entreta nto,
infelizmente, não parece que todos no passado aceitaram a Cristo; aliás, um incontá vel
número de pessoas não teve sequer a oportun idade de fazê-lo. Consequentemente,
não é plausíve l pensar em todas as pessoas sendo salvas dessa maneira , a não ser que
haja algum meio inconsc iente pelo qual as condiçõ es para a salvação sejam cumprid as.
A perspectiva univers alista mais comum é presum ir que, no final, Deus, de alguma forma,
simplesmente aceitará todas as pessoas na comunh ão eterna com ele.

Os objetos da salvaç ão
Alguns teo'logos argume ntam que somente os seres humanos, individual e coletivamente,
. - cons1ºd era O restante da criação .como
serão salvos . E ssa pos1çao merame nte um palco . .
.
em que se passa o d rama h umano; por tanto , ela' é apenas 111c1den tal para a ocorren c1a
'
completa d asalvaçao._ U . - alternat iva , no entanto , defende que os seres humano s
_ ma pos1çao . _ . .
nao fora , . e d 1 esença do pecado na cnaçao. Geralm ente mfenn-
m os umcos a1eta os pe a pr . _ .
do su _ d p 1 m Roman os 8.18-25 , a pos1çao alternatJ .va
ª propost a das afirmaç oes e au o e _
argum _ e final incluirá a restaura çao de todo o cosmo
enta que a salvaçao , em sua 1orma ' _ , . _
caído ·d- d O pecado e sua recondu çao a cond1ça o pura e
' que agora está sob a escrav1 ao ' .

gloriosa em que foi criado e para a qual foi destinad o por seu Cnador .
Asalva, ,
868 ,drJ

CONCEPÇÕES ATUAIS DE SALVAÇÃO


Teologias da libertação _
. . . ortantes que atualmente propoe uma perspecti .
Um dos movimentos mais imp . va (1n.
_ , . d teologias que pode ser coletivamente deno1111.
guiar da salvaçao e o conjunto e . . . . nadr,
. d l'b - " Poderíamos subd1v1dir esse movimento em teologia
de "teologias a 1 ertaçao • , . . , negra,
teologia feminista e teologia do Terceiro Mundo. A u~tH~a e~ especial e chamada dt
. da libertaçao.
teologia - Embora algumas diferenças s1gmficat1vas . tenham ocasiona,..
esses grupos há aspectos suficientemente comuns e
mente causado conflitos entre ' ntre
eles que nos permitem traçar algumas características básicas de sua concepção sobrea
natureza da salvação.
Uma das ênfases comuns é que o problema fundamental da sociedade consiste naopres-
são e na exploração das classes mais fracas pelos poderosos. A salvação implica libertação
de tal opressão. O método de libertação será apropriado à natureza da situação especifica.
A análise que a teologia da libertação faz da condição problemática da humanidade
provém de duas fontes. Por um lado, há um consenso de que a abordagem capitalistaou
"desenvolvimentista" das questões econômicas e políticas está inerentemente equivocada
e é absurda. Os capitalistas afirmam que há um processo pelo qual todas as sociedades
idealmente deverão passar. O problema com as nações subdesenvolvidas é que elas sim-
plesmente não estão adiantadas no processo, como as nações mais industrializadas. À
medida que as nações subdesenvolvidas progredirem, seus problemas serão resolvidos.'
Para os teólogos da libertação, no entanto, está se tornando cada vez mais evidente que
o desenvolvimento econômico das nações avançadas e a prosperidade das classes sociais
da elite são alcançados à custa dos menos favorecidos. Em países da América Latina.
percebe-se o contraste acentuado entre condomínios de prédios de luxo e as favelas
adjacentes. As corporações internacionais prosperam porque elas exploram a mão de
obra barata em repúblicas latino-americanas e em lugares semelhantes. Nações ricas
usam O poder militar para manter os países pobres em estado de subserviência, pois0
fato de as nações pobres imitarem as nações ricas não resultará em prosperidade p,1r1
t~dos. A razão subjacente é que as nações prósperas desfrutam de prosperidade espt'·
c1ficamente_porque elas mantêm outras nações empobrecidas. O abismo entre ricos~
pobres contmua aumenta_ndo. Não é somente o caso de um grande número de p~sso,1'.
(mesmo _nos Estados_~mdos) viver em condições de pobreza; há pessoas que !~te~'.~,
A

mente nao tem cond1çoes de viver! Além disso milhões trabalham em circunsr:u1LI•·
degradantes e injustas. 3 '

A outra fonte para se d _ _ l rwão éJ


_ compreen er a salvaçao como libertaçao da exp O ' :
percepçao de que a Bíblia se identifica com os oprimidos. Os teólogos da !iberraç.io

2y 7b . ,r,i1"
Pres~: ;9~i). e stages oJ economic growth, de Walt W. Rostow (2. ed., New York: Cambridge U111Vl . .

3G · Jolu1
ustavo GUTIERREZ A theolo oJ /'b
Eagleson, Maryknoll: O;bis,
197
f . . .dad lnd,t t'
p. ~- eratzon: hiSrory, politics, and salvation, trad. Can '
2
ões de salvação
conce Pç 869

nhecem que sua teologia é tendenciosa b d


reco d ue os autores da Bíbli . na a or agem bíblica, mas respondem
afirrnan odq D , h" , . da compartilham dessa inclinação. A história da obra
ntora e eus e uma istona e grupos de . .
re d e . b, . pessoas opnm1das. O povo de Israel foi
•rnido no Egito e tam em, postenorment - .
opn d fil" e, por naçoes mais poderosas. Considerem-
s ataques os isteus e o cativeiro nas - d ,.
-se O maos os ass1nos e babilônios. A igreja,
part 1.cularmente
.
quando se expandiu para 0 t · , •
.
,
erntono gentílico, era constituída de
pessoas impotentes, "pobres e. sem . importância, e não d a elite soc1"al . J usto e C a th enne
.
González resumem: Em primeiro lugar, é verdade que a maior parte da Bíblia é escrita
da perspectiva dos impotentes? Certamente".4
A partir da inclinação de Deus de transmitir a Palavra por meio dos fracos e im-
potentes, a teologia da libertação conclui que sua mensagem de salvação diz respeito
a eles em particular. Jesus confirmou isso em Lucas 10.21: "Graças te dou, ó Pai,[ ... ]
pois ocultaste essas coisas aos sábios e eruditos e as revelaste aos pequeninos". O s sábios
e poderosos devem ouvir a Palavra de Deus por meio de pessoas fracas e impotentes,
como Natã, Amós, Pedro e Jesus, ou não a ouvirão de modo algum.
Mas qual é a natureza específica da salvação, segundo a perspectiva das teolog ias da
libertação? Elas não alegam ser teorias universais, mas estão intimamente relacionadas
a realidades políticas concretas. As teorias universais geralmente acabam se revelando
concepções teológicas do universo de homens brancos da classe média. A teologia negra,
ao contrário, afirma-se corno urna maneira de romper com a influência corruptora do
pensamento branco, com o objetivo de formular uma teologia com base em normas da
comunidade negra e em fontes apropriadas a ela. 5
De forma correlata, as teologias da libertação não consideram que a Bíblia seja de
natureza universal. O!iando examinada de perto, ela se revela um livro não de verda-
des e regras eternas, e sim de história específica: ela não é mera narrativa de eventos
passados, é também um plano para a redenção da criação de Deus, uma tarefa política
a ser executada. 6
Embora a teologia da libertação esteja relacionada especialmente a questões his-
tóricas e políticas concretas, ela não se compreende simplesmente como uma teologia
fragmentada. Ela se ocupa e trata da teologia cristã como um todo, não apenas da
libertação. Apresenta-se como uma abordagem de todas as doutrinas ou dos assuntos
7
da teologia tradicional, porém, da perspectiva libertadora. • • •

A teologia da libertação não entende Deus como tradicionalmente c~do _pela maion~
dos cristãos : o ser 1mpassive
. , l , 1m
• utável
· e incognoscível. .Antes,
, Deus e ativo.
_ Ele esta
envolvido c om os po b res em sua luta, • Uma evidência disso e a encarnaçao, pela qual .
Deus , longe d e se manter 1n
. d"fi t
1 eren e e seguro , veio ao mundo na pessoa de Jesus Cnsto

4.Justo L G . . G G , , L ºbemtion prearhing. the pulpit and the oppressed,


N · ONZALEZ e Catherine . oNZALEZ, 1
~shville: Abingdon, 1980, p. 16. . .
James H. CoNE, A black theology ofliberation, Philadelphia: Lippmcott,
GoN ,
º•
197 53
P· ·
7Ib· 2 ALEz e GONZÁLEZ, op. cit., p. 20- 1.
idem, p. 2 1.

......
870
A salvação

e entrou na luta humana. Na perspectiva da teologia da libertação, 0 Deus d _


- d , d d , o te1srn0
tradicional que não muda e nao pode mu ar, e, na ver a e, um 1dolo desenvº~~ 1 .
, 0
aqueles que mais tinham a perder com a mudança. No entanto, ao contrário D P r
. - . . fi 1 - , , eus ew
ativamente envolVIdo na transformaçao. Isso s1gm ca que e e nao e neutro. Se . a
. . . suaJusti
produz igualdade, ela deve necessariamente atuar de manetra desigual e com en _~a
. f:' . d P satona
em um mundo desigual. Talvez a afirmação mais en at1ca essa posição tenha si.do fe·t
por James Cone: ''A teologia negra não pode aceitar uma concepção de Deus ~ª
que nao
o represente a favor dos negros e, portanto, contra os brancos. Vivendo em um
mundo
de opressores brancos, os negros não têm tempo para um Deus neutro".s
A concepção da teologia da libertação a respeito da salvação presume uma pers-
. . .
pectiva particular da humanidade e do pecado. A teologia trad1c1onal frequentemente
enfatiza a humildade e a auto-humilhaçã o como as virtudes principais da humanidade
planejadas por Deus. O orgulho, de maneira correspondente , é visto como pecado capi~
tal. O pecado, muitas vezes, é considerado uma questão de atitudes internas ou delitos
individuais. De acordo com os teólogos da libertação, porém, a Bíblia não enfatiza a
humildade, um atributo que frequentemente leva à aceitação da opressão. Antes, em
textos como o salmo 8, a Bíblia exalta a natureza humana. Ademais, ela não considera 0
orgulho interior o pecado principal. Servindo os interesses dos poderosos nesse aspecto,
bem como em tantos outros, a teologia e a pregação cristãs tendem a ignorar o pecado
mais comumente condenado na Bíblia: ''Ai dos que ajuntam casas e mais casas, dos que
acrescentam um campo a outro, até que não haja mais lugar, de modo que habitem sós
no meio da terra!" (Is 5.8). 9
A salvação não deve ser concebida primariamente como a vida individual após a
morte, afirmam os teólogos da libertação. A Bíblia se preocupa muito mais com o reino
de Deus. Mesmo a vida eterna é geralmente colocada em um contexto de nova ordem
social e considerada não tanto algo externo à história quanto uma participação em sua
culminação. Esta compreensão de que o alvo da história é a realização da justiça nunca
foi popular entre os poderosos. Se, de acordo com a fórmula tradicional, a história e
a eternidade são dois âmbitos paralelos (i.e., que não se intersectam), o nosso alvo na
história é obter acesso à eternidade. A melhor maneira de se alcançar isso é ser manso
e submisso. Visto que a principal preocupação de um indivíduo é que sua alma vá para
0 céu, os que exploram o corpo podem, na verdade, estar fazendo um favor. Mas co~o
González e González declaram , se a história e a eternidade se intersectam, "seª salvaçao
.
t' d todo ' entao
es a se moven o para uma nova ordem que inclui o ser humano como um
·
precisamos 1utar contra tudo o que, no presente, nega aquela ordem"•10 A 5alvação de
. portanto,
to d as as pessoas da opressão é o alvo da obra de Deus na história e preC1sa,

8
CONE, Ablack theology ofliberation, p. 131-2.
9
GONZÁLEZ e GONZÁLEZ, op. cit., p. 24.
'ºIbidem.
ões de salvação
concepÇ
871
refa dos que nele creem, utilizando t d .
rata o os os meios , . . 1 .
se e até mesmo a revolução se nec , . · poss1ve1s, me us1ve esforços
olíticos , essano.
p
. a existencialista
'feo1ogt .
variação das teologias do século 20 foi a t . .
Ú01ª fu d t d fü eo1ogia existencialista que recebeu este
or estar n amen a a na osofia existe .ali ,
no 01e P d d , . d. nci sta ou haver sido elaborada a partir
Na ver a e, em mve1s 1versos, provavel . .
dela. a1 d'd d . mente a ma1ona das teologias do século
. corporou guma me 1 a o existenciali
20 1n . smo em suas formulações doutrinárias.
,,.. s em mente aqm, no entanto as que sã0 b d
.1e01° _ . ' a erta e eclaradamente existencialistas
sua orientaçao, teologias em que a filosofia exist 'ali .
ern . enci sta tem um papel importante
eS
ignificativo. Talvez o representante mais notável desse t· d 1 . . R d lf
1po e teo ogia seJa u o
Bu1trn ann e seu programa de demitologizaçao. - B 1 .
u tmann procurou mterpretar o NT e
certarnen_te, ~labor~r ~ t~o~ogia com base no pensamento de Martin Heidegger. ,
O pnmeiro pnnc1p10 importante é a distinça~o que H ·d
. . . . . f:
e1 egger az entre co nh eci-·
rnento objetivo e subjetivo. O conhecimento objetivo consiste em ideias que refletem ou
correspondem corretamente ao objeto significado. Aqui, a atitude do sujeito ou conhe-
cedor não tem nenhuma contribuição positiva a fazer, tornando-se, antes, um obstáculo.
Entretanto, o conhecimento subjetivo é bem diferente. Nesse caso, o interesse central
não é a exatidão da descrição do objeto significado, mas o envolvimento subjetivo ou
0 sentimento interior do conhecedor em relação ao assunto de discussão ou objeto de

conhecimento. O nosso conhecimento subjetivo de outra pessoa não é a nossa reserva


de ideias objetivas sobre ela; mas é uma questão de nossos sentimentos para com ela.
O mesmo princípio se aplica ao conhecimento subjetivo de nós mesmos. A verdade sobre
nós, então, envolve muito mais do que informação objetiva, pois, embora possamos ter
todo tipo de conhecimento científico sobre nosso corpo, talvez saibamos muito pouco
sobre nosso verdadeiro eu, quem realmente somos. 11
Portanto, da perspectiva de Bultmann, a Bíblia não é essencialmente uma fonte de
informação objetiva sobre Deus e sobre a pessoa e a condição humanas. Ela nos dá a
Geschichte e não a Historie. Ela não é, primariamente, um relato objetivo de ocorrências
factuais, e sim do impacto que as diversas ocorrências tiveram sobre os discípulos. O seu
alvo não é nos informar, mas nos transformar; não é acrescentar informações a nosso
repertório de dados , mas afetar nossa existência.
Bultmann utiliza O conceito de existência autêntica e inautêntica. Ele menciona
duas tendências no "homem moderno". Por um lado, há uma tendência a ser guiado na
vida por auto-orientação, para cumprir os desejos de felicidade e s:gurnnç,t, urilida~e e
proveito• Isso e, ego1smo
, e presunç a~o . O amor aos outros e o dese10
• de . conhecer, dizer
e honrar a verdade são subservientes ao impulso do autoengrandec1mento. Os seres

11
?\1arf H . . N y, k· Harper & Row, 1962, p. 85. [Edição em português:
Bemg and ttme, ew or ·
in EIDECGER, . . • · ( d D
Ser e temn0 p , . ] f d S K' erkegaard Conrlud111g 11mc1entijicpostscnpt tra .
.
F r , etropol.is: Vozes, 2011. ; e., e 0 ren 1 _ . ' _ )
· Swenson e Walter Lowrie, Princeton: Princeron UniverSity, 1941 • P· 169 75 ·
870
V Asalvaç·
ªº
e entrou na luta humana. Na perspectiva da teologia da liberta;ão, o Deus do teíslllo
. _ d - de mudar é na verdade, um idolo desenvolvido
tradicional que nao mu a e nao Pº ' ' ,. Por
' d nça No entanto, ao contrario De
aqueles que mais tinham a perder com a mu a . - , ' us está
- I · ifica que ele nao e neutro. Se sua· .
ativamente envolvido na transformaçao. sso sign . . Justiça
. tu r de maneira desigual e compen . .
produz igualdade, ela deve necessariamente a ª ,. ._ . satona
. al T'-1vez a afirmação mais enfatICa dessa pos1çao tenha sido feit
em um mun do des1gu . ai _ a
por James Cone: ''A teologia negra não pode aceitar uma conce~çao de Deus que não
o represente a favor dos negros e, portan co
t
°, ntra os brancos. Vivendo em um m d
un o
- ~ t mpo para um Deus neutro". 8
de opressores brancos, os negros nao tem e . _
A concepção da teologia da libertação a respeito da salvaçao presume uma pers-
pectiva particular da humanidade e do pecado. A teologia tradicional frequentemente
enfatiza a humildade e a auto-humilhação como as virtudes principais da humanidade,
planejadas por Deus. O orgulho, de maneira correspondente, é visto como pecado capi-
tal. O pecado, muitas vezes, é considerado uma questão de atitudes internas ou delitos
individuais. De acordo com os teólogos da libertação, porém, a Bíblia não enfatiza a
humildade, um atributo que frequentemente leva à aceitação da opressão. Antes, em
textos como o salmo 8, a Bíblia exalta a natureza humana. Ademais, ela não considera o
orgulho interior o pecado principal. Servindo os interesses dos poderosos nesse aspecto,
bem como em tantos outros, a teologia e a pregação cristãs tendem a ignorar o pecado
mais comumente condenado na Bíblia: ''Ai dos que ajuntam casas e mais casas, dos que
acrescentam um campo a outro, até que não haja mais lugar, de modo que habitem sós
no meio da terra!" (Is 5.8). 9
A salvação não deve ser concebida primariamente como a vida individual após a
morte, afirmam os teólogos da libertação. A Bíblia se preocupa muito mais com o reino
de Deus. Mesmo a vida eterna é geralmente colocada em um contexto de nova ordem
social e considerada não tanto algo externo à história quanto uma participação em sua
culminação. E sta compreensão de que o alvo da história é a realização da justiça nunca
foi po~ular entre os poderosos. Se, de acordo com a fórmula tradicional, a história e
a eternidade são dois am~ b't 1 os para1e1os ('1.e. que não se intersectam) o nosso ,aIvo 11·i'
·a
história. é obter acesso ª' et erm ad e. A melhor ' maneira de se alcançar' isso e, ser manso
e submisso. Visto que · • al · •1r.1
, ª pnncip preocupação de um indivíduo é que sua alma va P· '
o ceu, os que exploram o d M ·0 1110
G ál corpo po em, na verdade estar fazendo um favor. as e
onz ez e González declar h' , . ' . " alv,1çã0
, am, se a 1stona e a eternidade se mtersectam, seª 5'
esta se movendo para uma d então
. nova ordem que inclui o ser humano como um to o,
precisamos lutar contra tudO O " ,o A sal iio de
todas as d que, no presente, nega aquela ordem . ' vaç,
pessoas a opressã0 , O al . ortanto,
e vo da obra de Deus na história e precisa, P
~eONE,A black theology of/'b .
9GON ZÁLEz e GoNZÁL z era~zon, p. 131-2.
iolbidem. EZ, op . c1t., p . 24.
ões de salv açã o
con ce Pç
871
tare fa dos que nel e cre em , util iza ndo
ser a tod .
, . s e até me sm o a rev olu ção se ne os os mei os po , · · 1 ·
poh nco , , . ssiveis, me us1ve es1e orço s
ces san o.
reologia exi ste nci ali sta
Urna var iaç ão das teo log ias do séc ulo
20 foi a teo l . . . .
fu d
nome por est ar n am ent ad a na filo sofi og1a existenciali sta, que rece beu este
a exis tenc iali sta ou h
dela. N a verd a d e, em nive1s, • d.
ive rso s, pro vav elm ent e aver s1 o e1a b ora d a a part.lr
.d .
zo .
inc orp oro u alg um a me did a do exi. sten a ma•ion.a d as teo1og1. as d o sec ,
u1o
. cial ism o em suas e - d .
1or mu1aço es out nna n. as.,
Ternos em me nte aqu i, no ent ant o, as
que são abe rta e dec lara dam ent e existen
em su~ ori e_n taç ão, teo log ias em que a cia list as
filosofia existencialista tem um pap el imp
e sign ific ativ o. Tal vez O rep res ent ant e ort ant e
ma is not áve l desse tipo de teo log ia seja
Bul tma nn e seu pro gra ma de dem itol ogi Ru dol f
zaç ão. Bul tma nn pro cur ou inte rpr eta r o
cer tam ent e, ela bor ar a teo log ia com bas NT e,
e no pen sam ent o de Ma rtin He idegge
O pri me iro pri ncí pio imp ort ant e é a r.
dist inç ão que He ide gge r faz ent re con
me nto obj etiv o e sub jeti vo. O con hec ime hec i-
nto obj etiv o consiste em idei as que refl ete
cor res pon dem cor reta me nte ao obj eto m ou
significado. Aq ui, a atit ude do suje ito ou
ced or não tem nen hum a con trib uiç ão con he-
pos itiv a a fazer, torn and o-s e, ant es, um obs
Ent reta nto , o con hec ime nto sub jeti vo tácu lo.
é bem dife ren te. Nes se cas o, o inte ress
não é a exa tidã o da des criç ão do obj eto e cen tral
significado, mas o env olv ime nto subjeti
o sen tim ent o inte rio r do con hec edo r vo ou
em relação ao ass unt o de discuss ão ou
con hec ime nto . O nos so con hec ime nto obj eto de
sub jeti vo de out ra pes soa não é a nos sa
de ide ias obj etiv as sob re ela; ma s é um rese rva
a que stão de nossos sen tim ent os par a com
O mesmo pri ncí pio se apl ica ao con hec ela.
ime nto subjetivo de nós me smos. A ver dad
nós , ent ão, env olv e mu ito ma is do que e sob re
info rma ção objetiva, pois, em bora pos sam
tod o tipo de con hec ime nto cien tífi co os ter
sob re nos so cor po, talv ez saib am os mu
ito pou co
sob re nos so ver dad eiro eu, que m rea lme
nte som os. 11
P ort ant o, da per spe ctiv a de Bu ltm ann
, a Bíb lia não é esse nci almente um a fo nte
info rma ção obj etiv a sob re De us e sob de
re a pessoa e a con diç ão hu ~~n as. Ela
Geschichte e n ão a Historie. Ela não é, prim no~ d ~ a
aria me nte , um rela to ob_1et1v o de oco rren
factua·1s, · d · c1as
e sim o imp act o que as d·v 1
ersa s oco rrên cias tive ram sob re os disc ípu
los. O seu
alvo - , . r orm . _
nao e nos in1 ar, m as nos t ra nsr11ormar·, não é acresce nta r mfo rma çoe s a nos so
rep ertó rio de d ado s ma s afe tar nossa
existên cia.
B u l tma nn util.. ' • d
iza o concei to e ex1s · t Anci a aut ênt ica e ina utê ntic a. E le me .
du dA . e A . nci ona
as ten enc 1as d ,, p um lad o há .
no "ho me m mo ern o • or um a ten den cia a ser gm ado na
vid ' ..
a por aut o-o rie ntação , p ara cum pri r os. d · s d e felicid ade e segura nça , util
ese_1o ida de e
. d h
proveito. I sso é egoísm o e presun ção.
O am or aos
out ros e o dese_10 e con ece r, d.1ze r
eh
onr ar a ver dad e são sub serv 1en . . lso do autoen gra n d ec1. men to. O s seres
tes ao imp u
1
iM . . . N Yo rk: H arper & Row, 1962 ' p. 85.. [E.dição em port ugu ês:
Ser e t anm H p
E I DEG GER , B emg and t one,
ew .
. k , . d Con dudi ng 11 nsc,e ntijic post scnp
,-.. S emp o, etró poü s: Voz es, 201 1. ]; e f d S0re n Kier ega,1r , t (trad . D .
t•. w ·• e
. ton U 01ve
enso n e W alte r L owrie, P rinc eton : p nnc . •ry
rs1 , 194 1
, p. 169 -75) .
e
872
.

- são somente desresPeitosos para com os inte ress es e necessid d


V •alvaçi,

humanos nao , - d bed ient es às ord ens e exig ênc ias de Deu a es d
outros como tambem sao eso s para s . os
, .
Ou eles negam a ex1s . A . de Deu s ou, se cree m mss
tenc1a o, neg am que ele tenhauad' Vida .·
le ítimo à obediência e à devoção deles. 12 ,, , ireno

g
Out ra tend enci
A . d "ho mem mod erno e a auto nom ia -
a o , . a cren ça de que al ,
Q"\.l , guern
pode ob ter se.0 !ança verdadeira por meio dos pro pno s esfo rços , do acu mul o de riquei
,:e - d tecnologia e da busc a pelo exerc1c1 , . d . fl A • •
as,
d a proweraçao
• • •

a . 0 a in uen cia, sep indiv idua l .


. , , seja
coletivamente. Isso, infelizmente, é uma espe ranç
a inat ingi vel, por cau sa de obstáculos
insuperáveis como a mor te e os desastres naturais
. A ação eg~ ísta ~ autô nom a contínua do
ser hum ano é uma rejeição ou negação de tudo
o que ele f01 proJ etad o para ser. 13 Oque
é, então, a existência autê ntic a ou a salvação? A
Pala vra de Deu s "ch ama o homem para
que se afaste desse egoísmo e da segu ranç a ilus
ória que edif icou par a si mesmo. Ela
chama a se voltar para Deu s, que está além do mun 0
do e além do pen sam ento científico.
Ao mesmo tempo, ela cha ma o hom em ao seu
verd ade iro eu" . 14
À med ida que a Palavra de Deu s alcança pes soa lme
nte o ser hum ano , ela o convida
a aba ndo nar sua tentativa de prod uzir segu ranç
a pelo s pró prio s esforços e a encontrar
verdadeira segurança na confiança em Deu s. Som
ente atra vés do exercício da fé, o ser
hum ano pod e pôr fim à sua existência inau tênt
ica: "Cr er na Pala vra de Deu s significa
aba ndo nar toda segurança mer ame nte hum ana
e, assi m, ven cer o desespero originado
da tentativa de enc ontr ar segurança, uma tent ativ
a sem pre vã".15
Fé significa abandonar a busca pelas realidades tang ívei
s e pelo s obje tos transitórios.
A procura dessas coisas é pecado, pois, por mei o
disso, exc luím os a real idad e invisível de
nossa vida e rejeitamos o futu ro que Deu s reserva
par a nós e que nos é oferecido como
presente . Cre r é abri r nosso coração à graç a de
Deu s, per mit ind o que ele nos liberte do
passado e nos leve a ingressar no futuro. Tam bém
env olve obe diên cia - "dar as costas
para o eu e aba ndo nar toda a segurança".
O prog ram a de dem itolo giza ção de Bul tma nn
é sem elha nte à concepção de que
a salvação con stitu i simples t • h ada
men e uma cam1n par a a exis tênc ia auteAntic · a, aban-
d~n~nd~ nossa busca ego ísta por segu ranç a e
con fian do em Deu s.16 As afirmações da
Bib~a nao devem ser inte rpre tada s com o dec lara
çõe s de um a verd ade objetiva externa
a nos mesmos. Ant es, elas nos dize m algo sob
.d , 1 re n , A
ente n d1 a a uz de Gál atas 2 20· "P os. cru z por exemp lo, deve ser
. . - ' ,
· · orta nto, nao sou mai s eu que
que m vive em mim . E essa vida que vivo ago ra m vive, mas e Cristo
no cor o vivo ela fé no Filh o de Deus,
que me amo u e se entr ego u por m. ,, A
p , p
• im · men sag em da cru z não é que Jesus fi01. morto
com o um tipo de pag ame nto sub stitu tivo feit o
ao P . -o
ai em um a tran saça celestial. Isso
llRud_olfBuLTMANN,jesus Cbrist and m tholo N
.
Jesus Cristo e mitologia, 3. ed. São p
1 .:YN ~ '- ew York: Scnbner, 1958, p. 39-4 0. [Ed1. - 1 orn1gtl';s:
13Jbidem, p. 45. ' au o. ovo Seculo, 2005.] çao en P
14
lbidem, p. 40.
15
lbidem.
" Ibidem, p. 9-16.
/"i
Â. ..
concepç ões de sa lvação

873
, rnito. O signific ado demitol ogizad0 d
e . a cruz
anseios por autogra tificaçã o e seguran ça , é que cad a pessoa precisa mortificar seus
. - d
surre1çao eve ser enten d.ida em associa -a parte de De us. 17 D a mesma fo rma, a res-
.d . çao com texto R
ta rnbém, consi era1-vos mortos para do s como omanos 6 11· "Assim
, 1o nao - esta, f::..aJ.ando o peca · · · ,
, mas vivos p
ara D eus, em C risto J esus".
1
Esse vers1cu de algu
t!Ãrpressa a verd a d e d e que, se deposit ar m evento ocorrid , 0
com
J
esus. E m vez disso, ele
. . mos nossa fe em D .
futuro, seremo s vivifica dos de uma m . eus e estivermos abertos para 0
_ , aneira que não ex .
ortanto, nao e uma mudanç a na essê . d al penmen tamos antes. A salvação,
P nc1a a ma co al
regeneração, nem é uma declaraç ão c d ' mo guns
JJ0 rense e que fom . t .fi tendem d .
a entende r a
q
ue é a compre ensão tradicio nal da . .fi _ os JUS I ca os diante de D eus,
JUStl caçao. Antes é u d fu
de nossa E x istenz, de toda nossa . ' ma mu ança ndamen tal
. . perspectiva e condução da vida. is
Embora a teologi a existencialista parti ui d B
. d . c ar e u1tmann tenha perdido sua popula-
nda e, assim como o program a de demitologizaç-
. . . ao no qual e1a se fu ndarnen ta element os
da. fi1oso fi a existenc ialista sobrevivem em suas
. . . . , mm·tas 1ormas,
r: '
na teologia posterio r e na
vida relig10sa popular , mclusiv e em igrejas evangélicas. A oposição ao " · a1· "
r: A · 1 alid d " rac1on ismo , a
pre1eren. _ cia pe a ment . a . e hebraica " à grega, ares·1stencia
A · a expli caçoes - ab rangentes e
a aplicaçao da teologi a aos interess es pessoais imediatos estão entre as várias evidências
de que essa filosofi a continu a presente .

Teologia secula r
Todo o ambien te cultura l em que a teologia se desenvolve está sofrendo modificações.
A atividad e de Deus era conside rada a explicação da existência do mundo e do que nele
acontece, e o divino era o solucion ador dos problemas que os seres humanos enfrentavam.
Hoje, no entanto , as pessoas deposit am, na prática, a sua confiança no visível, no aqui e
agora, e em explicaç ões que não presum em entidades transcen dentes ou suprasse nsíveis.
Essa perspec tiva diferen te surgiu por diversos meios. Um deles foi o aument o das
explicações científi cas. Enquan to antes parecia necessário crer que algum ser ou fo rça
sobrenatural h ouvesse trazido à existência esse grande e complexo Universo, agora há
explicações alterna tivas. E m tempos passados, a complexidade do organism o físico
humano parecia apo ntar p ara um grande, sábio e poderoso arquitet o. A teoria da evo-
lução, no entanto , atribui a cOinplexidade humana a variações aleatórias combin adas
com a lut • - 1 v·
a e a com petiçao pe a 1da, em que os mais aptos se ad,lptam
.
para sobreviver.
Out -
ra razao p ara a mu d ança de perspec tiva é que a humani dade desenvo , .
lveu a
capac·d d d l . d
1 a e e reso ver mmtos os pro blemas que enfrenta.. Em tempos b1bltcos, se
uma lh ,
, . l
mu er era estenl, e a orava a D eus, e ele respond ia abnndo -lhe o utero para que
uma · ) T b , n se acredita va em Deus como a fonte do
criança nascess e (lS m 1.1- 20 . am ei . . . - . ._
cli N , d s e meJO e a chuva posteno r foram atn
ma. a epoca de E lias uma seca e tres ano
A

bu 'd ' ) A .. orém se uma mulher estenl , •d ·


1 as a D eus (lRs 17-18 esep ter
; Tg 5.17,18 · gora, P '

17l bidem p. 35-8


1
18J •
bidem, p. 19-22.
A Salva,~ ,
o
r
874
ílula de fert ilid ade e, com o acréscimo d e espe
eceita uma P • (' . rll'la
.
r •fi .al oco rre o nas cim ento as vezes m 'ltiplo sl) ,
inec olog ista . u
filh os, o g . inação arti ci , com iod · . Se
iza as nuv ens
or meio de insemngo pen,o d o, algu ém pul ver d eto de
t alvez p 1o hove. A hum ani da A e pod e con trol ar t Prata
- há chuva por um anta 0
. mel han te, e c nas,
nao
alguma substância se . , _ é mai s nec essá rio. esp écie hum an a se tor
r a Deu s Jª naopro blem as sem a3u . nou
ou
· da sob re-h uma na.
cimento quanto o cdimlida r com seus
pes soa s mo der nas se tornaram secula
adulta. Ela é capaz e olvi. mentos, mui tas
d d senv res.
,
A luz esses e tenh am de form a con scie nte, adotado urna co
1
fu dam enta lme nte e as têm inte , -
n . . na- ress e em que stoe s especulativa s. Ant s-
Não é que 0
ali ta pois mw tas um mod o de vid a que , na prát ica, não tem lu es,
mov isão natu r s ' d gar par
. · ntem ente a otar am mo básico. Os esfo a
elas mconsc1ed ectiva secular resu lta de um pra gm atis . li . - . , rços
. h .
Deus. Parte essa persp m sup rir as nec essi dad es uma nas , a re giao Ja não é rna1s
• A •
, . _ 19
científicos tiveram eXItO e
,. fi v· os pois
'
em um a era pos -cn sta.
. -
necessana nem e caz. ivem ' essa s1tu ~çao . Um a delas é encarar
ra
Há duas respostas que a igreja pod e ofer ece
s, alte rnat ivas um do outro. Se essa
. .smo e O secularismo com o con corr ente
. iam
o cnst
ia .ªº. lon ~o dos séculos 18 e 19 e até
abordagem for ado tada , con form e a tend ênc
resistir, evit ar ou refu tar o secularismo.
mesmo em nossos dias, haverá tent ativ as de
o do secu lari smo , bem com o da filosofia
Haverá esforços para mos trar a inad equ açã
ênfa ses na bon dad e, valor e suficiência
e do humanismo relacionados a ele, com suas
. Ela pro cur a mos trar que a hum anidade
humanos. Esta é a abo rdag em da apologética
ão secu lar não con seg ue lidar. Apenas 0
enfrenta problemas com os quais a cosmovis
teísmo cristão pod e resolvê-los.
e tem sido cada vez m ais adotada por
No século 20, poré m, uma resp osta dife rent
não um con cor ren te, mas uma expressão
teólogos cristãos: considerar o secularismo
a abo rda gem foi Die trich Bon hoeffer.N os
madura da fé cristã. Um dos precursores dess
ição à qua l se refe ria com o "cristianismo
anos finais de sua vida , ele desenvolveu uma pos
nça r a mai oridade não é rebelião contra
sem religião". O fato de a espécie hum ana alca
20

ena mai s elev ada a se torn ar independente


Deu s, e sim D eus edu can do sua cria tura terr
os a se torn ar ind epe nde ntes, da mesma
dele. Assim com o pais sábios ajud am os filh
a leva r a hum anid ade à autossuficiência.
forma, na seculariz ação, Deu s se emp enh a par
na perspec tiva d e B onh oef fer, uma tenta-
O s esforços para refutar o secularismo são,
de faze r adu ltos reto rnar em à ado lesc ênc ia, forç and o- os a se torn ar dependentes,
tiva
21
explorando suas fraquezas.
ente do m u ndo secular. Antes, ele esrú
Bon hoeffer não pen sava em D eus com o aus
"relig·10so" , e, ser s1m . 1es mente humano.
pres ente na "irreligião". Ser cris tão não é ser p
A ade são "crisr~os
que ch ega ram à mai orid
queles mem bros seculares da espécie hum ana

20· L·1ngdon
~ ul lhe sew lar meanin oí th e 1- ' · 3_z9,
e ospel, New York: Macmill an, 1963, P·
V AN BuR EN,
ILKE Nam ing the whir lwind- the
r 'g 'J
:wal of God-.language, Indiana polis: Bobbs-M
errilJ, 1969, !1s-80,
20D i rich BoNH OEFF ER, l et;ers an:n illan , 1972, P·
2'Jbi m, p. 326- 7. p -persfrom pmo n, ed. ampl., New York: M acm
concepções de salvação
875
• " 22 p ·
. onscientes . recisamos celebrar a ema . _
1nc nc1paçao do se h 1 -
corno u
m presente gracioso deste D r umano em re açao a D eus
· evemos traduz· · • .
e as pessoas seculares contemporâneas ent d trPo cnstiarusmo
. para uma linguagem
qu . . _ en am. recisamos ajudá-las a perceber que
1ião necessitam se tornar cnstas; elas já são crist- O _. . .
d as. segmento evangeüco trad1c1onal
meteu o erro e tentar tornar as pessoas 1·1 •
co re g10sas em vez de cristãs (i.e., autossufi-
·entes e plenamente humanas). Bonhoeffi .
c1 , . er era particularmente contrário ao aspecto
interior e p~ssoal da fe cnstã tradicional, o estágio final da religião.23
Os escntos de Bonhoeffer sobre esse tema sa-0 fi , · S l - h
ragmentanos. e e e nao ouvesse
sido executado, certamente teria desenvolvido melhor ess - Tal tare f: e · d ·
a concepçao. a 101 e1-
xa da P ara outros que retomaram suas 1·de·
' 1 b ·
ias e e a oraram uma teologia com base nelas.
24
John A.T. Robinson, na Grã-Bretanha, e os teólogos da morte de Deus, nos Estados
Unidos, tornaram-se os proponentes principais da teologia secular. Entre os integrantes
do segundo grupo, Thomas J. J. Altizer argumentou que o secularismo tem uma base
ontológica. O Deus primordial ou transcendente se tornou plenamente imanente no
mundo. Foi um processo longo que culminou na encarnação de Jesus. Deus não tem,
agora, uma condição independente, fora do mundo e da espécie humana. 25 Consequen-
temente, ele não será encontrado na adoração pública ou nas devoções pessoais. É mais
provável que ele seja encontrado mediante o envolvimento no movimento dos direitos
civis e em causas semelhantes. 26
Resumindo, a teologia secular rejeita a compreensão tradicional de que a salvação
consiste em afastamento do mundo e em recebimento da graça sobrenatural de Deus.
Antes, a salvação vem de forma muito mais difusa. Ela não ocorre por meio da religião,
mas é a salvação da religião. Perceber a própria capacidade e utilizá-la, tornar-se inde-
pendente de Deus, chegar à maioridade, afirmar-se e envolver-se no mundo - este é o
verdadeiro significado da salvação. A maioria das pessoas, mesmo as que estão fora da
igreja, já experimenta essa salvação. Na verdade, em vista da presente orientação "reli-
giosa" da igreja, os que estão fora talvez sejam mais genuinamente cristãos do que os q~e
estão dentro dela. Novamente, ainda que a declaração direta das ideias de Bonhoeffer
raramente seja ouvida, a fusão dos ideais cristãos com os que realmente pressupõen1
a prioridade do aqui e agora representa uma adoção popular de concepções seculares,
mesmo quando vestida de uma roupagem religiosa.

Teologia católico-romana contemporânea


1 1c1·1 d escrever o pensamento ca. to' lico-romano contemporâneo
E, d.ti, . . sobre qualquer
..
assunto, porque, apesar de p. , ter h av1.do uma posição uniforme e oficial do catolicismo

22
Ibidem , p. 280-2, 373.
23
lbidem p 344-5
24T ' • • Ph"I· dei hia: Westminster, 1963 .
JOhn A. T. ROBINSON, H onest to Cod, l '1 P . PI .1. d lphia: Westminster, 1966, p. 40-54.
2s11, Ch . . thl'tsm 11 a e '
ornas J.J. ALTI Z ER, 'lhe Cospe/ of mltan ª. d, .. 11 ornas J.J. ALTI ZE R e William HAMILTON,
2óWiJJ· f G Od h log1es to ay, ,n. 1 .
1am HAMILTON, The death o t eo 1\ , ili 1966 p. 48.
R.ª dtca/
'
theology and the death of Cod, Indianapo is:
1· Bobbs-iv1err , ,
876 A sai
. . d
. .
stões agora parece ex1st1r somente urn '
"ªçº!'
b maiona as que ' a gra d
romano so re a . , .os oficiais ainda existem, mas atualmente são su 1n e dive
'd d Padrões doutnnan d 1 p efll r,
si a e. nte contestados por ec arações posterio entad
al ns casos, aparenteme ,. . res. En !is
e, em gu _ nclusões do Concílio Vaticano II e as opin• ~ . treest
úl . d clarações estao as co toes tnd· as
amas e ,: bl' adas É necessário considerar algumas des IVidua·
de estudiosos catolicos pu ic . . . . . sas declar i1
do da posição tradic10nal da igreJa. açôes
à luz do pano d e fu n . . d
. _ ' li ficial tem sido, por mmto tempo, a e que a igr . ,
A posiçao cato ca o . . d' eJa e o ú .
. d D Essa graça é transmitida me iante os sacramentos d . n1c0
meio da graça e eus. . _ d b~ a igreja
_ .e d . •ia oficial e orgamzada nao po em rece e-la. Fundarnenta} -01
que estao 1ora a igreJ . . _ ta111b.
- tradicional é a distmçao clara entre natureza e graça A em
para essa concepçao . . · natureza d
humanidade consiste em duas partes: a capacidade pass1~a para receber a graça e o dese•:
. la graça Os seres humanos, no entanto, sao completamente in J
ou anse10 pe · , . . capazes de
satisfazer esses aspectos de sua natureza pelas propnas realizações. Isso requer a
· 'd d' · d'd ' h · graça
de Deus, que é compreendida como Vl a ivma conce i a a umamdade por Deusi;
Essa posição tradicional foi modificada em diversos pontos. Um deles diz .·
respeito
à natureza humana. Aqui , Karl Rahner faz um trabalho extraordinário. Ao descre~ a
humanidade como separada da igreja e de seus sacramentos, Rahner fala da condição
"existencial sobrenatural". Com isso, ele se refere não somente ao que os seres humanos
têm em si, como o potencial para conhecer a Deus, como também ao fato de que esse
potencial já está sendo exercido ativamente. Não existe algo como estar totalmenteà
parte da graça. A graça está presente até mesmo na própria natureza. 28
Em sua discussão das religiões não cristãs, o Concílio Vaticano II parece haver
reconhecido a possibilidade de que a graça esteja presente na natureza. Ele ressaltou a
origem e o destino comuns de todos os seres humanos. As diversas religiões representam
várias perspectivas do mesmo mistério de vida. A graça de Deus pode ser encontrada
em todas elas, embora em medidas distintas. 29 Consequentemente, os católicos são
instruídos a "reconhecer, preservar e promover os bens espirituais e morais" encontrados
entre os adeptos de outras religiões. 30
Será que a presença da graça na natureza significa que existe graça à parte ou fora
da igreja? Este é o dilema que a igreja enfrenta. Será que a ordem de Deus obrigand0
todos os seres humanos a conhecê-lo não implica que há alguma maneira pela qual eles
possam fazer isso? A resposta geral do catolicismo contemporâneo tem sido tantoª de
afirmar que todas as pessoas podem realmente conhecer a Deus quanto a de continuara

27
Joseph Po 7h H dt'r J9~;.
v. 1, p. 66-75. HL E, e sacraments: a dogmatic treatise, ed . Arthur Preuss, St. Louis: B. er. '
2sK n . S.. burr.
ar1 IVI.HN E R, Ecclesiolouy th / · I • . . N York: l •1 ·
1976, p. 282. o. ' eo ogzca m vesttgattons, v. 9, trad. D avid Bourke, ew .
29D . .. r-Jc11'
ogmat1c constitution 00 th h h . W ,/' Vatican 11•
Yíor. . H
k ererd & H d e e urc , m: alter M . ABBOTT org. The documents °.J
30
ererl966p35
' ' . . ' ' 66'J,
Declaration of the relationshi of th h . . 0 p. ci t., P·
P e e urch to non-Christian religio ns, in: AaaoT1 , oig.,
ões de salvação
coneepç
877

. ·stir na exclusividade do papel da igre·Jª na sa1vação E .


1nst . .
•s arnplo da 1greJa e de sua membresi· a. · ssa resposta eXIge um conceito
111at
A posição católica tradicional é a d ._
. . e que a uniao com 1. . , ,.
vação porque a 1greJa possui os meios a greJa e necessana para a
sal ' para a salvaç S •-
us aceitará, em lugar disso O deseJ·o . ªº· e a uniao real não é possível,
De ' sincero por el E b .
•greJ·a não seja indispensável a separ - completa n-
açao
ª· m ora a união de fato com
, ·, I
a1 '
dade argumenta a favor de grau d . ao e aceitave . Yves Congar, na
ver , s e membres1a na i · 31 M .
te da espécie humana não tenh li _ greJa. esmo que a ma.ior
par ª gaçao visível e oficial com a igreia ainda assim
existe algo como uma membresia invisível O d . J '
, . . I . · n e quer que exista salvação aí também
estara a 1greJ a. sso inverte a fórmula tradicio al d '
.
re ai1za as
alvaça~o
.
°
n ' segun a qual a presença da igreja

adotou uma posição semeIhante a, de Congar: o povo de


O Concílio
_ , . Vaticano
. , .II . . ,
Deus nao esta o dD , d' 'd'
. limitado a 1greJa v1s1vel e hierárquica• povo e eus esta 1vi ido em
três categorias, conforme seu grau de envolvimento com a igrep: · ·

1. Católicos que estão "incorporados" à igreja.


2. ~ristãos não católicos, que :s.tão "ligados" à igreja. Embora sua situação não seja
tao segura quanto a dos catohcos romanos, eles têm igrejas genuínas e não estão
completamente separados de Deus.
3. Não cristãos, que estão "associados" à igreja. 32

O terceiro grupo inclui os que Rahner denomina "cristãos anônimos".33 O fato de


haver pessoas que estão fora da Igreja Católica visível (ou de qualquer igreja cristã, no
que diz respeito ao assunto) não significa que todas elas estejam separadas da graça de
Deus. Cristo também morreu por elas, e não devemos negar essa graça. Os conceitos
de graus de membresia e de cristãos anônimos permitiram à igreja tanto conceder a
possibilidade da graça à parte dos sacramentos quanto manter sua autoridade.
Há também discussões na igreja sobre a natureza da salvação. Passou-se a ter maior
abertura ao conceito protestante clássico da justificação. Nesse sentido, a obra de Hans
Küng sobre a teologia de Karl Barth tem sido particularmente significativa. No passado,
0 catolicismo combinou que os protestantes denominam justificação e santificação em
O
um só conceito: graça santificadora . Küng, no entanto, fala sobre os aspectos objetivo
e subjetivo da justificação. O primeiro corresponde ao que os prote~tante~ geralment:
c~amam de justificação. Nesse aspecto da salvação, o ser humano e passivo e Deus e
ativo. O segu ndo aspecto corresponde aproX1·madam,ente. ao que.. os protestantes geral-
14
mente chamam de sant1.ficaçao;_ aqm• 0 ser humano e ativo: Kung observa que Barth

Yves C
31 . . . d its problems Baltimore: Helicon, 1961, p.101 -4.
ONGAR, The wide world my pansh: sa1vat1on an '
32 16
pKogmatic constitution on the church, P· 30-5, seções l~- · 6 p 394.
. . Baltimore: Hel1con, 1969 ' v. ' .
3
ar! RAH Th .
. d C tholic reflection New York: Thomas
34u NER, eologzcal lnvesttgatwns, '
1,ans K·· • f K 1 Barth an a a
Nels UNc, Justification: the doctnne o ar
on, ! 964,p. 222-35,264-74.
878 Asalvaç·
ªº
enfatizou O primeiro, enquanto o Concílio de Trento destacou o segundo. Não ob
não há real conflito entre Barth e Trento. 35 Além do conceito protestante da justifista~te,
a Igreia Católica tem se tornado mais tolerante também com a interpretação d caça.o, a graç
'J
feita por Lutero. , . ª
Resumindo, a Igreja Católica, em anos recentes, esta mais aberta à possibUi
. , 1 al al - al dade
de que pessoas fora d a igreja v1s1ve , e t vez gumas que nao eguem ser c . _
- 'li da salvação nstas
seiam receptoras da graça. Como resu1tado, a compreen sao_ cato ca. .
, ,
esta se
'.} . .
tornando consideravelmente mais ampla do que a concepçao trad1c1onal. Além d'lqo
.
compreensão atual inclui dimensões geralment e associadas ao protestantismo. ,a

Teologia evangélica
A posição ortodoxa tradicional ou evangélica sobre a salvação está associada intima-
mente à compreensão ortodoxa da condição humana. Nela, o relacionamento entre 0
ser humano e Deus é o mais important e. Qyando essa relação não está em ordem, as
36
outras dimensões da vida também são afetadas de maneira adversa.
Os evangélicos entendem que as Escrituras indicam a existência de dois aspectos
principais relacionados ao problema humano do pecado. Primeiro, o pecado é um
relacionam ento rompido com Deus. O ser humano deixou de cumprir as expectativas
de Deus, seja por transgredi r os limites estabelecidos pela Lei dele, seja por deixar de
fazer o que é ordenado de modo positivo nela. O desvio da Lei resulta em um estado
de culpa ou sujeição ao castigo. Segundo, a própria natureza das pessoas está corrom-
pida, como resultado do desvio da Lei. Agora, há uma inclinação para o mal, uma
propensão ao pecado. Há uma tendência, por assim dizer, para longe do bem, de modo
que a pessoa se inclina naturalme nte a praticar o mal. Geralmen te denominada de
corrupção, tal inclinação frequente mente se expressa também em confusão e conflitos
interiores. Além disso, visto que vivemos no contexto de uma rede de relacionamen-
tos interpessoais, a ruptura de nosso relacionam ento com Deus também resulta em
desordem no nosso relacionam ento com outras pessoas. O pecado chega até a assumir
dimensõe s coletivas: a estrutura da sociedade em geral inflige privações e injustiças a
indivíduos e grupos minoritári os.
Certos aspectos da doutrina da salvação estão relacionad os à questão da posição
da pessoa diante de Deus. A condição legal do indivíduo precisa ser mudada: de cul-
pado para não culpado. É uma questão de ser declarado justo ou reto perante Deus,
de ser visto como satisfazen do plenamen te as exigências divinas. O termo teoló~ico
st
aqui é "justificação". A pessoa é justificada ao ser levada a uma união legal com Cn º·
d
Entretant o, é necessário algo que vá além da mera remissão da culpa, pois se pef eu

35
Jbidem, p. 275-84. J
- h lí tica ela Pº e
yr i1 Okorocha mostrou, no entanto, que pelo fa to de a salvação ser uma questao . of 'salvano
36C O 5 . n·
.d . - . . . , . .
estar associa a a questao p nnc1pal de muitos africanos: a questão do poder. V. Toe meaning Grand
an African perspective (in: W illiam A. DYRN ESS, org., Emerging voices in global Christian tbeology,
Rapids: Zondervan, 1994, p. 59-92).
concepções de salvação

· · 'dade a1etuosa
uela mtimi e
que d . 879
a q E evena car .
corn Deus. sse problema é resolvido pela dactenzar o relacionamento do . d' 'd
- f: , 1 a oção
, na qual a pessoa ,
m 1v1 uo
d
osiçao avorave perante Deus e cap . d
P . acita a a reivi . e restaura a a uma
nd1car todos os bene11c1os
pelo Pai amoroso. C! • •
providos
Além da necessidade de a pess
oa restabelecer s l .
também a de mud ar a condição de seu cor - eu re acionamento com Deus há
'd d a1 , d . 1· - açao. A transfo
d
- b, . . ,
rmaçao as1ca na onentação
da v1 a e guem, a me maçao para O
. d " peca o ao deseJ·o · · d .
te é denomina a regeneração" ou lit al positivo e viver corretamen-
, , er mente novo .
uma verdadeira transformação do cara't d ' . nascimento. Está incluída nela
er a pessoa a fu - d
ositiva. Ela, contudo, é somente O • , • d . ' 10 sao e uma energia espiritual
P m1c10 a vida espiritual A d' - ..
·
·indi'víduo é transformada progre ss1vamente· · con 1çao espmtual do
ap d f:
. b' . , ' essoa e ato se torna mais santa. Essa
mudança progressiva su ~etiva e denominada "sanf fi - ,, (" ,, .
_ a1 , i caçao tornar santo ). A sant1-
ficaçao fin mente e .completada na vida após a morte, quando a natureza espmtual ..
,
da pessoa sera . Isso, se chama "gloriºficaça-o" . E a d'1spos1çao
, aperfeiçoada. · - da pessoa de
manter a fe e o compromisso ate o final por me1·0 da graça de Deus e, a "perseverança".
Assim como fizemos em relação a outras questões, adotaremos a posição evangélica
sobre a salvação. Embora Deus esteja interessado e preocupado com todas as necessi-
dades humanas, tanto individuais quanto coletivas,Jesus deixou claro que o bem-estar
espiritual eterno do indivíduo é infinitamente mais importante do que o suprimento
das necessidades temporárias. Observe-se, por exemplo, seu conselho em Mateus
5.29,30: "Se o teu olho direito te faz tropeçar, arranca-o e joga-o fora; pois é melhor
para ti perder um dos teus membros do que ter todo o c~r~o lançado no i~ferno. Se a
tua mão direita te faz tropeçar, corta-a e joga-a fora; po1s,,e melhor para t1 pe_r~er um
· todo O corpo para o inferno . Sua pergunta retonca em
dos teus memb ros d o que ir
t . "Pois que adianta ao homem ganhar o mundo
Marcos 8.36 realça o mesmo aspec º· . . al
. . . ►" A reocu ação divina com o bem-estar espmtu eterno
inteiro e perder a sua vida. · P P _ 'd ' · onvincentes a favor da
b 'bl' do pecado sao evi encias c
do ser humano e o retrato i ico . , 1 26 que O pecado se origina no
- Vimos no capitu o ,
concepção evangélica da salvaçao. ' ,. posta à tentação. E observamos,
. lh al voluntaria em res
indivíduo por meio de esco a pesso d d do humano. Esta "depravação
. al rofun a o peca 1
no capítulo 28, a natureza rad1C e P fi rmação radical e sobrenatura
,, . . •fi que uma transo - , . .-
total , como é denominada, sigm ca erdão e a restauraçao a poSiçao
,. ra que ocorram O P
da natureza humana é necessana Pª
favorável diante de Deus.

Você também pode gostar