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E T IC A Demonstrada em Ordem Geométrica E Dividida em cinco partes, nas quais se trata I. De Deus Il. Da Natureza ¢ Origem da Mente III. Da Origem e Natureza dos Afetos IV. Da Servidio Humana, ou das Forgas dos Afetos V. Da Poténcia do Intelecto, ou da Liberdade Humana Parte Ul Da Mente 149 ProrposigaAo XIII abjeto da idcia que constitui a Mente humana é0 Corpo, ou 4, um modo certo da Extensdo, existente em ato, e nada outro. sef a DeMonsTRAGAO Com efeito, se 0 Corpo nao fosse o objeto da Mente humana, as ideies das afecgdes do ‘Corpo nao seriam em Deus (pelo Corol. da Prop. 9 desta vd) enquanto constituisse a nossa Mente, mas enquanto constituisse | cen de uma outra coisa, isto é (pelo Corel. da Prop. 1x desta parte), ac ideias das afecgoes do Corpo nio seriam cm nossa Mente. Ora (pelo “ eioma 4 desta parte), temos as ideias das afecgses do corpo; portanto, & objeto da ideia que constitui a Mente humana é 0 Corpo, ¢ este (pela Prop. | wn desta parte) & exiscente em ato, Ademais, se além do Corpo hauvesse também um outro objeto da Mente, visto que nao existe nada (pela Prop. | 6da parte 1) de que nao siga algum cfeico, entdo em nossa mente deve- | ria dar-se necessariamente (peli Prop. 1x desta parte) uma ideia de algum efeito dele. Ora (pelo Axioma 5 desta parte), nenhuma ideia dele é dada. | Logo, 0 objeto da nossa Mente é 0 Corpo existente, ¢ nada outro. C.Q. D. COROLARIO . Dai segue que o homem consta de Mente e Corpo, ¢ que 0 Corpo hu- mano existe tal como 0 sentimos. Esco.tio0 Disso ndo somente entendemos que a Mente humana € unida ao | Corpo; mas também o que se hide entender por uniia da Mente'e do Corpo. Na verdade, nninguém a poderd entender adequadamente, ou scja, distintamente, se primeiro néo conhecer a natureza do nossa Cor- po adequadamente, Com efeito, as coisas que até aqui mostramos si0 1 bastante comuns € nio pertencem mais aos homens do que aos de- | mais Individuos, os q te todos animados. Pois, de uma coisa qualquer se di necessariamen- | teem Dens uma ideia, da qual Deus ¢ causa, da mesma mancira que da ideia do Corpo hum embora em graus diversos, sao entretan- kl no; © por consequéncia, tudo o que dissemos i ideia do Corpo humano hi de dizer-se necessariamente da ideia de i idet. ma coisa qualquer, Contudo, tampouco podemos negar que as ideias — pate tl DA Mente 151 si tal como os préprios objetos, ¢ que uma ¢ superior ¢ con- shee dade do que a outra, conforme o objeto de uma scja superior a ais realidade do que 0 objeto da outra: por essa razio, para cousenls Br que 2 Mence humana difere das demais ideias e em que lhes ¢ seqeniow “, qecessario, como dissemos, conhecer a natureza do seu obje- ree Corpo humana. No catanto, aqui n3o posso explicar isso, nem & o2, ben Os para as coisas que quero demonstrar. Contudo, digo de maneira secessitio PAT o mais um Corpo mais apto do que outros para fazer [agir] geri que er itas coisas simultaneamente, tanto mais a sua Mente é mais = Yee qutras para perceber muitas coisas simultaneamente; ¢ quanto ga 0 Bits de um corpo dependem somentc dele préprio, ¢ quanto menos sais Jorpos cancortem com ele para agi ranco mais apra é a sua mente » eo emeier distintamente. E a partir disto podemos conhecer a superio- ts fe ama mente diance de outras; podemos, ademais, ver o motivo por caaeeco temos sendo um conhecimento bastante confuso de nosso Corpo, iraitas autras coisas que em seguida dai deduzirei. Por esse motivo, achei Sievalis « pena explicar ¢ demonstrar tudo isso com mais cuidado, para 0 dmecessirio antepor umas poucas coisas sobre a naturcza do corpo. Axroma I Todos os corpos ou se movem ou repousam. Axroma II Todo corpo se move ora mais lentamente, ora mais rapida- mente. Lema I Os corpas se distinguem uns dos outros em razdo do movimento e | do repouso, da rapidez ¢ da lentiddo, endo em razdo da substancia. DEMONSTRAGAO Suponho a pri a parte conhecida por si. E que os corpos nio se dis- oe ¢m razio da substancia ¢ patente canto pela Prep. 5, quanto pela iP. 8 da parte 1. Mas, aind: is cl: ir di foi di Ese da Poop ee xs ja mais claramente, a partir do que foi dito no > Parte tl Da Mente 19 Lema II Jados 0s corpos convém em algumas coisas. todo. DEMONSTRAGAQ n efeivo, todos 08 corpos convém em que envolvem o conceito de Cor s ‘ ¢o mesmo atributo (pela Def 1 desta parte). Além disso, [convém] sé iu Bese um ppodem mover-se ofa mais lentamente, ora mals rapidamente e,em em qu vemas absollitos, OF4 MOVE! ar, ps Se, ora repo! Lema III Um corpo em movimento ou em repouso deveu ser determina- doao movimento ou a0 repouso por outro corpo, que também foi determinado ao movimento ou ao repouso por outro, e este por sua vex por outro, € assim ao infinite. DEMONS TRAGAO Corpos (peta Defin, 1 desta parte) sao coisas singulares que (pelo Lema 1) se distinguem umas das outras em razdo do movimento ou do repouso; eportanto (pela Prop. 28 da parte 1), cada um deveu ser necessariamente determinade ao movimento ou ae repouso por outra coisa singular, a sa- ber (pela Prop. 6 desta parte), por outro corpo, que também (pelo dxioma 1) ou se move ou repousa, E este também (pela mesma razdo) no pode mover-s¢ ou repousar sc nao foi determinado ao movimento ou ao repou- } 50 por outro, ¢ este, ainda uma vez (pela mesma razdo), por outro, e assim winfinito, C.Q.D. COROLARIO Dai segue que um corpo em movimento continua a mover-se até que Seja determinado Por outro corpo a repousar; € um corpo em repou- P : . ‘ ® também continua a repousar até que seja determinado por outro a0 im : : 5 evimento. © que também é conhecido por si. Com efeito, quando su- Ponho que um cor; SOtPOs em movim, PO, por ex. A, repousa, e nao presto atengao a outros ento, nada poderei dizer sobre 0 corpo A senio que f paara tl Da Munre 155 se, depois: acontecer de 0 corpo A se mover, isso decerto nao ast. Se, HEP OT pousava, uma vez que dai nada outro podia seguir se- Fre advit de au repousasse. Se, 20 contririo, se supée A em movimen- ey que que prestarmos atengio somente a A nada poderemos fo, eodas 28 YEE jue se move. Se depois acontecer de A repousar, isso iemar om nao pode advir do movimento que tinha, uma vez que ar nada outro podia seguir senéo que A se movesse; assim por uma coisa que nao cstava em A, a saber, por uma causa ado excpousie ‘jo movirmen nite’ H pela qual foi dever extern Axr1oma I Todas as maneiras como um corpo ¢ afetado por outro cor- geguem da natureza do corpo afetado e simultaneamente da natureza do corpo aferante; de tal maneira que um sé ¢ 0 mes- | mo corpo é movido diferentemente conforme a diversidade de narureza dos corpos moventes e, inversamente, corpos diver- | sos sio movidos diferentemente por um sé ¢ o mesmo corpo. Axroma ITI Quando um corpo em movimento atinge outro em repouso e nao pode demové-lo, é refletido de tal | maneira que continua a mover-se, ¢ 0 an- | gulo da linha do movimento de reflexao com o plano do corpo em repouso que foi atingido ser4 igual ao angulo que a linhado movimento de incidéncia formou como mesmo plano. {sso quanto aos corpos simplissimos, a saber, os que se distinguem uns dos sutras 56 por movimento € repouso, por rapidez ¢ lentidao. Passemos agora 205 compostos, DEFINIGAO is Quandoalgunscorposdemesmaoudiversa grandezasdocons- Tangidos por outros de tal maneira que aderem uns aos outros, — ——_—e panre il Da Mente 137 gemovem com o mesmo ou diverso grau de rapidez, de pu se °y maneira dU al 4 numa propor ns 208 a Individuos ° ¢ comunicam scus movimentos uns aos outros o certa, dizemos que esses corpos estio unidos ¢ ¢ todos cm simultinco compécm um sé corpo ee que se distinguc dos outros por essa uniao de corpo AxroMa III anto mais as partes de um Individuo ou corpo compos- e m umas as outras segundo superficies maiores ou me- eee nto mais dificil ou facilmente podem ser coagidas a ss situagao ¢, por consequéncia, tanto mais dificil ou faenchite pode ocorrer que 0 préprio Individuo assuma uma ee figura. E por isso, chamarei dures aqueles corpos cujas artes aderem umas as outras segundo grandes superficies; mo- Ies, aqueles cujas partes aderem umas as outras segundo peque- nas superficies; ¢, enfim, flwédos, aqueles cujas partes se movem umas por entre as outras. Lema IV Sede um corpo que ¢ composto de udrios corpos, ou seja, de um Individuo, sto separados alguns corpos, e simultaneamente tan- 40s outros da mesma natureza ocupam o seu lugar, 0 Individuo manterd a sua natureza de antes, sem nenhuma mudanea de sua forma, DreMONSTRAGAQ Com efcito, os corps (pelo Lema 1) no se distinguem em razio da gbssineia;¢ aquilo que constieui a forma do Individuo consiste na unigo qranbes (pela Def preced.); ora, esta (por Hipdtese) serh mantida, ainda terka sua Son continua mudanga de corpos; portanto, 0 Individuo man- cap atureza de antes tanto cm razao da substancia como do modo. paxte tl DA Ménre 199 Lema V tes componentes de um Individuo se tornam maio- seas par mas em proporgao tal que, como dantes, todas mene ‘as com as outras a mesma proporgdo de mavi- conse ye repent da mesma maneira 0 Individuo mante- ent natureza de antes sem nenhuma mudan¢a de forma. oF Lal DEMONSTRAGAO fg amesm que ado Lema precedente, am Lema VI ‘Ge alguns corpos, Componentes de um Individuo, sao coagidos dar a direcao de seu movimento de um lado para outro, an maneira tal que possam continuar seus movimentos e ¢0- maick-f0s entre si com a mesma proporeao de antes, igualmente » Individuo manterd sua natureza sem nenhuma mudanca de forma. DeEMoNSTRAGAO £ patente por si. Com efeito, supde-se que o Individuo mantém tudo que em sua definigio, dissemos conscituir a sua forma. Lema VII Além disso, um Indivtduo assim composto mantém a sua na- lureza, quer se mova por inteiro, quer esteja em repouso, quer se mova em direrao a este, ou dquele lado, contanto que cada parte mantenba 0 seu movimento e que 0 comunique ds ontras como dantes, DEMONSTRAGAO E patente pela sua prépria definigo que se vé antes do Lema 4. Escé.to hee = Portanto, vemos por que razéo um Individuo composto a Ag © de varias maneiras, conservando, contudo, a sua na- de corp, tte concebemos um Individuo que nio € composto scnio POS que se distinguem entre si apenas por movimento ¢ repauso, vane tf Ds Mewre », Isto é, que é compasto de corpos simplissisnes dene ler ; be ides * mos um outre compeste de muitos Individuas de 1 urena cxcobriremon que pade ser afetado de muitas outras igualmente dl snservando concudo a sua naturcea, De fato, visto que cada suas partes € compo (pee Lema preced.) movers or ¢ por consequéncia comunicar os seus mov a de muitos corpos, cada ma delas poders ida- ais lentamente ora mais rap entos 4s outras ora sem ncnhuma mudanga de sua natureza. tercciro género de Individuos, compostos duos deste segundo género, da mesma mancira descobriremos ‘ora mais devay concebermos dos de muitas outras manciras, sem nenhuma mus padem ser afer Pde sua forma, se continuarmos assim ao infinito, concebercmos c dant tureza intcira ¢ um Individuo, cujas partes, isto €, co- mence que a jos os corpos, Variam de infinitas manciras, sem nenhuma mudanga do Individuo inteiro. Se cu tivesse tido a intengao de tratar do corpo minu- ciosamence, deveria ter explicado ¢ demonstrado essas coisas de forma mais prolixa. Mas ja disse que minha intengao ¢ outra, ¢ nao me referi 2 essas coisas sendo porque a partir delas posso facilmente deduzir o que decidi demonstrar. PosTuLaDos 1. © Corpo humano écomposto de muitissimos individuos (de natureza diversa), cada um dos quais ¢ assaz composto. IL. Dos individuos de que o Corpo humano é composto, alguns sao fluidos, alguns moles e, por fim, alguns duros. IIL Os individuos componentes do Corpo humano ¢, con- sequentemente, o préprio Corpo humano, sao afetados pelos corpos externos de multiplas maneiras. IV. O Corpo humano precisa, para se conservar, de muitis- Simos outros corpos, pelos quais é continuamente como que tegenerado, V. Quando uma parte fluida do Corpo humano ¢ determi- pante tl Da Menre 1 m corpo externo a acingir amitide uma outra mole, oru nad? PY a superficie desta ultima ¢ como que aas mud cla mprime nela rigios do corpo externo que a impeliu. alguns 68 * 1.0 Corpo humano pode mover os corpos externos de vi Vt tox maneitas¢ dispé-los de miltiplas maneiras ultip' Prorposi¢gAo XIV 4 Mente humana é apta a perceber muitissimas coisas, ¢ é tao apta quanto mais pode ser disposto o seu Corpo de miltiplas mais maneiras. DEMONSTRACAO Com efeico, 0 Corpo humano (pelos Post, 3 € 6) € aferado de miilriplas eiras pelos corpos externos, ¢ ¢ disposto a afetar os corpos externos de mane yanciras, Ora, a Mente humana deve perceber tudo que acon- ee . Corpo humano (pela Prop. 12 desta parte); logo, a Mense humana apes perceber muitissimas coisas, ¢ € do mais apea ete. C. QD. Prorposi¢géo XV A ideia que constitui o ser formal da Mente humana nao é simples, mas composta de muitissimas ideias. DEMONSTRAGAO Aideia que constitui o ser formal da Mente humana é¢ a idcia do corpo (pela Prop. 14 desta parte), que (pelo Past. 1) é composto de muitissimos Individuos assaz compostos, Ora, a ideia de cada um dos Individuos com- ponentes do corpo é necessariamente dada (pelo Corol, da Prop. 8 desta parie) em Deus; logo (pela Prop. 7 desta parte), a ideia do Corpo humano écomposta dessas muitissimas ideias das partes componentes. C. Q. D. PrRoposigao XVI Alideia de cada maneira como 0 Corpo humano é afetado por Corpos externos deve envelver a natureza do Corpo humano e si imultaneamente a natureza do corpo externa. ee

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