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Unidade II
Nesta unidade falaremos sobre as correntes teóricas da Escola Metódica: o positivismo, o cientificismo
e o historicismo. Nossa intenção é compreender o contexto dos Oitocentos, buscando apreender essas
correntes como frutos do contexto político, econômico e social do período, bem como do pensamento
científico vigente.
De forma resumida, o século XIX caracterizou‑se pela consolidação do intenso processo de crescimento
demográfico e pela acelerada industrialização da Europa e de outros continentes. O fantástico progresso
econômico, embora tenha atingido de forma desigual os países europeus, resultou na configuração de
classes sociais bem definidas (o proletariado e a burguesia capitalista) e mudou a paisagem das cidades
e a geografia que dividia nações.
Nas fábricas, operários trabalhavam sem descanso, recebendo salários baixos e vivendo em condições
precárias. Nos campos, a produtividade aumentou em função do uso de tecnologia, só não crescendo
mais em função da escassez de mão de obra. Vindos da burguesia industrial, surgiram indivíduos movidos
pela crença no progresso e na mudança. Para esses empreendedores ávidos por novos mercados e por
invenções inovadoras, nada parecia ser obstáculo aos sonhos de expansão e riqueza.
Deixando para trás os ideais tradicionais e os valores religiosos como condutores da vida social e
política, a Revolução Francesa do século anterior disseminou o espírito de liberdade, de igualdade e de
fraternidade; espírito que foi colocado a serviço do progresso e do desenvolvimento do capitalismo.
Lembrete
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TEORIA DA HISTÓRIA
Leitura obrigatória
FALCON, F. C. O Iluminismo. São Paulo: Ed. Ática, 2009. Cap. 9. Disponível em:
<http://unip.bv3.digitalpages.com.br/users/publications/9788508015139/
pages/85>.
Figura 1 – Unificação alemã: em amarelo, o reino da Prússia, em 1864; em rosa, as aquisições prussianas entre 1865 e 1866; em
verde, a Alsácia e a Lorena, adquiridas em 1871
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Unidade II
Esses novos ares também contaminaram o Novo Mundo, em especial os Estados Unidos que, após a
Guerra de Secessão, fizeram da industrialização sua vocação maior.
Saiba mais
Apesar do sentimento de progresso que pairava no ar, o ambiente não era dos mais favoráveis para
o capitalismo: em especial a partir de 1848, as revoltas de trabalhadores aumentaram em termos de
frequência e intensidade, já que as manifestações francesas contra o autoritarismo e as dificuldades
econômicas haviam propagado o clima revolucionário para outros países. Marx (1818 – 1883) e Engels
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TEORIA DA HISTÓRIA
(1820 – 1895), figuras centrais do pensamento político do período, ofereciam finalmente o corpo teórico
necessário para se entender a dinâmica do capitalismo e combatê‑lo.
Leitura obrigatória
Figura 3 – Propagação da Revolução de 1848 pelo restante da Europa. Em branco, os países liberais; em amarelo, os conservadores
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GERMINAL. Dir. Claude Berri. França: Sony Pictures, 1993. 160 min.
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Unidade II
Leitura obrigatória
Entretanto, o capitalismo tinha problemas mais urgentes para resolver: os mercados até então
explorados haviam chegado a um ponto de exaustão. Era necessário expandir o capitalismo para além
das fronteiras da Europa, e a esse propósito lançaram‑se a Bélgica, a Holanda, a Inglaterra, a França, a
Alemanha e os Estados Unidos, entre outros: era premente encontrar novos mercados consumidores de
produtos industrializados e novos mercados fornecedores de matérias‑primas. A Inglaterra tornou‑se
praticamente dona do mundo. Conquistou a Índia e lá organizou a produção dos insumos necessários
para a indústria têxtil da Inglaterra. De Singapura, passaram a controlar o fluxo marítimo entre a China
e a Índia. Conquistaram Hong Kong, a Birmânia, a Austrália, a Nova Zelândia, o Canadá e quase todo o
continente africano.
Se no campo geopolítico e econômico o século XIX foi marcado pelos movimentos de unificação
em prol dos Estados Nacionais e pelo capitalismo monopolista e imperialista, no campo científico
esse período foi representado pela hegemonia dos fatos e da matéria. Apesar das revoltas dos
trabalhadores, das guerras entre as nações e da miséria generalizada, os cientistas e pensadores
conseguiam enxergar no contexto dos Oitocentos a promessa de um futuro promissor. Para Rossi
(2000, p. 52):
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TEORIA DA HISTÓRIA
e não outra direção. Considera em todo caso que tem sentido operar no
mundo com base em projetos regidos pela esperança num futuro desejável,
melhor que um presente cujos limites e insuficiências são visíveis.
Assim, a ciência partiu em busca das explicações para os fenômenos da natureza e da sociedade:
dando continuidade aos ideais iluministas, a ciência assumiu um caráter preferencialmente mecanicista,
inclusive utilizando a matemática para traduzir os fenômenos da natureza. Imparcial e infalível, essa
matemática seria o símbolo do método científico capaz de, distante de quaisquer discussões metafísicas,
alcançar o pleno conhecimento da realidade. Afinal, tratava‑se de fazer a defesa da ciência e da técnica,
responsáveis pela melhoria das condições de vida da humanidade. Nesse cenário, não havia qualquer
espaço para as superstições e para os sistemas metafísicos dogmáticos. Tratava‑se apenas de utilizar a
razão, submetendo‑a à evidência empírica e, da experiência.
Em consequência, o uso intensivo da matemática e das técnicas de cálculo deu impulso à mensuração
sob a forma de estatísticas e de recenseamentos: esses seriam os instrumentos utilizados para o estudo
científico e racional dos fenômenos sociais. Na França, esse propósito se revelaria nos recenseamentos
e nos cálculos administrativos e contábeis; na Alemanha, por meio de uma abordagem descritiva e
analítica; na Inglaterra, apoiada fundamentalmente na análise matemática. O mundo estava à disposição
para a quantificação: “nascimentos, óbitos, doenças, preços, produção, animais, condenados por crimes,
prostituição, o uso do solo, da água e do ar, quantidade de bosques, de moinhos, de rebanhos e de vinhedos”
(JUDENSNAIDER, 2012, p. 56). Esses dados permitiam, acima de tudo, a construção de leis explicativas por
meio de um único método que permitia o conhecimento da verdade sobre o mundo e a sociedade.
Para formular esse método seguro de obtenção do conhecimento, Comte (1798 – 1857) buscou uma
síntese dos desenvolvimentos científicos da Física, da Química e da Biologia; interessava‑o também afastar
a ciência das influências da religião e da metafísica e alcançar a objetividade, propósito básico das áreas
do conhecimento que se pretendiam racionais. Subordinando a imaginação à observação dos fenômenos
e alcançando o conhecimento “positivo”, o positivismo comtiano, assim, baseava‑se em três pressupostos:
Sob a inspiração da categorização dos organismos vivos tal como feita pelos botânicos e
zoólogos, Comte organizou o conjunto de conhecimentos como se fosse a reunião de “órgãos”
interdependentemente relacionados. Iniciando pela divisão mais geral do conhecimento em teóricos
e práticos, ele ressaltou que a procura da verdade não devia estar baseada na utilidade daquilo que
se investigava, já que muitas vezes a aplicação prática só ocorria tempos depois de adquirido o
conhecimento. Ainda, ele assinalava a importância de classificarmos os fatos, sem os quais teríamos
que nos apegar às explicações teológicas e metafísicas.
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Unidade II
Ele também dividiu as ciências naturais em dois grandes grupos: o primeiro, formado pelas ciências
abstratas e gerais (responsáveis pela descoberta das leis que regiam as classes de fenômenos), e as
concretas – particulares e descritivas – que representavam a aplicação das leis formuladas no primeiro
grupo no sentido de compreender a história dos seres existentes. Essa classificação envolvia, também,
uma hierarquia da importância das ciências: as gerais, portanto, eram mais importantes que as concretas.
Como exemplos, ele citava: a fisiologia geral deveria anteceder a zoologia e botânica; a química precedia
a mineralogia. O que Comte pretendia era organizar uma sequência lógica e sucessiva do encadeamento
das ciências naturais, de acordo com sua dependência mútua (COMTE, 1978).
Comte sugeriu que a ciência podia ser estudada de duas diferentes formas: por meio da perspectiva
histórica (seguindo a ordem cronológica das descobertas) e por meio da perspectiva dogmática (em que
a ciência era estudada tendo em vista os conhecimentos como um todo, atingidos até aquela época). É
interessante observar que, ao considerar a opção dogmática, Comte fez uma ressalva: as novas concepções
permitiam um olhar especial em relação ao conhecimento anterior; assim, ao longo do tempo, prevaleceria
a tendência de suprimir o caminho histórico em favor da análise dogmática. Isso ocorria, segundo a sua
visão, por causa da dificuldade de refazer – de maneira rigorosa – os caminhos propostos pelo pensamento
anterior, na ordem sucessiva do efetivamente ocorrido. Comte concluiu tratar‑se de tarefa impossível
conhecer a verdadeira história de cada ciência caso isso não fosse feito por meio do estudo da história da
humanidade. Nas suas palavras, “não conhecemos completamente uma ciência se não conhecemos sua
história. Mas este estudo deve ser concebido inteiramente separado do estudo próprio e dogmático da
ciência, sem o qual a história não seria inteligível” (COMTE, 1978, p. 28).
Comte também hierarquizou a forma como as ciências deveriam ser estudadas, segundo a ordem de
contribuição dos progressos reais que cada ciência apresentava e que possibilitava a compreensão dos
aspectos referentes às demais.
Comte também traçou o caminho que cada ciência deveria percorrer, passando pelos estágios
teológico, metafísico e, finalmente, positivo. Como base e suporte geral de todo conhecimento, estava a
ciência matemática, origem de todo o saber e ponto de partida da educação científica racional.
O positivismo teve uma enorme repercussão no Brasil, pois suas características pragmáticas
encontraram eco e seduziram a elite intelectual em formação que necessitava de suporte teórico e
científico. No entanto, é curioso perceber como os brasileiros foram além do proposto por Comte,
negando inclusive suas ideias por meio de uma prática que desvirtuou, aos poucos, os postulados
positivistas originais.
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TEORIA DA HISTÓRIA
Assim é que encontramos, no Brasil, uma interpretação bastante curiosa do trabalho de Comte.
A adoração de Clotilde de Vaux, os estatutos e cláusulas impeditivas da participação de positivistas
no governo e na área da educação, a reação ao progresso da medicina (como o horror à vacina), a
celebração de missas, a instituição de Semanas Santas em homenagem ao falecimento de Comte e
Clotilde, e mais uma série de abusos e interpretações rígidas do pensamento positivista acabaram por
criar um ambiente de repúdio a essa filosofia, trazendo como consequência o inverso da disseminação
que Comte pretendia.
A atuação brasileira, na verdade, acabou por reputar à Comte o que ele mais odiava, que era a
atribuição de caráter divino ao que ele pretendia que fosse apenas científico e racional. “Os seus
conceitos e conselhos somente se referiam ao momento histórico e ao meio social que ele tinha em
vista. Mudadas as circunstâncias de tempo e lugar, ele não poderia deixar de rever os seus conceitos e
conselhos, pois, do contrário, infringiria o princípio básico, por ele mesmo formulado: tudo é relativo, eis
o único princípio absoluto” (LINS, 1967, p. 419).
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Apesar de se opor à metafísica, Comte construiu uma filosofia da história em que os melhoramentos
e avanços não se davam de forma gratuita, mas em função de uma intenção racional (ROSSI, 2000).
Quer dizer, buscando distância da metafísica, Comte construiu outra filosofia, base de um corpus de
conhecimento estruturado a partir da razão prática, da experiência e da indução. Não à toa, essa
influência se deu, entre os historiadores, sob a forma de uma busca incessante por documentos e outras
evidências empíricas.
Essa nova metafísica que negava a influência da filosofia encontrou em Kant (1724 – 1804) seu
maior exemplar. Segundo Fleischer (2000, p. 21):
si, mas sempre só naquela maneira como elas se nos apresentam a partir das
condições subjetivas do nosso conhecimento.
Resta‑nos agora investigar como esse contexto social, político, econômico, científico e filosófico
impactou a construção teórica dos historiadores.
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Inicialmente, voltemos ao período anterior, marcado pelos ideais iluministas e pelo idealismo. Esse
idealismo, impregnado de metafísica, preconizava a identificação do imutável das filosofias da História.
Embora inverificável, e especialmente por isso, esse método permitia a compreensão do passado, do
presente e do futuro por meio da identificação de princípios invariantes e essenciais provenientes do
imutável modelo da razão humana que governava o mundo na direção do progresso. Para os idealistas,
a História “era mera exemplificação de formas gerais do ser ou de leis de eterno retorno” (REIS, 2004,
p. 9). Decididos a se afastar do romantismo literário dos escritos históricos do período anterior, os
historiadores buscaram novos caminhos.
Faltava, porém, aos autores dessa primeira metade do século XIX um método
crítico para estabelecer uma documentação segura. Escreviam rápido demais,
um pouco como romancistas que eram. [...] Para alcançar uma concepção
mais válida da história, definida agora como curiosidade intelectual, era
preciso o método, o método científico, como se dirá na segunda metade
do século. A erudição já era conhecida antes da época romântica. Mas
os eruditos do Antigo Regime, sobretudo do século XVII, conservavam as
maneiras de colecionadores de antiguidades e de raridades. Foi, sobretudo,
no início do século XIX que a compilação crítica dos textos e documentos se
desenvolveu paralelamente à história viva (ARIÈS, 1989, p. 149).
A partir de então, e por oposição ao idealismo e aos ideais iluministas, a História se propôs a entender
as relações de causalidade. A formulação matemática “se X, então Y” é a que melhor expressa essa
intenção: era necessário conhecer as relações de causa e efeito. “É a isso que chamavam ‘conhecimento
positivo’: observar os fatos, constatar suas relações, servir‑se delas para a ciência aplicada” (LEFEBVRE,
1971 apud REIS, 2004, p. 7).
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TEORIA DA HISTÓRIA
Essa nova abordagem buscou proteger‑se da imaginação e da ficção. O método crítico requeria,
inicialmente, credulidade na recepção da informação e no acolhimento ao documento; depois, deveria
duvidar, desconfiar e suspeitar. “A confiança no documento não deveria ser fundada na declaração de
intenção do próprio documento, mas construída pela ‘dúvida metódica’ [...]. O historiador não dava a
sua confiança ao documento, ele a elaborava e a construía objetivamente” (REIS, 2001, p. 7).
Observação
Não havia mais uma narrativa histórica que emanava de pressupostos racionais e da própria
consciência: a História era aquela que derivava dos fatos, examinados objetivamente pelo historiador.
Não havia mais uma fórmula básica que engendrava a história do mundo: havia eventos que, se
corretamente analisados e linearmente organizados, davam conta de revelar o passado que estava lá,
distante, irreversível e único. “A partir do século XIX, uma história científica não quis mais se apoiar
em pressupostos metafísicos. A história quis criar métodos e técnicas para o controle humano do seu
conhecimento. A verdade histórica é dos homens e deste mundo” (REIS, 2000, p. 329).
Uma pergunta surge desse cenário: mas o fato de essas novas correntes terem assumido todos esses
pressupostos já não configurava também a adoção de uma filosofia da História? Em outras palavras:
apesar de as novas correntes preconizarem uma História a posteriori, isso, per si, já não seria um critério
a priori?
A resposta para essa pergunta é afirmativa: havia uma filosofia de história implícita nessas novas
abordagens. Afinal, o historiador não tem como escapar dos seus pressupostos e de suas ideias filosóficas.
Ele vê o mundo a partir disso, ele vê o passado por meio dessas lentes. O olhar do historiador seleciona os
fatos que ele reconhece como possíveis de serem encaixados dentro de uma estrutura mental organizada
a partir de hipóteses a priori. A objetividade, mesmo que apresentada como modelo do ideal, é apenas
uma possibilidade remota, ao menos nos termos que essas correntes propunham:
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TEORIA DA HISTÓRIA
Enquanto o positivismo buscava a aproximação das ciências humanas com as ciências naturais, o
historicismo pretendeu dar continuidade à obra kantiana; afinal, a utilização de um método crítico não
era garantia do conhecimento objetivo! No historicismo, “a filosofia retorna à história, mas de forma
kantiana. [...] Seu objetivo é estabelecer um conjunto de critérios que singularize o conhecimento histórico,
tornando‑o independente dos modelos de objetividade da física e afastando‑o da filosofia especulativa”
(REIS, 2004, p. 34). Um exemplo dessa nova corrente metódica pode ser encontrado na obra de L. Von
Ranke (1795 – 1886), alemão e tido como uma das maiores figuras do historicismo. Estudioso da história
do Estado, ele municiou‑se de documentos diplomáticos escritos e oficiais para narrar a trajetória da
formação do Estado alemão. Documentos oficiais, rigorosamente analisados e organizados, de autenticidade
comprovada; a partir desse material, Ranke fez surgir o seu objeto de pesquisa, fechando as portas para
qualquer possibilidade de interferência – incluindo a sua, de sujeito do conhecimento – no processo de
elaboração histórica. O historiador não podia julgar o passado, sendo a ele apenas permitido narrá‑lo a
partir de procedimentos objetivos e isentos de qualquer reflexão filosófica.
Essa abordagem “positivista” pregava, portanto, a distância do sujeito em relação ao seu objeto,
fazendo do passado a área de investigação e utilizando rigor e objetividade para analisar os documentos
que contariam a história tal como ela “efetivamente havia ocorrido”. Um dos traços desse método seria,
dessa forma, o incansável esforço no sentido de conferir ou não autenticidade aos documentos e o
desenvolvimento de técnicas para o estudo de manuscritos e textos. Assim, os historiadores científicos
alemães pretendiam o afastamento com o socialismo e com qualquer crítica social durante a investigação
histórica. Ela “superestimava a eficácia do método crítico em seu esforço de objetividade, que escondia,
na verdade, suas ideias filosóficas sobre a história” (REIS, 2004, p. 19).
Se na Alemanha essa nova corrente foi representada pelo historicismo e pelo cientificismo, na
França ela buscou não se desvencilhar completamente da herança iluminista, apenas atualizando‑a
por força da filosofia comtiana e do evolucionismo darwiniano. Não se tratava de um presente
superando o passado, “mas da temporalidade evolutiva, cumulativa, da evolução gradual, irreversível,
linear e infinita do progresso iluminista” (REIS, 2004, p. 20). O caminho histórico estava dado
pela evolução na direção de uma sociedade moral e fraterna, cujas realizações encontravam‑se
apoiadas no espírito positivo. “O século XIX é tão metafísico como Comte pode sê‑lo: sob o discurso
positivo, cientificista, há uma compreensão total da marcha da humanidade, uma metafísica, uma
filosofia da história” (REIS, 2004, p. 21). Entre a metade do século XVIII e a metade do XIX, a ideia de
progresso “[...] [iria] coincidir – no limite – com a de uma ordem providencial, imanente ao devenir
da história” (ROSSI, 2000, p. 95). Afinal, tudo parecia construir uma ordem natural da história no
sentido do avanço e da melhora.
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Unidade II
Na França, o positivismo histórico disseminou‑se nas universidades, nos arquivos, nas bibliotecas e
nos museus. O ensino de História se distanciou do ensino da Literatura, já que esse pressupunha um
método específico. “A história se profissionalizou definitivamente – numerosas cadeiras na universidade,
sociedades científicas, coleções de documentos, revistas, manuais, publicação de textos históricos, um
público culto comprador de livros históricos” (REIS, 2004, p. 22).
Agora, era possível separar os profissionais dos não profissionais no trabalho de investigação
histórica: os primeiros procuravam semelhanças, construções abstratas ou leis que explicassem
os acontecimentos; os segundos tinham o “espírito positivo” que, por excelência, se propunha
antimetafísico. “Assim se abriu o fosso que separou a história dos profissionais (diremos a história
‘científica’) do público comum, ou mesmo dos outros especialistas das disciplinas humanas, em
particular da filosofia” (ARIÈS, 1989, p. 147).
O apego ao documento, o esforço obsessivo para conferir autenticidade às fontes, a dúvida sistemática
e o culto ao fato histórico, o evento único e irreversível: essas são as atitudes dos historiadores “positivos”.
Assim procederá Fustel de Coulanges (1830 – 1889), um dos maiores exemplares da escola histórica
metódica: embora ele tenha partido de uma hipótese inicial (procedimento que não faz parte do manual
positivo) e não tenha se baseado em qualquer lei histórica (como Comte talvez preferisse), Fustel se
distinguiu do romantismo poético, literário e imaginativo de Michelet (1798 – 1874) e se tornou o
modelo de historiador avesso a qualquer tipo de especulação.
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TEORIA DA HISTÓRIA
Para Fustel, o trabalho do historiador requeria a constatação dos fatos e a proximidade absoluta,
total e imparcial com os documentos. O passado, lá longe, poderia ser visto com clareza se essas regras
fossem seguidas. “A história se isola das ciências humanas, quer‑se livre da filosofia, mas tomada por
determinados a priori subjetivistas não explicitados” (REIS, 2004, p. 26).
Lembrete
Dentro desse espírito, a linearidade e o culto aos personagens mais importantes tornaram‑se
elementos constitutivos do trabalho dos positivistas. “A burguesia, num mundo cujo movimento ela não
suspeitava, não tinha o que fazer de uma filosofia da história” (ARIÈS, 1989, p. 153). De forma bastante
curiosa, e como observa Reis (2004, p. 32), esses procedimentos:
Resumo
Exercícios
Faltava, porém, aos autores dessa primeira metade do século XIX um método crítico para estabelecer
uma documentação segura. Escreviam rápido demais, um pouco como romancistas que eram. (...). Para
alcançar uma concepção mais válida da história, definida agora como curiosidade intelectual, era preciso
o método, o método científico, como se dirá na segunda metade do século. A erudição já era conhecida
antes da época romântica. Mas os eruditos do Antigo Regime, sobretudo do século XVII, conservavam
as maneiras de colecionadores de antiguidades e de raridades. Foi, sobretudo, no início do século XIX
que a compilação crítica dos textos e documentos se desenvolveu paralelamente à história viva (ARIÈS,
1989, p. 149).
B) A História deixou de lado um caráter abertamente narrativo em virtude de sua aproximação com
outras Ciências Sociais, como a Sociologia e a Geografia.
D) Os historiadores positivistas acreditavam que o documento escrito era a única forma viável de
aproximar-se do passado e o método historiográfico consistia em grande medida na avaliação da
autenticidade do documento estudado.
A) Alternativa incorreta.
Justificativa: a História Positivista privilegiava o documento escrito como fonte, na medida em que
ele traria informações unívocas, sem a necessidade da interpretação do historiador, ou seja, garantindo
a neutralidade no processo de conhecimento.
B) Alternativa incorreta.
C) Alternativa incorreta.
Justificativa: para os historiadores positivistas a História se movia graças aos “grandes feitos” dos
“grandes homens”, razão pela qual esse conceito se adequou perfeitamente aos projetos nacionalistas
do século XIX.
D) Alternativa correta.
Justificativa: essa era exatamente a ideia dos historiadores positivistas sobre o documento escrito e
sobre a validade do método historiográfico.
E) Alternativa incorreta.
Justificativa: a História passou a se vincular diretamente a outras Ciências Sociais na primeira metade
do século XX.
Na historia está presente uma lei que tende, através de graus ou etapas, à perfeição e à
felicidade do gênero humano; 2. tal processo de aperfeiçoamento é geralmente identificado com
o desenvolvimento e como crescimento do saber científico e da técnica; 3. ciência e técnica são a
principal fonte do progresso político e moral, constituindo a confirmação de tal progresso (ROSSI,
2000, p. 96).
C) uma relação com o iluminismo, sobretudo em relação aos vários estágios de desenvolvimento da
humanidade.
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TEORIA DA HISTÓRIA
D) uma ruptura com o evolucionismo darwiniano, por considerá-lo insuficiente para explicar as
sociedades.
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