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Argumento para curta-metragem

PAIXÕES URBANAS E OUTRAS DESILUSÕES

Com o tempo ela começou a perceber os trechos de poesias “impressos” com estêncil
pela cidade. Um dia já à noite no ônibus, reparou que havia uma certa lógica na
sequência e caminho que ela percorria. Faculdade, supermercado, trabalho. A cada dia
aparecia um texto, frase, poema que coincidentemente lhe cabia naquela escrita:
cabelo, cor da pele, lábios... Palavras que imaginativamente eram declaradas ao seu
ouvido.

Se o poeta pode ter sua musa, é direto da musa saber quem é seu poeta. Ela tinha
convicção que a cidade estava sendo pintada e desenhada por sua causa. Ela só não
sabia se estava se enamorando pela poesia ou por quem estava deixando a cidade
menos dura naquele caos de construções e entulhos.

“E se for mulher?” pensava ela com frio na espinha num misto acima de tudo de
alegria.

Atitude é pra poucas pessoas. Imprimiu em tiras de papel A4 a pergunta “Quem é


você?”. Ela andava com as cópias na bolsa e quando encontrava uma declaração,
colocava com fita crepe a pergunta.

Em apenas um dia uma resposta em letra de forma: “nos conhecemos”.

A cidade virou então um enorme diálogo espalhado ao ar e espaços livres.

Três meses depois ela se depara com mais um recado. A mesma forma, mesma
tonalidade de tinta, mesmo tamanho. A frase que ela já sabia e já sentia: “Carol, te
amo.”

A leitura foi lenta e repetida várias vezes. Sorriu várias vezes também.

E em vinte e sete anos, pela primeira vez ela desejou não se chamar Fernanda.

(Argumento com Certificado de Registro ou Averbação nº 35381, em 20/03/2019,


pela Fundação Biblioteca Nacional)

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