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Desde os primeiros esboços da civilização o povo busca continuamente

métodos para preservar seus direitos sob aqueles que querem usurpar suas
liberdades. O código de Hamurabi produzido na Babilônia transforma-se no
exemplo da evolução natural dos códigos que foram moldando e baseando-se
aos seus anteriores. Sobretudo porém, no período contemporâneo o grande
questionamento que se coloca é se estes direitos estão sendo utilizados como
uma arma do Estado para outros fins que não sejam a preservação do povo.

O livro “Direito Penal a Marteladas” do professor e ex-desembargador Amilton


Bueno Carvalho traz uma escrita crítica acerca do que é, e o que se
transformou o direito penal, com uma visão nietzschiana sobre o tema ele
utiliza de fatos e argumentos, inclusive de pensamentos do próprio filósofo
alemão para quebrar certos dogmas considerados intocáveis pela cultura
jurídica, com esta percepção niilista sobre o que é o direito penal o professor
Amilton põe em dúvida todos os pensamentos anteriores acerca dos temas
debatidos no livro.

Através dos anos de estudo e influência de Friedrich Wilhelm Nietzsche, um


dos mais importantes filósofos, crítico cultural e poeta do século XIX que teceu
duras opiniões sobre religião, a moral, a cultura contemporânea, filosofia e
ciência, exibindo uma predileção por metáfora, ironia e aforismo; o autor desta
obra busca em suas provocações estimular o senso questionador de todos os
jovens estudantes de direito e os entusiastas pela área.

Desde os primeiros capítulos, a partir do “Por que Direito Penal a Marteladas?”


o autor afirma esta obrigação como doutrinador de utilizar o martelo de
Nietzsche para destruir os dogmas e ídolos que estão tão enraizados na cultura
popular e cultura jurídica brasileira. Fazendo uma comparação entre o período
medieval em que o filósofo viveu, nos mostra o quão atrasados - apesar do
tempo - estamos em relação ao seu pensamento.

Seguindo a estrutura do livro, o professor Amilton tece uma grande crítica ao


sistema de ensino universal que é aplicado, como a educação superior
gradativamente vem se tornando mais popularizada. Entretanto , Nietzsche
questiona esta política, dizendo que a educação e o conhecimento devem ser
para poucos e que apenas poucos compreendem o que realmente significa
esta condição de “universitário”; continuando, de acordo com o filósofo o
conhecimento não pode ser ensinado pois ele é um dom que está latente em
determinados indivíduos por esse motivo é impossível ensinar alguém que não
possui esta condição, com a metáfora do ovo e da pedra Nietzsche demonstra
– de maneira rústica - esta explicação sobre o conhecimento ser seletivo. Do
mesmo modo ele critica os mentores que necessitam, pelo ego que seus
discípulos torne-se seus seguidores, segundo o mesmo, o professor está
fadado ao passado e que ele tornaram-se muletas para que seus alunos voem!

Em seguida, o professor Amilton Carvalho busca uma forma de filtrar os seus


leitores dizendo claramente a quem é direcionado o livro, seguindo a corrente
filosófica mais humanista, o professor faz suas considerações acerca daqueles
que ele considera a linha de frente da luta pela defesa dos direitos os
defensores; a partir da ideia anteriormente citada, ele explícita que o seu
pensamento humanista para com os direitos básicos é de respeito ao cidadão
independentemente de quem seja, pois a lei deve ser igualitária, e a justiça não
deve ter considerações sobre quem foi ou quem é a pessoa que está julgando
ou defendendo. Desta maneira, Amilton afirma que os advogados, defensores
estão em contato direto com aqueles a quem foi ofendido um direito, somente
eles têm compreensão da real situação emocional em que esses indivíduos se
encontram; por esse motivo, os defensores por se colocarem em situações que
quase sempre vão de encontro aos anseios populares ao defender aquele que
todos querem a condenação estão em uma posição mais desfavorável, em
razão disso esta classe deveria possuir uma maior estabilidade, pois são eles
que brigam frente a frente com os poderosos.

Avançando pelo livro do professor, encontra-se um dos seus pontos mais


polêmicos e criticados: o abolicionismo. Por ter sido magistrado durante 35
anos e um lecionador da matéria de direito penal por tanto tempo o autor
compreende as dificuldades acerca deste assunto. Já no início do capítulo ele
destaca o que significa o abolicionismo: não à cadeia.

O direito penal por ser responsável de tratar aqueles que estão à margem da
sociedade e são claramente expulsos por ela torna-se cada vez mais politizado
e distorcido, por conseguinte, converte-se em uma cultura popular de punição
desenfreada através da ideia de impunidade – claramente equivocada -
utilizada em discursos políticos. De acordo com Nietzsche, “o idiota tem a
resposta perfeita”, por isso com a politização dessa ramificação do direito todas
as pessoas têm a resposta pronta para o problema global do encarceramento
através de suas várias conjecturas.

O direito penal transformou-se em um grande palco onde juristas infectados por


esta mesma situação politica entram em uma dicotomia pelo discurso acerca
desta área, entretanto os dados e evidências paulatinamente disseminadas por
todo canto social revelam que o problema existe e não está sendo sanado.

Voltando ao abolicionismo, o autor revela como estão sendo utilizados os


escudos – o direito que teoricamente eram para ajudar os cidadãos - em
armas para transformar o estado em um tirano, através de um ativismo jurídico.
– ou apenas baderneiros e delinquentes de togas – O tribunal tornou-se uma
ida direta ao presídio, o pensamento de lei e ordem inundou esses ambientes e
incentivou aqueles julgadores a agirem de forma pretensiosa ao ponto de
distorcerem entendimentos apenas para satisfazer o seu gozo pelo
aprisionamento.

De acordo com Nietzsche com concordância do professor Amilton Carvalho, o


direito penal nada mais é do que uma vingança positivada pelo Estado para
satisfazer a sociedade como um todo, pois essa área do direito nada tem a
ajudar a vítima do crime - essa pode recorrer aos seus direitos em outras áreas
da justiça – e que as diversas leis cruéis e repressoras não são soluções, não
inibem o crime.

Seguindo adiante, nesta mesma corrente, o filósofo Nietzsche entendi que o


“não-castigo” é o grande próximo objetivo e desafio para evolução social. A
punição como vingança não ajuda em nada a comunidade, entretanto, é
utilizada desde os primeiros esboços de sua criação com o intuito de
separação entre “ bons e os maus” pelo Estado a fim de favorecer classes
sociais mais elevadas. Com o intuito de punir o pobre e favorecer o rico a
punição transformou-se em mais uma arma nesta segregação histórica, porém,
o problema se multiplicou pois a punição não purifica o criminoso, ao contrário,
a punição torna- o mais criminoso, pois os presídios ao longo dos anos foi onde
largaram pessoas como se não tivessem direitos, desta forma transformou-se
em “más-morra”, um lugar onde se morre de maneira indigna onde os direitos
humanos inexistem.

Atualmente, muito se fala sobre “ressocialização”, entretanto nas atuais


condições é impossível imaginar um cenário como este, pois o presídio não
prende somente o corpo mas também aprisiona o espírito; a ideia popular de
que o castigo cria sentimento de culpa no criminoso está completamente
enganado, pois nos presídios só se alimenta o ódio. Em síntese, o direito penal
elege os indesejados pela diferenciação de crime e os marginaliza pondo-os
em presídios que não os ajudam, mas somente pioram a sua condição em um
ciclo infinito de injustiça e ódio em violação de direitos para todas as partes –
vitima e criminoso -.

Outro grande ponto criticado no livro é a prisão preventiva. Segundo o autor


este instrumento jurídico é um absurdo, pois ele é claramente uma violação
inconstitucional de direitos, segundo a carta máxima instituída no Brasil “é
vedada a antecipação de pena” , não obstante, é uma das ferramentas mais
utilizadas no sistema judiciário com discursos vazios e argumentos fracos de
ordem pública e ordem econômica, com essas justificativas sendo muito
escassas e amplos ao ponto de não significar em nada. Desta mesma maneira
fica nas mãos de bons e justos perseguidores as decisões de aceitarem ou
indeferirem esses pedidos.

Em seus discursos finais o autor pontua ao olhar de Nietzsche problemas


vigentes em nosso ordenamento jurídico como a reincidência, que o filósofo
afirma não fazer sentido pois o julgamento é pelo ato que ele praticou, que não
deve ter agravante por ele ter praticado um ato já condenado ou um ato que ele
já pagou, por esse motivo torna-se incompreensível a ideia de ainda em dias
atuais serem utilizadas esses argumentos para aumentar o encarceramento em
massa.

Concluindo, o autor busca sumamente explicar os defeitos no ordenamento e


nas doutrinas jurídicas e em tudo o que ela rodeia, problemas fulcrais e
basilares que habitam no mundo jurídico, e que suas críticas tentem ao mínimo
fazer uma diferença aos futuros operadores do direito para destruir os dogmas
então enfatizados durante séculos ensinamentos, e lhes mostrarem que existe
mais de uma maneira de se pensar direito.

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