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ISSN: 2525-8761
RESUMO
O estudo aqui apresentado objetivou identificar as compreensões de profissionais da
Psicologia acerca dos aspectos psicossociais da aposentadoria e as suas atuações junto
a pré-aposentados, em empresas da região do Extremo Oeste de Santa Catarina. O
método pautou-se pela abordagem qualitativa, com a realização de entrevistas
semiestruturadas junto a oito profissionais da Psicologia, que atuam no âmbito do
Trabalho e das Organizações, na região mencionada. As informações foram analisadas
por meio da análise de conteúdo. A partir das categorias de conteúdos identificadas,
concluiu-se que as profissionais participantes reconhecem as mudanças psicossociais e
os desafios inerentes da aposentadoria, bem como compreendem a importância dos
programas de preparação com pré-aposentados, objetivando a prevenção de
adoecimentos. Verificou-se que, na região pesquisada, praticamente inexiste essa
atuação, justificado pelos participantes como decorrente do desconhecimento da
demanda, indicando a necessidade de inclusão do tema nos currículos universitários e
espaços de encontro dos profissionais.
ABSTRACT
The study presented here aimed to identify the understanding of psychology
professionals about the psychosocial aspects of retirement and their actions with pre-
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retirees in companies in the Extreme West of Santa Catarina region. The method was
based on the qualitative approach, with semi-structured interviews with eight
professionals of Psychology, who work in the field of Work and Organizations, in the
mentioned region. The information was analyzed through content analysis. It was
concluded from the categories of contents that the participating professionals recognize
the psychosocial changes and the inherent challenges of retirement, as well as
understand the importance of pre-retirement programs with the objective of preventing
illness. It was verified that, in the region, this performance was practically non-existent,
justified by the participants as a result of the lack of knowledge of the demand,
indicating the need to include the subject in university curricula and meeting places of
professionals.
1 INTRODUÇÃO
Para se pensar a aposentadoria é preciso levar em conta o contexto do trabalho,
que, na contemporaneidade, pode ser entendido como “o núcleo definidor do sentido da
existência humana” (ZANELLI; SILVA; SOARES, 2010). O ato de trabalhar apresenta-
se com diversos significados psicológicos e sociais, sendo facilitador do
reconhecimento, dos vínculos entre as pessoas e, ao mesmo tempo, constitui-se central
à identidade humana (FÔLHA; NOVO, 2011; FRANÇA, 2008; ROESLER, 2014;
SOARES; BOGONI COSTA, 2015).
O afastamento do trabalho em decorrência da chegada da aposentadoria
geralmente ocorre com sentimentos ambíguos e contradições (BARBOSA; TRAESEL,
2013; BOGONI COSTA, 2015; FRANÇA, 2008; ROESLER, 2014; ZANELLI;
SILVA; SOARES, 2010), pois, ao mesmo tempo em que estar aposentado pode
significar lazer, descanso e oportunidade de realizar novos projetos, são comuns as
vivências que interferem na saúde psicossocial, tais como o isolamento e o sentimento
de inutilidade, além dos temores quanto ao envelhecimento (ALVES; ALVES, 2011;
PINTO; ALVES, 2014).
É um momento em que se mobilizam emoções, sentimentos e valores que o ser
humano desenvolve ao longo da vida, também podendo apresentar temores relacionado
ao sentimento de isolamento, de inutilidade, dificuldades financeiras e de desatualização
(OLIVEIRA; TORRES; ALBUQUERQUE, 2009). MARCELINO ET AL. (2020) ao
realizarem uma revisão integrativa sobre fatores de risco nos transtornos mentais
comuns em idosos apontaram que entre os principais fatores sociais e psicológicos que
desencadeiam estes transtornos, destaca-se a aposentadoria.
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poucas as empresas que investem em PPAS estruturados sendo a maior parte delas da
área pública.
Nesta perspectiva, entende-se que a atuação do psicólogo nas organizações, com
visão estratégica e de cuidado com a saúde, vem a contribuir para a promoção da
qualidade de vida dos trabalhadores nesta fase de transição de carreira (RODRIGUES,
et al., 2005; SOARES; BOGONI COSTA, 2010; SOARES; BOGONI COSTA, 2015).
Sendo assim, este estudo teve por objetivo identificar as compreensões de profissionais
da Psicologia acerca dos aspectos psicossociais da aposentadoria e das suas atuações
com pré-aposentados, em empresas da região do Extremo Oeste de Santa Catarina.
2 MÉTODO
Para o desenvolvimento do estudo adotou-se a abordagem qualitativa que,
conforme Gerhardt e Silveira (2009, p.31), “[...] não se preocupa com a
representatividade numérica, mas sim com o aprofundamento da compreensão de um
grupo social, de uma organização, etc.”. A organização das informações ocorreu de
modo exploratório e explicativo, sendo o primeiro com o propósito de fornecer maior
intimidade em relação ao problema relatado e o segundo, de descrever e detalhar o
fenômeno estudado em termos dos achados junto aos participantes (GIL, 2010).
O instrumento de coleta de dados utilizado foi a entrevista semiestruturada, com
roteiro elaborado pelas pesquisadoras para este fim, contendo informações
sociodemográficas, tal como idade, formação, área de atuação profissional na empresa,
tempo de formado, especializações, etc., e as questões direcionadas aos objetivos da
pesquisa. Prezou-se por certa flexibilidade nos procedimentos de coleta de informações,
com vistas a absorver novos temas e questões trazidas pelos entrevistados, permitindo
falas mais livres sobre assuntos que surgiam relacionados com o tema principal
(MINAYO, 2004).
As entrevistas foram gravadas em áudio, mediante consentimento dos
participantes com a assinatura do Termo de Uso de Imagem e, posteriormente,
transcritas integralmente para a interpretação. A análise das informações ocorreu a partir
do método de análise de conteúdo (BARDIN, 2011), que possibilitou a interpretação
dos conteúdos coletados em análises reflexivas, conforme os objetivos da pesquisa.
Participaram da pesquisa oito profissionais da Psicologia, que atuam no âmbito
do Trabalho e das Organizações, na região do Extremo Oeste de Santa Catarina. Os
mesmos foram selecionados por conveniência, a partir da abertura ao contato pelas
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3 RESULTADOS E DISCUSSÃO
CARACTERIZAÇÃO DOS PARTICIPANTES DA PESQUISA
Participaram da pesquisa oito psicólogas, todas do sexo feminino, que atuam no
campo da Psicologia Organizacional e do Trabalho (POT), no Extremo Oeste de Santa
Catarina. Conforme caracterização da Tabela 1 verificou-se que a maioria das
profissionais possui experiência e especialização, o que permite inferir bons
conhecimentos acerca da atuação neste campo.
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CATEGORIAS DE ANÁLISE
Os resultados foram agrupados em duas categorias de análise: “aspectos
psicossociais da aposentadoria” e “atuação profissional em orientação para a
aposentadoria”.
Quanto aos aspectos psicossociais da aposentadoria, as informações coletadas
possibilitaram a identificação de três subcategorias, quais sejam: a) a aposentadoria
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que os que não se preparam tem consciência das consequências que a falta de recursos
pode resultar, ressaltando a importância de pensar nesse preparo visto que, geralmente,
a renda diminui quando saem do mercado de trabalho, não podendo depender apenas da
Previdência Social (BRASIL, 2016). No entanto, a mesma pesquisa ainda revela que
tal preparação raramente é realizada, em especial devido à falta de instrução, consciência
de poupança e, ainda, devido à baixa renda, que impede qualquer reserva (BRASIL,
2016).
O segundo aspecto que motiva o retorno ao mercado de trabalho é a dificuldade
psicológica de aceitar a aposentadoria, justificada, em grande parte, pela representação
social da aposentadoria como ócio e inatividade, bem como a importância social que se
dá ao trabalho (ZANELLI; SILVA; SOARES, 2010). Nas falas das participantes
evidenciou-se destaque ao sentimento de “utilidade” proporcionado pelo trabalho:
“Temos dois colaboradores que se aposentaram e continuam na organização ainda (...)
não queriam ficar parados, queriam dar continuidade ao trabalho porque tinham
capacidade”(P1); “Temos duas colaboradoras que já estão aposentadas e continuam
trabalhando conosco (...) para complemento de renda e porque tem vida útil para
permanecer” (P2); “(...) ouço de colaboradores que trabalham conosco há mais de
quinze anos que não querem parar de trabalhar quando se aposentarem para
permanecerem ativos” (P7).
De acordo com Zanelli, Silva e Soares (2010), a passagem para a aposentadoria
pode se tornar fácil quando ainda na organização são promovidos espaços de vivências,
facilitando às pessoas pensarem em novas perspectivas de ações, em projetos de vida no
pós-carreira. Diante disso, aos trabalhadores, é importante promover espaços para
reflexões que lhes permitam compreender esse novo momento de vida e repensar
desejos pessoais que, muitas vezes, são esquecidos pela rotina de trabalho. Da mesma
forma, faz-se necessário que as organizações incentivem a preparação financeira, o que
poderia evitar o retorno ao trabalho motivado pela diminuição de renda.
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momento de fazerem o que gostam e de estarem mais próximas dos seus familiares. No
entanto, quando chega o momento da aposentadoria, podem se frustrar por uma rotina
carregada de situações que envolvem conflitos relacionais, familiares e mudanças
pessoais com perda de identidade (ANTUNES; MORÉ, 2020, SOARES; BOGONI
COSTA, 2011). As falas seguintes ilustram essas compreensões da aposentadoria como
frustração e adoecimento mental: “Ter expectativa demais pode ser uma frustração
depois, pois idealiza uma coisa que não se tornou realidade ”(P1); “Quando você está
no mercado de trabalho, você não pensa além, (...) é difícil pensar no que vai acontecer
depois (...) às vezes, você espera tanto, tanto, e quando você vive fica frustrante” (P2);
“Temos vários relatos em que a tão esperada aposentadoria passou a ser um pesadelo na
vida para quem hoje vivem o ócio”(P8).
A rotina de trabalho ocupa um espaço significativo na vida das pessoas,
representa uma contribuição social, disso pode advir o sentimento de frustração. Em
decorrência deste sentimento, podem buscar em outras circunstâncias um abrigo, como
nos casos de abuso de álcool e drogas, que podem ser vistos como formas de diminuir
as “dores existenciais” de não se sentir um lugar seguro, com os mesmos vínculos de
antes de aposentadoria (ZANELLI; SILVA; SOARES, 2010).
A vivência desse processo pode ocasionar também danos para a qualidade de
vida do trabalhador, acarretando em solidão, sentimentos de inutilidade e de baixa
autoestima (ROESLER, 2014). Tais aspectos foram recorrentes nas compreensões das
profissionais pesquisadas: “Quando se aposenta, às vezes, se isola socialmente, podendo
entrar em depressão, tendo o tédio não tem mais as mesmas atividades para desenvolver,
para fazer no dia a dia” (P7); “É muito fácil cair no alcoolismo, até mesmo pela
ociosidade. Conheço alguns casos de pessoas que entraram em depressão a partir do
momento que se aposentaram” (P2).
Compreender as particularidades que norteiam a vida do pré- aposentado, assim
como seus projetos no momento em que ocorre a aposentadoria, pode ser uma
alternativa para o enfrentamento das frustrações e adoecimentos. Diante disso, a
Psicologia, em suas diversas atuações, pode construir estratégias assertivas de
enfrentamento, potencializando e possibilitando que essas pessoas identifiquem um
futuro para além do trabalho (SOARES; BOGONI COSTA, 2015). Os Programas de
preparação para a aposentadoria visam justamente “proporcionar aos futuros
aposentados o reforço dos aspectos positivos e a discussão sobre alternativas de como
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4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este estudo procurou identificar as compreensões de profissionais da Psicologia
acerca dos aspectos psicossociais da aposentadoria e as suas atuações junto a pré-
aposentados, em empresas da região do Extremo Oeste de Santa Catarina.
Ao se analisar as informações trazidas pelas profissionais da Psicologia que
trabalham em organizações, evidenciou-se que consideram importante conhecer os
aspectos psicossociais da aposentadoria, mas que a temática carece de estar mais
presente em discussões acadêmicas nos cursos de graduação e pós-graduação e nos
treinamentos nas organizações.
Com relação aos aspectos psicossociais, as profissionais relataram a questão do
retorno para o mercado de trabalho, devido à necessidade de melhorar a renda,
ressaltando, dessa forma, a importância do preparo financeiro ao longo da vida. Ao
mesmo tempo, este retorno pode acontecer, segundo as mesmas, devido à falta de
aceitação das condições da aposentadoria que podem ser relacionadas à frustração e ao
adoecimento dos aposentados que não conseguem alcançar satisfação e sentimento de
pertencimento e utilidade, necessitando retornar ao mercado de trabalho. Na
compreensão das entrevistadas, as idealizações sobre a aposentadoria durante a carreira
podem incorrer em situações de risco à saúde psicossocial. Além disso, entendem que
os aposentados lidam de modo solitário com os estigmas sociais que foram impostos à
condição de não trabalho. Diante disso, reafirma-se que a aposentadoria pressupõe mais
do que um mero encerramento de carreira, trazendo impactos indiscutíveis ainda que as
percepções variem de uma pessoas para a outra (ZANELLI; SILVA; SOARES, 2010;
SOARES; COSTA, 2011).
No que se refere às atuações profissionais em orientação para a aposentadoria,
evidenciou-se que é percebida como importante, porém não tem sido prioridade em
estratégias organizacionais que favoreceriam a valorização humana e a diminuição de
doenças psicossociais. Ao mesmo tempo, o desconhecimento do tema por parte das
profissionais e a ausência de informações durante a formação foram justificativas para
a atuação ainda não ter o devido espaço na região onde ocorreu a pesquisa. Diante disso,
infere-se ser de suma importância à Psicologia estudar mais sobre o fenômeno e
possibilitar a formação, desde a graduação, permitindo aos profissionais que possam se
apropriar do saber e da atuação desta temática nas organizações.
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