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ENERGIA

ESG além das Renováveis:


oportunidades para o setor de O&G

Fernanda Delgado
Diretora executiva corporativa do Instituto Brasileiro do Petróleo e Gás (IBP) e
professora de Geopolítica do Petróleo e dos Recursos Naturais da FGV

A atual agenda do setor energético temáticas principais, indo muito além conjunto de oportunidades na busca
mundial tem a questão da transição da questão ambiental. por um segmento mais competitivo.
energética como uma de suas princi- Se a exigência dessa agenda fosse Sob a ótica ambiental, é válido
pais pautas. Contudo, as abordagens antes um aspecto cada vez mais rele- destacar a importância da contribui-
desse processo não se limitam à des- vante para assegurar a financiabilidade ção das empresas de O&G por meio
carbonização ou seus efeitos climáti- de uma empresa ou segmento, a visão da sua expertise técnica e cultura de
cos, mas abarcam também aspectos das métricas ESG como oportunidade inovação, além da capacidade de mo-
de ordem social e de governança. Por para geração de negócios, melhorias bilização de recursos para a realização
isso, toda a estratégia voltada para em eficiência, atração de talentos e de de investimentos em PD&I – Pesqui-
a questão da sustentabilidade deve estabelecimento de um melhor diálogo sa, Desenvolvimento e Inovação – e
estar associada também aos seus im- com a sociedade agora tem se consoli- na viabilização de tecnologias de des-
pactos diretos e indiretos no âmbito dado. Pesquisa da consultoria McKin- carbonização que ainda estão em es-
social no qual as empresas estão dire- sey reforça ainda que as práticas ESG tágios iniciais. A expansão dessas tec-
tamente envolvidas. estão relacionadas com o fluxo de cai- nologias e a redução dos seus custos
A agenda ESG – environmental so- xa de cinco formas principais: dependem de recursos de engenharia
cial and governance – vem pautando as e gerenciamento de projetos em larga
(i) facilitando o crescimento de
decisões de diversos stakeholders repre- escala, que são expertises associadas às
receita,
sentando, portanto, riscos e oportuni- grandes empresas de O&G.1
(ii) reduzindo custos,
dades que tendem a afetar a capacida- Do ponto de vista social, vale des-
(iii) minimizando intervenções re-
de de uma empresa de criar valor no tacar o aspecto da transição energética
gulatórias e legais,
longo prazo. Assim, as discussões em justa, ou seja, aquela que busca con-
(iv) aumentando a produtividade
torno dessa agenda não devem passar ciliar as preocupações em relação às
dos funcionários e
despercebidas pelo setor de óleo e gás. mudanças climáticas com questões de
(v) otimizando investimento e
Pelo contrário: suas empresas têm um ordem socioeconômica. Nessa aborda-
gastos de capital.
papel essencial nesse contexto, deven- gem, a indústria de O&G ganha rele-
do atuar de forma ativa, buscando A agenda ESG representa a opor- vância pela sua capacidade de geração
incorporar os aspectos dessa agenda e tunidade para a criação de valor. O se- de empregos e de renda, sobretudo
promover o diálogo em torno de suas tor de O&G tem na agenda ESG um em países como o Brasil. Portanto, é

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preciso considerar, dentro do contexto váveis – à segurança do suprimento,


da transição energética, as particulari- A indústria de O&G conferida pela indústria de O&G.
dades de cada país sob a ótica social e
como a indústria de O&G contribui ganha relevância pela
dentro dessa perspectiva. Segurança energética
Com relação à governança, esta não sua capacidade de Ainda sobre esse tema, no contexto
deve estar vinculada apenas ao atendi- atual, a preocupação primária não é
mento de leis, regulamentos e regras, geração de empregos mais sobre a antecipação ou o adia-
mas também ao bem-estar dos cola- mento da transição, mas sim sobre a
boradores e das populações nas adja- e de renda, sobretudo questão da segurança do suprimento,
cências ou impactadas pelas atividades papel hoje conferido pelos combustí-
da empresa, os desdobramentos sobre em países como veis fósseis. A busca é pela diversifica-
a cadeia produtiva, os riscos políticos, ção das fontes e da redução da depen-
além do estabelecimento de métricas o Brasil dência dos combustíveis fósseis, mas
relativas a temas como direitos huma- mesmo um futuro descarbonizado
nos, bem-estar e meio ambiente. As- não será um futuro sem a participa-
sim, o fortalecimento da governança ção dos hidrocarbonetos.
das empresas de O&G e o alinhamen- essencial e que toca os parâmetros da O processo de transição energética
to a essa perspectiva são requisitos para agenda ESG de forma transversal que é inevitável e há uma sinalização ine-
a plena convergência dessa indústria é a segurança energética. É premente quívoca na direção da descarboniza-
com a transição energética. coadunar a diversificação das matri- ção. Dados da International Energy
Outrossim, a indústria de O&G zes energéticas – e participação cada Agency (IEA) indicam que, após anos
está ligada também a outro aspecto vez mais pronunciada de fontes reno- praticamente estagnado, o investi-

Figura 1 Investimento em energias limpas, 2017-2022


(em US$ bi)
1.600

1.400

1.200

1.000

800

600

400

200

0
2017 2018 2019 2020 2021 2022*

Energia renovável Energia nuclear


Eficiência energética e outras finalidades Grids e Armazenamento
Combustíveis de baixo carbono e CCUS Veículos elétricos
*Os dados de 2022 são estimativas. Fonte: IEA. World Energy Investment. 2022.

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mento em energias limpas subiu em setoriais mais profundas, de forma


2021 e, em 2022, estima-se que pode É necessário considerar as a zerar as emissões líquidas de car-
superar US$ 1,4 trilhão, correspon- bono do setor energético até 2050 e
dendo a quase 75% do crescimento realidades e potencialidades atingir os objetivos estabelecidos no
dos investimentos totais em energia.2 Acordo de Paris.
Vale mencionar que as soluções e de cada economia, onde Contudo, o setor de óleo e gás se-
desenhos para o net zero são diversos, guirá sendo essencial para viabilizar a
uma vez que não há uma solução úni- cada nação deve pensar transição energética, garantindo a se-
ca que caiba a todos os países. Assim, gurança do abastecimento bem como
é necessário considerar as realidades a transição que melhor a expertise e os recursos para investi-
e potencialidades de cada economia, mento em tecnologias direcionadas
onde cada nação deve pensar a tran- couber do ponto de vista da ao processo de descarbonização. Nes-
sição que melhor couber do ponto de se sentido, os esforços da indústria es-
vista da custo-efetividade. custo-efetividade tão voltados para entregar um barril
Estudos recentes têm analisado de petróleo mais resiliente, com um
projeções de cenários de longo prazo baixo custo de produção e com uma
(2019-2050) que visam entender o baixa taxa de emissão de CO2.
comportamento da demanda mun- oportunidade para exploração e ren- Países que buscam investir em tec-
dial por petróleo – figura 2 (IBP, tabilização desses recursos. nologias de produção mais eficientes
2022). A maioria dos cenários confir- As projeções da IEA e da British e que emitem uma quantidade me-
ma a tendência de redução dessa de- Petroleum (BP) evidenciam uma nor de CO2 durante a produção,
manda, diagnosticando um ponto de queda ainda mais acentuada na de- possuem vantagens competitivas que
inflexão no quinquênio 2025-2030, manda. As premissas dessas institui- podem assegurar posições estratégi-
podendo marcar a última janela de ções consideram mudanças sociais e cas na indústria mundial de petró-

Figura 2 Projeções de longo prazo da demanda por petróleo


(2019-2050, milhões de barris por dia)
125

110

95

80

65

50

35

20
2019 2020 2021 2025 2030 2035 2040 2045 2050

OPEC (Reference) IEA (Stated Policies) BP (New Momentum) IEA (Net Zero)

BP (Net Zero) Shell (Sky) Shell (Waves)


Fonte: IBP, 2022.

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leo. A figura 3 apresenta os valores das zero estão entre os exemplos mais
de intensidade de CO2 provenientes É sempre bom lembrar simples perseguidos pelo setor.
das atividades de produção de petró- Dessa forma, a questão da transição
leo para vários países. que o Brasil ocupa energética e a agenda ESG não deverão
É sempre bom lembrar que o levar a uma perda de protagonismo do
Brasil ocupa uma posição de desta- uma posição de petróleo na matriz energética do fu-
que no que se refere à transição para turo. Pelo contrário: o setor de O&G
uma economia de baixo carbono. destaque no que se converge com essa pauta na medida
Isso ocorre devido a fatores como: que se mostra essencial justamente
expressiva participação de fontes re- refere à transição para no sentido de viabilizar a transição,
nováveis na matriz energética nacio- ao mesmo tempo em que garante a
nal (cerca de 46%, ante média global uma economia de segurança do abastecimento e contri-
de 14%),3 baixo teor de emissão de bui para a viabilização do desenvolvi-
CO2 na produção de petróleo e in- baixo carbono mento de novas tecnologias por meio
vestimento em tecnologias pioneiras da sua expertise e da sua capacidade de
de descarbonização. mobilização de recursos.
Para além do deslocamento de
óleos menos eficientes do ponto Os aumentos de eficiência energética
de vista da emissão de CO2 na sua em seus processos industriais, incluindo 1
IEA. The oil and gas industry in energy transitions.
produção, vale destacar os compro- o refinamento, o zeramento das quei- 2020.
missos, aportes tecnológicos e inves- mas de flaring, redução nas emissões 2
IEA. World Energy Investment. 2022. As ener-
gias limpas incluem: VEs, CCUS, grids e arma-
timentos que o setor de óleo e gás de metano, investimentos em energias zenamento, eficiência energética, nuclear e
enseja na direção de sua obrigação renováveis e no mercado de carbono e renováveis.
com a transição energética. o comprometimento de emissões líqui- 3
EPE. Balanço Energético Nacional (BEN). 2022.

Figura 3 Intensidade de carbono da produção de petróleo


(2019, kgCO2/boe)
50
Intensidade de carbono Média global
45
40
35
30
25
20
15
10
5
0
Kuwait

EAU

Arábia Saudita

Noruega

Catar

China

brasil

Reino Unido
EUA

Cazaquistão

Rússia

México

Angola

Iraque

Irã

Argélia

Nigéria

Líbia

Canadá

Fonte: IBP, 2022.

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