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GARANTISMO PENAL INTEGRAL

A Teoria Garantista precisa ser entendida como algo mais abrangente,


não limitada pelo Direito Penal, muito menos como uma vertente deste,
porquanto traz à baila uma discussão profícua que envolve temas de
Jusfilosofia a Direito Constitucional, de modo que não se limita a direitos de
primeira geração, elencados na Carta Maior. Ademais, impende salientar que a
Teoria Garantista transcende o Direito Penal e ecoa em outras searas jurídicas.

O Garantismo Penal Integral, doravante denominado Garantismo Penal,


nada mais é do que uma ótica constitucionalista a partir da qual se busca uma
“técnica de tutela capaz de minimizar a violência e maximizar a liberdade”,
além de aproximar a realidade do que se considera estado ideal no tocante à
efetiva aplicação da legislação, ou seja, uma norma pode ser considerada
vigente, não obstante inaplicável ao caso concreto, porquanto carece de
legitimidade diante dos princípios e normas constitucionais.

Segundo nos ensina Ferrajoli, faz-se imprescindível entender a Teoria


Geral do Garantismo sob alguns aspectos, notadamente a vinculação do Poder
Público ao estado de direito; a noção de que a norma, ainda que vigente, não
necessariamente é válida; sobretudo a dicotomia existente entre as questões
ético-políticas e jurídicas. Em tempo, também se faz necessário elencar
resumidamente os Princípios Fundamentais: a Retributividade, a Legalidade
(lato sensu), o Direito Penal como ultima ratio, a Lesividade a bem jurídico
tutelado constitucionalmente, a Materialidade, a Culpabilidade, a
Jurisdicionalidade, a separação entre o juiz e a acusação (Princípio
Acusatório), o Encargo da prova (pertencente à acusação) e, finalmente. o
Contraditório.

Surgida na Itália dos anos setenta, momento de recrudescimento


legislativo, a Teoria Garantista de Ferrajolli tem seu postulado em um direito
alternativo, de maneira que o acusado (investigado ou réu) passa à condição
de sujeito de direitos, não mais um simples objeto de investigação e punição
pelo Estado. Esta dimensão negativa impõe ao Poder Estatal uma posição
absenteísta, propõe-se a tutela dos direitos fundamentais assegurados
constitucionalmente, a fim de que o indivíduo, ora infrator, seja imune às
arbitrariedades dos intérpretes legais ou à literalidade da lei, mas que viola a
dignidade da pessoa humana.

A história recente brasileira foi marcada por um Estado de exceção,


autoritário, indiscutivelmente violador de garantias essenciais. Decorrente
dessa memória inegável, é que o Garantismo Negativo ganha força, justamente
no que muitos entendem com privilégios de poucos. A exemplo, há as
imunidades, inviolabilidades asseguradas na Carta Maior. Nesse diapasão, em
recente decisão inédita, o STF proíbe no país, por seis meses, despejos
desocupações, reintegrações de posse ou remoções forçadas em imóveis de
moradia coletiva ou de área produtiva em que vivam populações consideradas
vulneráveis, da mesma forma, também fica suspenso o despejo de populações
que deixaram de pagar o aluguel em imóveis residenciais e que estejam em
situação de vulnerabilidade. Evidente aqui é a postura de tutela de indivíduos-
infratores, mas em situação de vulnerabilidade, o que impede a aplicação literal
do direito à propriedade. (ADPF 828 03/06/21 MC / DF)

Não obstante sua vertente negativa, a Teoria Garantista impõe o dever


de proteção à sociedade, ou seja, o Garantismo Positivo busca evitar a ação
criminosa (caráter preventivo) como também punir o infrator (caráter
retributivo). A partir dessa ótica, poder-se-ia questionar se haveria ou não
conflito entre segurança e liberdade. A resposta a este aparente conflito está
no Primado da Proporcionalidade, que garante a proibição do excesso, de um
lado, como também a proibição da proteção deficiente, de outro. Não há que se
discutir acerca de um posicionamento estatal em favor da sociedade,
notadamente em um país assolado pela violência e corrupção. Aqui a proteção
se volta não mais ao indivíduo-infrator, mas à sociedade-vítima. É evidente que
a restrição do direito do indivíduo-infrator se dá quando proporcional, adequado
e, sobretudo, necessário.

Consoante tal entendimento, o Supremo Tribunal Federal decidiu que "


o fato de ter sido verificado o registro das últimas chamadas efetuadas e
recebidas pelos dois celulares apreendidos em poder do co-réu, cujos
registros se encontravam gravados nos próprios aparelhos, não configura
quebra do sigilo telefônico ... é dever da autoridade policial apreender os
objetos que tiverem relação com o fato...”. Caso em que as provas obtidas
em situação flagrancial configuraram a Teoria da descoberta inevitável, por
conseguinte, a relativização do direito à intimidade como tutela pro societate.
A despeito de julgados diversos, não há que se falar em prova ilícita por
derivação.  (HC 91867; Rel. Min. Gilmar Mendes).

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