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Tyidle- he an LIGIA OSORIO SILVA TERRAS DEVOLUTAS E LATIFUNDIO EFEITOS DA LEI DE 1850 24 BDIGAO Unwvansioane Esrapuat bx CaMinas Reivor Jost Taneu Joes (Coordenador Geral ds Univecsidade Fanwanpo Fenetina Cosra, (Conslho Edrorial Presidente Duo Feancheers AvcIRPécoRA~ ARLEY Rasos MORENO Epvanno Ditcano Assan Jost A.R. Gosryo Jost Rosento Zax ~ MaRceLo Known Sept Hiraxo ~ Yano BRIAN Jowion vit A estratégia Saquarema visio Saquarema consistia, do ponto de vista da substituisio “do wabalho escravo, num gradualismo que levaria 4 natucal extin- Gio do escravismo pelos efeitos da Lei Eusébio.! Na pritiea essa goncepso se expressou na estratégia da emancipagao gradual, Sama forma de ajustar a manurengio da esctavidéo aos anseios “emancipacionistas de parcelas cada ver maiores da sociedade. Sérgio Buarque de Holand registra de modo bastante apro- ptiado as razées da forma timida como o Estado imperial tratou a questio do escravismo: Se no Brasil o caminbo que levaria & supressio do trabalho escravo foi um caminho tortwoso, que levou freqiientemente a medidas di- latérias, nao se deve isso 2 imposicao de fazendeitos, mas ao vemor constante, nos meios dirigentes do pafs, de que uma solucéo muito radical do problema tivesse conseqiiéncias catastedficas.® A idéia de que a escravidao deveria ser man 20 programa de introducio de imigrances pelo governo era muito a paralelamente 11 “Bxttato de um parecer da Sesto dos Negécios do lmpésio do Conselho de Bstado", Riode Jancito, Ian, 4 fev, 1853, laa 824, doc. 18, manuscio 2 Sérgio Buarque de Holanda, De Inpévis @ Republica, vol. $ dot. 11 (© Brasil monér- {quico) da Hece, organizada pelo autos, p. 284 140 | Terras devolutas¢latifindio Comum Bos anos 1850. O governo imperial considerava neces ia 2 manutengao da escravidéo ainda por um periodo razogyel, como defendia um parecer da Sesio dos Negécios do Impéria og Conselho de Bstado: "A escravidao é urna instiuicao que recebe. ‘mos de nossos pais, que tem seu fundamento nas leis, esti con, saerada pela diueurnidade dos tempos, € que tom sido maoiid, favs, diga-se assim, que é« pura verdade com a sangio da rly gido santa que professamos”? © exemplo dos Estados Unidos era constantemente citado para embrar os benefcios da escravidio associada& colonizagso, Fssas idéias 96 sofreram um abalo sensivel apés a guetta ci] americana (1861-1865). Em relagio & imigracao, a visdo Saquarema retomava as ids de povoamento do amplo territério nacional existentes desde os tempos de dom Joio Vi, mas agora dando énfase na necessidade do branqueamento da populagio por meio da introdugso de im Brantes europeus (inicialmente se pensava sobretudo em alemies ¢suigos) e na difuséo da pequena propriedade por intermédio de venda de lotes de terras recortados nas terras devolutas da Coroa, Mas era também sensivel aos reclamos da grande lavoura de en. pottacéo para a introdugao de teabalhadores pata as fazendas, Pensourse, os anos 1850, que imigrantes chineses podeviam per. feitamence servir a esse fim, com a tessalva de que viessem apenas Para trabalhar e no para se instar, porque sua miseigenagio com 0s nacionais nao era vista com bons olhos 4 9 Exereo de um parscer de Sesfo dos Negécios do pia.” 4 Sobre a inrodusio de chinese, LR Lacerda Wernec afirmava: “O China nfo & h- ee uns Pécle de monsre, quer no corpo, quero espe, lama € p,¢ Bgde Conforns sua obra Ia sobre a coloniard, ed Rode anc: acme in63.B 15. Bsalio Cabal de Melo tambén explica a ids do govern imperial ¢ Propésite daimigrast asic o chins, “uabalhador asaltade, proporconea fas, Fa trabalho grande vous clei, sem destin ea enzattnte dame bn, a sctesandy 4 China 20 fim do conto coletvo que o tata 20 Bra) Nore egrin eo bpris Rio de ance: Nowa Fontciee Disa Feleal INL, yh, A estratépia Saguaroma Jaa Nos mesmos anos 1850, dava-se ao primeiro tipo de imigra- a denominasio de “espontinea’, porque dria respeitoique- jmigrantes que vinham para 0 pais por conta prépria, porque jabam recursos para fazé-lo e teriam cambém recursos para com- suas passagens, Ambos os tipos de migrates eram chama- de colonos. Nos anos 1880 foi também comum designar ° srimeito tipo de imigracéo como “colonizagio oficial” ¢, ao se- do, como “colonizagio particular”, a nacionais ou estrangeiros que, quisessem compris. O dinhei- “yp arrecadado seria utilizado no financiamento da imigracio 7 = gular. B por isso que quando o Senado retomou a discussio ® { projeto de sesmarias ¢ colonizagio, em agosto de 1848, Bernardo «Pereira de Vasconcellos, abalizado representante dos Saquarcmas, é ir ublic lo particular, _afirmou: “o que urge é extremar o dominio pablico do part © sivel a venda, e todo o projeto rcuiria por terra. A Lei de Terras estava, portanto, destinada a desempenhar um “papel de fundamental importancia na colocacio em pritica da concepgao Saquarema, que era a concepedo, dominante no go- verno imperial, do processo ¢ transi¢éo do trabalho escravo para : ho livre. ae dessa estratégia ¢ as adaptagoes que foram sendo feitas durante o desenrolar do século XIX deveram-se, em grande 72. Ver também Handelmann, Misia do Brasil, 40d, Sto Paulo: Isis, Eovse, 1982, vol 25 p26 5 Aris do Senado do Inpro do Brasil, 21 ago, 1948, p- 496. aga] Terras devolutas¢latiindio medida, as condigées especificas nacionais ¢ internacionais gy stragto de trabalhadores estrangeiros, Uma vee que se optou pe solugdo de continuar buscando fora do pais « mao-de-ob, te cessitia§continuidade da proceso de desenvolvimento, en, pie. ciso adaprar-se de algum modo as injungées que em niv nacional orientavam 0 fluso de emigrantes.® Nessa matétia, o Brasil de meados do século XIX nao se apres Sentava em boas condigbes de competigéo. Até 1850, a imigiaray de colonos brancos livres, fosse para os micleos onde eles se oe favam pequenos proprietévios, fosse para trabalhar nas fizenday como Parceiristas ou ndo, era muito pouco expressiva, A vigéncig do trabalho escravo impedia que se levasse muito a sévio o Proje to de povoamento e da transformagio das caracteristicas da cul. tara do solo, O niimero de escravas negros entrados no pals su. Perava em muito o de trabalhadores livres. O conceto de que gorava o trabalhador negro escravizado era, por razbes Sbviag, ‘muito superior 20 conceito que se fazia do trabalhador livre, na. clonal ou estrangeito, Por sua vex.0 conceito de que 0 Brasil go- zava na Europa ngo o tornava um plo de atracio para emigran- tes, que além de pouco informados sobre as carateristicas do pals (muitos franceses acreditavam que o imperador do Brasil era ne- 870) temiam, com muita razdo,transladar-se para um pais em que predominava o trabalho escravo.? AS experiénelas na introdusio de trabalhadores estrangeiros foram, portanto, limitedas. A parceria, a formula implementada € Geko Fureado analzou a outzas posbiliades de solusio para o problema da mio- <-abea, em paricular a questo da ofera interna potencies concla queeatennen (Gas tod canaferéncia de méio-de-obea intern se deviam, em larga medida, so its {REEE polos soci em jogs, Formapioeonimice do Bul, Ged, Rio de Janos Fundo de Cuba, 1964, cap, XX, especialmente pray, 7 2.xo€mencionado por ¥.1. Bail, “Comte de a Hate a L' Empire él Pc Fentinand Saroias, 862, p. 292, a propésio da vista de um navio baileno« Cher bow. Mattos vsanes se cspansiram ao pereber pel cad mpern oe le ‘ra branco, “esque is Vavaent presque onfondu avec Selougus" el inter. A estranégia Sagearema has quais os trabalhadores estrangciros foram introduzidos nao de molde a methorar a imagem do Brasil no exterior. Fsca- . 4s iva dos diveitos e deveres a nog tigorosamente precisa e objet be imp uo wegime de trabalho livre [...] A incompreensio de tais = culminincia na sublevagio dos colonos de Ibicaba, a colénia mode- fo, em feversico de 1857 ento do terririo por meio da distibuigéo de pequenos lores jtamente) a colonos estrangeiros. Sao bem conhecidos os 10s da vinda de agorianos, sufcos e alemées, principalmence nas ‘eol6nias de Santo Agostinho, Leopoldina e Nova Friburgo, loca- * lzadas no Espirito Santo, Bahia e Rio de Janeiro, respectivamen- “nis, Fundaram-se em 1829 coldnias em Santo Amaro ¢Kape- eerie (S40 Paulo), Rio Negro (Parana), So Pedro de Alcintara ~ ¢ Itajai (Santa Catarina), Em 1824-1825, formaram-se as col- ~nias de Sio Leopoldo, Tiés Forquilhas e Torres, em Sao Pedro do 8 Stxio Buarque de Holanda, “Peeficio" in Thomas Davatz, Menérias de um colano ne ‘Brasil (850), Sto Paulo; leaiaia, EDU, 1980, p. 57. aaa | Terras devolutas¢ latifindo imperial, pois ndo prosperaram como o esperado. A lei orcamen- tiria de 1830, que proibia despesas com a colonizagéo, teve nary, ralmente por efeito estancar esse processo. Com isso findou g primeiro periodo de colonizacéo.? Em 1834, 0 ato adicional deixou a cargo dos governos provin. ciais promover e estimular, em colaboracio com 0 poder central, © estabelecimento de colbnias de lingua estrangeira, Santa Cary. tina foi a primeira provincia que se utilizou desse dou em 1835 a colénia de Irajai-Mirim, Outras provincias fize- ram a mesma coisa. Inicialmente os governos provinciais tiveram toda a iniciativa: traziam os colonos e davam 0 solo gratuitamente pata o estabclecimento das colénias agricolas. Em seguida, porém, empreendedores particulates, nacionais e estrangeiros, isoladog ou em sociedade, comegaram a fundar coldnias e pata isso pediam ¢ obtinham 0 auxilio do governo. Iniciou-se, assim, 0 “negécio" da colonizagio. Em 1848, alei n* 574, de 28 de outubro, concedeu as provin- cias, num mesmo ou em diferentes lugares de seu territétio, 6 éguas em quadro de terras devolutas com destino & colonizacio, nao podendo estas ser trabalhadas pelo brago escravo."° Ao ser publicada a lei de 1850, nenhuma provincia tinha demarcado as suas 6 léguas. Aandlise da experitncia acumulada nesses anos de colonizagio leva a crer que muito era prometido aos colonos e pouco era cum: prido. Os nticleos eram geralmente siuados em locais distances, sem meios de comunicacéo adequados ¢ sem 0 apoio admi. nistrativo necessario, As companhias de colonizacao, na gandncia de garantir seus Iucros, ndo tinham muitos escrdpulos no cum- primento dos contratos € a fiscalizagao do governo era, no mini: 9 Handelman, Matéria do Brasil th ps 344 10 Joio Barbalho Uchoa Cavalcanti, Consiuizdo feral brasileira. Comenstios Rio de Tancico: Sapopemba, 1993, p. 269, A cstratigia Saqueroma [nas josa catélica, muitos jmento, no Império, uma instituicao rei jgrantes se viam na necessidade de abjurar sua fé para poderem jaar seus casamentos. Referindo-se a essa experiéncia acumu- | ¢ sem muicas esperangas de ser modificada, afirmou um ionario do Servico de Terras do Rio Grande do Sul em -Bles (os imigrantes) lutam com a nossa ignordincia, com os nossos © excravos, com 0 noss0s costumes, com as nossas moléstias, com 25 nossas necessidades, com as nossas instituigées. Para coroar todos ‘esses males falta-Ihes a ptimeira das liberdades, a liberdade religiosa, * ea primeira das protegdes, a protecao ao trabalho." Tendo em vista essa situagaio, nao € espantoso que cm 1855 ii apenas cerca de 80 coldnias de imigrances ricultorcs, cuja populagio total era de aproximadamente 40 mil s0as; mais ou menos o mesmo nimero de pessoas que costu- sva emigrar para os Estados Unidos num trimestre,"? ~ Quando o fim do cdfico relangou a questio di imigrasao, ensou-se em reativar a colonizago para a pequena proptiedade m os outros paises para onde afluiam os emigrantes esponté- fneos, Assim resumia esta opinido um relatério oficial: ‘A medigao e demarcagéo de pequenos loves de tertas ao alcance de medioctes fortunas, situados em pontos convenientes, € expostos & venda, de mancira que o imigrance possa contar obté-los logo apés a sua chegada, ou logo que Jhe permicam seus recursos, se no so 246 | Terres devolutas ¢ leifindio or si sds a condicéo exclusiva da imigracéo (espontinea) si iivida, a mais poderosa alavance para fomenté-la."? 0 sem Para que isso viesse a ocorter era preciso uma legislagéo de terras que estabelecesse a confianga dos estrangeitos nos teuoy de propriedade concedides no Brasil.“ Fra vor corrente naquele fempos que 0 sucesso da colonizagio americana se devia a sey bem organizado sistema de parcelamento e venda de teras pi, blicas. Enquanto isso, no Brasil o sistema da propriedade tettito. rial estava em completa balbiicdia e quase que em parte alguina se podia dizer com certa seguranga se o solo era particular oy piblico. O episédio da colénia alema de Séo Pedro de Alcantara era de péssimo augirio: 0 imperador dom Pedro I doou aos co- lonos terras incultas, ¢ estes tiveram depois de compré-las de particulates, possuidores “legais”, para se pouparem das despesas de um interminavel proceso." E preciso, entretanto, atentar Para, © faro de que esse tipo de sitwacio ocortia porque o governo im- perial nao tinha forcas para enfrentar o poder do senhoriato rural, As coldnias, uma ver instaladas, eram abandonadas & sua sorte, ¢ 08 colonos viam-se ameacados de perder suas terras, A regulari- zagéo da propriedade da terra poderia ter comegado a partir dos niicleos, se o governo imperial garantisse aos colonos o titulo de propriedade ¢ a posse da terra. Isso provavelmente teria estimu: Jado o senhoriato rural a legalizar também a sua situacio. Mas a estratégia Saquarema consistia exatamente no contrario disso, como veremos, Partiu-se do principio de que a regularizagao da situagio do senhoriato rural era a condigdo fundamental para a implementasao da politica de imigracao espontinea. 85 "Relatrio de 11 de maio de 185%, apud Handelmann, Minirie do Bras, ¢ p. 348-9, sem referencia ao axganismo de onde provi +4 Cf, Enulia Viowi da Coste, Da senzala& clini, Sto Paulo: Dive, 1966, p.72, 15 Hiandelmann, Hisdris do Boal, p. 349, A ceeratégia Saguarome [aay claro que nao era apenas d imigragao que a desordem juti- causava problemas, aos proprietarios particulares nacionais mifias ¢ dos crimes no campo. Nesse sentido, compreendemos © discurso de Bernardo Pereira de Vasconcellos, no Senado, em oe 48, quando ele afirmou que a “lei atendia aos interesses de toda jeuleura do Rio de Janeiro naguele momento, Para esse setor ‘principal problema consistia em arranjar fundos para financiar -imigragio, Em 1850, 0 café estava apenas dando seus passos proclamada como tal, porque nunca se afirmou com todas as letras que se desejava continuar tendo acesso as terras devolutas. © E por isso que a bibliografa sobre o petiodo imperial, «meno republican, aramente se refere hexistencia ce uma outra visio 0 que diz respeico ao problema da terra Somente por meio do erie, ee 516 © dessgro de una prs doe ends (posses) com rei ce Waren Dean, “snd and land pic in ment ery Bo BE Hane drone levine, 428, 978 oi, 148] ‘Tervas devolutas eleifindio acompanhamento da histéria da aplicagao da Lei de Terrase seug desdobramentos, € que se pode acompanhar a formacio, na pti tica, de uma “politica” de tecras distinta da politica Saquatema. Justamente porque se pretendia fosse geral & que dentro dy estratégia Saquarema estava contemplada nao 86 2 imigracio es. S gjantes, Decididamente as provincias do Norte do Império néo Pontinea como também a imigracio regular. E a Lei de Teray prescavam 3 imigragao. As provincias do agticar (Pernambuco, integrava-se, assim, no ambicioso intuito do governo imperial de conciliar as tendéncias existentes na sociedade, constituindo-ge ‘no ponto central do plano de transigao para o trabalho livre, sey desorganizar a producio ¢ sem os efeitos catastréficos que cle tanto temia. ovincias que se prestavam a recché-los eram, sem diivida, as Sul do pais: S20 Pedro, Parand e Santa Catarina. Algumas sides de Sao Paulo, Rio de Janeiro, Espirito Santo e Minas seficiar com esse tipo de trabalhador porque nem o clima nem E gitipo de cultura que se praticava eram adequados aos colonos -europeus. ‘A introdugio dos colonos implicava naturalmente a modifi- Para dar um pouco mais de concretude a essa estratégia, po- gio do sistema das lavouras, Tratava-se de implancar a pequena demos citar a opiniéo de Heinrich Handelmann, autor de vali. sissima obra sobre o Brasil, escrita em 1860, na qual expressou de Faistema, como as das provincias do Norte. O café podia se bene- forma clara come seria possivel conciliar todas as tendéncias exis. dos dois sistemas e a0 lado da grande propriedade pod tentes em relagéo a imigragdo ¢ ainda manter por longo tempo.a rescer a pequena (apesar de que Handelmann observa que essa escravidéo.”” ipétese desagradava sobremaneira aos grandes proprietirios de Handelmann nao expressava a opinifo oficial do governo im- Paulo) petial ¢ suas observagées tém até algumas diferengas com as opi: nides dominantes dentro do governo. Nao apreciava a imigracéo regular, que ele chamava de artificial, e era muito critico a0 re- gime de parceria, que he parecia uma tentativa de instituir a servidio, © que Ihe parecia mais beneficios ttazer a0 pais era a afluén- cia de uma corrente espontinea, forte e ininterrupea de agricul- tores, Observava, entretanto, “que isso néo se deve entender como podendo ou devendo tal introducdo compensar exata e imediatamente a introdugao suspensa de afticanos”, Pelas condi- ‘ges navurais e climéticas existentes nas diferentes regiGes do pais, ficavam impostos limites & imigragdo de agricultores europeus. _ Mudlanga como a que sugerimos é portanto, muico possivel na me- ~tade sul do Brasil; essa regido de modo algum sofreria prejuizo; por outro lado, porém, surgiria com isso considerivel proveito para a < metade norte, pois esta, que segundo a experiencia ensina, nao pode dispensar o trabalho do escravo negro no cultivo dos seus principais produtos (agiicar ¢ algodio), receberia entio os escravos tornados dispenséveis no Sul. Assim verificar-se-ia no Brasil a mesma divisio >» do interior da Unido Norte-Americana, a diviséo em agrupamento © triplice: de Bstados de lavoura livre, de Estados de lavoura mista ctiadores de escravos, ¢ de Estados plantadores que necessitam dos esctavos; porém, 0 trifico interno de escravos deixaria 0 seu cami- ‘ho contrétio & naturcza no qual ele atualmente sc acha, ¢ voltaria 20 caminho natural fazendo passar os negras das zonas temperadas do Sul para as quentes do Norte.!* 17 Hendelmann, Hissria do Brill. 346. em, op. cit, p. 347. A estratigia Saquaroma lus aso} Terras devolutase latifiindio A estratégio Saquarema lasa exclusivamente por nacionais). Mas, justamente porque um ZA seus objetivos era a atragio dos imigrantes (funcionar como Sfaimatiz), a lei previa a venda das cerras devolutas em pequenos acessiveis a0s colonos derentores de um pequeno pectlio. O gcesso ou nic desse cmpreendimenco dependia das condicées js nas quais esses lotes seriam vendidos. As idéias de Handelmann eram, naturalmente, idade dele ¢ néo do governo imperial; entretanto nao seria ents eo supor que o autor captou as idéias de pelo menos uma pep cela da elite imperial, dos circulos préximos do imperados, aie the facilcou pessoalmence o acesso a documentos ¢ informa, ua proposta constitui um exemplo da forma concreta de coms a colonizacio para a pequena propriedade era vista em combing. $40 com a escravidao ¢ a grande lavoura. As considetagdes que tecemos até agora a respeito das motiva. s6es que levaram 8 adogao a Lei de Terras afastaram-nos um poy co de um ntimero considerdvel de trabalhos que de um modo oy ‘outro fornecem uma explicagiio para esse mesmo fendmeno, Alle de 1850 € vista, em parte significativa da bibliografia consagrade a andlise da politica de tertas ¢ de méo-de-obra do Estado impe. tial, como tendo pot objetivo principal vedat 0 acesso 4 terra aos imigeantes que comecaram a afluir na segunda metade do século XIX. Tal concepgio se baseia sobretudo no artigo da lei que este belecia que daquela data em diante as terras devolutas s6 pode: riam ser obtidas por meio da compra. Alguns autores combinam essa interpretagao com a idéia de que a politica de colonizagio espontinea do governo imperial constituia uma espécie de chamatiz para a imigracéo regula.” A observacio atenta dos fatos e das idéias ventiladas no Brasil, em meados do século XIX, obrigou-nos a nuangar um pouco tas afirmagées. A lei, tal como veremos a seguir, procurava, é fato, para os fazendeiros. José de Souza Martins destaca esse ponto mo motivaséo para a aprovacio da lei e sobretudo como fun- yento da postura que defendia a imigracao espontanea.”” A. igmentacao da propriedade tinha o objetivo de criar uma de- nanda de tetras por parte dos pequenos colonos que facia subir apta a substicuir os escravos nas migeantes pode significar prender-se ma armaditha de ver 0 re- tado do processo de aplicagio da politica imperial de terras ¢ nizagio (em cujo centro estava a Lei de Terras), suas hesita- Ges e compromissos durante toda a segunda metade do século indivel a anilise do que a lei efet ativas para sua aplicagao e as resistencias que suscitou, enim, ‘imo da lei, Sam isso, perde-se de vista um aspecto importants fie era sua dererminacéo em regulamentar 0 acesso & terra dos Eroprietérios de terra nacionais, criando por forca de sua aplica- - Antes de passarmos 2 anslise dos dispositivos da Lei de Terras optiamente dita, cabe fazer algumas observagbes sobre o incui contido nela de facilitar a transformacéo da terra numa mer regulamentar 0 acesso A terra por parte dos nacionais ¢ dos es- trangciros e pretendia estancar 0 proceso de apossamento que vinha ocorrendo indiscriminadamente até entao (efetuado quase 19 Verem especial Emilia Viowi da Costa, Da Monarguia a Replica — Moment dee sivas, 3 ed. Séo Paulo: Brasliense, 1985, pp. 140-1, 2 Alberto Passos Guinaries Quatro scules de lasifindio, sed. Rio de jancto: Pe e'Tera, sd, pardelarment PP. 130, 135 asa] Torrasdevotutes¢ttifindio Aipotecas ¢ oj dit i a por peragGes de crédito. Era, portanto, do incerese doy eee venaeitos — que podesiam obter crédito usando a terra cone garantia de seus empréstimos e também de : 1p! le seus credores —, ban A lei queiros, financistas e comissdrios, que, caso executassem a: tecas, teriam uma mercadoria negocidvel nas mios, A hipétese ¢ bastante plausivel, endo em vista que a perspes. tiva do fim do escravismo demandava uma nova garantia ee Z empréstimos. Entretanto, ¢ preciso atencar para o fato de gue. havia ourra possibilidades de resolver esse problema (que de firs seriam implementadas no decotrer dos anos 1860 € 1870) de que © processo de valorizagéo das terras era longo e ficou ainds tmais longo, tendo em vista a forma pela qual a politica de tery” foi executada pelo Estado imperial. Em outras palavras, a Leide Terras daria as condigées jurfdicas para que 2 terra viesse a 4. fornar uma mercadovia aceitavel nas transagées entie credotes¢ fazendciros, Entretanco, para que esse processo se completasse ety sua plenitude, isto é, para que a terra tivesse um valor realizivel, atlvando, assim, a existéncia de um mercado de terras, era preci $0, além da aplicacio exemplar da lei, que interviessem outros fatores no conjunto geral de economia. ipo. pprojeto de sesmarias ¢ colonizacio, finalmente discutido e provado no Senado em 1850 (lei n® 601, de 18 de serembro de Jojo ¢ regulamentacao da propriedade da terra) num mesmo pro- feto ¢ no papel primordial que © governo deveria desempenhar 2 importagao de trabalhadores livres. Nas discussdes que se guiram 4 apresentagio do projeto, novamente foi questionada (forma como o governo tratatia o caso dos posseiros ¢ sesmeiros. situagio irregular, Pediu-se, ¢ obteve-se, mais benevoléncia Em seus artigos iniciais, a let proibia a aquisigao de terras devolutas por outro meio que nfo a compra e estabelecia uma nova defini¢io para o conceito de cerras devolutas. Em seguida nham os artigos, que podem ser divididos em duas categorias: § atribuicdes dos possuidores particulares ¢ as do governo. Resumiremos essas disposigoes rapidamente, para em seguida alisarmos em destaque os aspectos mais importantes da lei asa] STerras develute:¢latifindio Scriam revalidadas as sesmazias ou outras concessées dp vetno-geral ou provincial que se achassem cultivadas, oy <2 Princfpios de cultura e morada habitual do respectivo sesmeirg (ou seu representante), mesmo que nenhuma das o shes estabelecidas originalmente tivesse sido cumprida, Seriam legirimadas as posses mansas e pacilics,' que se acha, Sem cultivadas ou com prineipio de cultura e morada habiwal dg ‘espectivo posse (ou seu representante). Cala posse em tery de cultura ou em campos de criagio compreendera, além de. terreno aproveitado, outro tanto mais de tereno devoluco que houvesse contiguo, contanto que em nenhum caso a extensig Coral da posse excedesse a de uma sesmaria igual is iltimas con, cedidas na mesma comarca ou na mais préxima. Em casos de dlispura entre posseiros ¢ sestneitos, o critério mais imports seria sempre o de favorecer aquele que efetivamente cultvasse ay) terras (a lel especificava os casos). Estabelecia também que nao entendiam por “principio de culeura’ os simples rogados, derru. bada de matos, queimadas, levantamentos de rancho e outros atos de semelhante natureza: © governo marcaria os prazos dentro dos quais deveriam ser medidas as posses cas sesmarias, designaria einsteuiria as pessoas que fariam as medigées, podendo, caso julgasse conveniente, rotrogar os prazos marcados, Os possuidores que deixassem de proceder 3 medigéo nos pri- 20s marcados seriam reputados caidos em comissoe perderiamn os beneficios da lei, conservando apenas 0 direito de serem mantic dos nas posses do terreno que ocupassem com efetiva cultura ¢ 1 "Pos posses mants¢ paccas eneadems as poses nko comtstadas ou impughadat judicialmente da sorce que 0: poseios, por si, ou por quem os represents suceda, ‘enh sempre prticado todos os atos de danni, tido todas os ebmodos evant fens de senhor, sem que houveste quem ais teaha oposc obstéeula” Cf]. M. Pe rete ce Vasconcelos, Lio dr tras. Rio de Jancizo:Laemmner, 1860, p. 348 ni bss poderia vender nem hipotecar sua posse. Pata que se pu- a see E im realizar essas operagbes, era necessirio 0 titulo de pro: dade obrido apés a medigao e o pagamento dos direitos de “ho governo, por sua ver, cabia realizar a medigio das terras Aayolutas, respeitando os direitos dos posseiros e sesmeiros, 0 que cava respeitar os prazos marcados para 0 cumprimento das sminagoes da lei. i “Cabia a0 governo, também, prover os meios préticos pelos ig seria extremado 0 dominio piblico do dominio particular, ificando quais as autoridades que procederiam administra rence na cxecusio dessa tarefa, Essas regras seriam especi- adas no regulamenco que seguiia a lei O governo seservaria as texas devoluta que julgasse neces es para a colonizaco indigena, para a fundacto de povoagtese a construséo naval. Orgenizaria também, por leeguesia, a sgistro das tertas possuidas, a partir de declaragées feitas pelos £05 lotes mediriam 500 bragas de lado (121 ha). O prego da terra ‘variaria dentro dos scguintes limites: meio real ¢ dois séis por im isentos de servigo militar, may ndo do servigo da Guarda Nacional do municipio. Ficava também autorizado 0 governo @ mandar vir anualmente, & custa do Tesouro, um certo niimero de 156] Tervas devolutas ¢leifindio Ale |asz ‘A lei também demonstrou o espitito conciliatério que presi- colons livres para serem empregades, pelo tempo que fose may ja sua elaboracio ao abolir o imposto territorial pre cado, em estabelesimentos agriclas, nos trabalhosdvigidos pl administragio piblica ou na formasio de coldnias n0s luge : : «qe estas mais conviesem, tomando antecipadamente as medida ram a retirada do imposto ¢ o governo een necesséras para que tis colonos achassem emprego assim gig pe alternative de recursos, Essa desisténcia diante dos peoprie= bsembacseca my os de terras foi um dos aspectos da lei que mais critica mere- O produto da venda das terase dos direitos de chanceltig ppor parte dos comentaristas da época, De fato, parece total- seria aplicado na ulterior medigéo das cerras devolutas ¢ na ins te injustificado que uma ul que tinha ae de seus portagdo de colonos livres, Alm do regulamento necessiri 4 etivos principais financiar a imigragao néo instituisse o impos- execucao da lei, ficava 0 governo autorizado a estabelecer ung, rertitorial. Além de reforgar os minguados recursos do Estado reparsigdo geral das terraspriblicas, encarregada de divigit a med iperial, um imposco sobre as terras desestimularia a manuten- Gio, diviséo descrgio das ters devolutase sua conservacto,¢ 8 de grandes latifiindios improdutivos. Assim argumentaram ainda de fiscalizar a sua venda e distribuigio e promover a colo. nizagio nacional e estrangeira. Numa primeira avaliagio global da lei, pode-se observar que seus autores procuraram aparatas arestas ainda existentes no pro. jeto de 1843. Na forma como aprovada, a lei deixava entrever que fora concebida dentro de um espirico conciliatério. Um dos as- Pectos conciliat6rios manifestava-se na alteracéo do limite das posses a serem legalizadas. Vimos, durante a discusséo do projto de 1843, 08 depurados acusarem o governo imperial de querer i Axi tee i uesta é imigracao, IstO expropriar os possuidores ao estabelecer limites méximos para faeediscutindo a questéo dos créditos pata a imigracéo. O impo: pderia ter sido uma forma de os proprietarios arcarem com uma 0 no tro mil e quinhentos réis) por légua quadrada, o que ele con- rava “demasiado médico”, mas ja seria alguma coisa? O pro- de Varnhagen surgitt no mesmo ano em que a Camara estava tamanho das posses. Na época, o méiximo que conseguiram fai que as posses efetivadas antes de 1822 pudessem manter-se na sua inteireza. Na lei, ficou estabelecido que as posses poderiam ser legitimadas do tamanho que fossem, sem restrigdo de data de ocupagio, ¢ ainda se concedia outro tanto de terreno devoluto. contiguo. s Outro aspecto conciliatério da lei, no sentido de ndo assustar demais 0s posseiros, ea 0 artigo que mantinha o posseiro caido ‘em comisso na posse da terra que eletivamente cultivasse, embo- 1a nio 0 tornasse proprietério na plena acepcao do termo. te das despesas, que estavam correndo por conta do Tesouro, Handelmann observou que, enquanto nao se instituisse um mposto dessa natureza, a gandncia dos proprietétios de erras em [ance Al dining, re dro hada iio _inpncn dons pr mar «oes ue pommam ova erl, tt pee da Vina 0.) Gominguce 896 Inc, Cla Mats de Olde, | Maton doe ae 358 Terras devolutase latifndio taxas, segundo as diversas regiGes do pats, poderia dar um suficien. 'e contrapeso ao insensaco ¢ inredutivel apego com que a atistocn. cia de fazendeivos tem em mio a sia superabundancia de terrg’s Handelmann defendia a proposta de que mesmo 0s colonos que viessem para trabalhar nas fazendas pudessem, por um ma. todo de aforamento ou outro, ter 0 direito de apés um cerey ‘tempo comprar as terras dos fazendeiros, Mas, para que 0s faren, deitos estivessem dispostos a isso, era necessério que as terra, incultas Ihes custassem algo, Desde que o fizendeiro tenha que pagar o imposto por sua proprie dade inculta, que, agora, se nada Ihe rende, tambéim nadia lhe cust, endo certamente ele de pronto se prestard a vender 0 que née pods cle proprio com vantagem administra, ou deixaré cair em devolu, S40 a0 Estado; e, reduzido a menor territério, ele mudars pouco 4 pouco o sistema aeual de cultura exaustiva por um sistema de explo. ago agricola racional.! ‘Tavares Bastos também props, em 1867, a retomada da ques- tio do imposto tertitoti Para atenuae as qucinas da lavoura, poder-se-ia ensaiar o impost, fimitando-o as propriedades sivuadas dentro de tantas léguas na zona das estradas de ferro, e de rodagem, e dos tios navegados a vapor. Assim o imposto cairia sobre os que j tram proveito imediato: dos sactificios do Estado para thes dar boas vias de comunicagio’ Assim também, acrescentava, o imposto incidiria sobre as tet- ras proximas do litoral, onde seria mais conveniente que os imi= 5) Handelmann, Hsin do Brash 4° ed, Sto Paulo: ataia, Ens, 1982, «I, p51 4. Tbidees, 5 Tavares Bastos, Os mar do presente as expenanar do fire, Sio Paulo, Past, Rio de JInneivo, Recie: Ca. Bdtara Nacional, 1959, p88 Ale fuss “Aopinido dos contemporineos é importante porque demons- que j4 naquela época havia clareza quanto & necessidade de cear de algum modo a apropriagio indiscriminada de terras da para isfacio das necessidades de mio-de-obra dos fazendeiros deve- “in recait, pelo menos em alguma medida, sobre os propriecérios de terras. Ainda mais que a lei introduzia a via da colonizagao jicial, ausence do projeto de 1843, mas mantinha o apoio do sno a via da imigragio regular. Contemplava, portanto, am- da foi feito, no Império, a respeito do imposto territorial. © O intuito de claborar uma lei conciliatSria nao é, em si, desa- aspectos que a lei precendiia conciliar exam conciliaveis. Por um ido, pretendia-se impedir 0 acesso 3 tetra dos imigrantes pobres roibigao da posse). Por outro, havia a incengio de estabelecer colonos com alguns recursos nas terras devolutas da Coroa, sr meio da venda de lotes. O primeiro aspecto deveria contentar (08 fazendeiros e 0 segundo, promover recursos para o Estado, No {taco da situacio juridica de todos os ocupantes das terras. Essas questes merecem uma andlise mais detalhada. Ji que umn dos pontos fundamentais para a concretizagao da politica imperial era a venda de lotes para a colonizagio, 0 prego dos lores merece uma atencéo destacada. Por outro lado, como nular a imigracdo espontinea, um dos objetivos da lei era e 160 | Tervas devolutas e laifindo pode ser interessante procurar determinar se 0s precos estabele. cidos tinham efetivamence alguma relagéo com 382 intengio, No hé unanimidade na bibliografia especializada a esse respeitg, Alguns autores afirmam que a lei puxava 0s pregos para cima, outros consideram que os pregos eram suficientemente baixog para atender aquele objetivo. BES pate 20s Estados Unidos, o proyo da terra estipulado na lei cra ecusam comprar lotes ai demarcados pelo motivo de que © preco, Jnda o minimo da lei, € maior que o das terras particulares dos redone! No artigo 14, pardgrafo 2 da lei, relembramos, ficou estipula: do que os pregos variasiam de meio real a dois réis, segundo g qualidade ca situasdo dos lotes. A terta mais cara, portanto, eta de dois réis por brasa quadrada, o que equivale a dizer que um lote, como os que se queria vender aos imigrantes, de 121 ha (ou 250.000 bragas quadradas, ou ainda, um quadrado de 500 bracas de lado) custaria no maximo 5008000 (quinhentos mil-réis), ou ‘o prego fixo de um délar ¢ um quarto cada acre (uss1,25, ou , mais ou menos 28500, dois mil e quinhentos tis). Em ou- jpalses era ainda mais caro. O prego mdximo previsto pela lei uj foi de 18653 (mil seiscentos ¢ cingiienta e trés réis) por acte E> E bem verdade que o preco da medi¢io das terras aqui era is caro do que nos Estados Unidos. Naquele pais a medicéo lava entre 3 ou 4 délares por segdo de 640 acres, 0 que signifi- na moeda brasileira 9 a £2 réis por acte. Aqui, 0 preco da dicéo da légua quadrada variava entre 500$000 (quinhentos | réis) ¢ 1:0008000 (um conto de réis). Sendo a légua quadrada a 10.890 actes, a medigso de cada acre custava aqui de 45 a ris, isto & de cinco a ito vezes mais que nos Estados Unidos. as é necessiiio observar que o prego da medigo néo influfa em tno prego dos lotes para os imigrantes, porque estes eram meio conto de réis. Esse prego, segundo Varnhagen, era muito mais caro do que o que se cobrava pelas terras particulares. Sig- nificava que um terreno de 1 légua quadrada custaria 18 contos,. © que era muito mais alto que os pregos efetivamente praticados nas transacées particulates.” ‘A terra mais barata custaria a0 imigrante 12.5000 (cento e vinte ¢ cinco mil-réis). Isso significava, afitma ‘Tavares Bastos, que meia Iégua quadrada, numa comarca do interiors, comprada 20 Estado, ccustaria, pelo menos, 2:2 508000 (dois contos e duzentos ¢ cingiienta il-téis), 0 que era muito superior ao seu valor venal. E acrescenaz 44ge Wendidos na maioria das vezes demarcados, = Embora alto internamente, se comparado aos pregos interna- ynais vigentes em 1850, © prego da terra estabelecido pela lei competitive. © problema, porém, & que a partir dos anos {.a] sabe-se que a certa distancia do livoral, mesmo nas vizinhangas € dentro das éreas de certas col6nias, sobretudo das militares, codos iso comecou a se manifestar uma tendéncia a baixa dos pregos picrnacionais los loces de tereas para attair a imigragio, E 0 {6 Wasren Dean, *Latfundia and land policy in ninereenth censuy Bra” Hipane ovemno imperial ndo acompanhou essa tendéncia, como nos ex- Amercen Historical al Review, 24,8, 197%, p68 da que esquera de Wakefield fora completamente abandonado c qu os pregs exiplados era menres que ct priticados not Estados Unidos 4 Alberto Passos Galmartes, Quatro sleulosdeaifine dho, sf, Ro de Jani: Daze Tray sp. 134, considera os proas eerada. Pu leo objervs principal da lec cifcaltar acess ere : 7 BAL Varhagen, Projets de wma lt adional “Tavares Bastos, OF made pret p83 Aleé ho 162 Terrasdevoitase latifindio Nos Estados Unidos, promulgou-se a t lei chamada de Precos Graduados. Suas disposigées objeti evitar que asceras puilicas detxassem de passar 20 dominig ticular por causa do prego. Segundo ess lei, as teras que hose sem enctado em hasta piblica, sem obter comprador duranrey anos, podiam, entio, ser vendidas a r délaro acre; no fim ae anos, 75 cents; nofim de 20 anos, a 50 cents: no fim de yoann 4.1245 cents, A lei exigia apenas que o comprador se estabelenn, se efetivamentena tera, ou que aanexasse a outro cstabelevina to que jé possuisse, - de terras piblicas. Esse minimo de 12,5 cents, Bastos, representava a metade de nossos menotes press, tum quarto de real por braca quadrada? : Mas a politica americana de terras no foi adotado 0 Homestead Act. Pssa lei per dio (ameticano ou estrangeiro), maior ou sj, parou por af. Em 1863, rmitia que qualquer cida de 21 anos, que nu tivesse lutado contra os Estados Unidos e que declanae pa mente querer possuir uma determinada érca de terras, podia, pa- gando x0 délates para despesa de cadastro¢ efetivamente cay vando @ tetra por cinco anos, tornar-se proptietirio de 160 acres, No Brasil a politica de tertas do Estado imperial ni previa nada igual, até 1867, data na qual Tavares Bastos tecia essas con: sideracées, nem muito menos mais tarde. A opiniao de alguns cena an enn 7 Ed seer ase scdeptaneo ea erage aes en bacon nds en He aa spe i tras ms undo 86x Cpe ae Art Ras “leas sno Bee mento sa San Shc tt dws pb CE Oise Zee Sea en en Pica in Eon Un Bs Edd Ga ye age 4 de agosto de 85440 € que ainda nao tivesse comprado 320 acre, comenta Tavares © Ales jes sas brasileitos do Império, como 0 Marqués de Abrantes, conceder tettas gratuitamente aos individuos tornava-os gentes © preguigosos. A lei de 1850 admitra, & verdade, a 4 prazo, mas nesses casos © prego nunca era o ménitno es- iglado, porém o de 1 real ou 1,5 real por braga quadrada. {Em 1867, 0 governo imperial, por mcio do decreto de 19 de jeiro, procurou regulamentar a situacdo das colénias do Estado de algumas providéncias, mas manteve precos devados os lotes de terras dentro de seus perimetros. Os loves urbanos 65, oito mil duzentos € sessenta e cinco réis, a 668120, ses- xa ¢ seis mil e cenco e vinte réis, por acre). Eos tertenos rurais média, portanto, superior ao prego maximo do acre nos Es- los Unidos (28500, dois mil ¢ quinhentos réis). B, se a venda a ptazo, adicionava-se 20% ao prego estipulado. E verdade J.000 bragas de maca derubada. Mesmo assim, Tavares Bastos ditava que os pregos tornavam a compra pouco atraente, Em ‘Como essas observages de Tavares Bastos nos ajuda a com- © preendes, nao eta simples conciliar as duas vias de imigragio den- tro de um mesmo projeto: atrair imigrantes, acenando com a lade de eles tornarem-se proprietétios e, 20 mesino tem- iar os custos da 10 Tavares estes, Os males do preston p85 164 | Terres devolutas ¢tatifiindio Ales [ass \ém do objetivo de levancar fundos para custear a imigracio fa, outra razo, habitualmence apontada, para que o governo paatasse artificialmente prego da terra era a pressio dos prd- farendeitos. A idéia, a que jf nos referimos, visava tornar a utilizagéo da terra como garantia das hipotecas, em vez avo, como se fazia até entao, Um dos maiores obsticulos, imigrasdo regular (weabalhadoces paca as farendas). A pritie monstrou que o desejo de conciliar essas duas maneitas ane rar a imigracao tinha poucas possibilidades de dar certo, S Z das duns “imigrag6cs” siria perdendo. Nas condigbes vines sociedade brasileira, para que a via da colonizagio ofa] oe cert, além de outs colts, sera precto que a tera fog et de grasa aos imigrantes, pelo menos inicialmente “ © resultado, até aquela data (1867), mostta, compara. vamente 20s Estados Unidos, ofracaso da tentative, De sgh 1832, 0 governo americano vendew 11.739.000 ha, Deak 1858, vendeu 47.630.687 ha, O total do produto da vends s de 369.000:000000 (erezentos esesenta € nove mil contos fy #4), em 71 anos, ou seja, mais de §.000:0008000 (eines mag ontos de ris) por ano. Em compensagio, no Brasil, de 1854 4. 1865 venderam-se nas diferentes provincias apenas 85.260 ms S valor tral de 174:4258559 (eentoe setenta¢ win comtore qu, frocentos vintee cinco mil uinhentosecingientae nove © ue represencava uma média anual (sete anos) de 24:4898365 (inte ¢ quatro contos ¢ quatrocentos € oitenta e nove mil trezen. tos € sessenta € cinco réis),"! _ De posto de vista financero,aestratégia do governo imperial do pareceu a melhos, mas muito pior ainda seria a comparagin dos efeitos sociais diversos que as duas politicas de terrastivenmy €m seus respectivos paises ¢ que saltam aos olhos, #2 isfatdria da garantia oferecida pela terra. A ide Terras visava também alterar esse quadro, Embora ainda 5 nos tenhamos ocupado da aplicacio da lei de 1850, © que 105 a seguir, podemos adiantar alguns aspectos em relagio a ¢ problema especifico, Esses aspectos apontam no sentido de a lei ndo conseguiu alterar o quadro desanimador da organi- 0 fundidria ¢, portanto, nio viabilizou a utilizacdo da cerra no garantia de crédito para os fazendeiros, ‘A idéia de promover o crédito & lavoura por meio do sistema potecirio foi importada da experigncia francesa do Cridit Foncien. se sentido, criou-se o Banco Rural e Hipotecitio na década de 0 ¢ promoveu-se uma reforma hipoteciria na década de 1860. colonial, mas manteve um dos aspectos que beneficiava o fa- \deiro, rendo em vista as condigées particulares da sociedade lo fazendeiro, caso este nao pudesse saldar seus compromissos. ‘Arreforma, além de manter esse dispositive, desfavordvel a0 cre~ dor, numa sociedade em que as tertas valiam muito pouco e nao ‘havia um mercado de terras realmente ativo, levou ainda mais 1 dem op iy py. 12 A oxapaso ds tera deolas nos ado Unidos da eo to ads Unidos de Ania ess ft esi pols fram sudo de forma isi por Feet Jucaon Taso hana aot dcuma ki eal atopic caf ainsino sm psd en papel na cond a demons Os pecan {280 sands em Zhe fone i Amariten ht, Nas logue, Pet Velo ‘SSDP np, Se presides de Bonin no Ba ver mary Bol Br, 2c, Seo Pad: Ci. Et Nason ~ Int ah 166 | Tras devotutas¢lanfndio Aer | 167 Jonge a protegio 20 Fazendeiro. Vejamos como ex , politica de emancipacio gradual da escravidao, que manteve tio Stanley Stein: polit ipacdo g) a -onomia girando em torno do escravo, postergando a neces- de de sua substituicao por outta garantia igualmente segura 10 depois de 1870, quando a perspectiva do fim do regime plica ess quae De acordo com essas leis imperiais, nenhum emprésti - trapassar a metade do valor da garantia oferecida pelo dere t Potecério, Nessas condigées, quando o devedor nao anldan, a ‘wompromisos e o prestamistaconseguia a ordem de execugzo cial, o devedor entregava sua propriedade, exigindo resinni ge dinheito da metade do valor da mesma* “ee star a0s fazendciros contra a garantia de instiusnentos agrico- fa, de frucos pendentes e de colheitas, prética que @ eforma hi- ciria aventada em 1855 procuraria institucionalizar,eliminando yeso da centativa de transformar a terra em garantia de emprés- que foi a incapacidade do Estado em regulatizara situago ypropriedade territorial, aspecto que trataremos adiante. Mas a centativa do governo imperial surtiu efeitos inesperados Js desdobramentos posteriores da regularizacao jusidica da pro Nessas condigdes, nao é de admirar que os bancos insists na abolicao da adjudicagio forcada, argumentando que cla - ss gentava os capitais da érea do crédito rural. O Banco do Brasil, tum dos credores dos fazendeitos, Iutou pela detrogacéo dese dispositivo, mas, em 1873, um decreto aboliu-o exclusivamente em favor do Banco de Crédito Hipotecirio que se pretenders ctiar. Mas nem isso, nem a tentativa da reforma hipotecitia de assimilar os escravos aoe bens iméveis, para aumentat a garaniq dos credores (tendo em vista que estes valiam muito mais do que 4 terra), surtiu o efeito desejado. De 1864 a 1889, poucos es. ‘abelecimentos foram fundados com o objetivo de proporcionar crédito & lavoura com base na propriedade territocial. Os poucos que o foram, além de serem tidos na conta de instituigées poueo sélidas, empregavam quantias fnfimas em operacées de his potecas.!® Colocar um preco clevado nas terras do Estado néo transfor ‘ou a terra numa garantia segura para os empréstimos, como parece ter sido a intengéo dos legisladores do Império. Duas fo- ram as razbes basicas para o fracasso dessa tentativa. A primeita 1237, de 24 de setembro), 0 governo estatuiu que a cransmis- 0 inservivos, por culo oneroso ou gratuito (isto é, a compra, a nda ou a cessio), dos bens suscetiveis a hipoteca ndo operava i efeitos a respeito de terceiros sendo pela transcrigao. Isso {juridico os termos de cessao de iméveis (venda ou doagéo) ou de srerras devolutas lavrados em repartiges pitblicas. Reforcando jo Ministério, elaborou trés avisos (n® 315, de 25 de novembro, #8 534, de 5 de dezembro, c n® 562, de 30 de dezembro, todos de 14 Stanly Stein, Grondene edevadencia do ca. Sto Palo: Brasilicnse, 1961, p 289. 7 Fe Slame Gren, A Gaede Perea apiione no Bra Sto Fe verre; Campinas: Unscasn, p, 95, © Evaldo Cabral de Melo, O Norte fo P de Melo, O Nore agai, £16 Ver). de Lima Pei, Da propidnd Bra Sto Palo: Casa Dpiat £952 Epp. 335-6, ¢ Ruy Cre Lima, Poynter do Bl emai (iyo ova Nee Sala 1958 P84 268 Tras devoluas latifndio sarems 0s termos de venda e concessio de tert nas tepartigde piiblicas, sem a transcrigio piblica dos titulo. Essa praxe cong rauou por entenderem alguns que o Fstalo, no senda um pro. Prievario de terras comum, nao estava obrigado a seguir as nop. mas do direito civil que regulavam a compra ¢ venda enteg Parciculares. No Império, os avisos de Itaboral nfo alteraram, Portanto, a siuagio juridica da venda de terras;entretanto,comg esses avisos nfo foram revogados, na Repiblica a questéo seri reromada, como veremos. Outro aspecto da Lei de Terras, que merece uma andlise mais | dctalhada é, sem diivida, a proibicio da posse. O artigo 1 da ej foi aquele que de longe mais chamou a atengéo dos analistas, pela importancia social que adviria de sua aplicacao. A polémica em torno da possibilidade de as tertas devolutas serem passtveis de incorporagdo ao patriménio privado, por meio da posse, mesmo depois da promulgacéo da lei de 1850, encheu iniimeros volumes dedicados ao dircito agrério. No regime imperial admitia-se, em geral, que, a0 proibir a aquisigao de terras devolutas por outro meio que nao a compra, a lei cornara ilegal esse meio comum, até entéo, de apropriagao privada. E transformara os “novos” posseiros em figuras ilegais, twansgressores que agiam 20 arrepio da lei. Ao deparar com essa forma de encarar 0 problema nos documentos oficiais do Lmpério, comereriamos, entretanto, um engano em supor que nao hou- vesse, j4 naquela época, sétias dividas a propésito da validade juridica daquele posculado. Definir as novas posses como ilegais foi a posigéo oficial do governo imperial, até o fim do Império, _ mas a resisténcia de setores importantes da sociedade (as classes dominantes no campo, em especial), apoiados numa parcela cada vez mais expressiva dos juristas, obrigou-o a algumas concessdcs. Mais importante do que essas concess6es, que foram sendo feitas numa tentativa de salvaguardar 2 autoridade governamental, A lei [16g mstantemente desafiada nesse campo, foi a paulatina dissemi- agio da convicgao de que era legalmente impossivel e social yente indesejavel a completa sustagao da posse como meio de a eminente figura da época, o livro Dineito das coisas, de La- te Rodrigues Pereira (1834-1917), publicado pela primeira ez em 1877. O conselhciro Lafayette nascet na antiga cidade pineira de Queluz, que hoje em o seu nome, bacharelou-se em fireito pela Universidade de Sao Paulo ¢ trabalhou como advo- no eseritério do Famoso jurisconsulto Teixeira de Freitas.” 1850: um Cgn Peal (16 de deze de 130); 1m Ciiga da Proceso Crime Ena (9 de novebro de 1832), tfoumado em 1841 © 1871 4m Cigo do Proceso GP. Comercial (25 de novembo de 1850}. 0 Cadigo Civile 0 Codigo do Proceso Chl lo exam, A pane da legslagio portgussconcernente so dco privado, mod * faa plas kis promuleadas depos da Independéacia, const egg civil da 2: Bras, Temira de Freitas foi encarsegado pelo governo de rdigr a Conia des deci, que ficou prone es 1858 (333 argu) As lei concerenie & estaviio F foram dusifcads pane no chamade Cdigo Negro, para nfo macula com “spo sigesvergonhora 5 nossa eis civ, confrmeexpie o aoe Tez de Fetes fbi ambém encanegad de fro proj do Cédigo Cl. nas fr spenas 0 eboso ‘Una comiso foi nomeada para ducuti ese projet, mas depois de multe ese, as quis oimperdoe asst, os uabalos foram snpesos em ecorénca da uct do Poraguai (1865). Mais tarde Nabuco de Araijo foi encaregado de tedigie out projeto de Ciigo Civil mas moreu antes de completo, Em 1881 outa comiseo foi criads, mas disolvida por fl de verbo. A codicago das leis fot confi a Le © ayes Rodrigues Pace, Coelho Rodrigues eS Cowa. Augusto Tei de Fre tes, Clap des eis vs $e. Rio de ene Jain Rib doe 5un605 1915, p. 000% (lniodgéo 4 2% ed), e Emile Levestcur (og), Le rs. Pais: Syadicat Franco-Brsilien pour "Exposition Univer, 1889, p. 37. O Cédigo Chl brslee 1016 foiadorado em 1936, na Replica. 1704 Terra devolutaselatifndio portance, Nesse trabalho, que setviu de base a muitas juridicas contempladas no Cédigo Civil da Repsbica, a comet xidade da questio da posse aparece sugerida, tendo sido poses! = lorinente muito mais desenvolvida por outros ilustres juristayg, le época republicana, Ao tratar da ocupagao, tema central na questao da posse ae {erta, assim a definiu o conselheiro: “a ocupasao € 0 modo de. adquiti dominio sobre a coisa que nio tem dono, pelo simpl . pelo simpleg fa de apreendé-la com animo de possul-la como prépriz’ "Em sepuida, aborda a questio de definir quais as coisas que podem se, ocupadas ¢ exclui dessa categoria as terras devolutas, dizendo; Ames da promulgagso da citada lei (de 1850) vigorava 0 costume” de adquirem-se por ocupaséo (posse era 0 termo consagrado) sg fetras devolutas, isto é, as terras publicas que nto se achavam aph cadas a algum uso ou servigo do Estado, provincias ou municipios A dita lei abolit aquele costume ¢ torou dependentes de legitima, so as posses adquiridas por ocupasio primétia on havidas do pri ‘meiro ocupante, até a sua data.” Apresentava assim, sem sombra de diivida, a norma geral es. tabelecida desde a promulgacso da Lei de Tertas, que proibia 2 posse das terras devolutas, tendo o cuidado de afitmar que a lei abolira um costume. Mais adiante, entretanto, 0 autor vai discor- rer sobre os fundamentos da presctigéo aquisitiva (usucapiso), Ao defini-la, assim se exprime: “a prescrigéo aquisitiva (usueapio) é 0 modo de adquirir a propriedade pela posse continuada durante tum certo lapso de tempo, com os requisitos estabelecidos na le O elemento essencial da prescrigio aquisitiva era a posse ou a 18 Lafayerce Rovtrigues Pereira, Dinite desc (8 tit Divito das coi (1877), 66d. Rio de Janeiro, Sto Livearia Freitas Basos, 1956, p. 105 Sicetteetict 19 Idem, op ct, p. 102. Westbeg Alte jan posse, Ao estabelecer 0 que era suscetivel de presctiséo, novamente as terras devoluras Eoin em regra suscetiveis de serem prescita rodas as coisas que no esto fora do comércio. Estao fora do comércio € portanto nao se ‘gdquirem pot prescricéo: 8 As coisas sagradas, como os templos, as imagens. “ge As coisas religiasas, como os cemitérios [3° As coisas do dominio priblico, como os portos, os rios navegdveis, as as, pragas, estradas priblicas; as que sdo divesamente empregadas pelo “Butado em servigo de utilidade geval, como as fortalezas e as pragas de werra. Nao entram nesta classe ¢ podem ser prescritas as coisas do dominio do Estado, isto é, aquelas acerca das quais 0 Estado & con- siderado como simples proprietirio: tais como as terras devoluas, © gs ilhas formadas nos mares territoriais, os bens em que sucede na falta de herdeitos legais do defunto (grifo nosso). Quer dizer, as terras devolutas exam, em principio, passiveis ide softer a aquisi¢éo prescritiva, cujo elemento essencial era a osse, mas néo podiam ser ocupadas (apossadas) porque uma lei se € 0 elemento essencial da prescrigio aquisitiva. A lei pretendia sgularizar a propriedade privada da terra, mas estava opondo-se a. uma das garantias dadas pelo direito aos proprietirios. Afinal, como explica o conselheiro, “acabar com as incertezas da pro- priedade eis pois a razio final da prescri¢ao aquisitiva’. Fla con- segue isso de dois modas. Em uns casos simplesmente confirman- © do as transferéncias de dominio preexistentes, suprindo a falta de prova, Como no caso de um testamento que desaparece e deixa ‘© possuidor de detetminados bens sem a prova do seu dominio sobre objetos que lhe foram legados. A prescrigio the garante que, 20 Ide, op. it, pp. 70+ a7] ‘Tervas devolutere latifindion se ele se manteve na posse desses bens, incontestado, por jg lepso de tempo (30 anos, por exemplo), isso prova que os bey séaefetivamente seus. “Sem a presczigéo a propriedade sera pig, viséria porque a histria no pode levar as suas investigasbes ang. © ato de aquisi¢ao do primeiro possuidor.”! Em outros casos, ey, or missio sanar os defeitos dos modos de aquisisio e nesse ¢. rier se converte em causa geradora de direitos. Est nesse cao 4 uusucapiao, perfeicamente vilido segundo o ditcito, entre party, lares, mas duvidoso no caso dos bens puiblicos, tendo em vista determinaséo da Lei de Tetras, proibindo a posse das terras de- volutas. Essa divide permaneceu sempre existence, embora na Pritica a possibilidade de se apossar de terras devohitas também sempre tenha existido, Outro aspecto que merece set analisado em detalhe, porque. em torno dele girava 0 novo ordenamento juridico da propried. de da terra, era o item da lei que redefinia 0 conceito de terras devolutas. Aci de 1850 reve os efeitos, no que tange a questo da regu: Jamentagéo da propriedade territorial, perdurando por um longo cspago de tempo, A porgao do territétio brasileiro ocupado, quando de sua elaboragéo, era infima — de acotclo com o censo de 1920, existiam ainda 79,4% de terras devolutas e apenas 20,6% de terras cultivadas, Mesmo que a apropriasio tenha andado mais tapidamente do que a fronteira agricola, é forgoso reconhecer que, quando a lei foi promulgada, restava uma parte considerivel do territério brasileiro desocupado ¢ nao apropriado que perten- ia 4 nacéo. Um dos objetivos da lei era justamente, além de re- gulacizar a propriedade daqueles terrenos que jé estavam ocupa- dos, determinar as normas de acesso as terras devolutas, daquela data em diante. A lei deveria constieuir um matco na hiseéria da a1 Hem, 9p. ct, p. 267 Ale las Spropriagio territorial: os terrenos jé ocupados, até 1850, ha- m-se beneficiado de normas ¢ costumes que a lei estava dando s Concessbes gratuitas, mas condicionais de ses- a posse “mansa e pacifica’, A lei previa a regularizagio yas épocas. No intuito de reorganizar a estrutura fandiria para poder lcangar scus objetivos é que a lei de 1850 redefiniu 0 conceito |, Pardgrafo 1% As que nao se achatem aplicadas a algurn uso piblico nacional, provincial ou municipal Parigrafo 2% As que nao se acharem no dominio particular por qualquer titulo legitimo, nem forem havidas por sesmarias ¢ outras concess6es do Governo Geral Provincial, nio incursas em comisso por falta do cumprimento das condigaes de medigao, confirmagio cultura. Pardgrafo 3% As que no se acharem dadas por sesmarias, ou outras, concess6es do Governo, que, apesar de incursas em comisso, forem revalidadas por esta lei. Pardgrafo 4*: As que nio se acharem ocupadas por posse, que apesar de nao se fundatem em titulo legal, forem legitimadas por esta lei Essa redefinieio tornou legal o sentido com 0 qual o temo _“devoluto” vinha sendo aplicado desde os tempos coloniais, como luto” era aquele de terra concedida, que, pelo fato de o conces- siondrio nao preencher as condigdes da concessio, voltava 20 a7a| Tereas devolutas ¢tatifindio Senhor original, no caso, & Coroa, Entretanto, com o tempo, » segundo significado de “devoluto” entrou definitivamente pars, lingua portuguesa. O termo “devoluto” foi empregado na lei em suas dias a0 66¢s, a antiga e a moderna, de vago, inculto. Além disso, ale defnia as terras devolutas por excluséo, Essa escalha, de chamar as tettaspiblicas nacionais de teas devolutas ede defnilas por excluséo — as que nio estiverem no dominio particular etc. —, divide até hoje a opiniéo dos comentadores, Pata alguns, come Costa Porto © Manuel Linhares de Lacerda, a utilizacéo desse fermo como sindnimo de vago causou muita confusio na hisedtig posterior da apropriagio territorial ¢, portanto, se o intuito da le ra esclarecer a matéria, isso foi um erro irrepardvel, Dentre os que tém a opinigo contriria, destaca-se Messiag Junqueira, para quem a lei de 1850 conceituou claramente o ins. tituto juridico das terras devolutas, Pata esse autor, a lei teve um pensamento fixo: respeitar a detengio daquele que, sem titulo dorinial em ordem, estivesse em contato com o solo brasileito, com ocupacio expressa por dois requisitos imprescindiveis: cul tura efetiva e morada habicual. Fosse esse ocupante antigo sesmei- 10 ou simplesmente posseiro, a lei respeitaria suas terras, contan- to que cle efetivamente as cultivasse. A lei respeitatia também todos aqueles que tivessem um titulo legitimo de propriedade, ‘Mas é bom lembrar que até aquela data, para que fosse posstvl ser um legitimo proprietdtio, o requisito de cultura efetiva e mo- fada habitual teria que estar sendo respeitado, porque todas as concessbes de terras — fossem sesmatias, terras cedidas a0s colo- nos estrangeiros etc, ¢ todas as posses com sentenca passada em julgado — haviam sido feitas com a condicionalidade do cultivo. Em conseqiéncia desses fatos é que Messias Junqueira afitma que, segundo a lei, € possivel formulas a seguince definigao: “Ter- ras devolutas so as que no estio incorporadas ao patriménio A lei |a75 em cultura efetiva e morada habitual”. Portanto, para 0 autor em questéo, o espirito da lei, 20 iden- cc respeitar todo aquele que efetivamence a cultivasse, Tanto igo era verdade, argumenca Messias Junqueira, que a lei, em seu igo 8°, garantia a posse da parte com cultura efetiva ¢ morada jabitual do sesmeiro ou posseiro que no cumprisse as determi- jagdes da propria lei, E verdade que o artigo II afirmava que sem ftulo de propriedade, que sé podia ser obtido por meio do smprimento das determinagdes da lei (em especial 2 medicéo), possuidor ndo poderia vender, nem hiporecar suas terras. Ele ontinuava possuidor dos terrenos que efetivamente cultivasse, as nfo se tornava proprietério, Mas, afirma o autor, o artigo 8°, binado com 0 artigo 179, inciso XXII da Constituicéo impe- ial de 25 de marco de 1824 (que garantia o direito de proprie~ fe em toda a sua plenitude), protegeu os ditos possuidores da “ameaga contida no artigo 2%, que jamais foi cumprida Existem, no entanto, outras interpretagées para a lei. Diz Ma- =% nuel Linhares que, para ofeito da aplicagio da Ici, pensando-se fm seus desdobramentos para além da situacio a qual ela foi aplicade, nao & possivel assimilar terras devolutas a terras vagas (por isso ele criticou o uso do termo “devoluto” na forma da lei). 2 MessasJonqueia, As rrr denauta a vfomia agai. Sto Paulos Grafica da Revises dos Tribunais, 1964, p68. 1761 Terres devout atfindio Proptietitio © posseiro ou sesmeito que nao cumprisse as dete. sminagdes da lei), impede que se considere “devoluto” como idéy. tico a “inculto”. As observagses que aqui ficam tém grande importincia porque dissuade a ersdnea conviegdo de ser devoluto sindnitmo de ineyl to — pois as cerras cultivadas de posse caduca ¢ née legitimady também sio devoluras embora estejam ocupadas com plantaggey De outta parte, os terrenos incultos quando estiverem no dominig particular por qualquer titulo legitimo nao se considera devolure, segundo os expressos termos do Parégrafo 2° da lei.® Compreende-se por que também Costa Porto criticou o uso do rermo “devoluto” quando se queria tratar de terras vagas. Era melhor, segundo esse autor, que tivesse guardado 0 terme apenas para aquelas retras que haviam sido cedidas e cujos be- neficiérios, por néo cumprirem as determinacées da lei, perdiam, © direito a clas e, porcanto, deviam “devolvé-las” (muito embora isso ndo tenha jamais ocorrido). As outeas tertas, néo ocupadas, vvagas, deveriam ser tratadas na lei de forma separada. Mas tal nfo ocorreu, Aparentemente, ambos os lados da polémica tém uma parte de razio, Messias Junqueira tem em parte razéo ao afirmar que, naquele momento, terta devoluta e terra inculta eram a mesma coisa, porque, como jé observamos, na definigio por excluséo do conceito de devoluto estavam excluidas as terras no dominio par- ticular por titulo legitimo, que formalmente deveriam ser tertas cultivadas, tendo em vista a cléusula de cultivo. Mas essa era a norma das concessGes feitas antes da lei. Por sua ver, tem tazéo Manuel Linhares quando afirma que, da vigéncia da lei em dian- 25 Manuel Linhares de Lacerda, Tatedo das tert no Brasil Rio de Janeiro: Alb, 1960, vol rp 29, 24 José de Coste Port, Sema sesmartal no Bra Beals: Bditora UnB, sd, p. 144 Alei haz _possuindo o proprietitio um riculo legitimo, suas terras nao is poderiam ser consideradas devolutas (artigo 3%, pardgrafo 2"), smo que nao fossem cultivadas, E também Costa Porto, ao 1 que 0 artigo 8* garantia o posseiro néo-cumprider das de- inagGes da lei na posse da terra, mas néo Ihe dava o direito a Fj questio do titulo de propriedade, ou pelo menos foi isso que onteceu na pritica. Todo o problema residia no fato de que a ‘estava operando a transigio de uma forma de propriedade (na ealidade os sesmeitos erat concessiondrios das terras, que teori- Eeimence podiam ser tomadas, caso as condigées da cesséo nfo ‘cumpridas) para outra, a forma burguesa, contractual, que mente verificado”. inpossivel sabcr-se ao certo), a lei deveria ter determinado isso ‘dlaramente, em vez de estabelecer uma definigéo no minimo “confusa, Essa definigao pareceu a alguns juristas incompreensivel. Tei- xeira de Freitas, na Consolidagio das leis civis (1858), definiu do Sio terras devolutas: 3) as que nao se acharem aplicadas a0 uso publico; ; 2) a5 que nao sc acharem no dominio particular por algum titulo legitimo ou que ndo forem havidas por sesmarias do governo geral ou provincial; as] Terres devolutas #laifindio 3) as que forem havidas por sesmaris ¢ outras concesses do go, no geral ou provincial, mas incursas em comisso, por falta de ‘clin. Primento das condicoes de medisio, confirmaséo ou culeura; 4) a8 que forem havidas por sesmarias ou pelasditasconcesse in? cursas em comiss, seas sesmatias ou concess6es néo forem remly dadas; i 5) a8 que forem havidas por meras posses, madas,*> se esas ndo Foren lei. De fato, a definigio de Teixeira de Freitas € muito mais larg Porque mostra afirmativamente © que a lei considerava tertay devolutas; entrctanto, € preciso notar que o problema que apon- tamos anteriormente permaneceria, ou seja, “devolutas”, no sen: tido original de “devolvido”,s6 seria vilido para as teras ocupa- das até 1850, Nesse caso o critério de cultura podetia ser aplicado, Para a5 terras cujos proprietitios obtivessem um titulo de pro. Priedade, por suposto, apés a aplicagéo da lei, nfo mais se pode. tia alegar a auséncia de cultura para penalizé-los. A lei, de todo modo, modificava a realidade & qual estava sendo aplicada e teria sido mais simples se tivesse feito mais claramente uma distingao entre as terras que estavam retornando ao patriménio da nacdo, Porque seus possuidores ndo haviam cumptido as condigées ori ginais da concessio ou respeitado os dispositivos da lei, e as terras ndo ocupadas que poderiam ser descritas como vagas. Em consegiiéncia, portanto, da dinamica provocada pela existéncia da lei, independentemente do fato de ela ser ou nfo universalmente aplicada, abandonou-se, com 0 tempo, a questio do cultivo como critério de definigdo para terras devolutas, Aos = poucos, terras devolutas passaram a ser: 1) as que nao estavam aplicadas a algum uso pitblico nacional, estadual ou municipal; a5 Tencira de Breias, Coneidep. artigo 535 p50. Alet ha79 ‘as que nao estavam no dominio particular, em virende de titulo jcimo."* ‘Ainda no Império, essa foi uma das conseqiincias mais graves sa falta de clareza sobre a definigéo de terras devolutas, & qual somava.a incapacidade de fiscalizacio do Estado sobre suas ter- as, pritica muito problemética ances da promulgacio da lei.” ~ Qutra conseqiténcia de igual importancia decorreu da falta de areza a respeito do artigo 82, que mantinha os possuidores de- sbedientes na posse das terras que efetivamente cultivassem, € 11880, Naturalmente, nao se pode atribuir apenas & lecra da lei a sponsabilidade por tudo 0 que se passou posteriormente na ist6ria da propriedade da terra, mas, tendo a Lei de'Terras per- durado por mais de meio século como a tinica legislagao regula- dora da apropriagéo tervitorial — ¢, mesmo depois disso, serviu de base & formagio de jucisprudéncia sobre terras —, é lamenti- yel que nao primasse por melhor técnica na definigéo de seus 7 ftom if ao leon ober ma ntlsta nosis por io de sca

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