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O Fim dos Alimentos - Nathan Debortoli - https://doi.org/10.4000/confins.

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Referência(s): (tradução de Ana Gibson do original The end of food, 2008, Boston,
Houghton Mifflin. ISBN 9780618606238., 416 pages), Rio de Janeiro, Elsevier, 364 p.
ISBN 978-85-352-3208-0

1 Jornalista desde 1983, Roberts escreve e ministra palestras frequentes sobre a


interação complexa da economia, da tecnologia e do mundo natural. The End of Food
seu livro mais recente, foi publicado em 2008. Roberts tem escrito também para
jornais de prestígio como The Los Angeles Times, The Washington Post e The
Guardian. Dá palestras frequentes sobre questões energéticas e outros recursos no
Fórum Econômico Mundial (Davos), E.U. Environmental Protection Agency,
Biotechnology Industry Organization (BIO) e o Council on Foreign Relations. A obra “O
Fim dos Alimentos” conduz de forma interdisciplinar temas sócio econômicos,
ambientais e institucionais.

2 Na narrativa de Roberts a crise dos alimentos é fundamentalmente econômica e de


sustentabilidade, com raízes no excedente agrícola (primeira fonte de troca geradora
do comércio e do lucro) dando origem a um paradigma econômico explícito - o
capitalismo - criador de escalas maiores de produção e um sistema globalizado de
comércio de alimentos, propiciando a revolução industrial. Nesta obra o autor não
pretende criar uma teoria da crise mundial dos alimentos, contudo, constrói uma
amálgama teórica fundamentando e correlacionando aspectos explicativos do estado da
arte da economia alimentar. Dividida em três seções e dez capítulos cronológicos a
obra contempla conceitos da agricultura primitiva, bem como a evolução das diversas
técnicas de cultivo e produção animal, perpassando tecnologias alimentares criadas na
revolução industrial e a produção da agricultura moderna em larga escala, intensiva em
insumos. Explica-se na obra que o novo modelo industrializado da agricultura tornou a
fazenda um empreendimento racional - quanto maior a entrada de capital -
fertilizantes, pesticidas, sementes - maiores os lucros. A pecuária e a agricultura
intensivas de substâncias químicas degradaram a capacidade produtiva dos sistemas
naturais.
3 A espiral tecnológica da crescente produtividade reduziu de forma generalizada os
preços dos produtos no mercado, incrementando o poder de compra dos consumidores,
contudo, gerando lento desastre para os produtores. Empresas farmacêuticas e
petroquímicas engoliram os produtores pequenos e menos eficientes oligopolizando
setores de insumos e sementes, assim como processadores detiveram a maior parte do
mercado de carnes. Graças aos lobbies dessas empresas aboliram-se em muitos países
leis e restrições quanto à procedência de produtos alimentícios. Tais prerrogativas
geraram protocolos universais isentando de barreiras diplomáticas e comerciais o
mercado mundial de investidores da indústria de alimentos, como a Nestlé e o
McDonald’s. Na sua crítica Roberts inclui conceitos de externalidades ambientais e
sociais ocasionadas pelo consumo maciço dos recursos naturais, bem como a escassez
iminente das fontes de energia que propiciam essa produção (e.g. o petróleo e
atualmente a água) e demonstra como todos fatores se inter-relacionam gerando a
insustentabilidade socioambiental da economia alimentar.

4 De acordo com Roberts a revolução do setor do varejo deu-se pela seguinte lógica:
(a) agricultores são reféns dos (b) insumos, que são providos por (c) multinacionais
petroquímicas e farmacêuticas que agregam valor aos produtos enviados para (d)
grandes marcas que processam os alimentos e (e) distribuem alimentos acabados ou
semiacabados para varejistas que são (f) controlados pelo preço e a demanda do
mercado. (g) Os quais criam suas próprias marcas (setor supermercadista) de menor
qualidade e com menor valor de venda (genéricos) (h), usurpando o poder de venda de
redes menores que se fundem para criar poucas grandes redes varejistas (i),
aumentando o custo do produtor primário e alimentando a hegemonia varejista. Neste
processo os produtos alimentícios ganham alto valor agregado devido ao marketing
embutido. Cadeias varejistas como Walmart contabilizam cada centímetro das
prateleiras para vender os produtos de maior receita, utilizando-se de itens não
alimentícios geradores de taxas de lucros mais elevadas para subsidiar de forma
eficaz a venda dos alimentos.

5 Ao mesmo tempo que populações de países do norte (desenvolvidos) e do sul (em


desenvolvimento) lutam contra as consequências da dieta moderna, como a obesidade,
doenças cardíacas e diabetes, uma em cada sete pessoas no mundo vive em estado de
“insegurança alimentar”. A busca por produtos mais saudáveis e sustentáveis tem sido
limitada por meio das fronteiras dos limites fiscais, estruturais e técnicos do setor
alimentício. A cultura just-in-time obriga produtores a entregarem produtos em tempo
recorde; os alimentos viajam globalmente portando patógenos, estimulando a
contaminação por mutações de vírus como a gripe suína, gripe aviária e salmonella. O
just-in-time diminuiu a oferta de empregos por meio da logística e reduziu os níveis
salariais. Por um lado estimulou a superprodução via exigência de alimentos de
aparência perfeita; e por outro, varejistas exigem que produtores comprovem que a
produção é efetuada da forma mais barata possível. Reduzindo a capacidade dos
produtores de lidar com contratempos como: greves, brechas nas cadeias de
abastecimento e surtos de doenças.

6 Alternativas como impostos de sustentabilidade dos alimentos vêm sendo discutidas


no congresso norte-americano. Os preços dos alimentos dependeriam de suas
externalidades na produção e de seus possíveis benefícios ou danos á saúde.
Inexoravelmente propostas desse tipo são barradas por políticos patrocinados por
produtores de alimentos. Do ponto de vista ecossistêmico, a agricultura é a maior
poluidora dos sistemas aquáticos, pois utiliza amplamente o nitrogênio juntamente com
organofosfatos encontrados nos pesticidas. A produção agrícola a curto prazo agrava a
extração e a exploração de recursos naturais e humanos dos quais depende sua
produtividade a longo prazo. Os produtos transgênicos são alívios temporários para a
escassez de alimentos. Para além desses existem limites biológicos na produção de
carnes e de alimentos em geral. A redução do estoque de terras agricultáveis e a
redução de outras culturas em favor do milho e da soja escassearam diversas fontes
de alimento em detrimento da produção da carne.

7Tendo a agricultura industrial esgotado as suas capacidades renovadoras, a nova


agricultura sustentável surge como alternativa de maior consciência sobre os limites
naturais. Tendo automaticamente diminuído a obsessão por soluções tecnológicas e
milagres científicos da transgenia. Pesquisas demonstram que milhares de fazendas de
pequeno e médio porte têm adotando a produção diversificada/rotação, mais eficientes
que o agronegócio monocultor. Novos modelos de agricultura sistêmica natural
reintegram gado e lavoura, cultivando plantas que estimulam o ciclo de nutrientes
complexos. Os alimentos tendem a se tornar mais sociais, engendrando a revalorização
do agricultor. Os números da agricultura orgânica já alcançam cifras altas de
concorrência em relação à agricultura industrial, com maior valor agregado e menor
poluição. Esse sistema, contudo ainda sofre embates com forças do mercado, que
descaracterizam os seus fundamentos principais.

8“O Fim dos Alimentos” captura a atenção do leitor pela detalhada análise da lacuna e
do paradoxo crescente entre a economia alimentar moderna e as bilhões de pessoas
que deveriam ser alimentadas por ela. Roberts elucida meticulosamente como o varejo
desenvolveu uma cadeia de produção de alimentos baseada na alta lucratividade e nos
preços baixos para o consumidor. Explica como a iminente catástrofe da escassez
alimentar é reflexa da produção mundial de commodities, do oligopólio empresarial e do
consumo maciço de alimentos industrializados. Este livro é de leitura obrigatória para
indivíduos que se preocupam com os alimentos, seus hábitos de consumo, e como a
produção mundial ditará a sobrevivência no planeta.. Um prato cheio para quem deseja
atualizar-se e aprofundar conhecimentos relativos a complexa rede de elementos que
envolve uma de nossas fontes primordiais de vida: os alimentos.

Referência eletrônica: Nathan Debortoli, «O Fim dos Alimentos», Confins [Online], 10 |


2010, posto online no dia 21 novembro 2010, consultado o 12 abril 2022. URL:
http://journals.openedition.org/confins/6736; DOI:
https://doi.org/10.4000/confins.6736

Nathan Debortoli - Doutorando do Centro de Desenvolvimento Sustentável - CDS

Universidade de Brasília - UnBnathandebortoli@gmail.com

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